Professional Documents
Culture Documents
IPPUR / UFRJ
Prédio da Reitoria, Sala 543
Cidade Universitária / Ilha do Fundão
21941-590 Rio de Janeiro RJ
Tel.: (021) 590-1191 / (021) 260-5350
Fax: (021) 564-4046
E-mail: cadernos@ippur.ufrj.br
http:\\www.ippur.ufrj.br
CADERNOS IPPUR
Ano XIII, N o 1
Jan- Jul 1999
Indexado na Library of Congress (E.U.A.)
e no Índice de Ciências Sociais do IUPERJ.
Irregular.
Continuação de: Cadernos PUR/UFRJ
ISSN 0103-1988
Apoio
EDITORIAL
Convencionamos chamar de fronteira a região onde há indistinção, ambigüidade e
incerteza. Nela a contemporaneidade de tempos históricos configura uma unidade
do diverso. A fronteira existe em relação a alguma outra coisa, definindo-se como
enlace entre zonas estruturadas e não-estruturadas, entre a ordem e a desordem, o
velho e o novo. A fronteira extrai sua virtualidade histórica do jogo recíproco entre
o articulado e o não-articulado, entre a estrutura e a não-estrutura. Não se trata,
porém, de espaços vazios, sem história, “não-lugares”, mas sim de locus efetivos de
transformações socioterritoriais. Essas transformações são o objeto central do pre-
sente número do C ADERNOS IPPUR. Na fronteira desmaterializada do valor, vere-
mos como se desenvolvem as formas renovadas de reprodução/expansão do capital
financeiro. A aceleração dos ritmos da acumulação não deixará de redefinir, no
entanto, também a fronteira histórica e material da construção das formas urbanas
nas periferias do capitalismo. Fronteiras conceituais e simbólicas, por fim, estarão
sendo igualmente experimentadas nas formas de pensar e representar as cidades:
metáforas econômicas poderosas estão sendo acionadas para redesenhar as condi-
ções do exercício dos processos decisórios em política urbana. A discussão de uma
urbanização de fronteira nos conduz necessariamente às fronteiras do urbanismo.
Ano XIII, N o 1 SU MÁ R IO
Jan- Jul 1999
Resumos e Abstracts , 7
Atualidade Analítica , 15
CO LABO RARAM NESTE NÚMERO
Erik Swingedouw, 17
Alfredo Wagner Berno de Almeida Produciendo Futuros: el sistema financiero
Ana Cristina Fernandes como proyecto geográfico
Célio Bermann
Fania Fridman Artigos , 49
Flávio Villaça Jan G. Lambooy,
Frederico G. Bandeira de Araujo Frank Moulaert, 51
Glauco Arbix La Organización Económica de las
Lilian Fessler Vaz Ciudades: una perspectiva institucional
Luciana C. do Lago Rainer Randolph, 83
Lúcia Maria M. Bógus
O Planejamento Comunicativo entre as
Perspectivas Comunitarista e Liberal: há
Milton Campanário uma “terceira via” de integração social?
Paulo Estevão M. dos Santos Lia Osorio Machado, 109
Sueli Schiffer Urbanização e Mercado de Trabalho na
Amazônia Brasileira
Erik Swingedouw
O artigo apresenta uma avaliação do This paper assesses the explicative pow-
poder explicativo das teorias neo-insti- er of the neo-institutionalist theories of
tucionalistas da organização e da desorga- the economic organization and disorga-
nização econômica das cidades e propõe nization of cities, stating some institu-
alternativas institucionalistas (evolutivas tionalist (evolutionist or regulationist)
ou regulacionistas) a essas teorias. Tendo alternatives to these theories. The text
por referência as teorias econômicas neo- makes reference to the neoinstitution-
institucionalistas tal como as define alist economic theories as defined by Eg-
Eggertsson, ou seja, o pensamento de gertsson, that is, the neoclassical tradition
tradição neoclássica, suavizado em suas modified by a more moderate reference
hipóteses de ausência de restrições insti- to the hypothesis of absence of insti-
tucionais no comportamento econômico, tutional restrictions to the economic
de informação perfeita e de intercâmbio behaviour, perfect information and ab-
sem custos, examinam-se inicialmente as sence of transactions costs. First, the text
conseqüências dos custos de transação examines the consequences of positive
positivos. Na segunda parte, resumem- transaction costs. Second, it resumes the
se as principais mudanças contempo- main contemporary changes in the eco-
râneas na organização econômica das nomic organization of cities, with spe-
cidades, com especial atenção aos se- cial attention to the growing importance
guintes aspectos: o crescimento dos servi- of professional services; the information-
ços profissionais; a cidade informacional; al city; the transactional city; the city as
a cidade transacional; a cidade como base of knowledge serving the innova-
base de conhecimentos para as ativida- tive activities of industry and services; the
Cadernos IPPUR 9
Rainer Randolph
O Planejamento Comunicativo The Communicative Planning
entre as Perspectivas Comunita- between the Communitarian and
rista e Liberal: há uma “terceira Liberal Perspectives: is there a
via” de integração social? “third way” to social integration?
O artigo apresenta uma descrição do This article attempts to describe the ur-
processo de urbanização na Amazônia banization process in the Brazilian Ama-
brasileira em três momentos, caracteri- zon region in different moments, each
zados por dinâmicas distintas de povoa- one presenting a different settlement
mento. Alguns aspectos das relações dynamics. Some of the conexions be-
entre urbanização e mercado de traba- tween urbanization and the labor mar-
lho são abordados em cada período, ket are explored, with emphasis on
com ênfase no período atual. Três noções current tendencies. The description was
básicas orientaram o trabalho: a) a evo- built on three basic notions: a) the non
lução não-linear da urbanização e das linear evolution of cities and urbaniza-
cidades; b) o vínculo entre urbanização tion; b) the link between urbanization
e sistema de povoamento; c) a subordi- processes and settlement systems; c) the
nação da ordem construída do sistema subordination of organized, deliberate
de povoamento à ordem espontânea order in the settlement system to a spon-
Cadernos IPPUR 11
dos mercados (de terras, de trabalho, taneous market order (of land, labor
de dinheiro). and money).
Este artigo aborda o planejamento estra- This article approaches city strategic
tégico de cidades a partir dos significados planning through the meanings which
que emergem da afirmação contempo- come up from contemporary assertion
rânea da metáfora cidade-empresa. São of company-city metaphor. There are
identificados, nas práticas e discursos identified, in contemporay practices
contemporâneos, elementos que reve- and discourses, the elements which
lam uma submissão da política urbana unveil urban politics submission to ef-
à performance eficaz e, portanto, à téc- fective performance, therefore, to tech-
nica. Não só os mesmos diagnósticos e nique. Not only the same diagnosis and
meios para a integração competitiva no means to competitive integration into
mundo globalizado são enunciados e globalized world are enunciated and
defendidos por autores de diversas defended by authors from different
origens, como os próprios vocabulários origins, but the vocabulary itself used
desses autores celebram palavras e ex- by these authors is made of words and
pressões-chave que reafirmam, pela re- expressions which restate, through
petição exaustiva, o que constituiriam exhaustive repetition, prescriptions to
receitas para as cidades. No planeja- cities. In the city strategic planning and
mento estratégico de cidades e na afir- in the company-city metaphor what is
mação da metáfora cidade-empresa, o important is not to try to understand
que está em jogo não é procurar com- what is a city, nor what could be called
preender o que é a cidade, nem estabe- a fair city, but what makes a city more
lecer o que seria uma cidade justa, mas effective in economic competition.
determinar o que torna uma cidade
mais eficaz na competição com seus con-
correntes.
Wilhelm Meiners
O presente texto aborda o recente ciclo The text treats the recent cycle of auto-
de investimentos automobilísticos na motive investments in the Brazilian econ-
economia brasileira, com ênfase nos fa- omy focusing on its main factors: the
tores que o conduziram, como a evolu- Brazilian automotive market’s evolution
Cadernos IPPUR 13
ção do mercado brasileiro nos anos 90, in the 90’s; the automotive system set-
a implantação do regime automotivo, a ting up; the foreign investment that has
retomada do investimento externo no taken up again in this sector; and the
setor e a competição na disputa regio- inter-regional competition for the new
nal pelas novas plantas automotivas. O automotive plants. This factors are dis-
trabalho pretende discutir as forças que cussed as significant forces acting in the
impulsionaram esse ciclo de investimen- context of the “fiscal war” established
tos no contexto da guerra fiscal estabe- among regions in order to attract the
lecida entre as regiões para a atração automotive industries.
das montadoras.
Erik Swyngedouw
mundial. Por ejemplo, sólo en los mer- carteras de inversión, como los fondos
cados de divisas, la cantidad neta diaria de pensiones (véase Clark, 1993b), están
que circulaba en 1992 era de 900 mil estrechamente relacionadas con esta eco-
millones $USA, alrededor de 12 veces nomía de “casino”, como Strange (1986)
más que el PIB total de los países de la de forma tan acertada la describió.
OCDE sobre una base anualizada. Las
transacciones realizadas en el mercado Las devaluaciones y apreciaciones
internacional de capitales varían entre de las monedas resultan, a menudo, de
el 135% del PIB en EE.UU. y el 1000% una intensa actividad especulativa, tal y
en Gran Bretaña (BIS, 1994, pg. 174- como ocurrió en septiembre de 1992
175). cuando la libra esterlina se vio forzada a
abandonar el mecanismo de tipos de
Desde una perspectiva geográfica, cambio europeo, y también afectan a la
estos flujos son, por supuesto, eminente- vida diaria de forma importante, algunas
mente espaciales. Se mueven de un sitio veces acabando con cantidades consi-
a otro y, durante el proceso, afectan a derables de riqueza y valor potencial a
las condiciones “locales” de los extremos golpe de unas pocas teclas de ordenador.
emisor y receptor del flujo. Los momen- La espectacular quiebra virtual del con-
tos y casos de estos “espacios de flujos”, dado de Orange (el condado con la
a los que Castells (1989) concede gran renta media más elevada de EE.UU.)
importancia, generan geografías singu- en diciembre de 1994, cuando no pudo
lares y diferenciadas. Además, estos refinanciar su fondo de inversión, fuerte-
confieren una forma y una distribución mente apalancado, con que sus gestores
geográfica a las redes de telecomunica- de cartera habían apostado equivoca-
ciones y a las autopistas de la información damente en el mercado de futuros, cos-
que vinculan a los mercados financieros tará a los contribuyentes unos 2 mil
en una red densa y compleja de sistemas millones de $USA, según las estimacio-
de transacciones que operan las 24 nes, y reducciones y recortes en la pro-
horas del día (Thrift, 1986; Warf, 1989). visión de servicios sociales, ambientales
y educativos durante años (The Orange
Por tanto, no es preciso indicar que County Register, 7 de diciembre, 1994).
la economía global se encuentra profun-
damente afectada por este crecimiento Por supuesto, los lugares no son
en espiral de los mercados financieros in- meros receptores pasivos que se amol-
ternacionales. Pero es evidente que estas dan a los caprichos de los flujos moneta-
condiciones del sistema financiero inter- rios. Por el contrario, las configuraciones
nacional no sólo afectan a las configura- locales específicas de autorización y de-
ciones geográficas globales y a las sautorización social y su dinámica juegan
tensiones político-económicas, sino que un papel decisivo. Las políticas regula-
también influyen e, incluso, determinan doras nacionales, las características de
el entorno diario y las perspectivas de los centros financieros locales, el funcio-
cada uno de nosotros. Por ejemplo, las namiento de la economía nacional, etc.
Erik Swyngedouw 19
carteras. De hecho, el dinero nos per- quiebra del Barings, el banco de nego-
mite almacenar valor y acumular rique- cios británico más antiguo, expuso per-
za. Uno comienza con dinero e intenta fectamente (The Economist, 4 de marzo
terminar con más valor acumulado. Este 1995; Tickell, 1995). Así, estos caprichos
intrincado y casi místico proceso sólo de los mercados monetarios sugieren
puede llevarse a cabo convirtiendo el que, quizás, el dinero no es un recipiente
dinero en algo más, esto es, en otros de valor tan fiable como a menudo su-
bienes aunque, por supuesto, el objeto p on emos.
de estos intercambios puede ser otra
clase de dinero (por ejemplo, oro por El dinero también está estrecha-
dólares o dólares por libras). Esta trans- mente relacionado con el crédito. Los
formación muestra el vínculo entre la bancos conceden préstamos (a los es-
circulación del dinero y el movimiento tados, las empresas y los particulares),
del trabajo, los medios de producción especulando sobre el éxito de alguna
como maquinaria, carreteras y similares, empresa futura. Esto es precisamente lo
los recursos y la naturaleza (véase que el sector financiero ha hecho tradi-
Cronon, 1991). cionalmente. Los bancos reúnen gran-
des sumas de dinero y conceden créditos
Por otro lado, el dinero es mucho que los prestatarios deberán devolver
más que ese instrumento de circulación, con intereses. Por supuesto, esto depen-
un depósito de valor y un mediador en de de que el uso futuro tenga éxito, lo
el proceso de interacción entre sociedad cual no puede garantizarse de forma
y naturaleza. Aunque representa cierto alguna. La reciente utilización de la fi-
tipo de valor, facilitando el intercambio nanciación Ponzi y la megalomanía de
y permitiendo la acumulación, el dinero los bonos basura durante los ochenta
es, en última instancia, un trozo de papel asociaron las operaciones arriesgadas y
o de metal o, en los últimos años, una fuertemente especulativas a las expecta-
serie de bits y bytes que atraviesan a toda tivas de rápidos beneficios. Sin embargo,
velocidad las autopistas de la informa- cuando la deuda aumentó, el dinero se
ción, lo que, en esencia, le proporciona devaluó o los tipos de interés se dispa-
un carácter ficticio y lo convierte en algo raron, esta burbuja especulativa explotó
intrínsecamente especulativo (Harvey, y tuvo dramáticas consecuencias sociales
1982). Donde quiera que lo almacene- y políticas.
mos o lo movamos, contamos con que
mañana o al año siguiente todavía De todo ello se podría extraer otra
podremos intercambiarlo por cosas de- paradoja. No podemos imaginar la vida
seables y de que mantendrá, o preferi- sin dinero; es impensable una economía
blemente aumentará, su valor cuando integrada con mercados globales en la
aparezca de nuevo al final de la línea de que el dinero no intervenga en las inter-
flujo. Esta es una apuesta que, a menu- minables transacciones que dan cierta
do, no está en absoluto garantizada clase de coherencia a la sociedad de
como, por ejemplo, en el caso de la mercado. En esencia, la producción, el
Erik Swyngedouw 21
mente el marco durante un mes. La pun- dejando de lado la definición del dinero
tilla llegó finalmente cuando Nixon uni- como contenedor estable de valor abso-
lateralmente anunció en 1971 que los luto. La homogeneización impuesta del
Estados Unidos abandonaban la con- orden monetario mundial se desintegró.
vertibilidad garantizada del dólar en oro. El orden global se hizo añicos, pero en
Otros estados decidieron desligar sus los intersticios de este mosaico se fragua-
monedas del dólar para no ser atraídos ban nuevos acuerdos globales-locales
por la espiral devaluadora en la que el (“glocales”) y aparecían nuevos flujos
dólar se vio envuelto durante los años monetarios y nuevas configuraciones
70. Entre 1971 y 1973, el acuerdo de geográficas.
Bretton Woods comenzó a resquebrajarse
a medida que las divisas comenzaron a La debilitada posición competitiva
flotar unas frente a otras y frente al oro estadounidense, sus problemas de ba-
(u otros bienes) (Reszat, 1993). lanza de pagos y su creciente déficit pre-
supuestario (que alcanzó cotas dramáticas
En resumen, esta dinámica geográfi- durante la carrera armamentística de
ca y sus relaciones de poder desencade- Reagan) hizo que Estados Unidos se vol-
naron una serie de tensiones y procesos viese mucho más introspectivo. Su polí-
que, finalmente, socavaron la relativa tica monetaria fue dirigiéndose cada vez
coherencia de esta peculiar configura- más hacia objetivos internos. Por supues-
ción geográfico-histórica de la economía to, la creación de “xeno-dólares” también
del mundo capitalista. Las contradic- afectó al orden mundial. En un intento
ciones geográficas internas que propor- de traspasar la crisis devaluatoria a los
cionaron a la economía capitalista su demás, Carter buscó cuadrar sus cuentas
dinamismo y creatividad, también mina- imprimiendo dólares, lo cual provocó una
ron de forma continua los fundamentos rápida devaluación del dólar frente al oro
sobre los que descansaba. y desencadenó una espiral inflacionista
que disparó la inflación hasta los dos dígi-
tos. Cuando el dólar alcanzó su cotización
La fragmentación espacial y más baja a finales de los setenta y la espiral
la integración financiera: el inflacionista estaba fuera de control, el
nuevo escenario “glocal” del monetarismo reaganiano aplicó una polí-
dinero tica monetaria restrictiva y redujo la oferta
de dinero. El valor del dólar y los tipos
La perspectiva de un orden capitalista de interés reales crecieron vertiginosa-
global estable, prometida en la era de mente, difundiendo la crisis por toda la
la posguerra, demostró no ser más que economía mundial y, perjudicando en
un espejismo. La consecuencia real de concreto, a los Estados deudores (Cor-
la desaparición de Bretton Woods fue bridge, 1993).
