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25/08/13 Torias das Relações Internacionais

No curso de Estudos Regionais e Geografia, entre tantos temas, é comum falar-se sobre os Estados
nacionais ou, ainda, sobre as relações internacionais. O texto apresentado abaixo, visa complementar os
estudos dessas disciplinas, ele nos apresentará as várias teorias sobre a origem dos Estados e as teorias
sobre a geopolítica do sistema internacional.

TEXTO Nº 01

Teorias das Relações Internacionais

Autor: Demétrio magnoli

Estado é uma criação recente da história humana. Embora esse termo seja comumente
usado para fazer referência a inúmeras formas de articulação do poder em sociedades
antigas e medievais, ele só ganha sentido e conteúdo no Renascimento europeu. A Europa
pós-medieval inventou o Estado, sob a forma das monarquias absolutas.

Com o Estado, surgiram teorias políticas sobre o Estado. Nicolau Maquiavel (1469-1527),
funcionário do governo de Medice de Florença e autor de O Príncipe, postulou a
separação entre a moral e a política como fundamento da razão de Estado. O Estado
deve afirmar a sua soberania contra os interesses particularistas. As idéias de Maquiavel,
profundamente influenciadas pela divisão da Itália, representaram um dos pilares do
absolutismo.

Thomas Hobbes (1588-1679), autor do Leviatã, foi o principal teórico do absolutismo. O


Estado nasce do interior da sociedade, mas ele se eleva acima dela. Antes do seu advento
imperava o "estado de natureza", a guerra de todos contra todos. Assim, ele surge como
manifestação da evolução humana, cujo sinal é a consciência da necessidade de um poder
superior, absoluto e despótico, voltado para a defesa da sociedade. Essa consciência origina
um contrato pelo qual os homens abdicam da sua liberdade anárquica em favor do Estado,
afim de evitar o caos. A figura bíblica do Leviatã representa o Estado: um monstro cruel
que, no entanto, impede que os peixes pequenos sejam devorados pelos maiores.

A transição do absolutismo para o liberalismo processou-se por vias diferentes e


contrastantes. Na Grã-Bretanha, resultou da progressiva e gradual limitação do poder
monárquico através da afirmação do parlamento. Na França, da irrupção revolucionária de
1789, que destruiu os fundamentos do poder real e instaurou a soberania popular. As
teorias sobre o Estado refrataram essa transição.

John Locke (1632-1704), autor de Dois tratados sobre o governo civil, retomou as idéias
do "estado natureza" e do contrato de Hobbes, revisando-as para defender a limitação do
poder real. A liberdade original dos homens não se perde na instituição do Estado, mas
subsiste como contraponto do poder do soberano. No limite, é essaliberdade original que
prevalece, pelo direito à ressurreição. Em Locke, fica estabelecida a separação entre a
sociedade civil e a sociedade política, ou seja, entre a esfera privada e a pública. O poder
circunscrito à esfera pública, não pode ser transmitido por herança ou proceder da
propriedade territorial - só pode ser gerado por consentimento político.

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O Barão de Montesquieu (1689-1755), autor de O espírito das leis, desenvolveu a teoria


da separação dos poderes, cujos fundamentos encontram-se em Locke. O Estado liberal
assenta-se sobre o equilíbrio dos poderes de produção das leis (legislativo), execução das
leis (Executivo) e controle da sua aplicação (judiciário). Essa estrutura terrena do Estado
deveria substituir o poder divino dos reis, a fim de defender os interesses e a liberdade dos
homens. O contrato político ganhava assim o seu detalhamento, sob a forma da
democracia representativa.

Jean-jacques Rousseau (1712-1778), filósofo do grupo enciclopedista e autor da obra Do


contrato social, inverteu a noção hobbesiana do "estado de natureza". Onde Hobbes
enxergou a guerra e a anarquia, Rousseau encontrou a felicidade e a harmonia da vida
selvagem. O advento da propriedade privada rompe o equilíbrio e introduz a violência e a
escravidão. Superar essa situação é superar o absolutismo, substituindo-o por um contrato
legítimo fundado na soberania popular. A assembléia dos cidadãos, a democracia direta,
esse é o único Estado legítimo e um reflexo do caráter superior e livre do ser humano.
Nessa linha, Rousseau investia não apenas contra o absolutismo, mas também contra a
democracia representativa e a delegação de poderes, elevando-se à condição de precursor
das utopias comunistas.

