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Freud
I - INTRODUÇÃO
Daí porque, em plena Era Vitoriana (1), para o espanto de uma sociedade dotada de valores
morais pautados por excessiva rigidez, Freud observou a presença de sexualidade na infância,
ou seja, não que o petiz expressasse esta erotização por meio dos órgãos genitais, mas sim
que estas pulsões sexuais encontravam guarida em etapas pré-genitais.
Freud percebeu que havia um transcurso das pulsões sexuais a contar do nascimento até a
genitalização, como se aquelas fossem dotadas de uma viscosidade, levando-o a denominar
este fenômeno como "viscosidade da libido", o que faz antever a existência de etapas ou fases
neste desenvolvimento da psicossexualidade.
Autores outros subdividem algumas dessas fases e divergem quanto às faixas etárias que as
demarcariam (2). Mas, o propósito deste trabalho é o de registrar estas fases na ótica de
Freud.
Ei-las:
Sabidamente, a criança ou qualquer outro animal, assim que vem à luz, por inescondível
instinto, procura saciar a fome que o assola.
Contudo, no homem, o ato do bebê ir em busca do seio materno vai além da questão da
sobrevivência, tendo aí a satisfação de um prazer de índole erótico, sem que isto signifique
conteúdo genital.
De início o bebê e sua genitora, sob a perspectiva daquele, é um aglomerado único, onde o
contato com o seio materno constitui na saciação de dois desejos: a alimentação e o prazer
sexual. Onde a boca é a região que constitui a fonte da satisfação (3).
À medida que a criança já atinge a casa de um ano de idade, com ganho de rudimentares
movimentos, para superar a sensação de ausência do objeto de seu desejo (seio da mãe)
começa a utilizar artifícios para supor que controla o desaparecimento momentâneo de sua
mãe.
Exatamente isso é que resultou na descoberta de Freud, que verificou, em seu neto, que
estava no berço, que essa oralidade tinha grandeza superior ao encontro com o seio da mãe,
mas representava um desejo de dominá-la perto de si. Tal verificação decorreu do jogo do
carretel, que aquela criança empreendia (4).
Eventual fixação do adulto nesta etapa infantil da oralidade é perceptível diante dos hábitos
que se relacionam com a boca, tais como: fumar, falar demais, beber, comer em demasia, (5)
etc. Logicamente que se pode sublimar algumas dessas atitudes, como, por exemplo, a
utilização da fala para o campo da oratória e musicalidade.
Derradeiramente, a idade que esta fase se pronuncia, tem como termo inicial o nascimento e
final por volta dos 2 anos, lembrando o dissenso entre os autores quanto a este viés etário.
Logicamente, que se os zeladores das crianças tiverem ciência desta fase contribuirão, em
muito:
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c) entenderão que a criança deverá alimentar-se dentro de um esquema que satisfaça a sua
necessidade orgânica, não lhe empanturrando de víveres, como é do gosto, principalmente,
das avós. Assim as pouparão de se tornarem porvindouras desequilibradas no campo
gastronômico, glutonas e obesas;
d) não repreenderão o natural desejo da criança, nesta quadra, de levar tudo à boca. Tal
recalque, produzido pelos cuidadores da mesma, poderá dar azo a que, no futuro, por um
mecanismo de compensação, aquele ser torne-se um fumante, porque quando adulto,
encontrará liberdade de levar à boca o cigarro, que, simbolicamente será a representação do
objeto negado quando de sua meninice;
Nesta etapa do desenvolvimento, que se dá em média entre 2 e 4 anos de idade (6), a criança
passa a ter controle sobre os músculos estriados (esfíncteres). Tem prazer, igualmente erótico
– que não se confunde com genitalidade – em manter as fezes no seu intestino e ao depois
despejá-las para fora de si.
Poderá utilizar-se disso para desafiar seus cuidadores, seja evacuando em local supostamente
impróprio ou mantendo o estrume quando, por exemplo, a mamãe queria que ele o alijasse.
Tem gênese, nesta fase, a idéia de poder, de controle. Surgindo, por associação, no período
adulto, desde que ele o tenha fixado na analidade, a avareza, já que o dinheiro é tido
popularmente como sujo, sem contar, também, que o enriquecimento remete a idéia de poder.
Natural, pois, que na fase em comento, as crianças adoram brincar com barro, massas de
moldar, até mesmo com as próprias fezes, sendo esta última uma atividade que horroriza os
pais que não conhecem a psicossexualidade. Repressões nesta fase, geram, em regra,
constipações intestinais, onde presencia em adultos visível racionalização: "quando viajo não
consigo fazer cocô".
As pulsões sexuais ligadas ao toque com substâncias que lembrem as fezes podem ser
sublimadas, mormente nas atividades artísticas afetas à pintura e escultura (7).