que el dólar comenzó a flotar libremente
frente al oro, con lo que se restableció Sin embargo, dado que el dólar to-
como una medida relativa de valor, davía era una moneda mundial y un
Erik Swyngedouw 31
medio de cambio global, los exporta- y otros países de Europa, tuvieron que
dores de bienes se enfrentaban al peligro hacer frente al deterioro de sus balanzas
de verse arrastrados dentro de la espiral comerciales y a unos déficit presupuesta-
devaluatoria. En un intento de salva- rios astronómicos, como resultado del
guardar los precios de los bienes frente debilitamiento de sus posiciones com-
a la caída del dólar se formaron varios petitivas junto con un aumento de la de-
carteles. Debido a una serie de razones manda favorecido por el estado para
político-económicas, la OPEP fue el de mantener cierta cohesión social. Algunos
mayor éxito. Cada vez que el dólar ba- países intentaron inflar su deuda ince-
jaba, con un mínimo de todos los tiem- santemente imprimiendo más dinero (al
pos a finales de los setenta, el precio del final de la década eran habituales los ni-
crudo crecía espectacularmente. Ade- veles de inflación de casi el 20%). Esto,
más, la necesidad de un valor seguro por supuesto, socavó aún más lo que
provocó una lucha por el oro, haciendo quedaba de la estabilidad monetaria. A
subir su precio. Es evidente que estas la inestabilidad de los tipos de cambio
sacudidas en los mercados de bienes hubo que añadir el hecho de que los
afectaron tanto a las relaciones comer- tipos de interés también comenzaron a
ciales como a las estructuras de precios fluctuar con rapidez y de forma errática.
y contribuyeron a extender la crisis eco-
nómica. La incertidumbre sobre el valor Japón, cuyo proceso de renovación
monetario afectó negativamente al co- industrial ya había finalizado, logró
mercio internacional y reforzó los dese- crecer aún más y liderar algunos de los
quilibrios espaciales estructurales. Por territorios que habían quedado fuera de
ejemplo, la escalada del precio del petró- la influencia de Europa y EE.UU.. En
leo dio como resultado una afloración este contexto en el que las configura-
masiva de dólares procedentes funda- ciones geográficas estaban cambiando
mentalmente de las economías avanza- rápidamente, las llamadas al proteccio-
das y a la creación de una amplia reserva nismo y de hecho las medidas proteccio-
de petrodólares, que más adelante ali- nistas para proteger el mercado interior
mentarían los mercados de eurodólares. de las devaluaciones importadas, favo-
Las cosas fueron sustancialmente peor recieron la aparición de varios bloques
para aquellas economías del Tercer comerciales (Thurow, 1992). Esto no
Mundo que vieron que los precios de supuso de ningún modo el aislamiento
exportación se hacían cada vez más ines- hermético de la economía mundial –
tables mientras que los precios de las por el contrario, un objetivo del protec-
importaciones (y, desde luego, del petró- cionismo es reforzar las posiciones com-
leo) continuaban subiendo. Así, mientras petitivas en el mercado mundial (véase
algunos países iban acumulando enor- Hilferding, 1981). Se formaron tres blo-
mes superávit en sus balanzas comer- ques, que se centraron respectivamente
ciales, otros sufrían un intenso drenaje alrededor de Japón, los Estados Unidos
de fondos. Occidente y en particular y el eje germano-francés en Europa.
EE.UU., aunque también Gran Bretaña Naturalmente el aumento de la coope-
32 Produciendo Futuros: el sistema financiero como proyecto geográfico
Orige n de lo s de rivado s
Muchos de los instrumentos derivados no son especialmente nuevos. Por ejemplo, los futuros y
opciones sobre mercancías se utilizan desde mediados de la década de 1860 (véase Cronon,
1991). El primer swap se negoció en 1962. Sin embargo, la creciente incertidumbre de los mer-
cados financieros desde mediados de los 70 ha favorecido la proliferación de nuevos instru-
mentos como protección frente a los riesgos asociados a la volatilidad de los mercados de
divisas, a la rápida fluctuación de los tipos de interés, etc. El mercado de derivados permite una
mejor gestión del riesgo. No obstante, los derivados también se utilizan para actividades pura-
mente especulativas. En este sentido, su proliferación refuerza aún más la volatilidad e incerti-
dumbre del mercado. Su rápido crecimiento se ha acelerado por la globalización de los
mercados de capital, los avances tecnológicos en el terreno informático y de las telecomunica-
ciones, la liberalización de los mercados y la creciente competencia entre las instituciones finan-
cieras para inventar y vender nuevos productos.
De finic io ne s de los derivado s más impo rtante s
Opc ió n: Es el derecho a comprar o vender un número concreto de valores/títulos (monedas,
acciones, mercancías, etc.) a un precio específico dentro de un período determinado de tiempo.
Este derecho (la opción) también puede comprarse o venderse (en el mercado de opciones),
pero si el derecho no se ejercita dentro del período especificado, entonces expira y el compra-
dor de la opción pierde su dinero.
Futuro : Es un contrato para comprar o vender algo en el futuro a un precio acordado en el
momento actual. Al contrario de lo que ocurre con una opción, un futuro debe ser ejercitado al
final del contrato. Sin embargo, esto rara mente sucede en la práctica puesto que las partes en
general acuerdan liquidar sólo la diferencia entre el precio acordado y el precio efectivo en el
momento en el que el contrato se ejercita. Existen futuros para todo tipo de activos, desde
tripas de cerdo hasta índices del mercado bursátil.
S wap: Se trata de una transacción en la que las dos partes intercambian activos financieros.
Existen muchos tipos de swaps, por ejemplo, swaps sobre monedas o sobre tipos de interés. En
este último caso, por ejemplo, un prestatario que ha solicitado un préstamo en marcos ale-
manes intercambia el pago de los intereses sobre este préstamo por los de otro prestatario que
haya solicitado un préstamo en libras esterlinas.
De rivados mixto s: En los últimos años, se han introducido algunos instrumentos nuevos que
combinan una o más de las transacciones básicas anteriores (floors, caps, collars, swaptions...).
El control de estos sofisticados instrumentos puede llegar a ser muy complejo y exige unos siste-
mas informáticos y un software muy avanzados.
Proble mas
En la actualidad el mercado de derivados se encuentra sin regular. Los reguladores nacionales
e internacionales están muy preocupados por las consecuencias potencialmente ca tastróficas
que la proliferación y expansión de este mercado pueden provocar en la estabilidad del sistema
financiero internacional. Los inversores corren a menudo grandes riesgos, operando, en ge-
neral, con activos fuertemente apalancados en un mercado muy volátil. Se conocen muchos
ejemplos de fondos de inversión que pierden millones de dólares (véase Cuadro 1). Como el
mercado de derivados funciona con sólo una fracción del valor de los activos subyacentes, las
cosas pueden fallar estrepitosamente (como en el caso de la quiebra del Banco Barings). Dadas
las densas relaciones existentes en el sistema financiero internacional, una quiebra en un sitio
podría extenderse a través del sistema en un efecto dominó (Grupo de los Treinta, 1993;
Comité Basle, 1994).
Para más detalles, véase Becketti (1993), Grupo de los Treinta (1993), Hindle (1994), United
States General Accounting Office (1994), The Economist, 18 mayo 1994.
38 Produciendo Futuros: el sistema financiero como proyecto geográfico
Un problema más grave que este compañía necesitó reestructurar sus acti-
escenario funesto de hundimiento global vidades para cubrir las pérdidas, lo que
es la posibilidad de que se devalúen y provocó la desaparición de alrededor de
desaparezcan miles de millones de dóla- 10.000 puestos de trabajo (Verbraeken,
res o yenes o libras mientras continúa cre- 1994, p.34) Durante la primera mitad
ciendo la polarización socio-económica, de octubre de 1994, el rublo cayó de
la pobreza y el sufrimiento humano y un 2.000 a 5.000 rublos por dólar. Gran
número cada vez mayor de personas no parte de los 2.300 bancos comerciales
consigue satisfacer muchas necesidades que existían en Rusia hicieron poco más
básicas. Por ejemplo, cuando la empresa que especular con estos cambios. No es
alemana del metal y el petróleo Metall- necesario detenerse en los efectos de esta
gesellschaft perdió más de 1.300 millones volatilidad en los precios de los alimentos
de dólares como resultado de operacio- y la energía para los pobres de Rusia
nes efectuadas en el mercado de deriva- (Higgins, 1994).
dos que quedaron fuera de control, la
Referencias bibliográficas
A RMSTRONG , P., G LYN , A., H ARRISON , J. __________. Bank for International Set-
Capitalism since 1945. Oxford: tlements, 63rd Annual Report, 13th
Blackwell, 1991. June 1994, Basle: BIS , 1993a.
B ASLE COMMITTEE “The Capital Adequacy __________. Central Bank Survey of For-
Treatment of the Credit Risk eign Exchange Market Activity in
Associated with Certain Off-Balance- April 1992, Bank for International
Sheet Items”. Internal Document, Settlements, Basle, March 1993b.
released 15 July 1994, Basle, 1994.
__________. Bank for International Set-
B ECKETTI , S. “Are Derivatives too Risky tlements, 64th Annual Report, 13th
for Banks?”, Economic Review, June 1994, Basle: BIS , 1994.
Federal Reserve Bank of Kansas
City, Third Quarter, p. 28-41, 1993. B ORRMANN , A., K OOPMANN , G. “Region-
alisation and Regionalism in World
B HAGWATI , J. The World Trading System Trade”, Intereconomics, 29, 163-
at Risk: London: Harvester Wheats- 71, July/August 1994.
heaf, 1991.
B UDD , L., W HIMSTER , S. (eds.) Global
BIS. Bank for International Settlements, Finance and Urban Living. London/
57th Annual Report. Basle: BIS, 1987. New York: Routledge, 1992.
44 Produciendo Futuros: el sistema financiero como proyecto geográfico
C ASTELLS , M. The Informational City. G LYN , A. et al. The Rise and Fall of the
Oxford: Blackwell, 1989. Golden Age. Working Paper 43,
World Institute for Development
CLARK, G. L. Pensions and Corporate Re- Economics Research, Helsinki,
structuring in American Industry: The United Nations University, 1988.
crisis of regulation. Baltimore: The
Johns Hopkins University Press, 1993. G OWA , J. Closing the Gold Window.
Ithaca, NY: Cornell University Press,
COOKE et al. Toward Global Localisation. 1983.
London: University College Press,
19 92 . GROS, D., THYGESEN , N. European Mo-
netary Integration: From the Euro-
Corbridge, S. Debt and development. pean Monetary System towards
Oxford: Blackwell, 1993. Monetary Union. London: Longman,
19 92 .
COX , R. Production, Power and World
Order. London/New York: Columbia G ROSSMANN , H., K OOPMANN , G.
University Press, 1987. M ICHAELOWA , A. “The New World
Trade Organization: Pacemaker for
C RONON , W. Nature’s Metropolis – World Trade?”. Intereconomics, 29,
Chicago and the Great West. New 107-15, May/June 1994.
York: W W Norton & Co., 1991.
GROUP OF T HIRTY Derivatives: Practices
D RACHE, D., G ERTLER , M. “The World and Principles. Washington, DC, Glo-
Economy and the Nation-State: The bal Derivatives Study Group, 1993.
New International Order”. In:
D RACHE, D., G ERTLER , M. (eds.) The HARVEY, D. The Limits of Capital. Oxford:
New Era of Global Competition – Blackwell, 1982.
State Policy and Market Power.
Montreal/Kingston: McGill-Queen’s __________. Consciousness and the Urban
University Press, 3-25, 1991. Experience. Baltimore: The Johns
Hopkins University Press, 1985.
T HE E CONOMIST. “The Collapse of Barings
- A Fallen Star”, The Economist, 19- __________. The Condition of Postmod-
21, 4 March 1995. ernity. Oxford: Blackwell, 1989.
J OHNS, A. “Not Tax Havens, Havens for M ASSEY , D. “Politics and Space/Time”.
Transnational Invisible Trade Enter- New Left Review, 196, 65-84, 1992.
prise”. Intereconomis, 29, 26-32,
January/February 1994. __________. “Power-geometry and a
Progressive Sense of Place”. In: B IRD ,
K REDIETBANK . “De Nieuwe Financiale J. et al. (eds.) Mapping the Futures –
Instrumenten - Weldaad of Kwaad?”. Local Cultures, Global Change.
Weekberichten, 47(36), 1-5, 1992. London: Routledge, 59-69, 1993.
T HUROW , L. Head to Head: The Coming W ESTLAKE , M. “Latin Lovers”, Risk, 6(9),
Economic Battle between Japan, 51-60, 1993.
Europe and America. 1992.
W ILSON , N. “Scratching the Surface”.
T ICKELL , A. “Making a Melodrama out Futures and Options World, p. 22-
of a Crisis: Interpreting the Collapse 23, September 1994.
of Barings Bank”. Mimeographed
Paper, School of Geography, Uni- W OOD , R. From Marshall Plan to Debt
versity of Manchester, Manchester Crisis. Berkeley: University of Cali-
M13 9PL, 1995. fornia Press, 1986.
I n tr o d u c ci ó n
1
Véase por ejemplo la evocación maravillosa de la vida en la Cartago antigua, en Haefs (1989).
en una lectura más amplia de las diná- lazos en la ciudad, con dinámicas socia-
micas institucionales y de los procesos les y políticas no reduccionistas.
económicos, es posible establecer unos
Durante, al menos, los últimos diez años, visión económica arrogante del nuevo
la geografía económica ha desempeña- arquetipo urbano.
do un papel fundamental dentro del de-
bate sobre la reestructuración del sistema
productivo en el mundo capitalista. Entre El nuevo arquetipo urbano
los temas conocidos de este debate se
encuentran: la transición del fordismo a Las ciudades contemporáneas económi-
los modos de organización de la produc- camente “modernas” suelen represen-
ción posfordistas (Moulaert y Swynge- tarse como entidades territoriales cuyas
douw, 1989), la geografía de sistemas dinámicas socioeconómicas están gober-
flexibles de producción con especial én- nadas por unos nuevos principios de
fasis en las, generalmente reconocidas y innovación y organización, coordinación
frecuentemente criticadas, formas espa- económica y gestión. Estos nuevos prin-
ciales del Distrito Industrial y Distrito de cipios corresponden a distintos concep-
Alta Tecnología (Benko y Lipietz, 1992; tos de ciudades grandes y dinámicas.
Goldstein, 1991; Massey, 1985). El aná- Cada concepto representa importantes
lisis urbano ha seguido esta tendencia, y dimensiones de la organización econó-
se ha ocupado bastante de las ciudades mica urbana actual.
globales prósperas y de los mecanismos
económicos que se esconden detrás de LA C IU D AD IN N O V AD O R A
su éxito. Una lectura no demasiado crítica
de esta literatura podría convencernos de Este concepto, el más genérico de todos,
que las ciudades están cerca de conver- se refiere principalmente a la ciudad
tirse en entidades económicas y políticas como agente dinámico en la innovación
racionales, siguiendo la lógica de com- tecnológica, fundamentalmente a través
portamiento económico racional de la de la creación de parques de innova-
economía neoinstitucional, capaz de ción, de políticas de formación y edu-
proporcionar una solución a todos los cación etc. (cfr., por ejemplo, Goldstein,
problemas metropolitanos tradicionales 1991). En los últimos años ha habido
(desempleo, pobreza, utilización de terre- un cambio en la forma de entender la
nos, decadencia física, crisis de la demo- innovación, pasando del enfoque pro-
cracia y del gobierno local etc.). Pero la piamente físico “hardware”, hacia una
realidad se encuentra muy lejos de esta perspectiva de la innovación basada en
Jan G. Lambooy y Frank Moulaert 55
bales en general son ciudades donde hay sólo unas decenas de sociedades urba-
una fuerte presencia de sedes de Corpo- nas pueden denominarse globales. Las
raciones Transnacionales que operan en otras ciudades, sin embargo, aunque
muchos continentes. Algunas tienen una hacen referencia a las características
especialización funcional (financiera, es- quizás más innovadoras de las econo-
tructura de control de ciertas industrias mías urbanas contemporáneas, dejan a
manufactureras etc.), aunque la mayoría un lado los resultados de etapas ante-
manifiestan un alto grado de integridad, riores del desarrollo urbano. Por lo tanto,
diversidad y complementariedad en sus el modelo ortodoxo basado en la combi-
funciones económicas, sociales, políticas nación de estas figuras entra fácilmente
y culturales. Su carácter geográfico y fun- en conflicto con las intenciones de sus
cional las sitúa como núcleo de muchas autores, acabando por utilizar las partes
redes internacionales (Lambooy, 1988; de la realidad urbana socioeconómica
Sassen, 1994; Shachar, 1996). Obvia- por el todo.
mente, la ciudad global posee gran parte
de las características de las figuras urba- El cuadro 1 resume este tipo de
nas anteriores. “partes por el todo”: señala cuáles son
las dimensiones de las figuras urbanas
citadas anteriormente que se mantienen
El problema de estos conceptos de en el “nuevo arquetipo urbano”. Esta
grandes ciudades dinámicas diferentes, síntesis ahistórica y no institucional, re-
no es que no existen, sino que, en reali- fleja claramente en muchos sentidos la
dad, en la economía urbana ortodoxa forma de pensar de la economía neoins-
suponen el modelo de economía urba- titucional y abandona el análisis llevado
na actual. Sin embargo, su importancia a cabo por los autores previamente ci-
estadística es parcial. En todo el mundo, tados.
