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1 INQUIETAÇÕES PRIMEIRAS
POR QUÊ e PARA QUÊ prôpor-se estudos sobre a história da biblioteca no Brasil
seja essa instituição de leitura – a biblioteca pública, a escolar, a infantil ou especializada
como uma biblioteca universitária? Essa pode ser uma pergunta com certo ceticismo de
pesquisadores, instituições de fomento à pesquisa, alunos ou mesmo de um cidadão comum,
afinal qual a contribuição de estudos de tal ordem.
As investigações acerca da história da biblioteca se inscrevem na disciplina do estudo
da história do livro, disciplina a qual segundo Darton (1990, p. 111) se constitui em um campo
exuberante e coloca como questão: “Como o historiador do livro poderia negligenciar a
história das bibliotecas, das edições, do papel, dos tipos e da leitura?”.
No campo da Biblioteconomia os estudos têm tradição de longa data constituindo-se
em uma disciplina curricular geralmente sob a denominação de “História do Livro e das
Bibliotecas” nos cursos de graduação em biblioteconomia. A biblioteconomia no Brasil como
campo de estudo e prática tem seu início na Biblioteca Nacional, (RJ) curso criado e
instalado nos porões dessa biblioteca no século XX pelo Decreto No. 8.835, de 11/07/1911 (a
título de contemporanização onde hoje está o Auditório Machado de Assis). Foi o terceiro
curso de biblioteconomia no mundo, depois do da École de Chartes na França e do curso do
Columbia College, em Nova York nos Estados Unidos. Esse primeiro curso da BN só
começou a funciona efetivamente em 1915 e hoje se encontra na Escola de Biblioteconomia
da UNIRIO. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 2009).
No século XX não só criou outros tantos cursos de biblioteconomia nos diferentes
estados da federação brasileira como resultou na produção do conhecimento de uma
biblioteconomia tropical. Entre alguns dos estudos histórico-sociais sobre a biblioteca no
Brasil, citam-se o estudo de Sônia Catarina Gomes, em 1982 - Bibliotecas e sociedade na
Primeira República, o trabalho investigativo de Zita Catarina Prates de Oliveira, em 1994, A
biblioteca fora do tempo: políticas governamentais de bibliotecas públicas no Brasil, e, mais
próximo ao final do século XX, o estudo realizado por Rosemay Tofani Motta, em 2000 sob o
titulo Baptista Caetano de Almeida: um mecenas do projeto civilizatório em São João d’El-
Rei no início do século XIX – a biblioteca, a imprensa e a sociedade literária.
De diferentes campos e abordagens teóricas circunscritas em alguma linha podemos
citar títulos que impactaram a produção bibliográfica nacional quando o tema é a biblioteca,
citam-se entre outros, a obra de Rubens Borba de Moraes, O problema das bibliotecas
brasileiras, 1943. Passados mais de 40 anos, Eduardo Frieiro publica O diabo na livraria do
Cônego, 1981. Do autor Waldeck Carneiro da Silva, o título, A miséria da biblioteca escolar,
1993. Esse último titulo denunciou no início dos anos 90 o estado de abandono das bibliotecas
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escolares brasileiras, publicação que de certo modo chamou atenção da revisão e prosição de
estudos no campo da Biblioteconomia entrelaçadas à questões do campo da Educação e do
ensino brasileiro
No cenário internacional o interesse por estudos acerca da biblioteca
internacionalmente segundo Baratin e Jacob (2000, p.9), adquiriram uma nova abordagem a
partir das práticas culturais objeto de estudo quer do campo da História, da Sociologia, da
Educação entre outros.
Nesse sentido as contribuições brasileiras a partir de estudos culturais em diferentes
campos do conhecimento podemos elencar entre outros títulos: o estudo de Cláudio Denipoti,
o título Páginas de prazer: a sexualidade através da leitura no início do século, em 1999. o
trabalho de Christini Cardoso Morais Para o aumento da instrução da mocidade da nossa
pátria: estratégias de difusão do letramento na Vila de São João del-Rei (1824-1831), em
2002, bem como o título da tese Os jardins das delícias: gabinetes literários, bibliotecas e
figurações da leitura na corte imperial, de Nelson Schapochnik, em 1999.
