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FIGURA/FUNDO.

INDAGAÇÕES SOBRE A RELAÇÃO


EDIFÍCIO/CIDADE NA PRODUÇÃO DE OSCAR NIEMEYER.
BORDA, Luis Eduardo1

RESUMO
O presente texto visa apresentar minha pesquisa de pós-doutorado, cujo título é
Figura/Fundo. Indagações sobre a Relação Edifício/Cidade na Produção de Oscar
Niemeyer. A pesquisa está sendo desenvolvida na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo, sob a supervisão do prof. Dr. Rodrigo Cristiano Queiroz.
Pretende investigar as relações entre edifício e cidade na produção do arquiteto; para isso,
analisará algumas propostas urbanísticas de Niemeyer, bem como algumas de suas
intervenções no espaço urbano. Buscará identificar, a partir disso, modos recorrentes do
arquiteto pensar a relação entre forma arquitetônica e cidade. A análise do enfrentamento
de Niemeyer com o espaço pré-existente levará em conta, entre outras questões, o debate
que se dá a partir dos anos 50 sobre a revisão do Urbanismo Modernista, procurando
verificar em que medida as intervenções de Niemeyer acompanham tal discussão. A base
teórica para o trabalho serão as várias análises que têm sido feitas sobre a obra do
arquiteto, alguns trabalhos referenciais sobre o Urbanismo Modernista e sobre sua revisão
e, finalmente, discussões sobre a questão do lugar na Arte e na Arquitetura
Contemporâneas.

ABSTRACT
This paper aims to present my postdoctoral research, entitled Figure / Background. Questions about
Relationship Building / City in the Production of Oscar Niemeyer. The research is being developed at
the Faculty of Architecture and Urbanism, University of São Paulo, under the supervision of Dr.
Rodrigo Cristiano Queiroz. The aim is identify Niemeyer’s recurring modes of thinking the
relationship between architectural form and city and, for that, the analysis will consider some urban
proposals of Niemeyer, as well as some of his interventions in urban space. The analysis will take
into account the debate that takes place from the 50 on the review of Modernist Urbanism, seeking
to determine if the Niemeyer’s interventions accompanies this discussion. The theoretical basis for
the work will be the various studies that have been made about the work of the architect, some

1
Doutor em Artes pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (2003), Mestre em
História Social da Cultura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1993), Professor Associado da
Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design da Universidade Federal de Uberlândia, atualmente cursa Pós-
Doutorado em Arquitetura e Urbanismo na Universidade de São Paulo. E-mail:
luiseduardoborda@yahoo.com.br

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important works about the Modernist Urbanism and, ultimately, discussions on the issue of place in
Contemporary Art and Architecture.

Palavras-chave: Oscar Niemeyer, arquitetura, urbanismo.

A PESQUISA: SEUS OBJETIVOS E QUESTÕES


A pesquisa de pós-doutorado que ora desenvolvo tem por objetivo lançar um
olhar sobre as relações objeto/cidade na produção de Oscar Niemeyer. Questão que
tem despertado grande interesse e debate na atualidade, considero que a relação
entre as formas arquitetônicas e o contexto urbano tem sido um tema pouco
explorado nas análises que tem sido feitas sobre a obra do arquiteto. É bem
provável que uma das razões disso seja a expressividade plástica e a originalidade
das formas de Niemeyer, algo que, monopolizando a atenção da maioria de seus
críticos, talvez tenha levado a maioria das análises a centrarem-se na compreensão
das referências estéticas de sua arquitetura, bem como no estudo do
desenvolvimento de sua linguagem.
O trabalho pioneiro de Yves Bruand, por exemplo, centrou-se nas questões
plásticas quando buscou identificar os traços marcantes da arquitetura brasileira e
compreender a contribuição de Niemeyer para a constituição de tal linguagem. Não
foi objeto de sua análise as convicções urbanísticas de Niemeyer ou o seu modo de
entender a relação entre as formas e a cidade.
Pesquisadores mais recentes como Marco do Vale e Rodrigo Queiroz
aprofundaram a análise dos aspectos plásticos da arquitetura de O. Niemeyer, neste
caso verificando de modo rigoroso e detalhado as influências de Le Corbusier sobre
sua obra, ou mesmo as influências recíprocas entre Niemeyer e Corbusier (no caso
da análise de Rodrigo Queiroz). Mais uma vez, as análises recaíram sobre os
aspectos formais e sobre as referências de O. N, sem que a ênfase fosse a relação
das formas com o espaço urbano.
Eu meu trabalho de Doutorado, intitulado O Nexo da Forma. Oscar Niemeyer:
da Arte Moderna ao Debate Contemporâneo, também realizei uma análise voltada
para a questão plástica da obra de Niemeyer. Neste caso, busquei na Arte Moderna
as referências formais do arquiteto, entendendo que esta era uma via importante
para a compreensão de sua poética. A despeito de o foco principal ser a forma, não
deixei contudo de discutir a espacialidade das obras e até mesmo dediquei dois