La ciudad neoinstitucional
A pesar del escepticismo inicial frente al mica institucional de North (Eggertsson,
nuevo arquetipo urbano y sus bases teó- 1990; Hodgson, 1993). Finalmente, las
ricas, se necesita estudiar más de cerca consecuencias espaciales de la economía
la teoría económica neoinstitucional y neoinstitucional para la economía ur-
su significado en el análisis de la organi- bana, no se han resumido de manera
zación económica de las ciudades. Exis- aceptable nunca.
ten, al menos, tres razones para ello.
Primero, la teoría no es completamente
igual al arquetipo: es propiamente ins- Los fundamentos de la
tructiva. Segundo, hay muchas versiones economía neoinstitucional
de la economía neoinstitucional, desde
el enfoque transaccional de Coase Las nociones centrales de la economía
(1937) y Williamson (1975; 1985) hasta neoinstitucional son las transacciones y
una interpetación más amplia de la diná- los costes de la transacción, los derechos
Jan G. Lambooy y Frank Moulaert 59
2
En la interpretación de Williamson de los costes transaccionales: “Las transacciones pueden
tener lugar a través de los mercados o dentro de las organizaciones. Que una transacción
específica se asigne al mercado o a una organización, es una cuestión de minimización de
costes” (Williamson, 1975; 1985; Douma y Shreuder, 1992: 102).
3
Williamson no emplea bien el concepto de Simon de la obligada racionalidad. El concepto de
Simon de comportamiento satisfactorio no sólo se basa en la información limitada, sino
también en la dificultad de llevar a cabo todos los cálculos necesarios para poder tomar
decisiones racionales. Williamson pasa por alto éste último.
60 La Organización Económica de las Ciudades: una perspectiva institucional
la versión de Williamson sobre economía 1929; Isard, 1956; Phelps, 1992; Mou-
institucional, en la que defiende que las laert y Djellal, 1995). Sin embargo, el en-
instituciones sólo se crean para reducir foque de North resulta especialmente útil
los costes transaccionales. North matiza para aclarar algunas de las dinámicas ins-
este supuesto y ofrece una visión más titucionales en el mercado inmobiliario
amplia de la dinámica institucional – urbano (Van der Krabben y Lambooy,
aunque aún limitada al sistema econó- 19 94 ).
mico. Afirma que las instituciones se
crean para reducir la incertidumbre En los últimos años, la idea de eco-
típica del comportamiento humano. nomías de aglomeración ha experi-
North reconoce que la historia influye mentado una evolución importante.
en el cambio institucional, éste depende Gracias al debate acerca de los procesos
de la trayectoria que se haya seguido, y de transacción e innovación, se le ha
que incluso a largo plazo, no siempre dado un contenido más amplio a este
contribuye a una mayor eficiencia, concepto (Phelps, 1992). En primer
como sostenían los economistas neoins- lugar, sus dimensiones cualitativas han
titucionales “puros”. A su juicio, las reglas recibido mucha más atención. El enfo-
políticas predominan sobre las reglas que ha cambiado, pasando de efectos
económicas. Las instituciones cambian de escala a efectos de alcance (Goldstein
interactivamente; aunque North en- y Gronberg, 1984) y de economías de
tiende el cambio institucional como un localización a economías de urbani-
sistema mecánico: que se produce en zación (Lambooy, 1981; Moulaert y
sentido ascendente, generando resulta- Djellal, 1995). En segundo lugar, sus im-
dos crecientes en los procesos institucio- plicaciones espaciales se han analizado
nales de aprendizaje. Por consiguiente, mejor. De hecho, actualmente resulta
simplifica la complejidad de las relaciones mucho más sensato considerar “las aglo-
entre estructuras, instituciones y agentes. meraciones como redes de áreas muy
extensas” (Moulaert y Gallouj, 1993).
La ciudad institucional
La expresión “ciudad institucional” hace nal neoinstitucional, o incluso la teoría
referencia a una ciudad cuya organiza- de elección pública y del agente princi-
ción económica se explica en base a la pal. Otros, como Commons y Veblen,
teoría económica institucional. en En limitan la economía institucional a cam-
este enfoque pueden presentarse dos bios basados en el antiguo institucio-
ambigüedades. En primer lugar, el térmi- nalismo, sobre todo el de los EE.UU.
no economía institucional tiene varios (véanse Hodgson, 1988; 1993; Mou-
significados. Algunos autores entienden laert, 1987). Otros en cambio, identi-
como parte de ésta, la teoría transaccio- fican la economía institucional con la
64 La Organización Económica de las Ciudades: una perspectiva institucional
evolucionista (Hodgson, 1988: 13) 4. La (Hodgson, 1988). Esto fue tan cierto en
única manera de superar este problema los años 30, frente al crecimiento de la
conceptual es definiendo cuidadosa- economía neoclásica, como lo es hoy
mente lo que queremos decir con teoría día en contra de las distintas corrientes
institucional (véase lo siguiente). En se- de economía neoclásica y neoinstitucio-
gundo lugar, no existe una literatura nal. A pesar de este planteamiento “en
propiamente dicha sobre las consecuen- negativo”, la economía neoinstitucional
cias de la economía institucional en el no surge como un complemento a las
análisis de la organización económica de debilidades de la ortodoxia, sino como
las ciudades. Sin embargo, la literatura una agrupación coherente de contribu-
acerca del desarrollo económico local y ciones teóricas diferentes que cubren
los sistemas de gobierno (Colletis et al., distintos elementos de la dinámica
1990), los sistemas de innovación regio- reguladora socioeconómica (Moulaert,
nales (Abdelmalki et al., 1992) y sobre 1987).
la reestructuración económica de las
economías urbanas (Harloe, et al., En general, la economía institucional
1990) se apropia de forma significativa considera a los participantes de la econo-
de la teoría institucional, y especial- mía como seres humanos, y a la socioe-
mente de la economía evolucionista y conomía como un sistema. A diferencia
la teoría de regulación. Por lo tanto, se de la economía ortodoxa, y de la neoins-
puede considerar que la teorización de titucional, “las relaciones sociales, las de-
la organización económica desde el cisiones y las acciones en la producción
punto de vista institucional constituirá el e intercambio”, “la tecnología en relación
próximo paso lógico en el análisis urba- con la producción etc.” y “los gustos y
no contemporáneo. preferencias individuales” se consideran
partes endógenas de este sistema (Hodg-
son, 1988). Esto implica una serie de im-
Características de un portantes consecuencias: los gustos y las
enfoque institucional preferencias dejan de estar determinadas
por el sistema económico, sino que se
La economía institucional se desarrolla forman en él, e influyen en su evolución;
como respuesta a la incapacidad de la el desarrollo de la tecnología y la diná-
economía ortodoxa de ocuparse del ca- mica organizacional son parte del este
rácter social de las relaciones económi- proceso; la dinámica institucional llega a
cas, la heterogeneidad de las actividades ser considerablemente más compleja y
económicas y la complejidad de la re- realista. La coordinación económica en
gulación y coordinación económica términos de autoridad económica dentro
4
Algunos autores tienden a identificar el “viejo” institucionalismo, con la economía evolucionista.
Esto no es del todo adecuado, para uno de los principales representantes del viejo institu-
cionalismo, John Commons. A John Commons no se le puede considerar un evolucionista
en el sentido posdarwinista.
Jan G. Lambooy y Frank Moulaert 65
conducta individual y colectiva en los sub- tiva de las mismas, sino que pretende de-
sistemas de la sociedad urbana. Desde mostrar la complejidad de la dinámica
este punto de vista, el modelo instrumen- reguladora. Para conseguir elaborar este
talista de regulación con uno o varios cuadro, se empezó utilizando elementos
agentes (p.ej. agentes “del estado”) que de Peck y Tickell (1992), que explican
regulan (p.ej. grupos de ciudadanos, em- como la regulación económica que in-
presas, sindicatos) aplicando determina- fluye en el ámbito local, tiene lugar a dis-
das leyes y reglas políticas establecidas por tintos niveles espaciales. Aunque estos
la burocracia estatal, sólo es un caso espe- autores no los explotan, estos elementos
cial de regulación. La lista de formas ofrecen la oportunidad de extender el
reguladoras que muestra el cuadro 3, no argumento a formas de regulación no
pretende ser una reproducción exhaus- económicas e informales.
Referencias bibliográficas
F LOCH , Th. “Williamson et les coûts de H AEFS , G. Hannibal: der Roman Kartha-
transaction. Une relecture dans le gos. Zurich: Haffmans, 1989.
cadre du mode de recours aux ser-
80 La Organización Económica de las Ciudades: una perspectiva institucional
I SARD , W. Location and space economy. MOULAERT, F. “An institutional revisit of the
Cambridge, Mass.: MIT Press, 1956. Storper-Walker theory of labour”.
International Journal of Urban and
J ACOBS, J. The death and life of great Regional Research, 11.3:309-330,
American cities. New York: Doubleday 19 87 .
Anchor, 1961.
__________. “Rediscovering spatial ine-
J ONES , E. Metropolis. Oxford: Oxford quality in Europe. Building blocks
University Press, 1990. for an appropriate ‘regulationist’,
analytical framework”. Environment
K NIGHT , R. “The changing nature of city and Planning D: Society and Space,
development”. Urban Studies, 1995 v. 14, n. 2, London: Pion Limited,
(forthcoming). p. 155-179, abr. 1996.
1
Ver em particular os trabalhos apresentados nos últimos anos na ANPOCS: Randolph, R.
Acordos estratégicos ou alianças comunicativas: Formas alternativas de gestão e planeja-
mento urbano? Trabalho apresentado no XX Encontro Nacional da ANPOCS, Caxambu,
1996; Randolph, R. O planejamento comunicativo é possível? Indagações e reflexões sobre
novas formas de articulação entre espaço, Estado e sociedade no Brasil. Série Estudos e
Debates, n. 6, IPPUR/UFRJ: Rio de Janeiro, 1996, 22 p. (ANPOCS 1995); e Randolph, R.
Gestão comunicativa versus gestão participativa: Novas formas de responsabilidade política
ou velhas irresponsabilidades? Trabalho apresentado no XVIII Encontro Nacional da ANPOCS,
Caxambu, nov. 1994.
2
Como afirmaram, em relação ao projeto da reforma urbana no Brasil, os autores Ribeiro,
L.C.Q., Santos Jr., O.A., Das desigualdades à exclusão social, da segregação à fragmentação:
os novos desafios da reforma urbana. Cadernos IPPUR, ano VII, n. 1, jun. 1993, p. 53-61.
3
Existem, especialmente na literatura norte-americana, uma série de sínteses e análises a
respeito dessa trajetória; ver, por exemplo, Hudson, B.M. Comparison of current planning
theories: Counterparts and contradictions. American Planning Association Journal, oct. 1979,
p. 387-398; Galloway, Th.D., Mahayni, R.G. Planning theory in retrospect: the process of
paradigm change. American Planning Association Journal, jan. 1977, p. 62-77.
4
Consideramos pioneiros o americano John Forester e a inglesa Patsy Healey; ver particularmente
a explicitação em Healey, P. Planning through debate: the communicative turn in planning
theory. In: Fischer, F., Forester, J. (eds.) The argumentative turn in policy analysis and planning.
Durham and London: Duje University Press, 1993; uma análise dessa autora do sistema de
planejamento na Inglaterra encontra-se em Healey, P. The reorganisation of State and market in
planning. Urban Studies, v. 29, n. 3/4, 1992, p. 411-434; no último Encontro Nacional da
ANPUR em maio de 1999 em Porto Alegre uma colega americana, Judith Innes, apresentou
uma experiência de São Francisco apoiada explicitamente na mesma base dos outros autores
e que aponta na mesma direção.
5
Apresentamos já em 1994 uma primeira sistematização em Randolph, R. Gestão comunica-
tiva versus gestão participativa:, op. cit.
6
Característica destacada na literatura mais recente sobre reforma urbana e planos diretores e
considerada como traço de um novo “paradigma” de planejamento urbano – pelo menos
em relação ao modelo tecnocrático dos anos 70 no Brasil – por Gondim, L. O plano diretor
como instrumento de um pacto social urbano: quem põe o guizo no gato. In: Farret, R.L.
(org.) Modernidade, exclusão e a espacialidade do futuro. (Anais do VI Encontro Nacional da
ANPUR), Brasília: ANPUR, 1996, p. 223-235.
7
Sem serem contraditórias ou exclusivas, as duas abordagens estão tendencialmente em
permanente conflito por causa do dilema, em contextos históricos concretos, do planeja-
mento capitalista entre “desenvolvimento” e “democracia” ou acumulação e legitimação; ver
nossos breves apontamentos a esse respeito em Randolph, R. Acordos estratégicos ou alian-
ças comunicativas, op. cit.
Rainer Randolph 85
8
Ver ibidem.
9
Pelo menos quando se adota como referencial conceitual para a compreensão das sociedades
contemporâneas (e, apesar de todas as suas particularidades, também da brasileira) a visão
habermasiana de uma profunda contradição lógica entre atos comunicativos e atos estratégicos
(superada apenas dialética e concretamente nas práticas sociais cotidianas); ver Habermas, J.
Ações, atos de fala, interações mediadas pela linguagem e mundo da vida. In: idem, Pensamento
pós-metafísico. Estudos filosóficos. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1990, p. 65-103.
10
Ver a nossa discussão em torno do caráter estratégico do Programa Favela Bairro da Prefeitura
do Rio de Janeiro, que contém uma caracterização desse plano: Randolph, R. Plano Estratégico
e urbanização de favelas no Rio de Janeiro: Análise de aspectos estratégicos do Programa
Favela-Bairro. Trabalho apresentado no VII Colóquio sobre Poder Local, UFBA/NPGA, Salvador,
abr. 1997; e também Vainer, C.B. Cidades, cidadelas e a utopia do reencontro - uma reflexão
sobre tolerância e urbanismo. Cadernos IPPUR, ano XII, n. 1, jan./jul. 1998, p. 33-46.
11
Para essa primeira aproximação pautamos nosso estudo no breve artigo de Habermas, J. Três
modelos normativos de democracia. Lua Nova, Revista de Cultura e Política, 1995, n. 36, p.
39-48 (com um adendo editorial nas p. 48-53); esse texto, que teve sua origem numa
conferência proferida por Habermas na Espanha em 1991, foi incorporado ao seu livro
Habermas, J. Faktizität und Geltung. Beiträge zur Diskurstheorie des Rechts tund des
democratischen Rechtsstaats. Frankfurt/M.: Suhrkamp, 1992; portanto, seria através desse
livro – recentemente traduzido para o português – que poderíamos aprofundar nosso debate
com esse autor; uma empreitada suficientemente complexa que ultrapassaria os limites do
atual ensaio; ver Habermas, J. Direito e democracia. Entre facticidade e validade. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2 tomos, 1997/98.
86 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
12
Seguindo basicamente a interpretação de Azevedo, Sergio de. Planejamento, cidade e demo-
cracia: reflexões sobre o papel dos governos locais nos anos 90. In: Diniz, E., Lopes, J.S.L.,
Prandi, R. (orgs.) O Brasil no rastro da crise: partidos, sindicatos, movimentos sociais, Estado
e cidadania no curso dos anos 90. São Paulo: ANPOCS, HUTCITEC, 1994, p. 244-270.
13
Refutamos, com isso, visões a-históricas ou psicológico-reducionistas que vêem no “plane-
jamento” ou na sua “racionalidade” um traço característico universal da atuação humana ou
de sua ação orientada por objetivos. Não podemos concordar, portanto, com Hudson, quando
identifica as ordens do rei Hammurabi da Babilônia de encravar as leis em pedra como
planejamento; ver Hudson, B.M. Comparison of current planning theories: Counterparts and
contradictions. American Planning Association Journal, oct. 1979, p. 387-398, p. 387.
14
É Boaventura Santos que atribui a esses três autores os três princípios da construção da
regulação que representa um dos pilares do projeto da modernidade: o princípio do Estado
(Hobbes), o princípio do mercado (Locke) e o princípio da comunidade (Rousseau); ver
Santos, B. Pela mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez,
1996, 2. ed., p. 236.
Rainer Randolph 87
é a natureza desse Estado e sua relação/ vez mais complexas; exige-se, portanto,
intervenção com/em a “sociedade”. uma atuação complementar e corretiva
do próprio Estado (governo).
Antecede, ainda, ao surgimento do
planejamento propriamente dito o Surgem assim, a partir dos anos 30,
avanço de uma “gestão racional” dos as primeiras práticas sistemáticas de in-
negócios do Estado capitalista, que pode tervenção “planejada” 16, que foram
ser identificado nos países capitalistas, objeto da nossa discussão em trabalho
quando tomam corpo a profissionaliza- anterior. 17
ção dos encarregados – transformados
em “administradores” – e a burocrati- No atual contexto, não é necessário
zação (condicionamento legal) dos pro- aprofundar o estudo dos diferentes
cessos administrativos. modelos de planejamento que foram
desenvolvidos a partir daí. A propa-
Portanto, mais do que uma simples gação, a aceitação e o (muitas vezes par-
“racionalização”, o planejamento pode cial) abandono desses modelos pelos
ser entendido – em primeira aproxima- planejadores gerou uma certa seqüên-
ção – como “racionalização da raciona- cia em que os períodos da hegemonia –
lização” 15. Em termos mais concretos, discursiva ou mesmo prática – de um
diante das ameaças internas ao próprio modelo não excluía integralmente os
sistema de mercado na crise de 1929/ anteriores.
30, o projeto liberal dominante sofre uma
adaptação (Keynes) que procura instalar Assim, existem várias classificações
mecanismos complementares de solução a respeito das diferentes “fases” do pla-
dos problemas socioeconômicos. A lógica nejamento que foram experimentadas
(racional) da distribuição e alocação de em países capitalistas no século XX, com
recursos através dos mercados não pare- certas diferenças históricas, que, no en-
ce ter uma capacidade de condução sufi- tanto, conviviam mais ou menos paci-
ciente em sociedades e economias cada ficamente durante certos períodos 18.
