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RESUMO DA CAUSA
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Esse enorme contingente de consumidores recebeu uma dolorosa e
inesperada notícia no dia 07 de maio de 2018: o anúncio pela CBTU, sociedade
de economia mista responsável pela gestão do metrô de Recife, do reajuste de
87,5% (oitenta e sete e meio por cento) no valor das tarifas diárias de transporte
na cidade. Aumento que passou a vigorar de forma abrupta desde o dia 11 de
maio, última sexta-feira, ou seja, apenas 5 (cinco) dias após a anúncio.
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DO CABIMENTO DA AÇÃO POPULAR
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ato administrativo a invalidar, por contrariar normas específicas que
regem a sua prática ou por se desviar de princípios que norteiam a
Administração Pública, sendo dispensável a demonstração de prejuízo
material aos cofres públicos ... (STJ – RESP 849297/DF, Segunda Turma,
Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJ 08.10.2012, publicado na
RSTJ vol. 228, p. 217).
É certo, portanto, que ainda que não haja dano ao erário, a afronta aos
princípios constitucionais regentes da Administração Pública autoriza, por si só,
o manejo da ação popular, sendo este o caso em tela: trata-se o reajuste tarifário
anunciado pela CBTU de um ato atentatório a diversos princípios da
administração pública, dentre eles o da moralidade, tal como demonstraremos.
DA LEGITIMIDADE ATIVA
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compete à Justiça Estadual o julgamento de ação popular movida contra
sociedade de economia mista.
II. Conflito conhecido e provido, para declarar competente o Juízo
suscitado, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Belo Horizonte, MG. (STJ –
CC 25538/MG, Relator Min. Aldir Passarinho Junior, Primeira Seção, DJ
30.08.1999, p. 27)
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MS. (CC 56989/MS, Terceira Seção, Relator Ministro Og Fernandes, DJ
07.11.2008).
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PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ENERGIA
ELÉTRICA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO.
ENQUADRAMENTO DE EMPRESA COMO CONSUMIDORA FINAL DO
SERVIÇO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REVISÃO DO
JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE
PROVA. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA.
1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a relação
entre concessionária de serviço público e o usuário final para o
fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como energia elétrica,
é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do
Consumidor. (STJ - AgInt no AREsp 1061219 / RS,AGRAVO INTERNO
NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL, Relator Ministro Og Fernandes,
Segunda Turma, DJ 25.08.2017).
DA ILEGALIDADE
Como prescreve o art. 2º, alínea “c” da Lei nº 4.717 de 1965, são nulos os
atos praticados pela administração com ilegalidade do objeto, sendo certo que o
dano aos cofres públicos, como já ressaltado, não é requisito absoluto.
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“Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço
adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido
nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade,
continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade,
cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.” (enfatizou-se)
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Citado por GONÇALVES, Cristiane Vitório. APLICAÇÃO DA MODICIDADE TARIFÁRIA COMO
DIREITO SUBJETIVO DO INDIVÍDUO DE ACESSO AO SERVIÇO PÚBLICO. Disponível em
https://jus.com.br/artigos/25342/aplicacao-da-modicidade-tarifaria-como-direito-subjetivo-do-individuo-
de-acesso-ao-servico-publico/2
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No ponto, pede-se vênia para transcrever o trabalho de Cristiane Vitório
Gonçalves, citando o magistério de Diógenes Gasparini:
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IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que
coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
§ 1o Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I – Ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
III.- se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-
se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras
circunstâncias peculiares do caso”. (Grifo nosso)
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TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 3ª ed. São Paulo: Método/GEN, 2013, p.550.
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É evidente, portanto, que houve quebra dos deveres de zelo, cooperação,
razoabilidade e lealdade decorrentes do princípio da boa-fé por parte da CBTU
para com o usuário, o que juridicamente constitui uma ilicitude apta a ensejar a
anulação do ato por ela perpetrado. Também foi rasgado o princípio da
confiança, que igualmente rege as relações entre administração e administrado,
pois este foi surpreendido, não teve a possibilidade de se adequar às novas
regras tarifárias unilateralmente e arbitrariamente impostas pela parte ré. Nesse
sentido, afirma Rafael Maffini que:
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MAFFINI, Rafael da Cás. Princípio da Proteção Substancial da Confiança no Direito Administrativo
Brasileiro. 253f. Tese (Doutorado em Direito). Faculdade de Direito, Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, Porto Alegre, 2005, p. 48-9.
