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De 22 a 26 de julho de 2013.
Política Externa
Trabalho Avulso
Belo Horizonte
2013
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José Renato Ferraz da Silveira
Juliana Graffunder Barbosa
Belo Horizonte
2013
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RESUMO
A partir do término da Guerra Fria (1989-1991), o mundo se depara com a sobrevivência de uma
“superpotência solitária” em um “momento unipolar”, enquanto a Política Externa Brasileira
articula o aprofundamento da inserção brasileira no cenário internacional. A inflexão nas
Relações Internacionais é observada pela nova distribuição de poder resultante do desfecho da
bipolaridade, a qual compreende aspectos híbridos de uni-multipolaridade. Ademais, como
assevera Nye (2009; 2012), o soft and cooptive power entra em voga e passa a ser utilizado
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conjuntamente ao hard power de forma inteligente , para que Estados enfrentem o complexo
“jogo de xadrez tridimensional” que se apresenta: o tabuleiro do alto, militar; o tabuleiro médio,
representando as relações econômicas; e o último tabuleiro, domínio transnacional.
Inegavelmente, o Brasil almeja um papel de hegemon regional, em sua acepção gramsciana,
propagando sua influência econômico-institucional. Paradoxalmente, sob o prisma militar, o
Brasil está afastado dos principais focos de tensão internacional e, somado a isso, o país não
possui um papel proeminente a cumprir no campo da segurança internacional. O mosaico
internacional apresenta perspectivas que oscilam num jogo de luz-sombras entre a estabilidade-
instabilidade: de declínio relativo da hegemonia norte-americana à decadência político-
econômica das “velhas” potências europeias e ascensão econômica chinesa.
Palavras – Chave
Superpotência Solitária. Política Externa Brasileira. Relações Internacionais. Soft and Cooptive
Power. Hard Power.
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O uso de maneira inteligente os recursos tanto de soft power quanto de hard power,
conjuntamente, configura o smart power, cunhado por Nye (2009)
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1 INTRODUÇÃO
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O objetivo do artigo apresentado por Velasco e Cruz e Sennes está na prospecção de algumas
das linhas mestras que guiarão o sistema internacional em um horizonte de vinte anos.
Considerando que o artigo base foi publicado em 2006, o limiar temporal é o ano de 2026.
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Capacidades relativas é a capacidade de um Estado em relação a outro.
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2 DESENVOLVIMENTO
O mundo atual é observado por Nye (2012) como um complexo “jogo de xadrez
tridimensional”: o tabuleiro do alto, militar; o tabuleiro médio, representando as relações
econômicas; e o último tabuleiro, domínio transnacional.se apresenta muito mais
complexo e dinâmico do que há vinte anos atrás. Mudanças nos padrões tecnológicos,
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O bandwagon effect caracteriza um comportamento de adesão dos Estados de menores à um
Estado líder.
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difusão dos meios de comunicação, o fenômeno da globalização fizeram que os atores
internacionais se multiplicassem entre Estados, Organizações Inter-Governamentais e
Forças Transnacionais5; e o poder se tornasse mais difuso. Como assevera Eiiti Sato,
“essa realidade, muito mais variada e dinâmica, representa uma considerável ampliação
de oportunidades, mas significa também maior dificuldade na construção de estratégias
de inserção internacional.” (2000, p.167)
Sem dúvida, no que concerne ao Brasil, as limitações e possibilidades quanto a
atuação internacional são dependentes do cenário que se apresentará. Embora as
carências e os problemas internos brasileiros impliquem em uma projeção limitada e
papel coadjuvante a cumprir no campo geopolítico mundial. Como adverte Paulo
Roberto de Almeida (2012, p.4), “O Brasil e a América do Sul - esta a única porção do
planeta em que o primeiro pode atuar de alguma forma relevante - constituem “polos de
poder” - se o conceito se aplica - absolutamente marginais do ponto de vista da
geopolítica mundial”.
Destarte, o desempenho crescente brasileiro só se verifica na ordem
geoeconômica mundial. A Economist Inteligence Unit prevê que, até 2030, o Brasil deva
atingir o PIB de U$7,34 trilhões, o que o transformará na quarta maior economia, atrás
apenas de China, EUA e Índia, respectivamente, e à frente do Japão, Alemanha,
Rússia, França e Reino Unido. De acordo com a Agência Internacional de Energia
(AIE), graças à descoberta de reservas de petróleo na camada do pré-sal, o Brasil
passará a ser o sexto maior produtor mundial em 2030, com 3,4 milhões de barris
diários, atrás de Arábia Saudita, Rússia, Iraque, Irã e Canadá. Segundo a agência, o
Brasil será o terceiro país com o maior aumento porcentual previsto na produção de
petróleo até 2030, de 2,9% ao ano, atrás apenas do Iraque e do Canadá.