15
Habermas chamou planejamento uma vez de “racionalização da racionalização”; ver Habermas,
J. Técnica e ciência enquanto “ideologia”. In: Os Pensadores - Benjamin, Habermas, Horkheimer,
Adorno. São Paulo: Abril Cultural, 2. ed., 1983, p. 313-343; aqui p. 313: “ A planificação
pode... ser concebida como um agir racional-com-respeito-a-fins, de segundo grau: ela se
dirige para a instalação, para o aperfeiçoamento ou para a ampliação do próprio sistema do
agir racional-com-respeito-a-fins.”
16
No sentido de uma “racionalidade instrumental” propriamente capitalista; há quem qualifi-
que as intervenções urbanísticas do século passado e do início do atual como “resquício”
feudal em plena consolidação capitalista.
17
Ver Randolph, R. O planejamento comunicativo é possível?, op. cit.
18
É óbvio que há enormes diferenças entre as experiências dos países industrializados e outros
que, na época, apenas iniciaram esse processo; sem falar daquelas diferenças oriundas dos
sistemas políticos e regimes governamentais.
88 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
19
Ver para o aprofundamento das explicações das tradições citadas, as contribuições de Davidoff,
Reiner, Lindblom e outros na já clássica coletânea de Faludi, A. (org.) A reader in planning
theory. Oxford e.o: Pergamon Press, 1973.
20
Ver Hudson, B.M. Comparison of current planning theories, op. cit., p. 388.
21
Há um nome principal relacionado a essa nova proposta, que é o de Charles Lindblom; ver
também Hudson, B.M. Comparison of current planning theories, op. cit., p. 389.
22
Ver idem, p. 390.
23
Hudson acrescenta ainda uma outra categoria: o planejamento radical que aparece mais
como proposta do que discurso/prática hegemônico; ver Hudson, B.M. Comparison of current
planning theories, op. cit., e nossa discussão em Randolph, R. O planejamento comunicativo
é possível?, op. cit.
24
Ver Fischer, F., Forester, J. (eds.) The argumentative turn in policy analysis and planning, op.
cit., e Brown, R.H. Social planning as symbolic practice, op. cit.
25
Ver – antes mesmo da publicação da Teoria da Ação Comunicativa – em Forester, J. Critical
theory and planning practice. American Planning Association Journal, july 1980, p. 275-
286, em que já apresenta tanto seu recurso à pragmática de Habermas como dois esquemas
sobre experiências de distorções na comunicação e as respectivas respostas para corrigi-las
como elementos chaves para sua teoria do planejamento; ver mais tarde em Forester, J.
Planning in the face of power. Berkeley e.o.: University of California Press, 1989; ver também
a apreciação da abordagem “foresteriana” por Gondim, L.M. Um encontro com Habermas
nas encruzilhadas da pós-modernidade: a contribuição de John Forester para uma teoria da
prática do planejamento. Cadernos IPPUR, ano IX, n. 1/4, jan./dez. 1995, p. 65-81.
Rainer Randolph 89
da habitação distribuídos entre diferen- desses governos e sua prática diante das
tes ministérios; política habitacional ato- enormes demandas imediatas, da falta
mizada em inúmeras instituições etc.). de consenso e de complexidades de im-
plementação de mecanismos de parti-
Assim, apesar de uma retórica de par- cipação direta 29.
ticipação, observa-se um retorno à si-
tuação anterior a 1964 (pós-Plano de Sem querer entrar em maiores deta-
Metas), quando prevaleceu um tênue lhes e apreciações mais aprofundadas,
planejamento incremental visando resol- dirigimos particular atenção às expe-
ver problemas pontuais e localizados. riências participativas em diferentes pe-
Porém, parece-nos que é também nessa ríodos. Conforme Azevedo 30, no Brasil
época da preparação da Constituinte e precisariam ser distinguidos duas dife-
do debate durante todo o período da rentes modalidades:
elaboração da Carta Magna que surgem
novas formas de envolvimento (“partici- (i) a primeira, denominada “participação
pação”) político por parte da sociedade 27. restrita e instrumental”, avaliada a
partir dos objetivos do governo,
De uma maneira geral, os disposi- surge para responder à crise do pla-
tivos da própria Constituição provocarão nejamento compreensivo na medida
novos esforços em torno do planeja- em que divide responsabilidades,
mento das cidades e resultarão em novos amplia recursos disponíveis (mão-de-
“pactos” (territoriais) 28; ao nível munici- obra gratuita ou sub-remunerada),
pal, as experiências recentes de governos aumenta a eficácia na alocação de
municipais sob controle do Partido dos recursos e eleva o nível de legitimação
Trabalhadores, que pretendem ampliar (governo, burocracias). As organiza-
a participação direta da comunidade ções associativas que aceitam a “par-
através da incorporação de “conselhos ceria” com o governo o fazem por
populares” e entidades congêneres no interesses bastante pragmáticos, a fim
processo decisório da administração pú- de conseguir recursos adicionais aos
blica, apresentam, na opinião do autor, eventualmente obtidos através dos
uma certa falta de clareza sobre a melhor programas tradicionais; é esta a mo-
forma de proceder. Em geral ocorreu dalidade que prevalece historica-
uma defasagem entre o discurso inicial mente no país;
27
Ver, por exemplo, as reflexões de Ribeiro, A.C.T. Reforma urbana: limites da participação
política na esfera local e exclusão social. Trabalho apresentado na 41ª Reunião Anual da
SBPC, Fortaleza, 1989.
28
Ver Ribeiro, L.C.Q., Cardoso, A.L. Plano Diretor e gestão democrática da cidade. Revista de
Administração Municipal, v. 27, n. 196, jul./set. 1990, p. 8-20; e as contribuições em Grazia, G.
da (org.) Plano Diretor: instrumento de reforma urbana. Rio de Janeiro: FASE, 1990.
29
Ver Azevedo, Sergio de. Planejamento, cidade e democracia, op. cit.
30
Ver idem.
Rainer Randolph 91
(ii) a segunda, que teve maior tradição No seu balanço da experiência par-
nos países da Europa Ocidental, cha- ticipativa, o autor se declara favorável à
mada de “participação ampliada ou participação ampliada: “sem nenhuma
neocorporativa”, ocorre normal- dúvida, ... [ela] ... pode vir a ser um
mente através da inclusão de orga- mecanismo importante de democratiza-
nizações associativas em órgãos ção do Estado e de incorporação pau-
colegiados do tipo “conselhos” ou latina de setores populares melhor
“comitês”. O neocorporativismo organizados na gestão da política urba-
pode ser visto como possibilidade de na nos diferentes níveis de governo.” 31
substituição do corporativismo in-
formal (que beneficia grupos com A diferenciação entre as duas mo-
maior poder econômico e político) dalidades, conforme introduzida por
por uma arena institucional com Azevedo, permitirá aperfeiçoar os argu-
regras claras e transparentes em que mentos já trabalhados nos citados traba-
todos os setores interessados numa lhos anteriores em que o planejamento
determinada política pública possam comunicativo foi analisado no contexto
discutir os seus rumos. dos mencionados modelos gerais, par-
ticularmente em confronto com o parti-
No Brasil essa experiência é relativa- cipativo.
mente incipiente por dois motivos: por
um lado, devido a resistências por parte Mostrará, o que julgamos ainda mais
do poder público (estatal); por outro, importante, a necessidade de aprofun-
pelo pouco interesse que desperta em dar a reflexão com respeito aos projetos
grande parte das associações, o que não políticos aos quais essas modalidades
surpreende porque a forma neocorpo- estão ligadas. Pois, apesar das aparentes
rativista costuma atrair organizações semelhanças entre planejamento comu-
reivindicativas de âmbito maior (fede- nicativo e a modalidade neocorporati-
rações, associações regionais, estaduais vista do participativo, a diferença entre
e nacionais) e os movimentos sociais eles deriva-se de duas concepções polí-
stricto sensu (ambientalistas, movimento ticas divergentes nas quais se baseiam,
negro etc.), que têm certo “cacife” de como demonstraremos a seguir.
barganha nas diferentes arenas políticas.
31
Idem, p. 256.
92 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
32
Ver, por exemplo, os capítulos (que têm sua origem em artigos da década de 80) do seu livro
Forester, J. Critical theory, public policy and planning practice. Albany: State University of
New York Press, 1993.
33
Ver sua elaboração em Randolph, R. Gestão comunicativa versus gestão participativa, op. cit.
34
Ver Habermas, J. Teoria de la acción comunicativa (2 v.). Madri: Taurus, 1989 (original em
alemão em 1981).
35
Como expressa logo o primeiro item da proposta de Healey, P. Planning through debate: the
communicative turn in planning theory, op. cit., aqui se mostra a clara referência ao pensa-
mento de Habermas; ver também as observações na nota de rodapé n° 24.
Rainer Randolph 93
36
Conforme Healey, P. Planning through debate, op. cit., o respeito manifesta-se através do
reconhecimento mútuo, da valorização, da atenção que se concede ao outro e ao processo e
da busca de possibilidade de tradução.
94 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
É aqui, também, que dilemas morais e foi, inclusive, um dos principais “ins-
e experiências estéticas têm sua origem; trumentos” de “colonização” do mun-
em que se desenvolvem modalidades di- do da vida, termo de Marx usado por
ferentes de conhecimento, compreensão, Habermas quando se refere à relação
apreciação, experimentação, julgamento entre os dois “lados”.
etc. Diferenças de interesses entre indiví-
duos e grupos precisam ser expressas e O ponto crucial do planejamento
aceitas no mútuo respeito entre as comu- comunicativo consiste, portanto, em
nidades envolvidas, apresentando uma transformar essa relação numa relação
moralidade para a interação. O debate de “verdadeira” interação entre as duas
entre os participantes a respeito de seus esferas, em que o sistema deve estar
interesses deve ser realizado como um aberto a um processo de aprendizado
processo de aprendizado mútuo através mútuo com as comunidades e deve
da disposição de todos para chegar a aceitar os mecanismos de comunicação
uma compreensão que não necessaria- “orientada para o entendimento” (e não
mente levará a um consenso. para um fim), uma vez que os objetivos
(resultados antecipados) do planeja-
Em relação ao sistema (administrati- mento não são conhecidos de antemão;
vo) temos muito menos indicações explíci- em que segue uma lógica essencialmen-
tas; porém, a caracterização do sistema te processual, adversa à condução ins-
como especializado em alocação (de re- trumental; em que, sempre aberto à
cursos) e em (exercício de) autoridade e autocrítica (capacidade crítica) e ao re-
poder (forças opressivas e dominadoras) direcionamento, estabelece no seu de-
destaca novamente a influência de Haber- curso arenas em que programas podem
mas. 37 É nele, também, que há barganha ser formulados e conflitos, identificados
e negociação; isto é, formas instrumentais e mediatizados.
e estratégicas de lidar com interesses diver-
gentes. Até onde essa esfera defende inte- Entendemos que Healey e outros
resses próprios não está muito claro, mas autores (Forester, Brown) propõem o
não se pode descartar essa hipótese. fortalecimento, dentro do processo de
planejamento, de uma lógica antagônica
Articulação entre sistema e à instrumental, o que subentenderia
mundo da vida no processo do certos níveis de autonomia da razão co-
planejamento comunicativo municativa e buscaria “afetar” e mudar
estruturas já cristalizadas 38. Portanto,
Já o afirmamos, o planejamento este- apesar de poder parecer omissa em re-
ve, tradicionalmente, ligado aos sistemas lação a determinações “estruturais”, a
37
Nas palavras da própria autora, ver idem, p. 241/42. Ela não se pautou apenas nesse autor,
mas utilizou-se também do debate pós-moderno e anti-racional de Foucault e Bourdieu e,
ainda, de uma quantidade grande de estudos etnográficos de práticas do planejamento.
38
É em Habermas, J. Direito e democracia, op. cit., que encontraríamos mais argumentos a respeito
das condições para uma empreitada que parece ter, à primeira vista, pouca chance de sucesso.
Rainer Randolph 95
40
Idem, p. 249. [Tradução nossa].
41
Ver também Gondim, L.M. Um encontro com Habermas nas encruzilhadas da pós-
modernidade, op. cit., que, sem fazer referência à proposta comunicativa, identifica essa
tendência em certas abordagens voluntaristas.
42
Já foi mencionado antes que apenas poderíamos trabalhar com essa referência específica; ver
Habermas, J. Três modelos normativos de democracia, op. cit.
43
Novamente convém destacar que uma apropriação mais aprofundada do acima citado livro
(Habermas, J. Direito e democracia, op. cit.) poderá melhor sustentar a argumentação aqui
desenvolvida; particularmente a partir do debate que Habermas trava em torno do conceito
do “poder comunicativo” de Hannah Arendt e da sua “oposição” aos poderes político e
administrativo.
Rainer Randolph 97
44
Ver Habermas, J. Três modelos normativos de democracia, op. cit.
45
Seria importante, inclusive, devido à especificidade da história do Estado no Brasil, aprofundar
a investigação sobre diferentes corporativismos; ver Boschi, R.R. (org.) Corporativismo e
desigualdade. A construção do espaço público no Brasil. Rio de Janeiro: IUPERJ, Rio Fundo,
1991; ou Diniz, E. Crise, reforma do Estado e governabilidade. Rio de Janeiro: FGV, 1997.
98 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
tradição em países onde se formou histori- inclusão desses interesses nas negociações
camente o Estado do Bem-Estar Social, ao nível do Estado e da sociedade política
através de uma prévia organização dos (com presença de representantes do go-
principais interesses econômicos e sociais verno, eventualmente de partidos) reali-
(tradicionalmente dos empresários e dos zadas por ocasião do planejamento de
trabalhadores, representados pelos res- determinadas medidas 46.
pectivos sindicatos), que permitiu a efetiva
46
O funcionamento das “câmaras setoriais” no governo federal foi um exemplo no Brasil; ver
Diniz, E. Crise, reforma do Estado e governabilidade, op. cit.
Rainer Randolph 99
Quadro 2 - Continuação
Conc eit os Conc epç ão Liberal Conc epç ão R epubl icana
Status: define-se pelos direitos
subjetivos que os cidadãos têm Uma série de critérios onde esta concepção diverge da
diante do Estado e dos demais liberal (não os apresentamos aqui).
cidadãos. Elemento positivo: direitos de cidadania são direitos de
Goze proteção do Estado na participação e comunicação políticas; estabelece
medida em que observam as leis. liberdades positivas.
Direitos subjetivos são negativos – Poder administrativo (que não representa poder
Cidadão garantem um âmbito de escolha. originário) provém do poder comunicativo gerado na
Direitos políticos têm a mesma prática da autodeterminação dos cidadãos e se legitima
estrutura: fazer valer seus interesses na medida em que protege essa prática por meio da
privados através da agregação com institucionalização da liberdade política.
outros interesses privados até que se Espera-se dos cidadãos republicanos muito mais
forme uma vontade política capaz do que meramente orientarem-se por seus interesses
de exercer uma efetiva influência privados.
sobre a administração
Direitos subjetivos devem-se a uma ordem jurídica
objetiva que possibilita e garante a integridade de uma
O sentido de uma ordem jurídica vivência com igualdade de direitos e autonomia
está em que essa ordem permite fundada no respeito mútuo.
decidir em cada caso particular que Vincula legitimidade da lei ao procedimento
direitos cabem ao indivíduo. democrático de gênese da lei.
Direitos subjetivos (porém existe Há uma conexão interna entre a prática
Direito
algum conteúdo intersubjetivo de de autodeterminação do povo e o império
reconhecimento). impessoal da lei.
Direitos sempre fundados numa "lei É a comunidade que estabelece as leis
superior" de uma razão ou (conjunto de direitos).
revelação transpolítica Direito de votar interpretado como liberdade positiva
converte-se em paradigma dos direitos
em geral.
Paradigma é o diálogo, isto é, uma concepção dialógica
da política.
Luta por posições que assegurem a Política: como atividade normativa, contestação
capacidade de dispor de poder sobre questões de valores e não meramente questões
administrativo. de preferência, lançando mão da argumentação
Concorrência entre atores coletivos racional e persuasão.
que agem estrategicamente com o Há uma diferença estrutural entre o poder
objetivo de conservar ou adquirir comunicativo que surge da comunicação política na
posições de poder. forma de opiniões majoritárias, discursivamente
Processo Êxito mede-se através do número formadas, e o poder administrativo, próprio do aparato
Político de votos obtidos em eleições estatal (embate de opiniões sustentado no terreno
(decisões de voto têm a mesma político tem uma força legitimadora).
estrutura que as escolhas O poder administrativo somente pode ser empregado
orientadas para o êxito dos com base nas políticas e nos limites das leis que surgem
participantes de um mercado. do processo democrático.
O input de votos e o output de Formação da opinião e da vontade políticas no espaço
poder respondem ao mesmo público e no parlamento não obedece às estruturas dos
modelo da ação estratégica. processos do mercado, mas tem suas estruturas
específicas; são de uma comunicação pública orientada
para o entendimento.
Habermas, J. Três modelos normativos de democracia. Lua Nova, 1995, n. 36, p. 39-53.
