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SOCIOLOGIA GERAL

Cinthia Regina Nunes Reis


Cosme Oliveira Moura Júnior

SOCIOLOGIA GERAL

São Luís
2010
Governadora do Estado do Maranhão Edição:
Roseana Sarney Murad Universidade Estadual do Maranhão - UEMA
Núcleo de Tecnologias para Educação - UemaNet
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Cinthia Regina Nunes Reis
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Proibida a reprodução desta publicação, no todo ou em


parte, sem a prévia autorização desta instituição.

Reis, Cinthia Regina Nunes.


Sociologia geral / Cinthia Regina Nunes Reis,
Cosme Oliveira Moura Júnior. - São Luís: UemaNet,
2010.

148 p.: il.

1. Sociologia. 2. Ensino I. Moura Júnior, Cosme


Oliveira II. Título.
CDU: 316:37
SUMÁRIO

UNIDADE 1
A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA .............................................. 13
O contexto do surgimento da sociologia enquanto ciência ........ 13
Consolidação da sociedade capitalista e o surgimento da
sociologia ................................................................ 14

UNIDADE 2
ESTRUTURA METODOLÓGICA DA SOCIOLOGIA ........................... 23
Sociologia como ciência: complexidade epistêmica ................ 23
Problema social versus problema sociológico ........................ 26
Sociologia versus Filosofia Social ....................................... 28

UNIDADE 3
Principais teorias sociológicas para análise da sociedade
contemporânea .......................................................... 31
As teorias clássicas ...................................................... 31
Enfoque coletivista ................................................ 32
A sociologia de Émile Durkheim ........................... 32
A sociologia de Karl Marx ................................... 43
Enfoque individualista ............................................ 57
A sociologia de Max Weber ................................. 57
Novos modelos de explicação sociológica ............................ 73
Escola de Frankfurt ............................................... 74
Nova Sociologia Francesa – Pierre Bourdieu ............. 76
Norbert Elias ................................................ 78
Escola de Chicago ................................................. 79
A sociologia de Georg Simmel ............................. 80
UNIDADE 4
Estrutura social: noções básicas ................................... 87
Conceito e função de estrutura social ............................... 87
Status ................................................................. 88
Papel ................................................................. 89
Os aspectos que fundamentam o papel e o status ............. 90
Integração e relacionamento papel-status ...................... 90
O indivíduo e a estrutura social .................................. 92
Tipos de estrutura social .......................................... 93
Grupos sociais ................................................ 93
Organizações ou estruturas organizacionais ............. 94
Comunidades .................................................. 94
Instituições .................................................... 94
Categorias sociais ............................................ 94
Estratificação social ..................................................... 95
Legitimação da estratificação: aceitação ....................... 97
Conceito básico para compreensão da estratificação ......... 98
Sociedades abertas e fechadas ..................................100
Os tipos de estratificação social .................................101
Castas ......................................................... 101
Classes ........................................................ 103
Estamento .................................................... 105

UNIDADE 5
Instituições Sociais ....................................................109
O que é uma Instituição Social? ......................................109
Família e parentesco ...................................................111
Formas de organização das famílias .............................112
O desenvolvimento da vida familiar .............................115
Mudanças nos padrões familiares ................................116
Economia ................................................................119
O desenvolvimento da agricultura ...............................121
O desenvolvimento da indústria .................................123
O desenvolvimento da economia dos serviços .................127
Religião ...................................................................129
Recreação ...........................................................130
Educação ............................................................131
Política .............................................................132
REFERÊNCIAS ............................................................ 137
ícones

Orientação para estudo

Ao longo desta apostila, serão encontrados alguns ícones utiliza-


dos para facilitar a comunicação com você.

Saiba o que cada um significa.

ATIVIDADES GLOSSÁRIO

SUGESTÃO DE REFERÊNCIAS
FILMES

SAIBA MAIS
APRESENTAÇÃO

A sociologia tem ocupado um papel cada vez mais importante na


análise da sociedade contemporânea. É uma das ciências humanas
que estuda a sociedade, ou seja, estuda sistematicamente o
comportamento humano em seu contexto social, enquanto que o
indivíduo na sua singularidade é estudado pela psicologia.

A sociologia tem uma base teórico-metodológica, que serve para


estudar os fenômenos sociais, tentando explicá-los, analisando
os homens em suas relações de interdependência. Compreende,
também, as diferentes sociedades e culturas, além de esclarecer o
tamanho, a direção e o significado das mudanças sociais, sugerindo
formas de tratar os problemas sociais gerados desde o surgimento
da sociedade capitalista até os dias atuais. Como problemas atuais,
podemos citar a fome, o desemprego, o suicídio entre outros.

Esses problemas, embora sejam constantemente analisados, às


vezes, são desvinculados de sua base social, sendo interpretados
como problemas individuais e, como tais, perdem sua dimensão
social, não encontrando respostas adequadas para tratá-los. A
sociologia busca justamente olhar para estes e outros problemas
que afligem a sociedade contemporânea.

É nessa perspectiva que iremos trabalhar neste material. Procuramos


não só demarcar uma ciência específica, mas, sobretudo,
desvendar alguns problemas ou fenômenos que nos cercam, e não o
percebemos enquanto tais, ou seja, não pensamos neles enquanto
fenômenos sociais e científicos.
Portanto, caro estudante, desejamos excelente leitura do material
e uma proveitosa compreensão do seu conteúdo enriquecendo
tanto seus conhecimentos científicos quanto suas vidas pessoais.

Bom estudo!
PLANO DE ENSINO

DISCIPLINA: Sociologia Geral


Carga horária: 60 horas

EMENTA:
A sociologia no campo do conhecimento: origem histórica. Análise
da realidade social. Conceitos e proposições teóricas e metodoló-
gicas para compreensão dos fenômenos sociais.

OBJETIVOS:
¡ Analisar a realidade social tendo em vista a aquisição de uma
postura crítica e transformadora frente aos problemas sociais
do contexto no qual está inserido;
¡ Compreender o contexto histórico, econômico, político e
social do surgimento da sociologia;
¡ Localizar a sociologia no quadro científico;
¡ Relacionar de forma compreensiva as diferentes perspectivas
teóricas da sociologia para a análise da sociedade contemporânea;
¡ Apreender o conceito e funções da estrutura social;
¡ Compreender o conceito de instituições sociais, identificando
algumas instituições específicas.
CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS:
UNIDADE 1
A sociologia como ciência

UNIDADE 2
Elementos para análise científica: epistemologia da sociologia

UNIDADE 3
Principais teorias sociológicas para análise da sociedade
contemporânea

UNIDADE 4
Estrutura social

UNIDADE 5
Instituições sociais

METODOLOGIA:
O material deve ser trabalhado de forma concatenada, uma vez
que as unidades são correlacionadas. Assim, as unidades 1, 2 e 3
contemplam desde o surgimento da sociologia, sua constituição
enquanto ciência, os teóricos clássicos até o desenvolvimento
das teorias contemporâneas de explicação sociológica; enquanto
as unidades 4 e 5 trabalham as formas como as sociedades se
organizam e como os indivíduos estão inseridos nessa organização.
As aulas devem ser dialogadas com a participação dos alunos.

AVALIAÇÃO:
A avaliação deverá acontecer no decorrer do processo de
aprendizagem finalizando com trabalhos escritos e apresentados
em dupla.

No decorrer das aulas deverá ser observada a participação do


aluno, sua interação com a aula; também valerão nota as questões
levantadas no final de cada unidade, bem como o debate sobre os
filmes sugeridos.

Para finalizar deverá ser elaborado um trabalho que correlacione


duas ou mais unidades.
unidade

1
OBJETIVOS DESTA UNIDADE
A Sociologia como ciência Conceituar a sociologia
a partir de uma
análise histórica
sobre o surgimento,
especialização e
oficialização da disciplina
enquanto ciência;
O contexto do surgimento da Sociologia
enquanto ciência Dissertar sobre o final do
século XIX e anos iniciais
do século XX, tendo em
vista que este período
Nós, seres humanos, sempre tivemos curiosidade pelas origens foi o marco fundador
do nosso próprio comportamento, mas, durante centenas de do surgimento (questão
anos, as nossas tentativas de nos compreendermos dependeram social) e da elaboração
dos modelos de pensar transmitidos de geração em geração, das bases epistemológicas
e metodológicas da
às vezes, seguindo os termos religiosos. Foram em termos
sociologia.
religiosos, por exemplo, que justificavam e explicavam, na
época, o poder da nobreza feudal e da monarquia. Mas, a
teologia, no final do século XVII, paulatinamente foi deixando
de ser a forma norteadora do pensamento, cedendo lugar para
as indagações racionais.

O emprego sistemático da observação e da experimentação


como fonte de exploração dos fenômenos da natureza ganhava
cada vez mais espaço e acumulava cada vez mais conhecimentos.
O pensamento social desse período também realizava seus voos
rumo a novas descobertas. A pressuposição de que o processo
histórico possui uma lógica passível de ser apreendida abriu
novas pistas para investigação racional da sociedade.
Vico (1668-1744) afirmava que “a sociedade podia ser compreen-
dida porque, ao contrário da natureza, ela constitui obra dos pró-
prios indivíduos” (apud MARTINS, 1994, p. 19).

Porém, foi no século XVIII que um movimento intelectual chamado


de Iluminismo nocauteou a influência da religião, da tradição e do
dogma no pensamento intelectual, possibilitando a consolidação
da ciência como a maneira de pensar o mundo.

O estudo objetivo e sistemático do comportamento humano e da


sociedade é um desenvolvimento recente, data do início do século
XIX, mais precisamente por volta de 1830. Porém, a sua formação
constituiu-se em um acontecimento complexo para o qual concor-
reu uma constelação de circunstâncias históricas e intelectuais, e
determinadas intenções práticas.

Consolidação da sociedade capitalista e o


surgimento da Sociologia

O surgimento da sociologia confunde-se com a própria ascensão


do modo de produção capitalista, melhor dizendo, com um novo
paradigma socioeconômico: o capitalismo como modo de vida. Este
processo tem como marcos históricos fundamentais movimentos
como o Renascimento, o Iluminismo, a Revolução Francesa, a In-
dependência dos Estados Unidos e a Revolução Industrial, os quais
fizeram emergir novas relações de trabalho, o estado laico, a ciên-
cia e a razão experimental como fundamentos para compreensão
do mundo.
Questão Social - é
a generalização dos
problemas sociais
Estes períodos foram assolados por crises, guerras, conflitos inter-
surgidos com o advento classistas, suicídios, perda de referências, desemprego, infanti-
do modo de produção
capitalista: desemprego, cídio etc. Inserida neste turbilhão de problemas sociais, que se
mendicância,
fome, aumento tornavam gradativamente globalizados (questão social), surge a
da criminalidade,
prostituição, alcoolismo,
sociologia como alternativa para o controle, planejamento e re-
suicídio, infanticídio, constituição do equilíbrio e coesão social.
surtos de epidemias etc.

14 FILOSOFIA
Esse desequilíbrio foi gerado na transição do Antigo Regime
econômico para o Capitalismo enquanto modo de produção.
Assim, a Revolução Industrial representou o triunfo da sociedade
capitalista que foi pouco a pouco concentrando máquinas,
terras e as ferramentas sob o seu controle, convertendo
boa parte dos indivíduos em despossuídos. Cada avanço com
relação à consolidação da sociedade capitalista representava a
desintegração de costumes e instituições e a introdução de novas
formas de organizar a vida social. A utilização da máquina na
produção não apenas destituiu o artesão dos seus instrumentos
de trabalho como impôs uma severa disciplina, com novas formas
de conduta e de relações de trabalho.

Figura 1: MONTAGEM TRANSIÇÃO ANTIGO REGIME PARA CAPITALISMO


Fonte: http://images.google.com.br/images?hl=ptBR&source=hp&q=revolu%C3%A7%C3%A
3o%20francesa&um=1&ie=UTF-8&sa=N&tab=wi

A transformação da atividade artesanal em atividade manufatureira


e, por fim, em atividade fabril desencadeou uma migração do
campo para a cidade, assim como engajou mulheres e crianças em
jornadas de trabalho de 12 horas, sem direito a férias ou feriados e
recebendo salários inferiores aos dos homens. Essas transformações
impactaram o mundo inglês, sobretudo as cidades industriais

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 1 15


que apresentaram um elevado crescimento demográfico sem, no
entanto, ter uma estrutura de moradia, saneamento, saúde etc.
A título de exemplo, Manchester, que no início do século XIX tinha
por volta de 70 mil habitantes, cinquenta anos depois apresentava
300 mil.

A Revolução Industrial fez emergir o proletariado, vítima das


consequências nefastas desse processo. Essa nova classe, no
entanto, não sofreu de forma impassível, reagiu sob várias formas:
destruição das máquinas, atos de sabotagem e explosão de oficinas,
roubos, crimes, até evoluir para a criação de associações livres e
formação de sindicatos.

Com isso, o centro dos confrontos sociais deixou de ser pobres


contra ricos, para ser classe operária contra os proprietários dos
meios de produção. A profundidade dessas transformações colocou
a sociedade num plano de análise, ou seja, ela passou a se constituir
como um problema, um objeto que deveria ser investigado.

Cabe ressaltar que a Revolução Industrial foi o ponto culminante de uma


evolução tecnológica, econômica e social que vinha se processando
na Europa desde a Baixa Idade Média, com ênfase nos países onde
a Reforma Protestante tinha conseguido destronar a influência da
Igreja Católica: Inglaterra, Escócia, Países Baixos, Suécia. Nos países
fiéis ao catolicismo, a Revolução Industrial eclodiu, em geral, mais
tarde, e num esforço declarado de copiar aquilo que se fazia nos
países mais avançados tecnologicamente: os países protestantes.

Na França, as novas maneiras de produzir chocavam-se com a


monarquia absolutista, isto é, com um regime de governo que
assegurava consideráveis privilégios para um grupo de indivíduos
improdutivos (nobreza), atrapalhando, sobretudo, a consolidação
da livre-empresa.

Por isso, a burguesia, ao tomar o poder em 1789, investiu diretamente


contra os fundamentos da sociedade feudal, procurando construir
um Estado que assegurasse e incentivasse a empresa capitalista.
Figura 2: os três estados na
frança pré-revolucionária
Para tanto, contaram com o apoio dos trabalhadores pobres das
Fonte: http://revistaepoca. cidades. A burguesia que se instalara no poder não constituía um
globo.com/Revista/ Epoca/0,,E
RT60632-15223-60632-3934,00.html grupo coeso quanto aos seus interesses, havia uma ala mais radical

16 FILOSOFIA
que pretendia suprimir também as instituições civis. Porém, o grupo
burguês, interessado apenas nas transformações necessárias para
o livre desenvolvimento empresarial, empreendeu-se em controlar
os novos surtos revolucionários que pretendiam modificar toda a
estrutura social. Assim, o projeto revolucionário deveria ser superado
por outro que conduzisse à “organização” ou aperfeiçoamento da
sociedade nascente, isto é, a sociedade capitalista, o que tornou
necessário parar a radicalização revolucionária e iniciar-se um
processo de reordenação social que possibilitasse o progresso
humano (filosofia social positivista Augusto Comte).

A sociedade capitalista nascente na França, no início do século XIX,


carregava consigo as situações sociais vividas pela Inglaterra no
início da Revolução Industrial. A partir da terceira década do século
XIX, intensificaram-se na sociedade francesa as crises econômicas
e as lutas de classe. A contestação da ordem capitalista pela classe
trabalhadora passou a ser violentamente reprimida pela burguesia,
via os aparatos do Estado.

Mesmo assim, ficava cada vez mais claro que a burguesia não
seria capaz de interromper apenas com ações repressivas aquele
estado de “desorganização” social e estabelecer uma nova ordem
social estável. Por isso, alguns pensadores acreditaram que, para
introduzir uma “higiene” social e reorganizar a sociedade, seria
necessário fundar uma nova ciência.

REVOLUÇÕES BURGUESAS E
ANTIGO REGIME
INDUSTRIAIS
Explicações do mundo vinculadas às Revolução técnico-científica: o cien-
interpretações da Igreja Católica. tificismo. As explicações dos fenô-
menos naturais e sociais passam a
ser baseados na razão científico-ex-
perimental.
Escravidão e não existência de de- Reforma Protestante, Revolução In-
mocracia. glesa, Revolução Francesa, Indepen-
dência dos Estados Unidos.
Relações de trabalho servis: senhor- Sistema capitalista.
servo; escravidão.
Mercantilismo. Relações de trabalho assalariadas,
fim da escravidão e servidão.
Civilização rural e produções manu- Civilização urbano-industrial.
ais e artesanais.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 1 17


Monarquias absolutistas inexistência Poder político-econômico passa para
de participação popular. as mãos da burguesia.
Classes sociais definidas por nasci- O Estado (política laica) passa a ser
mento: nobreza e clero. definido pela participação da bur-
guesia, não mais pela interferência
da Igreja.
Trabalho artesanal e corporações de Trabalho assalariado industrial.
ofício.
Sistema de produção artesanal e ma- Sistema de produção industrial ou
nufatureiro: predomínio do trabalho fabril em que se aplica o trabalho
manual e baixa divisão das tarefas humano conjugado ao uso de máqui-
(divisão social do trabalho). nas, provocando o aumento da pro-
dutividade.
Inexistência de trabalho assalariado. A sociedade passa a ser definida pela
riqueza: burguesia (proprietários) e
proletários (trabalhadores).
Quadro 1: sinóptico - Transição do Antigo Regime para o Capitalismo.

Assim, essa nova ciência que deveria ser


criada, tinha como objetivo uma aplicabilidade
prática, isto é, dar respostas à crise social
daquele tempo. A jovem ciência assumia como
tarefa intelectual repensar o problema da
ordem social.
Positivismo – “é uma
corrente filosófica que Dessa forma, surgiu a sociologia que deveria,
surgiu na França no
começo do século XIX. Os
Figura 3: Auguste Comte segundo Auguste Comte, orientar-se no sentido
Fonte: www.suapesquisa.
principais idealizadores com/o_que_e/ de conhecer e estabelecer as “leis imutáveis”
do positivismo foram positivismo.htm
os pensadores Augusto da vida social, abstendo-se de qualquer
Comte e John Stuart
Mill. Esta escola discussão crítica. Comte denominava a nova ciência de física-social,
filosófica ganhou força
na Europa na segunda expressando o seu desejo de construí-la a partir dos modelos das
metade do século XIX e ciências físico-naturais, seguindo o pensamento positivista.
começo do XX, período
em que chegou ao
Brasil. O positivismo A oficialização da sociologia (denominação atribuída por Comte)
defende a ideia de
que o conhecimento foi, portanto, uma criação do pensamento positivista que pretendia
científico é a única
forma de conhecimento realizar a legitimação intelectual do novo regime, o Capitalismo.
verdadeiro. De acordo
com os positivistas Comte acreditava que este novo campo de estudo podia produzir
somente pode-se afirmar conhecimento acerca da sociedade com base em fatos científicos,
que uma teoria é correta
se ela foi comprovada uma vez que foi a última ciência a se desenvolver. A Sociologia,
através de métodos
científicos válidos”. para ele, deveria contribuir para o progresso da humanidade,
(www.suapesquisa.
com/o_que_e/
usando seu caráter científico para compreender, prever e controlar
positivismo.htm). o comportamento humano em sociedade.

18 FILOSOFIA
Nesse sentido, esta sociologia de inspiração positivista não
tinha como pretensão questionar os fundamentos da sociedade
capitalista, nem alimentar teoricamente as lutas do proletariado.
Este (filho da revolução industrial) buscou no pensamento socialista
o referencial teórico para embasar suas lutas.

Foi nesse contexto que a sociologia adquiriu outra vertente,


tornando-se, também, uma teoria crítica da sociedade.

A sociologia é um campo de disputas pelo poder de criar discursos


que pretendem ser verdades; é uma ciência teórica e prática,
pois é base para a produção de políticas públicas e políticas
internacionais. Desta forma, sociologia não é puramente
filosofia ou abstração pela abstração, mas sim um conjunto de
conhecimentos praxeológicos que nos atingem sem que tenhamos
consciência de tal.

No momento de formação da sociologia, segundo


Martins (1994, p. 34-94), existiam as seguintes
vertentes sociológicas em gênese:
• Sociologia moralista e conservadora; pretendia
amortecer os prejuízos socioeconômicos e políticos
através de propostas conservadoras que tentavam
evitar as mudanças sociais e assim manter um
equilíbrio da sociedade em prol do status quo;
• Sociologia vinculada a lutas sociais e classes
sociais exploradas: a sociologia de Saint Simon,
porém esta tem pouca objetividade, apesar das
propostas de superação da exploração social.
De forma ampla nela se encontram as teorias
marxistas;
• Sociologia acadêmica: relacionada a Émile
Durkheim, procura manter a ordem e compreender
os problemas sociais anômicos e normais.
• Sociologia das elites: a sociologia revolucionário-
burguesa torna-se de elite e procura sintonizar a
emergente sociologia ao controle social.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 1 19


1 Discorra sobre o momento histórico em que surge a
sociologia. Tente enfatizar eventos e transformações
históricas que foram fundamentais e que influenciaram na
construção da sociologia como ciência.

Os Miseráveis (1998)
Sinopse: “Os Miseráveis” (1998) é uma adaptação do clássico romance
homônimo de Victor Hugo. O filme conta a história de Jean Valjean (Liam
Neeson) que, depois de cumprir 19 anos de prisão com trabalhos força-
dos por ter roubado comida, torna-se empresário em uma pequena cidade.
Valjean, perseguido pelo policial Javert (Geoffrey Rush), foge para Paris
com sua filha adotiva. Paris passava por conturbações revolucionárias em
meio ao qual surge o romance entre a filha de Valjean e um jovem revolu-
cionário, impelindo Valjean a se envolver nas lutas proletárias.

Em 1807, para escapar das tropas napoleônicas, o casal se transfere às


pressas para o Rio de Janeiro, onde a família real vive seu exílio de 13 anos.
Na colônia aumentam os desentendimentos entre Carlota e D. João VI.

Direção: Billie August


Gênero: Drama
Elenco: Liam Neeson, Geoffrey Rush, Uma Thurman, Claire Danes, Hans
Matheson.

Tempos Modernos (1936)


Sinopse: Um operário de uma linha de montagem, que testou uma “máquina
revolucionária” para evitar a hora do almoço, é levado à loucura pela
“monotonia frenética” do seu trabalho. Após um longo período em um
sanatório, fica curado de sua crise nervosa, mas desempregado. Ele deixa
o hospital para começar sua nova vida, mas encontra uma crise generali-
zada e equivocadamente é preso como um agitador comunista, que liderava
uma marcha de operários em protesto. Simultaneamente, uma jovem rouba
comida para salvar suas irmãs famintas, que ainda são bem garotas. Elas
não têm mãe e o pai delas está desempregado, mas o pior ainda está por vir,

20 FILOSOFIA
pois ele é morto em um conflito. A lei vai cuidar das órfãs, mas, enquanto
as menores são levadas, a jovem consegue escapar.

Direção: Charles Chaplin


Gênero: Comédia
Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Tiny
Sandford, Chester Conklin.

GIDDENS, Anthony. Sociologia. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste


Gulbenkian, 2000.

MARTINS, Carlos.B. O que é sociologia. Col. Primeiros Passos. 38.


ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

TURNER, Jonathan. Sociologia: conceitos e aplicações. São Paulo:


Makron Books, 2000.

VILA NOVA, Sebastião. Introdução à sociologia. São Paulo: Atlas,


2008.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 1 21


unidade

2
Objetivos dESTA unidade:

ESTRUTURA METODOLÓGICA DA Discutir e apresentar


os aspectos gerais da
SOCIOLOGIA estrutura epistemológica
da sociologia;
Estudar e esclarecer
ao estudante os
principais problemas
epistemológicos e
de delimitação da
sociologia enquanto
Sociologia como ciência: a complexidade epistêmica ciência e área do
conhecimento científico.

A sociologia pode ser conceituada como o estudo sistemático


e metódico da sociedade. Conforme Durkheim, a sociologia
seria o estudo dos fatos sociais. Por outro lado, Weber entende
que a sociologia seria o estudo das ações sociais. De modo
geral, a sociologia é o estudo de fenômenos sociais: problemas
sociológicos e problemas sociais. Mas o que são problemas
sociais e problemas sociológicos? O que caracteriza um
fenômeno social?
Figura 4
Fonte: http://www.
É importante destacar que a estrutura epistemológica da clickinformacao.com/fotos/curso-
de-ciencias-sociais.jpg
sociologia compõe-se, como qualquer outra ciência, de sujeito,
objeto e métodos. O que caracteriza uma ciência são formas com
que o sujeito cognoscente estabelece a relação de pesquisa ou
de estudo com o objeto do conhecimento. Nas ciências humanas,
de modo geral, a relação entre sujeito e objeto possui algumas
variáveis complexas, que tornam a objetividade da elaboração
de leis gerais e universalizantes muito fluida e flexível.
Enquanto nas ciências exatas, principalmente na física, o cientista
pode estabelecer e elaborar leis universais concluídas da pesquisa
de um objeto inanimado, como a força gravitacional, na sociologia
esta relação torna-se muito mais complicada, para não dizer, pra-
ticamente inviável. Mas, por que razão a sociologia não estabelece
leis universais?

A resposta para tal questão reside na estrutura epistemológica da


relação sujeito e objeto, melhor dizendo, da natureza de ambos e
acima de tudo das peculiaridades e complexidades características
do fenômeno social. A primeira resposta pode ser retirada do se-
guinte princípio da sociologia: tanto o sujeito quanto o objeto do
conhecimento são humanos, são seres ou instituições que podem
estabelecer uma relação comunicativa de troca simbólica. Vejamos
no exemplo.

O sociólogo, William Foote Whyte (2005), estudou um grupo de


jovens em uma gangue, tentando compreender o funcionamento e
as causas que levavam a juventude de um bairro norte-americano
a adentrarem nestes grupos sociais. Para fundamentar a pesquisa,
o autor teve que fazer entrevistas, trabalho de campo, e até certo
ponto ser aceito e estudado pelo objeto de estudo, os membros da
Em fevereiro de 1937, o gangue. Neste caso, o trabalho científico do sociólogo só foi possí-
então jovem economista
William Foote Whyte,
vel porque ele dialogou e trocou informações com o objeto, que,
com uma bolsa de de algum modo, também o estudava.
iniciação de Harvard,
decidiu estudar um bairro
italiano pobre de Boston, Desta rápida descrição, podemos retirar a seguinte inferência: o
a que deu o nome de
Cornerville. Um clássico sucesso de uma pesquisa social requer, em muitos casos, o estabe-
da pesquisa sociológica, o
trabalho de Whyte sobre lecimento de um diálogo com o objeto de estudo.
Cornerville tem servido
como modelo para a
etnografia urbana há Agora pensemos no caso da física. Seria possível o físico estabele-
quase 70 anos. Utilizando cer uma relação dialógica com a lei da gravidade? A lei da gravida-
o método de observação
participante, o autor de poderia questionar o físico? Poderia não aceitar a pesquisa?
revela um mundo de
intrincadas relações
sociais, considerando A relação sujeito e objeto na sociologia é caracterizada pela dialo-
pessoas e situações reais.
Com seu olhar profundo gicidade, o sujeito e objeto interagem entre si. Desta caracterís-
e detalhista, Whyte
mudou a maneira de se
tica temos como corolário fundamental o caráter relacional entre
compreender a pobreza sociólogo e objeto de estudo. O segundo fator de complexidade
e a vida nas grandes
cidades. (http://www. diz respeito às características humanas, principalmente, ao livre
zahar.com.br/imprensa/
r0922.pdf) arbítrio.

24 FILOSOFIA
O livre arbítrio é uma característica humana que possibilita a va-
riabilidade em relação a uma lei social geral, ou seja, por mais
que haja uma tendência para determinado comportamento, a com-
plexidade da razão humana, conjugada com o livre arbítrio, pode
gerar um desvio à norma. Já no caso das leis da física - como a lei
da gravidade - não cabe livre arbítrio, ninguém escolhe segui-la ou
transgredi-la, simplesmente a gravidade atua sobre nós como lei da
natureza universal e geral. Neste sentido:
A matéria-prima da ciência natural, portanto, é
todo o conjunto de fatos que se repetem e têm
uma constância verdadeiramente sistêmica, já que
podem ser vistos, isolados e, assim, reproduzidos
dentro de condições de controle razoáveis, num
laboratório. [...]. em contraste com isso, as ciências
sociais estudam fenômenos complexos, situados em
planos de causalidades e determinação complicados.
Nos eventos que constituem a matéria-prima do
antropólogo, do sociólogo, do historiador, do cientista
político, do economista e do psicólogo, não é fácil
isolar causas e motivações exclusivas, mesmo quando
o sujeito está apenas desejando realizar uma ação
aparentemente inocente e basicamente simples,
como o ato de comer um bolo. Pois um bolo pode
ser comido porque se tem fome e pode ser comido
por motivos sociais e psicológicos: para demonstrar
solidariedade a uma pessoa ou grupo, para comemorar
uma certa data (DAMATTA, 1997, p.18).

Por outro lado, na sociedade, por mais imperativa que seja a norma
social, sempre há o desvio; por mais perfeita que seja a organiza-
ção social, sempre cabe a transgressão. Talvez por isso Rousseau
tenha chegado à conclusão de que a democracia, por mais perfeita
que fosse, só poderia ser plena quando exercida por deuses ou por
anjos, pois os primeiros construiriam, supostamente, as leis univer-
sais, e os segundos seriam desprovidos de livre arbítrio.

Outro fator que torna o objeto da sociologia ainda mais complexo é


que os fatos sociais não podem ser reproduzidos em laboratório, ou
seja, são fatos únicos. Nestes termos, a matéria-prima das ciências
humanas são eventos do passado, e o papel dos cientistas humanos
é tentar entender tendências por meio da reconstrução racional
das relações causa-efeito destes eventos. De modo geral, um fe-
nômeno social é único, apesar de possuir tendências. Deste modo:

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 2 25


O problema básico, assim, continua: os fatos so-
ciais são irreproduzíveis em condições controladas
e, por isso, quase sempre fazem parte do passado.
São eventos a rigor históricos e apresentados de
modo descritivo e narrativo, nunca na forma de
uma experiência. Realmente não posso ver e certa-
mente jamais verei uma expedição de troca do tipo
kula, tão esplendidamente descrita por Malinowsk
(DAMATTA, 1997, p. 21).

Destarte, podemos concluir da complexidade dos fenômenos dois


grandes corolários fundamentais da estrutura epistemológica da
sociologia enquanto ciência humana: 1) a relação sujeito e objeto
é relacional; 2) o fenômeno social é relativo, pois varia conforme
o espaço, tempo, sociedade e cultura; 3) a sociologia não traba-
lha com leis universais, mas com tendências fenomenológicas; 4)
o fenômeno humano é flexível, fato que não lhe retira o caráter
objetivo e rigoroso, pois há métodos para se trabalhar com as ten-
dências fenomenológicas.

