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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE - UERN

Pró-Reitoria de Ensino de Graduação – PROEG


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Execução Penal
Prof Romero Marinho

3
01. A individualização da pena e a classificação do condenado. 02.
Comissão Técnica de Classificação (arts. 5.º e 9.º da LEP). 03.
Exame criminológico. 04. Identificação do Perfil Genético

01. A individualização da pena e a classificação do condenado


a) Breve Histórico
O princípio constitucional da individualização das penas passou por diversas
modificações durante os séculos, estando sempre associado à ideia de humanização das
penas e a sua proporcionalidade, até alcançar o status de direito fundamental do
acusado, como conhecido atualmente, e teve como marco filosófico a grande
contribuição do pensamento iluminista.
Posteriormente, esses ideais de humanização da pena foram lançados como
direito fundamental do homem inserido na Declaração Universal dos Direitos do
Homem e do Cidadão de 1789, no seu artigo 15, no qual asseverava que “as penas
devem ser proporcionais ao delito e úteis à sociedade”1, e posteriormente nas diversas
Cartas Constitucionais dos países ocidentais, assegurando como garantia do acusado.
Após a Segunda Guerra Mundial, a Declaração Universal dos Direitos do
Homem de 1948 consagra mais uma vez através de tratados internacionais o sentido de
humanização das penas, sob o manto do direito à dignidade humana. Declara que
“ninguém pode ser submetida à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano
ou degradante”, tendo “toda pessoa o direito à vida, à liberdade e à segurança
pessoal.”
A Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824
previa, em seu artigo 179: “A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos
Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a
propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte”.
Especificando no seu inciso XX que: “nenhuma pena passará da pessoa do
delinquente. Por tanto não haverá em caso algum confiscação de bens, nem a infamia
do Réo se transmittirá aos parentes em qualquer gráo, que seja”.

1
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte geral. 16. ed. v. 1. São Paulo:
Saraiva, 2011.p. 54.
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No inciso XII encontrávamos a seguinte previsão: “As Cadêas serão
seguras, limpas, o bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos Réos,
conforme suas circunstâncias, e natureza dos seus crimes”, demonstrando desde então,
a intenção do legislador em buscar adequar as penas de acordo com as condições
particulares do condenado no cumprimento da penalidade2.
Fincou-se no ordenamento jurídico brasileiro o primeiro resquício do
princípio da personalidade da pena, sendo repetida pelas Constituições de 1891 e 1934.
A Constituição de 1937 não contemplou o princípio.
No texto constitucional de 1946, tem-se o retorno desses princípios, estando
dispostos no artigo 141 (“A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a
segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: [...]”), no parágrafo 29, que
“a lei penal regulará a individualização da pena e só retroagirá quando beneficiar o
réu,” e, no seu parágrafo 30, que “nenhuma pena passará da pessoa do delinqüente”.
Mister ressaltar é que pela primeira vez o princípio da individualização da pena estava
descrito de forma expressa.
O texto constitucional de 1988 em seu artigo 5.º, inciso XLV, abarcou o
princípio da personalidade da pena, dispondo que “nenhuma pena passará da pessoa do
condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de
bens serem, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o
limite do valor do patrimônio transferido”.
Fato interessante é a junção do preceito da reparação do dano na esfera civil
juntamente com o obstáculo à transcendência da pena na esfera penal, sendo que o
inciso XLVI determina que “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre
outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa;
d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos”, indicando,
assim, quais são as possíveis penas a serem destinadas aos condenados.
E mais uma vez individualizando a pena em relação à conduta do apenado
quando da previsão no inciso XLVIII dispondo que “a pena será cumprida em
estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do
apenado”, assegurando no inciso XLIX, o respeito à integridade física e moral dos
presos.
b) Conceito
O princípio da individualização da pena veio ganhando cada vez mais
importância, esboçando “uma modulação que se refere ao próprio infrator, a sua
natureza, a seu modo de vida e de pensar, a seu passado, a ‘qualidade’ e não mais a
intenção de sua vontade”3.
Individualizar significa tornar individual uma situação, algo ou alguém,
quer dizer particularizar o que antes era genérico, tem o prisma de especializar o geral,

2
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte
geral. 9. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. 1 v. p. 194.
3
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 29. ed.
Petrópolis: Editora Vozes, 2004. p. 53.
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enfim, possui o enfoque de, evitando a estandardização, distinguir algo ou alguém,
dentro de um contexto.
O art. 5.º, XLVI, da Constituição Federal é taxativo ao determinar que “a lei
regulará a individualização da pena...”
Individualização da pena tem o significado de eleger a justa e adequada
sanção penal quanto ao montante, ao perfil e aos efeitos pendentes sobre o sentenciado,
tornando-o único e distinto dos demais infratores, ainda que coautores ou mesmo
corréus.
Evita-se uma mecanização no momento da previsão, aplicação e execução
da pena, tornando o subjetivismo, tanto do legislador, como do magistrado de suma
importância.
Nelson HUNGRIA, citado por Luiz LUISI4 descreve de forma clara o que
vem a ser o princípio da individualização: “retribuir o mal concreto do crime, com o
mal concreto da pena, na concreta personalidade do criminoso”.
De acordo com o que ensina Luiz Regis PRADO5:
“O princípio da individualização da pena, conforme a cominação legal
(espécie e quantidade) e a determinar a forma da sua execução. [...] Em
suma, a pena deve estar proporcionada ou adequada à magnitude da lesão
ao bem jurídico representada pelo delito e a medida de segurança à
periculosidade criminal do agente”.
Carmen Silvia de Moraes BARROS6 esclarece que:
“A individualização da pena no processo de conhecimento visa aferir e
quantificar a culpa exteriorizada no fato passado. A individualização no
processo de execução visa propiciar oportunidade para o livre
desenvolvimento presente e efetivar a mínima dessocialização possível. Daí
caber à autoridade judicial adequar a pena às condições pessoais do
sentenciado”.
Como diz José Antonio Paganella BOSCHI7, o princípio da
individualização da pena:
“Visa a resguardar o valor do indivíduo – precisa ser juridicamente
considerado. A atitude implica reposicionamento do intérprete e do
aplicador da lei penal perante o caso concreto e seu autor, vedadas as
abstrações e as generalizações que ignoram o que o homem tem de
particular.”
Receberá o tratamento penitenciário adequado, atendendo também ao
princípio da individualização da pena e da medida de segurança.
4
LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. 2. ed. rev. e aum. Porto alegre: Fabris Editor, 2002. p.
52.
5
PRADO, Luis Regis. Curso de Direito penal – parte geral. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT,
2008. p. 139.
6
Apud MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 10. ed. rev., ampl. e atual. de acordo com as Leis n.
12.403/2011 (prisões cautelares, liberdade provisória e medidas cautelares restritivas ) e 12.433/2011
(remição da pena) – São Paulo : Saraiva, 2012. p. 42.
7
BOSCHI, José Antonio Paganella. Das penas e seus critérios de aplicação. p. 47.
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Há basicamente quatro modos de se individualizar a pena:
a) pena determinada em lei, sem margem de escolha ao juiz;
b) pena totalmente indeterminada, permitindo ao juiz fixar o quantum que
lhe aprouver;
c) pena relativamente indeterminada, por vezes fixando somente o máximo,
mas sem estabelecimento do mínimo, bem como quando se prevê mínimos e
máximos flexíveis, adaptados ao condenado conforme sua própria atuação
durante a execução penal;
d) pena estabelecida em lei dentro de margens mínima e máxima, cabendo
ao magistrado eleger o seu quantum. Este último é, sem dúvida, o mais
adotado e bem afeiçoado ao Estado Democrático de Direito.
A individualização da pena desenvolve-se em três etapas distintas:
Individualização legislativa. Primeiramente, cabe ao legislador fixar, no
momento de elaboração do tipo penal incriminador, as penas mínima e
máxima, suficientes e necessárias para a reprovação e prevenção do crime.
Individualização judiciária. Dentro dessa faixa, quando se der a prática
da infração penal e sua apuração, atua o juiz, elegendo o montante concreto
ao condenado, em todos os seus prismas e efeitos.
Individualização executória. Finalmente, cabe ao magistrado responsável
pela execução penal determinar o cumprimento individualizado da sanção
aplicada que se protrai em toda sua durante. Ainda que dois ou mais réus,
coautores de uma infração penal, recebam a mesma pena, o progresso na
execução pode ocorrer de maneira diferenciada. Enquanto um deles pode
obter a progressão do regime fechado ao semiaberto em menor tempo, outro
pode ser levado a aguardar maior período para obter o mesmo benefício,
pois se buscar sempre o regime mais adequado, com base em avaliações
técnicas. Assim também ocorre com a aplicação de outros instrumentos,
como, exemplificando, o livramento condicional ou o indulto coletivo ou
individual.
Sintetiza de forma clara Cezar Roberto BITENCOURT8, esses três
momentos individualizadores:
“Individualização legislativa – processo através do qual são selecionados
os fatos puníveis e cominadas as sanções respectivas, estabelecendo seus
limites e critérios de fixação da pena; individualização judicial – elaborada
pelo juiz na sentença, é a atividade que concretiza a individualização
legislativa que cominou abstratamente as sanções penais, e, finalmente, a
individualização executória, que ocorre no momento mais dramático da
sanção criminal, que é o seu cumprimento.”