Contudo, apesar dessas projeções positivas, “o Brasil apesar de ser o país mais
rico do subcontinente, é um dos mais desiguais” (ROSSI, 2012, A23).
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Classificação de atores internacionais segundo Pecequilo (2004), que divide os atores não-
estatais em dois grupos: Organizações Internacionais Governamentais ou Inter-Governamentais,
que representam agrupamentos políticos constituídos fundamentalmente por Estados; e, Forças
Transnacionais, que possuem caráter transterritorial e de domínio privado, sub-categorizados
em: Organizações Não-Governamentais, Multinacionais (Transnacionais), grupos diversos da
sociedade civil (Igrejas, sindicatos, partidos políticos, grupos terroristas, máfias) e a opinião
pública internacional.
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industrializada, embora lhe falte certo grau de autonomia
tecnológica suscetível de inserir essa economia nos grandes
circuitos da interpendência produtiva mundial (ALMEIDA, 2012,
p. 5).
Agora, ninguém mais duvida que o século XXI será norte americano. O
novo milênio já é apresentado como mais uma era de domínio dos
Estados Unidos. Entretanto, tal certeza, como todas as anteriores,
ainda deixa em aberto muitos desenvolvimentos e indagações, tendo
sido encerrada apenas uma curta fase (e a primeira) do pós Guerra
Fria. Como os Estados Unidos definirão sua estratégia e política
externa, como as demais potências responderão à sua hegemonia,
contestando-a ou aproximando-se cada vez mais dela, como os países
fora do núcleo estarão se inserindo nessa nova ordem, como ela agirá
sobre eles, como serão as respostas às ameaças transnacionais e aos
desafios políticos e econômicos existentes e emergentes, são
referenciais que poderão mudar o destino do sistema, para melhor ou
para pior, para a instabilidade ou a estabilidade. Apesar de estarem no
centro do mundo, amparados por seus recursos e tradições, não
sabemos até quando a América permanecerá nessa posição
(PECEQUILO, 2003, p. 388).
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improvável a concentração de poder hegemônico nas mãos de um único Estado. A ideia
de que estamos no fim de uma era em que os Estados Unidos parecem estar
destinados a ser o primeiro hiperpoder global e também o último.
Além disso, dois eventos são projetados: a emergência da Índia e a provável
integração russa na União Europeia (UE). Ipso facto, em nossa concepção, a Rússia
parece “distante” do processo integracionista europeu. Não há “esforço” sinalizado pelo
condomínio franco-germânico em ter a Rússia como parceira na UE. Notamos que a
extensão da OTAN para o leste europeu na Polônia e Hungria - embora componente do
prisma geopolítico - é visto pela Rússia como “a ameaça é a percepção da ameaça”, ou
seja, nesse sentido, há uma incompatibilidade em ter a Rússia como parceira
estratégica tanto no aspecto econômico, e ainda mais enfaticamente no militar. A busca
da UE em outros fornecedores de gás e petróleo sinalizam a desconfiança e o receio de
ter dependência de recursos naturais russos - óleo, gás e carvão. E com essa assertiva,
Ferreira apud Nasser problematiza (2009, p. 62): “Moscou ainda tem um trunfo da maior
importância - o petróleo e o gás que a Rússia fornece à Europa”.
Outro ponto que merece análise é a redução da presença norte americana na
região do Oriente Médio, pela dificuldade de arcar com os custos econômicos e políticos
nela implicados. Há uma mudança de eixo pelo governo norte americano de Obama de
“abandono gradual” da mobilização militar na região. O documento Defense Strategic
Guidance de janeiro de 2012, referente às ações estratégicas que o governo Obama
tomará para segurar a sua liderança global, deixa claro a intenção do governo norte
americano em concentrar suas ações na região da Ásia-Pacífico. “Indeed, as we end
today’s war, we will focus on a broader range of a challenges and opportunities,
including the security and prosperity of the Asia-Pacific.”
No que tange ao Brasil, os autores apontam que a forma de inserção
internacional brasileira aumenta em importância: “se consolida como liderança e
coordenador estratégico” (VELASCO E CRUZ; SENNES, 2006, p. 34). Ainda afirmam
os autores que o processo de integração resulta maior estabilidade e ocupação
econômica e social das zonas fronteiriças e do interior do continente, reduzindo a
desigualdade econômica regional.