Agora voltemos para um segundo questionamento: o papel da so-


ciologia é estudar somente os problemas sociais?

Problema social versus problema sociológico

Muitos imaginam que a sociologia é a ciência que estuda problemas


sociais para buscar soluções, ou seja, estuda os problemas, assim
como um médico patologista estuda os estados anômicos da socie-
dade para criar uma “vacina” e, assim, solucionar a doença e gerar
a normalidade social. No entanto, esta é uma concepção muito
restrita do que é sociologia que, enquanto ciência, é muito mais
que o estudo de estados de anormalidade. Observe:
Parece frequente que os que não estão familiari-
zados com a sociologia imaginam que esta ciência
tenha como objetivo a resolução dos problemas so-
ciais, o que é um equívoco. É bem verdade que a so-
ciologia nasceu como tentativa de buscar soluções
racionais, científicas, de acordo com a pretensão
de Comte, para os problemas sociais resultantes da

26 FILOSOFIA
revolução industrial e de decomposição da ordem
social aristocrática na França do início do século
XIX. Nos Estados Unidos, a sociologia foi grande-
mente estimulada, nos seus primórdios pela pre-
tensão análoga, embora como consequência de
outras condições sociais, de fazê-la um instrumen-
to para a solução científica dos problemas daquela
sociedade [..] (NOVA, 2008, p.42).

Todo fenômeno social é um problema sociológico, pois se origina na


sociedade e desdobra consequências sociais. Temos como exemplo
as manifestações populares como o bumba-meu-boi, o carnaval,
assim como a pobreza e as relações de trabalho. É importante en-
fatizar que os problemas sociológicos não são em si fatos patológi-
cos, ou seja, fenômenos que produzem prejuízos à sociedade.

Essa última categoria de problemas sociológicos são considerados


problemas sociais, que são fenômenos que geram ou tendem a ge-
rar prejuízos e estados patológicos na sociedade. Como exemplo,
temos a pobreza, o alto nível de criminalidade, o alto nível de cor-
rupção, que podem gerar ou geram estados de instabilidade e de
prejuízo à sociedade em geral.

Portanto, todo problema social é um problema sociológico, mas


nem todo problema sociológico é problema social, pois:
Imaginar que a sociologia seja uma ciência dos
problemas sociais constitui um equívoco análogo
ao de supor que a biologia tenha como objeto de
estudo apenas as manifestações patológicas, doen-
tias, de vida.
Ao sociólogo interessam, antes, os problemas so-
ciológicos, quer dizer, os problemas de explicação
teórica do que acontece na vida social. Neste sen-
tido, tanto o funcionamento fluente da família
quanto a sua desorganização entram no campo de
interesse do sociólogo (NOVA, 2008, p.43).

Fica claro que a sociologia não estuda apenas fenômenos patoló-


gicos, estados de fragmentação e desintegração do tecido social,
mas estuda também estados de normalidade e estabilidade. Nestes
dois grandes marcos divisórios do objeto da sociologia (desinte-
gração e estabilidade) podemos utilizar a classificação de Augusto
Comte: a sociologia estática e a sociologia dinâmica.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 2 27


A sociologia estática é o campo da sociologia que estuda as insti-
tuições, ou seja, os aspectos contínuos das sociedades (estados de
normalidade). Enquanto a sociologia dinâmica estuda processos de
mudança, que geralmente são momentos compostos por problemas
sociais advindos de questionamentos de uma antiga ordem estável
da sociedade (lembremos da passagem do antigo regime para o
capitalismo).

A sociologia estática estuda os fenômenos gerais da sociedade, es-


tuda a vida social em si mesma, os aspectos constantes da socieda-
de. Este modo estuda as Instituições básicas, ou seja, instituições
necessárias para vida social: 1) a propriedade – que permitem aos
homens produzirem e acumularem; 2) a família – que educa e en-
sina os costumes e tradições aos indivíduos; 3) a linguagem – que
possibilita a comunicação e a troca simbólica entre os indivíduos
em sociedade. A sociologia dinâmica estuda os processos de trans-
formação e evolução da vida social.

Sociologia versus filosofia social

Outra confusão que há no campo da sociologia é a equiparação


desta com a filosofia, fato em si um erro epistemológico infantil.
Primeiramente, é importante enfatizar o que é conhecimento cien-
tífico e o que é conhecimento filosófico.

Inicialmente, o conhecimento científico pode ser considerado


o produto de um processo racional, sistemático e metódico de
observação objetiva de fenômenos, fatos, processos e realidades
verificáveis. Nestes termos, a ciência faz-se: racional, verificável,
factual, experimental e objetiva. A ciência baseia-se na objetividade
(observação sistemática de objetos) para se chegar a verdades
provisórias. As verdades são provisórias, pois a realidade é mutável e
dinâmica. Desse modo a ciência acompanha os processos de mudança
e é válida até quando suas teorias não são refutadas (princípio da
falseabilidade).

28 FILOSOFIA
Por outro lado, o conhecimento filosófico, apesar de racional,
sistemático, rigoroso e lógico, não é verificável, não pode ser testado
nem verificado empiricamente:
[...] portanto, o conhecimento filosófico é
caracterizado pelo esforço da razão pura para
questionar os problemas humanos e poder discernir
entre o certo e o errado, unicamente recorrendo às
luzes da própria razão (LAKATOS, 2008, p.19).

Retomemos a sociologia. Esta área do conhecimento é uma ciência, Falseabilidade (ou refuta-
bilidade) é um conceito
pois seu objeto é verificável e o produto de suas pesquisas são importante na filosofia da
ciência (epistemologia).
testáveis e falseáveis, pois são empiricamente observáveis. Como Para uma asserção ser
refutável ou falseável,
exemplo, podemos citar um sociólogo que pretende estudar os em princípio será possível
comerciantes informais das ruas de uma grande cidade. Tal objeto fazer uma observação ou
fazer uma experiência
de estudo é empiricamente observável, com isso o pesquisador física que tente mostrar
que essa asserção é falsa.
não fará um estudo a partir da introspecção, mas sim através de Por exemplo, a asserção
“todos os corvos são
análises teórico-empíricas baseadas no fenômeno. pretos” poderia ser fal-
sificada pela observação
Por fim, fica claro que a sociologia é uma ciência que tem um objeto de um corvo vermelho.
A escola de pensamento
empírico, verificável e falseável, já o conhecimento filosófico que coloca a ênfase na
importância da Falseabi-
não possui tal estrutura. A análise da Filosofia Social emite juízo lidade como um princípio
filosófico é conhecida
de valor, é normativa, especulativa e conjectural; enquanto a como a Falseabilidade.
sociologia parte da observação de fatos sociais, não é especulativa, http://pt.wikipedia.org/
wiki/Falseabilidade
é observação sistemática de fatos e não emite juízos de valor.

1 Por que o conhecimento sociológico não é o mesmo que


conhecimento filosófico?

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 2 29


ILHA DAS FLORES (1989)
Sinopse: Um ácido e divertido retrato da mecânica da sociedade de con-
sumo. Acompanhando a trajetória de um simples tomate, desde a plantação
até ser jogado fora, o curta escancara o processo de geração de riqueza
e as desigualdades que surgem no meio do caminho.

Direção: Jorge Furtado


Gênero: Documentário Experimental

DA MATTA, Roberto. Relativizando: uma introdução à antropologia


social. Rio de Janeiro: Rocco, 1987.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. São


Paulo: Perspectiva, 2005.

LAKATOS, Eva Maria e MARCONI, Marina de A. Metodologia


Científica. 5. Ed. São Paulo: Atlas, 2008.

SANTOS, Boaventura Sousa. Introdução a uma Ciência Pós-


Moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.

William Foote White. Sociedade de esquina: a estrutura social de


uma área urbana pobre e degradada. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

VILA NOVA, Sebastião. Introdução à Sociologia. São Paulo:


Atlas,2008.

30 FILOSOFIA
unidade

3
Objetivo dESTA unidade:

Principais teorias sociológicas Apresentar as


principais bases da
para análise da sociedade sociologia clássica e
suas contribuições
contemporânea para estruturação das
análises da sociedade
contemporânea, isto é,
sociedade capitalista;
Tratar as abordagens
coletivistas (Émile
As teorias clássicas Durkheim e Karl Marx)
e individualistas
(Max Weber e George
Simmel) com suas
A sociologia enquanto herdeira das tradições concepções dicotômicas
da realidade social
filosóficas conservou antinomias clássicas (indivíduo-sociedade);
desta matriz epistemológica. Em particu-
Discutir as teorias
lar, as oposições tradicionais entre idealis- contemporâneas que
mo e materialismo, sujeito e objeto. Émile buscam superar estas
antinomias e pensar
Durkheim e Karl Marx, apesar de apresenta-
conjuntamente os
rem diferenças substanciais em seus corpos aspectos da realidade
teóricos, compartilham a abordagem coleti- classicamente
Figura 5
Fonte: http:// vista, destacando a estrutura como a unida- apreendidos como
sociologiaemrede.ning. antagonistas.
com/ de de análise por excelência.

Em contraposição a esse pressuposto coletivista, encontram-se


os autores que privilegiam como unidade de suas análises as
ações subjetivas de atores individuais, pois para este grupo,
aqui representado por Weber e Simmel, é a realidade individual
que compõe e dá sentido à realidade social.
Enfoque coletivista

Saint Simon A sociologia de Émile Durkheim


Claude-Henri De Rouvroy, Con-
de de Saint-Simon (nascido a 17
de outubro de 1760 e falecido
a 19 de maio 1825, em Paris), O arcabouço metodológico desse autor tem como unidade de
foi um dos fundadores do cha-
mado “socialismo utópico”. Foi análise as estruturas sociais. A visão de Durkheim sobre o objeto
um importante teórico social
francês que escreveu a obra e método da sociologia foi moldada pelo pensamento positivista
Nouveau Christianisme, na qual
proclamou uma fraternidade francês remontando, principalmente, a Comte e Saint-Simon.
do homem que deve acompa-
nhar a organização científica
da indústria e da sociedade.
(http://www.cobra.pages.
nom.br/fmp-saint-simon.html)
Émile Durkheim
e (Martins, 1994).

Nascimento 15 de abril de 1858


Falecimento 15 de novembro de 1917
Paris, França
Nacionalidade Francês
Ocupação Acadêmico, sociólogo, antropólogo, filósofo

Seu objetivo, segundo Giddens (1999), era encontrar uma resposta


Figura 6 - Émile Durkheim
Fonte: http://1.bp.blogspot. aos perturbadores efeitos da vitória alemã sobre a França em
com/_iFoS7IfVMsg/SInoEBvZQFI/
AAAAAAAAALk/-1W1jfexDM8/ 1870-1871. A Revolução do século XVIII, da qual os eventos de
s400/durkheim.jpg
1870-71 foram consequência, acabou com o Antigo Regime, e
estabeleceu a sociedade liberal, burguesa, trazendo com ela
problemas políticos e sociais de ordem geral, que se tornaram
crônicos. O grande problema teria sido o fato da Revolução
Francesa não ter estabelecido uma sociedade burguesa ideal,
isto é, a combinação de democracia política com hegemonia de
uma classe capitalista dominante. Em função disso, a história
francesa foi caracterizada por ciclos de revolução e restauração,
permanecendo sempre elementos conservadores. Esse fato
marcou o pensamento durkheimiano, que se entregou não ao
problema da ordem em geral, mas de uma autoridade adequada
para a sociedade industrial moderna.

32 FILOSOFIA
Durkheim aponta os fatos sociais, como o objeto de análise, em
sua obra As Regras do Método Sociológico (1895). Esses fatos
teriam que ser definidos objetivamente, eles não poderiam
ser confundidos com os demais fatos, que caberiam a outras
ciências investigarem. Os fatos sociais que serviam de objeto
para a sociologia eram percebidos através de sinais exteriores,
ou seja, eles se manifestavam por meio de coisas concretas,
e teriam que ser tratados como tais. Para Durkheim os fatos
sociais são aspectos da vida social que moldam as nossas ações
enquanto indivíduos.

Deste modo, o autor define fato social como manifestação de


algum fenômeno, preponderantemente coletivo, coercitivo e
exterior aos indivíduos. Nesta concepção o fato social é algo que
está além do individual e acima da psicologia (entenda psicologia
como estudo individual da mente humana). Assim, o fato social é
dotado de vida própria, independente da vontade individual dos
membros da sociedade:
[...] consistem em maneiras de agir, de pensar e
de sentir, exteriores ao indivíduo e que são dota-
das de um poder de coerção em virtude do qual
esses fatos se impõem a ele. Por conseguinte,
eles não poderiam se confundir com os fenômenos
orgânicos, já que consistem em representações e
em ações; nem com os fenômenos psíquicos, os
quais só têm existência na consciência individual
e através dela. Esses fatos constituem, portanto,
uma espécie nova, e é a eles que devem ser dada
e reservada a qualificação de sociais (DURKHEIM,
1999, p.3-4)

Esclarecendo o conceito

Durkheim elenca três características básicas e indispensáveis para


um fenômeno ser classificado enquanto fato social:

• Coerção externa: significa que todo fato social, para ser fato
social, tem que coagir o indivíduo caso ele queira ir de encontro
à determinação do fato. Essa coerção pode ser violenta ou não,
só simbólica, mas que incomode, que constranja o indivíduo;

• Generalidade do fato: o fato deve atingir a todos, sem exceção,


conforme a sua regra; e, além disso, é produto da própria

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 33


coletividade. Assim, deve ser entendido como manifestação de
uma totalidade social: consciência coletiva e representações
coletivas. “O fato social é público” (Durkheim, 1999);

• Autônomo à vontade do indivíduo: o fato independe da vontade


do indivíduo, este tem que se “submeter”, uma vez que a
sociedade (este ser formado por todos os indivíduos, mas que
vai muito além destes) está acima dele, pois:

[...] esse fenômeno é um estado do grupo, que se


repete nos indivíduos porque se impõem a ele. Ele
está em cada parte porque está no todo, o que é
diferente de estar no todo por estar nas partes
(DURKHEIN, 1999, P.9).

Reconhecendo um fato social: a moda

Cada um se veste de uma maneira, num determinado


momento, porque todos se vestem dessa forma. Não
é um indivíduo que origina a moda, mas a sociedade
que, partindo de vários pontos, constrói um modo
determinado de vestimenta, que varia conforme
sexo, idade etc.
Caso queiramos ir contra o padrão estabelecido,
sofreremos coerção direta e/ou indireta. Basta
não estarmos vestidos da forma que foi designada
como adequada para adentrarmos em determinados
ambientes que somos prontamente barrados, como
por exemplo, não podemos entrar em nenhuma
repartição pública com trajes de banho.
Em outros casos a coerção é indireta, através de
olhares recriminadores, risos etc. Mesmo não tendo
uma proibição expressa, na nossa sociedade, homem
não usa vestido e caso algum queira experimentar essa
coerção social, basta sair à rua trajando o referido
vestido que, certamente, logo sentirá os olhares, os
cochichos e rizinhos que, no mínimo, incomodarão.

Para tentar comprovar essas três características dos fatos sociais,


segundo Durkheim:
Basta observar a maneira como são educadas as
crianças. Quando reparamos nos fatos tais como
são e como sempre foram, salta aos olhos que

34 FILOSOFIA
toda educação consiste num esforço contínuo para
impor à criança maneiras de ver, de sentir e de agir
as quais ela não teria chegado espontaneamente.
Desde os primeiros tempos de sua vida a coagimos
a comer, dormir e a beber a horas regulares.
Coagimo-la à limpeza, à calma, à obediência;
mais tarde, coagimo-la a ter em conta os outros,
a respeitar os usos, as conveniências, a trabalhar
etc. etc. Se, com o tempo essa coação deixa de ser
sentida é porque fez nascer hábitos e tendências
internas [...] (internalização das regras sociais)
(DURKHEIM, 1978, p.89, grifo nosso).

Fatos enquanto maneira de ser e de agir

Os fatos sociais se manifestam, como no exemplo supracitado, nas


maneiras de fazer em cada sociedade, mas não se restringem a
isso, pois se manifestam também como maneiras de ser coletivas
(DURKHEIM, 1978).

Os fatos sociais, enquanto maneiras de agir, podem ser menos


consolidados, mais fluidos. Nesse caso, temos as chamadas cor-
rentes sociais, movimentos coletivos ou correntes de opinião que
nos impelem com intensidade desigual, segundo épocas e lugares,
a agirmos de determinadas maneiras. Exemplos desses fatos são
as correntes para casamento, suicídio, aumento da natalidade ou
sua redução etc. Essas correntes variam conforme mudanças nos
contextos sócio-históricos.

Os fatos sociais, enquanto maneiras de ser, têm uma forma já cris-


talizada na sociedade. Nesse caso temos as regras jurídicas, mo-
rais, os dogmas religiosos e sistemas financeiros, o sentido das vias
de comunicação etc. Exemplos desse tipo de fato social são os mo-
dos de circulação de pessoas e mercadorias, as formas de comuni-
car, de negociar, de expressar louvor etc.

Exemplificando

Nos anos de 1980 surgiu no mundo a AIDS. Esta doença foi aos
poucos impondo mudanças nas maneiras de agir nas relações
sexuais, isto é, a adoção do uso de preservativo tornou-se um

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 35


imperativo inquestionável, uma vez que a ciência comprovou que
a única forma de prevenção da doença nas relações sexuais é
recorrer ao uso do preservativo. Mas essa mudança, já consolidada
no padrão de comportamento das pessoa, ainda não foi aceita
pelos dogmas da religião católica. Esta ainda condena qualquer
método anticoncepcional, incluindo o uso do preservativo.

O método – regras relativas à observação dos fatos sociais

A investigação dos fatos sociais deve seguir os passos já determina-


dos pelas ciências naturais, embora Durkheim reconheça a particu-
laridade do objeto das ciências sociais. Assim, o autor sugere como
a primeira regra e mais fundamental: considerar os fatos sociais
como coisas, e esclarece:

Não dissemos que os fatos sociais são coisas


materiais, e sim que são coisas tanto quanto as
coisas materiais, embora de outra maneira.
O que vem a ser coisa? A coisa opõe a ideia assim
como o que se conhece a partir de fora se opõe
ao que se conhece a partir de dentro. É coisa todo
objeto do conhecimento que não é penetrável à
inteligência, tudo aquilo que não podemos fazer
uma noção adequada, por simples procedimento
de análise mental.[...] Tratar os fatos de uma certa
ordem como coisas não é, portanto, classificá-los
nesta ou naquela categoria do real; é observar
diante deles uma certa atitude mental (DURKHEIM,
1999, p. XVII).

Destarte, os fatos sociais são objetos científicos, pois se materia-


lizam, ou seja, são verificáveis. Esta característica separa a socio-
logia da filosofia, pois a primeira trata de um objeto verificável e
a segunda toma as ideias como objeto de estudo. Por outro lado, a
sociologia também se preocupa com o que se conhece a partir de
fora (social), diferindo-se da psicologia que estuda fenômenos que
se conhece a partir de dentro (internos ao indivíduo).

A segunda regra que é corolário da anterior consiste em: descartar


sistematicamente todas as pré-noções e os preconceitos que
nos paralisam quando pretendemos conhecer os fatos sociais
cientificamente. Também porque as “coisas” são tudo o que nos é
dado, tudo o que se oferece (ou se impõe) à nossa observação, é

36 FILOSOFIA
algo exterior a nós. “Mas esta regra não ensina ao sociólogo como
este deve apoderar-se dos fatos para proceder um estudo objetivo”
(DURKHEIM, 1999, p. 35).

Para tanto, o sociólogo deve definir e classificar o conjunto de


fenômenos que pretende estudar, isto é:
[...] definir aquilo que irá tratar para que todos
saibam, incluindo ele próprio, o que está em cau-
sa. Esta é a primeira e mais indispensável das con-
dições para o estabelecimento de qualquer prova
e de qualquer verificação (DURKHEIM, 1999, p.35).

Para cada categoria de fatos sociais só há uma única causa, por-


tanto, uma única explicação. Explicar um fenômeno social, para
Durkheim, é procurar sua causa eficiente, é identificar o fenôme-
no antecedente que o produziu. Depois de achar a causa, pode-se
procurar descobrir a função desse fenômeno na sociedade, a sua
utilidade. Se, por ventura, há várias causas para um fenômeno, há
vários tipos desses fenômenos.

As causas dos fenômenos sociais devem ser procuradas no meio


social, no qual eles estão acontecendo, não devem ser procuradas,
por exemplo, no passado, como a História faz. Para se verificar se
um fenômeno é causa de outro, deve-se comparar os casos e veri-
ficar as diferentes combinações de circunstâncias que revelam que
um depende do outro: “o social só pode ser explicado pelo social”
(DURKHEIM, 2003, p. 112.).

Aplicação do Método: o estudo sobre o suicídio

Segundo Durkheim, existe para cada grupo social uma tendência O Suicídio, obra escrita
em 1897, é considerada
específica para o suicídio, que não é explicada nem pela constitui- modelo de pesquisa social
ção orgânico-psíquica dos indivíduos nem pela natureza do meio na qual o método central
utilizado é o uso da esta-
físico. Com essa constatação, ele atribui como causa fatores sociais tística como instrumento
de análise de fenômenos
e, assim sendo, constitui-se enquanto um fenômeno coletivo. sociológicos.

De acordo com Durkheim, os indivíduos têm certo nível de inte-


gração com os seus grupos, o que ele chama de integração social.
Níveis anormalmente baixos ou altos de integração social poderiam
resultar num aumento das taxas de suicídio.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 37


Os níveis baixos afetam porque a baixa integração social, sendo
resultado de uma sociedade desorganizada, leva os indivíduos a se
voltarem para o suicídio como uma última alternativa, ou ainda,
porque os indivíduos não possuem laços sociais (vínculos sociais)
que os impeçam de atentar contra sua própria vida. Os níveis al-
tos afetam na medida em que as pessoas preferem destruir a si
próprias a viverem sob grande controle da sociedade, ou ainda,
suicidam-se para manterem um ideal coletivo ou o bem comum de
um grupo social.

Partindo da ideia de que um efeito (sinal exterior) só pode ser


fruto de uma única causa, Durkheim comparou taxas de suicídio
e chegou à conclusão que havia vários tipos de suicídio. Concluiu
também que estes tinham como fonte geradora causas diferen-
tes, uma vez que um mesmo antecedente (causa) não pode pro-
duzir consequências diferentes. Portanto, para classificar os tipos
de suicídio, procurou identificar e classificar as condições sociais
(causas) que levaram aos suicídios. Com isso, classificou quatro
tipos de suicídios:

1. Suicídio anômico: a anomia é um estado onde existe uma fraca


regulação social entre as normas da sociedade e o indivíduo, mais
frequentemente trazidas por mudanças dramáticas nas circuns-
tâncias econômicas e/ou sociais. Este tipo de suicídio acontece
quando as normas sociais e leis que governam a sociedade não cor-
respondem com os objetivos de vida do indivíduo, uma vez que o
indivíduo não se identifica com as normas da sociedade, o suicídio
passa a ser uma alternativa de escape.

2. Suicídio fatalista: o fatalismo é o estado oposto à anomia, onde


a regulação social é completamente instilada no indivíduo; não há
esperança de mudança contra a disciplina opressiva da sociedade.
A única forma de o indivíduo ficar livre de tal estado é cometer
suicídio. Durkheim viu esta razão nos escravos que cometeram sui-
cídio na antiguidade, mas viu uma relevância mínima na sociedade
moderna.

3. Suicídio egoísta: o egoísmo é um estado onde os laços entre o


indivíduo e os outros na sociedade são fracos. Estando o indivíduo
fracamente ligado à sociedade, terminar sua vida terá pouco im-

38 FILOSOFIA
pacto no resto da sociedade. Em outras palavras, existem poucos
laços sociais para impedir que o indivíduo se mate. Esta foi a causa
vista por Durkheim entre divorciados e homens solteiros, que ten-
dem ao suicídio mais que os homens casados, uma vez que o casa-
mento para os homens gera laços sociais mais estáveis e na intensi-
dade ideal; não os oprime da mesma forma como às mulheres, por
isso, para estas a relação é inversamente proporcional.

4. Suicídio altruísta: o altruísmo é o oposto do egoísmo, onde um


indivíduo está extremamente ligado à sociedade, de forma que não
tem vida própria. Indivíduos que cometem suicídio baseados no al-
truísmo morrem porque acreditam que sua morte pode trazer uma
espécie de benefício para a sociedade. Em outras palavras, quando
um indivíduo está tão fortemente ligado à sociedade, ele cometerá
suicídio independentemente de sua própria hesitação se as normas
da sociedade o levarem a tal.

Durkheim viu isto ocorrer de duas formas diferentes:

a. quando os indivíduos se veem sem utilidade para a sua socieda-


de, tornando-se um peso para a mesma, eles preferem cometer
suicídio, como em algumas sociedades indígenas;
b. quando os indivíduos veem o seu mundo social (com seus ideais
e crenças) mais importante do que a sua própria existência in-
dividual, sacrificam a si próprios em defesa do mesmo, como
os homens-bomba.

Estado normal e patológico

Durkheim analisa a sociedade em duas perspectivas: um estado


normal e um estado anômico ou patológico. Para definir um estado
de normalidade social, basta compreender que as relações sociais
estão se reafirmando com os fatos sociais e acontecimentos mais
específicos. Como exemplo: o próprio suicídio altruísta que, em
certas sociedades, como a japonesa, reforça a tradição social mi-
lenar do suicídio ritual.

Já o patológico pode ser exemplificado pelo suicídio egoísta, pois


esse tipo de suicídio é desencadeado pela perda de referências e
desintegração das relações sociais. Neste caso, o suicídio não é

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 39


fator de reforço da coesão e consciência coletiva, mas sim de es-
facelamento destas.

Durkheim e o princípio da integração social

A integração social ou coesão social é a questão central que norteia


todo o pensamento sociológico de Durkheim. Ele tinha por preten-
são encontrar a resposta de como a sociedade é possível. Em ou-
tros termos, como pode uma coleção de indivíduos constituir uma
sociedade?

Durkheim marca o estudo da integração social por meio da noção


de solidariedade, e a relação indivíduo/sociedade por meio da no-
ção de consciência coletiva.

Para Durkheim, a solidariedade garante a coesão social, e, portan-


to, garante a sociedade. Ele distinguiu duas formas de solidarie-
dade: a solidariedade por semelhança, chamada de mecânica e a
solidariedade por diferenciação, chamada de orgânica. Essas duas
formas de solidariedade ocorrem conforme o tipo de organização
social.

Solidariedade mecânica: este tipo de solidariedade acontece nas


sociedades tradicionais baseadas em laços por semelhança e pa-
rentesco, isto é, nas sociedades em que os indivíduos diferem pou-
co uns dos outros. A sociedade tem coesão porque seus membros
têm os mesmos sentimentos, os mesmos valores, reconhecem os
mesmos objetos como sagrados, os sentimentos são coletivos. Esse
tipo de solidariedade é característica das sociedades tidas como
simples ou primitivas, nas quais não há uma complexa divisão do
trabalho, os indivíduos são intercambiáveis.

Solidariedade orgânica: esta é a forma de agregação característica


da divisão social do trabalho. O termo orgânico está referindo-se
a um órgão composto por partes especializadas que se agregam
por meio da diferença de funções e objetivos comuns, sendo todos
indispensáveis à vida. Esta forma de solidariedade é a dita racio-
nalização pela divisão do trabalho na cidade, na fábrica e na vida
social. Impera, portanto, nas sociedades modernas, industriais.

40 FILOSOFIA
A relação entre indivíduo e sociedade marcada pela solidariedade,
segundo Durkheim, é caracterizada pela supremacia da sociedade,
através da noção de consciência coletiva que é:

O conjunto das crenças e dos sentimentos comuns


à média dos membros de uma sociedade forma um
sistema determinado que tem vida própria; [...] ela
é independente das condições particulares em que os
indivíduos se encontram: eles passam, ela permanece.
[...] ela não muda a cada geração, mas liga umas
às outras as gerações sucessivas. Ela é, pois, bem
diferente das consciências particulares, conquanto só
seja realizada nos indivíduos (DURKHEIM, 1999, P. 50).

A consciência coletiva comporta força de maior ou menor extensão,


de acordo com o tipo de sociedade. Nas sociedades mais simples,
dominadas pela solidariedade mecânica, a consciência coletiva
abrange a maior parte das consciências individuais com seus
imperativos e proibições sociais. A força desta consciência coletiva
nessas sociedades é extrema, manifestada pelo rigor dos castigos
impostos aos que violam as proibições sociais. Quanto mais forte
a consciência coletiva, maior a indignação com o crime, isto é,
contra a violação do imperativo social. Segundo Durkheim, nas
sociedades modernas, nas quais reina a solidariedade orgânica,
haveria uma redução da extensão da consciência coletiva, bem
como um enfraquecimento das reações coletivas contra a violação
das proibições e, sobretudo, haveria uma margem maior na
interpretação individual dos imperativos sociais. Os indivíduos, em
muitas circunstâncias, teriam a liberdade de crer, de querer e de
agir conforme suas preferências.

Durkheim para chegar à solidariedade como o elemento de coesão so-


cial, recorreu à questão do direito (enquanto regras morais) como seu
sinal exterior, tendo em vista que a solidariedade não é algo objetivo,
concreto, palpável; é abstrato, apenas seus efeitos são observados
e sentidos. Considerando que há duas formas de solidariedade que
variam conforme o tipo de sociedade, este autor classificou dois tipos
de direito, o direito repressivo e o direito restitutivo.

O direito repressivo (penal) impera na solidariedade mecânica,


pois o elo de solidariedade ao qual ele corresponde é aquele cuja
ruptura se constitui o crime (todo ato que implica ao seu agente

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 41


uma reação chamada pena), na medida em que ofende a consci-
ência moral do grupo ao qual se refere (ofende as consciências de
cada membro), podendo abalá-la ameaçando a coesão social, com-
prometendo a própria sociedade. É necessário, portanto, que seja
repreendido para a salvaguarda do grupo.

O direito restitutivo (civil, processual, comercial etc.) impera nas


sociedades em que a divisão social do trabalho é complexa, ou
seja, na sociedade industrial, onde a coesão social é estabelecida
pela solidariedade orgânica. Neste tipo de sociedade, o delito não
fere a consciência coletiva, o agente apenas deixa de cumprir uma
função determinada pela sociedade e assumida por ele, logo a re-
ação ao seu ato é de restituir o que foi acordado.

1 Segundo Durkheim, os fatos sociais têm vida própria.

2 Como a divisão do trabalho, segundo Durkheim, pode desencadear


a integração social nas sociedades modernas?