No mercado editorial são também significativos os títulos disponíveis quer editados
ainda na última década do século XX como aqueles publicados na primeira década do século
XXI. A exemplo arrola-se – o título editado pelo Arquivo Nacional, trabalho de Tânia Maria
Bessone, Palácios de destinos cruzados: bibliotecas, homens e livros no Rio de Janeiro,
1870-1920, em 1999, a obras coletiva de Lilia Moritz Schwarz, Paulo Cesar de Azevedo e
Angela Marques da Costa, A longa viagem da biblioteca dos reis: do terremoto de Lisboa à
independência do Brasil, 2002. O resultado de pesquisa de doutoramento por mim realizado
na Universidade de São e publicado sob o título Dos espaços de leitura à biblioteca
municipal de Jaraguá do Sul: discursos e percursos (1937 – 1983) em 2009, pela Editora
Insular.
Esse contexto quer traduzir algumas respostas à proposição em se investigar a
biblioteca brasileira em diferentes campos do conhecimentos e com diferentes abordagens; e
nas entrelinhas quer de algum modo justificar esse estudo da biblioteca escolar no ensino
primário oferecido no estado de Santa Catarina em meados do século XX.
Na condição de investigadora de instituições de leitura, a biblioteca contemporânea -
aposto no conhecimento histórico e na experiência humana das gerações anteriores em dois
sentidos sem uma escala de ordem da sua importância.
Em primeiro, a história é um registro compreendido em um lugar e, em um tempo –
isto é, cada indivíduo em seu tempo e lugar poderá ler e reler a história como luz para seu
pensar e fazer no seu tempo. Em segundo lugar, a partir do campo do fazer, a experiência
daqueles que nos antecederam poderão mostrar gestos, modos de gestão de instituições de
leitura, bens culturais inseridos nas diferentes realidades colocadas a partir de diferentes
referenciais de cultura no Brasil.
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Nessa linha de raciocínio a leitura desse documento tem como pressuposto norteador
que a Biblioteca da escola do Ensino Primário de meados do século XX, prescrita no estado
de Santa de Catarina é um espaço de sociabilidades inscrito como parte da cultura escolar
nesse tempo e nos diferentes lugares dessa escola.
A cultura escolar para fins desse estudo é entendida como “[...] o funcionamento
interno da escola com a análise das relações conflituosas ou pacíficas que essa cultura
mantém, a cada período de sua história, com um conjunto de culturas do seu tempo, seja a
religiosa, política ou popular.” proposto a partir de Julia (2001) em uma leitura de (Beirith,
2009, p. 19).
Da estrutura dos títulos, capítulos, seção artigos e incisos que aqui interessam ao
estudo dizem respeito ao Titulo IV – Das instituições complementares da escola, e
especificamente as instituição complementares escolares, a Biblioteca e os Clubes de
Leituras como espaços de sociabilidades engendrados no Decreto que regulamenta os
estabelecimentos de Ensino Primário de Santa Catarina.
Passaremos no item que segue a uma contextualização do Ensino Primário do tempo
passado lido da luz da janela do tempo presente.
[As bibliotecas] serão organizadas nos grupos escolares, nas escolas normais
primárias e institutos de educação, e nas escolas isoladas, tendo como objetivo
a intensificação do gosto pela leitura (art. 1º. Da port. N. 4, de 13/1/1937). O
acervo dessas bibliotecas deveria ser composto por ‘[...] livros sobre viagens,
ciências naturais (tanto quando possível sob a forma atrativa), biografias,
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TÍTULO IV
Cap. II – Biblioteca;
CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS
Sob um título instável para fechar esse texto, as considerações aqui não querem ser
conclusivas, mas convidativas ao leitor/a voltar-se a questão norteadora Quais os indícios de
sociabilidades existentes na prescrição da Biblioteca da escola, no Decreto No 3. 735 de 17
de dezembro de 1946, o qual regulamenta o Ensino Primário à época?