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essencial no controle jurisdicional dos atos do podes público, porque permite a
superação da análise de aspectos puramente formais e avanço na utilização de
critérios valorativos.
É nesse sentido, então, que o ato da CBTU se mostra mais repugnante
ao mínimo senso de ponderação, de equilíbrio, de proporção, é dizer, de justiça,
já que, pelo menos desde Aristóteles a ideia de justiça é compreendida em
estreita consonância com a ideia de igualdade. É essa igualdade entre as partes
que foi pela imposição pela CBTU de um aumento tão elevado e de maneira tão
repentina e atropelada.
Tem-se, diante do exposto, pela afronta às regras de proteção ao
consumidor e aos princípios regentes da administração pública, inclusive à
moralidade administrativa, que constitui cláusula nula de pleno direito o
estabelecimento de vantagens exageradas ao prestador do serviço público,
considerando-se vantagens exageradas aquelas decorrentes do desequilíbrio
contratual, ainda que a pretexto de reequilibrá-lo, como é o caso, devido à forma
pela qual foram implementadas.
Trata-se, em verdade, de afronta a um direito subjetivo do usuário de um
serviço público que é vital, de uso frequente e contínuo – como é o caso do
transporte público – de não ser surpreendido com reajustes desproporcionais
concedidos inopinadamente.
Assim, o prazo de 4 (quatro) dias contado entre o anúncio da medida e
sua implementação mostra-se insuficiente para a reorganização financeira dos
usuários, e eiva de vício a medida, que se revela desleal e abusiva, pois
sobrecarrega o elo mais vulnerável na relação. Não é moral, razoável e
proporcional onerar ainda mais o cidadão, que tem sofrido reduções sistemáticas
em suas finanças e convivido com a fila do desemprego.
Há, portanto, irrefutáveis violências à Constituição Federal e a legislações
de regência, todas elas justificáveis para impor, definitivamente, a suspensão e
posterior anulação do ato praticado pela CBTU no âmbito do município de Recife.
DO PEDIDO LIMINAR
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Com efeito, a ilegalidade do aumento já ficou claramente demonstrada, e
reside no fato de ter sido o reajuste feito de maneira totalmente arbitrária, em um
valor quase que extorsivo, e sem sequer um prazo minimamente razoável de
implementação, de modo que, assim, tal ato colide com as normas de defesa do
consumidor e diversos princípios do ordenamento, como os da
proporcionalidade, razoabilidade, boa-fé, confiança, moralidade, modicidade
tarifária, etc.
Já o perigo da demora na prestação jurisdicional reside no dano
irremediável que este abrupto aumento irá acarretar no bolso de inúmeras
famílias, a grande maioria de baixa renda, cujos integrantes utilizam o metrô. E
isso não apenas pelo nítido excesso no reajuste, mas, sobretudo, repita-se, pelo
fato de que, pegas de surpresa, sem tempo para se planejar, as famílias terão
seu orçamento seriamente comprometido.
Com efeito, a medida, que entrou em vigor ontem, 11 de maio, foi
anunciado no dia 07 de maio, com apenas 4 dias de antecedência. Esse atropelo
inviabiliza totalmente a adequação das famílias a essa nova realidade de
despesas com transporte, e isso está acarretando grandes dificuldades paras a
imensa maioria dos usuários, cujas economias são contadas, não havendo
“gordura” para cobrir esses novos gastos.
Registre-se, ainda, que a concessão dessa medida em caráter liminar, o
que protege as famílias, em nada irá agravar a situação da CBTU, que já se
mantém com as tarifas no patamar anterior há 06 anos, o que lhe dá plena
capacidade de garantir a continuidade do serviço durante o tempo em que for
discutido o mérito sem maiores transtornos. Tal não é o caso das pessoas
afetadas por esse aumento.
Desse modo, presentes todos os requisitos autorizadores da medida
liminar, espera-se que a mesma seja concedida, de modo a evitar maiores
prejuízos ao consumidor até que a CBTU, como é conforme ao bom-senso e,
sobretudo, ao direito, reedite a medida estabelecendo um escalonamento do
aumento, ou seja, que o mantenha, se assim for mesmo necessário, mas
implementando-o de maneira lenta e gradual, a fim de que o consumidor possa
dispor do tempo necessário para se adaptar à nova realidade.
5. CONCLUSÕES E PEDIDOS
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Ante o exposto, requer o autor:
Nestes termos,
Pede deferimento.
Recife, 12/05/2018.
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