3 Estabeleça a relação entre consciência coletiva e consciência


individual, apontada por Durkheim.

42 FILOSOFIA
A VILA (2004)
Sinopse: Em 1897 uma vila parece ser o local ideal para viver: tranquila,
isolada e com os moradores vivendo em harmonia. Porém, este local per-
feito passa por mudanças quando os habitantes descobrem que o bosque
que o cercam esconde uma raça de misteriosas e perigosas criaturas, por
eles chamados de “Aquelas de Quem Não Falamos”. O medo de ser a próxi-
ma vítima destas criaturas faz com que nenhum habitante da vila se arris-
que a entrar no bosque. Apesar dos constantes avisos de Edward Walker
(William Hurt), o líder local, e de sua mãe (Sigourney Weaver), o jovem
Lucius Hunt (Joaquin Phoenix) tem um grande desejo de ultrapassar os
limites da vida rumo ao desconhecido. Lucius é apaixonado por Ivy Walker
(Bryce Dallas Howard), uma jovem cega que também atrai a atenção do
desequilibrado Noah Percy (Adrien Brody). O amor de Noah termina por
colocar a vida de Ivy em perigo, fazendo com que verdades sejam revela-
das e o caos tome conta da vila. (http://www.adorocinema.com/filmes/
tempos-modernos/)

Direção: M. Night Shyamalan


Gênero: Suspense
Elenco: Bryce Dallas Howard , Joaquin Phoenix , Adrien Brody , William
Hurt, Sigourney Weaver.

A sociologia de Karl Marx (1818 - 1883)

Nascimento 5 de maio de 1818


Falecimento 14 de março de 1883
Londres, Inglaterra
Nacionalidade Alemão
Ocupação Economista, filósofo, historiador, teórico po-
lítico e jornalista

O interesse de Marx em estudar as “leis do movimento” capitalista Figura 7 - Karl Marx


Fonte: http://utilika.org/pubs/
como um sistema econômico pode ter advindo, como sugere etc/aa/talk/marx.jpg
Giddens (1998), do fracasso dos levantes ocorridos na Alemanha
em 1848, contra a estrutura econômica e social tradicional

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 43


reinante. Quando comparada aos países capitalistas avançados, a
Alemanha apresentava um atraso em termos de desenvolvimento
econômico e um baixo grau de liberalização política. Era governada
pela aristocracia fundiária, sob o poder econômico dos Junker, a
burguesia nascente não detinha nenhum poder. Mas, em face às
correntes de mudança política que vinham ocorrendo na Europa
desde a Revolução Francesa, os intelectuais da época acreditavam
que estas mudanças não tardariam a atingir a Alemanha.

Imbuído nessa esperança, Marx teria começado seus escritos como


uma antecipação da revolução alemã. Ao pensá-la, considerando o
atraso alemão na sua estrutura política e econômica, como sugere
Giddens, Marx teria problematizado o papel do proletariado na his-
tória. Devido a essa particularidade da Alemanha frente aos outros
países, a emancipação só poderia ocorrer de forma radical, sendo
fruto direto do proletariado:
[...] uma classe que é a dissolução de todas as
classes, uma esfera da sociedade que tem um
caráter universal porque os seus males são univer-
sais (GIDDENS apud MARX, 1998, p. 78).

Mas parece que Marx não teria prestado atenção ao fato de que
o proletariado, na Alemanha, ainda se encontrava em formação.
Consciente disso, em 1847, como sugere Giddens (1998), ele teria
reformulado, para este momento, o ator da história. Assim, a re-
volução iminente na Alemanha seria uma revolução burguesa, logo
seguida da revolução proletária. Mas a inoperância dessa burguesia
em busca do poder e sua disposição para desperdiçar suas poucas
forças em conflitos prematuros com o proletariado, já indicavam o
desfecho desse contexto, isto é, o fracasso dos levantes de 1848.
Esse fracasso serviu para minar o otimismo de Marx, dos peque-
nos grupos socialistas e também dos liberais, que foram coagidos a
aceitar medidas que apenas criavam a ilusão de democracia parla-
mentar, continuando, assim, o poder tradicional.

Esses eventos marcaram a vida de Marx e despertaram o seu inte-


resse em entender e explicar a lógica desse novo sistema, o sistema
capitalista que, na Alemanha, se instalou por meio de um processo
totalmente diferente do ocorrido nos outros países europeus, como
sinteticamente acabamos de mostrar.

44 FILOSOFIA
Influências sobre o pensamento de Karl Marx

Marx, para analisar o sistema capitalista rompeu com o pensa-


mento dominante na época, particularmente com os economistas Os economistas clássicos
clássicos e os neo-hegelianos. Ele apresentou, efetivamente, a sua representados principal-
mente por Adam Smith,
metodologia nas obras A Ideologia Alemã (1845-46) e Para a crítica David Ricardo, John
Stuart Mill, entre outros,
da economia política (1859). compuseram a primei-
ra escola moderna de
pensamento econômico,
Marx, segundo Giddens (1998), começou seu desenvolvimento in- denominada de Econo-
telectual a partir da perspectiva da crítica da religião, derivada mia Clássica. A obra A
Riqueza das Nações de
da radicalização de Hegel. É em A Ideologia Alemã que Marx de- Adam Smith é geralmen-
te aceita como o marco
senvolve essa crítica, travando um diálogo irônico com os neo- inaugural do pensamento
econômico clássico. Seus
hegelianos, tratando com respeito apenas Feuerbach. conceitos giram em torno
da noção básica de que
Para Marx o problema central do idealismo hegeliano estava no do- os mercados tendem a
encontrar um equilíbrio
mínio do pensamento sobre o mundo real, uma vez que para Hegel econômico a longo prazo,
ajustando-se a determi-
era o mundo das ideias, pensamentos e conceitos que produziam, nadas mudanças no cená-
rio econômico (http://
determinavam e dominavam o mundo real dos homens. Essa visão pt.wikipedia.org/wiki/
era uma contraposição ao pensamento kantiano, que defendia o Economia#Economia_
cl.C3.A1ssica).
pressuposto de que o conhecimento se dá pela aparência do fenô-
meno apreendido pelos dos órgãos do sentido.

Os novos hegelianos, em especial, F. Strauss, Max Stirner, Bruno


Bauer e Feuerbach perceberam esse problema, mas não consegui-
ram superar o sistema hegeliano por acharem que bastaria criticar
apenas um aspecto dessa filosofia, em vez de criticá-la em seu
conjunto. Pautados nessa concepção, cada um deles tomou um as-
pecto da realidade e o converteu numa ideia universal, passando
a deduzir todo o real a partir desse aspecto idealizado. Esse exer-
cício dar-se-ia pela substituição da consciência dominante, que
continha os verdadeiros grilhões dos homens, por uma consciência
nova revelada pelos filósofos.

Feuerbach apresentava particularidades em relação a esse grupo.


Ele teria “ido mais longe” na crítica ao sistema hegeliano. Sua
filosofia assentava-se numa reversão ao idealismo de Hegel, a
partir da elaboração de uma própria versão do materialismo. Para
Feuerbach, “homem tinha que ser o homem real vivendo em um
mundo material real” e não um Espírito Absoluto tratado por Hegel.
A aplicação de sua teoria se deu na análise da religião, através da

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 45


demonstração de que o “divino era um produto ilusório do real, que
Deus era uma projeção idealizada da humanidade”. Dessa forma,
a “religião era uma ‘representação’ simbólica das aspirações do
homem”, era, em última instância, uma alienação. Feuerbach,
conclui que bastaria desmistificar a religião, colocando-a em um
nível racional, para eliminar a autoalienação.

Marx critica essa leitura, ao afirmar que Feuerbach pecou em fa-


lar de um homem em abstrato, pois, para ele, o homem é um ser
histórico que se faz diferentemente em condições históricas dife-
rentes. Com essa visão, Marx elimina a noção de uma “essência
humana”. Além disso, a alienação religiosa era apenas um efeito de
outra anterior, segundo Marx, que é a alienação do trabalho, é esta
alienação que está na base de todas as outras. Defende ainda que
o principal não é interpretar o mundo, mas transformá-lo (XI Tese).

O termo ideologia foi criado A crítica aos economistas clássicos devia-se, sobretudo, ao fato
por Destutt de Tracycom destes aplicarem categorias relativas ao capitalismo em seus estu-
significando ciência das
ideias. Posteriormente, esta dos sobre períodos anteriores e criticava também a adoção de re-
palavra ganharia um sentido
pejorativo quando Napoleão presentações idealizadas sobre a realidade objetiva, como ponto
chamou De Tracy e seus
seguidores de “ideólogos” no de partida no processo de investigação. A população, por exemplo,
sentido de “deformadores da
realidade”. No entanto, os
não poderia funcionar como a referência inicial da investigação
pensadores da antiguidade (sugerida pelos economistas clássicos), pois é “uma representação
clássica e da Idade Média já
entendiam ideologia como o caótica do todo” e, se submetida a um processo de análise, produ-
conjunto de ideias e opiniões
de uma sociedade. Karl Marx ziria conceitos e abstrações simplificados.
e Friedrich Engels na obra A
Ideologia Alemã concebem
a mesma como uma cons- Assim, Marx, como um intelectual da prática revolucionária, abo-
ciência falsa, proveniente mina a separação entre a produção das ideias e as condições sociais
da divisão entre o trabalho
manual e o intelectual. e históricas nas quais essas ideias são produzidas, e seria nesse
Nessa divisão, surgiriam os
ideólogos ou intelectuais movimento de separação que se constitui a ideologia, no sentido
que passariam a operar em
favor da dominação ocorri- marxista, isto é, falseamento da realidade. A intenção prática ou
da entre as classes sociais,
por meio de idéias capazes
de um projeto transformador perpassa todo o pensamento deste
de deformar a compreen- autor. Para ele, a produção de um conhecimento puro, no sentido
são sobre o modo como
se processam as relações de construção de categorias atemporais com validade universal,
de produção. Neste senti-
do, a ideologia (enquanto não passava de abstrações inexpressivas e vazias, o pensar neces-
falsa consciência) geraria a
inversão ou a camuflagem da
sariamente tem que estar relacionado historicamente.
realidade, para os ideais ou
interesses da classe domi-
nante (http://pt.wikipedia.
org/wiki/Ideologia).

46 FILOSOFIA
Objeto de estudo

Visando o pressuposto da transformação da realidade Marx define


como objeto de estudo as estruturas sociais, enquanto as “relações
de produção que estruturam classes sociais em conflito e distribuem
desigualmente o poder na sociedade” (PRATES, 1991, p. 22). Para
ele, a compreensão do processo histórico está condicionada à
compreensão da estrutura das sociedades, das forças de produção
e das relações de produção, e não adotando como ponto de
partida as interpretações do modo de pensar dos homens. Tais
relações são necessárias e independentes da vontade dos homens.
São necessárias porque garantem a manutenção e a reprodução
dos homens e, consequentemente, da própria sociedade.

O conjunto dessas relações de produção constitui a estrutura


econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual se ergue
a superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas
de consciências sociais determinadas. “O modo de produção da
vida material condiciona o processo de vida social, política e
intelectual geral” (Prates, 1991, p.167).

A análise da sociedade e principais conceitos marxistas

Marx afirmou que toda sociedade é formada por dois níveis de es-
truturas distintas: a base econômica, chamada de infraestrutura,
e a superestrutura.

A Infraestrutura é constituída essencialmente pelas forças e pelas


relações de produção (pelo conjunto do equipamento técnico e pela
organização do trabalho utilizados no processo produtivo, bem como
pela forma da distribuição dos meios de produção e do produto);

A superestrutura é constituída pelas instituições jurídicas e políti-


cas, como também pelos modos de pensar, pelas ideologias e filo-
sofias, que vão expressar os interesses dos que dominam o sistema
econômico, uma vez que, segundo Marx:
[...] a estrutura social e o Estado resultam con-
stantemente do processo vital de indivíduos deter-
minados; mas não resultam daquilo que esses in-

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 47


divíduos aparentam perante si mesmos ou perante
outros e sim daquilo que são na realidade, isto é,
como trabalham e produzem materialmente (QUIN-
TANEIRO apud MARX, 2002, p. 36).

Porque na produção da vida, os homens criam não só os produtos


materiais, mas também as suas representações, ideias, sistemas
legais, processos educacionais etc.

Características sociais

Ordenamento jurídico,
SUPERESTRUTURA ideologias, religião, crenças,
cultura

Estrutura econômica: relações


INFRAESTRUTURA de produção, relações de
troca, meios de produção,
unidades de produção
Materialidade

Esta análise da sociedade centrada no funcionamento e desenvol-


vimento do sistema econômico está pautada na Teoria Materialista
da História, expressa no conceito de modo de produção, o qual
variará conforme as formas e as relações de produção adotadas
A teoria marxista é con-
siderada materialista por
no decorrer da história, que moldaram o desenvolvimento da vida
compreender os modos de social, política e intelectual.
produção (relações de pro-
dução, processos produti-
vos, técnicas de produção, Para Marx, o motor do movimento histórico é a contradição entre
relações de troca) como
substrato material em que as forças de produção (conjunto dos conhecimentos científicos,
a história acontece, em que
a história é construída. dos equipamentos técnicos e da própria organização do trabalho)
empregadas pelos homens em cada momento da história para a
obtenção de bens necessários para a sobrevivência e as relações
de produção (as relações de propriedade e a distribuição da renda)
que expressam como os homens se organizam para produzir e
consumir essa produção em cada momento da história.

48 FILOSOFIA
A contradição que caracteriza a sociedade capitalista é dada pela
constante evolução das forças produtivas, enquanto que as rela-
ções de produção não se transformam no mesmo ritmo. Isso gera
uma segunda contradição ou dialética, que é, por um lado, o au-
mento cada vez maior de riqueza, e, por outro, o aumento da mi-
séria, uma vez que a riqueza gerada fica concentrada nas mãos
dos proprietários dos meios de produção e não é distribuída entre
a burguesia e o proletariado, entre o capitalista e o trabalhador
(ARON, 2000, p. 131).

Assim, o caráter contraditório do capitalismo se manifesta no cres-


cimento dos meios de produção, que em vez de elevar o nível de
vida dos trabalhadores, leva a um duplo processo de proletarização
e pauperização (ARON, 2000, p. 131).

Essa contradição entre aumento de riqueza e aumento de pauperi-


zação demarca a principal característica da sociedade capitalista
que é o seu antagonismo interno. Esse antagonismo, por sua vez,
vai se expressar no que ele denominou de luta de classes.

Para Marx, uma classe social é um grupo que ocupa um lugar de-
terminado no processo de produção. Embora Marx reconheça que
existam grupos intermediários (camponeses, artesãos, profissionais
liberais etc), enfatiza que, na sociedade capitalista, encontra-se
um movimento de consolidação das relações sociais em apenas (e
somente) duas classes: a que possui a propriedade dos meios de
produção e da organização do trabalho, denominada por ele capi-
talista ou burguesia; e aquela que é desprovida dos meios de pro-
dução, restando-lhe apenas a sua força de trabalho, o proletariado
ou assalariado. Essas duas classes, segundo Marx, tenderão atrair
para seu polo os outros grupos que compõem a sociedade.

A luta de classes trabalhada por Marx na obra Manifesto Comunista


(1848) é o fato mais importante da sociedade moderna, sendo
as classes os principais atores do drama histórico, na medida
em que o conflito existente entre elas relaciona-se diretamente
com a possibilidade da mudança social e, consequentemente,
com a superação das contradições existente. Esta mudança será
desencadeada pela classe que se encontra em desvantagem, isto
é, o proletariado. Mas, para que uma classe exista é preciso que

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 49


haja uma tomada de consciência da sua unidade e sentimento de
separação da outra classe social, haja vista que são, por princípio
antagônicas, com interesses divergentes. Em termos conceituais
é preciso que a classe em si (membros de uma sociedade que
compartilham determinadas condições objetivas ou a mesma posição
no processo produtivo) se consolide enquanto uma classe para si
(classe organizada politicamente para defender conscientemente
seus interesses).

Essa tomada de consciência, denominada por Marx de consciência


de classe, é um desdobramento da realidade social vivida, uma
vez que é a realidade social que determina a consciência dos ho-
mens e não o contrário (oposição ao idealismo hegeliano). É essa
consciência de classe que leva à formação de associações políticas,
tais como sindicatos e partidos, que objetivam a união solidária
entre seus membros, visando defender seus interesses (QUINTANEI-
RO, 2007, p. 44), e no caso do proletariado, visando, sobretudo,
combater seus exploradores. Cabe ressaltar que a burguesia já as-
sumira essa posição de desencadeadora da transformação (sistema
feudal para o capitalista).

Dessa forma, a sociologia de Marx é uma análise dialética das rela-


ções entre as forças produtivas materiais, os modos de produção,
os quadros sociais e a consciência dos homens, logo é uma análise
pautada na determinação do todo social, na qual o ator principal é
um ator coletivo, a classe.

Portanto, a concepção do capitalismo e da história feita por Marx


está associada à combinação dos conceitos de forças de produção,
relações de produção, luta de classes, consciência de classes, in-
fraestrutura e superestrutura.

E assim, Marx esboça as etapas da história humana a partir


dos regimes econômicos, em seu termo a partir do modo de
produção (do tipo de relações estabelecidas entre os homens que
trabalham), as quais seriam quatro, sendo as três primeiras as que
se sucederam na história ocidental: a antiga caracterizada pela
relação de escravidão, a feudal pela servidão e a burguesa pelo
assalariamento. Sendo esta o último modo de produção, que se
constituiu a partir da subordinação dos trabalhadores por um grupo

50 FILOSOFIA
detentor da propriedade dos meios de produção e do poder político,
que, seguindo a lei do desenvolvimento histórico será sucedido,
por sua vez, pelo modo de produção socialista.

O Capital é um conjunto
Karl Marx: produção e reprodução da vida material de livros (sendo o primeiro
de1867, o único publicado
por Karl Marx, os livros
II e III foram publicados
Para Marx, a essência do capitalismo é, antes de tudo, a busca pelo postumamente por Engels
a partir dos manuscri-
lucro, ideia que ele desenvolverá na sua obra principal denominada tos não terminados por
O Capital. Mas, qual a origem do lucro? Marx) que visa criticar o
capitalismo desvelando-o.
Muitos consideram essa
Marx acreditava que a fonte do lucro estava no processo de pro- obra o marco do pensa-
mento socialista marxista.
dução e de troca (circulação) de mercadoria, entendida como a Nesta obra existem muitos
conceitos econômicos com-
unidade analítica mais simples e expressão mais elementar da ri- plexos, como mais valia,
capital constante e capital
queza da sociedade capitalista. Explica, também, como produto- variável, uma análise sobre
res e comerciantes lucram a partir da teoria do valor e da teoria o salário; sobre a acumula-
ção primitiva, resumindo,
da mais-valia. sobre todos os aspectos do
modo de produção capita-
lista, incluindo uma crítica
exemplar sobre a teoria
Processo de construção do lucro do valor-trabalho de Adam
Smith e de outros assuntos
dos economistas clássicos
Para Marx o lucro se concretiza na circulação da mercadoria que é, (http://pt.wikipedia.org/
wiki/O_Capital).
na sua definição:
[...] um objeto externo, uma coisa que, por suas
propriedades, satisfaz necessidades humanas, seja
qual for a natureza, a origem delas, provenham do
estômago ou da fantasia. Não importa a maneira
como a coisa satisfaz a necessidade humana, se
diretamente, como meio de subsistência, objeto
de consumo, ou indiretamente, como meio de
produção (MARX, 1998, p. 57).

A mercadoria carrega consigo um duplo valor relacionado à quali-


dade e quantidade do bem. Esses valores são denominados de valor
de uso e valor de troca.

O valor de uso é referente às características intrínsecas do bem,


relativas à sua utilidade (o que desperta a demanda por ela). Assim,
o valor de uso de uma mercadoria é importante para que ela seja
procurada no mercado, para que ela seja desejada, porém esse
valor é difícil de ser quantificável e varia conforme as pessoas, já
que os interesses e gostos são individuais.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 51


O valor de troca é relativo à quantidade do bem. É o que deter-
mina quanto (quantitativamente) de uma mercadoria X (com sua
qualidade específica) será trocada por uma mercadoria Y (que tem
outra qualidade, isto é, que tem outro valor de uso). O valor de
troca é o ponto de equivalência entre as mercadorias e esse valor
se expressa no preço.

Marx vai dizer que esse ponto de interseção entre as mercadorias


expresso no seu valor de troca, ou seja, no preço, reside objeti-
vamente na quantidade média de trabalho humano despendido
para a sua produção. Isto é, trabalho que está inserido, integrado,
cristalizado no produto.

Assim, a quantidade de trabalho é o único elemento quantificável


descoberto na mercadoria para se comparar, por exemplo, o uso de
uma caneta com o de uma bicicleta. Trata-se de dois usos estrita-
mente subjetivos e, sob esse aspecto, não podem ser comparáveis
um com o outro. Portanto, o único valor quantificável é a quantida-
de do trabalho que foi empregado na produção de cada uma delas.

Mas como medir a grandeza do valor do trabalho humano?

Segundo Marx, pelo tempo de sua duração, por frações do tempo,


como hora, dia etc.

Problema... vamos pensar um pouco?

Se o valor de uma mercadoria é determinado pela quantidade de


tempo de trabalho gasto durante sua produção, quanto mais pre-
guiçoso e inábil for um ser humano, maior será o valor da merca-
doria produzida por ele?

Não, porque o trabalho que constitui a substância dos valores é o


trabalho humano homogêneo, dispêndio de idêntica força de traba-
lho. Portanto, é o tempo de trabalho socialmente necessário para
produzir-se um valor de uso qualquer, nas condições de produção
socialmente normais existentes e com o grau social médio de des-
treza e intensidade do trabalho.

52 FILOSOFIA
Exemplificando

Marx, para exemplificar na prática, recorreu à introdução do tear


a vapor na Inglaterra:

Na Inglaterra, após a introdução do tear a


vapor, o tempo empregado para transformar
determinada quantidade de fio em tecido diminuiu
aproximadamente a metade. O tecelão inglês
que então utilizasse o tear manual continuaria
gastando, nessa transformação, o mesmo tempo
que despendia antes, mas o produto de sua hora
individual de trabalho só representaria meia hora
de trabalho social, ficando o valor anterior de seu
produto reduzido à metade (MARX, 1998, p. 61).

Portanto, o tempo de trabalho requerido na produção de uma mer-


cadoria muda com qualquer variação na produtividade do trabalho
(grau de desenvolvimento científico e tecnológico, organização so-
cial do processo de produção, volume e eficácia dos meios de pro-
dução, as condições naturais e destreza média dos trabalhadores).

E o valor do trabalho, como é medido?

Ele pode ser medido como o valor de qualquer mercadoria, uma


vez que a força de trabalho é uma mercadoria como outra qual-
quer, embora ela apresente uma particularidade: ser paga pelo seu
valor e ao mesmo tempo produzir mais que o seu valor.

O salário pago pelo capitalista ao trabalhador assalariado, como


contrapartida da força de trabalho que este lhe vende, equivale
à quantidade de trabalho social necessário para produzir merca-
dorias indispensáveis à reprodução da vida do trabalhador e de
sua família. Observem, não se trata exatamente da quantidade de
tempo de trabalho necessário para produzir um trabalhador, mas
é a quantidade de tempo de trabalho necessário para produzir o
valor das mercadorias que o operário e sua família necessitam para
sobreviver (ARON, 1999, p. 141).

O tempo de trabalho necessário para o operário produzir um valor


igual ao que recebe sob forma de salário é inferior à duração
efetiva do seu trabalho. O operário produz, por exemplo, em
quatro horas um valor igual ao que está contido no seu salário, mas

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 53


na verdade ele trabalha oito horas (jornada de trabalho brasileira
por dia). Essas quatro horas restantes o trabalhador produz para o
seu patrão. Assim, o assalariado trabalha metade do tempo para si
mesmo e a outra metade para o dono da empresa.

A jornada de trabalho é dividida em duas, uma parte é destinada


para produzir o valor cristalizado no salário, chamada de trabalho
necessário, e a outra é chamada de sobretrabalho. Essa diferença
de tempo que sobra, isto é, o valor produzido durante o sobretra-
balho chama-se, segundo Marx, mais-valia.

Assim, a mais-valia é a quantidade de valor produzido pelo tra-


balhador além do tempo de trabalho necessário para produzir um
valor igual ao que recebe sob forma de salário.

A taxa de exploração do trabalhador pelo patrão é definida pela


relação entre mais-valia e o capital variável, isto é, o capital que
corresponde ao pagamento do salário. Quanto maior for a taxa de
mais-valia, maior será a taxa de exploração. Assim, a mais-valia
que se opera à custa dos assalariados é fruto da exploração destes,
e é a fonte de lucro do capitalista. Sendo que este lucro se mate-
rializará na circulação da mercadoria.

Para Marx existem dois tipos de troca:

Um que vai da mercadoria para mercadoria, passando ou não pelo


dinheiro. É a troca imediatamente humana, mas que não gera lu-
cro ou excedente, uma vez que trocamos um bem que não tem
utilidade para nós por outro que precisamos para satisfazer algu-
ma necessidade. M-D-M (Mercadoria- Dinheiro- Mercadoria) (MARX,
1998, p. 133). Nesse caso, a venda da mercadoria é para o produtor
adquirir em seguida outra mercadoria que necessita, não há sobra
na troca. Nas palavras de Marx (1998, p.180):

O circuito M-D-M tem por ponto de partida uma


mercadoria e por ponto final outra mercadoria que
sai da circulação e entra na esfera do consumo. Seu
objetivo final, portanto, é o consumo, satisfação
de necessidades, em uma palavra valor-de-uso.

Contudo, há um segundo tipo de troca, que vai do dinheiro ao


dinheiro, passando pela mercadoria, sendo que no final da troca

54 FILOSOFIA
haverá uma quantidade superior de dinheiro do que a empregada
no início. É essa troca que caracteriza o capitalismo. D-M-D
(Dinheiro-Mercadoria-Dinheiro) (MARX, 1998, p. 181). Nesse caso,
a um excedente de dinheiro. Nas palavras de Marx:

[...] a forma completa desse processo é, D-M-D’,


em que D’= D + ∆D, isto é, igual a soma de dinheiro
originalmente adiantada mais um acréscimo. A esse
acréscimo ou o excedente sobre o valor primitivo
chamo de mais-valia (1998, p. 181).

Assim, no capitalismo, o empresário não passa uma mercadoria que


é inútil para ele para outra que lhe é útil, mas um investimento de
capital inicial para um acréscimo de capital no final do processo.
Portanto, a essência da troca capitalista consiste em passar do di-
nheiro ao dinheiro, passando pela mercadoria.

Dessa forma Marx expõe a origem do lucro e o modo como um sis-


tema econômico em que tudo se troca de acordo com seu valor,
pode, ao mesmo tempo, produzir lucro para os empresários (ARON,
1999, 142), isto é, a teoria da mais-valia.

1 A lei brasileira do salário mínimo pode ser entendida en-


quanto uma aplicação da proposição de Marx para a teoria
do valor do trabalho?

2 Uma das características do Brasil é a persistência de eleva-


dos níveis de desigualdade social ao longo de sua história
recente. Essa desigualdade manifesta-se de várias formas e
estrutura boa parte das relações sociais da população bra-
sileira (ENADE 2008). Discuta essa afirmação recorrendo à
teoria marxista.

3 Explique porque Marx afirmava que “é a base econômica


que determina tanto a forma jurídica quanto política e ide-
ológica da sociedade”.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 55


3 Karl Marx considerava o capitalismo apenas como um sis-
tema econômico, sem considerar seus efeitos sobre fenô-
menos tais como ciência, tecnologia, ideologia, política?
(Questão baseada na prova do ENADE 2008).

Quase dois irmãos (2005)


Sinopse: o filme narra a história de vida de dois personagens que
constantemente se cruzam. Miguel, filho de médico, frequentava o morro
por causa da amizade de seu pai com sambistas, como o pai de Jorge. Quando
crianças brincavam juntos embalados ao som do único elemento do filme
que propicia uma possível conciliação de classe: o samba. Miguel e Jorge
cresceram e cada um seguiu seu rumo, até se reencontrarem duas vezes na
cadeia, primeiro como companheiros de cela e, depois, um de cada lado das
grades: Jorge, prisioneiro e traficante, e Miguel, livre e já deputado.

Direção: Lúcia Murat


Gênero: Drama
Elenco: Werner Shünemann (Miguel), Antônio Pompeo (Jorginho), Maria
Flor (Juliana), Fernando Alves Pinto (Peninha), Babu Santana (Pingão),
Luís Melodia, Flávio Bauraqui (Jorginho - anos 70), Jefchander Lucas,
Caco Ciocler (Miguel - anos 70), Renato de Souza (Deley), Marieta
Severo (Helena), Seu Jorge.

56 FILOSOFIA
Enfoque individualista

A sociologia de Max Weber (1864-1920)

Nascimento 21 de abril de 1864 em Erfurt, Turíngia


Falecimento 14 de junho de 1920
Munique
Nacionalidade Alemão
Ocupação Economista, sociólogo e filósofo

Max Weber, intelectual alemão de formação jurídica e econômica,


Figura 9 - Max Weber
teve seu pensamento marcado, sobretudo, por uma tensão entre a Fonte: http://filipspagnoli.
files.wordpress.com/2009/11/
herança materna (religiosidade protestante e dedicação ao mundo max-weber.jpg
da ciência) e a paterna (busca de poder e uma vida de negócios
públicos) (SCAFF, 1996, p. 34).

A política sempre esteve presente na vida de Weber. Filho de


um proeminente membro do Partido Nacional-Liberal dedicou
seus primeiros estudos acadêmicos à propriedade da terra na
Roma antiga. Investigando as tensões que se desenvolveram
entre a economia agrária das grandes propriedades fundiárias
e o comércio e a manufatura emergente, acabou encontrando
insights para alguns problemas da Alemanha contemporânea, isto
é, a sua transição para o capitalismo industrial dentro de uma
ordem social e política autocrática semifeudal, fundada no poder
dos latifundiários Junker, numa burocracia de função civil com um
corpo de funcionários que contrastava com as constituições mais
liberais (GIDDENS, 1998, pp. 30 – 33).

Para Weber, segundo Giddens (1998, p. 32), os Junkers eram uma


classe em decadência, que não poderia continuar monopolizando
a política alemã. Mas, por outro lado, não existia uma classe com
maturidade política para guiar os destinos de um Estado moder-
no. Nem a classe trabalhadora nem a burguesia tinham capacidade
para assumir a liderança na Alemanha. A primeira em virtude de ser

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 57


conduzida por um grupo (jornalistas) que não tinha vínculo orgâni-
co com os seus representados; e a segunda, pelo seu passado apo-
lítico, era um grupo passivo. Apesar disso, caberia a esta burguesia
economicamente próspera, a tarefa de desenvolver uma consciên-
cia política adequada para assumir a liderança da nação no futuro.

