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A influência disseminada
Talcott Parsons, cuja obra dominou a sociologia norte-americana por mais de
duas décadas (1950-1960) e exerceu – e ainda exerce (embora seja declinante)
– influência sobre toda a sociologia acadêmica mundial, travou contato com a
obra de Weber ainda nos anos 1930, na Alemanha. Sua tese de doutoramento
versava sobre o conceito de capitalismo em Weber e Sombart, o que lhe permitiu
preparar o terreno teórico sobre o qual desenvolveria, em 1937, uma original
tentativa de síntese sociológica, a primeira elaboração de sua teoria geral da
ação. O livro, um grosso calhamaço de mil páginas, intitulado Estrutura da Ação
Social, dedicou quase um terço das páginas à interpretação parsoniana de
Weber. No entanto, sua apropriação de Weber caracteriza-se pela ênfase posta
sobre as normas e valores sociais, em função de sua preocupação em construir
as bases de uma teoria da integração social. Se isso lhe permitiu aproximar
Weber de Durkheim muito mais facilmente do que é efetivamente possível,
facilitou, no entanto, uma apropriação da obra de Weber nos Estados Unidos
que, além de incorreta e problemática, enfatizava excessivamente sua utilização
conservadora. No entanto, a influência de Weber na sociologia norte-americana,
até então pequena, pegou carona no funcionalismo parsoniano e cresceu, até
que no fim dos anos 1960 a revisão interpretativa de suas contribuições
começasse a ser feita, resgatando-o contra Parsons. Quanto a isso, o pioneiro
foi C. Wright Mills, cuja obra reflete uma influência weberiana bastante diferente
daquela encontrada em Parsons e sua escola.
Se Parsons procurou aproximar Weber do funcionalismo durkheimiano, Wright
Mills fez a aproximação com a tradição marxista, extraindo daí não só uma
interpretação, mas um efeito – em suas próprias obras – crítico e politicamente
renovador. Mills foi praticamente uma voz isolada numa América conservadora
e exposta ao maniqueísmo da Guerra Fria, e uma voz que se calou
precocemente (ele morreu aos 47 anos, em 1961). Apesar disso, sua influência
na renovação antiparsoniana da sociologia norte-americana dos anos 1970
deveu-se, em grande parte, à extração marxista de sua apropriação de Weber,
que lhe permitiu enfatizar, ao contrário de Parsons, os conceitos de classe,
de interesse e de conflito. No entanto, ao contrário daquele, Mills jamais tentou
uma sistematização conceitual que lhe permitisse construir uma abordagem tão
abrangente quanto a parsoniana. Por isso, sua contribuição terminou confinada
à sua época.
Lukács, o grande pensador marxista, frequentou assiduamente o Círculo de
Heidelberg, que se reuniu na casa de Weber por quase uma década. Nos dois
últimos anos da vida de Weber, quando já se tornara marxista, Lukács, ainda
sob sua influência, redige alguns dos trabalhos que vão compor seu livro mais
célebre. Além de abundantes referências aos trabalhos de Weber, Lukács
promove uma inusitada aproximação marxista com a problemática weberiana da
“racionalização”, cuja influência posterior não deve ser negligenciada.
Mannheim, que foi chamado de “marxista burguês” e de weberiano “marxista”
(sic), escreveu suas principais obras entre as décadas de 1920 e 1940. Sua
influência, particularmente no campo da sociologia do conhecimento, é decisiva,
e tão grande quanto sua pretensão de construir uma ponte entre Weber e Marx
que resolvesse algumas das antinomias postas por essa relação. Sua influência
sobre Mills permitiu a este se apartar da todo-poderosa interpretação parsoniana
de Weber. Do mesmo modo, sua obra permitiu aos funcionalistas manter uma
porta aberta ao marxismo (pelo menos nessa área da “sociologia do
conhecimento”), como no estudo de Robert K. Merton sobre sociologia da
ciência.
No pós-guerra, a influência de Weber alastra-se pela Europa e pela América.
Raymond Aron, na França, forja o conceito de “sociedade industrial” e se apoia
em Weber para criticar o marxismo. Ralf Dahrendorf, na Alemanha, sob forte
influência weberiana, revisa o conceito de classe e, como Aron, substitui
capitalismo por “sociedade industrial”, para enfatizar a dimensão mais
abrangente (principalmente política) dos conflitos sociais do capitalismo tardio.
A sociologia inglesa renova-se com a influência de Weber, principalmente nas
obras de John Rex, J. Goldthorpe, David Lockwood, Frank Parkin e Anthony
Giddens. Na França, Michel Crozier e Alain Touraine estudam a burocracia e a
classe trabalhadora em aberto diálogo com as hipóteses weberianas, e Pierre
Bourdieu reinterpreta Weber em seus trabalhos de sociologia da cultura.