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capítulos às relações entre edifício/entorno.2 De qualquer modo, como este não era
o interesse central do trabalho, as relações objeto arquitetônico/cidade não tiveram o
mesmo aprofundamento que o foco principal da pesquisa.
A despeito da maioria das análises recaírem sobre a questão formal, coube a
autores como Carlos Eduardo Dias Comas, Luís Recamán de Barros e Marco Cezar
Dudeque dirigirem um olhar às relações da obra de Niemeyer com o espaço urbano.
Em sua análise do desenvolvimento da arquitetura brasileira, cuja melhor
expressão (segundo tal autor) seria Oscar Niemeyer, Recamán de Barros verifica
que a idéia de reprodutibilidade do objeto arquitetônico e o conceito de uma malha
ortogonal extensível (o “Plano Moderno”), conforme defendidos por Le Corbusier nos
anos 20, estão ausentes na experiência que inaugura a arquitetura brasileira: o
projeto para o prédio do Ministério de Educação e Saúde Pública (Rio de Janeiro,
1929).3 Segundo Recamán de Barros, a solução final da equipe brasileira não
somente se afastaria da idéia de reprobutibilidade do objeto arquitetônico como
implicaria, do ponto de vista urbanístico, uma acomodação (ou até mesmo uma
rendição) à cidade existente, o que significaria um posicionamento acrítico à cidade
tradicional. De acordo com o autor, esse posicionamento iria também caracterizar
todo o desenvolvimento posterior da arquitetura moderna brasileira. No caso
específico de Oscar Niemeyer, considerado pelo autor como a maior expressão da
arquitetura brasileira, teríamos uma arquitetura formalista, não-reprodutível,
desvinculada da idéia do Plano Moderno e também anti-urbanística.
Embora implique afirmações polêmicas, considero que a crítica de Recamán
de Barros tem o mérito de levantar a problemática das relações que se
estabeleceram no Brasil entre arquitetura moderna e cidade. Para o presente
trabalho, a análise de R. de Barros tem especial interesse uma vez que o autor vai
se ater às implicações urbanísticas de alguns projetos realizados por Oscar
Niemeyer. Ou seja, o autor coloca em foco algo pouco explorado nas análises, que é
justamente a relação edifício/cidade na obra de Oscar Niemeyer.
2
Uma vez que a pesquisa buscava interfaces entre alguns conceitos da Arte com a Arquitetura, a análise foi
feita a partir do conceito artístico de Site Specific. O capítulo foi intitulado Espaço e Lugar.
3
Barros observa, a propósito, que, quando chega ao Brasil em 1929, o próprio Le Corbusier já havia substituído
a idéia de uma edifício-protótipo por um edifício-forma, afastando-se portanto das idéias de reprodutibilidade
que marcaram sua defesa inicial da arquitetura moderna. Por essa época, Corbusier já demonstraria, segundo
R. de Barros, certa desesperança de implementar suas propostas de redefinição total do espaço urbano, sendo
que o que propõe para o Rio de Janeiro e São Paulo seriam estruturas que pairam sobre a cidade, sem
enfrentar de fato o espaço urbano pré-existente.