Weber teria se dedicado a estimular a construção dessa consciência


política liberal. Esse teria sido um dos motivos subjacente A ética
protestante e o espírito do capitalismo (1904-1905), ensaio no qual
procura identificar as fontes históricas desse tipo de “consciência
burguesa” e do próprio capitalismo moderno. Seus outros trabalhos
sobre epistemologia e metodologia, por exemplo, também refle-
tem problemas políticos e/ou pessoais que o afligiam.

Max Weber ficou marcado na sociologia por ser considerado precur-


sor do estudo da Ação Social ou da Compreensão, ou seja, o sentido
e o significado que os indivíduos dão às suas ações em sociedade.
A sociologia weberiana é também conhecida como teoria da ação
social, e tem como base a formação de tipos ideais: conceitos e
exemplos imaginários.

O corpo teórico-metodológico de Weber

Para Weber, as ciências humanas são animadas e orientadas por


questões que os cientistas dirigem à realidade. O interesse das
respostas depende amplamente do interesse das questões. Neste
sentido, “[...] não é mau que os sociólogos que estudam a política
se interessem pela política, e que os sociólogos da religião tenham
interesse pela religião” (WEBER apud ARON, 2000, p. 456).

Essa sua posição sobre a “ciência” é bastante ilustrativa. Ele


acreditava, segundo Scaff (1996, pp. 39-40), que a ciência
experimental ocidental moderna era historicamente e
culturalmente determinada e assim como toda atividade humana é
um produto de uma concatenação específica de circunstâncias, não
sendo, portanto, só uma busca enraizada na natureza das coisas.
Mas, mesmo assim, ainda é a ciência o melhor meio para se buscar
a “verdade” sobre nós mesmos, nossa história e o nosso possível
futuro, porque seu produto é válido na medida em que é formulado

58 FILOSOFIA
por meio de métodos críticos, autocorretivos e padrões racionais
de questionamentos, sem, contudo, perder de vista que este é
provisório por estar condicionado por valores culturais, interesses
pessoais e desenvolvimentos históricos.

Essa concepção de ciência como um “devenir da ciência”, isto é,


o desprezo às proposições relativas ao sentido último das coisas,
tendendo a um objetivo situado no infinito e renovando sem cessar
as indagações dirigidas à natureza (ARON, 2000), elaborada por
Weber, retrata uma mudança de foco, no qual a ciência deixa de
ser pautada numa busca ontológica das coisas, para assumir um
caráter epistemológico.

A nova concepção de ciência tanto serve para as ciências da natu-


reza como, e principalmente, para as ciências humanas ou sociais.
Para Weber, a relação entre os dois tipos de ciência, tão debatida
no mundo acadêmico, não se pautava nas questões alegadas pelo
positivismo de Comte, no qual as ciências sociais seriam simples Segundo o positivismo
de Comte “as ciências
aplicação das pressuposições e métodos das ciências naturais ao se ordenariam segundo
uma hierarquia empírica
estudo dos seres humanos, (GIDDENS ,1994), e que, portanto, não lógica, na qual cada ciência
dependeria da emergência
havia diferença. Nem tampouco, adota a visão de seus contempo- histórica prévia da que é
imediatamente inferior
râneos Rickert e Windelband, para os quais as ciências naturais e na hierarquia” (Giddens,
culturais seriam de ordens completamente diferentes. Para estes, 1994, p. 191).

os métodos das ciências naturais – que privilegiariam os caracteres


gerais dos fenômenos e o estabelecimento de relações regulares ou
necessárias entre eles, visando a uma construção de um sistema de
leis ou de relações cada vez mais gerais – , não seriam aplicáveis ao
estudo do universo das ações humanas, cabendo a este recorrer a
Heinrich Rickert e Wilhelm
processos inexatos e intuitivos (ARON,2000; GIDDENS ,1994). Dessa Windelband foram uns dos
maiores representantes
forma, para estes dois filósofos, segundo Cuin;Gresle (1994, p. 76), da Escola Neokantiana de
“as ciências se distinguem umas das outras não por seu conteúdo, Baden. Eles defendiam que
tanto as ciências naturais,
e sim pelo tratamento que dão a seu objeto”. quanto as culturais e a
história poderiam ter seus
fundamentos conceituais
Weber reconhece que há uma diferenciação entre os dois campos analisados criticamente.
Windelband considerou que
científicos e que esta se centra na particularidade do objeto de há dois tipos de ciências: as
nomotéticas que se preo-
conhecimento das ciências sociais, que é a ação social. Porém, cupam em estabelecer leis
esse fato não relega a objetividade nas ciências sociais, nem obriga universais e as ideográficas
que visam descrever os
a substituição de uma análise causal por uma intuitiva, como fatos históricos e singulares,
incluindo o estudo dos indi-
solicitava Rickert. víduos Cuin e Gresle (1994).

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 59


Weber acredita que a intuição nas ciências sociais ocupa o mesmo
lugar que nas ciências naturais e que as proposições das primeiras
são de fato proposições que não pretendem atingir verdades essen-
ciais, mas, nem por isso, deixam de tratar de fatos observáveis,
visando atingir uma realidade definida, isto é, a conduta humana,
na significação que os próprios atores lhe dão.

Embora Weber enfatize a interpretação compreensiva do sentido


subjetivo da ação humana, como o objetivo das ciências sociais,
especificamente da sociologia, ele reconhece a importância e a
necessidade de uma explicação causal. Para ele, “[...] a análise
das determinações causais é um dos procedimentos que garantem
a validade universal dos resultados científicos” (Weber apud Aron,
2000, p. 458).

Em se tratando de ciências sociais, Weber determina como regra


da metodologia causal a construção da individualidade histórica do
fenômeno, ao qual o cientista pretende determinar as causas. Em
seguida, o cientista deve, a partir de uma abstração, construir uma
experiência mental, na qual ele questiona: o que teria acontecido
se um dos elementos co-determinantes do acontecimento real não
tivesse presente ou se sofresse uma modificação numa determi-
nada direção, o curso dos acontecimentos, obedecendo a regras
empíricas gerais, ter-se-ia orientado de maneira diferente?

Foi com esse procedimento que Weber construiu sua análise do sur-
gimento do capitalismo moderno. Sua questão era saber por que o
capitalismo – produção para o mercado, separação da empresa do
local de moradia, a organização racional da mão-de-obra formal-
mente livre, meios técnicos de contabilidade, cálculo racional de
lucros para reinvestimento – só surgiu no Ocidente.

Em busca de uma resposta para essa questão, Weber estabeleceu


uma relação entre economia e religião, na sua obra A Ética Protes-
tante e o Espírito do Capitalismo. Nesta obra, Weber sugeriu que
o moderno capitalismo ocidental foi possível em virtude da:

[...] capacidade e disposição dos homens em adotar


certos tipos de conduta racional. Onde elas foram
obstruídas por obstáculos espirituais, o desenvolvi-
mento de uma conduta econômica também tem

60 FILOSOFIA
encontrado uma séria resistência interna. Porque
outros tipos de (...) racionalizações têm existido
em todas as culturas, nos mais diversos setores e
de tipos mais diferentes (WEBER, 1994, p. 11).

Sugere ainda que essa conduta racional teria sido despertada por
uma ascese religiosa, característica das seitas protestantes, espe-
cialmente do Calvinismo, tendo em vista que a sua doutrina da pre-
destinação, dá-se “[...] por decreto de Deus, para manifestação de
sua glória, alguns homens e anjos são predestinados à vida eterna
e outros são predestinados à morte eterna” (WEBER, 1994, P. 69).

Assim, estava eliminada qualquer possibilidade de salvação por


meios mágicos como superstição ou pecado, criando nos homens
uma necessidade de intensificação da atividade profissional (enten-
dida como vocação), na medida em que somente o sucesso econômi-
co, advindo do trabalho honesto, poderia indicar a escolha de Deus.

Teria sido, portanto, essa ética religiosa voltada para o trabalho e


o autocontrole, orientada para o agir aqui e agora, presente nos
dogmas protestantes, uma das razões para a emergência e sucesso
do capitalismo no ocidente. Weber deixa evidente essa conclusão
quando fala que “[...] à medida que se foi estendendo a influência
da concepção de vida puritana [...] ela favoreceu o desenvolvimento
de uma vida econômica racional e burguesa” Webber (1994, p. 125).

Embora tenha sido a chamada consequência não pretendida da


ação, Brubaker (1991) afirma que, para Weber, o desenvolvimento
do moderno capitalismo pressupôs, por um lado uma racionaliza-
ção “externa” do meio ambiente, racionalização esta marcada por
avanços tecnológicos, pela administração burocrática, pelo aparato
legal (Direito); por outro, uma racionalização interna e uma racio-
nalização da personalidade, que promoveram uma transformação
nas atitudes tradicionalistas em relação ao trabalho, as quais eram
o maior obstáculo interno ao desenvolvimento do capitalismo mo-
derno. Tendo-se em mente que o trabalho era visto pelo catolicismo
como um castigo de Deus “... comei o pão com o suor do teu rosto”.

Assim, a racionalização no âmbito da ciência, tecnologia,


direito e administração criou um ambiente externo calculável; a
racionalização no âmbito da religião, chamada de secularização

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 61


ou desencantamento do mundo e da ética criou uma reorientação
interna, disciplinando o indivíduo e centrando-o no trabalho. Com
a reunião dessas racionalizações, estavam dadas as pré-condições
indispensáveis para o desenvolvimento do moderno capitalismo,
que, para Weber, tem como característica a racionalização em
todas as esferas da vida social.

Desse modo, Weber concluiu que há uma “afinidade eletiva” entre


certas crenças calvinistas e a ética econômica da atividade capi-
talista moderna. E, com essa conclusão, Weber mostrou que não
há uma determinação unilateral do conjunto da sociedade por um
elemento, seja ele econômico, como defendia Marx, político ou
religioso. A relação causal estabelecida dessa forma é parcial e
não global, pois comporta um caráter de probabilidade, e não de
determinação necessária.

Essa noção da relação causa/efeito expressa a importância que


Weber atribui à singularidade dos fenômenos estudados, sem per-
der o seu interesse por proposições de caráter geral:

As ciências da realidade humana só são ciências na


medida em que são capazes de formular proposições
gerais, mesmo quando buscam compreender o
singular (WEBER apud ARON, 2000, p. 464).

Para atingir formulações gerais, Weber concebeu aquilo que se tor-


nou o centro da sua doutrina epistemológica, isto é, o conceito de
tipo ideal.

Tipo ideal é um instrumento criado por Weber para facilitar a com-


preensão de questões empíricas, tendo em vista que os conceitos
empregados pelas ciências sociais não podem ser diretamente de-
rivados da realidade, uma vez que esta é confusa e obscura. Assim,
cabe aos sociólogos a tarefa de:
[...] tornar inteligível até o limite o que não o foi,
de fazer aparecer o sentido daquilo que foi vivido
sem que o sentido tenha sido consciente aos que o
viveram (WEBER apud ARON, 2000, p. 465).

Para tal é necessário fazer uma abstração e combinação de um nú-


mero indefinido de elementos que, embora extraídos da realidade,
dificilmente serão encontrados sob essa forma específica.

62 FILOSOFIA
Por isso, o tipo ideal não é uma descrição da realidade que se dá
por meio de uma síntese abstrata de traços comuns a numerosos
fenômenos concretos, nem uma hipótese é um tipo puro num sen-
tido lógico, sem ser um exemplar da realidade.

O tipo ideal como um instrumento utilizado para facilitar a


compreensão da realidade foi exemplarmente empregado em A
Ética Protestante, quando Weber seleciona, dos escritos de vários
autores históricos, características da ética calvinista que foram
importantes na constituição do espírito do capitalismo.

A noção de tipo ideal expressa a tendência da sociedade capitalista


moderna para a racionalização. Segundo Weber, a principal carac-
terística da vida moderna é o processo crescente de racionalização
em todas as suas esferas, mas este seria, também, o seu grande
problema.

A radicalização da racionalidade (chamada por Weber de racionali-


dade formal), por meio, principalmente da burocracia, seria algo
quase que inevitável e seria esse movimento o acontecimento de
desarticulação da ordem social moderna.

Racionalização e burocratização

À proporção que a burocracia racional se expande, a democracia


consolida-se. Esta afirmação sintetiza o que Weber prevê como im-
portância da burocratização das instituições sociais. Mas por que
burocracia seria sinônimo de democratização? Vejamos.

Segundo Weber o quadro administrativo das sociedades racionais


(baseadas na dominação legal ou racional) é constituído de um cor- Figura 10
Fonte: http://www.guardianboat.
po qualificado de profissionais que adentram nas organizações a com.br/5feira/burocracia.jpg

partir da aprovação em provas de capacidades e mérito. Desta ma-


neira, o quadro burocrático racional corresponderia a um corpo de
funcionários qualificados pelo mérito. Isso quer dizer que em uma
sociedade racionalizada, os quadros de funcionários seriam forma-
dos pelos indivíduos mais competentes, pois os critérios de escolha
seriam regidos por uma meritocracia legal.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 63


Um exemplo bem claro deste processo de racionalização na so-
ciedade brasileira atual são os frequentes processos de concurso
público para adentrar na carreira em instituições estatais.

O termo burocracia foi


utilizado pela primeira vez
por Gournay em 1745, a
partir da junção do prefixo Características do quadro profissional da burocracia racional
“bureau” (que em francês
significa escritório bem
como a mesa de trabalho ou
secretária) com a palavra
“cracia” derivada do verbo
grego governar. A princípio
Burocracia é um mecanismo desenvolvido pela sociedade moderna
o termo burocracia signi- para o controle e coordenação das atividades humanas nas organi-
ficava o poder dos funcio-
nários do governo, mas o zações. Devido à diversidade de organizações que existe no mundo
seu uso foi generalizado
gradualmente para as gran- moderno, Weber identificou e classificou os traços gerais que ca-
des organizações em geral
(GIDDENS, 2002, p.350). racterizam um tipo ideal de estrutura burocrática. Assim, as carac-
terísticas burocráticas essenciais são:

1- Posições ou cargos cuidadosamente definidos, isto é, to-


dos os cargos, em princípio, existem independentemente
dos titulares, os papéis burocráticos são estabelecidos for-
malmente e podem ser exercidos por quem quer que pos-
sua as qualificações apropriadas;

2 - Uma nítida hierarquia de autoridade, isto é, as tarefas


na organização são distribuídas como deveres oficiais, com
limites nítidos de autoridade e responsabilidade. Uma bu-
rocracia parece-se com uma pirâmide, residindo a mais
alta autoridade no topo, existindo, ainda, uma cadeia de
comando que se estende do topo à base e torna possível a
coordenação da tomada de decisões. Cada funcionário de
nível mais alto controla e supervisiona o seu subordinado
imediato;

3 – A seleção do pessoal é pautada nas qualificações técnicas


ou profissionais, isto é, os cargos burocráticos são ocupa-
dos, em princípio, por pessoas que demonstram competên-
cia para cumprir as obrigações requeridas. Isso contrasta
com organizações não burocráticas, nas quais alguns status
podem ser ocupados com base em relações tradicionais ou

64 FILOSOFIA
pessoais, tais como: parentes, amigos etc. Assim, os méto-
dos de seleção numa burocracia são fundamentais, sendo
os exames formais uma maneira de garantir um processo
impessoal e sistemático de testar os candidatos e têm sido
empregados rotineiramente;

4 - As regras e regulamentos que governam as ações e con-


dutas dos funcionários a todos os níveis são escritas ofi-
cialmente, isto é, há um corpo de regras explícitas habi-
tualmente codificadas que governa as ações oficiais dos
ocupantes dos cargos. Essas definições, muitas vezes, cau-
sam reclamações pela sua inflexibilidade, porém, sem elas
haveria confusão e ineficiência nas organizações. Por ou-
tro lado, essas regras também servem para possibilitar aos
funcionários que trabalham juntos certa convivência har-
moniosa, independente dos sentimentos pessoais, além de
proteger os funcionários subordinados das possíveis ações
arbitrárias de seu superior e;

5 – Há uma estabilidade, possibilidade de carreira por pro-


moção na hierarquia e recebimento de remuneração sa-
larial, isto é, para exercerem com competência e impar-
cialidade suas funções, os funcionários burocráticos gozam,
frequentemente, de estabilidade que serve para protegê-
los de pressões externas e internas. As promoções estimu-
lam a eficiência e o tempo de serviço na organização.

Assim, para Weber quanto mais as organizações se aproximem des-


se tipo ideal de burocracia, mais eficiente será em atingir os obje-
tivos para os quais foram criadas (CHINOY, 2009, p.343-346).

Apesar dos pontos positivos da burocracia, a radicalização da racio-


nalidade, como nos fala Brubaker, levaria a uma constante erosão
das restrições costumeiras, religiosas e éticas ao comportamento,
que passaria a ser regulado por normas abstratas e gerais pautadas
na lógica da ação econômica que não olha em direção às pesso-

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 65


as somente em direção à mercadoria, eliminando, assim, as rela-
ções humanas espontâneas que são sustentadas por ações pessoais,
guiadas pela racionalidade substantiva que será desenvolvida por
Georg Simmel (1991, p. 37-38).
Na obra Raízes do Brasil de
Sérgio Buarque de Holanda
(1995) escrita em 1936, o Esse processo de racionalização e consequente burocratização ra-
autor discutiu temáticas cional seria o inverso ao que existe no Brasil, consolidado como
historiográficas, psicos-
sociais e sociológicas da “jeitinho brasileiro” e corrupção.
formação da cultura brasi-
leira. A grande construção
teórica deste livro é o con-
ceito de homem cordial. O Conceitos trabalhados por Max Weber
Homem Cordial é apresen-
tado como um híbrido entre
o tipo ideal carismático A teoria da ação trabalhada por Weber em sua obra Economia e
e tradicional, ou seja, as
relações socioculturais são Sociedade, está associada, segundo Aron (2000, p. 468), à sua frus-
perpassadas pelas tradições
familiares e/ou religiosas, tração política, cuja aspiração não satisfeita pela ação é uma das
e ainda pela capacidade de
carisma – estimar as pes- molas para o esforço científico.
soas, “ser gente boa”- que
os indivíduos conseguem
em sociedade. Enquanto no
Nesta obra, Weber, segundo Giddens (1994, p. 205), dedica-se às
tipo racional, o que preva- uniformidades da organização econômica e social, dedicando-se,
lece é a impessoalidade e o
princípio da igualdade. assim, à sociologia propriamente dita. Para este, a sociologia é
a ciência que se interessa pela formulação de princípios gerais e
conceitos de tipo genérico, relacionados com a ação humana. Esta,
por sua vez, deve ser interpretada, compreendida pelo cientista,
sendo este o objetivo da sociologia. Nas palavras de Weber, a so-
ciologia é “uma ciência que pretende compreender interpretativa-
mente a ação social e assim explicá-la casualmente em seu curso e
seus efeitos” (WEBER, 2004, p.3).

A ação ou conduta social, perseguida pelo cientista, é aquela que,


segundo Weber (1991, p.13-14):
[...] orienta-se pelo comportamento de outros, seja
este passado, presente ou esperado como futuro. Os
outros podem ser indivíduos e conhecidos ou uma
multiplicidade indeterminada de pessoas completa-
mente desconhecidas. [...] Nem todo tipo de contato
entre pessoas tem caráter social, senão apenas um
comportamento que, quando ao sentido, se orienta
pelo comportamento de outra pessoa. Um choque
entre dois ciclistas, por exemplo, é um simples acon-
tecimento do mesmo caráter de um fenômeno natu-
ral. Ao contrário, já constituiriam “ações sociais” as
tentativas de desvio de ambos e o xingamento ou a
pancadaria ou a discussão pacífica após o choque.

66 FILOSOFIA
Assim, a ação social implica um significado subjetivo que se refere
ao outro indivíduo ou grupo. Esta ação se constitui a trama da vida
social, na medida em que o significado atribuído à ação é subjeti-
vo, mas é, ao mesmo tempo, intersubjetivo, pois ninguém pode dar
um sentido à sua própria ação sem levar em consideração a respos-
ta de seus parceiros, que por sua vez deve apresentar um caráter
de previsibilidade (BOUDON; BOURRICAUD, 2000, p. 615).

É importante destacar que este autor faz uma inversão epistemo-


lógica do ponto de partida da análise sociológica, proposta por
Durkheim, ou seja, Max Weber parte da compreensão da ação so-
cial a partir do indivíduo. Vejamos o esquema abaixo:

OBS: Compreensão  Ação  Sentido  ORIENTADO EM RELAÇÃO


AOS OUTROS

O esquema acima mostra um conjunto de indivíduos correndo em


certo sentido; estes poderiam estar participando de uma marato-
na, de um arrastão, de uma procissão religiosa, ou de um treina-
mento do exército. Por que uma maratona poderia ser uma ação
social? É uma ação social, pois os indivíduos estão agindo orien-
tados para o sentido de ganhar, ou pelo menos, concluí-la até a
linha de chegada. A maratona é um evento esportivo determinado
por algum comitê organizador (grupo de indivíduos ou instituição).
Deste modo a ação dos indivíduos, acima, não é aleatória ou instin-
tiva, há um sentido claro e calculado, fato que definirá esta como
ação racional voltada a um fim determinado. A ação está orientada
e delimitada pela ação de outros indivíduos, outros competidores e
regras estabelecidas pela instituição organizadora.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 67


Agora podemos falar nos critérios de avaliação de uma ação social,
ou seja, será que toda ação humana é social? Algo para ser definido
como ação social deve ter as seguintes características: 1) deve
ser orientado ou delimitado por outros indivíduos ou grupos; 2) a
motivação e a ação atingem outros indivíduos. Vejamos os exemplos:

• Um indivíduo lança uma pedra em uma árvore no seu quintal –


neste exemplo o indivíduo age sem atingir outro indivíduo ou
instituição, portanto, não há uma relação social derivada deste
comportamento;
• Um indivíduo lança uma pedra em uma árvore no seu quintal
e a pedra acerta o vidro da casa do vizinho – neste exemplo
a ação inicia sem ser social, porém quando a pedra atinge a
vidraça da casa do vizinho, estabelece-se uma ação social, pois
ocorreu o prejuízo ou depredação de propriedade alheia, fato
que pode desdobrar-se em uma contenda, ou ainda, em um
processo judicial.

Nos dois exemplos acima fica claro que, para Weber, o sociólogo
deve buscar uma análise das ações e tentar interpretá-las segundo o
contexto ou a individualidade, história das relações de causalidade.

Weber (1991 p. 15) classificou quatro tipos ideais de ação:

1- Ação racional referente a fins é aquela em que o ator conce-


be claramente seu objetivo e combina os meios disponíveis para
atingi-los, é caracterizada pelo cálculo racional entre os meios
adequados para a obtenção de um determinado fim. É a ação típi-
ca da sociedade moderna, uma vez que a racionalização é o traço
característico do mundo moderno. Assim, a ação racional impera
em todos os setores, seja ele no empreendimento econômico ou na
gestão estatal (via burocracia);

2 - Ação racional de valor ou valorativa, caracterizada por uma


orientação moldada por um ideal dominante, crença consciente no
valor-ético, estético, religioso ou qualquer que seja sua interpreta-
ção – desprezando todas as outras considerações, inclusive o pró-
prio resultado da ação, embora seja uma ação calculada e pensada.

3 - Ação afetiva é executada sob a influência da emoção. Pode ser


uma reação desenfreada a um estímulo não-cotidiano.

68 FILOSOFIA
4 - Ação tradicional executada sob a influência do costume, do
hábito e de crenças, transformadas numa segunda natureza. O ator
precisa apenas obedecer a reflexos enraizados por longa prática.

Esses dois últimos tipos de ação situam-se na fronteira da conduta


significativa com a não significativa.

Essa classificação ideal típica, segundo Weber, tem por finalida-


de facilitar a interpretação da ação social, servindo como padrão
para mediação de desvios irracionais, que ocorrem de forma con-
tingente, pois as características da conduta humana são a regulari-
dade e a previsibilidade, elementos estes que garantem as relações
sociais, por conseguinte, a “sociedade”.

Se não houver o entendimento da ação entre o autor e o receptor,


não há relação social, e são essas relações sociais travadas em to-
dos os momentos que constitui aquilo que se convencionou chamar
de sociedade.

O caráter de previsibilidade da ação diagnosticado por Weber como


um elemento fundamental da mesma, leva-nos a pensar, a princí-
pio, em certo tipo de natureza humana, isto é, certo tipo de cons-
tância nos indivíduos que permitiria essa previsibilidade. Embora
se reconheça a visão histórica e particular que Weber emprega so-
bre o fenômeno social.

Interpretando a sociedade como sendo nada “mais do que as inte-


rações múltiplas dos indivíduos num determinado meio” (WEBER
apud GIDDENS, 1994, p. 210), Weber, como já havíamos mencio-
nado acima, estabelece a relação social como a materialização da
vida social. Para ele:
[...] relação social é entendida enquanto
comportamento reciprocamente referido ao
seu conteúdo de sentido por uma pluralidade
de agentes e que se orienta por essa referência.
A relação social consiste, portanto, completa
e exclusivamente na probabilidade de que aja
socialmente numa forma indicável (pelo sentido),
não importando, por enquanto, em que se baseia
essa probabilidade (Weber, 1991, p. 16).

Assim, para que haja relação social é preciso haver reciprocidade


entre as ações de ambas as partes envolvidas.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 69


As relações sociais podem variar quanto ao grau de estabilidade,
existindo aquelas que são mais estáveis, bem como aquelas que
tendem à transitoriedade; quanto ao seu caráter de cooperação,
uma vez que o conflito é uma das marcas de todas as relações, des-
de as mais transitórias até as mais permanentes, como observaram
Simmel e Weber.

A uniformidade da conduta pressuposta na relação social, segun-


do Weber (apud GIDDENS, 1994), pode ser assegurada pelo uso ou
costume, conceitos referentes a toda forma de conduta usual, que
é habitualmente adotada por um indivíduo ou grupo, embora não
seja necessariamente expressa a sua aprovação ou desaprovação
pelos demais, neste caso a uniformidade é obtida por um acordo
voluntário. Mas, também se tem a uniformidade obtida pela satis-
fação subjetiva de interesses próprios, neste caso a relação tende
a ser mais instável do que na primeira.

A estabilidade das relações sociais é mais firme quando as atitudes


subjetivas dos indivíduos são orientadas por crença numa ordem
legítima. A legitimidade da ordem pode ser adquirida de forma tra-
dicional, baseada na crença de uma santidade das regras e poderes
estabelecidos; carismática, baseada numa certa qualidade da per-
sonalidade de um indivíduo; legal, baseada na burocracia racional
que se estabelece em nome de regras impessoais.

Teoria Racional Tradicional Carismático


Política Normas legais, Costumes, tradição, Valores sobre-hu-
administração ra- religião, regras cos- manos, magia, fe-
cional, agente pú- tumeiras, direito tiche, fanatismo,
blico, presidente, consuetudinário, te- governos nazi- fas-
democracia, direi- ocracia, sultanismo, cistas; legitimação
to positivo. patrimonialismo e pela “capacidade
patriarcalismo pessoal de instigar
as emoções”
Religião Sacerdote, padre, Feiticeiro – age à O profeta- seu po-
pastor- normas, sua maneira, não der vem do caris-
rituais normaliza- há uma normaliza- ma, vem da capaci-
dos; formação ins- ção das cerimônias, dade de emocionar.
titucional é mais vinculado ao
costumeiro.
Modernidade Sociedade feudal, Sociedade de pai-
conservadora xões
Democracia Teocracia Fanatismo, autori-
tarismo
Tabela 1: Desdobramento das ações sociais em tipos de dominação

70 FILOSOFIA
Embora esses tipos de legitimidade da dominação se misturem,
como observou Weber, na sociedade capitalista ocidental há uma
predominância acentuada da legitimidade legal, centrada na buro-
cracia. Cabe destacar que esses tipos de legitimidade da domina-
ção são desdobramentos dos tipos de ação social classificados por
Weber.

1 Qual o papel da sociologia para Max Weber? No que ele se


difere de Emile Durkheim?

2 Levando em conta o conceito de burocracia racional de


Max Weber explique a seguinte afirmação: quanto mais a
burocracia se consolida, mais forte fica a democracia.

3 Cite um exemplo para cada tipo de ação social, definido


por Max Weber, e explique por que tais exemplos são ações
sociais.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 71


CORRA LOLA, CORRA (1998)
Sinopse: Manni (Moritz Bleibtreu), o coletor de uma quadrilha de con-
trabandistas, esquece no metrô uma sacola com 100.000 marcos. Ele só
tem 20 minutos para recuperar o dinheiro ou irá confrontar a ira do seu
chefe, Ronnie, um perigoso criminoso. Desesperado, Ronni telefona para
Lola (Franka Potente), sua namorada, que vê como única solução pedir
ajuda para seu pai (Herbert Knaup), que é presidente de um banco. Assim,
Lola corre através das ruas de Berlim, sendo apresentados três possíveis
finais da louca corrida de Lola para salvar o namorado (http://www.
adorocinema.com/filmes/corra-lola-corra).

Direção: Tom Tykwer


Gênero: Ação/Ficção Científica
Elenco: Franka Potente, Moritz Bleibtreu, Herbert Knaup, Nina Petri,
Armin Rohde.

a queda - as últimas horas de hitler (2004)


Sinopse: Traudl Junge (Alexandra Maria Lara) trabalhava como secretária
de Adolf Hitler (Bruno Ganz) durante a 2ª Guerra Mundial. Ela narra
os últimos dias do líder alemão, que estava confinado em um quarto de
segurança máxima (http://www.adorocinema.com/filmes/queda).

Direção: Oliver Hirschbiegel


Gênero: Histórico
Elenco: Bruno Ganz , Alexandra Maria Lara , Corinna Harfouch , Ulrich
Matthes , Juliane Köhler.

72 FILOSOFIA
NOVOS MODELOS DE EXPLICAÇÃO SOCIOLÓGICA

Modelos teóricos inovadores, que têm renovado e oferecido ex-


plicações valiosas da realidade social no mundo contemporâneo.
Estas propostas surgiram na Europa e EUA, sem a preocupação de
criar modelos teóricos universais, reavaliaram as teorias clássicas
e apresentaram novas propostas metodológicas.

De modo geral, tiveram influência da psicologia, psicanálise, lin-


guística, semiótica. Incorporaram pressupostos teóricos e métodos
de pesquisa que tornaram a sociologia mais interdisciplinar. É o
momento em que a sociologia torna-se uma ciência mais madura
e afasta-se das ciências exatas e biológicas, aproximando-se das
demais ciências humanas.