O Estado territorial nasceu com as monarquias absolutistas, que investiram contra os


interesses particularistas e as prerrogativas aristocráticas do feudalismo. Essa primeira
forma do Estado contemporâneo gerou corpos estáveis de funcionários burocráticos e
exércitos regulares e centralizados, unificando o poder político. O poder político
medieval, fragmentado em mosaicos de soberanias entrelaçadas, era dissolvido sob os
golpes centralistas da realeza. Um novo poder político emergia, baseado em fronteiras
geográficas definidas e na cobrança generalizada de impostos. Como conseqüência,
apareciam capitais permanentes, materializadas em cidades que se tornavam sede dos
órgãos do Estado.

O Estado nacional surgiu da decadência do absolutismo e da substituição pelo liberalismo.


Essa segunda forma do Estado contemporâneo gerou a soberania nacional, expressa na
eleição dos governantes e na limitação do Poder Executivo por representantes também
eleitos. A soberania deslizou da figura do monarca para o conceito de nação. O poder
despersonificou-se, identificando-se com o povo. O poder divino deu lugar ao consenso
popular.

A noção de consenso já aparecia em Maquiavel, que postulava a necessidade de o


soberano conseguir apoio popular. Contudo, o consenso maquiavélico dependia da virtude
do príncipe e da orientação da sua ação política. Locke e montesquieu fizeram do
consenso a base do Estado e a razão de ser das suas engrenagens de poder. Rousseau
levou a idéia até o seu limite, assentando o consenso na participação ativa e permanente
dos cidadãos. A nação tornava-se a fonte do poder, e a esfera da política passava a refletir
o consenso geral.

TRÊS ENFOQUES DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

As teorias políticas clássicas concentraram seu interesse sobre as relações internas aos
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Estados estabelecidas entre governantes e a sociedade em geral. O estudo das relações


internacionais, ou seja, das relações estabelecidas entre os Estados, é muito mais recente, e
só ganhou o estatuto de disciplina acadêmica no século XX. A preocupação com sistema
internacional de Estados foi estimulada pela constituição progressiva de uma economia
integrara, de âmbito mundial. As transformações na produção e na circulação de
mercadorias típicas do século XVIII e XIX - época da Revolução Industrial - aumentaram
a relevância desses estudos. A própria análise do Estado foi cada vez mais influenciada
pelas considerações relacionais, ou seja, pela investigação da posição ocupada e do papel
desempenhado pelo Estado no sistema geral e nos subsistemas particulares em que está
inserido.

O vasto campo de estudo das relações internacionais não é definido de forma consensual.
Diferentes autores encaram de modo divergente - e muitas vezes conflitante - o objeto das
relações internacionais. Grosso modo, é possível identificar três tradições divergentes que
informam a produção acadêmica de teorias sobre as relações internacionais.

Escola idealista

Oriunda do pensamento iluminista, a escola idealista enfatiza a comunidade de normas,


regra e idéias que sustenta o sistema de Estados. Sua fonte é a noção de direito natural
que aplicada ao sistema internacional, implica a definição da justiça como arcabouço das
relações entre os Estados. De certa forma, os ecos da visão rousseauniana do contrato
social ressurgem aqui em um contexto específico. Essa tradição, que se desenvolveu e se
reforçou no mundo anglo-saxão sob a forma de uma reação moral aos horrores da Primeira
Guerra Mundial (1914-1918), forneceu os parâmetros para a escola idealista.

Ainda hoje, a escola idealista assenta-se sobre a idéia iluminista ancestral da possibilidade
de uma sociedade perfeita. Essa meta moral condiciona o caráter francamente reformista
dos autores, que se preocuparam em adaptar o sistema internacional às exigências do
direito e da justiça. Os célebres "Quatorze Pontos", do presidente americano Woodrow
Wilson - a proposta de uma paz sem vencidos ou vencedores ao final da Primeira Guerra
Mundial - , bem como nos princípios fundadores da Liga das Nações, de 1920,
inscreveram-se como exemplos da influência idealista na diplomacia do século XX..

Até certo ponto a "política do apaziguamento" de Chamberlain e Deladier - que multiplicou


as concessões na vã esperança de acalmar o belicismo de Hitler - foi tributária dessa
corrente de idéias.

Escola realista

A segunda tradição, que informa a escola realista, enfatiza não a comunidade ideológica
do sistema internacional, mas seu potencial conflitivo. As raízes desse estilo encontram-se
essencialmente em Maquiavel e Hobbes.