Eis, uma vez mais a imprescindibilidade do conhecimento dessa fase pelos cuidadores da
criança, evitando-se nefastas repressões e, até quem sabe, em vista dessa ignorância, deixar
de estimular aquele pequeno ser a se tornar um portentoso artista.
O estágio fálico do ser humano está presente quando o órgão genital masculino (pênis) passa
a ser a representação simbólica de virilidade para os meninos e, igualmente para as meninas,
uma vez que estas acreditam que o dito órgão está incrustado nelas, especialmente no clitóris,
e que virá um dia acrescer tal qual o dos garotos.
Nesta escala temporal, cerca dos 3 aos 6 anos (8), aparece o complexo de Édipo, onde o
menino deseja sua mãe, querendo eliminar seu pai (rival), ainda que o veja como uma figura de
autoridade, o que faz emergir uma nítida ambigüidade: desejo de matá-lo/desejo de se parecer
com ele.
Na menina, por sua vez, o objeto indesejável é a mãe, visto que aquela quer fazer as vezes
desta, ser a namorada de seu pai e, quando percebe que seu pênis não erupcionará nutre o
desejo de lhe dar um filho como um substitutivo daquela representação (9).
Nesse instante da vida do pequeno surge ocasião, mais que ideal, que se deflagrem uma
pleíade de atividades socializantes para o mesmo, tais como: teatros, cinemas, jogos
diversificados, lazeres familiares (pescarias, idas ao shopping, zoológico, parque, clubes, tudo
isso em parceria com os cuidadores, ou seja, integradamente). Soa o momento do(a) filho(a)
se sentir unido(a) com o genitor(a), que mesmo tendo um ritmo forte de trabalho haverá de
planejar tempo livre para tais deleites, aproveitando-se da ternura que timbra a criança neste
período de latência, tornando-a mais permeável a um diálogo construtivo.
O período da latência culminará, em seu fecho na fase da organização sexual completa, selada
pela puberdade, por volta dos 11 a 12 anos de idade.
Aqui o sujeito busca objeto sexual fora de si, ou seja, almeja satisfazer suas pulsões sexuais
com alguém do sexo oposto, a menos que ocorra o que Freud denomina inversão (12).
Ordinariamente todo objeto sexual busca um alvo sexual, que, para não ser caracterizado com
perversão (13) deverá resultar no coito, daí a importância desta fase de genitalização
respeitando as diferenças anatômicas.
Em arremate, por conta dessa emergência dos desejos sexuais genitalizados, não mais
representados como pulsões parciais, é que faz com que o jovem, de um lado, sinta-se como
dominante de seus desejos e, por outro, como um meio termo entre a condição de criança e a
de púbere, culminando em alterações de humor, em vontade de transgredir a lei, etc.
Apegando-se mais ao grupo do que à família, porque, nesta última não sente, em regra, o
apoio e a auto afirmação necessários, conquanto entre os "amigos" ele se identifica em
plenitude (um se torna igual ao outro) e, em regra, a linguagem e os gostos são semelhantes,
dado o menor grau de interditalidade de condutas.
Por conta disso, é que os cuidadores desses entes, na fase genital haverão de conhecer as
amizades dos mesmos, promovendo, dentro das possibilidades, confraternizações em sua
casa para receber os amiguinhos da sua prole, para que no amanhã não descubra, com
inominável dor, que seu petiz se tornou um drogado de modo amplo (maconha, cocaína, álcool,
prostituição, etc).
3 – CONCLUSÃO
É observável que as pulsões sexuais não se realizam por inteiro até que se dê a culminância
da fase genital. Antes disso a organização sexual é parcial, isto é, a erotização ou está voltada
para a boca (fase oral), para o ânus (fase anal) ou para o pênis (fase fálica), sem contudo
significar uma realização sexual genitalizada. Bem por isso é que Freud denominou tais etapas
de pré-genitais, ocorrendo o direcionamento da pulsão sexual integral somente quando da fase
genital.
Deste contexto, pode se extrair duas expressivas conseqüências, que se bem entendida pelos
cuidadores das crianças, evitar-se-iam problemas psíquicos porvindouros. Ei-las:
a) enquanto o sujeito está na fase pré-genital, como mencionado acima, a erotização volta-se à
uma determinada região corporal mais específica (zona erógena), entrementes, estas
descargas sexuais não significam qualquer indício de cópula. Então, se um adulto ver duas
crianças de sexo oposto tirando suas roupas, não deverá olhar tal ato com a visão
pornográfica, mas sim com uma percepção de que eles apenas estão se conhecendo, por
estarem, possivelmente, na fase fálica.