[Síntese nossa]
100 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
47
Este debate lembra a discussão a respeito de duas possíveis interpretações dos novos movi-
mentos sociais da década de 80 que analisamos em outro momento; ver Randolph, R.,
Silveira, C., Menegat, E. Solidariedade e gestão territorial: Indagações sobre a atuação das
organizações não governamentais no Brasil. In: Novas e velhas legitimidades na reestruturação
do território. Anais do IV Encontro Nacional da ANPUR (Salvador, maio 1991), org. por M.A.
Filgueiras Gomes. Salvador: UFBa, Faculdade de Arquitetura, 1993, p. 77-88.
48
Habermas, J. Três modelos normativos de democracia, op. cit., p. 44.
Rainer Randolph 101
49
Dedicamos boa parte dos dois últimos artigos a essas questões.
102 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
50
Idem, ibidem.
51
Idem, p. 44-45.
52
Idem, p. 45.
Rainer Randolph 103
resultados racionais. Vincula essa pre- modelo liberal, porém mais fracas do
sunção ao fato de que nesse processo o que o modelo republicano, toma ele-
modo e o estilo da política deliberativa mentos de ambos e os articula de uma
realizam-se em toda a sua amplitude. forma distinta.” 53
53
Idem, p. 47.
104 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
54
Idem, p. 47-48.
55
Em Habermas, J. Direito e democracia, op. cit., o autor aprofunda essas questões e apresenta
suas posições em relação às condições necessárias para isso acontecer: destaca a condição
de uma sociedade civil forte e de uma esfera política pública dinâmica.
56
Habermas, J. Três modelos normativos de democracia, op. cit., p. 48.
Rainer Randolph 105
57
Talvez o caso de Porto Alegre seja emblemático para esse caminho.
106 O Planejamento Comunicativo entre as Perspectivas Comunitarista e Liberal
Referências bibliográficas
FORESTER, J. Critical theory and planning HABERMAS, J. Ações, atos de fala, intera-
practice. American Planning Associa- ções mediadas pela linguagem e
tion Journal, p. 275-286, july 1980. mundo da vida. In: HABERMAS, J.
Pensamento pós-metafísico. Estudos
__________. Critical theory, public policy filosóficos. Rio de Janeiro: Tempo
and planning practice. Albany: State Brasileiro, 1990. p. 65-103.
University of New York Press, 1993.
Rainer Randolph 107
A fronteira da borracha
1
O termo dendrítico designa a forma ramificada de uma rede, semelhante a uma árvore. No
texto, o termo é usado para descrever a forma tomada pela rede proto-urbana ao acompa-
nhar a forma dendrítica da rede fluvial.
Lia Osorio Machado 113
! !
! !!
! !!!!!
! ! !
! !
!! ! !!
!!! !
! ! ! !!! !! !!
!! !
!! ! !! ! !
! ! !! ! !
! ! ! ! !! !
! ! ! !
! ! ! !
! ! !
! ! ! !! !!!
! !! !! !
! ! !
! ! !!
! !! !
! !
! ! ! !
! ! ! ! !
!
! !
!
!! !
! !
! ! ! !
! !
!
!
! ! !
! !
!
! !
! !
!
! !
! !
! ! !
! ! ! !
! !
!
!
!
! ! !
!
! !
!
!
!
!
C i dade ! !
!
!
!
!
! 1945 (174) !
!
!! ! !
Km
! 0 100 200
IDAD452.PRJ 22/06/98
A fronteira urbana
Ao visitar a Amazônia Ocidental no final Embora permanecesse o comando
da década de 1950, o geógrafo Michel exercido pela rede fluvial sobre a interco-
Rochefort ficou impressionado com a es- nexão das aglomerações, o transporte
tagnação da economia local e a posição por esse meio de circulação havia sido
de primazia de Manaus. A cidade abri- complementado pelo transporte aéreo.
gava 88.600 habitantes, corresponden- De fato, muito antes das estradas, foram
tes a 54% da população urbana total os aviões os primeiros a efetuar a inte-
dos atuais estados do Amazonas, Acre, gração da Amazônia ao Centro-Sul do
Roraima e Rondônia. Nessa vasta área país, além de desempenharem impor-
predominavam as aglomerações com tante papel no controle militar do territó-
menos de 10.000 habitantes, a maioria rio depois da Segunda Grande Guerra.
delas centros elementares, cuja zona de
influência não excedia os limites dos mu- Na hierarquia urbana, abaixo de
nicípios respectivos (Rochefort, 1959). Manaus encontravam-se as capitais das
116 Urbanização e Mercado de Trabalho na Amazônia Brasileira
2
Podemos definir o atrator como a estrutura para a qual convergem as trajetórias dos compo-
nentes de um sistema espacial.
118 Urbanização e Mercado de Trabalho na Amazônia Brasileira
!
1967
RORAIMA
!
!
AMAPA
! !
! !!
!
! !! !!! !
! !!
! ! ! !! !!! !! !!
!!! !! !
!
!
!
! !!! ! !! !
!
!
!
! !! !!
! ! ! ! ! !! !! ! ! !
! ! !
! ! ! ! ! ! !
!
!
! ! ! !
! !
! !!! !!!
! !
! ! ! !
! ! ! ! !
!
!
! ! !! !!
! ! !! ! !! !
! ! ! !! ! !
! ! ! !!
!!! !! !
! ! ! ! ! !
! ! !! !
! !
!! ! !
!! AMAZONAS !
!
! !!!!
!
! !
!
!
PARA !
!
!!!
! !
! ! !!! !
!! ! ! !!
!! ! ! !
! !! ! !! ! !!
! !
! ! !!! !!!!
! ! !
!
! ! ! !! !!
! ! !!
! ! !
! !
! !
MARANHAO
! ! !
!! !
! ! !
! ! !
!
! !
ACRE !
!
TOCANTINS
!
!
! ! ! !
!
! !
RONDONIA !
! !
! !!
!
!
!
!
Cidade MATO GROSSO ! !
! 1967 (304) !
!!
!
!
!
! !
!
!
!
!!
! ! ! Km
! ! ! !
!
! ! !
! !
0 100 200
!
!
!
! 1980
!
! !
! !!
!
! !! !!! !
! !!
! ! ! !! !!! !! !!
!!! !! !
!
! !
!
! !! ! !! !
!
!
!
! !! !!
! ! !! ! ! !! !! ! ! ! !
! ! ! ! !! ! !
!
!
! ! ! !
! ! ! !!! !!!
! !
! ! ! !
! ! ! ! !
!
! ! !! !!!
! ! !! ! !! !
! ! ! !! ! !
! ! ! !!
!!! !! !
! ! ! ! ! !
! ! !! !
! ! !! ! !
!! ! ! !
! ! !!!!!! !
!
! !
!!! !
! !
! ! !!!!
!! ! ! ! ! !
! !!!!
! !
! !! ! !!
! !
!
! ! ! !! !!!!
! ! !
!
! ! !
!! !!
! ! !
!! !
! ! !
!! ! ! !
!
! ! !
! !! !
!!!
! ! ! ! ! !
! ! !
! !
!!
! !
! ! ! !
! ! ! !
!
! !
! ! !! !
! ! !
! ! !
! ! !
! ! !
! ! !!
! !
! ! !
! !
Cidade ! !
!
!
!
! !
!
! 1980 (361) !
!
!
!
!!! !
! !
! !
! ! !
! ! !! !
! !
!
! !
!!
! ! ! ! Km
! !
! !
! ! !
! !
! 0 100 200
!
!
!
!
!
! !
1990
!
!
!
!
!
!
!
!
! !!
! !!
!
! ! ! !!! !
! ! !!!
! ! ! !! !!! !! !!
!!! !! !
!
! !!
! !! ! !! !
!
!
!
! !! !!
! ! ! ! ! !! !! ! ! ! !
!
! ! ! ! ! !! ! ! ! ! !
!
!
! ! ! !
! !
! ! !! ! !!
! !!
! !! ! !
! ! ! ! !
!
!
! !! ! ! ! !
!!! !!!
!
! !! ! !! !
! ! !
! ! ! !! !
! ! !!!! !
! ! ! ! !!
!! ! !
! ! ! !
! !! ! ! !
! ! !! !
! ! ! ! !! ! !
!! ! ! ! !!
! ! !!!!! !
! !
! ! ! ! !
!!! !
! ! ! ! !
!!
!! ! ! !! !!
! !
!!
!!! ! ! !
! ! !! ! !!
! !
!!
!
! ! ! ! !!
! !!!!
! ! !
! ! ! !
! ! !!! !
! ! ! ! !
! ! !! !
! ! ! !
!! ! ! ! !
!
!
! !
! ! !
! !! !
! !
! !
! ! !! ! ! ! !
! !
!! ! !
! !!
! ! ! ! !
! ! ! !
! ! ! !!
! ! ! ! ! ! !
! ! !! ! !
! ! !!
! ! ! ! !
! !! !
! ! !!
! ! ! !
! ! ! ! !
! !! ! !!
! ! ! ! ! !
! ! ! ! ! ! ! !!
!! ! ! !
!
! ! ! !
!
Cidade !
! !
!
!
!
! !
! !
!
!
! ! !
!!
! !
! 1990 (499) ! !
!
!
!
!!
! ! !
! ! !! !
! ! !
! ! ! !
! !!! !
!
!
!!! !
!! ! ! !
!! !
!
!
! ! !
!
! ! !
! ! !
! !
!
!
Km
!
!
! 0 100 200
!
IDADE902.PRJ 22/06/98
3
A retração foi gradual porque resultou da acumulação de sucessivas mudanças e crises: a crise
fiscal do Estado (1973/1979); a crise da dívida externa e a drástica redução dos empréstimos
internacionais (1983); o fim do regime de governo militar (1984); a nova Constituição federal
(1988); o fim dos incentivos fiscais ao capital privado aplicado na Amazônia (1991). Ver M.
Baer, 1993.
124 Urbanização e Mercado de Trabalho na Amazônia Brasileira
Figura 3
(a) Amazônia Brasileira: população e criação de municípios (1960-1996)
1960 = 100
800
Constituição1988
600
400
Plano de Integração Nacional
200
0
1960 1970 1980 1991 1996
Pop. Total Pop. Urbana Municípios (unidade jurídico-administrativa)
Fonte: IBGE Org.: Lia Osorio Machado
100%
75%
50%
25%
0%
1960 1970 1980 1991 1996
Tamanho das cidades (em 1000 hab.)
Fonte: IBGE >500 100-500 50-100 25-50 <25 Org.: Lia O.Machado
Lia Osorio Machado 125
!
!
RORAIMA !
!
!
!
AMAPA !
!
!!
! MACAPÁ
74
!
!
!
!
BR-1
S.Grabiel da
!
Cachoeira
!!
!
! ! BELÉM
! !
! !
!!
a s !
! !!!!! !
!
zon
!! ! ! ! !
! ! ! !
!
!
! !
ma !! ! ! !!
!
! ! ! !
!
R. !A ! !
! !
!
!
!
Oriximiná !
! ! !
!
!
! ! ! !
! ! !
!
! !
!
! ! ! ! !
! ! SÃO LUÍS
!
! ! ! ! ! !
!
! ! ! ! !
!
!
! ! Santarém ! ! !
!
! !!
!
! ! !!!!! !
!
! ! ! ! !
!
! !
!
!
!!! ! ! !!
!
Tefé MANAUS !
! Altamira !
!
! !Itacoatiara
! !
!
! ! !
! !
!
! ! !! ! ! ! !
BR-010
!
! ! !!
! ! !
! ! ! ! ! !
! ! ! ! !
!
! !
!
!
!
! ! !! !
!
! !
!
!! ! ! Timon
!
!
! ! !
! Tabatinga ! !
!
!! Rio Amazonas !
! !
! ! !!
!
! ! !
!
!
!!
!
! !
!
!
!
!
Marabá !
!
! ! !
!!
!! !
! !
!
! ! !
!! ! !!
! !! ! ! !
! ! ! !
!
AMAZONAS !
!
Parauapebas!!! !
!!
!
!
!
!
! ! !
MARANHAO !
!
0
Eirunepé !
!
!! !! ! ! ! !
!! !
15
!!
!
BR-230 PARA !
! !
!
! !!
!
!
-
!
!
Araguaina
PA
! ! ! ! ! !
! ! !!! ! ! !
Cruzeiro
!
do Sul !
!
! !! !
!
!
!
BR-163
! !
!
! ! !
!
! !
!
! !
BR Redenção !
!
!
-3 !
!
!
! !
! 64 PORTO VELHO !
!
!
!
! !
! !
!
! ! !! !! ! !
! ! !
! !
RIO BRANCO
! !
!
!
!
! ! !
BR ! !
!
! ! !!
! ! ! ! !
ACRE -3 Alta !
Floresta !
!!
! ! ! ! !
64 ! !
! ! !
!
! !
! ! !
! PALMAS!
!
!
!
!
!
!
!
! ! !
!
! !
!
!
!
! ! ! !
! Jiparaná !
!
!
!
! !
! !
! !
!
! ! ! !
!
! !
!
RONDONIA !
!
!
!
! !
!
! !
!
!
!
Sinop
! !
!
S.Félix do Araguaia
!
! !
!
!
TOCANTINS
!
!
!Gurupi
! ! !! !
! !
! ! !
!
!
!! ! ! !
BR-153
!
Vilhena !
!
!
! !
! ! !
!
! !
!
!
!
!
!
!
!
!
! MATO GROSSO
!
!
! ! !
!
!
< 25 ! !
!
!
!
!! ! !
!!
!!
! !
Pontes e Lacerda B !! ! !
! ! !
!
!
R!
! !! !! !!-3 !
!
!! CUIABÁ
! !
!
!!
64 !
! !
! 25 a 50 !
!
! !
!
!!
!
!
!
!
!
!
!
!
!
!
!
!
!
Cáceres !
! BR-3
!
!
! 64
!
BR-163
! 50 a 100 !
Estradas principais
! 100 a 500
Km
Rio Amazonas
!
0 100 200 ! Cidades
> 500
127
Org. Lia Osorio Machado. Source: IBGE. BENKO.PRJ
128 Urbanização e Mercado de Trabalho na Amazônia Brasileira
Essa condição é encontrada em 55% duas vezes mais do que a soma dos em-
dos municípios com cidades de menos pregados formais no comércio e na in-
de 25.000 habitantes. As diferenças entre dústria. Até o início da década de 1990,
os estados não são significativas, exceto Manaus se afastava desse padrão, em que
no caso do Estado de Mato Grosso, em o setor industrial empregava mais do que
que o menor número de municípios o setor público. A instabilidade provoca-
nessa situação pode ser tomado como da pela sucessão de reformas econômicas
um indicador do dinamismo da econo- e pelas mudanças técnicas voltadas para
mia regional. Os municípios com cidades a redução da mão-de-obra empregada
de mais de 100.000 habitantes incluem na indústria reverteu o quadro. A recente
evidentemente as capitais dos estados. desvalorização da moeda talvez incentive
Apesar da importância relativa da função um novo ciclo de instalação de unidades
industrial e comercial nas capitais, o setor industriais na zona franca e, com ele, o
público permanece como o maior em- aumento do emprego industrial.
pregador. Em Belém, esse setor emprega
Lia Osorio Machado 129
4
Pode-se prever que no futuro próximo a adoção de novas tecnologias de comunicação alterará
o quadro no sentido “um indivíduo=um nódulo de rede”. Por exemplo, o número de telefones
celulares por habitante em alguns dos estados menos conectados ao resto da região por
rodovia, como o Amapá e Roraima, é de 2,05 (maior que no Rio de Janeiro) e 1,64 (maior que
em Santa Catarina), respectivamente (Embratel, 1996).
132 Urbanização e Mercado de Trabalho na Amazônia Brasileira
!
BOA VISTA!
!
Caracarai
S. Joao da Baliza
!
!
MACAPA
S. Gabriel da Cachoeira
!
! BELEM
!
Barcelos ! !! !
! !
! !!
!
! !
! SAO LUIS
!!
! !
!
! !! !!
!
! ! ! ! ! !
! ! ! ! !
! !
!
!
! ! ! !
! MANAUS ! !
!
Paragominas ! ! !
!! Santarem Alatamira !
! !
!!
Tefe ! ! ! ! Itacoatiara
!
!! !
!
!! !
! ! !
! !!! !! ! !
Coari ! ! ! ! ! ! !
!
Tabatinga ! Itaituba !!
Codo
!
! ! ! ! ! !
Imperatriz !!! ! !
! !
!
!!
!
!
!
! !
!
Maraba ! !
!
!!
! ! !
Manicore !
! ! ! ! !
! Parauapebas ! ! !
!
Eirunepe ! !
!
!
! !
Araguaina
! !
!
! !
!
S. Felix do Xingu ! !
!!
Labrea Humaita ! ! !!
!
Cr. do Sul ! ! ! ! Balsas
!!
!
! ! !
! !Feijo
PORTO VELHO !
!
!
!
! !
! !!
! !
!
Santana do Araguaia !
!
!
RIO BRANCO Ariquemes ! ! PALMAS
! Alta Floresta !
!
! !
! ! !
!
!
!
Guajara-Mirim ! Ji-Parana !
!
!
! ! !
! ! ! Cacoal
!!
! !Brasileia ! ! !
! ! Gurupi ! !
!
!! ! Sinop S. Felix do Araguaia
!
! ! ! !
! !
!
!!
! !!
!
!
!
! !
Nº de Agências ! Vilhena !
! ! !
! !
!
! !
! !
!! !
! !
! ! !
!
! 1-3 ! 4-7 ! 8-12
!
!
!! CUIABA !
!
!
!!
!! !! !
!
!
! !!
! !
!
!
!
!
! ! !
!
! !
! !