8
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit.
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Vale destacar, derradeiramente, o ensinamento de Carmen Salinero
ALONSO9:
“Os três estágios na concreção e individualização penal, ainda que
diversos, estão presididos e mediatizados pela finalidade que se persiga
com a imposição da pena. Desse modo, dependendo de quais sejam os fins
que se atribuam à pena nos três momentos – cominação, imposição e
execução da pena – a determinação da mesma variará de forma
substancial. Isso evidencia que o pressuposto prévio para o sistema e para
o conteúdo da determinação da pena é a postura que se mantenha a
respeito dos fins da pena, porque somente a partir desse prévio
posicionamento poder-se-á desenhar o modelo de determinação penal”.
c) Correlação da individualização com outros princípios aplicáveis à pena
I. Princípio da legalidade. Estabelece o art. 5.º, XXXIX, da Constituição
Federal, que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia
cominação legal”.
Logo, para a individualização da pena dar-se de maneira legítima, é
indispensável haver pena cominada em lei de antemão, bem como sejam previstos,
expressamente, todos os critérios orientadores para a sua quantificação e execução.
Na relação entre individualização e legalidade, esclarece Anabela Miranda
RODRIGUES10:
“O que em regra se passa é que o juiz é chamado a determinar a pena em
uma medida compreendida entre um máximo e um mínimo predeterminado
na lei, no singular preceito incriminador. Solução que, se por um lado,
como se viu, satisfaz as atuais exigências do princípio da legalidade da
pena, por outro lado garante as exigências de individualização, numa
confluência de interesses a que não é estranha a relativização que sofreram
os postulados básicos das Escolas clássica e positiva, inspiradores de
concepções extremas.”
E complementam MARINUCCI e DOLCINI11 dizendo que o ponto de
equilíbrio entre os princípios da legalidade e da individualização da pena reside na
predeterminação legal, para cada figura de infração penal, de uma moldura de pena, ou
seja, um mínimo e um máximo, dentro do qual o juiz deve escolher a pena adequada ao
caso concreto.
II. Princípio da isonomia. Os seres humanos são naturalmente desiguais,
precisando a norma tratar de maneira peculiar cada destas desigualdades. Por isso, a
quem mata destina o legislador, de modo isonômico, um montante variável de pena,
devendo o magistrado atender aos fins sociais a que a norma se dirige e ao bem comum
(art. 5.° da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro).

9
ALONSO, Carmen Salinero. Teoría general de las circunstancias modificativas de la responsabilidad
criminal y artículo 66 del Código Penal, p. 136.
10
RODRIGUES, Anabela Miranda. A determinação da medida da pena privativa de liberdade, p. 60-61.
11
MARINUCCI e DOLCINI. Corso di diritto penale, v. I, p. 220.
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Afirma Sidio Rosa de MESQUITA JUNIOR12 que:
“O princípio da individualização da pena decorre do princípio da isonomia,
eis que este traduz a idéia de que os desiguais devem ser tratados
distintamente, isso na medida de suas diferenças”.
Guilherme de Souza NUCCI13 destaca como princípio constitucional
explícito e afirma que a “pena não deve ser padronizada, cabendo a cada delinquente a
exata medida punitiva” como retribuição da conduta praticada. Pois, não teria qualquer:
“Sentido igualar os desiguais, sabendo-se, por certo, que a prática de
idêntica figura típica não é suficiente para nivelar os seres humanos. Assim,
o justo é fixar a pena de maneira individualizada, seguindo-se os
parâmetros legais, mas estabelecendo a cada um, o que lhe é devido”.
Cumpre citar que, logo em seguida no texto constitucional, no art. 5.º,
XLVIII, está disposto que: “A pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de
acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”, mostrando assim que a
pena deve estar moldada às condições pessoais do condenado, bem como à magnitude
da sua culpabilidade.
III. Princípio da Proporcionalidade. Sustentando-se na adequada posição de
intervenção mínima, este princípio exige tanto do ordenamento, como do operador que
as penas não sejam, exageradas para determinados delitos considerados de menor
importância, bem como estipular sanções ínfimas para aqueles que visam à proteção de
bens jurídicos considerados de vital relevo.
Muito à frente do seu tempo, BECCARIA14 já discorria sobre “as penas, e
na maneira de aplicá-las proporcionalmente aos delitos”, é importante “escolher os
meios que devem causar no espírito público a impressão mais eficaz e mais durável, e,
ao mesmo tempo, menos cruel no corpo do culpado”.
A proporcionalidade significa que “as penas devem ser harmônicas com a
gravidade da infração cometida, não tendo cabimento o exagero, nem tampouco a
extrema liberalidade na cominação das penas nos tipos penais incriminadores”15.
IV. Princípios da responsabilidade pessoal e da culpabilidade. ‘A pena não
passará da pessoa do delinquente’ é a regra constitucional estabelecida no art. 5.º, XLV
da CF. Assim, a individualização da pena tem por finalidade dar concretude ao princípio
de que a responsabilidade penal é sempre pessoal, jamais transcendendo a pessoa do
criminoso. E quanto a este, deve a sanção ser aplicada na justa e merecida medida.
V. Princípio da humanidade. A individualização da pena encontra vínculo
com o princípio da humanidade, especialmente no que concerne à individualização
executória da sanção penal, pois não é segredo serem as condições carcerárias no Brasil,
em grande parte, deixadas ao abandono, gerando estabelecimentos infectos e lotados,
sem qualquer salubridade, o que, na prática, não deixa de se configurar autêntica