Maquiavel sublinhou a importância da força na prática política liberta de constrangimentos


morais e conferiu legitimidade aos interesses do soberano. Em seu pensamento, os fins
condicionam os meios. O inglês Hobbes, como o italiano Maquiavel, nutria profundo

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pessimismo em relação à natureza humana. Seus comentários sobre o sistema internacional


traçam um paralelo entre as relações estabelecidas pelas pessoas na ausência do Leviatã.
Por essa via, ele realça uma idéia que se tornou a fonte da argumentação básica da escola
realista: a ausência de um poder soberano e imperativo nas relações internacionais.

No plano acadêmico a escola realista desenvolveu-se como reação aos melancólicos e


trágicos fracassos da "política do apaziguamento" conduzida na Europa do entreguerras.
Substituindo a meta moral do sistema internacional pela análise das condições objetivas
que determinam o comportamento dos Estados. Os pensadores realistas ancoraram sua
argumentação nas noções de anarquia inerente ao sistema e da tendência ao equilíbrio de
poder como contraponto a essa anarquia.

As divergências entre os autores realistas a respeito dos condicionantes do comportamento


dos Estados originaram a corrente neo-realista, também conhecida como realismo
estrutural. Contrariamente aos realistas que tentam definir o comportamento dos Estados
pela ânsia de poder, os neo-realistas preferiram identificar a busca da segurança como
causa última da prática política no sistema internacional. Esse enfoque realça a
problemática da estrutura do sistema, que define as formas e graus da insegurança
experimentado pelos atores isoladamente.

Escola radical

A terceira tradição tem raízes mais recentes, situadas no pensamento marxista. Karl Marx
não produziu uma teoria do sistema internacional, mas da história da revolução Social. Ao
contrário das tradições citadas anteriormente, não é a cooperação ou o conflito entre os
Estados o seu objeto, mas o conflito entre as classes sociais. O Estado é um elemento
marginal no pensamento marxista, e o comportamento dos Estados, quando enfocado,
surge apenas como veículo para interesses econômicos, políticos ou ideológicos de outros
atores (classes sócio-econômicas, corporações industriais e financeiras, etc.). Contudo,
principalmente por meio de Lenin, a tradição marxista forjou um pensamento sobre as
relações internacionais, classificado como escola radical ou neomarxista.

O Ambiente internacional das últimas décadas do século XIX e início do século XX -


marcado pela expansão neocolonial das potências européias na Ásia e na África, por
políticas semi-coloniais dos Estados Unidos no Caribe e Extremo Oriente, bem como do
Japão nas áreas insulares e costeiras da Ásia oriental e do sudeste - condicionou a
teorização leninista sobre o imperialismo. Apoiando-se nas teorias do britânico não-
marxista john Hobson, Lenin adaptou o conceito de imperialismo à teoria ou à linguagem
marxista. Na sua obra O imperialismo, estágio superior do capitalismo, o líder russo
estabelece interessantes conexões entre economia política do capitalismo, a luta pela
divisão dos mercados e o imperialismo neocolonial. O argumento original de Lenin,
entretanto, consistiu na ligação entre a prática imperialista e a guerra entre as potências.

A noção de imperialismo jamais foi nitidamente definida entre os autores da escola radical.
O rótulo "imperialismo" é utilizado em diferentes contextos, designando às vezes qualquer
império, outras, apenas os impérios neocoloniais dos séculos XIX e XX. Nas obras
posteriores dos marxistas não fica claro se o termo designa a "etapa superior do
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capitalismo" a que se refere Lenin ou a um sem número de relações econômicas entre


países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Contudo, a preocupação pelas relações de
subordinação econômica entre estágios desiguais de desenvolvimento industrial e
tecnológico veio a formar o arcabouço das análises radicais ou neomarxistas do sistema
internacional. Essas abordagens, sob o ponto de vista metodológico, contribuem para
lançar luz sobre os atores do sistema internacional que não são Estados: grupos
econômicos e corporações transnacionais, igrejas, instituições privadas multilaterais,
organizações sindicais, ambientais e não-governamentais em geral.