! !Barra do Garcas
!
! !
!
!
13-24 60-95 Rondonopolis km
!
!
0 100 200
133
!
Organizado por Lia Osorio Machado - Departamento de Geografia - UFRJ - banan 97 Fonte: Base de Dados do Banco Central do Brasil, 1997
Figura 5b
134
Redes Logísticas na Amazônia
Telecomunicações 1994
E
Rede de Serviços DATASAT BI Boa Vista
!
Tangará da Serra ! ! !
! ! ! ! !
Pontes e Lacerda ! !
! ! !
!! !
!
!
! !!
! !
!
! !
!
! !!
! !
Poconé !
Fonte: Base de Dados do Banco Central do Brasil, 1995. Impresso em 13/04/1999; AMLOGSPO. 0
KM
100 200
São Paulo !
‚
Organizado por Lia Osório Machado - Departamento de Geografia - UFRJ.
Lia Osorio Machado 135
Conclusões
5
O termo “atividades” é definido aqui como movimentos de contração ou de expansão dos
mercados, de comunicação/interação entre elementos do sistema, que levam à sua degrada-
ção ou ao aparecimento de processos de auto-organização.
136 Urbanização e Mercado de Trabalho na Amazônia Brasileira
Referências bibliográficas
tos observados nas gestões das cidades gico de cidades, a metáfora cidade-em-
do Rio de Janeiro e de Barcelona. presa informa e torna possível o desen-
volvimento de modelos e as práticas que,
Embora a expressão cidade-empre- partindo da gestão empresarial, tanto
sa não possa ser relacionada como típica têm transformado a gestão urbana con-
do repertório do planejamento estraté- tempor ânea.
Metáfor a 1
Para Arjo Klamer e Thomas Leonard recupera da análise de Black seis carac-
(1994), uma discussão sobre metáfora terísticas desse enfoque interativo da
partiria geralmente de Aristóteles, para metáfora: “a) o enunciado metafórico
quem produzir uma metáfora é, basi- engloba uma questão principal e outra
camente, dar a uma coisa um nome que subsdiária; b) estas questões devem
a ela não pertence (apud Klamer & abordar-se como sistema de coisas, mais
Leonard, 1994). A definição utilizada do que como coisas; c) na metáfora se
pelos autores (seguindo I. A. Richard e dá uma aplicação à questão principal de
Max Black) na discussão sobre o uso da ‘implicações acompanhantes’ próprias
metáfora no discurso econômico, entre- da questão subsidiária; d) as citadas apli-
tanto, é mais apropriada para o nosso cações podem ser tópicas ou divergen-
caso: metáfora é um processo da lin- tes; e) a metáfora seleciona, suprime,
guagem em que os atributos de um estrutura aspectos próprios da questão
objeto (questão subsidiária) são trans- principal; f) se produz um deslocamen-
feridos para outro (questão principal) e to de significado” 2 .
em que essas duas questões interagem
para criar um novo significado. Na metá- Ao mesmo tempo, o ponto da metá-
fora, caracteristicamente, a questão sub- fora seria precisamente que ela não é
sidiária procederia de um outro domínio entendida literalmente. Quase sempre
que não tem em princípio nada a ver existiria uma distinção entre os atributos
com o domínio da questão principal. da questão subsidiária e os da questão
principal que, embora relacionáveis no
Horenstein (1998), ao discutir as enunciado em questão, tornaria eviden-
metáforas nas ciências sociais, também te a intenção de se propor uma metá-
1
No Dicionário da Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, metáfora é
definida como um “Tropo [emprego de palavra ou expressão em sentido figurado] que
consiste na transferência de uma palavra para um âmbito semântico que não é o do objeto
que ela designa, e que se fundamenta numa relação de semelhança entre o sentido próprio
e o figurado”.
2
Horenstein, Norma S. “Metaforas en ciencias sociales: un analisis desde la perspectiva
estructuralista”. In: Episteme, v. 3, n. 6, Porto Alegre: ILEA/UFGRS, p. 191, 1998.
Fabricio Leal de Oliveira 143
fora. Assim o seria tanto para Black, para cação cardial’, ainda é utilizada em
quem “na metáfora há uma suspensão sentido trópico. Não existe o ‘sentido
voluntária de descrença ontológica e que próprio’; existe somente – mas sem-
propõe um ‘modo peculiar de penetra- pre e ineliminavelmente, e nas metá-
ção intelectual’”, quanto para Turbayne, foras ou alegorias mais sutis ou mais
para quem o emprego da metáfora im- desordenadas – referência identitária,
plicaria na consciência da dualidade de ponto de uma rede de referências
sentido 3 . identitárias, ele próprio preso no
magma de significações e referido ao
Klamer & Leonard, entretanto, rela- magma daquilo que é. Existe alguma
cionam à visão tradicional de metáfora, atribuição que não seja metonímica?” 4
que a entenderia como um desvio do
significado da linguagem literal, a obser- É fundamental para a nossa ques-
vação de que toda a linguagem é meta- tão uma abordagem que opõe, de um
fórica e que, portanto, toda a nossa fala lado, a utilização da metáfora como li-
sobre o mundo assim o é. mitada à sua aplicação prática – sem
maiores conseqüências além das restri-
Essa é uma das questões tratadas tas ao objetivo que motivou a sua enun-
por Castoriadis quando se interroga ciação – e, de outro, a indiscernibilidade
sobre o sentido próprio das palavras e entre literalidade e metáfora. É a partir
a possiblidade de uma linguagem literal: desse encontro entre um caráter mera-
mente instrumental (quase banal) da
“O que é uma ‘figura do discurso’, um metáfora e o seu potencial cognitivo que
tropo, e o que é o sentido próprio? a discussão de Klamer e Leonard esti-
O que se denominou desde a antigui- mula uma investigação do planejamen-
dade tropos são somente os tropos to estratégico de cidades tendo como
particulares ou tropos em segundo foco o potencial de interferência que a
grau. Toda expressão é essencial- transferência dos atributos da empresa
mente trópica. Uma palavra, mesmo para a cidade pode assumir na criação
quando utilizada em seu pretenso de representações sociais e nas relações
‘sentido próprio’, ou com sua ‘signifi- de poder na cidade.
Metá f ora s
Prosseguindo, trazemos para a discussão tando também algumas definições de
a classificação dos tipos de metáfora uti- Cohen, 1993, e de McCloskey, 1994),
lizada por Klamer e Leonard (acrescen- segundo o seu desempenho de funções
3
Em Horenstein, op. cit., p. 190-191.
4
Castoriadis, C. A instituição imaginária da sociedade. Paz e Terra: Rio de Janeiro, 1982.
p. 393.
144 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
e papéis específicos, tal como aparecem te, a afirmação de que não podemos
no discurso econômico. Essa “transferên- pensar sem as metáforas e de que a pró-
cia” de campos disciplinares específicos pria cognição é metafórica 5: é exatamente
para o nosso tema é recorrente numa por reconhecer o potencial e a importân-
área transdisciplinar como a do planeja- cia dessa forma de pensamento que pro-
mento urbano e confirma, evidentemen- pomos o seu estudo específico.
5
Embora Klamer e Leonard recorram sempre a F. Nietzsche para tratar do caráter metafórico da
cognição, discutir as questões apresentadas por Nietzsche exigiria um aprofundamento muito
além do escopo deste texto.
6
Cohen, B. “Analogy, Homology and Metaphor”. In: History of Political Economy. Annual
Supplement, v. 5, 1993.
7
McCloskey, D. N. Knowledge and persuasion in economics. Cambridge: Cambridge University
Press, 1994.
Fabricio Leal de Oliveira 145
8
Siembieda, William J. Adaptation and Application of Strategic Planning in the Public Sector .
Seminario de Gestión Urbana Estratégica II, Puerto Montt, Chile, p. 4, Novembro de 1994.
M ime o .
9
Modelo SWOT: Strengths, Weaknesses, Opportunities and Threats.
146 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
10
Harvey, David. “Do gerenciamento ao empresariamento: a transformação da administração
urbana no capitalismo tardio”. In: Espaço e Debates, ano XVI, n. 39, p. 50, 1996.
Fabricio Leal de Oliveira 147
11
Harvey, D. The Urbanization of capital. Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1985.
12
Mintzberg, Henry. The rise and fall of strategic planning. Toronto: The Free Press, 1994.
148 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
13
Mintzberg, H. & Jørgensen, J. “Una estrategia emergente para la política pública”. In: Gestión
y Política Pública, v. IV, n. 1, México, 1995.
14
Para Mintzberg (1994; 1995), estratégia é um plano (estratégia pretendida) mas é também um
padrão, uma consistência no comportamento durante o tempo (estratégia emergente).
Fabricio Leal de Oliveira 149
15
Por situacional entende-se que para cada ator social a realidade em que vive é uma situação
diferente e que existem vários planos sendo executados ao mesmo tempo com objetivos e
temporalidades diferentes.
16
Forn i Foxá, M. Barcelona: Estrategias de Transformación Económica. Seminário Estratégias
Urbanas Rio Barcelona, Rio de Janeiro, mai. 1993, p. 7. Mimeo.
17
Borja, J. “As Cidades e o Planejamento Estratégico: uma reflexão européia e latino-americana”.
In: Fischer, Tânia. (org.) Gestão contemporânea. Cidades estratégicas e organizações locais.
Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas Editora, 1996. p. 98.
150 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
18
“Sólo la implicación de todos los actores supone una cierta garantía de cumplimiento de un
plan que se define obligatoriamente como proactivo. La implicación de sólo una parte de los
actores, probablemente los más avanzados, puede desarollar un efecto perverso: Impulsar
las acciones que ya se desarollaban normalmente, bendiciéndolas y dándoles la legitimidad
que supone el sombrero del Plan y, por el contrario, el mismo sombrero, en la medida que
prescriben las necesidades, puede actuar de disminuidor de presión sobre aquellos aspectos
urbanos e sociales más conflictivos. Como resultado, si el Plan no tiene una implicación
completa y un seguimiento integral, puede ayudar a desequilibrar, impulsando unas acciones
y ayudando a olvidar otras, en vez de la teórica función opuesta que pretende un desarollo
equilibrado de todos los sectores y especialmente de la convivencia ciudadana ligada a la
vida cotidiana de los habitantes.” (Forn, M., op. cit., p. 10.)
Fabricio Leal de Oliveira 151
A metáfora cidade-empresa
19
Segundo Lyotard (1989), “performatividade” de um sistema diz respeito à “eficiência
mensurável numa relação input/output” (p. 28). Assim, “performatividade” é a relação glo-
bal dos inputs (energia gasta) com os outputs (informações ou modificações obtidas): um
“acto técnico é ‘bom’ quando realiza melhor e/ou quando gasta menos que outro” (p. 33-
91).
20
Lyotard, J. F. A Condição Pós-moderna. Lisboa: Editora Gradiva, 1989. p. 91.
21
Ibid., p. 92.
152 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
22
Gestão 1993-1996 na Cidade do Rio de Janeiro: Prefeito César Maia (PFL) e Secretário
Municipal de Urbanismo Luis Paulo Conde (PFL).
23
Em seu texto em parceria com Manuel Castells, posterior à conclusão do Plano Estratégico da
Cidade do Rio de Janeiro (Castells & Borja, 1996), Borja cita a experiência carioca, mas
omite o autoritarismo na elaboração do Plano. Enquanto Philip Kotler (Kotler, Haider & Rein,
1994), ao menos problematiza a viabilidade do planejamento estratégico em cidades sem
consenso mínimo em torno de metas e objetivos, Borja deixa que seja entendida como bem-
sucedida uma experiência que, se contou com a participação de uma parcela importante do
empresariado local, não foi sequer acompanhada pela população.
154 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
24
Vainer, Carlos B. Os Liberais Também Fazem Planejamento Urbano? Glosas ao “Plano
Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro”. II Semana IPPUR, Rio de Janeiro, 1995. Mimeo.
25
“Language begins as metaphor and, only ‘after long usage’ <hardens or freezes> into literality”
(Klamer e Leonard, op. cit., p. 27).
Fabricio Leal de Oliveira 155
dade: não mais como se fosse uma em- Essas perguntas estabelecem uma
presa, a cidade passaria a ser um tipo tensão entre cidade-empresa e a cida-
singular de empresa, com a transferência de-não empresa, que só poderia ser
de determinados atributos e relações mais bem explicitada a partir da análise
próprias da empresa, tais como a agili- detalhada dos planos estratégicos de ci-
dade e o arbítrio na gestão e a participa- dades elaborados com o perfil empre-
ção nas decisões segundo a capacidade sarial que examinamos aqui, o que está
de investimento. Possivelmente um muito além do escopo deste texto. Con-
“tipo” de empresa, em que nem todos tudo, a explicitação de possíveis cursos
os seus habitantes/trabalhadores/acio- de investigação sobre o planejamento
nistas seriam reconhecidos como aptos urbano e a gestão contemporânea das
a colaborar na produção da cidade capaz cidades é um dos nossos principais ob-
de sobreviver e vencer os seus concor- jetivos.
rentes. Esses cidadãos poderiam então
ser considerados menos importantes e O desenvolvimento de
“inferiores” do que os outros que cola- analogias
boram mais efetivamente para a “produ-
tividade” da cidade e, portanto, menos Segundo Klamer e Leonard, uma me-
merecedores de participar da gestão da táfora se torna heurística quando esti-
cidade. mula a construção de um sistema
analógico, de um modelo que traça pa-
Entretanto, essa cidade que é pensa- ralelos específicos entre os domínios dos
da como se fosse uma empresa é pen- objetos relacionados. Um modelo seria
sada assim até que ponto? A cidade uma metáfora desenvolvida e sistema-
inteira é pensada como empresa ou essa ticamente elaborada.
relação é reservada apenas para os seus
atributos, partes e relações onde faz sen- Para Cohen, a analogia serviria
tido e onde há correspondência e resso- “para fazer avançar o nosso entendi-
nância da justaposição dos atributos da mento referindo um fenômeno não
questão subsidiária? Se assim fosse, o inteiramente compreendido a um fenô-
que estaria de fora, o que não seria (ou meno análogo em alguma outra ciên-
não poderia ser) empresa? O que não cia onde ele é melhor compreendido” 26 .
seria empresa não seria a cidade, ou não
seria a cidade administrável por meio Se a cidade pode ser entendida
do planejamento estratégico? Qual a como uma empresa, então é possível
percepção social desta metáfora? Ela é que os componentes do que se chama
restrita ao meio operacional e acadêmico cidade possam ser comparados com os
do planejamento urbano? componentes do que se chama empresa
26
Cohen, B. “Analogy, Homology and Metaphor”. In: History of Political Economy. Annual
Supplement, v. 5, 1993.
156 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
Conclusão
A metáfora conecta dois domínios que como pensamos não só as questões
interagem para criar um novo significado principal e subsidiária, mas também
que não existia antes da sua enunciação sobre o mundo além dos conceitos 28 ”.
(Klamer e Leonard, 1994). É esse novo Mas como pensamos o mundo através
significado e a conjuntura em que ele dos conceitos, podemos dizer que a pró-
se insere que merece a nossa atenção: pria pertinência da metáfora é construí-
quais as possibilidades de transformação da socialmente e que visões de mundo
das relações de poder existentes com a estão em disputa por uma representação
criação desse novo significado? Como da questão subsidiária na questão
se altera a estrutura de poder na cidade: principal.
quem ganha, quem perde com a cida-
de-empresa? Considerar que “a cidade pode ser
administrada como uma empresa” ou,
O conteúdo cognitivo de uma metá- mais precisamente, que “a cidade pode
fora não pode ser alcançado pela sua aprender com as empresas como se ad-
tradução literal. É necessária, portanto, ministrar”, e assumir que a “cidade deve
uma reflexão que explicite os vetores de se comportar como uma empresa na
transformação de significado que são competição com outras cidades”, não
emitidos de uma metáfora, pois “uma implicam em que a cidade esteja sendo
metáfora, se pertinente, afeta o modo considerada de fato uma empresa. Isso
27
Já em 1985 Harvey (op. cit.) apontava o incentivo do “princípio de comunidade” como uma
estratégia de resposta a crises envolvendo algum risco à reprodução social. Nesse contexto,
as políticas facilitadoras do controle social e do restabelecimento da “harmonia” entre as
classes se dariam em torno das instituições básicas da comunidade, envolvendo um compro-
misso com melhorias comunitárias. Instrumentalidades como inclusão política, participação
cidadã e um compromisso da comunidade com serviços educacionais e de lazer e com um
senso de orgulho de vizinhança significariam uma “melhor”qualidade do ambiente construído.
28
Klamer e Leonard, op. cit., p. 30.
158 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
é trivial. O que não é tão trivial assim é integração competitiva no mundo glo-
que, ao construir uma ponte cognitiva balizado são comuns em autores de ori-
entre cidade e empresa, o pensamento gem tão diversa quanto Manuel Castells
estabelece relações entre atributos da e Philip Kotler, como os próprios voca-
cidade e da empresa que impulsionam bulários desses autores celebram deter-
uma nova maneira de pensar e admi- minadas palavras e expressões-chave
nistrar a cidade, assim como legitimam que reafirmam pela repetição exaustiva
velhas práticas na política municipal, as receitas contemporâneas para as
como a associação entre o capital local cidades.