12
MESQUITA JR., Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática: doutrina, jurisprudência, modelos.
4. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 31.
13
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral. 6. ed. rev. ampl. atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009. pp. 79-80.
14
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. p. 85.
15
NUCCI, Guilherme de Souza. Ob cit. p. 83.
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crueldade. Cabe, pois, ao juiz da execução penal zelar para se fazer o cumprimento da
pena de modo humanizado, podando os excessos causados pelas indevidas medidas
tomadas por ocupantes de cargos no Poder Executivo, cuja atribuição é a construção e
administração dos presídios.
Torna-se adequado aplicar o que há muito se prega para a civilização das
condições carcerárias, seguindo-se aquilo que não é inédito em Direito Penal, como se
constata na lição de Michel FOUCAULT16 e suas sete máximas das boas condições de
um presídio:
a) princípio da correlação: a finalidade primordial da condenação é a
transformação do comportamento do indivíduo;
b) princípio da classificação: detentos devem ficar isolados ou, pelo menos,
divididos conforme a gravidade do delito que tenham cometido, mas também quanto à
sua idade, suas particulares disposições, bem como quanto às técnicas de correção que
cada um mereça;
c) princípio da modulação das penas: necessita-se assegurar que, durante a
execução, haja adaptação do sistema punitivo, conforme os resultados obtidos –
positivos ou negativos;
d) princípio do trabalho como obrigação e como direito: ao preso deve ser,
sempre, proporcionada oportunidade de trabalho e é seu dever trabalhar para
fundamentar seu processo de recuperação;
e) princípio da educação penitenciária: a educação do detento é dever do
Poder Público, no interesse direto da sociedade;
f) princípio do controle técnico da detenção: o Estado deve garantir, nos
presídios, a atuação de pessoal preparado, com capacidade moral e técnica para zelar
pela boa formação do preso;
g) princípio das instituições anexas: além do encarceramento, o Estado deve
assegurar o acompanhamento de medidas de controle e assistência até que a readaptação
definitiva possa ocorrer.
E arremata o autor: “palavra por palavra, de um século a outro, as mesmas
proposições fundamentais se repetem”.
d) Descompassos da lei e da realidade
A Lei de Execuções Penais seria um “sonho constitucional” se não fosse a
realidade prática. Isso porque, a situação caótica em que se encontra o sistema
penitenciário brasileiro vem sendo agravada pelo Estado que não realiza investimentos
na implementação da Lei de Execução Penal.
No entanto, justifica a sua omissão sob o argumento de que a solução para a
criminalidade deve ser encarada com o aumento da punição e com sanções mais
severas. Tal discurso é apoiado pela população em geral, que além de desconhecer o
direito e a sua razão de punir, baseia suas conclusões em um raciocínio vingativo,
compreensível para a vítima, mas não para o Estado, que deve pautar-se pela
racionalidade nas suas atividades.

16
FOUCAULT, Michel. Ob. cit., p. 224-225.
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Nesse contexto, é importante ressaltar ainda que “qualquer solução adotada
na esfera legislativa passa, necessariamente, pelas mãos do Poder Executivo, que
precisa liberar verbas para implementação de inúmeros programas de prevenção,
punição e recuperação de criminosos”17.
Com isso, nada adiantaria a modificação legislativa para implementação de
políticas públicas mais eficientes de recuperação do preso, se o Poder Executivo não
disponibiliza verbas necessárias para sua concretização. Na realidade, o que se verifica é
o tratamento indiscriminado e generalizado dos condenados pela prática de crimes sem
qualquer distinção ou individualização da pena, servindo o sistema de verdadeira escola
da criminalidade.
BITENCOURT18 criticando o Poder Executivo afirma que: “ao invés do
governo melhorar a sua política penitenciária, para adequar-se aos preceitos legais,
muito deles inclusive insculpidos na própria Carta Magna, adota a posição inversa”:
“Já que não pode ou não quer atender a tais mandamentos, simplifica tudo:
não mudar a política penitenciária para atender às previsões da Lei de
Execuções Penais, mas muda a referida lei – piorando-a, isto é, suprimindo
aqueles preceitos que já vinha descumprindo – para, assim, adequá-la a sua
péssima administração penitenciária, caótica, desumana e altamente
criminógena, ou seja, uma verdadeira fábrica produtora de delinqüentes”.
Tal procedimento, além de impossibilitar o fornecimento de um tratamento
humano e recuperador para os condenados, estimula a barbárie que o Estado é obrigado
a combater, facilita a execução de delitos, alimenta a criminalidade, pois, cria o
ambiente propício para a prática de ilícitos penais a partir do sistema carcerário.
Para a solução da problemática, o poder público segue os ideais de um
direito penal máximo, ou seja, de um modelo do direito penal caracterizado pela
excessiva severidade, pela incerteza e imprevisibilidade de suas condenações e penas.
02. Comissão Técnica de Classificação (arts. 5.º e 9.º da LEP)
A Comissão Técnica de Classificação, instituto trazido pela Lei de
Execução Penal, em seus artigos 5.º ao 9.º, consiste em uma equipe multidisciplinar
com competência para analisar o preso quando de seu ingresso no sistema penitenciário,
elaborar diagnósticos que viabilizem sua ressocialização e reintegração social através do
programa individualizador da pena.
As Comissões Técnicas de Classificação possuem um importante papel na
individualização da pena. Para melhor entendê-la, importa destacar um breve
antecedente de seu papel nas palavras de ALBERGARIA19:
“Os antecedentes da CTC encontram-se nos laboratórios de antropologia
penitenciária [...]. Garcia Ramirez põe destaque a correlação entre o CTC
e o laboratório de antropologia criminal: ‘Com o estudo pormenorizado de
casos e a execução de tratamentos, estes Conselhos são os herdeiros
legítimos dos interesses e das tarefas que abriram a porta ao

17
NUCCI, Guilherme de Souza. Ob. cit. p. 383.
18
BITENCOURT, Cezar Roberto. Ob. cit. p. 543.
19
ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execução penal. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p.
269-270.
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penitenciarismo contemporâneo; efetivamente, descendem em linha reta dos
laboratórios de antropologia criminal, com o que os criminólogos encerram
a época humanitária e iniciaram a idade científica da execução das penas
privativas da liberdade”.
De acordo com o art. 6º da LEP, alterado pela Lei n.° 10.792/2003, a
classificação (análise dos antecedentes e da personalidade) “será feita por Comissão
Técnica de Classificação que elaborará o programa individualizador da pena privativa
de liberdade adequada ao condenado ou preso provisório”, podendo especificar:
o tipo de trabalho adequado ao preso;
se este poderá estudar;
se deverá participar de terapia ocupacional;
se terá acompanhamento psicológico ou terapia individual ou em grupo;
necessidades de acompanhamento com assistência social em relação ao
preso e seus familiares;
se há necessidade de acompanhamento psiquiátrico; quais as atividades
de lazer indicadas;
a forma como se dará a efetivação de todas essas necessidades e qual o
presídio indicado para tanto, tudo com o intuito de possibilitar a adequação
da pena à realidade do condenado.
Cabe à Comissão Técnica de Classificação elaborar o parecer inicial acerca
do cumprimento da pena, enfatizando fatores relacionados à personalidade do
condenado e seus antecedentes (art. 5º da LEP), bem como aspectos sociais e familiares,
capacidade laborativa, entre outros destinados a orientar a forma como deve o indivíduo
cumprir sua pena no estabelecimento penitenciário.
Nesse sentido também determina o art. 34 da Lei n.° 7.209/1984:
“Art. 34. O condenado será submetido, no início do cumprimento de pena, a
exame criminológico de classificação para individualização da execução”.
O exame, como preleciona SÁ, deve ser realizado única e exclusivamente
em benefício do preso. De posse desses dados, a Comissão Técnica de Classificação,
órgão responsável pelo planejamento da individualização da pena, segundo determina o
artigo 6º da LEP, iniciará a fase de definição do perfil do condenado, isto é, a análise de
seu comportamento e características, como pessoa e não como criminoso.
Essa fase de estudo da personalidade do indivíduo que está adentrando ao
sistema carcerário é de suma relevância, posto que viabiliza o acompanhamento e a
preparação deste para o retorno ao convívio social de forma mais eficaz.
Despertara-se para a necessidade dos profissionais em criminologia nos
núcleos penitenciários, para contribuição e resultados positivos nos procedimentos de
classificação e consequentemente nos processos de reintegração dos apenados.