Além disso, busca superar e resolver as dicotomias e/ou antino-


mias clássicas como: sociedade x indivíduo dos modelos clássicos
(Durkheim, Marx, Weber). É importante destacar que isto não sig-
nificou abandonar os modelos clássicos, mas sim sua atualização
em uma época de desenvolvimento dos meios de comunicação e da
indústria cultural. As novas sociologias buscaram discussões sobre
arte, vida urbana, modos de vida urbana e a mente humana, inte-
racionismo entre indivíduo e sociedade (a sociedade dos indivídu-
os) e de modo geral a crítica à razão instrumental.

Deste modo, as novas sociologias buscaram estudar o indivíduo do


ponto de vista de sua participação na ação social, elemento que
implicou em recortes metodológicos mais reduzidos, teorias de
menor abrangência e maior profundidade, métodos mais interpre-
tativos, históricos e qualitativos (como história oral e análise de
correspondências pessoais).

Neste grupo que chamamos de novas sociologias destacamos: Escola


de Frankfurt, a nova sociologia francesa de Bourdieu, Norbert Elias
e a sociedade dos indivíduos, e a Escola de Chicago (Simmel).

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 73


Escola de Frankfurt

Contexto: Início do século XX, industrialização da Itália e Alemanha, I


Guerra Mundial, Revolução Russa, conflitos entre operários e governo
na Alemanha, morte dos líderes Rosa de Luxemburgo e Karl Liebknecht.

Esta escola da sociologia relaciona-se com a Fundação do Instituto


para Pesquisa Social, ligado à Universidade de Frankfurt, que tinha
como destaque para Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Herbert
Figura 12: Escola de Frankfurt Marcuse, Walter Benjamin, Eric Fromm. Nos primeiros anos, o
Fonte: http://www.livrariares
posta.com.br/fotos/difel_esc_ Instituto foi financiado com doações dos judeus, mas com a ascensão
frank.jpg
do nazismo, seus pesquisadores tiveram de deixar a Alemanha,
devido às perseguições políticas.

De maneira geral, os frankfurtianos procuraram rever os princípios


marxistas, incorporando conceitos da Sociologia do Conhecimento
e da psicanálise. Críticos do nazismo alemão, Horkheimer e Adorno
criaram o conceito de indústria cultural (produção tecnológica,
lucrativa, planejada, e em série de bens simbólicos) em que discutiam
a formação de uma cultura de massa que vendaria os olhos da população
com o esvaziamento das ideias e fundamentação de ideologias.

Adorno e Horkheimer substituíram a expressão cultura de massa por


indústria cultural. Para estes autores, o cinema, o rádio, produção em
massa de obras de arte não são uma arte em si, nem cultura tradicional,
mas sim um negócio, que transforma a cultura em mercadoria. Este
fenômeno fundamenta o termo indústria cultural, pois a cultura e
a arte passam a ser mercadorias. Assim, os autores concluem que
a indústria cultural tenta reduzir todos os bens culturais em algo
consumível por qualquer tipo de consumidor, deste modo reduz a
cultura ao mais elementar, tornando-a algo rasteiro e superficial.

Em outra geração de Frankfurt, destaca-se Jürgen Habermas,


preocupado com as dimensões ideológicas do conhecimento e
na identificação de seus múltiplos condicionamentos. Elabora o
conceito de ação comunicativa e identifica dois tipos de razão na
cultura humana: a razão instrumental (domínio da natureza) e a
razão comunicativa (realização e libertação humanas). Habermas
critica a sociedade contemporânea pela prevalência da razão
instrumental sobre a razão comunicativa.
74 FILOSOFIA
Na ideia de mundo da vida, Habermas mostra a ra-
cionalidade dos indivíduos mediado pela linguagem e
comunicatividade. Esses elementos se constituem em
instrumentos de construção racional dos sujeitos cal-
cados na estruturação de três universos: o objetivo,o
subjetivo e o social.
É na esfera do universo da relação dos sujeitos que Ha-
bermas parte de sua concepção ontológica para a cons-
trução da racionalidade.
Na Teoria da Ação Comunicativa, o tema racionalidade
das opiniões e das ações é tratado sobre um prisma
filosófico e sociológico, a razão é a base do estudo da
filosofia. Os gregos da antiguidade, quando estudam a
própria razão, fundamentam-se numa base social onto-
lógica a partir do que poderíamos chamar de um dis-
curso comunicativo. A ação comunicativa busca explo-
rar uma sociologia do mundo da relação dos sujeitos,
ou seja, uma sociologia da ação comunicativa em que
o universo subjetivo, a ação política e a racionalidade
dos indivíduos se constituem em elementos estrutura-
dos de formação e revitalização da esfera pública na
busca da emancipação social.
A ação comunicativa que se efetiva na linguagem é uma
forma privilegiada de relacionamento entre os sujeitos:
permite a articulação de valores, elaboração de normas
e o questionamento dos mesmos. Esta é a diferença en-
tre o agir comunicativo e o agir estratégico, enquanto no
primeiro há a busca do reconhecimento intersubjetivo
das pretensões de validade, no segundo, um indivíduo
age sobre o outro para atingir os fins que ele a priori
definiu como necessários. Numa sociedade emancipató-
ria, predominam as ações comunicativas. O processo de
emancipação implica, então, um processo de racionali-
zação, de evolução simbólica, de diferenciação do mun-
do de vida, de aperfeiçoamento da comunicação entre
os sujeitos. O mundo emancipado é aquele onde o mun-
do vivido tem supremacia sobre o mundo do sistema. O
que significa resolução dos conflitos humanos com base
em discussões racionais, e evolução material equilibrada
com as exigências do meio ambiente.
“http://pt.wikipedia.org/wiki/A%C3%A7%C3%A3o_
comunicativa”

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 75


Nova Sociologia Francesa – Pierre Bourdieu

Pierre Bourdieu

Nascimento 1 agosto de 1930, Deguin


Falecimento 23 de janeiro de 2002
Paris
Nacionalidade Francês
Ocupação Sociólogo

Figura 13 - Pierre Bourdieu


Fonte: http://www.diplomatie.
gouv.fr/en/IMG/jpg/47s1.jpg Destaque para P. Bourdieu, que iniciou sua pesquisa pela análise da
educação e do patrimônio cultural das famílias, procurando rever
heranças clássicas e conciliar a análise da realidade objetiva com
a da subjetividade. Os principais conceitos desenvolvidos por este
autor foram a noção de habitus e campo.

Habitus: disposições internas do sujeito herdadas da família e


estruturadas pela experiência individual e pela educação (habitus
primário), que se transforma ao longo da vida, na experiência da
vida adulta (habitus secundário).

Campo: esferas autônomas da vida social, historicamente


constituídas. Noção que rompe com o determinismo econômico
marxista e propõe um conceito de sociedade formado por
instâncias, autônomas e interdependentes, que mantêm relações
de concorrência e poder.

76 FILOSOFIA
Na agenda teórica proposta à Teoria Sociológica
contemporânea, alguns elementos merecem destaque:
a releitura dos clássicos, a construção de conceitos
e a postura crítica do intelectual diante de uma
tomada de posicionamento político, elementos estes
amalgamados em sua discussão sociológica. Ao compor,
por exemplo, a ideia de campo, Bourdieu dialoga com a
ideia de esferas, proposta por Max Weber e, ainda, com
o conceito de classe social de Marx.
Construtivismo estruturalista ou estruturalismo
construtivista
Bourdieu, permitindo ter seu pensamento rotulado,
adota como nomenclatura o construtivismo
estruturalista ou estruturalismo construtivista.
Esta postura consiste em admitir que existe no mundo
social estruturas objetivas que podem dirigir, ou
melhor, coagir a ação e a representação dos indivíduos,
dos chamados agentes. No entanto, tais estruturas são
construídas socialmente assim como os esquemas de
ação e pensamento, chamados por Bourdieu de habitus.
Bourdieu tenta fugir da dicotomia subjetivismo/
objetivismo dentro das ciências humanas. Rejeita tanto
trabalhar no âmbito do fisicalismo, considerando o social
enquanto fatos objetivos, como no do psicologismo, o
que seria a “explicação das explicações”.
O momento objetivo e subjetivo das relações sociais
estão numa relação dialética. Existem realmente as
estruturas objetivas que coagem as representações
e ações dos agentes, mas estes, por sua vez, na sua
cotidianidade, podem transformar ou conservar tais
estruturas, ou almejar a tanto. (ttp://pt.wikipedia.
org/wiki/Pierre_Bourdieu)

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 77


Norbert Elias

Nascimento 22 de junho de 1897, Breslau


Falecimento 01 de agosto de 1990
Amsterdã
Nacionalidade Alemão
Ocupação Sociólogo

Figura 14 - Nobert Elias Conhecido como o sociólogo do processo civilizador e da vida


Fonte: http://crl.du.ac.in/
Publication/E-Resources%20 na corte, Elias concebe a sociedade como um tecido que liga os
in%20Public%20Domain-Final/
E-Resources/SocioSite%20 indivíduos, a cada ação numa direção, todo o tecido se reorganiza
FAMOUS%20SOCIOLOGISTS_
files/elias.jpg (a sociedade dos indivíduos) o sócio-histórico constituído por seres
que atuam de forma consciente, por meio de representações
abstratas e simbólicas que formam a respeito de si e da situação
da qual participam.

A sociedade é concebida por Elias como uma teia de relações


onde esta se reproduz à proporção que os indivíduos a constroem
e são construídas por ela, como na metáfora: os homens estão
na sociedade como uma aranha que tece a teia social ao mesmo
tempo em que se prendem a ela.

Elias busca entender as relações entre a sociedade e o indivíduo


dotado de liberdade, vontade e motivação, buscando romper com
determinismos e causalidades mecânicas. Desenvolve o conceito
de configurações ou habitus: interiorização do mundo exterior,
marca que a sociedade imprime na personalidade, agindo sobre os
sujeitos.

78 FILOSOFIA
Escola de Chicago

Contexto: EUA, na passagem do século XIX para o século XX, intensa


entrada de imigrantes europeus fugindo de perseguições políticas
e religiosas, marginalização, crime, conflitos raciais, minorias,
emprego da força policial na resolução destes conflitos (sem efeitos
duradouros).

A produção científica desta Escola de Sociologia teve seu apogeu


entre 1915 e 1940 e teve sede na Universidade de Chicago. Buscava
soluções para os conflitos, resultando uma sociologia urbana e
pragmática. Destaque para o pragmatismo de John Dewey; os Figura 15: Escola de Chigago
Fonte: http://img.
estudos sobre motivações, mobilidades e ritmos de vida da cidade mercadolivre.com.br/jm/
img?s=MLB&f=82822993_6438.
de Georg Simmel; o interacionismo simbólico de George Herbert jpg&v=E

Mead, valorizando o caráter simbólico e subjetivo da ação social.

A Escola de Chicago contribuiu com novas técnicas e métodos


de pesquisa social, entre eles: depoimentos, testemunho oral,
correspondência, análise de documentos, entrevistas. Tornou-se
referência em sociologia urbana.

Em 1935, outro grupo se destaca em Chicago, tem orientação


durkheimiana, estudam os processos de adaptação dos imigrantes
poloneses à cidade. Destacam-se Robert Merton e Talcott Parsons.

A Escola de Chicago começa a perder seu brilho quando uma outra


geração de sociólogos voltam-se para pesquisas quantitativas,
visando levantar tendências eleitorais ou preferência da
audiência por programas de comunicação, trazendo de volta à
cena a contestada postura positivista. Entretanto, verifica-se
a disseminação da metodologia da Escola de Chicago em outros
centros universitários (Yale, Michigan, Harvard, Columbia).

As contribuições da Escola podem ser sintetizadas na preocupação


em aplicar métodos etnográficos às análises sociais e à sociologia
urbana; na ênfase às pesquisas da vida cotidiana e processos
simbólicos. Por tais recortes específicos e bastante centrados em
casos, ficou conhecida como microssociologia. Um autor de grande
destaque deta escola foi Simmel, que aprofundaremos a seguir.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 79


A sociologia de Georg Simmel

Nascimento 22 de junho de 1897, Breslau


Falecimento 01 de agosto de 1990
Amsterdã
Nacionalidade Alemão
Ocupação Sociólogo

Figura 16 - Georg Simmel


Fonte: http://upload.
Georg Simmel (1858 – 1919), alemão de família remediada, teve
wikimedia.org/wikipedia/ sua vida, segundo WATIER (1996, p. 72), marcada pela experiência
commons/4/4f/Simmel_01.JPG
de nascer e morar, por um longo período, numa das maiores cidades
do mundo. Essa experiência teria despertado o seu interesse em
estudar “as novas relações sociais que indivíduos necessitados
desenvolvem quando a maioria de seus negócios é com pessoas que
não conhecem, estranhos no sentido mais amplo”.

Assim, dedicou a sua vida a capturar o espírito da sua época,


a descrever a transformação da alma da sociedade moderna,
levantando questões sobre a transformação das grandes cidades
e a implicação disso para a vida das pessoas. Para atingir tal
objetivo, discutiu sobre valores, dinheiro, cultura, o indivíduo, a
personalidade artística e a moda, mas a sua grande contribuição, ao
nosso ver, foi procurar as relações que poderiam emergir entre as
culturas objetiva e subjetiva, isto é, as relações que os indivíduos
constroem dentro de formas de sociação.

Simmel compartilha com Weber vários aspectos da sua teoria. E é


este que desenvolve a noção de racionalidade subjetiva esboçada
por Weber.

Para Simmel, cabe à sociologia organizar o real com ajuda de


sistemas de categorias ou modelos para que se possa conhecer
os fenômenos sociais. Com isso, este autor inaugura a sua
sociologia “da forma”. Essa noção tem por base a ideia kantiana
da possibilidade do conhecimento, que só é possível porque o
espírito projeta formas (a priori) aos fenômenos da natureza e,

80 FILOSOFIA
aproxima-se da ideia weberiana de tipo ideal, uma vez que os
modelos ou as formas criados por Simmel são construções mentais
que permitem interrogar e interpretar a ‘realidade social’, que é
caótica (BOUDON; BOURRICAUD, 2000, p. 5000).

A formalização da realidade social não é uma atividade exclusiva


do cientista, os atores também necessitam de regras normativas
para haver interação social e a própria sociação, mesmo que estas
não sejam conscientes.

Assim, com Weber, Simmel reporta-se à teoria da ação. E, para


compreender e interpretar as ações e as interações dos indivíduos,
ou seja, como as formas sociais persistem, Simmel criou um
modelo que apresenta de um lado a forma e de outro o conteúdo.
Os conteúdos são os motivos, impulsos, interesses, instintos que
levam os indivíduos interagirem entre si; enquanto as formas seriam
as maneiras como serão expressos esses conteúdos. Assim como os
conteúdos são múltiplos, as formas tendem a acompanhá-los.

Os impulsos que levam os atores interagirem mutuamente, segundo


Simmel, não são sociais em si mesmos. Só se tornam sociais através
das formas de ações recíprocas praticadas pelos indivíduos. Assim,
as ações recíprocas são a realização de uma unidade, de uma
sociação.

Essa noção nos revela que a sociação é feita a partir de uma teia
de relações entre os indivíduos. Como estes se relacionam de
várias maneiras, sob inúmeras formas, Simmel prefere conceituar
a sociação como um processo que se forma, dissolve e reforma
eternamente, isto é, toda vez que há uma interação entre
indivíduos.

E para que haja ações recíprocas, interações ou sociação, é


necessário que os indivíduos tenham a capacidade prática de
interpretar e entender as ações recíprocas. E para tal, os mesmos
precisam construir o “outro” como uma personalidade, como uma
unidade psicológica, permitindo, dessa forma, a compreensão.
Assim, toda sociação coloca em jogo mecanismos para a
interpretação dos outros e das situações, mecanismo que estão
ligados ao funcionamento da mente e que produzem, além das

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 81


unidades individuais, uma forma social que serve de modelo para
a orientação dos indivíduos.

A sociedade, portanto, torna-se possível porque os indivíduos


interagem uns com os outros de acordo com certas disposições,
imbuindo suas relações com boa vontade, esperança e confiança. A
ausência desses sentimentos que são individuais, mas que assumem
um caráter social, tornaria as relações sociais impossíveis.

Simmel chega a essa conclusão quando, ao investigar o que


possibilita e assegura a aproximação e os afastamentos entre
indivíduos, isto é, como se dá a interação entre os indivíduos,
descobriu que são as relações mais finas pautadas em sentimentos,
como gratidão, honra, fidelidade que são as mais firmes.

A sua conclusão partiu do “esquema da oferta e do equivalente”,


como a base de todas as relações humanas. Mas, para Simmel,
segundo COHN (1998), nem tudo pode ter sua equivalência
assegurada por coerção legal externa, cabendo, portanto, aos
sentimentos tecer esse laço de reciprocidade, equilibrando a
Marcel Mauss era um
sociólogo e antropólogo
relação entre o receber e o dar. Assim, essa relação não pode ser
francês, sobrinho de Émile reduzida à troca, aliás, esta quando plenamente desenvolvida,
Durkheim e considerado o
pai da etnologia francesa. como no mundo moderno, dispensa os homens, assumindo o caráter
Para Mauss, o elementar
das sociedades, em todos de conversão da capacidade de reciprocidade dos homens em mero
os tempos históricos, é o objeto, convertendo a relação dos homens em relação dos objetos.
intercâmbio e a dádiva.
Um de seus focos principais
são as prestações totais, O sentimento inverte esse movimento e, ao fazê-lo, propicia aquilo
através das quais “tribos”
e “metades” intercambiam que importa na constituição e permanência da vida social, isto é, a
tudo que lhes é importante:
festas, comidas, riquezas, manutenção da relação para além do momento da sua criação, porque o
mulheres, crianças etc. As
prestações totais agonísti-
que persiste é a relação e não o sentimento que a motivou.
cas acontecem quando um
chefe ou grupo compete Com essa análise, Simmel, assim como Weber, segundo COHN (1998),
com outro sobre quem pode
dar mais. Dar, receber e discorda da ideia de que as relações econômicas marcadas pela legalidade
retribuir são, para Mauss,
três momentos distintos racional sejam suficientes para estabelecer vínculos duradouros entre
cuja diferença é fundamen-
tal para a constituição e
os homens. Também, não seria um tipo de solidariedade social que
manutenção das relações acompanha a divisão do trabalho, como em Durkheim, tendo em
sociais. A dádiva opera
uma mistura entre amiza- vista que não se trata de interdependência, mas de reciprocidade,
de e conflito, interesse e
desinteresse, obrigação e aproximando-se do paradigma do dom, de Marcel Mauss.
liberdade. Também mistura
as pessoas que se presen-
teiam, as coisas e as pesso- Esta análise elaborada por Simmel, ao nosso ver, por outro lado,
as, as coisas e os espíritos. distancia-o um pouco de Weber, na medida em que desloca o ponto

82 FILOSOFIA
de persistência das relações sociais, e portanto da “sociedade”,
de uma ordem legal, como apontou Weber, para uma ordem
subjetiva. Ou em vez de distanciar, pode aproximá-lo, quando se
pensa na noção de racionalidade subjetiva esboçada por Weber.

A análise de Simmel sobre as possibilidades de manutenção


da ordem social, explicitada acima, revela que as formas de
interação podem se destacar de seus conteúdos, operando por
conta própria. Isso permite pensar a sociedade não diretamente
como um conjunto de interações em fluxo constante, mas como
um conjunto de formas padronizadas.

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SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 83


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84 FILOSOFIA
1 Dê exemplos e explique o que Durkheim define como fatos
sociais.

2 Cite e explique algumas contribuições de K. Marx para a


sociologia.

3 Por que a sociologia de Max Weber era conhecida como


sociologia individualista e da ação?

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 3 85


unidade

4
ObjetivoS dESTAunidade:
Objetivo dESTA unidade:

Estrutura social: noções básicas Apresentar o conceito


e função da estruturas
social;
Compreender como
os indivíduos estão
inseridos na sociedade;
Compreender a noção
de papel e status;
Apresentar a noção
de estratificação
Conceito e função de estrutura social social e com ela abrir
a discussão sobre
desigualdade social.

Partindo da constatação de que os membros e os grupos de uma


sociedade são unidos por um sistema de relações de obrigação,
isto é, por uma série de deveres e direitos (privilégios)
recíprocos, aceitos e praticados entre si, a estrutura social
refere-se à colocação e à posição de indivíduos e de grupos
dentro desse sistema de relações de obrigação. Em outras
palavras, a estrutura social é o complexo de papéis e status
que define o comportamento dos indivíduos e suas relações
entre si (Chinoy, 2008).

A estrutura tanto permite quanto restringe o que é possível


na vida social, isto é, as ações sociais são padronizadas,
institucionalizadas conforme as determinações estabelecidas
pela estrutura social, que por sua vez, relaciona-se tanto com
a cultura quanto com os recursos da organização.
Se um edifício fosse uma sociedade, as fundações, as colunas
de sustentação; as vigas seriam a estrutura, que servem tanto
pra constranger (limitar) quanto para permitir os vários arranjos
espaciais e os tipos de ambiente (que seriam na estrutura social –
papéis, organizações, instituições etc.).

Nesses termos, qual seria a função da estrutura social? Vejamos


abaixo:

• possibilitar a interação social;


• dar a cada um de nós um sentido para o lugar ao qual perten-
cemos, estabelecer o que se espera um do outro conforme o
status ocupado e orientar como devemos pensar, agir e sentir;
• sem a estrutura social não saberíamos como agir e constan-
temente ficaríamos incertos quanto às prováveis reações dos
outros;
• a maioria das atividades em nossa vida diária é conduzida den-
tro de estruturas sociais.

A estrutura social de uma sociedade é formada por dois elementos


básicos: o status e papel.

Status

O Status é a posição socialmente identificada que cada um dos indi-


víduos ocupa na estrutura social, isto é, é o lugar que ocupamos em
um sistema de posições interligadas. Todos nós ocupamos muitos
status diferentes, localizados em variadas estruturas.

Podemos afirmar também que o status é uma espécie de cartão


de identidade social, que pode ser adquirido ou atribuído.
Adquirido quando a pessoa precisa agir diretamente para ocupar
aquele status, por exemplo, é preciso casar para ocupar o status
de marido ou esposa; já o atribuído deriva de atributos sobre
os quais a pessoa não tem controle, por exemplo, os status
determinados biologicamente, ou quando se é colocado nessa
posição indiretamente, por exemplo, o status de filho.

88 FILOSOFIA
A noção de status envolve também a noção de poder e hierarquia,
uma vez que a posição que cada indivíduo ocupa na estrutura social
está relacionada com a distribuição desigual de riqueza, prestígio
e poder.

Ao conhecermos nosso status, sabemos onde estamos localizados e


o que esperar de nós. Exemplos: Status em família (pai, mãe, filho,
marido, esposa, sogra, irmão, tio, primo, sobrinho, avó etc.); sta-
tus em organizações (aluno, professor, chefe, patrão, empregado,
diretor, operário, médico, advogado, juiz, réu etc.).

Papel

Cada status traz consigo uma série de regras e normas que prescre-
vem a maneira pela qual a pessoa que o ocupa deve ou não deve
comportar-se em determinadas circunstâncias. Esse grupo de nor-
mas e regras é denominado de papel.

Quando nos comportamos em um status devemos ter consciência


das normas e regras que regulam as ações compatíveis com a posi-
ção ocupada.

O papel é o aspecto dinâmico do status, é a execução daquilo que


foi estabelecido pela estrutura, isto é, a maneira como devemos
nos comportar estabelecida previamente.

A importância dos papéis sociais não reside apenas na regulamen-


tação dos comportamentos, mas também no fato de permitir aos
indivíduos que predigam as ações dos outros e, portanto, que mo-
delem as suas próprias ações de acordo com essa predição.

Portanto, existem relações sociais entre os papéis desempenhados


pelos membros de uma sociedade, e tais relações não são definidas
apenas indiretamente por padrões gerais de comportamento (cor-
tesia, respeito, obediência), mas também por prescrições institu-
cionais específicas, as quais determinam como os ocupantes dos
status devem se comportar uns em relação aos outros.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 89


Numa audiência, por exemplo, as partes envolvidas só podem falar
quando o juiz faz a solicitação, também há regras para o trata-
mento com o juiz (meritíssimo), por outro lado, o juiz não pode
privilegiar uma das partes por questão de sexo, raça, credo, idade
a não ser que isso seja legalmente definido.

Os aspectos que fundamentam o papel e o status

Os papéis e status se constroem sobre dois tipos de alicerces prin-


cipais:

1. Alicerce biológico – em todas as sociedades se edificam status e


papéis diferentes conforme idade e sexo;
2. Alicerce social, porém, é o que determina a maior parte dos
status e papéis.

Quanto mais complexa a sociedade maior será a quantidade de


status e papéis a serem vivenciados pelos seus membros.

Integração e relacionamento papel-status

É importante destacar que o papel e o status social são dois as-


pectos que andam juntos e imbricados, pois ambos correspondem
a ações e práticas sintonizadas com situações, ou ocasiões sociais
definidas. De modo geral, definem modos de comportamento so-
cial. Vejamos:

Ao ocupar o status de aluno (que é adquirido), por exemplo, deve-


se seguir comportamentos definidos para tal “script” (ir à aula,
estudar, fazer prova, participar de atividades da escola, respeitar
os professores, prestar a tenção à aula, cumprir as tarefas deter-
minadas etc.).

Para verificarmos a integração do status e papel podemos utilizar


a imagem da representação. Cada ator tem que representar
conforme o papel atribuído ao personagem que ele representa, que

90 FILOSOFIA
por sua vez será estruturado dentro de enredo. Os papéis sociais
são apreendidos à medida que adquirimos a cultura do nosso grupo,
da estrutura social na qual estamos inseridos.

Geralmente esses papéis são introjetados de tal maneira que pas-


sam a fazer parte da personalidade individual e passamos a de-
sempenhá-los sem consciência do seu caráter social. Os papéis não
são pessoais, são as partes representadas no palco da vida social
(padrões de comportamentos).

Na vida social não ocupamos apenas um status, transitamos e


aprendemos vários. Nós não ocupamos apenas um status, mas es-
tamos inseridos num complexo de posições. Esse complexo no qual
cada um de nós ocupa várias posições conforme a estrutura é ge-
ralmente denominado de conjunto de status.

Ao ocuparmos vários status também temos que desempenhar vários


papéis. Assim, uma mulher poder ser: mãe, prefeita, funcionária
pública, evangélica e ainda torcedora de um time de futebol.

Um conjunto de status marca as estruturas às quais pertencemos


e os sistemas de cultura aos quais estamos ligados. Dessa forma,
estamos todos nos comportando em ocasiões diferentes seguindo o
papel estabelecido para cada status particular.

Podemos afirmar que o conjunto de status que vivemos ou que ocu-


pamos é a rede de relações que estabelecemos com outros indiví-
duos ou instituições. É de modo amplo uma das bases elementares
da vida social (rede social de relações).

Os vários status que ocupamos se ligam uns aos outros de tal forma
que nossos papéis em um dado status podem ser afetados por essa
ligação, por exemplo, aluno casado com filho pode ter comporta-
mento diferente daquele que é apenas aluno e filho.

Portanto, podemos apreender muito sobre a pessoa se conseguir-


mos mapear todos os status que ocupamos relacionando-os às es-
truturas e à cultura nas quais esses status estão inseridos e, com
isso, torna-se possível formar um quadro aproximado de “quem
somos” sociologicamente.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 91


Como ocupamos vários status e cada um tem um papel específico
(padrão de comportamento), às vezes pode haver um conflito entre
os papéis. Esse conflito é inevitável nas sociedades complexas em
que todos nós ocupamos status diferentes segundo as diferentes
estruturas nas quais participamos, uma vez que cada um tem suas
próprias exigências.

Para amenizar esse conflito é necessário que haja uma separação


das diferentes atribuições no tempo e no espaço. É preciso, por-
tanto, aprendermos a gerenciar essas fontes de tensão e conflito
ou vamos sofrer as consequências.

Vejamos o organograma:

Esse conjunto hipotético de status de um indivíduo liga-o a


comportamentos culturais de alguma forma diferente, composto
de crenças e normas que, por sua vez, refletem valores e outros
sistemas culturais. Construindo um diagrama semelhante para
cada um de nós, podemos aprender muito sobre nós mesmos e
sobre os códigos simbólicos que orientam nossos sentimentos,
comportamentos e ações.

O indivíduo e a estrutura social

Cada um de nós é uma peça na engrenagem das formas estruturais.


Embora tenhamos inteligência e criatividade, nossas vidas
cotidianas são altamente definidas pela estrutura. Nossa vida é um
constante e incessante movimento nas estruturas sociais – família,
amigos, escola, organização de trabalho, comunidade etc.

92 FILOSOFIA
O que somos como indivíduo é o produto dessa participação nas
estruturas. Embora possamos escolher nos deslocar para dentro
ou fora das estruturas, não podemos escapar de todas e, por-
tanto, podemos apenas escolher quais as que devem ser nossas
opressoras.

Nossa vida é um trânsito nas estruturas de status e papel, e nos


deslocamos na estrutura social definida pela sociedade em que
vivemos, conforme escolhas, práticas, costumes etc., que bus-
camos fazer em nossas vidas sociais. É importante enfatizar que
a escolha que podemos fazer é limitada pelas possibilidades es-
truturais que a sociedade permite, ou seja, só podemos escolher
exercermos o papel social de professor, caso você tenha passado
pela formação legal e normalizada pela sociedade em questão
(desse modo seguindo e obedecendo a critérios estabelecidos so-
cialmente).

Tipos de estrutura social

A sociologia identifica os seguintes tipos de estrutura social:


grupos, organizações, comunidades, estruturas institucionais e
categorias.

Grupos sociais

Grupos são estruturas sociais pequenas, compostas por um ou al-


guns tipos de status, números pequenos de papéis, com ligações
densas entre alguns status e claras expectativas culturais sobre o
que se espera que as pessoas façam.

Os grupos variam em sua durabilidade, podem ir de uma reunião


temporária de amigos aos laços permanentes da família. Também
variam de tamanho, por isso alguns são classificados de primários
(pequenos, unidos e íntimos) e outros de secundários (maiores, e
impessoais).

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 93


Organizações ou estruturas organizacionais

São estruturas maiores e mais formais compostas de uma diversida-


de de status que revelam diferenças de autoridade. Organizações
são constituídas para satisfazer necessidades humanas, tais como
ganhar dinheiro, educar as pessoas, produzir bens e serviços etc.

Comunidades

Comunidades são estruturas sociais que organizam a residência das


pessoas assim como suas atividades no espaço físico, geométrico.
As comunidades variam conforme o tamanho. Pode ser uma cidade
rural pequena a uma megalópole, um condomínio de poucas casas
a grandes estruturas residenciais. Conforme o tamanho, o poder da
estrutura varia inversamente proporcional.