Apesar da forte influência de Parsons, a sociologia norte-americana reencontrou
Weber de diversas maneiras, desde o pós-guerra até hoje. Obras muito
importantes como as de Seymour M. Lipset, Reinhardt Bendix, Robert Bellah,
Clifford Geertz, Randall Collins e S. Eisenstadt, entre outros, foram
desenvolvidas em constante recuperação e reinterpretação das hipóteses
weberianas. Tendências que aparecem na época da Guerra Fria, como a
sociologia fenomenológica, a etnometodologia, a sociologia radical, o
interacionismo simbólico, retomam Weber exatamente onde Parsons o havia
recalcado: no seu “idealismo”, na sua “sociologia compreensiva” e nas
minuciosas questões metodológicas.
Em compensação, o “materialismo” de Weber é recuperado pelo marxismo do
pós-guerra, que antes lhe havia reservado a indiferença dogmática ou o ataque
superficial. Essa indiferença não existiu nos clássicos do marxismo, mas tornou-
se dominante no período stalinista. Kautsky, Bukhárin, Rosa Luxemburgo,
Gramsci, Lukács e Max Adler citam Weber e quase sempre em apoio às suas
próprias ideias. Mas o conhecimento da obra de Weber era ínfimo, se comparado
ao que os marxistas contemporâneos passam a ostentar a partir dos anos 1960.
A influência de Weber na Escola de Frankfurt é reconhecida e bastante
significativa, principalmente na obra de Habermas. A crítica superficial foi
abandonada e o rigor com que muitos marxistas reavaliam a obra de Weber não
fica nada a dever ao ostentado pelos “weberianos”.
Uma verdadeira história das reinterpretações de Weber e de suas disputas teria,
agora, que descer ao campo temático e conceitual. Acompanhar a disputa dos
conceitos, a detecção de suas ambiguidades originais, o aparecimento de novos
problemas sobre os escombros de problemas que pareciam resolvidos, enfim,
teria de ser uma história da constante reatualização de Weber, como a feita
brilhantemente por Wolfgang Schluter nas últimas décadas. Aqui entrariam, por
exemplo, a penetrante e nem sempre admitida influência de Weber sobre as
obras seminais de Norbert Elias e Michel Foucault, apenas para citar dois nomes
que continuam em evidência. Naturalmente, isso não pode ser feito aqui. De
qualquer modo, será feito por cada sociólogo, em sua área específica de
atuação. Isso será inevitável sempre que se descobrir que o sociólogo
“weberiano” se dedica a uma coisa “que na realidade jamais chega, e jamais
pode chegar, ao fim”.
Michel Misse é professor de sociologia da UFRJ
Max Weber é conhecido como um dos fundadores da sociologia moderna, ao lado de pensadores
como Vilfredo Pareto (1848-1923), Émile Durkheim (1858-1917) e Georg Simmel (1858-1918).
Seu pensamento é marcado por uma crítica do materialismo histórico, que, em seu dizer,
petrifica as relações entre as formas de produção e de trabalho e as outras manifestações
culturais da sociedade. Para ele, o pensador social deve estar disposto a reconhecer a influência
que as formas culturais, como a religião, por exemplo, podem exercer sobre a própria estrutura
econômica.Karl Emil Maximilian Weber nasceu em Erfurt, em 1864, em uma família
protestante.A partir de 1869, instala-se com a família em Berlim. Seu pai foi deputado do Partido
Nacional Liberal, e, graças a ele, Weber, desde cedo, teve contato com homens políticos e
pensadores influentes que eram frequentemente convidados à sua casa.
O jovem Max, entediando-se na escola e tendo pouco contato com os colegas de sua idade,
tornou-se um leitor insaciável. Suas leituras (Cícero, Maquiavel, Kant etc.) testemunham sua
grande precocidade intelectual. Terminada sua formação básica, Weber inscreve-se na
Faculdade de Direito de Heidelberg, seguindo igualmente cursos de economia política, filosofia,
história e teologia.Em 1889, Weber conclui seu doutorado sobre o desenvolvimento das
sociedades comerciais nas cidades italianas da Idade Média. Em 1891, termina o trabalho A
Importância da História Agrária Romana para o Direito Público e Privado, que o qualifica para
ser professor na universidade. Esses anos foram decisivos na formação de Max Weber, porque
o fizeram se interessar pelos problemas sociais de sua época.Aos 29 anos, em 1893, assume o
cargo de professor de história do direito romano e de direito comercial na Faculdade de Berlim.
Casa-se com Marianne Schnittger, ícone da causa feminista e intelectual engajada em questões
políticas. Ela terá um papel decisivo na edição da obra de Weber, supervisionando
principalmente a publicação dos escritos póstumos de seu marido, em especial de sua obra
magna Economia e Sociedade.
De 1897 a 1903, Weber sofre de uma grave depressão nervosa, sendo obrigado a interromper
seu magistério. Em 1903, retomando suas atividades intelectuais, reorienta suas pesquisas para
a sociologia. É nesse contexto que ele publica A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Em
1909, funda a Sociedade Alemã de Sociologia.
Durante a Primeira Guerra Mundial, Weber inicia a redação de seu vasto projeto de sociologia
comparada das religiões mundiais. Em 1919, muda-se para Munique, a fim de ocupar a cátedra
de sociologia que a universidade havia criado especialmente para ele. É nessa ocasião que ele
pronuncia duas de suas mais conhecidas conferências: “A Ciência como Vocação” e “A Política
como Vocação”.