No entanto, como pondera Bárcena apud Rossi (2012, A23): “a América Latina é
a região mais desigual do mundo. Fora a desigualdade, a tributação é baixa na região o
que acarreta prejuízos no serviço público de qualidade; na educação, “50% dos
estudantes latinos americanos não alcançam os níveis mínimos de compreensão de
leitura, nos testes internacionais, quando, no mundo rico, a porcentagem de
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fracassados é de 20%” (ROSSI, 2012, A23); investimento em inovação e tecnológica,
“não supera nunca de 0,7% do PIB, quando na Coreia, por exemplo, é de 3%” (Ibid.,
A23); infraestrutura, “a América Latina está investindo 2% de seu PIB em infraestrutura,
quando precisaria de 5%, ano, ano, até 2020, pelas contas de Gurria (Ibid., A23).
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Quanto ao Brasil, nota-se nesse cenário conforme ambos autores, um processo
de consolidação da liderança sul americana e o credenciam para ocupar lugar de
destaque nos principais foros internacionais. Diferente dessa perspectiva otimista de
liderança do Brasil, Almeida (2012, p. 4) rechaça qualquer projeção de poder brasileira
no subcontinente americano: “o Brasil está longe de determinar as principais
orientações políticas ou econômicas que poderiam ser adotadas pelos demais países
da região”. Almeida (Op. cit., p. 12), ainda considera que o peso do Brasil nas grandes
questões de segurança internacional e na construção de uma ordem multipolar é
efetivamente reduzido e limitado.
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Unidos manteriam sua presença militar, com a mobilização crescente de tropas
estrangeiras sob o seu comando efetivo.
No que tange a China, Kissinger afirma (2011, p. 503): “a competição crucial
entre os Estados Unidos e a China muito provavelmente girará mais em torno das
questões econômicas e sociais do que militares”. Kissinger (Op. cit.) contraria o projeto
americano explicíto de organizar a Ásia com base na contenção da China. Vê essa
cruzada geopolítica norte americana com pouca chance de êxito. O rótulo apropriado
que Kissinger nota em relação a relação sino-americana é de coevolução. “Isso significa
que ambos os países buscam seus imperativos domésticos, cooperando no que for
possível, e ajustam suas relações para minimizar o conflito” (Ibid., p. 504-505).
Em relação a Europa e a Rússia, a expansão da OTAN é um projeto norte
americano de influência geoestratégica na aliança europeia e ao mesmo tempo visto
pelos russos como uma ideia de cerco.
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Na última e mais improvável projeção, contraponto do cenário da
Desconcentração Conflituosa, Velasco e Cruz e Sennes (2006) afirmam uma série de
perspectivas sob a ordem liberal cosmopolita: a homogeneidade de identidades e
valores básicos entre Europa, Japão e Estados Unidos, entendimentos estabelecidos no
interior de redes globais associando burocracias públicas e privadas; Estados Unidos e
Europa superam as divergências no plano da segurança; a China mantém seu
dinamismo e se consolida como um dos principais polos de crescimento da economia
mundial; a Rússia se integra a União Europeia; a Índia converte-se em país líder em
segmentos de alta tecnologia; elevado nível de consenso entre os principais atores da
cena internacional; no Oriente Médio, a presença militar estrangeira se fará sob a
bandeira da ONU; a ação conjunta da “comunidade dos internacional” mantém sob
controle os níveis de tensão internacional e diminuem a ameaça do terrorismo; na
esfera econômica, redução de barreiras protecionistas e a geração de normas globais
rigorosas sobre um conjunto crescente de temas.
Dentre os cenários, é o que mais se aproxima de uma ideia kantiana de
cosmopolitismo, em que há uma federação de Estados debatendo conjuntamente sobre
os rumos que a sociedade mundial tomará. A instituição do Estado dará espaço ao
cidadão global e aos direitos que este tem, independente de sua origem ou
nacionalidade. O progresso econômico e tecnológico nos levariam a uma sociedade
semelhante à ideia de “aldeia global” de Marshall McLuhan, com mais interligações
entre os povos, culturas e etnias.
Para o Brasil, a projeção de poder apresentada em termos globais e no sub-
continente seria ampliada, uma vez que aspirações como a Reforma do Conselho de
Segurança da ONU, a ampliação dos foros decisórios mundiais como o Fundo
Monetário Internacional (FMI), teriam mais espaço para discussão e implementação.
Menos crises internacionais que demandassem intervenções humanitárias surgiriam, o
Brasil se consolidaria como ator normatizador da ordem internacional quanto à
Responsabilidade ao Proteger, as Metas do Milênio da ONU seriam buscadas com mais
afinco pelos países e regimes internacionais como Kyoto e o Tratado de Não
Proliferação de Armamentos de Destruição Massiva, avançariam.
Desta maneira, o Brasil se firmaria como hegemon regional, na ascepção
gramsciana, detendo um consenso entre seus vizinho de que lidera-os nas mais
variadas temáticas, representando-os nos foros internacionais e arcando com os custos
dessa posição.
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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