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Esboçando uma leitura diversa do problema, o pesquisador Eduardo Dias
Comas também se aterá às relações entre objeto e cidade em Niemeyer, neste caso
analisando a relação edifício/cidade implicada na proposta para o prédio do MESP.
(COMAS, 1987). Para Dias Comas, o interesse urbanístico da solução proposta é
justamente o vazio ou praça que propõe à cidade. Considera também o autor que o
edifício queria ser o modelo de uma nova linguagem arquitetônica, o marco inicial de
um novo modo de pensar a arquitetura no Brasil.
No texto Pré-Brasília. A Legitimidade da Diferença, Dias Comas também se
ocupará das relações entre os edifícios de Niemeyer e o lugar no qual se inserem.
Para D. Comas, Niemeyer revelaria uma preocupação sensível com os espaços em
que se inserem suas obras, especialmente no que concerne à incorporação de
certos elementos do entorno. Escreve Dias Comas que “a alusão a precedentes
vernaculares, eruditos, mecânicos ou naturais é às vezes surpreendente, mas
sempre plausível em termos de programa e situação. O aspecto naval da
superestrutura do Ministério enfatiza a proximidade da baía de Guanabara; as telhas
de barro do Hotel de Ouro Preto se harmonizam com os telhados do entorno.
Concreto e granito nas colunas redondas do Ministério sugerem solidez essencial e
duradoura; aço e chapa ondulada nas colunas do Pavilhão conotam possibilidade de
desmonte; os pilares quadrados do Hotel de Ouro Preto remetem ao esqueleto de
madeira que sustenta as construções vizinhas”. E continua: “a preocupação de
Niemeyer com a caracterização do ‘espírito do lugar’ é fartamente documentada.
Exuberância, multiplicidade e diversidade se podem ler também como atributos de
uma paisagem, clima, temperamento e como tal se interpretam em seu tempo”.
(COMAS, 1994, p. 52).4 O limite de Oscar Niemeyer, considera Comas, é que,
embora se preocupe com a caracterização do programa, “só reconhece situação
enquanto espaço abstrato. Talvez por isso sua obra se introverta, insinuando a
impossibilidade da humanização arquitetônica do espaço aberto; cai na armadilha
megalômana da cidade ideal da arquitetura moderna. Contudo, já havia
demonstrado (no período pré-Brasília) que a arquitetura moderna nada devia à sua
aberrante cidade ideal, que podia existir múltipla e legitimamente diferente”. (Idem).
O pesquisador Marco Cezar Dudeque irá destacar a impressionante
capacidade de Niemeyer em criar lugares marcantes na tese O Lugar na Obra de

4
Citar também a referência Beaux Arts de O. N., o qual, ao invés das caixas indistintas de Mies van der Rohe,
preocupar-se-á com o caráter e diferenciação do edifício, de certo modo anunciando sua função.