Instituições

São as estruturas criadas para resolver problemas humanos básicos,


para manter efetivamente organizada a sociedade, através da
regulamentação e do controle da população. Podemos identificá-
las como estruturas políticas. Quanto maior a sociedade, maior e
mais complexa será a gama de instituições.

Categorias sociais

São as estruturas criadas e sustentadas em razão do tratamento


diferenciado daqueles que revelam características semelhantes. As
únicas categorias universais que servem para classificar as pessoas
são sexo e idade, mas as pessoas classificam umas as outras em
termos de características distintivas e reagem diferentemente
umas as outras.

94 FILOSOFIA
À medida que as sociedades se tornam mais complexas, novos tipos
de categorias são criados, a exemplo das categorias de etnia e
classe, que surgiram devido ao fato de seus membros receberem,
frequentemente, partes desiguais de recursos importantes. Nesse
sentido, essa estrutura é denominada de estratificação social.

ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL

Estratificação social pode ser definida como um modo complexo


de manifestação das desigualdades em sociedade, ou seja, a
configuração do posicionamento hierárquico dos indivíduos em
partes (seções) relativamente homogêneas de contingentes
populacionais quanto ao estilo de vida, oportunidades e interesses.
Podemos afirmar ainda que a estratificação é o mapa da distribuição
desigual de recompensas socialmente valorizadas pela sociedade
(poder, honra, prestígio, bens materiais etc.).

[...] onde quer que exista sociedade, existe


necessariamente algum tipo de desigualdade
social entre os indivíduos quanto aos seus
direitos e deveres, de acordo com as posições
que eles ocupam. Desigualdade de direitos e
deveres e diferenciação de posições, porém, não
significam o mesmo que estratificação (NOVA,
2008. p.152).

Nesses termos, é importante destacar que estratificação social


não é a mesma coisa que desigualdade social, mas que a primeira
é uma forma complexa da segunda. A desigualdade social está
presente em todas as sociedades desde as mais simples, como as
pequenas comunidades da África, até as complexas sociedades
urbano-industriais. É importante ressaltar que a estratificação
não está presente em todas as sociedades. Nas comunidades em
que há pouca complexidade no desenvolvimento tecnológico, esse
fato não gera a produção de um excedente de bens necessários à
sobrevivência:

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 95


“Nessas sociedades, a divisão do trabalho e o sistema de
posições, extremamente simples, tendem a se basear
de modo predominante na atribuição de acordo com o
sexo e idade dos indivíduos” (NOVA, 2008, p.153).

A inexistência de bens excedentes e a preocupação com a


subsistência faz com que os estilos de vida e oportunidades,
nas comunidades mais simples, sejam praticamente os mesmos.
Nessas sociedades, portanto, não há estratificação em camadas
delimitadas por status, estilo de vida e oportunidades desiguais.
Porém, é evidente que nessas comunidades existem desigualdades
perpassadas pela divisão de papéis sociais por idade e sexo.

O marco fundador de uma sociedade estratificada é quando


surge um amplo aperfeiçoamento das técnicas de transformação
da natureza de modo que se inicia um aumento da produção e
acúmulo de excedentes; daí surge o comércio, a especialização de
tarefas, a concentração de riquezas e, por fim, o estabelecimento
de camadas sociais. Estas serão amplos setores da população
com interesses, estilo de vida, oportunidades, valores, empregos
e papéis sociais semelhantes entre si, e desiguais entre outras
camadas sociais que também se configuram.

As sociedades estratificadas podem ser: sociedades de classe;


sociedades estamentais e sociedades de castas. As sociedades
podem ser definidas como estratificadas quando se estabelece
camadas de população semelhantes internamente, e desiguais
entre si. Cada classe social possui um status e interesses
diferenciados, cada casta tem prestígio e status diferenciados,
assim como nos estamentos. O importante é compreender que a
estratificação é a cisão da sociedade em estratos legitimados por
valores, leis e normas que definem que essa divisão seria: justa,
normal, correta.

É importante destacar que nas sociedades estratificadas, os


estratos possuem certa homogeneidade, porém há internamente
diferenciações de papéis, como no caso da sociedade de classes, em
que a classe média é formada por profissionais liberais, pequenos
empresários, funcionários públicos etc., esses tipos profissionais
diferenciam-se, mas possuem certas semelhanças.

96 FILOSOFIA
Para identificar o estrato social de uma dada sociedade, Max Weber
estabeleceu dois critérios que são:

1) analisar as semelhanças e diferenças nos estilos de vida


– desse modo uma camada que possui estilo de vida
semelhante, provavelmente, poderá ser um estrato;
2) compreender as oportunidades – se uma dada camada social
possui possibilidades de acesso a empregos, riquezas, poder e
prestígio semelhantes, possivelmente será um estrato. Assim,
é da conjugação de estilo de vida e oportunidades semelhantes
que Weber nos ajuda a identificar um estrato social.

Legitimação da estratificação: aceitação

A estratificação social pode ser analisada como um fato social, ou


seja, como algo que é exterior, geral e coercitivo. É exterior, pois
independe da vontade individual e perdura de geração a geração;
é geral, pois está disseminada nas crenças, valores e práticas
sociais de maneira coletiva; é coercitiva, pois ninguém escolhe
o estrato social a que faz parte, nem as regras e normas que já
foram estabelecidas socialmente. De modo geral, a estratificação
social não é apenas a distribuição ou divisão da sociedade em
camadas, ela é também composta de um sistema simbólico de
crenças, normas e valores que legitimam, regulam e interpretam a
distribuição desigual de recompensas sociais:

O poder de influencia dos homens comuns é


circunscrito pelo mundo do dia a dia em que vivem,
e mesmo nesses círculos de emprego, família e
vizinhança frequentemente parecem impelidos por
forças que não podem compreender nem governar.
As grandes mudanças estão além de seu controle,
mas nem por isso lhes afetam menos a conduta e as
perspectivas (MILLS, 1975. p.11).

O sistema de estratificação medieval, neste caso estamental, tinha


como base as justificativas religiosas como sistema simbólico de
legitimação e normalização. Assim, a Igreja dizia que Deus havia
distribuído os papéis sociais na humanidade: aqueles que deveriam
rezar pela salvação da humanidade, aqueles que deveriam governar
e proteger o povo e aqueles que deviam trabalhar para alimentar e
sustentar os que governavam e os que rezavam.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 97


Desse modo, os nobres nascem nobres, pois Deus os deu a nobreza
e a virtude para comandar e não trabalhar, pois o trabalho seria
algo doloroso e produto do pecado que expulsou a humanidade
do paraíso divino. O clero seria o responsável pelas orações
e salvação dos pecadores e, por fim, os camponeses e artesãos
seriam os desprestigiados que deveriam trabalhar para sustentar os
estamentos superiores e assim, pagar seus pecados na vida terrena.

Este sistema de crenças da religião cristã medieval fundamentou


e legitimou a estratificação social em estamentos, de modo que
a população como um todo aceitasse que esse sistema era justo,
correto e verdadeiro. Esse modelo de configuração social só será
questionado e derrubado com o advento do modo de produção
capitalista e o estabelecimento de uma sociedade de classes, após as
revoluções burguesas (Revolução Inglesa, Francesa, Independência
dos Estados Unidos etc.).

Conceito básico para compreensão da estratificação

Mobilidade social

Mobilidade social é toda movimentação ou passagem de um


indivíduo de um grupo social (estrato) para outro, ou dentro do seu
próprio sistema de posições inter-grupro (posição social) dentro do
rol de status e camadas sociais.

Podemos definir dois tipos de mobilidades sociais: a vertical e a


horizontal.

Figura 17
Fonte: http://4.
Mobilidade vertical é a passagem de um indivíduo de um grupo
bp.blogspot.com/_ inferior para um superior, ou seja, é o movimento ascendente na
UyMJAeDlF9w/SPiniO0t0aI/
AAAAAAAAA7M/56Ep4nHs6dk/ pirâmide de estratificação. Exemplo: um indivíduo que era de
s400/Pir%C3%A2mide+Social.jpg
classe média dentro de uma sociedade secularizada e racional
(sociedade de classes) consegue melhores postos de trabalho,
passa de operacional para superintedente executivo geral de uma
grande empresa multinacional. Neste exemplo o indivíduo não
muda apenas de emprego, mas de grupo social a que faz parte, pois
gradativamente acessará mais oportunidades e consequentemente

98 FILOSOFIA
compartilhará de um estilo de vida mais sofisticado, saindo assim
da classe média-baixa para a classe média alta.

Há dois tipos de mobilidade vertical, a ascendente em que um


indivíduo passa de um estrato inferior em status, oportunidades e
acesso aos bens valorizados socialmente, para um estrato superior
(ascensão social); e descendente – quando um indivíduo passa de
um grupo de maior status para um de status inferior.

Um exemplo contemporêneo de mobilidade ascendente está em


paralelo com os processos de migração social. No Brasil há uma
tendência de vinda de indivíduos do centro-sul, que não conseguiram
se estabelecer no mercado de trabalho, para o nordeste, onde há
“supostamente” menor quantidade de profissionais qualificados.
Nesses termos, assistimos no Nordeste brasileiro uma ampla
migração de pessoas que no centro-sul estavam em classes
desfavorecidas pela falta de vagas no mercado de trabalho e, ao
chegarem no Nordeste, ocupam cargos mais qualificados, saindo,
dessa maneira, da esfera de classe estratificamente menos
favorecida para alcançar prestígio nessa região.

A mobilidade descendente ocorre quando um indivíduo perde


o prestígios e o status inerente à sua classe, assim decaindo na
pirâmide social. Um exemplo disso pode ser dado na passagem do
antigo regime para o sistema capitalista na Europa, onde os nobres
e clero eram as camadas sociais de maior prestígio e, após as
Revoluções Burgueseas, tornaram-se classes inferiores, enquanto
a burguesia tomava as rédeas do processo sócio-histórico. Assim a
burguesia:

[...] passou a dominar, destruiu as relações feuda-


is, patriarcais e idílicas. Dilacerou sem piedade os
laços feudais, tão diferenciados, que mantinham
as pessoas amarradas a seus ‘superiores naturais’,
sem pôr no lugar qualquer outra relação entre os
indivíduos que não o interesse nu e cru do paga-
mento impessoal e insensível ‘em dinheiro’. [...]
Em uma palavra, no lugar da exploração encoberta
por ilusões religiosas e políticas ela colocou uma
exploração aberta, desavergonhada, direta e seca
(MARX; ENGELS, 1988, p. 10).

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 99


Nesse tipo de mobilidade o indivíduo muda de status e de camada
social. Fato que não ocorre na mobilidade horizontal.

A mobilidade horizontal é aquela em que o indivíduo muda apenas


de posição social inter-grupo. Essa mobilidade acontece quando o
indivíduo muda de status mas não de grupo social. O exemplo bem claro
disso é quando um indivíduo exerce a função de professor de Ensino
Médio e depois consegue, por mérito e competência comprovada,
passar para o cargo de professor de nivel superior. Nesses termos, o
indivíduo continuará na classe média, porém com mudança de posição
e status dentro do seu próprio estrato social. Conforme Weber, nesne
tipo de mobilidade não há alteração no estilo de vida nem no acesso
a novas oportunidades. Segundo Nova (2008, p. 155):

Se um indivíduo muda de emprego, ou mesmo de


ocupação, mas não altera substancialmente as
suas oportunidades de vida, mesmo que essa mu-
dança tenha resultado em aumento ou diminuição
de seus ganhos pecuniários, houve aí mobilidade
horizontal.

Sociedades abertas e fechadas

Sociedades abertas são aquelas em que a organização social é


considerada secularizada, ou seja, em que prevalece a racionalidade
e o utilitarismo em detrimento da tradição e dos costumes. Nessa
configuração social os indivíduos tendem a ter maiores mecanismos
que possibilitam oportunidades de mudança de status. Em uma
sociedade de classes, sociedade capitalista, há canais em que
o indivíduo pode lutar para se mover socialmente: através da
qualificação profissional, empreendedorismo, negócios etc.

Por outro lado, existem sociedades fechadas, aquelas em que a


tradição, os costumes e os laços de sangue são mais importantes
do que a obtenção de riquezas como fundamento do status social.
Os dois grandes exemplos desse tipo de configuração são as castas
e os estamentos. Em ambas, o estrato que um indivíduo pertence
é dado pelo nascimento e tradição, nesses termos não há como
mudar de camada social.

100 FILOSOFIA
Porém, é importante destacar que nas sociedades aristocráticas,
no caso a estamental, há uma pequena possibilidade de
mobilidade, como ocorria na Idade Média (compra de títulos
de nobreza, a nobreza de toga). Observe os critérios de
estratificação social:

• distribuição de renda: desigualdade econômica;

• distribuição de capital cultural: acesso a educação e bens


culturais;

• distribuição de papéis sociais: profissões diferenciadas de


acordo com as classes sociais;

• divisões por nacionalidade e etnia;

• castas ou estamentos: não há mobilidade social;

• classes sociais: sociedade burguesa; há a possibilidade de


mobilidade.

Os tipos de estratificação social

Castas

O sistema de estratificação por castas fundamenta o que


chamamos, anteriormente, de uma sociedade fechada, em que a
mobilidade social é interditada pela fundamentação herdada da
posição social e status. Desse modo, nesse sistema, as hierarquias
e status social são definidos de geração a geração por herança e
nascimento.

Nas castas o status, oportunidades e estilo de vida serão definidos


pelo nascimento e hereditariedade, desse modo quem nasce párea,
morrerá párea. Mesmo que um estrato inferior adquira riquezas
econômicas, este não terá ascensão social, pois o parâmetro para Figura 18
Fonte: http://pt.wikipedia.org/
tal é o prestígio e nobreza herdado de sua família. wiki/Ficheiro:Caste_AS.jpg

A configuração em castas mais conhecida é a da Índia, chamado de


sistema Vama, este estrutura-se:

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 101


• Brahmin (cabeça): é a casta mais elevada e de maior prestígio,
representa a cabeça de BRAHMA (entidade religiosa hindu).
Esse estrato social é formado por aqueles que, supostamente,
possuem maior sabedoria e desapego por terem nascido da
cabeça de Brahma. Seriam os sacerdotes, filósofos e professores.
• Ksatrya (braços): são os responsáveis pela defesa do povo e
dos estratos pensadores, supostamente teriam se originado
dos braços de Brahma. Esse estrato social também é dotado
de prestígio e grande nobreza, dele faz parte os militares e os
governantes.
• Vaishya (perna): está é a camada social responsável pelos
negócios, trabalho agrícola e comércio, possuem grande capital
financeiro, mas menor prestígio e nobreza. Esse estrato tem
como origem mitológica as pernas de Brahma, assim, compõe-
se de comerciantes e agricultores.
• Shudra (pés): é a camada social de menor prestígio e nobreza,
são os descendentes dos pés de Brahma, por isso são responsáveis
pelos trabalhos manuais considerados de menor prestígio e
nobreza. Essa classe é formada pelos artesãos, operários e
camponeses.

Esse sistema de castas indiano foi abolido com a implantação da


Constituição de 1949, porém a força da tradição e dos costumes
não foi ainda totalmente superada pela secularização das normas
(elaboração do direito positivo, direito de Estado). Destarte, há na
Índia contemporânea dois sistemas de estratificação: a tradicional
casta, e o secular sistema de classes.

Por ser um sistema em que o status e prestígio são transmitidos por


nascimento, há grandes restrições nos casamentos entre estratos
diferentes. Na realidade, é proibido o casamento entre estratos
desiguais, assim, um shudra nunca poderá casar-se com um vaishya.
Esse sistema de casamentos endogâmicos permite a imobilidade
social e a reafirmação do sistema de estratificação.

102 FILOSOFIA
ANA E O REI (1999)
Sinopse: Em 1860, a inglesa Anna Leonowens (Jodie Foster), viúva, viaja
até o Sião para ser tutora dos 58 filhos do Rei Mongkut (Chow Yun-Fat).
Divergências, choque de culturas e até o início de um romance marcam o
relacionamento entre Anna e Mongkut. (http://www.adorocinema.com/
filmes/anna-e-o-rei/)

Direção: Andy Tennant


Gênero: Drama
Elenco: Jodie Foster, Chow Yun-Fat, Ling Bai, Tom Felton, Randall Kim,
Kay Siu Lim, Melissa Campbell e Keith Chin.

Classes

A estrutura de classes sociais é típica de sociedades


racionalizadas pela secularização gerada
pelo modo de produção urbano-industrial. As
sociedades abertas são exatamente as sociedades
com estratificação em classes sociais.

Os fundamentos de uma estratificação em classes


sociais é o acesso a riquezas, propriedades de bens
e meios de produção. Em uma sociedade de classes
a divisão em camadas revela a desigualdade eco-
nômica propriamente dita. Como as diferenças de
estilo de vida, oportunidades e status têm como
elemento fundamental o fator riquezas, abre-se
a possibilidade de maior mobilidade social, pois
há uma máxima na sociedade capitalista: “se você
trabalhar poderá alcançar grandes riquezas”.
Figura 19
É lógico que dentro de um sistema de classes as Fonte: http://horaderelaxar.com.br/wp-content/
uploads/2008/11/piramede-do-capitalismo-1.jpg
oportunidades de ascensão são mais amplas, porém,
não quer dizer que são fáceis. Alcançar os altos setores sociais, as
classes altas, requerer janelas de acesso que não são tão amplas. É
importante deixar claro que na sociedade de classes há pelo menos
a possibilidade, ainda que difícil e restrita, de mobilidade social.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 103


É fácil escutar nos dias atuais que se você buscar qualificação, cur-
sos universitários, mestrados, doutorados, alcançará ascensão so-
cial. Dentro de uma sociedade de classes, a qualificação profissio-
nal pode ser uma via de ascensão, desde que haja um mercado de
trabalho com carências nas áreas da qualificação. Em casos em que
o mercado de trabalho não está aberto, e nem necessita de maio-
res qualificações, a educação acaba por produzir mais frustrações
sociais que ascensão.

Caso ocorra ascensão social de um setor pobre para um setor elite


(ganho de um prêmio na loteria, jogador de futebol) a assimilação
e incorporação à classe mais alta, pelo menos no sentido do estilo
de vida, não ocorre automaticamente. Esse indivíduo, também co-
nhecido como “novo rico”, obterá maiores oportunidades de aces-
so aos bens e serviços, mas demandará tempo para sua adaptação
ao novo estilo de vida, e não será aceito de imediato.

Nas sociedades capitalistas podemos


definir três grandes estratos sociais:
elite (composta pela elite política e
por proprietários dos meios de produ-
ção e das maiores fontes de riqueza,
poder político e intelectual); classe
média (estrato intermediário forma-
da por profissionais liberais, médicos,
advogados, professores, contadores,
altos funcionários públicos); pobres Figura 20
(são os trabalhadores e operários que Fonte: http://parroquiaicm.
files.wordpress.com/2008/07/
possuem apenas sua força de traba- capitalismo.jpg

lho e vivem de salário).

Conforme Marx as classes são produtos da estrutura econômica,


são efeitos da estrutura (ver capítulo 2). É da divisão social do tra-
balho que surgiriam as classes. O autor define que classes sociais
são divisões da sociedade que surgiram em decorrência de confli-
tos e antagonismos gerados pela desigualdade de condições e de
propriedade dos meios de produção e riquezas. Desse modo, Marx
concebe que em uma sociedade de classes o que move os processos
de transformação são conflitos entre classes: luta de classes.

104 FILOSOFIA
A PROCURA DA FELICIDADE (2006)
Sinopse: Chris Gardner (Will Smith) é um pai de família que enfrenta sérios
problemas financeiros. Apesar de todas as tentativas em manter a família
unida, Linda (Thandie Newton), sua esposa, decide partir. Chris agora é
pai solteiro e precisa cuidar de Christopher (Jaden Smith), seu filho de ap-
enas 5 anos. Ele tenta usar sua habilidade como vendedor para conseguir
um emprego melhor, que lhe dê um salário mais digno. Chris consegue uma
vaga de estagiário numa importante corretora de ações, mas não recebe
salário pelos serviços prestados. Sua esperança é que, ao fim do programa
de estágio, ele seja contratado e assim tenha um futuro promissor na
empresa. Porém seus problemas financeiros não podem esperar que isso
aconteça, o que faz com que sejam despejados. Chris e Christopher passam
a dormir em abrigos, estações de trem, banheiros e onde quer que consi-
gam um refúgio à noite, mantendo a esperança de que dias melhores virão.
(http://www.adorocinema.com/filmes/a-procura-da-felicidade)

Direção: Gabriele Muccino


Gênero: Drama
Elenco: Will Smith, Jaden Smith, Thandie Newton, Brian Howe, James
Karen.

Estamento

Forma de estratificação social típica das sociedades aristocráticas.


Nela o prestígio tem peso maior que a riqueza; assim, o nobre,
mesmo empobrecido, não perde o prestígio recebido por herança.

A localização do indivíduo na hierarquia social não é somente


uma realidade econômica, mas de direito, ou seja, o nobre é
superior, pois nasceu nobre, e o plebeu é inferior por nascer
plebeu. Nessas sociedades, os direitos e deveres dos mem-
bros dos estamentos são definidos por lei.

Até o século XVIII, a França estava dividida em três esta-


mentos: nobreza, alto clero e Terceiro Estado. Este últi- Figura 21
Fonte: http://farm4.static.flickr.
mo heterogêneo: camponeses, artesãos, comerciantes, com/3228/2856323360_caed42b891.jpg

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 105


banqueiros etc. Dentro dele temos a burguesia, categoria social
dedicada às atividades comerciais e financeiras, com grande poder
econômico, mas sem prestígio político.

A Revolução Francesa (1789) extinguiu a diferenciação legal dos


indivíduos proclamando a igualdade dos cidadãos perante a lei, o
que permitiu à burguesia se afirmar politicamente. Com a extinção
da sociedade estamental e ascensão política da burguesia, nasce a
sociedade de classes.

CASTRO, A. M. de. Introdução ao pensamento sociológico: coletâ-


nea de textos. São Paulo: Centauro, 2001.
CHINOY, Ely. Sociedade: uma introdução à Sociologia. 20. ed. São
Paulo: CULTRIX, 2008.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O manifesto comunista: 150 anos
depois. Rio de Janeiro: Contraponto; São Paulo: Perseu Abramo,
1998.
TURNER, Jonathan. Sociologia: conceitos e aplicações. São Paulo:
MAKRON BOOKS, 2000.
VILA NOVA, Sebastião. Introdução à Sociologia. São Paulo:
Atlas,2008.

WEBER, Max. Economia e Sociedade. Brasília: UnB, 1991.

1 Faça um organograma que descreva a estrutura de status e


papel que você faz parte na sociedade.

2 Conceitue e exemplifique os tipos de estrutura social.

3 Diferencie os tipos de estratificação social.

106 FILOSOFIA
4 O sistema de castas da Índia é uma divisão social importan-
te na sociedade Hindu, não apenas na Índia, mas no Nepal
e noutros países e populações de religião Hindu. Embora
geralmente identificado com o hinduísmo, o sistema de cas-
tas também foi observado entre seguidores de outras re-
ligiões no subcontinente indiano, incluindo alguns grupos
de muçulmanos e cristãos. A Constituição Indiana rejeita a
discriminação com base na casta, em consonância com os
princípios democráticos e seculares que fundaram a nação.
Barreiras de casta deixaram de existir nas grandes cidades,
mas persistem principalmente na zona rural do país.

(http://pt.wikipedia.org/wiki/Sistema_de_castas_
da_%C3%8Dndia).

Levando em consideração o texto acima, por que o sis-


tema de castas na Índia ainda persiste nas regiões rurais,
apesar da abolição? Pesquise na internet para fundamen-
tar sua resposta.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 4 107


UNIDADE

5
OBJETIVO DESTA
OBJETIVOS DESTAUNIDADE:
UNIDADE:
INSTITUIÇÕES SOCIAIS Apresentar o conceito
e função de instituições
sociais;
Apresentar as principais
instituições sociais na
vida moderna com seus
elementos básicos.

O que queremos dizer quando falamos que a família, a educa-


ção, a religião, o governo, a economia são instituições sociais?
Qual a função das instituições sociais em nossas vidas?

Nesta unidade pretendemos responder essas questões estudan-


do mais detalhadamente algumas das principais instituições
presentes em nosso cotidiano.

Émile Durkheim, na obra As regras do método sociológico, apre-


sentou a sociologia como “ciência das instituições, de sua gênese
e de seu funcionamento” Durkheim (apud NOVA, 2000, p. 161).

Status é a posição
O qUE É UMA INSTITUIÇÃO SOCIAL? socialmente identificada
que cada um dos indivíduos
ocupa na estrutura social.
Isto é, é o lugar que
ocupamos nas instituições
que pertencemos.
Instituições sociais são conjuntos de valores, crenças, normas,
Papel é o comportamento
status (posições) e papéis referentes a campos específicos de normatizado e imposto
socialmente que adotamos
atividade e necessidade humanas. Elas estabelecem o modo ao ocuparmos determinados
socialmente aceito de satisfazer determinadas necessidades e status ou posições em
cada instituição a qual
realizar certas atividades (NOVA, 2000). Assim, elas podem pertencemos.
ser vistas como um tipo especial de estrutura social que tem por
função responder aos problemas humanos básicos sejam eles sociais
ou biológicos, tais como garantir alimentação, abrigo, proteger e
socializar as crianças, isto é, para manter efetivamente organizada
a sociedade, através da regulamentação e do controle da população
(TURNER, 2000).

Nesse sentido, podemos dizer que as instituições são componentes


que garantem estabilidade às sociedades. Para Nova (2000, p. 16):
As instituições são criadas para resolver os proble-
mas que cercam os homens, mas acabam ganhando
vida própria ao serem impregnadas de símbolos
culturais.

As instituições tendem a se multiplicar com a complexidade da vida


moderna. Além disso, elas são inter-relacionadas.

Cabe frisar que, como salientou Nova (2000), quando falamos em


instituições não estamos nos referindo a algo concreto, observável
diretamente na sociedade. O termo instituição é uma construção
teórica. O que observamos no real são grupos (primários como
família, ou secundário como escola) que congregam coletividades
reais. Nesse sentido, não observamos a família brasileira enquanto
instituição, mas como uma amostra estatisticamente significativa
de famílias que nos possibilita identificarmos características dos
padrões culturais (valores, crenças, normas, comportamentos
padronizados) dominantes na organização das relações de
parentesco no Brasil.

Você pode se perguntar agora: toda família organiza-se da mesma


forma como a identificada enquanto família brasileira? A resposta
é não. Algumas instituições são universais, existem em termos
evidenciais em todos os tipos de organização social, ou seja, em
todo tipo de sociedade. Essas instituições universais, chamadas de
axiais, segundo Nova (2000, p. 161), “são centrais para a solução
de um conjunto de atividades relativas à satisfação de necessidades
humanas particulares, tais como família, religião”.

Apesar dessas instituições serem universais, isto é, estarem


presentes em todas as formas de sociedade, sejam elas urbanas/
industriais, rurais/agrárias, modernas ou tribais, elas variam na

110 FILOSOFIA
forma de apresentação de sociedade para sociedade, por exemplo,
a composição familiar da sociedade brasileira envolvente não é a
mesma da família indígena timbira, que por sua vez pode variar de
povo para povo, mas, no geral, a família timbira apresenta:
Timbira é o nome que de-
signa um conjunto de po-
“casamento monogâmico, implicando na transfer- vos: Apanyekrá, Apinayé,
ência do marido para casa onde vive a mulher. A Canela, Gavião do Oeste,
Krahó, Krinkatí, Pukobyê.
união se torna estável depois do nascimento do Outras etnias timbira já
primeiro filho. Mas há ampla liberdade sexual para não se apresentam como
solteiros e casados. Casas contíguas oriundas do grupos autônomos: os
poucos numerosos Krenyê
desdobramento de uma casa anterior são, por força e Kukoikateyê vivem
da regra de residência pós-marital, relacionadas entre os Tembé e Gua-
jajara, que falam uma
entre si por linha feminina e formam uma unidade língua tupi-guarani (Te-
social. As pessoas nascidas num mesmo segmento netehara); os Kenkateyê,
de casas desse tipo não casam entre si. Tais seg- Krepumkateyê, Kroreka-
mekhrá, Põrekamekrá,
mentos são, pois, exogâmicos” (http://www.ama- Txokamekrá, recolheram-
zoniamaranhense.com.br/paggaviao3.html). se e se dissolveram entre
alguns dos sete povos
timbira inicialmente
Considerando que as instituições enquanto tais são abstrações teóricas, enumerados. Os grupos
timbira se localizam no
iremos apresentar algumas das principais instituições sociais. sul do Maranhão, leste do
Pará e norte do Tocan-
tins. (http://www.amazo-
niamaranhense.com.br/
paggaviao.html).

FAMÍLIA E PARENTESCO

A família é a primeira instituição social duradoura na história


humana. Ela refere-se, segundo Nova (2000, p. 164), “à
orientação e à regulamentação das relações de parentesco,
da procriação, das relações sexuais e da transmissão dos
componentes intermentais básicos da sociedade”. Ela é “um
grupo de pessoas unidas diretamente por laços de parentesco,
no qual os adultos assumem a responsabilidade de cuidar das
crianças” (GIDDENS, 2000, p. 176). Por laços de parentesco
entendemos que são “relações entre indivíduos estabelecidas
através do casamento ou por meio de linhas de descendência
que ligam familiares consanguíneos” (idem). Enquanto que
o casamento pode ser entendido como uma união sexual e
econômica entre dois indivíduos adultos, reconhecida e aceita
socialmente. Assim sendo, numa perspectiva funcionalista,
podemos dizer, segundo Turner (2000, p. 137), que “as relações

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 111


de família e parentesco preenchem certas condições básicas de
sobrevivência”, isto é, têm por função garantir a manutenção
do grupo social.
Nepotismo (do latim
nepos, neto ou As relações de parentesco sempre foram de fundamental
descendente) é o termo
utilizado para designar o
importância para o funcionamento de outras instituições antigas
favorecimento de parentes (economia, educação, religião, política, governo), embora
em detrimento de
pessoas mais qualificadas, esse vínculo entre elas tenha se afrouxado ao longo dos anos,
especialmente no que diz
respeito à nomeação ou principalmente nas sociedades ocidentais, pois em algumas
elevação de cargos.
culturas mais tradicionais, como a indiana, ele ainda se mantém
Originalmente a
palavra aplicava-se enraizado e, no caso do Brasil, apesar da nossa legislação vetar,
exclusivamente ao âmbito
das relações do papa
por exemplo, o nepotismo, isto é, prática de empregar no
com seus parentes, mas funcionalismo público pessoas com vínculo de parentesco, essa
atualmente é utilizado
como sinônimo da ação ainda persiste.
concessão de privilégios
ou cargos a parentes
no funcionalismo
público. Distingue-se
do favoritismo simples,
que não implica Formas de organização das famílias
relações familiares com
o favorecido (http://
pt.wikipedia.org/wiki/
Nepotismo).
As formas de organização das famílias variam de sociedade
para sociedade, refletindo as necessidades de sobrevivência
particulares de cada uma. As regras para o casamento (enquanto
criador e sustentáculo da família e dos sistemas de parentesco)
são determinadas por normas culturais que definem quando e
com quem casar. A escolha do parceiro nem sempre foi livre e
em algumas sociedades ainda há situações de imposição.