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Quanto ao assunto MIRABETE20 lembra que:
“O procedimento de classificação utiliza-se de métodos científicos de
personalidade, que visam à observação do comportamento, compreendendo
toda a percepção do condenado em relação a outras pessoas, possibilitando
a aplicação de testes, entre outros, “tudo com o sentido de tornar bem
conhecida a individualidade do sentenciado e conferir-lhe o tratamento
adequando, no presídio mais adequado”.
Para haver a classificação, há também a necessidade de um procedimento
que busque deliberar o tipo de programa individualizador de execução a que deva ser
submetido o encarcerado, que aliás, pode ser tomada no próprio estabelecimento
prisional.
Com o advento da Lei n.° 10.792, de 1.º de dezembro de 2003, que, entre
outras providências, modificou pontualmente a Lei de Execução Penal, as atividades das
Comissões Técnicas de Classificação foram mitigadas se comparadas àquelas previstas
na redação original do art. 6.º da Lei de Execução, onde se assegurava, além do que hoje
se tem previsto, que às Comissões Técnicas de Classificação também competia
acompanhar a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direitos,
devendo propor à autoridade competente as progressões e regressões dos regimes, bem
como as conversões. A modificação introduzida restringiu consideravelmente o rol das
atividades das Comissões.
A respeito dessa supressão legislativa, NUCCI21, perfaz severa crítica:
“Não se pode obrigar o magistrado, como se pretendeu com a edição da
Lei 10.792/2003, a conceder ou negar benefícios penais somente com a
apresentação do frágil atestado de conduta carcerária. [...] Se os pareceres
e os exames eram padronizados em alguns casos, não significa que não
mereçam aperfeiçoamento. Sua extinção em nada contribuirá para a
riqueza do processo de individualização da pena ao longo da execução. E
mais: se os pareceres da Comissão Técnica de Classificação eram tão
imprestáveis para a progressão, deveriam ter a mesma avaliação para a
inicialização da execução penal. Ora, quem padroniza para a progressão,
pode perfeitamente padronizar para o início do cumprimento da pena. A
mantença da Comissão para avaliar o condenado no começo da execução,
mas a sua abolição para o acompanhamento do preso, durante a execução,
é um golpe (inconstitucional) ao princípio da individualização da pena.”
Não obstante, o magistrado poderá fazer uso da assistência técnica da
Comissão Técnica de Classificação na análise da concessão de benefícios. Esse é o
entendimento do Supremo Tribunal Federal22, in verbis:
“4. A Lei n. 10.792/03 alterou a redação do dispositivo supratranscrito,
suprimindo a exigência daquele exame, verbis: “Art. 112. A pena privativa
de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência
para regime menos rigoroso, a ser determinado pelo juiz, quando o preso
20
MIRABETE, Julio Fabbrini. Código penal interpretado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 52.
21
NUCCI, Guilherme de Sousa. Individualização da pena. 6. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro:
Forense, 2014. p. 410.
22
STF, HC 103070-SP, Primeira Turma, Rel. Min. LUIZ FUX, julg. 14/06/2011, DJe 29/07/2011.
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tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar
bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do
estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão”. 5. A Lei
n. 10.792/03, não obstante tenha silenciado a respeito da obrigatoriedade
do exame criminológico, é lícito ao juízo da execução, fundamentadamente,
determinar sua realização (Precedentes: HC n. 105.234/RS, Relatora a
Ministra Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJ de 21.3.11; HC n. 106.477/RS,
Relator o Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, DJ de 19.4.11; HC n.
102.859/SP, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJ de
1º.02.10). 6. O requisito subjetivo da progressão não está restrito ao “bom
comportamento carcerário”, como faz parecer a literalidade da lei, mas,
antes requer analisar as características psicológicas, a probabilidade da
adaptação do condenado ao regime menos rigoroso e a progressiva
capacidade de reinserção social, entre outros fatores. 7. O exame
criminológico funda-se também no poder instrutório do juiz da novel
concepção de atividade judicial. 8. In casu, a decisão do que determinou a
realização do exame está fundamentada na ausência de elementos que
demonstrem que o paciente preenche o requisito subjetivo para obtenção do
benefício. Ordem indeferida.”
Mesmo que a alteração supra tenha revogado o exame criminológico e o
parecer da CTC na emissão de relatório quanto aos requisitos subjetivos do indivíduo
encarcerado, para fins de livramento condicional ou progressão de regime, esta não
alcançou os artigos 83, inciso III e parágrafo único do Código Penal e o artigo 131 da
LEP, que assim dispõem:
“Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a
pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:
III - comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena,
bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à
própria subsistência mediante trabalho honesto.
Parágrafo único - Para o condenado por crime doloso, cometido com
violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará
também subordinada à constatação de condições pessoais que façam
presumir que o liberado não voltará a delinqüir.”
“Art. 131. O livramento condicional poderá ser concedido pelo Juiz da
execução, presentes os requisitos do artigo 83, incisos e parágrafo único,
do Código Penal, ouvidos o Ministério Público e Conselho Penitenciário.”
Tal análise satisfaz a exigência constitucional da individualização da pena,
evitando que fique o juiz engessado na sua decisão à simples verificação do implemento
do tempo mínimo para a concessão do benefício pretendido e a atestado de boa conduta
que, na prática, nem sempre espelha a situação real do condenado.
Segundo SÁ23, o parecer da CTC “emana de todo um trabalho prévio da
Comissão, que implica engajamento na dinâmica da instituição, enfoca a resposta do