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Oscar Niemeyer. Partindo das idéias de Norberg-Schulz sobre a questão do lugar,
Dudeque irá mostrar que, em virtude de sua forte identidade e caráter singular,
muitos dos projetos de O. N. tornaram-se referências visuais nas cidades em que se
implantaram. Conclui sua análise dizendo que “o formalismo de Niemeyer se impõe
sem hesitação e despretensão. Para os mais puristas e conservadores, a relação
com o lugar se esfacela em pedaços. (...) A taça gigante, o museu de Niterói,
também consegue um grau de autonomia assustador. Dialoga com a natureza, o
Pão de Açúcar ao longe, com o mar, que ajuda a dar continuidade visual.
Supervaloriza, a partir de si, o lugar. (...). Talvez seja este poder de síntese
conseguido de maneira decidida e madura, se valendo de formas singulares, que
crie o desejo, em alguns lugares do mundo, de possuírem o privilégio de abrigar um
edifício de Oscar Niemeyer”. (DUDEQUE, 2009, p. 179).
Por fim, Dudeque irá observar que muitos dos lugares criados por Niemeyer
têm um caráter a que Norberg-Schulz chamaria de “cósmico”. 5 Os edifícios ligam-se
ao céu e a terra tão somente, parecendo surgir de nada mais do que desses
elementos primordiais. Seria o caso dos edifícios de Brasília.
Considero que a análise da relação edifício/cidade realizada por esses três
autores, somada às considerações que eu próprio já havia realizado tanto em minha
dissertação de Mestrado quanto em minha tese de Doutorado, apontam para
determinada problemática que eu sintetizaria da seguinte maneira:
1. A relação edifício/cidade na obra de Niemeyer precisa ser avaliada,
primeiramente, a partir de seus projetos urbanísticos, nos quais fica claro seu
modo de entender a cidade, sua expectativa em relação ao futuro e sua
vinculação aos preceitos do urbanismo modernista. Embora Niemeyer tenha
realizado poucas propostas urbanísticas comparativamente ao número de
propostas arquitetônicas, considero que tais projetos são de grande interesse
para o entendimento de seu pensamento. A análise de tais propostas ilumina,
a meu ver, a análise dos modos de relação de Niemeyer com a cidade real,
tradicional, na qual, ao fim e ao cabo, a maioria de seus projetos se implanta.
Talvez ajudem a compreender, por outro lado, certo desconforto do arquiteto

5
Na sua análise da questão do lugar, Schulz os divide em cósmicos, românticos, clássicos e
complexos. (DUDEQUE, 2009).

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em trabalhar com a cidade tradicional, modo de organização urbanística
avaliada por ele como algo ultrapassado e que não resolve com eficiência os
problemas do homem moderno.6
2. O ponto de partida das intervenções de O. N. é preferencialmente a natureza,
não o espaço pré-existente. Luís Recamán de Barros observa isso,
apontando que o mesmo acontece com Le Corbusier. Segundo o
pesquisador, ambos partem da idéia de tabula rasa. (BARROS, 2002).
Dudeque aponta a mesma questão em Niemeyer, associando tal tendência
ao que Schulz chamaria de dimensão “cósmica” da noção de lugar.
(DUDEQUE, 2009). Eduardo Dias Comas também se refere ao problema,
observando que Niemeyer “só reconhece situação enquanto espaço
abstrato”. (COMAS, 1994, p. 52). Trata-se de uma questão a que eu mesmo
já havia chamado a atenção no capítulo Oscar Niemeyer e o Desenho da
Cidade, de minha dissertação de Mestrado (BORDA, 1994), bem como nos
capítulos O Povo e a Rua e Espaço e Lugar de minha Tese de
Doutorado.(BORDA, 2003).
3. A relação edifício/cidade em Niemeyer terá de levar em conta as fases
identificadas pela maioria de seus críticos e que são o período pré e pós-
Brasília. Embora ambos os períodos talvez revelem a mesma independência
das formas em relação ao espaço urbano, a fase pós-Brasília evidencia a
intenção clara de Niemeyer em destacar suas formas no espaço da cidade e
produzir determinado impacto visual, o que acaba por transformá-las em
pontos referenciais na paisagem urbana. As perguntas em relação a uma fase
e outra são: existem questões que sintetizem determinado modo de raciocínio
de Niemeyer em relação à implantação de seus edifícios? Quais seriam os
principais critérios que Niemeyer leva em conta na hora de implantar sua