Em alguns sistemas de parentesco o casamento deve ser


exogâmico, isto é, ocorrer fora da unidade familiar ou da
comunidade, já em outros o que vale é a endogamia, isto
é, casamento dentro do grupo específico. No geral as regras
que regem o casamento passam pelo filtro da “proibição do
incesto”, isto é, interdição do casamento (ou relação sexual)
entre pessoas com determinado grau de parentesco. Observe
que a interdição se dá baseada na relação de parentesco e não
na consanguinidade, portanto, a explicação para a proibição do
incesto não pode ser sustentada apenas com base nos problemas
genéticos que podem surgir.

112 FILOSOFIA
Segundo Lobato (1999, p. 15 ):
A prevalência dos laços de parentesco sobre os de
consanguinidade, na instituição da proibição do
incesto, aparece claramente em sociedades cujo
sistema de parentesco é unilinear. Com efeito,
nessas sociedades a relação tida como incestuosa
atinge certos parentes, os primos paralelos (filhos
de irmãos do mesmo sexo), que, do ponto de vista
da consanguinidade, são idênticos aos primos
cruzados (filhos de irmãos de sexo diferente), sobre
cujo relacionamento não há nenhuma interdição,
uma vez que, de acordo com o sistema unilinear,
eles não são parentes entre si, já que cada um deles
pertence a um grupo de parentesco diferente.

Para uma discussão mais aprofundada sobre o tabu do incesto veja


Claude Lévi-Strauss (1970 - 1976). Ele foi um antropólogo, profes-
sor e filósofo francês. É considerado o fundador da antropologia
estruturalista e o seu livro As estruturas elementares do paren-
tesco publicado em 1949 é um dos mais importantes estudos sobre
família já realizado. O título é uma paráfrase ao título do livro de
Émile Durkheim, As formas elementares da vida religiosa (http://
pt.wikipedia.org/wiki/Claude_L%C3%A9vi-Strauss). Outra referên-
cia relevante é o livro A origem da família, propriedade privada e
Estado, de Engels, em que se discute o papel da propriedade priva-
da nos processo de definição da família enquanto instituição social,
e o surgimento da família nuclear burguesa.

Assim, uma explicação pautada na biologia não se sustenta. Também


não se sustenta uma explicação pautada na psicologia que nos
levaria a pensar numa repulsa natural do desejo por determinadas Socialização é a assimilação
de hábitos característicos
categorias de parentes. Se houve essa naturalização não seria do grupo social ao qual
pertencemos. É todo o
necessário a sociedade estabelecer a norma da proibição. Esta se processo através do qual
um indivíduo se torna
torna naturalizada por meio do processo de socialização. membro funcional de uma
comunidade, assimilando a
Segundo Turner (2000, p.138) as regras de cultura que lhe é própria.
É um processo contínuo que
parentesco são importantes também para nunca se dá por terminado.
Socialização é o processo
determinar as regras de descendência, através do qual o indivíduo
se integra no grupo em
isto é, determinar o lado da família que que nasceu adquirindo
os seus hábitos e valores
deve ser considerado o mais importante. característicos. A socialização
Neste caso há três possibilidades: 1) é, portanto, um processo
Figura 22: a família nuclear
fundamental, não apenas
Fonte: http://3.bp.blogspot. descendência patriarcal que se pauta na para a integração do indivíduo
com/_sgBxk4viPT0/SNKkjSXBJZI/ em sua sociedade, mas,
AAAAAAAAABU/pZrjjV2F3zc/
figura masculina, portanto, é a família do também, para a continuidade
s1600-h/familia.jpg dos sistemas sociais.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 113


pai a mais importante; 2) descendência matriarcal que é pautada
na figura da mulher, sendo os parentes homens das mulheres os
principais transmissores da propriedade e da autoridade; e 3)
descendência bilateral, em que ambos os lados tem a mesma
importância.

Outra forma de organização das famílias passa pela composição


de seus membros. Dessa maneira, tem-se a chamada família
nuclear, composta por dois adultos (figura paterna
e materna), vivendo juntamente com seus filhos.
Essa é a típica família urbano-industrial. Por outro
lado, tem-se a chamada família extensa, composta
por duas ou mais famílias nucleares ligadas por
consanguinidade, casamento ou agregação,
geralmente avós, tios, irmãos etc. Como exemplo

Figura 23: a família extensa


desse tipo de composição familiar tem-se as famílias
Fonte: http://acertodecontas.blog.br/wp-content/ tradicionais agrárias.
uploads/2008/09/j-b-debret.jpg

A composição numérica das famílias geralmente dá-se baseada


na necessidade de sobrevivência do grupo, isto é, em muitas
sociedades as famílias extensas são unidades de consumo e
produção, necessitando, portanto, da força de trabalho de seus
membros. Esse é o caso, por exemplo, das famílias extensas no
meio rural. Já as famílias nucleares, predominantes nos centros
urbanos, são apenas unidades de consumo e o seu tamanho ideal,
portanto, deve ser pequeno.

A família nuclear é considerada pela teoria funcionalista como o


modelo organizacional particularmente apropriado para garantir
a sobrevivência da sociedade, uma vez que a sua universalidade
e difusão são evidências “da sua capacidade de fornecer a base
para a regulação da atividade sexual, a cooperação econômica,
a reprodução, a socialização e o apoio emocional” (MURDOCK;
PARSONS apud BRYM, 2006, p. 360).

A família nuclear pode ser expandida “horizontalmente” através


da poligamia ao acrescentar mais de um cônjuge à família. A
Poligamia. União poligamia ainda é legalmente permitida em alguns países da
conjugal de um idivíduo
com vários outros, África e da Ásia, no Brasil ela é permitida pela Constituição
simultaneamente

114 FILOSOFIA
de 1988 aos grupos indígenas devido o reconhecimento da
autonomia de suas regras de parentesco. Porém, a poligamia,
onde é aceita, nem sempre é permitida a todos os membros da
sociedade, até mesmo entre alguns grupos indígenas brasileiros
ela é um privilégio restrito a determinados indivíduos que se
encontram no topo da hierarquia social, como, por exemplo,
entre os tupinambás, em que a maioria dos homens só possui
uma única esposa, mas os grandes guerreiros e caciques podem
usufruir da poligamia (RAMINELLI apud BRYM, 2006, p. 360). Cabe
ressaltar que o fator econômico é importantíssimo para a prática
da poligamia onde ela é aceita, pois na maioria das sociedades
poligâmicas as famílias tendem à monogamia (casamento com
um único cônjuge) devido à falta de condições materiais para o
sustento de muitas mulheres e filhos, no caso da poliginia. Não
podemos esquecer que existe também a poliandria, isto é, o
casamento de uma mulher com mais de um marido, embora seja
muito menos comum.

Cabe ressaltar que a família nuclear poligâmica não se confunde


com a família extensa, na medida em que esta se expande
“verticalmente”, acrescentando à família nuclear membros de
outras gerações.

O desenvolvimento da vida familiar

Segundo Giddens (2002, p. 178), o sociólogo e historiador Lawrence


Stone realizou um estudo sobre as mudanças na vida familiar,
percorrendo um período de trezentos anos, indo desde as formas
medievais europeias até as famílias modernas. Com esse estudo o
autor distinguiu três fases de desenvolvimento da família: do início
do século XVI a estrutura familiar predominante era a nuclear
que vivia numa habitação modesta e inserida em relacionamentos
comunitários, incluindo outros parentes. Segundo Stones (apud
GIDDENS), nessa época, as pessoas não obtinham intimidades
emocionais na vida familiar, nem o sexo no casamento era visto como
fonte de prazer, mas apenas como necessário para a procriação.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 115


Também não havia liberdade de escolha do parceiro, tudo estava
atrelado a interesses diversos, fossem dos pais, parentes ou da
própria comunidade. Stones entendia a família dessa época como
“uma instituição flexível, discreta, impassível e autoritária, era,
ainda, efêmera devido a morte prematura dos maridos ou esposas”.

Do início do século XVII até o início do século XVIII predominou a


família nuclear autônoma dos laços de parentesco e da comunidade
local, começando a enfatizar o amor conjugal e paternal.

Na última fase identificada por Stones, segundo Giddens (2002,


p. 178), desenvolveu-se gradualmente o modelo de sistema
familiar que se tornou típico nos países ocidentais. Nesse tipo de
organização familiar os grupos são formados por laços emocionais,
a partir de escolhas pessoais guiadas por atração sexual ou pelo
amor romântico que serão exaltados no seio do casamento e não
em relações extraconjugais. As famílias possuem alto nível de
privacidade e preocupam-se com a criação e educação dos filhos.

Mudanças nos padrões familiares

Apesar dessa identificação de formas de organização familiar


realizada por Stones, existe uma diversidade de arranjos familiares
no mundo. Alguns sociólogos funcionalistas, como Popenoe (apud,
BRYM, 2006, p. 359) “acreditam na redução da família com base
em uniões formais entre homens e mulheres e no aumento da
incidência da mãe que trabalha fora como o responsável por muito
das “patologias sociais”. Já outro grupo de sociólogos, influenciado
pela teoria do conflito e pela teoria feminista, argumenta que não
se pode falar em a família (no singular), pois esta instituição social
não assume só uma forma. As famílias se estruturam, segundo
eles, conforme as exigências das pressões sociais, além disso,
esses novos arranjos não levam necessariamente a deterioração
da qualidade de vida das pessoas. Muito pelo contrário, pode
contribuir para melhorar a vida de homens, mulheres e crianças.
Assim sendo, a família nuclear tradicional tende a dividir espaço
com outras formas de arranjos familiares.

116 FILOSOFIA
Um exemplo desses novos arranjos é o casamento entre pessoas do
mesmo sexo. Atualmente oito países (Holanda, Bélgica, Canadá,
Hungria, Dinamarca, Noruega, Suécia, França, Islândia, Espanha e
Alemanha) reconhecem a união entre homossexuais, concedendo-lhes
os direitos de um casamento legal. Canadá, Holanda e Bélgica foram os
três primeiros a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

As famílias homossexuais e heterossexuais diferem, segundo


Brym (2006), quanto ao grau de satisfação conjugal quando têm
filhos, isto é, casais de lésbicas com filhos têm mais satisfação
conjugal do que os casais que não os têm, enquanto que nos casais
heterossexuais ocorre o contrário, segundo Koepke e Moran (apud
BRYN, 2006, p. 383).

Outra diferença apontada pelos autores é o tempo de dedicação


das parceiras das mães lésbicas com relação aos parceiros das mães
heterossexuais, as primeiras dedicam mais tempo cuidando dos fi-
lhos do que os segundos.

Além disso, segundo Zinn e Eitzen (apud BRYN, 2006, p. 384),


[...] há uma tendência dos casais homossexuais a
serem mais igualitários e dividirem com mais igual-
dade as decisões e as tarefas domésticas, igualdade
essa propiciada pelo fato dessas pessoas terem a
mesma socialização de gênero e tenderem a ter
renda aproximada.

Figura 24: novos arranjos matrimoniais Figura 25


Fonte: http://1.bp.blogspot.com/_bpRreEwps_g/SaQrLi08z4I/AAAAAAAAB0M/ Fonte: http://robotactionboy.
XjaFI6RTvB8/S660/euaceito.jpg blogdns.org/william/gaysimpsons.jpg

Outro exemplo desses novos arranjos familiares são as famílias


chefiadas por mulheres. As famílias que têm a mulher como
o provedor e, consequentemente, o chefe, têm aumentado
estatisticamente a cada ano. As causas são variadas, mas podemos

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 117


destacar o movimento de emancipação feminina, cada vez mais as
mulheres têm conseguido independência financeira (seja ela por
necessidade ou por satisfação pessoal via qualificação profissional),
além da necessidade de assumir a responsabilidade da família
quando a relação conjugal acaba e o marido desaparece, ou não
consegue sustentar os filhos dessa relação. Assim, essas mulheres
até ganharam um nome particular, são as chamadas “Pães”.

Segundo dados do IBGE, de 1996 a 2006:


[...] o número de mulheres que se declararam
como a pessoa de referência da família aumentou
de 10,3 milhões para 18,5 milhões no Brasil. A taxa
de ocupação dos filhos foi maior nas famílias chefi-
adas por mulheres: 44,1%, contra 40,3% nas famíli-
as chefiadas por homens. Essas são algumas das
conclusões da Síntese dos Indicadores Sociais 2007,
elaborada na maior parte com os dados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).

Os resultados da PNAD (2006) mostraram ainda a tendência já verifi-


cada nos últimos 10 anos – crescimento da proporção de pessoas que
vivem sozinhas, dos casais sem filhos, das mulheres sem cônjuge e com
filhos na chefia das famílias e, também, uma redução da proporção dos
casais com filhos. Esse fenômeno é fruto de um conjunto de fatores,
tais como: o aumento da expectativa de vida, a redução da fecundi-
dade das mulheres e a redução das taxas de mortalidade.

Gráfico 4.1 - Distribuição dos arranjos familiares residentes em domicílios


particulares, segundo o tipo de arranjo familiar - Brasil - 1996/2006
%
57,4

49,4

18,1
15,6 15,8
13,1
10,7
8,0
5,4 6,0
0,3 0,3

1996 (1) 2006


Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1996/2006.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.

118 FILOSOFIA
Segundo a pesquisa do IBGE:
[...] as famílias do tipo monoparental feminino se
destacam nas áreas urbanas e metropolitanas, onde
os aspectos culturais propiciam maior liberdade
de comportamento. No conjunto do País, a mé-
dia, em 2006, foi de 18,1%, mostrando crescimento
de quase 3 pontos percentuais em relação a 1996
(15,8%). Nas Regiões Metropolitanas, a proporção
variou de 16,6%, em Curitiba, a 25,5%, em Recife.

Por outro lado, é surpreendente observar que são elevados os


percentuais de arranjos com chefia feminina onde há presença
de cônjuge. A média nacional foi de 20,7%, enquanto nas Regiões
Metropolitanas os valores variaram entre 17,7%, na do Rio de Janeiro,
a 30,5%, na de Fortaleza. Em geral, a representação da pessoa de
referência recai sobre os homens. Duas principais hipóteses podem
ser formuladas com vistas a explicar o aumento continuado desse
tipo de arranjo no momento atual: um aumento de “poder” por
Figura 26: Mulher chefe de
parte das mulheres em suas famílias ou o desemprego dos homens. família
Fonte: http://www.usp.br/
espacoaberto/arquivo/2007/
Assim, a sustentabilidade emocional e, mais recentemente, finan- espaco85nov/ilustras/capa04.jpg

ceira das famílias tem recaído sobre a mulher. Esta tem se sobre-
carregado para cumprir com as novas demandas que a sociedade
atual tem lhe imposto.

A questão da sustentabilidade material das pessoas ronda os


homens desde sempre. Numa perspectiva funcionalista, se
não houver a garantia da comida as pessoas e a sociedade não
sobrevivem. Dessa forma, a economia ocupa um lugar de destaque
na vida dos seres humanos e por isso essa instituição tem uma
profunda conexão com todas as outras.

ECONOMIA

A economia é a instituição social que organiza a produção, a


distribuição e a circulação de bens e serviços.

As atividades econômicas são institucionalizadas à medida que


são explicadas por crenças, legitimadas por valores e reguladas

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 119


por normas. Assim, em todas as sociedades, para a produção, a
circulação e a troca de bens escassos, existem crenças, valores,
normas posições e papéis determinados.

Máximas de Bejanmini

Lembre-se que o tempo é dinheiro. Para aquele que


pode ganhar dez shillings por dia pelo seu trabalho
e vai passear ou fica ocioso metade do dia, apesar
de não gastar mais que seis pence em sua vadiagem
ou diversão, não deve ser computada apenas essa
despesa; ele gastou, ou melhor, jogou fora. mais
cinco shillings. ‘Lembre-se que o crédito é dinheiro.
Se um homem deixa seu dinheiro em minhas mãos
por mais tempo que o devido, está me dando os
juros, ou tudo o que eu possa fazer com ele durante
esse tempo’. Isto atinge somas consideráveis quando
alguém goza de bom e amplo crédito, e faz dele
bom uso. “Lembre-se que o dinheiro é de natureza
prolífica e geradora” (WEBER, 2001, p. 178).

Todas as economias, segundo Turner (2000), funcionam pautadas


na tecnologia (conhecimento sobre como controlar e transformar
o meio ambiente), no trabalho (força humana dispendida nas
atividades econômicas) e no capital (em forma de instrumentos
de produção, bem como, em forma de dinheiro). Para entender
essa tríade, vejamos a evolução da economia ao longo da história
econômica.

A evolução do trabalho ao longo da história humana marca a


forma de produção da subsistência e como vivemos a nossa vida.
Conforme Marx e Engels, é por meio do trabalho que o ser humano
faz-se humano, pois somente por esse meio os indivíduos podem
satisfazer suas necessidades e, assim, deixarem de ser alienados
(ver capítulo 2). “A história dita universal não é outra coisa que
a geração do homem pelo trabalho humano e o devir da natureza
para o homem” (MARX,crítica).

Tomando como base a citação acima, podemos identificar grandes


momentos na evolução das técnicas de trabalho e seu impacto
nas revoluções produtivas (reestruturações produtivas). Três

120 FILOSOFIA
revoluções são identificadas como fundamentais nesse processo: a
revolução agrícola, depois a revolução industrial e, por último, a
revolução no setor de serviços.

O desenvolvimento da agricultura

Até por volta de 10 mil anos atrás todos os seres humanos


eram nômades, vivendo em tribos que foram se fixando na
terra gradativamente com a criação de animais e o cultivo
da agricultura, utilizando para tanto ferramentas manuais
A horticultura difere da
simples. Somente há 5 mil anos os homens, já agricultores, agricultura por não utilizar
fontes não-humanas de
inventaram o arado e, somando-o aos animais de grande porte, energia, como trator,
escavadeira, motoserra etc.
aumentaram substancialmente as áreas cultivadas (BRYM, 2006)
Assim, sociedades horticultoras surgiram como dominadoras de
conhecimentos sobre sementes, plantas e cultivos (tecnologia);
pás, amoladores e outros incrementos manuais (capital); plantio,
colheita (trabalho); e organização por parentesco (empresarial).

Com o advento e dominação das técnicas agrícolas o homem Técnica: sequência de


operações definidas de atos
sedendariza-se e possibilita o estabelecimento fixo de sociedade coordenados, que chegam
a uma transformação dese-
em regiões próximas aos grandes rios, surgem daí as primeiras jável das coisas que nos ro-
civilizações nascidas às margens da Mesopotâmia e meso-américa. deiam, quer dizer, do meio
inicial. Representa aquilo
As civilizações mesopotâmicas, assim como as pré-colombianas, que os homens chamam
de processos técnicos, ou
desenvolveram técnicas que conjugavam o esforço e trabalho mais simplesmente técnicas
(DUCASSÉ, 1955).
humano para dominação da voracidade da natureza e uso desta para
satisfação das necessidades de subsistência. Desse modo, as técnicas
tornaram-se fatores elementares de desenvolvimento da sociedade.

Podemos dizer que a invenção da charrua (arado primitivo),


as técnicas de barragens, aterros e a canalização de rios na
Mesopotâmia e nas civilizações pré-colombianas deram início ao
primeiro grande processo de reestruturação produtiva, em que a
humanidade passa de uma economia de coleta e trocas diretas,
para uma economia de produção agrícola e sedentarizada.

É importante destacar que a partir das técnicas agrícolas em


expansão ocorre o fenômeno de utilização de força motriz

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 121


de animais e escravos para arar a terra e o gerenciamento de
trabalhadores através da divisão de tarefas para as grandes
construções, como os canais de irrigação, os canais de transporte
(Egito, Astecas, Maias e Incas). Esses se constituíram os primeiros
processos de gerenciamento de mão de obra e produção.

No período medieval as warcrafts, ou artes de produção de armas,


serão outro ponto culminante na evolução das técnicas (uso
de metais), juntamente com a implementação de moinhos que
utilizavam as forças eólicas e hidráulicas. O advento da sociedade
feudal e novas relações de trabalho (servil) e a conjugação de
engenhocas com o uso de forças da natureza vai elevar ainda mais
o nível produtivo na Europa.

Assim, a agricultura representou uma ruptura tecnológica


significante em relação à horticultura por utilizar, além da força
animal, a energia da natureza (água e vento) nos processos
produtivos. Essa ruptura, segundo Turner (2000), estimulou o
desenvolvimento tecnológico posterior como o surgimento da
metalurgia e a fundição. Também houve um incremento do dinheiro,
das ferramentas de metal, das rodovias etc. O trabalho ganhou em
especialização e o empresariado mudou, deixando a vila e a família
nuclear como forças de organização mais importantes. Essas foram
suplantadas e substituídas pelos mercados, estruturas políticas
feudais, casas mercantis, associações, ou seja, organizações que
germinaram na moderna empresa.

É importante destacar que no final da Idade Média há um amplo


ressurgimento do comércio com abertura de rotas comerciais,
comércio com as Índias, surgimento de feiras (burgos), aumento
da produção artesanal (corporações de ofício). À proporção que o
sistema feudal entra em crise pela explosão populacional da baixa
idade média, conjugada com a fome e a peste, devido à crescente
decadência da produtividade, emerge o sistema econômico baseado
na concepção burguesa de produção e trabalho (capitalismo).

Inicialmente, os artesãos unem-se em corporações de ofício e


organizam se em oficinas de manufatura (trabalho manual dividido
em etapas de produção, o que Marx chamou de modo de produção

122 FILOSOFIA
manufatureiro ou pré-capitalista). Com transformações estruturais
na técnica, ou seja, a invenção da máquina conjugada à divisão
do trabalho já operacionalizada nas manufaturas, surge, conforme
Marx e Smith, a maquinofatura.

A invenção do tear mecânico (na Inglaterra), das ferrovias, da


máquina a vapor e mais tarde do motor à explosão, vão aumentar
a complexidade das relações de trabalho e aumentar o nível de
produtividade na economia, agora sim, capitalista industrial. É
a partir das revoluções industriais que o capitalismo torna-se o
sistema que aplica a técnica conjugada à ciência e produz um modo
de produção preponderantemente tecnológico e tecnocrático
(DUCASSÉ, 1955).

As relações de trabalho deixam de ser entre o senhor e o servo, entre


o senhor e o escravo, e passam a ser entre o patrão e o empregado.
A propriedade deixa de ser servil e passa a ser privada, daí surgem
as concepções político-econômicas denominadas liberais (nascidas
na Inglaterra). A economia deixa de ser predominantemente rural
e passa para a economia urbano-industrial.

O desenvolvimento da indústria

A industrialização é o processo de subordinar o poder inanimado


das máquinas a serviço do trabalho em uma fábrica (TURNER,
2000). Esse processo foi iniciado há algumas centenas de anos ,
mas transformou o mundo. Nas economias industriais recorre-se
à tecnologia (em constante aperfeiçoamento) para transformar
e controlar o meio ambiente, a formação de capital envolve
dinheiro e várias formas de acumulá-lo para investir na produção,
o trabalho cada vez mais se especializa e a troca de bens se dá no
mercado, incluindo o trabalho que é vendido como qualquer outra
mercadoria.

Com o estabelecimento da economia industrial, não só surgem as


mercadorias, mas o próprio trabalho humano torna-se mercadoria.
Nesses termos, Marx define que a sociedade capitalista é, antes

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 123


de tudo, guiada pela relação de troca e aplicação de trabalho;
o trabalho produz as mercadorias e é vendido como força de
trabalho, ou embutido na mercadoria como fator de produção.
Desse modo, a economia capitalista é um sistema econômico
baseado no capital/trabalho. O capital é o valor econômico que é
investido na produção ou em negócios financeiros.

TRABALHO MOEDA

VALOR DE TROCA
MERCADORIA

VALOR DE USO

A economia capitalista é caracterizada por seu um sistema


baseado na indústria, no trabalho assalariado e em uma economia
de mercado. Na economia de mercado a propriedade dos fatores
e meios de produção são privados e a forma reguladora é o preço
definido pela oferta e procura. O capitalismo visa maximizar os
lucros através de investimentos e produção.

Como já vimos no CAPITULO 1 deste livro, lembremos do processo


de surgimento do capitalismo e suas fundamentas características:
advento da propriedade privada, trabalho assalariado, produção
urbano-industrial e aplicação da ciência em prol do capital.
Estamos falando da era da grande indústria fordista que intensifica
a aplicação de conhecimento científico na produção em massa.

No início até meados do século XX a economia industrial já


estava consolidado com o paradigma produtivo denominado
de Fordista, uma alusão ao nome de Henry Ford (1863-1947)
que aplicou na sua fábrica um conjunto de procedimentos que
visavam o aumento da produção com redução de custos. Para
isso, ele tomou as ideias de Frederich Taylor (1856-1915), um
engenheiro-consultor de gestão americano, centradas na noção
de administração científica.

124 FILOSOFIA
A Administração Científica formulada por Talyor para, inicialmente,
o campo industrial, mas que foi adotada nos demais setores da
economia, como o de prestação de serviços, comércio etc., tinha
como princípios fundamentais:

1 – Separação programada da concepção/planejamento das


tarefas de execução, isto é, separação entre trabalho
intelectual (que caberia à gerência pensar o processo
produtivo) e trabalho manual (que caberia ao trabalhador
apenas executar o que a gerência determinasse). Nesse
sentido, as iniciativas e o trabalho intelectual foram
banidos do “chão de fábrica”, eles cabiam apenas à
administração superior; segundo Taylor, “os trabalhadores
não são pagos para pensar, mas para executar”.

2 – Intensificação da divisão do trabalho, através do estudo dos


tempos e movimentos. O administrador deve juntar todo
o conhecimento tradicional adquirido pelo trabalhador
e classificar, tabular e reduzir esse saber a regras, leis e
fórmulas, devolvendo-as ao trabalhador como “the one best
way” (a melhor maneira de se executar uma operação). O
objetivo era encontrar maneiras mais rápidas e eficientes
para executar as tarefas, eliminando o chamado tempo
morto. Cada tarefa corresponde a um posto de trabalho
e graças a um criterioso processo de recrutamento era
possível destacar-se o operário mais adequado para ocupá-
lo (the right men in the rigth place). No período anterior o
trabalhador escolhia seu próprio trabalho e treinava-se a si
mesmo nas corporações de ofício, por exemplo, mas a partir
de então ele deveria ser selecionado “cientificamente”,
depois treinado, ensinado e aperfeiçoado nas tarefas que
lhes foram atribuídas.

Seguindo a mesma linha de Taylor, no que se refere à organização


e sistematização da produção e do trabalho, Ford apropriou-se
dessa forma de gestão e radicalizou-a.

Ele articulou as ideias de Taylor da separação entre concepção/


execução a fragmentação/rotinização/esvaziamento das tarefas
e implementou-as em 1913, na sua fábrica de automóveis em
Detroit, associando-as à noção de um homem/uma tarefa, com

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 125


especialização desqualificante atuando numa linha de montagem
acoplada à uma esteira rolante, ao controle do tempo de execução
das tarefas estritamente orientadas por normas operacionais em
um processo onde a disciplina se torna o eixo central da qualificação
requerida.

A adoção da linha de montagem numa esteira rolante, além de


eliminar o tempo morto por evitar que o trabalhador tivesse que
se deslocar, mantendo, assim, o fluxo contínuo e progressivo da
produção, aumentou a produtividade do trabalho e do volume
produzido, além de garantir a cadência do trabalho, passando a
regular mecânica e externamente o trabalhador.

Com esse novo formato de processo de trabalho e de organização


da produção houve um aumento da produtividade industrial, com
aumento de salários reais, aumentando, assim, o consumo em
massa.

Ford acreditava que para a produção em massa (fruto do aumento


da produtividade assegurada pela sua forma de organização da
produção) era necessário um consumo em massa, um novo sistema
de reprodução da força de trabalho que lhe garantisse, pelo
menos em parte, ter acesso aos bens produzidos. Assim, caberia
à ação do poder corporativo, através do pagamento de salários e
da redução da jornada de trabalho, propiciar aos trabalhadores
tempo e renda para consumir os produtos que as corporações
fabricavam em massa.

Assim, Ford aumentou o salário dos seus operários no início da


grande depressão de 1929, acreditando poder aumentar a demanda
efetiva e, com isso, recuperar o mercado e restaurar a confiança
da comunidade empresarial.

Essa estratégia, somada com a intervenção estatal que adotou


a política keneysiana do pleno emprego e o estabelecimento do
Welfare State, foi a saída para a crise econômica de 1929. Com
essa aliança entre capital, trabalho e Estado o mundo capitalista
vivenciou um período de expansão e prosperidade que foi de
1945 a 1973, chamado pela literatura dos trinta anos gloriosos do
capitalismo.

126 FILOSOFIA
O período TAYLORISTA-FORDISTA pode ser também sintetizado
como a era da grande indústria pesada, ou era do automóvel e
do pleno emprego. A economia exigia um trabalho especializado,
pouco criativo e bastante rígido. Em meados da década de 70,
o modelo da grande indústria começa a entrar em crise devido a
crise fiscal do Estado e constantes super-produções. A economia
da grande indústria parece ter que se re-inventar, fato que será
proporcionado pelo novo modelo econômico produtivo em gestação
e ampliação: o toyotismo.

O desenvolvimento da economia dos serviços

O regime de acumulação fordista, apesar de ter sido o responsável


em grande parte pela consolidação e expansão do capitalismo
enquanto sistema hegemônico, a partir da década de 1960,
começou a perder o fôlego.

Esse paradigma da produção em massa, verticalizada de produtos


padronizados, foi tornando-se obsoleto na medida em que os
mercados consumidores foram ficando saturados (entrada do
Japão nessa busca de mercados consumidores e dos países em
desenvolvimento).

Somando-se a isto, a partir dos anos de 1970, veio a crise do modelo


econômico do pós-guerra pautado nas políticas de um Estado
de bem-estar social na Europa e do new-deal norte americano,
levando o mundo capitalista a uma longa e profunda recessão.
O estado já não conseguia cumprir suas políticas assistenciais e
havia, por outro lado, uma enérgica reação dos trabalhadores
fortemente organizados em sindicatos.