(o capital imobiliário, por exemplo) e a
Prefeitura municipal no planejamento Assim como o “consenso entre ato-
urbano, seja através da programação de res públicos e privados”, os “contratos
obras e investimentos da administração, urbanos” e as “parcerias público-priva-
seja através da regulação do uso e ocu- das” muitas vezes são capazes de resu-
pação do solo. mir a gestão das cidades com Plano
Estratégico, o binômio globalidade/loca-
O que argumentamos, portanto, é lismo se encarrega de resumir o mundo
que o novo significado surgido a partir e a cidade contemporâneos.
da relação cognitiva entre a questão
principal (cidade) e a questão subsidiá- Por outro lado, a afirmação da me-
ria (empresa) é um vetor no sentido de táfora cidade-empresa oculta o fato de
favorecer certas práticas sociais em de- que a cidade não é uma unidade: os
trimento de outras. conflitos são minimizados e assim não é
potencializado o surgimento de alterna-
A ênfase na competição entre ci- tivas não previstas. Borja e Castells
dades por investimentos privados no (1996) chegam mesmo a dizer que a
mundo globalizado significa uma ênfase “não articulação entre os atores urbanos
no ambiente externo à administração, que caracterizou a cidade latino-ameri-
pois os atributos da administração (as cana parece em vias de superação” 29 .
forças e fraquezas) são avaliados en-
quanto capazes de enfrentar e aprovei- Essa unidade é mais notável na
tar as ameaças e oportunidades do meio enunciação da cidade como ator político
externo que seriam inevitáveis e, em (Borja e Castells, 1996): tratar-se-ia de
parte, conhecidas. Os investimentos para metáfora, metonímia ou símile? A afir-
atrair investimentos são a tônica e, muito mação da cidade como ator político cria
embora isso não seja uma novidade nas um novo significado a partir de ator/po-
administrações municipais, o discurso de lítica/cidade ou é, antes, uma superficia-
legitimação certamente o é. Não só os lização das relações sociais na cidade que
mesmos diagnósticos e meios para a permitem a sua simplificação na unidade
29
Castells, M., Borja, J. “As cidades como atores políticos”. In: Novos Estudos CEBRAP, n. 45,
p. 157, jul. 1996.
Fabricio Leal de Oliveira 159
30
Kotler, P., Haider, D., Rein, I. Marketing público. São Paulo: Makron Books, 1994.
160 A Metáfora Cidade-Empresa no Planejamento Estratégico de Cidades
Referências bibliográficas
I n tr o d uç ã o
Este trabalho analisa o processo de reali- Ao longo de vinte anos (dos anos
zação de audiências públicas no licencia- 1970 aos anos 1990), por meio de lutas
mento ambiental de empreendimentos sociais travadas nos mais variados cam-
potencialmente causadores de degra- pos, a sociedade brasileira foi construindo
dação ao meio ambiente. Através da espaços de participação e relacionamento
apresentação de dois casos de realização com o poder público, articulando alian-
de audiências públicas na avaliação am- ças, promovendo resistências e buscando
biental de empreendimentos hidrelétri- ampliar os direitos civis, políticos e sociais.
cos, procura-se esclarecer o papel desse A emergência de políticas, bem como de
mecanismo institucional no contexto da instrumentos legais e normativos que
participação da sociedade nas discussões têm como pressuposto a participação da
e tomadas de decisão relacionadas aos sociedade, cujo exemplo são a ação civil
processos de apropriação do território pública 1 e a audiência pública, confir-
e seus recursos naturais. mam esse processo.
2
Conforme aponta Fabiani (1989: 205), a emergência do meio ambiente como uma categoria
nova e objeto de política no espaço público, implica a extensão do domínio político para
setores cuja atuação, em relação ao meio ambiente, estivera fora da ação estatal específica. A
incorporação desses setores, por outro lado, supõe a submissão a uma nova codificação e
fundamentação legal (ambiental), assim como a emergência de novas formas de participação
e representação política.
3
A fim de viabilizar a Política Nacional do Meio Ambiente, a lei criou o Conselho Nacional de
Meio Ambiente (CONAMA), como instância superior do SISNAMA, diretamente vinculado à
Presidência da República. O CONAMA teria como finalidade a articulação de todos os órgãos
e entidades nas diversas instâncias governamentais, bem como de instituições investidas
pelo poder público da responsabilidade pela proteção e melhoria da qualidade ambiental.
Sua missão primordial seria a formulação e execução da política ambiental.
Chélen Fischer de Lemos 165
4
Os órgãos licenciadores ambientais são também chamados de órgãos estaduais de meio
ambiente (OEMAs). Como essa denominação exclui o órgão federal (IBAMA), a denomina-
ção mais genérica foi adotada neste trabalho.
5
O processo de licenciamento ambiental compreende, por parte dos órgãos licenciadores, a
emissão de três tipos de Licença: Licença Prévia (LP); Licença de Instalação (LI); e Licença de
Operação (LO). A sociedade só é chamada a participar das discussões durante o processo de
licenciamento prévio ambiental (Resolução CONAMA 006/87).
166 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
6
Na regulamentação das audiências públicas, alguns estados estabeleceram a possibilidade de
realização de audiências em processos que não exigem EIA/RIMAs, se o órgão ambiental julgar
necessário. É o caso dos estados de São Paulo e de Minas Gerais.
Chélen Fischer de Lemos 167
7
Em meados da década de 1980, a assunção da questão ambiental por parte do Banco
Mundial (BIRD) – em virtude das repercussões dos impactos socioambientais dos grandes
projetos e empreendimentos – reforçou o licenciamento como um instrumento eficaz de
gestão do meio ambiente. Além disso, como agente financiador, o BIRD podia pressionar os
países que recebiam seus financiamentos a adotar tal procedimento.
168 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
8
O I Encontro Nacional de Trabalhadores Atingidos por Barragens ocorreu nos dias 19 a 21 de
abril de 1989, em Goiânia. Em março de 1991 (de 12 a 14) ocorreu o I Congresso Nacional de
Trabalhadores Atingidos por Barragens, em Brasília, com representantes dos atingidos de
várias partes do país. Nesse Congresso foi eleita a Coordenação Nacional do Movimento de
Atingidos por Barragens - MAB. O movimento nacional constituiu-se com o objetivo de articular
as lutas regionais em escala nacional, realizando ações em conjunto e defendendo os
compromissos firmados entre as empresas de energia elétrica e os movimentos de atingidos
em todo o país. Nesse sentido, o MAB procurou articular-se com outros movimentos sociais,
entidades da sociedade civil (nacionais e internacionais), sindicatos, e com o legislativo, a fim
de buscar a adesão política e social à causa dos atingidos. A constituição de um movimento
nacional contribuiu para a consolidação da identidade de atingido como uma identidade
positiva, capaz de compor uma força política. Em 1997, o MAB estendeu suas articulações para
além das fronteiras nacionais através do I Encontro Internacional de Atingidos por Barragens,
realizado em Curitiba em março desse mesmo ano. Do Encontro resultou o documento chamado
“Declaração de Curitiba, Pelo Direito à Vida e aos Modos de Vida das Populações Atingidas
por Barragens”.
Chélen Fischer de Lemos 169
9
O Vale do Ribeira é considerado uma das regiões mais pobres e menos desenvolvidas desses
estados. Localizam-se aí os últimos remanescentes de mata atlântica na região e o último
grande rio que corre livre de barramentos: o rio Ribeira do Iguape. A concentração e as
disputas pela terra tornam a questão fundiária na região bastante complexa, provocando
inúmeros conflitos que envolvem centenas de famílias. Além disso, a região apresenta muitas
áreas ambientalmente protegidas e particularidades socioculturais, como a presença de co-
munidades remanescentes de quilombos. Numa região em que os problemas econômicos,
sociais e ambientais são muito complexos, a questão fundiária torna-se um agravante e um
fator alimentador de todos os outros problemas. Este é o cenário no qual se desenvolvem os
debates em torno da construção das barragens no Vale do Ribeira.
170 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
(MOAB), por sua vez – articulando-se do MOAB, bem como pela ausência de
desde o início com o Movimento Nacio- mobilização organizada dos atingidos e
nal de Trabalhadores Atingidos por Bar- da comunidade em geral.
ragens (MAB) e com outros movimentos
sociais e entidades da sociedade – não A CMVR encontrava-se então pouco
concentrou sua ação no município-sede mobilizada. Além disso, já havia feito as
(Eldorado/SP). O MOAB adotou uma suas próprias “audiências públicas”, por
visão regional mais ampla, procurando ocasião da realização de duas Assem-
conhecer todos os aspectos do problema bléias Populares 11 , nas quais as opiniões
da construção das barragens no Vale do dos moradores e atingidos foram ex-
Ribeira, independentemente das fron- postas não apenas para o poder público
teiras estaduais. Tal perspectiva levou (inclusive a própria SUREHMA, que en-
seus militantes à tentativa de participar viou representantes às duas assembléias),
de todo o processo de licenciamento da como também para o empreendedor. De
usina, inclusive na audiência pública de certa forma, a questão já estava resol-
Cerro Azul/PR. vida: as pessoas se reuniram, deliberaram
pela não construção da usina, tornaram
As audiências públicas para a discus- pública sua decisão e esperaram que essa
são do EIA/RIMA da UHE Tijuco Alto decisão fosse respeitada. Mesmo tendo
foram solicitadas pelas entidades da so- conhecimento de que uma audiência pú-
ciedade civil SOS Mata Atlântica, em blica poderia acontecer, já que ela havia
São Paulo, e GEEP-Açungui (Grupo de sido mencionada pelo governo estadual
Estudos Espeleológicos do Paraná), no no início das conversações sobre o em-
Paraná, em julho de 1990, à Secretaria preendimento, a garantia de que a
de Meio Ambiente de São Paulo (SMA/ opinião da população seria levada em
SP) e à Superintendência de Recursos conta foi considerada mais importante do
Hídricos e Meio Ambiente do Paraná que a garantia de que haveria uma au-
(SUREHMA) 10, respectivamente. A par- diência pública formal para discutir os
tir dessas solicitações, foram marcadas impactos e implicações do empreendi-
as audiências em Ribeira/SP, em março m en to .
de 1993, e em Cerro Azul/PR, em ja-
neiro de 1994. Ambas caracterizaram- Os dois momentos – a participação
se pelo amplo apoio dos políticos locais organizada pela comunidade nas Assem-
ao empreendimento e pela limitada bléias Populares e a participação na au-
participação dos membros da CMVR e diência pública (de Cerro Azul) – podem
10
Esta superintendência foi sucedida pelo IAP – Instituto Ambiental do Paraná.
11
A primeira Assembléia Popular teve lugar na praça principal de Cerro Azul, no dia 07/09/1988,
e contou com a presença de cerca de 2.000 pessoas. A Segunda Assembléia Popular teve lugar
na escola estadual, no dia 27/10/1989, e contou com a presença de cerca de 1.000 pessoas.
Em ambas as assembléias colocou-se em votação se a população era favorável ou não à
construção da usina, que foi rejeitada por unanimidade.
Chélen Fischer de Lemos 171
12
As solicitações de audiência pública na Cidade de São Paulo foram protocoladas em julho de
1990, maio de 1993, agosto de 1993, outubro de 1993 e fevereiro de 1994. A mesma
solicitação foi feita por ambientalistas com assento no CONSEMA nas reuniões plenárias de
06/08/1993 e 06/05/1994; e na Reunião Extraordinária do Plenário do CONSEMA que
decidiu sobre a viabilidade do empreendimento em 26/05/1994.
13
Este procedimento foi denunciado à mesa organizadora por um representante das entidades
ambientalistas do CONSEMA e se encontra registrado na ata sumária da audiência.
172 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
14
Segundo depoimentos de militantes do movimento, os políticos locais teriam mobilizado a
população de toda a região para comparecer à audiência pública e se manifestar favoravelmen-
te ao empreendimento. Para isso, teriam oferecido diária e almoço com churrasco e cerveja.
Chélen Fischer de Lemos 173
15
O CONSEMA é o órgão deliberativo responsável pela discussão e elaboração das normas e
diretrizes da política ambiental do Estado de São Paulo.
16
As exigências condicionantes são obrigações (elaboração de estudos, formulação de proje-
tos, estabelecimento de medidas mitigadoras de impactos ambientais etc.) impostas pelos
órgãos licenciadores ambientais às empresas, cujo cumprimento condiciona a obtenção das
licenças ambientais subseqüentes.
17
Assim como o Vale do Ribeira, o Vale do Jequitinhonha é uma região pobre e cheia de
conflitos fundiários, o que contrasta com a existência de importantes recursos naturais (flo-
restais e subsolo, principalmente). A água, no entanto, é um recurso precioso por se tratar de
uma região sujeita a secas e baixos índices pluviométricos. A população é predominante-
mente rural, e a agricultura é praticada por pequenos produtores no Médio e Alto
Jequitinhonha, com emprego majoritário de mão-de-obra familiar. A pecuária é praticada de
forma extensiva em médias e grandes propriedades no Baixo Jequitinhonha. Essa divisão
reflete a estrutura fundiária polarizada latifúndio/minifúndio e a concentração da terra. O
garimpo de ouro e diamantes permanece até hoje uma atividade econômica importante para
complementar a renda familiar. A migração temporária e permanente, especialmente para
São Paulo e Mato Grosso do Sul, também é uma das particularidades do Vale e expressa as
dificuldades de reprodução social das famílias camponesas. Sendo uma região onde a mo-
radia às margens dos rios constitui o modo de vida tradicional, condição fundamental para a
reprodução social da população rural, a construção de barragens com o resultante desloca-
mento forçado da população pode ter graves conseqüências sociais.
174 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
18
O COPAM foi criado em 1977 como o principal órgão deliberativo e normativo de meio
ambiente do Estado de Minas Gerais.
19
A construção de uma usina hidrelétrica implica a realização de várias etapas de estudos e
projetos. Os estudos de viabilidade determinam se o empreendimento é exeqüível técnica e
economicamente, enquanto os estudos socioambientais (EIA/RIMA), que fundamentam a
Licença Prévia Ambiental, determinam sua viabilidade ambiental.
Chélen Fischer de Lemos 175
20
Em 1993, a Comissão de Atingidos enviou correspondência à FEAM pedindo informações
sobre o andamento do licenciamento da UHE Irapé e manifestando a pretensão de solicitar
audiência pública para discutir o processo. Como resposta, a FEAM sugeriu a solicitação
imediata da audiência pública pelo movimento, o que foi feito oficialmente em 1995.
21
De acordo com depoimento de técnico da FEAM recolhido durante o trabalho de campo, a
CEMIG contratou serviços de terceiros para a montagem de uma “lona de circo” em Acauã,
para o serviço de lanches e para o transporte dos interessados. A luta da Comissão de
Atingidos foi pelo controle dessa infra-estrutura, organizando os grupos de famílias que
seriam transportadas até a audiência e garantindo que tivessem “todo o conforto” de que
eram merecedores.
176 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
dos. Nela os atingidos expuseram seus sugere, pois, que o ambiente da au-
pontos de vista, fizeram críticas ao em- diência interfere no seu resultado. Embo-
preendimento, reivindicaram seus direitos ra elas não tenham poder deliberativo,
e se mostraram grandes conhecedores podem ser politicamente estratégicas para
dos aspectos socioeconômicos e culturais os agentes sociais no desenvolvimento da
da região. luta.
Conclusão
Pelas evidências apresentadas pode-se tantâneo” do conflito. As audiências pú-
dizer, portanto, que as audiências públi- blicas podem ser ainda espaços de rei-
cas possuem muitos significados e de- vindicações e afirmação de identidades
sempenham muitos papéis nos conflitos sociopolíticas (como no caso de Irapé)
relacionados aos empreendimentos ou espaços de controle das manifesta-
hidrelétricos. Ao longo do processo de ções públicas (como no caso de Tijuco
licenciamento ambiental, elas represen- Alto).
tam simultaneamente momentos do
processo de constituição de um campo Por outro lado, o resultado das au-
de lutas, momentos da própria luta, ob- diências dependerá diretamente do
jetos específicos de disputa e momentos modo como – no desenvolvimento da
de manifestação de posições cristalizadas luta – cada agente social ou institucio-
ou, em outras palavras, um retrato “ins- nal age, de acordo com os significados
22
Conforme demonstra Fabiani (1989), a “tecnificação” e a “cientifização” da política estão
relacionadas a um processo de despolitização e neutralização da dinâmica das lutas sociais,
a fim de produzir um esvaziamento do espaço político de sua conflitualidade, por meio da
redução dos problemas a uma solução técnica baseada na verdade científica.
Chélen Fischer de Lemos 181
23
Gismondi e Richardson (1994) contrapõem-se à idéia (baseada em Foucault) de que os
mecanismos institucionais, como as audiências públicas, viabilizam o controle e a submissão
das consciências pelo Estado, servindo como meio de controlar o debate público e a subor-
dinação dos descontentamentos populares. Para esses autores, a elaboração e formulação
de um discurso próprio – através da expressão de compreensões e argumentos alternativos
que questionam maneiras preestabelecidas de falar e pensar – pela população nas audiências
públicas ambientais pode alterar o curso das próprias audiências, uma vez que o discurso
oficial e dominante pode ser desmistificado e sua autoridade social questionada. O espaço
para o surgimento de novas formas de subjetividade ocorre no processo de recusa à adesão
ao discurso oficial e na afirmação da diferença na formulação do discurso próprio.
182 Audiências Públicas, Luta Social e Participação Democrática
Referências bibliográficas
dos por barragens do Vale do Jequi- __________. “O Caso dos Atingidos por
tinhonha. Belo Horizonte, 1993. Dis- Barragens”. In: Equipe do Projeto
sertação em Sociologia (Mestrado) – Meio Ambiente e Democracia. (org.)