23
SÁ, Alvino Augusto de. A recuperação dos sentenciados e a questão do exame criminológico versus
parecer das comissões técnicas de classificação. In IBCCrim, São Paulo, v. 13, p. 203 a 217,
jan/mar.1998.
59
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preso à terapêutica penal, não é perícia, diferindo fundamentalmente do exame
criminológico”.
O parecer da Comissão Técnica de Classificação se difere do exame
criminológico quanto à sua natureza, tendo em vista o parecer não se tratar de perícia,
em um determinado ponto da execução, mas sim da captação e da organização de dados
que lhe permita propor o programa individualizador da pena e avaliar a resposta do
preso a esse programa.
SÁ24 explica:
“Descarta-se, portanto qualquer idéia de perícia no parecer das CTC.
Seria tecnicamente inviável e eticamente inadmissível. Caso a autoridade
judicial queria informes pertinentes á avaliação da conduta criminosa, em
si, à persistência ou não dos fatores associados mesma, poderá requisitar
além do parecer, além do parecer da CTC, o exame criminológico,
consoante previsto no art. 112 da LEP. Diferem entre si, quanto á natureza,
exame criminológico e parecer da CTC. O primeiro organizando (e, não
raras vezes, afunilando) o informes sob a ótica da “nódoa” do crime na
conduta do condenado. O segundo, organizando os dados e informes na
busca de avaliar a qualidade da resposta do preso à terapêutica penal. O
que se observa, porém, é que os pareceres da CTC, na prática, convertem-
se em peça pericial, já que, afastada a CTC de suas verdadeiras funções
(conforme, de fato, mais comumente acontece), e incumbida indevidamente
de somente elaborar os tais pareceres, torna-se lógica e racionalmente
impossível que venha a elaborá-los consoante as especificações acima, pois
falta toda a “matéria-prima” com a qual elaborá-los: exame de
personalidade, classificação, elaboração dos programas
individualizadores, acompanhamento do preso, avaliações dos programas,
etc”.
Referindo-se ao trabalho da Comissão Técnica de Classificação, estabelece
o art. 9º da LEP que “a Comissão, no exame para a obtenção de dados reveladores da
personalidade, observando a ética profissional e tendo sempre presentes peças ou
informações do processo, poderá: I – entrevistar pessoas; II – requisitar, de repartições
ou estabelecimentos privados, dados e informações a respeito do condenado; III –
realizar outras diligências e exames necessários”.
A partir daí, depreende-se que os membros da Comissão Técnica de
Classificação devem buscar o maior número possível de subsídios a respeito do
examinado, o que pode ser feito por meio de entrevistas pessoais, requisição de
informações a respeito do condenado de repartições públicas ou estabelecimentos
privados e de quaisquer outras diligências ou perícias que se mostrarem pertinentes.
Evidentemente, a essas providências agrega-se a necessidade de exame dos autos da
ação penal e processo de execução criminal, além da observação do comportamento do
condenado durante fase executória, atentando-se, por exemplo, para seu envolvimento
frequente ou não na prática de intercorrências disciplinares.
O parágrafo único do art. 96 da Lei de Execução Penal estabelece a
possibilidade da realização de pesquisas criminológicas no interior das unidades
24
SÁ, Alvino Augusto de. Ob. cit.
60
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prisionais, com a finalidade de auferir características pessoais dos presos à contribuir
com o estudo da Criminologia. Quanto ao assunto, COSTA25 explica:
“Percorrendo a história da Criminologia, constatamos que a meta
essencial dos criminólogos tem sido a pesquisa no sentido de verificar se os
delinqüentes apresentam características particulares, e se são portadores
de quaisquer traços que os distingam dos indivíduos não delinqüentes. Esta
pesquisa foi desenvolvida por diversos caminhos: antropológico, biológico,
psiquiátrico, psicológico e social. O exame do conjunto do comportamento
do indivíduo e dos seus componentes biológicos, psiquiátricos, psicológicos
e sociais aproximam-se muito do exame clínico, eu deve ser
necessariamente dirigido por uma equipe que apresente múltiplos
conhecimentos. A observação criminológica conduz a uma classificação
etiológica.”
Composição da Comissão Técnica de Classificação (art. 7º da LEP)
A composição da Comissão Técnica de Classificação está vinculada à
natureza da pena executada, isto é, se privativa de liberdade ou restritiva de direitos.
Tratando-se da verificação das condições de cumprimento da pena do
indivíduo condenado a pena privativa de liberdade, a Comissão Técnica de
Classificação deve existir em cada estabelecimento penal, sendo presidida pelo
respectivo diretor e composta, no mínimo, por dois chefes de serviço, um psiquiatra, um
psicólogo e um assistente social. Essa composição, conforme assinala Júlio Fabbrini
MIRABETE, justifica-se na circunstância de que:
“O exame de personalidade e o exame criminológico, bem como todo o
processo de individualização do tratamento penitenciário, exigem postura
técnica e científica e, assim, funcionários aptos a realizarem os exames
clínicos, morfológicos, psiquiátricos, psicotécnicos, psicológicos, sociais
etc., para a síntese criminológica necessária aos informes e pareceres a
respeito da periculosidade e adaptabilidade do condenado, básicas para
uma correta classificação dos presos e ajustada individualização da pena”.
Sendo, porém, hipótese de pena restritiva de direitos, não exige a LEP o
mesmo rigor dispensado à avaliação dos condenados a prisão, referindo apenas que a
Comissão Técnica de Classificação atuará junto ao Juízo da Execução e será integrada
por fiscais do Serviço Social.
Classificação no Rio Grande do Norte
De acordo com a Portaria n.º 072/2011/GS-SEJUC/RN, que institui o
Regimento Interno Único dos Estabelecimentos Prisionais do Estado do Rio Grande do
Norte, traz o seguinte tratamento para classificação:
Art. 38 O preso que adentrar pela primeira vez na Unidade cumprirá um
período inicial considerado de adaptação e observação, nunca superior a
60 (sessenta) dias, durante o qual será observado seu comportamento pela
Comissão Técnica de Classificação.

25
COSTA, Álvaro Mayrink da. Exame criminológico. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 111-112.
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Art. 39 Nos (30) trinta primeiros dias do estágio de adaptação o preso não
poderá receber visitas de familiares e amigos, podendo somente receber seu
advogado ou Defensor Público.
Art. 40 Durante o período de adaptação o preso será classificado quanto ao
grau de periculosidade, comportamento e antecedentes.
A incomunicabilidade apregoada por esse diploma normativo não merece
guarita constitucional haja vista que se durante o estado de defesa, quando o governo
deve tomar medidas enérgicas para preservar a ordem pública ou a paz social;
ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades
de grandes proporções na natureza, podendo determinar medidas coercitivas,
destacando-se restrições aos direitos da reunião, ainda que exercida no seio das
associações, o sigilo da correspondência e o sigilo de comunicação telegráfica e
telefônica, havendo até prisão sem determinação judicial, tal como disciplinado no art.
136 da CF/88, a incomunicabilidade é vedada.
Se em situações de extrema conturbação social, como o estado de defesa, o
Poder Público não poderá deixar de nenhuma forma o preso incomunicável, não
poderão autoridades administrativas valer-se de expedientes normativos para faze-lo.
De acordo com o Regimento Único do RN, a composição e as atribuições da
Comissão Técnica de Classificação serão a seguinte:
Art. 26 A Comissão Técnica de Classificação, órgão colegiado, deverá ser
composta pelo(a) Diretor(a) do Estabelecimento, que a presidirá, dois
agentes penitenciários, com larga experiência no penitenciarismo, um
Psiquiatra, um Psicólogo, um Assistente Social, e tem por finalidade
aquilatar a personalidade do condenado, para determinar o tratamento
adequado, competindo-lhe:
I - Fixar o programa reeducativo;
II - Acompanhar a execução das penas privativas de liberdade;
III - Classificar o condenado segundo seus antecedentes e
personalidade, para orientar a individualização da execução penal;
IV - Propor as conversões e as regressões, bem como as progressões;
V - Informar, caso seja solicitado, através de parecer técnico, o perfil
criminológico do condenado para fins de benefício;
VI - Zelar pelo cumprimento dos deveres dos presidiários e assegurar
a proteção dos seus direitos, cuja suspensão ou restrição competirá a
Direção da Unidade ou ao Juiz das Execuções Criminais.
Art. 27 A Comissão Técnica de Classificação, para obtenção de dados
reveladores da personalidade dos presos, poderá:
I - Entrevistar pessoas;
II - Requisitar de órgãos públicos ou privados dados e informações
referentes ao preso;
III - Realizar outras diligências e exames.

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Gráfico

03. Exame criminológico


a) Breve histórico
Os pioneiros da criminologia reivindicavam a organização de um exame
médico-psicológico-social dos delinquentes, ou hodiernamente, apenados.
Historicamente, a necessidade desse exame foi afirmada pela primeira vez em 1890, no
Congresso Internacional Penitenciário de St. Petersburgo, por Lombroso26, em um
ambiente em que o cientifismo jurídico era posto à prova diante do positivismo. No
referido Congresso, foi apresenta suas bases para um exame criminológico para
determinar as causas inerentes aos criminosos, idéia que posteriormente foi validada e
reafirmada por Ferri e Garofalo27.
Rapidamente, o meio doutrinário jurídico absorveu a ideia, não só
fomentando cientificamente, como positivando nas legislações.