O mesmo raciocínio dá-se com a masturbação infantil, que geralmente escandaliza mães e
pais, que, se soubessem sobre a pré-genitalização entenderiam que esta fricção nada tem com
uma idéia sexual-genital, mas sim está ligada a uma erotização desaguadora de prazer, tão
somente isso.
b) Na fase genital, esta sim, abarcada pelo direcionamento da pulsão sexual completa, com
alvo na organização sexual também otimizada, o interesse do sujeito, divorcia-se de um até
então auto erotismo, para a busca de objeto sexual diverso de si. Ocorrendo aí a procura dos
grupos para neles, por meio de um processo de identificação, encontrar auto afirmação,
mormente em famílias mais castradoras.
Em suma, o vislumbre da psicossexualidade servirá de norte para todos aqueles que tem o
mister de zelar de crianças, conferindo-lhes roteiro seguro para se evitar indesejáveis
recalcamentos que, no futuro, poderá ser a gênese de inumeráveis neuroses patogênicas; bem
como significará o completo entendimento do gizado no Art. 17, do ECA.
4 – BIBLIOGRAFIA
Freud S. Obras Completas, Volume XVIII. Para Além do Princípio do Prazer. Editora Imago.
Nasio JD. Édipo, o complexo que nenhuma criança escapa. Capítulo 1. Rio de Janeiro, Ed.
Jorge zahar.
Roudinesco E. Dicionário de Psicanálise. Verbete: Estádio. Rio de Janeiro. Ed. Jorge Zahar.
1998.
1 - " Época vitoriana, período que compreende a segunda metade do século XIX e primeira
década do século XX, em que os movimentos sociais populares cederam lugar a um sistema
social equilibrado grandemente devido à estabilidade do Império Britânico, governado pela
rainha Vitória (1819-1901).
Apesar do materialismo herdado, a época foi marcada pelo retorno de valores éticos como
respeitabilidade, polidez e circunspecção, considerados as mais elevadas virtudes sociais. O
espírito vitoriano marcou a literatura com refinamento e vigor, como nas obras de Charles
Dickens, Emile Brontë, George Eliot e Thomas Hardy. No entanto, muitos críticos sociais tem
uma visão amarga desse período, que consideram uma época de preconceitos, excessiva
repressão moral e hipocrisia." (R.Q.Cobra 30/04/2003; in http://www.cobra.pages.nom.br/ec-
epvitoriana.html, acessado em 20/11/2010; grifou-se).
4 - " Freud, em 1920, no artigo "Para Além do Princípio do Prazer" observa o seu neto num
jogo que chamou de fort-da.
O garotinho, em seu berço, balbuciando as primeiras palavras, inicia uma brincadeira com um
carretel amarrado a um cordão, joga-o para fora do berço e diz fort e o puxa de volta; alegre
com sua reaparição, o saúda com da.
O bebê encena através dos objetos a seu alcance o desaparecimento e o retorno do objeto.
Este desaparecimento e retorno nos remete a relação mãe-bebê, porque uma criança pequena
jamais quer sua mãe longe de si."( Fonte : Obras Completas de Freud, Volume XVIII)
5 - Um menino de 12 anos, com déficit de atenção escolar, que na análise demonstrou que
todo seu desejo era transferido para a saciação do prazer de comer (fase oral), como bem
registra Gilberto Safra no áudio denominado Percurso Histórico sobre as diversas teorias e
escolas psicanalíticas, deslocava todo o seu prazer para o ato de comer, e com isso
desinteressava-se das demais atividades, localizada esta fixação, com associação livre e
respectiva interpretação, a análise devolveu àquele ser uma vida plena;
7 - "Para entendermos a sublimação tomaremos como exemplo a pulsão parcial anal: quando
esta fase está sendo construída a criança volta-se para tudo que diz respeito a esta região do
corpo. Descobre que dela se desprendem as fezes. É natural que desejem manipulá-las. Mais
tarde, parte dessa pulsão será reprimida, parte irá compor a sexualidade genital e parte será
sublimada, transformando-se, por exemplo, na atividade de esculpir argila, havendo
dessexualização do objeto no caso, a argila." (Fonte: Fagundes, TCP,
site: http://www.pedagobrasil.com.br/cantinho/simaiasampaio9.htm, acessado em 22/11/2010).
11 - Freud S. Obras completas. Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Volume VII. O
alvo sexual da sexualidade infantil.
13 - "Considera-se como alvo sexual normal a união dos genitais no ato designado como coito,
que leva à descarga da tensão sexual e à extinção temporária da pulsão sexual (uma
satisfação análoga à saciação da fome)". (Fonte; Freud S. Obras Completas. Voluma VII. Cite.
Desvios com respeito ao alvo sexual)