Esse novo padrão, denominado de acumulação flexível, foi pos-


sibilitado, sobretudo, pela adoção de inovações tecnológicas (ci-
bernética, biotecnologia, engenharia genética, microeletrônica,
informática) chamadas de Terceira Revolução Industrial e foi ins-
pirado no modelo japonês de organização do trabalho, denomina-
do de Toyotismo.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 127


Esse modelo tem como elementos fundamentais: a economia de
escopo, ou seja, produção em lotes menores e mais diversificação
de modelos, totalmente voltada para as exigências dos mercados
consumidores; as equipes de trabalho (também chamadas por
Mercados são relações
sociais que regulam a troca grupos de trabalho ou células de produção) que passaram a
de bens e serviços. Em
um mercado os preços são ser autônomas para desenvolverem seu programa de trabalho
estabelecidos com base
na abundância dos bens obedecendo à meta fixada pela gerência sob os aspectos da
e serviços (oferta) e em
quanto eles são requeridos
qualidade e quantidade, sendo o trabalhador um elemento
(demanda). fundamental que tem valorizado o seu saber fazer; saber fazer
este cada vez mais ampliado, tornando o trabalhador num ser
polivalente.

Assim, o modelo toyotista de organização do trabalho e da


produção tem seu fundamento centrado na noção de flexibilidade
que se opõe diretamente à rigidez do modelo fordista.

Estamos agora diante de um paradigma que se centra na


sociedade dos serviços, ou seja, a economia que antes
se preocupava predominantemente com o aumento de
produtividade, agora se volta para a invenção de serviços como
mercadorias de alto valor agregado e de grande importância
para agregar valores na produção. Surge daí uma produção
flexibilizada e centrada na vontade e desejo do cliente de
maneira personalizada (serviço Vip para agregação de valor
ao produto). Atualmente, estamos no que os economistas
e sociólogos chamam de economia de consumo de serviços
altamente qualificados e de alta qualidade, como isso temos:
os softwares de computador, os serviços de telefonia celular,
servidores e provedores de internet, a expansão de franquias
internacionais (HP, Mac Donald´s etc).

Basta você refletir e se perguntar: compro mais mercadorias ou


pago serviços? Gasto mais com as contas de celular ou com a
compra do aparelho?

Figura 27:
Fonte: http://farm1.static.flickr.
com/1/329966_f1e7e1eac1_m.jpg

128 FILOSOFIA
RELIGIÃO

Diz respeito às relações que os humanos estabelecem com o


domínio metaempírico (o intangível, o sobrenatural) da realidade,
ou seja, com o que está para além da possibilidade de observação.
A religião é uma instituição social que estabelece concepções,
princípios éticos, normas de modo geral, formas de interpretar a
realidade.

Conforme Emile Durkheim, em As formas elementares da vida


religiosa, a religião é uma instituição que estabelece a moral na
sociedade, que fundamenta cosmovisões e assim dá sentido à vida
de uma dada comunidade. Nesse sentido, o autor estabelece que
não há religiões falsas, mas sim religiões diferenciadas, mas, o que
lhes é comum, seria a produção de representações e referencias
sócio-simbólicas que dão sentido à vida em sociedade.

O principal objetivo da instituição religiosa é explicar os fenômenos


existências humanos tentando responder: de onde viemos, para
onde vamos e o que há depois da morte.

Voltando a Durkheim, fica evidenciado que as religiões é que fun-


damentaram as primeiras noções do pensamento coletivo, chama-
das representações (noções de espaço, de tempo, de gênero, de
número, de causa, de personalidade etc.). A religião tenta respon-
der questões que a ciência e a verificabilidade não conseguem,
assim tem o poder de ultrapassar o alcance dos conhecimentos
empíricos. Acima de tudo, a religião é uma instituição, e as insti-
tuições são fatos sociais.

A instituição religiosa pode ainda ser definida como o conjunto


de crenças baseados em dogmas que definem noções de mundo,
realidade e princípios éticos. Esses dogmas têm como base a
aceitação por meio da fé de uma comunidade de fiéis, que os
seguem por meio da fé e da devoção.

Segundo Max Weber as crenças e valores religiosos têm um papel


importante na definição das condutas dos indivíduos em sociedade.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 129


Na ética protestante e o espírito do capitalismo, o autor defendeu
que a religião pode exercer uma poderosa influência na conduta
prática dos indivíduos, como foi o caso da religião protestante
em relação ao modo de produção capitalista. Weber pesquisou
e analisou os valores e princípios que fundamentavam a religião
protestante e percebeu sua sintonia com a racionalidade
econômica inerente a concepção de empreendimento capitalista
(tempo é dinheiro, Deus ajuda quem cedo madruga, a parábola
dos talentos etc).

Por outro lado, os marxistas entendiam que a religião era puro


sistema de alienação: “religião é o ópio do povo”. Marx afirmava
que as instituições religiosas apenas mascaravam e acomodavam a
população à sua situação de pobreza e de explorados.

O importante é compreender que a religião é uma instituição


fundamental na vida social, ou seja, está presente em todas as
sociedades, desde povos primitivos da antiguidade, civilizações
mesopotâmicas, até sociedades pós-modernas atuais. Nesses
termos é uma instituição axial.

Recreação

Recreação são as formas de manifestação social


que visam aliviar as pressões do dia a dia.
Geralmente são consideradas as festas, os rituais
de descontração (como a malhação de Judas na
semana santa) e as grandes manifestações culturais
da população como carnaval, festas juninas, natal
e ano novo.

Os momentos de recreação vão desde as grandes


festas convencionadas até festas de aniversário,
Figura 28:
Fonte: http://livrepensar.files.wordpress.com/2009/06/ casamentos, formaturas e carnavais fora de época.
blogue-educacao-aquarela_01.jpg
De modo geral são momentos em que a sociedade pára para extravasar
as pressões e o estresse da vida cotidiana. No Brasil temos como
exemplo: o futebol, o carnaval, as festas juninas, a copa do mundo.

130 FILOSOFIA
Educação

A educação é uma instituição universal encontrada


em qualquer tipo de sociedade humana, não en-
tenda que educação é apenas escolar ou formal.
Este nível de educação é apenas uma manifesta-
ção da educação enquanto instituição axial, nesses
termos podemos verificar que em uma sociedade
indígena a educação ocorre no processo de sociali-
zação do indivíduo a partir do aprendizado da cul-
tura, do trabalhar, da religião, dos conhecimentos
e práticas tradicionais, independente de escola.

Civilizações como as mesopotâmicas e greco-


latinas não conheciam a educação escolar, fato
Figura 29:
que não nega a existência de educação. Na Idade Fonte: http://www.meninomaluquinho.com.br/
imagensPaginas/mmp465_carnaval.gif
Média os conhecimentos técnicos e profissionais
eram passados na prática artesanal nas oficinas, não existia uma
escola formal, nesse período as profissões passavam de pais para
filho. Embora a escola tenha surgido na Idade Média nas catedrais
(com a decadência dos mosteiros), somente na era capitalista a
escola torna-se fundamental para a formação de profissionais
para o exercício de funções na economia e no mundo do trabalho
(revoluções industriais).

De modo geral é importante destacar que a escola é apenas


uma das diversas formas que a instituição axial educação pode
se manifestar nas sociedades. É importante que o aluno consiga
verificar que a educação tem como função universal: a manutenção,
a continuidade e a transmissão das normas, dos valores, dos
símbolos e das crenças:
A educação constitui uma instituição universal pelo
fato de que em todas as sociedades – das comuni-
dades tribais às complexas sociedades urbano-in-
dustriais – é necessário garantir não apenas a con-
tinuidade biológica, mas, igualmente, a transmissão
das normas, dos valores, dos símbolos e das crenças,
enfim da estrutura intermental sem a qual nenhuma
sociedade pode funcionar (NOVA, 2008, p.183).

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 131


Assim, a educação consiste
nos processos de ensinar
e aprender socialmente
conteúdos culturais com
MEC (Ministério da Educa-
ção e Cultura): LDB - o objetivo de perpetuar
Art. 1º A educação abrange
os processos formativos e transmitir de geração a
que se desenvolvem na vida
familiar, na convivência geração o conhecimento,
humana, no trabalho, nas
instituições de ensino e
modos de ser, interpretar
Figura 30:
pesquisa, nos movimentos o mundo e práticas de uma Fonte: http://greenpack.rec.org/citizens_
sociais e organizações da rights/images/citizens_rights.jpg
sociedade civil e nas mani- dada sociedade. A educação
festações culturais (LEI Nº
9.394, DE 20 DE DEZEMBRO é também um processo de socialização e é exercida nos vários
DE 1996).
espaços de convívio social, servindo para adequação dos indivíduos
à sociedade, grupos e/ou classes a que pertence. De acordo com
a Constituição Federal do Brasil e a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), de 1996, é o processo formativo que visa ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o mundo do trabalho. (http://
www.educabrasil.com.br/eb/dic/dicionario.asp?id=250)

Política

É a instituição social que visa o controle social formal,


representação política da população. Política não é concebida
aqui, simplesmente, como as formas do jogo do poder, mas
sim as normas, as regras, as organizações e legislações que
regram e fundamentam o controle social (organização e
ordenamento da sociedade). Desse modo, a polícia é uma
instituição política, o INSS é uma instituição política, um pajé
em uma tribo exerce uma função de controle e regramento
social que é política.

A política, enquanto instituição axial, pode assumir várias


formas que vão desde o estado moderno à organização tribal. É
importante que o aluno distinga que a instituição axial política
não é simplesmente o que nós ocidentais entendemos como poder
público, mas engloba instituições de sociedade não-estatais. Mas o

132 FILOSOFIA
que seriam sociedades não-estatais? Respondendo, as populações
indígenas brasileiras não são estados-nação (saber mais), ou seja,
não são reconhecidas internacionalmente como uma instituição
que possui soberania, território, fronteiras definidas; ou ainda
são sociedades que não criaram sistemas políticos aos moldes
modernos (republicas, monarquias, tiranias), de modo resumido
não são países.

A instituição axial política resume-se ao caráter universal de


controle e regulação das relações sociais, que na civilização
ocidental vem sendo exercida pela forma estado-nação e suas
formas de governo (monarquia, república e despotismo). Já em
sociedades tradicionais e não-ocidentais, podemos verificar a
ausência dessas manifestações modernas, fato que não define que
são sociedades sem política. Essas sociedades apenas manifestam
a instituição política de modo diferente, através das relações de
liderança tradicional e tribal.

NAÇÃO SEM ESTADO


Uma das principais contribuições de Pierre Clastres para a
antropologia foi sua crítica à visão, até então dominante,
de que sociedades como as dos índios da América do
Sul são mais “primitivas” ou “menos desenvolvidas
culturalmente” do que sociedades mais hierárquicas,
onde a presença do Estado é mais evidente – como no
caso das sociedades Maia, Inca e Asteca. Ele procurou
demonstrar a falsidade do pressuposto de que todas
as sociedades necessariamente evoluem de um sistema
“tribal”, “comunista” e “igualitário” para sistemas
mais hierárquicos. As sociedades não-hierárquicas,
segundo seus estudos, possuem mecanismos culturais
que impedem ativamente o aparecimento de figuras
de comando – seja isolando os possíveis candidatos
a chefe (como no caso dos Pajés), seja destituindo-
os do poder do mando (como no caso dos chefes que
só têm poder para aconselhar). Sendo assim, elas
não estariam evoluindo em direção à estatização: ao

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 133


contrário, configuram-se como verdadeiras sociedades
“contra o Estado”, pois sua dinâmica cultural almejaria
precisamente impedir a formação de uma classe de
dirigentes e outra de dirigidos, (http://pt.wikipedia.
org/wiki/Pierre_Clastres)

Estado-nação
Chama-se Estado-nação quando um território delimitado
é composto por um governo e uma população de
composição étnico-cultural coesa, quase homogênea,
sendo esse governo produto dessa mesma composição.
Isso ocorre quando as delimitações étnicas e políticas
coincidem. Nesses casos, normalmente, há pouca
emigração e imigração, poucos membros de minorias
étnicas, e poucos membros da etnia dominante a
viver além fronteiras. (http://pt.wikipedia.org/wiki/
Estado-na%C3%A7%C3%A3o)

1 O que é a família nuclear tradicional e quão prevalente ela


é em relação a outras formas de família?

2 O estudo da religião pode enfraquecer ou não tem implica-


ções necessárias para a fé religiosa do pesquisador?

3 Qual a função da instituição política? Ela só existe nos mol-


des da nossa sociedade?

134 FILOSOFIA
Tempos Modernos (1936)
Sinopse: Um operário de uma linha de montagem, que testou uma “má-
quina revolucionária” para evitar a hora do almoço, é levado à loucura
pela “monotonia frenética” do seu trabalho. Após um longo período em
um sanatório ele fica curado de sua crise nervosa, mas desempregado.
Ele deixa o hospital para começar sua nova vida, mas encontra uma crise
generalizada e equivocadamente é preso como um agitador comunista, que
liderava uma marcha de operários em protesto. Simultaneamente uma jovem
rouba comida para salvar suas irmãs famintas, que ainda são bem garotas.
Elas não têm mãe e o pai delas está desempregado, mas o pior ainda está
por vir, pois ele é morto em um conflito. A lei vai cuidar das órfãs, mas
enquanto as menores são levadas, a jovem consegue escapar. (http://
www.adorocinema.com/filmes/tempos-modernos/)

Direção: Charles Chaplin


Gênero: Comédia
Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Tiny Sandford,
Chester Conklin.

Kramer vs. Kramer (1979)


Sinopse: Ted Kramer (Dustin Hoffman) é um profissional para quem o
trabalho vem antes da família. Joanna (Meryl Streep), sua mulher, não
pode mais suportar essa situação e sai de casa, deixando Billy (justin
Henry), o filho do casal, com Ted, que tudo faz para poder educá-lo,
trabalhando e fazendo as tarefas domésticas. Quando consegue ajustar
seu trabalho a essas novas responsabilidades, Joanna reaparece exig-
indo a guarda da criança. Ted, porém, se recusa e os dois vão para o
tribunal lutar pela custódia de Billy.( http://www.adorocinema.com/
filmes/kramer-versus-kramer/)

Direção: Robert Benton


Gênero: Drama
Elenco: Dustin Hoffman, Meryl Streep, Jane Alexander, Justin Henry,
Howard Duff.

SOCIOLOGIA GERAL | unidade 5 135


Eu Tu Eles (2000)
Sinopse: É a trajetória de Darlene (Regina Casé), uma bóia-fria do
sertão nordestino, que vive uma curiosa relação com seus três maridos
(Lima Duarte, Stênio Garcia e Luis Carlos Vasconcelos). Ela tira de
cada um o que esses de melhor podem oferecer em meio a difícil vida
sertaneja.

Direção: Andrucha Waddington


Gênero: Comédia
Elenco: Regina Casé, Lima Duarte, Stênio Garcia e Luis Carlos
Vasconcelos.

136 FILOSOFIA
REFERÊNCIAS

A proibição de incesto em Lévi-Strauss

Josefina Pimenta Lobato

Artigo publicado na Revista Oficina: Família, seus conflitos e


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BRAVERMAN, Henry. Trabalho e capital monopolista: a degradação


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Choix-Essais, Christian Bourgois éditeur, 1994.

SOCIOLOGIA GERAL | REFERÊNCIAS 137


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WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São


Paulo: Martin Claret, 2001.

WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. 5.


ed. São Paulo:Pioneira,1981.
Glossário de conceitos elementares

Abordagem teórica – Perspectiva da vida social oriunda de de-


terminada tradição teórica. Entre as principais tradições teóricas
incluem-se o funcionalismo, o estruturalismo, o interacionismo
simbólico e o marxismo. As abordagens teóricas fornecem as pers-
pectivas gerais a partir das quais os sociólogos, assim como em
qualquer outro ramo científico, desenvolvem o seu trabalho e in-
fluenciam as áreas da sua investigação, bem como o modo como os
problemas são investigados, identificados e enfrentados.

Burocracia – tipo de organização hierárquica que adquire a for-


ma de uma pirâmide de autoridade. O conceito de burocracia foi
popularizado por Max Weber como sendo a forma de organização
humana em larga escala mais eficaz. Weber defende que à medida
que as organizações se expandem, existe a tendência inevitável
para se tornarem cada vez mais burocratizadas.

Casamento - é uma união sexual e econômica socialmente aceita


entre os membros do grupo. O casamento implica, quase sempre,
duas pessoas de sexo oposto, embora em algumas culturas certos
tipos de casamento entre homossexuais sejam aceito. O casamento
forma normalmente a base de uma família de procriação, ou seja,
espera-se que o casal tenha filhos e os eduque. Muitas sociedades
permitem a poligamia, na qual um indivíduo pode ter vários cônju-
ges ao mesmo tempo.

Ciência – no sentido da ciência física, é o estudo sistemático do


mundo físico. A ciência implica a ordenação e a disciplina de dados
empíricos, a construção de abordagens teóricas que interpretem
e expliquem esses dados. A atividade científica reúne a criação
de audazes e novos modos de pensamento e o teste cuidadoso de

SOCIOLOGIA GERAL | GLOSSÁRIO 139


hipóteses e ideias. Uma das características principais que permitem
distinguir a ciência de outros tipos de conhecimento é o principio
geral de que todas as ideias científicas estão abertas à discussão e
revisão crítica por parte dos membros da comunidade científica.

Classe – Embora seja um dos conceitos mais usados em sociologia,


não há um consenso sobre o mesmo. Contudo, a maior parte dos
sociólogos adota o termo quando se referem às diferenças socio-
econômicas entre grupos de indivíduos que criam diferenças em
termos de poder e propriedade material.

Cultura – Normas, valores, bens materiais característicos de de-


terminado grupo. Tal como o conceito de sociedade, a noção de
cultura é usada com muita frequência em sociologia e nas outras
ciências sociais. A cultura é uma das características próprias da
associação humana.

Desemprego – Situação em que o indivíduo não possui trabalho


com todos os direitos trabalhistas assegurados, assim sendo, o tra-
balhador informal pode tem ocupação, mas não um emprego.

Divisão do trabalho – Divisão de um sistema produtivo em tarefas


ou ocupações laborais específicas, criando interdependência eco-
nômica. Todas as sociedades têm formas mais ou menos complexas
de divisão do trabalho. As mais simples são baseadas em sexo e
idade, com o desenvolvimento da industrialização essa divisão se
complexificou.

Economia – Sistema de produção e trocas que provê as necessida-


des materiais dos indivíduos que vivem em determinada sociedade.
As instituições econômicas são fundamentais em todo tipo de so-
ciedade, uma vez que o que acontece a nível econômico influencia
outras esferas da vida social.

Educação – Transmissão de conhecimento e saberes de uma gera-


ção para outro através da instrução direta. Embora exista processo
educativo em toda sociedade, apenas no período moderno a edu-
cação de massa ganhou a forma da escolarização, isto é, instrução
em ambientes educacionais próprios nos quais os indivíduos passam
vários anos da sua vida.
Estado – Aparelho político (instituições governamentais e funcio-
nalismo público) que governa uma dada ordem territorial, cuja au-
toridade é baseada na lei e que tem capacidade para usar a força.
Nem todas as sociedades se caracterizam pela existência de um es-
tado. As sociedades de caçadores-coletores e pequenas sociedades
agrárias não têm instituições estatais. O aparecimento do estado
marca uma transição na história da humanidade, na medida em
que a centralização do poder político, que a formação de estado
implica, introduz novas dinâmicas no processo de mudança social.

Estado-Nação – Tipo particular de estado, característico do mun-


do moderno, no qual um governo detém o poder soberano sobre
um território definido e onde a grande massa da população é for-
mada por cidadãos que têm consciência de pertencerem a uma
única nação. Os estados-nação são relacionados ao aparecimento
do nacionalismo, embora as lealdades nacionalistas nem sempre
estejam de acordo com as fronteiras dos estados que hoje existem.
Eles surgiram primeiramente na Europa e depois se espalharam no
mundo todo.

Estratificação Social – Existência de desigualdades estruturais en-


tre grupos de uma sociedade em termos de acesso a bens mate-
riais ou simbólicos e serviços. Embora todas as sociedades tenham
formas de estratificação, só com o advento do sistema estatal
emergiram diferenças em termos de riqueza e poder. Nas socie-
dades modernas a forma clássica de estratificação é o sistema de
classe social.

Estrutura Social – Padrões de interação entre indivíduos ou grupos.


A vida social não acontece de modo imprevisto. A maioria das nos-
sas atividades são estruturadas: estão organizadas de uma forma
regular e repetitiva. Embora a comparação possa ser duvidosa, é
necessário pensar a estrutura social de uma sociedade como algo
comparável aos suportes que sustentam e mantêm um edifício.

Família – Grupo de indivíduos ligados entre si por laços de sangue,


de casamento ou adoção, que formam uma unidade econômica, em
que os membros adultos são responsáveis pela educação e sustento
das crianças. Todas as sociedades conhecidas têm alguma forma de

SOCIOLOGIA GERAL | GLOSSÁRIO 141


sistema familiar, embora a natureza das relações familiares seja
muito variável. Nas sociedades modernas a forma clássica é a fa-
mília nuclear.

Globalização – Interdependência crescente entre pessoas, regiões


e países no mundo.

Grupos Sociais – Conjunto de indivíduos que interagem sistema-


ticamente com outros. Os grupos podem ser de associações mui-
to pequenas a organizações em grande escala ou sociedades. Seja
qual for o seu tamanho, a característica principal é a identificação
comum entre seus membros. Grande parte da vida ocorre em gru-
pos, que vão se tornam cada vez mais variados com a complexifi-
cação social.

Ideologia – Ideias ou crenças partilhadas que servem para justificar


os interesses de grupos dominantes. As ideologias são próprias de
todas as sociedades em que as desigualdades entre os grupos são
enraizadas e sistemáticas. O conceito de ideologia está fortemente
associado ao de poder, uma vez que os sistemas ideológicos servem
para legitimar o poder que os grupos detêm de forma desigual.

Industrialização – Desenvolvimento de formas modernas de indús-


tria (fábricas, máquinas e processos de produção em larga escala).
A industrialização tem sido um dos processos mais marcantes da
vida social nesses últimos dois séculos. As sociedades industriali-
zadas têm características bem diferentes das sociedades menos
desenvolvidas.

Interação Social – Encontro social entre indivíduos. A maior par-


te de nossas vidas é povoada por interações. As interações sociais
referem-se a situações formais e informais nas quais as pessoas
travam conhecimento (comunicação) uma com as outras. Como
exemplos temos: uma sala de aula, uma festa, uma briga.

Métodos de investigação – Diferentes métodos são empregados


para recolher materiais empíricos em sociologia, mas o trabalho
de campo (ou observação direta) e a pesquisa com questionário
(enquete) são os mais recorridos.
Mobilidade Social – Movimento de indivíduos ou grupos entre di-
ferentes posições sociais. A mobilidade vertical refere-se ao movi-
mento ascendente ou descendente numa hierarquia de um sistema
de estratificação. A mobilidade horizontal é o movimento físico dos
indivíduos ou grupo entre regiões.

Mudança Social – Alteração nas estruturas básicas de um grupo so-


cial ou de uma sociedade. A mudança social é um fenômeno cons-
tante na vida de uma sociedade. As origens da sociologia remontam
às tentativas de compreender as mudanças pelas quais a nascente
sociedade capitalista estava passando.

Normas – Regras de conduta que especificam comportamentos con-


siderados adequados numa série determinada de contextos sociais.
Uma norma pode aprovar ou proibir um determinado modo de com-
portamento. Todos os grupos humanos seguem normas definidas,
que são sempre reforçadas por sanções de várias ordens, que vão
desde a desaprovação informal à punição física ou à pena capital.

Organização – Grupo numeroso de indivíduos, envolvendo um con-


junto definido de relações de autoridade. Nas sociedades indus-
trializadas existem muitos tipos de organizações que influenciam
na maioria dos aspectos da vida dos indivíduos. As organizações
possuem relações estreitas com a burocracia, muito embora nem
toda organização seja burocrática.

Papel Social – Comportamento esperado da parte do indivíduo


quando ocupa uma determinada posição social. A ideia do papel
social deriva do teatro, da representação que os atores desempe-
nham no palco. Assumimos diferentes papeis sociais, pois ocupa-
mos várias posições no teatro da vida.

Parentesco – Relacionamento entre indivíduos através de laços de


sangue, de casamento ou adoção. As relações de parentesco estão,
por definição, implicadas no casamento e na família, mas envolve
muito mais que estas duas instituições. Na nossa sociedade as re-
lações de parentesco não envolvem necessariamente obrigações
sociais como em algumas outras sociedades nas quais o parentesco
é fundamental para maior parte dos aspectos da vida social.

SOCIOLOGIA GERAL | GLOSSÁRIO 143


Poder – A capacidade de indivíduos ou membros de um grupo para
alcançar seus objetivos ou favorecer os seus interesses. O poder é
um aspecto presente em todas as relações humanas. Muito dos con-
flitos de uma sociedade são lutas pelo poder, porque quanto mais
poder um indivíduo ou grupo detiver, maior será sua capacidade de
conseguir o que deseja à custa de outros.

Política – Meios através dos quais o poder é entregue de modo a in-


fluenciar a natureza e os conteúdos de atividades governamentais.
A esfera do político inclui as atividades dos que estão no governo,
mas também as ações de muitos outros grupos e indivíduos.

Posição Social – Identidade social que um indivíduo detém dentro


de um determinado grupo ou sociedade. As posições sociais podem
ser de natureza muito geral (como aquelas associadas a papéis de
gênero) ou ser muito específicas (como no caso das posições pro-
fissionais).

Religião – Conjunto de crenças que envolvem símbolos inspirado-


res de reverencia e adoração, a que aderem os membros de uma
comunidade, bem como práticas rituais em que os mesmos par-
ticipam. A religião não implica sempre uma crença em entidades
sobrenaturais. A diferença crucial entre magia e religião pode ser
assentada no fato da primeira ser praticada essencialmente por
indivíduos enquanto que a segunda é o centro de rituais de uma
comunidade.

Secularização – Processo de declínio na influencia da religião sobre


os outros aspectos da vida social, tal como o político, econômico.

Socialização – Processos sociais através dos quais as crianças desen-


volvem uma consciência da existência de normas e valores sociais
e alcançam uma noção própria de eu-social. Embora esse processo
seja significativo na infância e adolescência, continua, por toda a
vida, uma vez que ninguém está imune às influenciais dos outros,
além do que a vida social é uma constante mudança.

Sociedade – Este é um dos conceitos sociológicos mais importan-


tes. Uma sociedade é um grupo de pessoas que vivem em deter-
minado território, estão sujeitas ao mesmo sistema de autoridade
política e estão conscientes de possuir uma identidade própria
diferente das dos outros grupos. Algumas sociedades são muito
pequenas (como alguns grupos indígenas), enquanto outras são
enormes.

Sociedades industriais – Sociedades nas quais a grande maioria da


força de trabalho encontra-se na produção industrial.

Sociologia – O estudo de grupos e sociedades humanas, que dá um


destaque particular à análise do mundo industrializado, ou moder-
no. A sociologia faz parte de um conjunto de ciências sociais que
inclui também a antropologia, a economia, a ciência política e a
geografia humana. A distinção entre várias ciências sociais não é
nítida, uma vez que todas partilham determinado leque de interes-
ses, conceitos, métodos comuns.

Status – Honra ou prestígio social conferido a determinado grupo


que ocupa um lugar específico na estrutura social.

Teoria – Uma tentativa de identificar propriedades genéricas que


explicam fenômenos regularmente observados. A elaboração de te-
orias é um elemento essencial de todo trabalho sociológico. Embo-
ra as teorias tendam a estar relacionadas com abordagem teóricas
mais vastas, são também fortemente influenciadas pelos resulta-
dos das investigações que ajudaram a criar.

Trabalho – Atividade humana na qual os indivíduos produzem rique-


za a partir do mundo natural e asseguram a sua sobrevivência. O
trabalho não deve ser considerado somente como emprego remu-
nerado. Nas culturas tradicionais havia apenas um sistema monetá-
rio rudimentar, e poucas eram as pessoas que trabalhavam em tro-
ca de dinheiro. Nas sociedades modernas, persistem ainda muitos
tipos de trabalho que não implicam pagamento de salário direto.

Valores – Ideias de indivíduos ou grupos acerca do que é desejável,


descente, bom ou mau. A variação em termos de valores constitui
um aspecto fundamental da diferenciação entre as culturas huma-
nas.

SOCIOLOGIA GERAL | GLOSSÁRIO 145


BOUDON, Raymond. BOURRICAUD, François. Dicionário crítico de
sociologia. São Paulo: Ática, 2000.

BRYM, Robert, LIE,John, HAMLIN, Cynthia Lins, MUTZEMBERG,


Remo, SOARES, Eliane Veras, SOUTO MAIOR, Heraldo Pessoa. So-
ciologia: sua bússola para um novo mundo. São Paulo: Thomson
Learning, 2006.

GIDDENS, Anthony. Sociologia. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste


Gulbenkian, 2000.

OUTHWAITE, William, BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamen-


to social do século XX. Rio de Janeio: Jorge Zahar Editor, 1996.
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Caro Estudante,
No sentido de melhorar a qualidade do material didático, gostaríamos que você re-
spondesse às questões abaixo com presteza e discernimento. Após, destaque a folha
da apostila e entregue ao seu Tutor. Não é necessário assinar.

Município: _________________________________ Polo: _______________________


Turma: _________ Data: _____/ _____/__________
Responda as questões abaixo de forma única e objetiva
[O] - ótimo, [B] – bom, [R] - regular, [I] - insuficiente

1 Qualidade gráfica [O] [B] [R] [I]


1.1 Encadernação gráfica
1.2 Formatação da apostila
1.3 Ícones apresentados são informativos
1.4 Tamanho da fonte (letra)
1.5 Tipo de fonte está visível (Arial, Times New Roman...)
1.6 Qualidade de ilustração

2 Conteúdo [O] [B] [R] [I]


2.1 Coesão
2.2 Coerência
2.3 Contextualizado com a realidade e prática
2.4 Organização
2.5 Programa da disciplina (Ementa)
2.6 Incentiva à pesquisa

3 Atividades [O] [B] [R] [I]


3.1 Atividades relacionadas com a proposta da disciplina
3.2 Atividades relacionadas com a realidade e a prática
3.3 Relacionadas ao conteúdo
3.4 Contextualizadas com a prática
3.5 Claras e de fácil entendimento
3.6 Estão relacionadas com as questões das avaliações
3.7 São Problematizadoras e incentivam à reflexão
3.8 Disponibilizam uma bibliografia complementar

O material chega em tempo hábil? sim ( ) não ( )

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