26
COSTA, Álvaro Mayrink da. Criminologia. Vol. 1 – Tomo 1. Rio de Janeiro. Forense, 1982. p. 47.
27
COSTA, Álvaro Mayrink da. Exame Criminológico, p. 115.
63
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Um evento relevante para o impulso normativo de um exame biopsicológico
foi o XII Congresso realizado pela falecida Comissão Internacional Penal e
Penitenciária, em 1950, em Haia, no qual se adotou a seguinte resolução: “na
organização moderna da justiça criminal, é altamente desejável, para servir de base ao
pronunciamento da pena e aos processos de tratamento penitenciário e de liberação,
dispor-se de um relatório prévio ao pronunciamento da sentença, objetivando não
somente as circunstâncias do crime, mas também os fatores relativos à constituição, à
personalidade, ao caráter e aos antecedentes sociais e culturais do delinquente”28.
É importante lembrar que no ciclo de Estudos de Bruxelas de 1951 tratou-se
especificamente do exame médico-psicológico e social do criminoso, e em suas
conclusões vinculava a elaboração do exame como algo voltado ao indivíduo que
cometia um crime, em seu benefício, para que pudesse adquirir uma readaptação social,
e por meio dela, a proteção social29.
Em 1952, o exame foi o tema do primeiro curso Internacional de
Criminologia oferecido pela Sociedade Internacional de Criminologia. O III Congresso
Internacional de Defesa Social de 1954 também tratou do assunto e em 1959 foi objeto
do ciclo de Estudos da Fundação Internacional Penal e Penitenciária.
A América Latina acabou sendo influenciada pelos estudos europeus. Duas
das obras que mais contribuíram para a difusão na América Latina das ideias de um
exame biológico ou psicopatológico e da diferença entre criminosos e não criminosos
foram a “Criminologia” de Edmund Mezger, de 1933 e traduzida ao espanhol em 1950,
e a “Biologia criminal”, de Franz Exner, de 1939 e traduzida ao espanhol em 1944.
No Brasil foi marcante a influência da escola positivista. Os vários
anteprojetos elaborados para o direito penitenciário tratavam de exame de
personalidade, estudos clínicos morfológicos, fisiológicos e neuropsiquiátricos; a
análise da inteligência, sentimentos, instintos, tendências e aptidões; e uma pesquisa do
ambiente familiar, vida pregressa, circunstâncias do fato cometido, grau de
conhecimentos, nível de cultura e formação religiosa.
Álvaro Mayrink da COSTA30 escreveu uma das únicas obras brasileiras
sobre o exame criminológico, na qual percebemos nitidamente a influência das
correntes que identificam características distintivas entre os criminosos:
“Todo homem nasce com uma constituição bio-psicológica determinada,
tornando-se mais importante estudar as tendências do que as estruturas,
porque são elas que determinam o equilíbrio social do indivíduo. Todavia, é
preciso igualmente levar em conta o dinamismo do meio, e através do meio,
da influência da situação sobre o desenvolvimento da personalidade. O
crime se produz porque um indivíduo, respondendo a caracteres biológicos
e psicológicos determinados, se encontra, num dado momento, colocado em
uma situação tal, que a execução deste crime se lhe afigura como um
resultado necessário ou inevitável, tanto seja determinante do crime ou

28
O Exame bio-psico-social na Justiça Penal, in: Revista Brasileira de Criminologia e Direito penal. nº
11, p. 123.
29
SILVEIRA, Alípio, O Exame bio-psico-social na Justiça Penal, in: Revista Brasileira de Criminologia e
Direito penal. nº 11, p. 122.
30
COSTA, Álvaro Mayrink. Exame criminológico, p. 33.
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exercendo apenas uma influência favorável, a situação será sempre um
fator fundamental.”
Em 1984, com a edição das Leis n.° 7.209 (nova parte geral do Código
Penal) e 7.210 (que regulamenta a Execução penal no país) é que o exame
criminológico surgiu como algo definitivo em nosso sistema normativo.
O exame criminológico não vive sem críticas mordazes. Alexis Couto de
31
BRITO se posiciona:
“Realmente chama a atenção como por um caminho curto e vacilante e ao
final do Século XX introduziu-se e se construiu as bases jurídicas de um
exame criminológico no Brasil, nítida e literalmente (lembrem-se da citação
de Di Tullio) com base em preceitos positivistas de meados do século XIX.
E, infelizmente, de sua previsão como algo, por vezes, necessário aos fins
da execução penal. A origem brasileira do exame não se afastou, ao
contrário, ratificou o pensamento lombrosiano, com pitadas dos conselhos
segregadores de Marc Ancel e sua defesa social, e das posturas
discriminatórias oferecidas pelo nacional-socialismo de Mezger e Exner.
Em nenhum momento dos projetos ou mesmo de suas exposições de motivos
há uma orientação de como o exame deverá ser feito e quais as técnicas
possíveis que poderiam ser adotadas para se chegar às conclusões
esperadas por tal exame, talvez porque sempre se soubesse que tais
conclusões fossem apenas especulações, ou mesmo um ato de fé no fato de
que a ciência pudesse dar causas tratáveis à criminalidade.”
b) Conceito
De acordo com o art. 8º da LEP:
“O condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime
fechado, será submetido a exame criminológico para a obtenção dos
elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à
individualização da execução”.
Dispõe o parágrafo único, por sua vez, que:
“Ao exame de que trata este artigo poderá ser submetido o condenado ao
cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto”.
Nas palavras de Jason ALBERGARIA32:
“O exame criminológico é a base do tratamento para se conseguir a
ressocialização. A Fundação Internacional Penitenciária indica os dois
objetivos fundamentais do exame criminológico, quais sejam, o
conhecimento da personalidade do delinquente e a preposição do
tratamento com vistas à reinserção social.”
O exame criminológico é realizado para o resguardo da defesa social, e
busca aferir o estado de temibilidade do delinquente.

31
BRITO, Aléxis Couto de. Análise crítica sobre o exame criminológico. in RASCOVSKI, Luiz (coord.).
Temas relevantes de Direito Penal e Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2012.
32
ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execução penal. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 259.
65
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Devemos reforçar que não se confundem o exame de classificação previsto
no art. 5º da LEP e o exame criminológico estabelecido pelo art. 8º.
O exame de classificação é amplo, apresentando a situação do condenado
de forma genérica, com ênfase em aspectos objetivos de sua personalidade,
antecedentes, aspectos sociais e familiares, capacidade laborativa, entre outros
destinados a orientar a forma como deve ele cumprir a pena no estabelecimento
penitenciário.
Já o exame criminológico é mais restrito, analisando questões de ordem
psicológica e psiquiátrica do condenado, visando revelar elementos como maturidade,
frustrações, vínculos afetivos, grau de agressividade e periculosidade e, a partir daí,
prognosticar a potencialidade de novas práticas criminosas.
O objeto do exame criminológico é, portanto, de apresentar ao juiz um
quadro da personalidade do autor da infração penal. A personalidade é o efeito de todas
as circunstâncias da vida, exprimindo-se em cada comportamento e ato criminoso.
Segundo PITOMBO33, o exame criminológico é composto de:
1. informações jurídico-penais, ou seja, como agiu o condenado, se ele
registra antecedentes etc.;
2. exame clínico – saúde individual e eventuais causas mórbidas,
relacionadas com o comportamento delinquencial;
3. exame morfológico – constituição somatopsíquica;
4. exame neurológico – manifestações mórbidas do sistema nervoso;
5. exame eletrencefalográfico – não para só a busca de lesões focais ou
difusas, mas da correlação, certa ou provável, entre alterações funcionais do
encéfalo e o comportamento do condenado;
6. exame psicológico – nível mental, traços básicos da personalidade e sua
agressividade;
7. exame psiquiátrico – saber se o condenado é pessoa normal, ou portador
de perturbação mental;
8. exame social – informações familiares, condições sociais em que o ato foi
praticado.
Na lição de Luiz Roberto de ALMEIDA34 e Evaldo Veríssimo Monteiro dos
SANTOS:
“Com a realização do exame criminológico, estarão respondidas várias
questões que envolvem o criminoso na sua conduta antijurídica, antissocial
e seu possível retorno à sociedade. Diante de tais providências, teremos o
resultado das variações do caráter do delinquente manifestado por sua
conduta já que o comportamento será sempre o reflexo da índole, em
desenvolvimento.”
Conforme se infere do art. 8º, caput, da LEP, para o condenado ao
cumprimento de pena privativa de liberdade em regime fechado, além do exame de