6
Luís Recamán de Barros cita um importante depoimento de O. N. em que diz: “Acho que a gente não pode,
em um prédio moderno para uma cidade moderna, imaginá-lo em relação ao que há em volta. É muito
complicado. Cada arquiteto quer dar o seu show, e as cidades são confusas (...). Nenhum prédio em são Paulo
foi feito com a liberdade que deveria ser. Tem o ambiente, tem as coisas em volta... Ele sofre isso tudo, e ele
ainda aumenta às vezes a confusão... A arquitetura urbana é muito difícil”. E continua adiante: “Eu gosto de
fazer outro tipo de edifício. Eu acho que as cidades deveriam ser multiplicadas e não deveriam crescer
exatamente. Uma vez eu estudei uma cidade para o Nordeste, eu previa isso. É uma cidade para cem mil
habitantes, mas quando ela estivesse completa fazia-se outra cidade, deixando o espaço livre, vegetação. Era
outra coisa. Ela surgiria sucedendo assim linearmente, criando um grande conjunto, que seria uma série de
cidades se multiplicando”. Niemeyer, O. (Arquitetura e Vida: 36), apud DUDEQUE, 2008, p. 31.

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arquitetura? Quais são, afinal, os modos de relação do arquiteto com o
espaço urbano?7
4. Uma vez que a produção de Oscar Niemeyer se desenvolve ao longo de um
período de mais de setenta anos, a análise das relações edifício/cidade
precisa ser discutida também a partir dos desdobramentos teóricos e dos
rumos do debate sobre o espaço urbano, discussões que acontecem durante
esse período. Dentro disso, uma das principais perguntas seria: Niemeyer
acompanha o debate relativo à revisão dos pressupostos do Urbanismo
Modernista? Repensa o Plano Moderno?
5. Finalmente, um último aspecto é verificar certa sensibilidade discutida por E.
Dias Comas e também apontada por mim em análises anteriores. Trata-se de
referências de algumas obras de Niemeyer a determinados aspectos do lugar
onde se implantam; exemplos disso são o projeto para o auditório anexo ao
MESP (Rio de Janeiro, ), o qual, próximo ao mar, lembra uma concha
marinha; colunas que lembram galhos de árvore no Parque Ibirapuera; os
auditórios que estabelecem determinada semelhança com os cascos dos
barcos da Baía do Comércio (Le Havre, ), etc.

Como base teórica para a pesquisa, pretendo recorrer, primeiramente, às


inúmeras análises e leituras produzidas sobre a obra de Niemeyer e que incluem
algumas das já citadas neste texto, trabalhos referenciais sobre o Urbanismo
Modernista e sobre sua revisão a partir de meados do século XX (Françoise Choay,
José Lamas, Collin Rowe, entre outros) e, finalmente, discussões sobre a questão
do lugar na Arte e na Arquitetura (Aldo Rossi, Norberg-Schulz, Marc-Augé, Alberto
Tassinari, Rosalind Krauss, entre outros).
Acredito que, se bem sucedida, a contribuição da pesquisa será uma melhor
compreensão das convicções urbanísticas de Niemeyer, um melhor entendimento
dos modos como efetivamente enfrentou o problema da implantação de seus
edifícios na cidade real e, também, uma melhor compreensão da forma como

7
A despeito de sua orientação refratária ao problema da inserção do edifício/cidade tanto no período pré
quanto pós-Brasília, talvez se possa afirmar que Niemeyer efetivamente dialoga com os espaços urbanos pré-
existentes, sendo que, na fase pós-Brasília, a força de seus projetos parece decorrer muitas vezes do contraste
que estabelecem com o pré-estabelecido ou mesmo do caráter auto-referente de suas formas. Haveria uma
clara intenção em contrastar suas formas com o espaço urbano, de modo a destacá-las na paisagem da cidade?