FAFICH / UFMG . Conflitos Sociais e Meio Ambiente:
desafios políticos e conceituais. Rio
R OCHA , Benjamin. História do Povo da de Janeiro: IBASE , 1995. p. 39-74.
Beira dos Rios. Minas Novas: CAMPO -
VALE , 1996.
Introdução
1
O’Brien, P. e Karmokoliar, Y. (1994, p. 1).
Wilhelm E. Milward A. Meiners 187
2
Presidência da República (1959) citado por Shapiro (1997).
3
“A legislação sobre o índice de nacionalização pretendia induzir as montadoras a produzirem
somente os componentes principais (como os motores e as estampagens de grandes peças)
e a contratarem junto a fornecedores as peças restantes. Graças à política protecionista,
veículos e peças tiveram que ser produzidos no país, sendo proibida sua importação. Conse-
qüentemente, procurando respeitar o índice de nacionalização, as montadoras foram levadas
a ensinar aos fornecedores conceitos de organização industrial; a oferecer contratos de longo
prazo e, com freqüência, acordos de exclusividade no fornecimento; a emprestar equipamentos
e recursos; a facilitar o contato com fornecedores estrangeiros; e a auxiliar na obtenção de
concessões e outros acordos de assistência técnica, que propiciariam aos brasileiros o acesso
à tecnologia e aos princípios modernos de produção.” Addis, C. (1997, p. 137).
188 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
93,7 milhões no final de 1994 (pouco tinados à renovação dos modelos e mo-
mais de 100%). A arrecadação de impos- dernização dos equipamentos, com
tos federais no setor cresceu de uma vistas à produção de modelos básicos
média de US$ 126 milhões no primeiro que, pelo volume produzido, assumi-
trimestre de 1992 para US$ 306 milhões riam escalas econômicas viáveis.
no último trimestre de 1994 (uma ex-
pansão de 243%) 4. A integração com o Mercosul e a
abertura comercial da economia são
Porém, mesmo com resultado tão fatores importantes para explicar os mo-
favorável, os investimentos nas monta- vimentos da indústria automobilística em
doras permaneceram em um patamar meados da década, principalmente pela
de US$ 1,1 a 1,2 bilhão entre 91 e 94, imposição de uma maior penetração do
e os empregos foram reduzidos de 109 veículo importado e pela prática de regi-
mil em 91 para 107 mil em 94, e para mes automotivos.
menos de 100 mil em 1998. Na indústria
de autopeças os investimentos também No Mercosul, o regime automotivo
permaneceram estáveis no período, em da Argentina entrou em vigor já em
torno de US$ 800 milhões; todavia, a 1992, com prazo de validade até 1999.
queda do emprego foi ainda mais acen- O setor automobilístico é realçado por
tuada: de 255,6 mil empregos em 1991, sua participação no PIB, seus efeitos mul-
o setor passou a empregar 236,6 mil tiplicadores sobre outros setores, seus
em 1994, 192,7 mil em 1996 e cerca impactos nos níveis de renda e emprego
de 185 mil no final de 1998. e, principalmente, por sua influência no
equilíbrio da balança de pagamentos,
Ainda era cedo demais para a in- num momento de esforço para a estabi-
dústria apostar num crescimento sus- lização dos preços e do câmbio. 5
tentado, mesmo porque possuía uma
relativa margem de ociosidade acumu- De acordo com Vigevani e Veiga 6,
lada nos anos 80, podendo expandir a os principais efeitos desencadeados pelo
produção sem investir em novas plantas. regime automotivo argentino foram
Os investimentos no período foram des- uma maior flexibilidade para as monta-
4
Esses dados comprovam que, apesar da diminuição nas alíquotas, não ocorreu nenhuma
“renúncia fiscal” efetiva no setor; ao contrário, proporcionalmente a arrecadação subiu mais
do que as vendas e o faturamento do setor.
5
As principais medidas firmadas entre o governo argentino, empresas montadoras, autopeças
e trabalhadores foram a ampliação de 40% (automóveis) e de 42% (comerciais leves) no
conteúdo importado dos veículos (com a modernização das plataformas e dos modelos e
com o alto grau de global sourcing para as montadoras) e o regime de importação das
montadoras baseado no intercâmbio comercial compensado (para cada dólar exportado a
empresa pode importar igual valor), com a concessão de uma alíquota de 2% na importação
de veículos e partes.
6
Vigevani, T. e Veiga, J. P. C. (1997).
190 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
7
De acordo com Honório Kume, “Tarifa Efetiva: aumento percentual no valor adicionado
doméstico proporcionado pela estrutura de proteção (tarifária e não tarifária) relativamente
ao valor adicionado obtido em situação de livre-comércio. Considera tanto a tarifa aplicada
sobre o produto importado como as tarifas incidentes sobre seus insumos, quando o produto
é produzido domesticamente.” (Kume, H., 1996, p. 23).
Wilhelm E. Milward A. Meiners 191
para disciplinar os preços domésticos via de capital externo, tiveram que promo-
aumento da competição externa. Com ver um ajuste em suas importações.
esse propósito, a liberação das importa- Havia, seguindo a tendência do segun-
ções atingiu o ápice em setembro de do semestre de 1994, uma expectativa
1994 (durante a gestão do Ministro da de elevados déficits em conta corrente,
Fazenda Ciro Gomes), em decorrência que só poderiam ser financiados com a
da conjugação de três fatores: sobreva- entrada de capital de curto prazo. Com
lorização do real provocada pela entra- o objetivo de corrigir a grave distorção
da de capitais e permitida pelo Bacen; nas importações, bem como de atender
antecipação, a partir do Encontro de às demandas de maior proteção setorial,
Cúpula do Mercosul, em Ouro Preto, o Governo Federal editou uma série de
de três meses na data de entrada em medidas, entre elas elevação nos juros
vigor da Tarifa Externa Comum - TEC internos, a fim de atrair capitais externos
(medida que deveria ocorrer somente para recuperar o nível de reservas inter-
com a União Aduaneira, em janeiro de nacionais e cobrir o déficit em conta cor-
1995); e as reduções tarifárias provo- rente; adoção de bandas cambiais, com
cadas para pressionar os preços domés- o objetivo de flexibilizar o câmbio dentro
ticos. As importações, além de mais de limites aceitáveis para a estabilização;
acessíveis, também aumentaram em revisão de alguns subsídios fiscais seto-
decorrência da excepcional elevação da riais, entre eles a suspensão da alíquota
demanda agregada, comum às fases simbólica de 0,1% do IPI dos carros
iniciais dos planos de estabilização. As populares, que voltou ao patamar de
importações saíram de um patamar 8%; e promoção de uma série de restri-
mensal de US$ 2,6 bilhões em junho ções tarifárias, visando atingir os itens
de 1994 para US$ 4,2 bilhões em de- responsáveis pelas altas taxas de cresci-
zembro de 1994. No setor automotivo, mento das importações, particularmente
as importações de autoveículos mais com a ampliação das tarifas de veículos
que dobraram, saltando para US$ 1,84 e a alteração de sua convergência à TEC.
bilhão em 1994 – 193,3 mil veículos,
cerca de 13,8% do mercado interno 8. No final desse ano, foi estabelecido
Em 1995 as importações de autoveícu- o Regime Automotivo Brasileiro, a partir
los atingiram o recorde de US$ 3,863 das seguintes disposições legais: 1) Decre-
bilhões em 1995 – com 411,6 mil uni- to 1.761 (26/12/95), que determina o
dades e 23,2% do mercado interno. sistema de incentivos ao complexo
automotivo (com essa medida o Governo
No final de 1995, com a eclosão da institui o Regime Automotivo Brasileiro,
crise mexicana, as economias latino- estabelecendo algumas regras para a
americanas, que sustentavam crescentes importação de veículos pelas montadoras
déficits comerciais com o grande fluxo instaladas, bem como enquadrando as
8
Em face das exportações de autoveículos, de US$ 1,41 bilhão, foi gerado um déficit de US$ 430
milhões, inédito no item autoveículos desde a implantação do setor, no final dos anos 50.
192 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
9
O Regime Automotivo também prevê proporções mínimas a serem observadas para usufruir
do desconto nas importações, sob pena de multas: na importação de bens de capital as
compras no país devem ser no mínimo iguais às compras efetuadas no exterior – US$ 1 local
para US$ 1 importado – até 31/12/97, e no mínimo o dobro – US$ 2 local para US$ 1
importado – em 1998 e 1999; na importação de matéria-prima as compras efetuadas no país
devem ser no mínimo iguais às compras efetuadas no exterior – US$ 1 local para US$ 1
importado – entre 1996 e 1999. Devem ser observados os limites para as importações com
desconto na alíquota, sob pena de multas: importações totais não podem exceder as expor-
tações líquidas; importações de autopeças não podem exceder 2/3 das exportações líquidas.
O Índice de Nacionalização (relação compra de autopeças e matérias-primas no país/compras
totais de matérias-primas e autopeças) deve ser no mínimo de 50% por um período de 3
anos do início da produção e 31 de dezembro do ano seguinte; depois, mínimo de 60%.
O propósito dessas disposições é regular os descontos previstos nas alíquotas e incentivar a
entrada de novos fornecedores de autopeças, matérias-primas e bens de capital, além da não
desmobilizar as já existentes.
10
Essa MP, reeditada sob a inscrição 1740-32, prorrogando casuisticamente seu prazo para
atender à instalação da Ford, na Bahia, concede benefícios especiais, além dos já previstos a
indústrias que se instalarem no Norte e Nordeste – FINAM e FINOR –, com a intenção de
promover desconcentração regional da indústria automobilística, rompendo com o “polígono
industrial”. Essa medida vem sendo um dos principais entraves para o estabelecimento de
um Regime Automotivo do Mercosul, pois gera um favorecimento regional não aceito pela
Argentina.
Wilhelm E. Milward A. Meiners 193
11
BNDES (1997 e 1998).
194 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
12
BNDES (1994, p. 1).
13
José Ricardo Tauile chama a atenção: “Além do mais, a estabilidade da moeda viabilizava a
reabertura de mecanismos eficazes de financiamento de vendas de veículos (crédito direto
ao consumidor, leasing, consórcios, etc.). Tais mecanismos são importantíssimos para alavancar
as vendas de veículos. Assim é que nos EUA, no início da década, 95% dos veículos eram
vendidos a prazo e apenas 5% à vista. No Brasil, era o contrário, somente 5% das compras
eram financiadas.” (Tauile, 1999, p. 14)
14
Acompanhamento do Centro de Informações Gazeta Mercantil indicam que 14% das inten-
ções e decisões de investimento na indústria estão situados no complexo automobilístico.
Wilhelm E. Milward A. Meiners 195
15
Laplane e Sarti (1997b).
196 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
essencial para sua estratégia mun- mundiais, com presença forte nos prin-
dial. Para essas empresas, a expan- cipais segmentos e mercados mundiais.
são em mercados dinâmicos é tão Estima-se também que a montadora que
crucial hoje como nos anos 50, não estabelecer uma produção (e ven-
quando se deslocaram para a Amé- das) superior a 4 milhões de veículos até
rica Latina em resposta ao ‘desafio 2005 não conseguirá sobreviver às cres-
americano’.” 16 centes exigências financeiras dos vetores
de competição global, ou seja: renovação
A indústria automobilística mundial continuada de modelos, presença em di-
encontra-se em pleno processo de rees- ferentes mercados mundiais com pro-
truturação, envolvendo aspectos de dução local, mix variado de modelos,
transição para a produção enxuta e de capacidade de crédito para fornecedores
recuperação de rentabilidade dos proje- e clientes, capacidade de articulação em
tos industriais em face de outros negócios diferentes culturas gerenciais, empre-
do setor automotivo. Nesse processo, sariais, mercadológicas e institucionais.
decisões a respeito de novos produtos,
alianças estratégicas e mercado são Esse movimento de fusão das mon-
chaves para o sucesso e até para a sobre- tadoras é igualmente compartilhado
vivência empresarial. A montadora que pelos fornecedores de primeira cama-
não estender seu potencial produtivo aos da, que também estão no processo de
blocos regionais e mercados mais dinâ- globalização de suas estruturas produti-
micos perde escala, lucros e participação, vas, no de exigências tecnológicas cres-
correndo o risco de ser absorvida no centes e necessitam de grande suporte
próximo movimento de fusão e incor- financeiro. Nesse sentido, aprofunda-se
poração 17. Estima-se que, das atuais 18 a estrutura oligopolista, com destaque
montadoras, daqui a 15 anos sobrevi- ao grupo restrito de montadoras e sis-
vam apenas de 5 a 8 grandes grupos temistas 18. (Figura 1)
16
Laplane e Sarti (1997b, p. 169-70).
17
Movimentos significativos de fusões e incorporações foram apreciados ultimamente, como a
fusão da alemã Daimler Benz com a Chrysler, a venda da Rolls Royce para a Volkswagen, a
incorporação da Kia (também detentora da marca Asea Motors) pela Hyundai, as aquisições
da Volvo Car pela Ford e da Nissan, uma das grandes do mercado japonês, pela Renault.
18
A partir da lógica do global sourcing, os fornecedores e autopeças estão adquirindo tradicio-
nais fornecedores nacionais, cuja dificuldade de se projetarem ao mercado internacional não
oferece melhores perspectivas de sobrevivência. A lógica da produção enxuta impõe forne-
cedores globais que partilham desde o projeto do produto até a decisão de novos investi-
mentos, acompanhando a montadora nos investimentos em novas regiões. Nesse sentido, o
fornecedor que não possuir fôlego financeiro, gerencial e tecnológico ou associam-se a
global players ou contentam-se com níveis de suprimento de terceira camada para baixo.
Assim, o processo de participação de empresas locais no complexo automotivo é extrema-
mente seletivo e excludente, com redução significativa dos efeitos indutores de desenvolvi-
mento regional a partir da instalação de plantas automobilísticas.
Wilhelm E. Milward A. Meiners 197
19
Humphrey (1998).
198 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
produtores 20, abrindo uma janela de para 2,1 milhões de veículos nesse pe-
oportunidade para o ingresso tanto de ríodo). Havia, também, boas pers-
newcomers como de novas regiões no pectivas de continuar evoluindo, pois a
complexo automotivo nacional. As tabe- região ainda apresentava um dos maio-
las 1 e 2 indicam que o Mercosul, for- res potenciais de crescimento, dada a
mado principalmente pelos mercados idade média da frota de veículos, cerca
brasileiro e argentino, representava, em de 10,5 anos no caso do Brasil, e baixa
1996, 4,1% do mercado mundial de taxa de motorização, 10,3 e 5,9 habi-
veículos, observando uma expansão de tantes por automóvel, no Brasil e na
109% entre 1990 e 1996 (de 1 milhão Argentina, respectivamente.
20
Carvalho e Queiroz (1997, p. 7).
Wilhelm E. Milward A. Meiners 199
21
Brito e Bonelli (1996, p. 1).
200 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
22
As greenfields brasileiras significam para as montadoras a aplicação, em uma região nova e
com menores restrições institucionais, de grande parte dos avanços e adaptações ao sistema
de produção enxuta, que seriam testados no Mercosul e depois introduzidos em novas
plantas nos países centrais. Nesse sentido, as greenfields brasileiras são ricas em produtos de
montagem simplificada, em inovações de lay-out (VW/Audi), em automação dos sistemas de
montagem (Renault e Mercedes-Auto), em elevada interação com fornecedores (o consórcio
modular da VW-Caminhões, a co-localização de fornecedores sistemistas da VW/Audi, GM
Blue Macaw e Ford Amazon, e a modularização da Chrysler), em definição de grupos de
trabalho semi-autônomos em células de montagem com reduzida hierarquia funcional, em
sistemas logísticos e de suprimento just-in-time e just-in-sequence, com estoques mínimos
ou zerados (que ocorrem em todas as greenfields e em algumas brownfields reestruturadas,
como a Mercedes-Caminhões e Ônibus).
23
Varsano, R. (1997, p. 11-12).
24
Ver Rodrigues (1998), CNI/CEPAL (1997) e Gazeta Mercantil (1998).
Wilhelm E. Milward A. Meiners 203
25
Castro (1999, p. 45).
204 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
26
Diniz, C. C. (1996, p. 87-88).
27
A produção automobilística na região concentrava-se em caminhões pesados, ônibus, má-
quinas agrícolas e encarroçadores, além do pólo de autopeças no Rio Grande do Sul.
208 Novo Ciclo de Investimentos da Indústria Automobilística no Brasil
Conclusão
Referências bibliográficas
1
Milton SANTOS, Crescimento nacional e nova rede urbana: o exemplo do Brasil. Revista
Brasileira de Geografia, v. 29, n. 4. p. 78-92, 1967.
2
Tzvetan Todorov, Les morales de l’histoire. Paris: Bernard Grasset, 1992.
Leila Christina Dias 219
Neio Campos
Artículos
Teorías de desarrollo industrial regional y políticas de segunda y tercera generación
A.H.J. (Bert) Helmsing
Las desigualdades territoriales en el estado Español. 1955-1995.
Manuel Delgado Cabeza.
Jesús Sánchez Fernández.
La globalización de la fruta, los cambios locales y el desigual desarrollo rural en América
Latina: un análisis del complejo de exportación de fruta chilena
Warwick E. Murray
El espacio rural entre la producción y el consumo: algunas referencias para el caso argentino
Marcelo Posada
El puerto y la vinculación entre lo local y lo global.
Carlos Martner
Eure tribuna
¿Qué debe hacer el gobierno local ante los grandes emprendimientos en el comercio
minorista?
José Luis Coraggio y Ruben César