33
Apud. MIRABETE, Julio Frabbini. Execução penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-1984. 10. ed.
rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2004. p. 53.
34
ALMEIDA, Luiz Roberto de, e SANTOS, Evaldo Veríssimo Monteiro dos. O exame criminológico, p.
47.
66
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classificação, deverá ser obrigatoriamente submetido a exame criminológico. Isso se
justifica na circunstância de que a imposição do regime fechado decorre da prática de
crimes de maior gravidade.
Entretanto, para os presos que iniciem o cumprimento de pena em regime
semiaberto, a realização do exame criminológico é apenas facultativa, podendo ser por
iniciativa da Comissão Técnica de Classificação visando à correta individualização da
execução.
E para os condenados em regime aberto ou a pena restritiva de direitos?
Infere-se do art. 8º da LEP que não se realiza o exame criminológico nesses
casos.
c) Hoje facultativo, mas imprescindível
Antes da Lei n.º 10.792/2003, dispunha o art. 112 da LEP que a progressão
do regime carcerário condicionava-se a parecer prévio da Comissão Técnica de
Classificação e realização de exame criminológico.
Com a vigência da referida lei, foram suprimidas essas exigências,
contentando-se o legislador com o cumprimento do mínimo de um sexto da pena
imposta e atestado de bons antecedentes fornecido pela direção do estabelecimento
penitenciário.
É latente a necessidade do exame criminológico inicial, o qual não foi
abolido, para fins de classificação e individualização da execução da pena, consoante
indicado na Lei de Execução Penal. Entretanto, da mesma forma se torna indispensável
o exame no decorrer de toda a execução penal, para a análise de deferimento dos
pedidos de benefícios.
Não obstante a modificação legislativa, a jurisprudência dos Tribunais
Superiores está consolidada no sentido de que o silêncio da LEP não inibe o juiz da
execução do poder de determinar tais exames, desde que o faça fundamentadamente.
Parte-se do princípio de que a análise do requisito subjetivo necessário à progressão do
regime condiciona-se à verificação do mérito do condenado, para o que nem sempre é
suficiente o atestado de bom comportamento carcerário atestado pelo diretor do
presídio.
O Supremo Tribunal Federal no ano de 2009, editou a súmula vinculante nº
26, onde:
“Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime
hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a
inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990,
sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos
objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de
modo fundamentado a realização de exame criminológico”.
Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula nº 439, de 28
de abril de 2010, “Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso,
desde que em decisão motivada”.
As súmulas editadas pelas cortes superiores confirmam que a alteração da
redação original do artigo 112 da Lei de Execução Penal não vedou a realização do
67
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exame criminológico, mesmo porque, como visto acima, os artigos 8º da LEP e 34 do
Código Penal também admitem essa perícia, como lembrado por MIRABETE35:
“[...] É ele indispensável quando se trata da progressão do regime fechado
para o regime semi-aberto, conforme dispõem os artigos 34 do CP e 8º da
LEP ao determiná-lo para a ‘individualização da pena”.
Quanto à progressão, continua seus ensinamentos:
“Não basta o bom comportamento carcerário para preencher o requisito
subjetivo indispensável à progressão. Bom comportamento não se confunde
com aptidão ou adaptação do condenado e muito menos serve como índice
fiel de sua readaptação social”36.
Tratando-se da progressão do regime semi-aberto para o aberto, o exame
criminológico não é obrigatório, mas pode ser determinado pelo juiz da execução (art.
8.º, parágrafo único).

d) Exame criminológico e progressão de regime


Os únicos requisitos para progressão de regime carcerário é o cumprimento
de um sexto da pena, como requisito objetivo para progressão, e a apresentação de
atestado de boa conduta carcerária firmado pelo direto do estabelecimento prisional,
como requisito subjetivo.
Portanto, também para fins de progressão de regime o exame
criminológico tornou-se uma faculdade do juiz a fim de poder aferir se o condenado
absorveu a terapêutica penal, principalmente em hipóteses em que fixada elevada pena
ou de condenado com histórico criminal indicativo de periculosidade.
Nesse sentido, é possível citar trecho do voto preferido pelo Ministro Celso
de Mello no HC 85.688/PR:
“Não constitui demasia assinalar, neste ponto, não obstante o advento da
Lei n.° 10.792/03, que alterou o art. 112 da LEP – para dele excluir a
referência ao exame criminológico -, que nada impede que os magistrados
determinem a realização de mencionado exame, quando o entenderem
necessário consideradas as eventuais peculiaridades do caso, desde que o

35
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Ob. cit. p. 295.
36
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Ob. cit. p. 294.
68
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façam, contudo, em decisão adequadamente motivada, tal como tem sido
expressamente reconhecido pelo E. Superior tribunal de Justiça (...)”.
Independentemente, é certo que o exame criminológico, mesmo quando
realizado, não vincula obrigatoriamente o juiz, que, fundamentando sua decisão, pode
decidir de forma contrária, não sendo obstativa ao ponto de se negar a progressão de
regime com base em informações ou interpretação que possa extrair do laudo
respectivo.
No entanto, há que entenda pela obrigatoriedade, como afirma Guilherme de
Souza NUCCI:
“Realizar um programa individualizador no começo do cumprimento da
pena (art. 6º, LEP) e um exame criminológico (art. 8º, LEP), sem haver
solução de continuidade, quando for indispensável para obtenção do
resultado concreto do programa fixado para o preso, seria inútil. Para que
o juiz não se limite a requisitos puramente objetivos (um sexto do
cumprimento da pena + atestado de boa conduta carcerária), contra os
quais não há insurgência viável, privilegiando o aspecto subjetivo que a
individualização — judicial ou executória — sempre exigiu, deve seguir sua
convicção, determinando a elaboração de laudo criminológico, quando
sentir necessário, fundamentando, é certo, sua decisão, bem como pode
cobrar da Comissão Técnica de Classificação um parecer específico,
quando lhe for conveniente. Acrescente-se que a redação do art. 112, caput,
da Lei de Execução Penal, menciona que o preso deve ostentar bom
comportamento comprovado pelo diretor do estabelecimento. Essa
comprovação pode não se dar de modo suficiente em um singelo atestado
de boa conduta, instando o magistrado a demandar outros esclarecimentos,
como os dados possíveis de colhimento pelos demais profissionais em
exercício no estabelecimento penal.”37
e) Exame criminológico e livramento condicional
Ao tratar do livramento condicional, dispõe o art. 83, parágrafo único, do
Código Penal que, “para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou
grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à
constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a
delinquir”, sugerindo, portanto, a necessidade de exame criminológico também nesse
caso.
O impasse existente a respeito decorre do fato de que a Lei n.° 10.792/2003,
alterando o art. 112 da LEP, estabeleceu no § 2.º deste dispositivo que o procedimento
adotado para progressão de regime será também adotado para fins de livramento
condicional. E, para fins de progressão, basta a verificação do tempo mínimo de
cumprimento de pena aliado à existência de atestado de boa conduta carcerária (art. 112,
caput, da LEP). Nesse contexto, estaria dispensado o exame criminológico para fins de
livramento condicional quando se trata de condenado por crime doloso cometido com
violência ou grave ameaça à pessoa?