SISTEMA INTERNACIONAL E O EQUILÍBRIO DE PODER

A política externa consiste no conjunto de posturas, práticas e iniciativas do Estado


relacionadas com o ambiente político que o envolve: o sistema internacional de Estados.
Raymond Aron, em Paz e guerra entre as nações, define o sistema internacional como "o
conjunto constituído pelas unidades políticas que mantêm relações regulares entre si e que
são suscetíveis de entrar numa guerra geral". Os sistemas internacionais são constituídos,
portando, de unidades separadas - isto é, Estados soberanos - que se encontram integradas
pelas relações de independência. Na síntese de Aron:

Tomemos como ponto de partida o esquema das relações internacionais: orgulhosas da


sua independência, coisas da sua capacidade de tomar sozinhas as grandes decisões, as
unidades políticas são rivais por que são autônomas - em última análise, elas só podem
contar consigo mesmas.

No ambiente de anarquia do sistema internacional, cada uma das unidades políticas


componentes almeja sua segurança particular e, para incrementá-la, acumula meios e
recursos de poder. O resultado da atitude de cada unidade política isoladamente
considerada é o aprofundamento da sensação de insegurança das demais que reagem no
sentido de recobrar sua segurança, ampliando seu próprio poder. O equilíbrio de poder não
se constitui o alvo da atividade de qualquer componente do sistema, mas emerge
eventualmente da combinação das suas iniciativas particulares.

A anarquia básica do sistema internacional está, contudo, circunscrita pela estrutura do


sistema. Essa estrutura condiciona padrões de relações e laços de interdependência que
limitam os conflitos de poder e fornecem um certo grau de estabilidade provisória para o
próprio sistema internacional. A estabilidade é assegurada pelo equilíbrio de poder entre as
principais potências.

Em primeiro lugar, a estrutura do sistema envolve a consideração dos seus limites. Por
muito tempo a distância geográfica funcionou como fator determinante na delimitação dos
sistemas: entidades políticas muito distantes não podiam manter relações interativas
regulares. O sistema das cidades gregas na antigüidade - ancorado na rivalidade entre
Atenas e Esparta -, chegou a abranger, no máximo, o império persa. Contudo, o domínio
macedônio ampliou a unidade política e acumulou recursos econômicos e militares que
permitiram empreendimentos distantes, dilatando os limites do sistema.

A premissa de interdependência política das entidades também funcionou como fator de


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delimitação espacial. As relações estabelecidas entre as potências mercantis européias e as


colônias no Novo Mundo, ou as relações entre as potências industriais do século XIX e
suas colônias asiáticas e africanas , embora regulares e constantes, não exprimem um
sistema mundial, em função da ausência de soberania dos territórios subordinados.

Em segundo lugar, a estrutura do sistema depende da configuração da relação de forças.


Os sistemas organizam-se em torno das grandes potências, ou seja, dos Estados que
dispõem dos meios para exercer uma influência significativa sobre todos os demais. Apenas
as entidades políticas cujo poder é levado em conta pelas principais são participantes
integrais de um sistema de Estados. A configuração da relação de forças dos sistemas influi
decisivamente sobre os padrões de aliança, tensão e conflito que dinamizam.

No século XIX, após a derrota de Napoleão Bonaparte, constituiu-se um sistema europeu


baseado na convivência de cinco potências: Grã-Bretanha, França, Prússia, Rússia e
Áustria-Hungria. O Congresso de Viena, de 1815, estabilizou as relações entre elas pela
constituição da chamada Santa Aliança. O Sistema de Metternich, como ficou conhecido,
refletia o equilíbrio de poder entre as potências do Velho Mundo. O sistema de Estados
europeus do século XIX representa um exemplo clássico de sistema multipolar ou
pluripolar.

Esse equilíbrio, que perdurou por praticamente um século, começou a ser erodido pela
unificação alemã de 1871, que gerou novas tensões em função do aumento do poderio da
Alemanha e da insegurança que ele provocou entre as demais potências do sistema. Além
disso, no final do século, a emergência dos Estados Unidos e do Japão como potências
internacionais começou a provocar o alargamento dos limites do sistema, que tendia a se
globalizar. A Primeira Guerra Mundial e as crises do entreguerras destruíram
definitivamente o sistema multipolar europeu do século XIX.

A Segunda Guerra Mundial (1939-45) originou um sistema internacional de características


completamente diferentes. A expressão Guerra Fria referencia-se nesse novo sistema, de
abrangência mundial, alicerçado sobre o equilíbrio entre as duas superpotências
termonucleares. Na segunda metade do século XX, a bipolaridade de poder estruturou as
relações entre os Estados e definiu os padrões de conflito e cooperação em escala global.

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