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acompanhou o debate sobre a revisão de alguns pressupostos do Urbanismo
Modernista.
No que concerne especificamente ao debate urbanístico contemporâneo e às
expectativas hoje discutidas sobre a inserção do edifício na malha urbana, alguns
tópicos serão utilizados na análise das propostas de Niemeyer. Entre esses tópicos
incluem-se: o problema da revitalização dos espaços urbanos, a necessidade de
requalificação dos ambientes deteriorados, a premência de fazer do edifício ou dos
conjuntos construídos não um enclave urbano mas algo que possa reforçar
conexões, fluxos e vivências, e que também possa levar em conta os elementos pré-
existentes, a história e a memória coletiva; a necessidade de fazer com que tanto os
novos edifícios quanto os novos setores urbanos possam gerar espaços que não
sejam os da segregação mas os do contato, da troca e da vivência coletiva; a
preocupação urbana em conferir identidade aos lugares construídos; o desejo
contemporâneo de produzir espaços a partir de idéia de Desenho Urbano e que
tenham, dentro disso, qualidade visual e plástica; e, finalmente, a necessidade de
projetar espaços que revelem determinado equilíbrio entre áreas verdes e áreas
edificadas e que impliquem boas condições de conforto ambiental.
Como observado anteriormente, no que concerne a esses aspectos, acredito que
a análise da obra de Oscar Niemeyer revelará tanto os méritos quanto os limites da
produção do arquiteto.

RESULTADOS ESPERADOS
Como hipótese inicial, diria que a consideração da relação edifício/cidade a partir
dos aspectos anunciados terá como conseqüência:
1. Valorizar a preocupação de Oscar Niemeyer com a questão do Desenho
Urbano, algo que constitui, aliás, uma das questões importantes do debate
contemporâneo;
2. Colocar em foco sua defesa em relação às questões ambientais,
especificamente sua defesa em relação à presença do verde na área urbana,
a necessidade da existência de mais praças e parques, a importância da boa
ventilação e insolação;

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3. Destacar sua contribuição para a construção de espaços livres urbanos, os
quais o arquiteto esperava que se tornassem espaços de encontro e de
vivência na cidade;
4. Sublinhar sua capacidade de criar lugares marcantes, de forte identidade e
que freqüentemente vão se transformando em referências visuais no espaço
urbano;
5. Reconhecer a sensibilidade demonstrada por Niemeyer muitas vezes ao
incorporar à arquitetura aspectos da paisagem local;
6. E, finalmente, problematizar determinadas inserções de O. N., as quais, a
despeito de considerar determinadas conexões com a malha urbana,
ressentem-se muitas vezes da provisão de equipamentos que possam
garantir a vitalidade e o uso mais intensivo dos espaços criados, e que
também, outras vezes, carecem de uma conexão mais direta com o entorno
imediato.8
O trabalho será organizado em forma de texto e deverá estar concluído até
outubro de 2014. Está sendo viabilizado através do Programa de Aperfeiçoamento
Docente da Universidade Federal de Uberlândia, que possibilitou Afastamento
Remunerado para cursar Pós-Doutorado.

Bibliografia
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1993.
BARROS, Luís Recamán de – Oscar Niemeyer: Forma Arquitetônica e Cidade no
Brasil Moderno. Tese de Doutorado. São Paulo: FFLCH/ USP.
2002.
BARROS, Luís Recamán de – Por uma Arquitetura, Brasileira. Dissertação de
Mestrado. São Paulo: FFLCH/ USP. 1996.
BORDA, Luis Eduardo – O Nexo da Forma. Oscar Niemeyer: da Arte Moderna ao
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BRUAND, Yves – Arquitetura Contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva.
1981.
CANTON, Kátia – Espaço e Lugar. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

8
Considero que seja o caso do Memorial da América Latina, por exemplo, e do Teatro Municipal de Uberlândia.

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CHOAY, Françoise – O Urbanismo. Utopias e Realidades. Uma Antologia. São
Paulo: Perspectiva, 2000.
COMAS, Carlos Eduardo Dias – Protótipo e Monumento, Um Ministério, O Ministério.
In: Revista Projeto nº 102. São Paulo: Arco Editorial Ltda, 1987.
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DUDEQUE, Marco César - O Lugar na Obra de Oscar Niemeyer. Tese de
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2009.
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