37
NUCCI, Guilherme de Souza. Primeiras linhas sobre a Lei 10.792/03, obtido pela Internet:
http://www.cpc.adv.br/Doutrina/default.htm.
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Guilherme de Souza NUCCI38 compreende que tal exame não pode ser
dispensado tendo em vista que
“A Lei 10.792/2003, que trouxe a alteração ao art. 112, não modificou o
disposto no parágrafo único do art. 83, que exige o exame criminológico
para quem pretenda conseguir livramento condicional, desde que autor de
crime doloso violento, bem como não alterou o disposto no art. 131 da Lei
de Execução Penal (L. 7.210/1984), prevendo ser a concessão do
livramento submetida às condições do art. 83 e parágrafo único, com
parecer prévio do MP e do Conselho Penitenciário”.
Sem embargo, a verdade é que a jurisprudência dos Tribunais Superiores
vem considerando, também nesse caso, o exame criminológico uma faculdade do juiz.
Diante de condenado à prática de crime doloso cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa, o juiz pode determiná-lo sempre que julgar necessário para apurar se
existem as condições pessoais que façam presumir que ele não voltará a delinquir.
Considera-se, enfim, que a noção de bom comportamento, tal como prevista no art. 112
da LEP (na redação dada pela Lei n.° 10.792/2003), abrange a valoração de elementos
que nem sempre podem se restringir ao mero atestado de boa conduta carcerária
fornecido pelo diretor do presídio.
De qualquer forma, é certo que, mesmo realizado o exame criminológico, o
juiz não está adstrito às suas conclusões para fins de conceder ou negar o livramento
condicional, podendo decidir de forma contrária, desde que o faça fundamentadamente.
04. Identificação do Perfil Genético
a) Hipóteses legais
Trata-se de hipótese de identificação criminal, introduzida pela L.
12.654/2012 por meio do art. 9º-A da Lei n.° 7.210/1984 (Lei de Execução Penal),
referindo-se à identificação obrigatória do perfil genético, mediante extração de DNA,
dos condenados pela prática de crime doloso praticado com violência de natureza grave
contra pessoa, bem como dos crimes hediondos previstos no art. 1.º da Lei n.°
8.072/1990.
Essa previsão tem por finalidade abastecer banco de dados a fim de facilitar
a elucidação de crimes em futuras investigações.
A exigência legal dessa forma de identificação é bastante restrita, exigindo a
ocorrência de condenação pela prática de determinadas naturezas de crimes, quais
sejam:
Crimes dolosos praticados com violência de natureza grave contra a
pessoa: a análise do que seja a violência de natureza grave condiciona-se, a
nosso ver, ao exame do caso concreto. Logo, poderá ser tanto uma conduta
que tenha causado lesão corporal na vítima como até mesmo o uso da força
física, bastando que o modus operandi do agente revele violência exagerada
e desmedida.

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NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal comentado. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008,
p. 492.
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Crimes hediondos, isto é, aqueles previstos no art. 1.º da Lei n.°
8.072/1990.
A extração do material biológico para confecção do perfil genético deverá
ser realizada por meio de técnica adequada (não invasiva, logicamente) e indolor.
A extração de DNA nos casos referidos deve ser determinada na própria
sentença condenatória, condicionando-se logicamente ao respectivo trânsito em julgado,
sob pena de violação ao princípio constitucional da presunção de inocência. No silêncio
da sentença, pode determiná-la o juiz da execução.
Uma vez realizada, a identificação do perfil genético deverá ser armazenada
em banco de dados sigiloso regulamentado pelo Poder Executivo (art. 9º-A, § 1º, da Lei
n.° 7.210), dependendo o acesso das autoridades policiais a esses bancos de ordem
judicial (art. 9º-A, § 2º, da Lei n.° 7.210).
Conforme referido no § 1º do dispositivo, o banco de dados é sigiloso. Por
essa razão, dispõe o § 2º que o acesso ao respectivo acervo pela autoridade policial,
federal ou estadual, no curso do inquérito, depende de prévia ordem emanada do juiz
competente. Reputamos que o juiz competente, nesse caso, não será necessariamente
aquele que determinou a coleta do perfil genético, tampouco o juiz da execução, mas
sim aquele ao qual, na sua atuação ordinária, for distribuída a representação do delegado
de polícia. Logo, poderá ser o juiz de qualquer das varas criminais ou até mesmo o juiz
de plantão.
b) Constitucionalidade
Considerando que o fornecimento desse material é obrigatório para os
condenados pelos crimes antes referidos, nos termos do art. 9º-A da Lei n.° 7.210, parte
expressiva da doutrina vem sustentando a inconstitucionalidade do dispositivo, sob o
argumento de que implica violação ao direito que sobressai do art. 5.º, LXIII, da
Constituição Federal no sentido de que ninguém pode ser obrigado a produzir prova
contra si mesmo (nemo tenetur se detegere).
Para NUCCI39 articulou no seguinte sentido:
“A identificação genética e a imunidade contra autoacusação
“Impõe-se, por força de lei, a identificação do perfil genético de
condenados por delitos violentos graves e crimes hediondos, mesmo que já
tenham sido criminal e civilmente identificados. O objetivo, nesta hipótese,
não é somente garantir a perfeita individualização da pessoa do condenado,
a fim de se evitar seja o inocente processado no lugar do culpado. Tem-se o
nítido propósito de formar um banco de dados para, havendo um crime no
futuro, auferir-se elementos para identificar o seu autor, sem sombra de
dúvidas.
Estar-se-ia ferindo princípio constitucional sob tal aspecto? Não nos
parece. Em primeiro plano, cremos que todas as pessoas deveriam ser
identificadas, civilmente, de forma segura e moderna. O exame de perfil
genético poderia constar de todas as identidades civis, como, hoje, em chips
de passaporte já constam dados pessoais. Porém, é um processo lento,
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NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 10 ed rev., atual. e amp.
São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 1031.
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complexo e caro. Em segundo lugar, parece-nos que todos os condenados a
penas privativas de liberdade deveriam ser geneticamente identificados – e
não somente os autores de delitos violentos ou hediondos. A medida, no
entanto, é experimental e depende de implementação complexa e custosa
para o Estado. Em terceiro, não se está coletando o material genético com
o fim de comparar com material já colhido, visando à incriminação do
acusado; identifica-se o sentenciado, mediante extração de DNA, mantendo
em banco sigiloso, para que, no futuro, ocorrendo algum delito, possa o
Estado-investigação confrontar com os elementos colhidos na cena do
crime. Ninguém pode se acusar pelo delito que ainda não cometeu.
Deve-se, por certo, evitar a inversão desses valores e registros. Primeiro,
identifica-se o condenado pelo perfil genético, arquivando-se os dados
coletados. Depois, se e quando houver um crime, cujo suspeito seja o
próprio, do material captado por diversos meios lícitos de investigação, faz-
se o confronto. Exemplo: Fulano é condenado e cumpre pena por estupro. É
identificado por perfil genético. Sai em liberdade condicional. Torna a ser
acusado de estupro. O cabelo ou outros pelos colhidos no lugar do crime,
pela polícia, pode ser confrontado com o perfil genético do suspeito. Tal
medida pode incriminá-lo ou isentá-lo de vez, o que significa um bem
enorme para evitar erros judiciários.
No entanto, o contrário não é admissível. Fulano, cumprindo pena por
estupro, é identificado pelo perfil genético. Se há acusação anterior de
outro crime sexual, com material colhido, mas sem confronto, por falta de
elementos, torna-se incabível extrair, à força, dados genéticos de Fulano
para auxiliar na investigação de crime pretérito. Estaria ele sendo coagido
a fornecer prova contra si mesmo.
Em suma, soa-nos válida a identificação pelo perfil genético, desde que
usada para futuros delitos.”

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