O exame do Decreto mostra que a Biblioteca da escola do Ensino Primário do estado
de Santa Catarina é parte integrante da História da Educação de Santa Catarina.
A Biblioteca Escolar no estado de Santa Catarina ganha seu status legal a partir da
Reforma Trindade sob a batuta dos ventos da Escola Nova.
Como um espaço de sociabilidades, a instituição de leitura e formativa, - a Biblioteca
do Ensino Primário é evidenciada no Decreto a partir do conceito de sociabilidade, isto é, uma
dada sociedade constitui essa categoria a partir do estabelecimento de finalidades. A
finalidade tanto da Biblioteca como do Clube de leitura se constitui na formação de um
educando/aluno social e cultural.
Acreditamos que o exame do documento “Regulamento para os estabelecimentos de
ensino primário no Estado de Santa Catarina”, de 17 de dezembro de 1946 – Decreto N 3.
735, de 17 de dezembro de 1946, ou a Reforma Elpídio Barbosa, a partir da perspectiva dos
estudos culturais significa inicialmente ler a Biblioteca escolar do lugar presente com vistas a
capturar “[...] gestos, lugares e modelos do trabalho do pensamento, como às dinâmicas da
tradição e a memória do saber. (BARATIN e JACOB, 2000, p. 9).
Do tempo presente acreditamos que podemos auscultar o tempo passado que toda
biblioteca, só é uma biblioteca com seus leitores, consulentes, freqüentadores ou como mais
recentemente vem se denominado, os utilizadores dos acervos bibliotecais. Que leitores já
fomos de acervos impressos? e como podemos nos espelhar para nos constituirmos em
leitores, utilizadores da Biblioteca Digital – a tão sonhada Biblioteca de Alexandria ou a
Babel de Jorge Luis Borges [...].
O documento aqui inquirido por outro lado aponta como é lenta e árdua a constituição
de uma cultura de biblioteca mesmo que se faça presente na legislação, em outras palavras a
existência cultural de bibliotecas é mais lenta no pensar e fazer do leitor/utilizador das
diferentes bibliotecas brasileiras como instituição de formativa social e cultural.
Do prescrito como parte da cultura escolar, nos idos anos 40 do século XX, a
Biblioteca Escolar na atualidade ainda é pouco presente na mentalidade da comunidade
escolar na ação das suas diferentes atividades do ensino.
Mas na contramão de um possível pessimismo, o Decreto N 3. 735, de 17 de
dezembro de 1946 mostra que esforços, foram e vem sendo sim, envidados, desde outras
gerações - que como nós apostam nesse equipamento cultural e social.
POR QUÊ e PARA QUÊ prôpor-se estudos sobre a história da biblioteca no Brasil?
Uma das tantas respostas possíveis. Conhecer e refletir-se gestos e modos para o tempo
presente.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BARATIN, Marc; Jacob, Christian. (Dir.). O poder das bibliotecas: a memória dos livros no
Ocidente. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2000.
BRASIL. Ministério da Educação e Saúde. Organização ensino primário e normal. XVI estado de
Santa Catarina. Rio de Janeiro: Departamento de Educação do Estado de Santa Catarina, 1942.
(Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, Boletim, 21).
DARTON, Robert. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e revolução. São Paulo: Companhia das
Letras, 1990.
ELIAS, Norbert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994.
FIORI, Neide Almeida. Aspectos da evolução do ensino público: ensino público e política de
assimilação cultural no Estado de Santa Catarina nos Períodos imperial e republicano. 2.ed. rev.
Florianópolis, Ed. UFSC, 1991.
JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. In: R. Bras. Hist. Educ., n.1, jan./jun.,
2001.
OLIVEIRA, Zita Catarina Prates de. A biblioteca “fora do tempo” - políticas governamentais de
bibliotecas públicas no Brasil, 1937 – 1989. Tese. 220 f. (Doutorado em Ciência da Comunicação) –
Escola de Comunicação e Artes, Curso de Pós–Graduação em Ciência da Comunicação, Universidade
de São Paulo, São Paulo, 1994.
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UNESCO. Manifiesto de la UNESCO sobre la biblioteca pública. UNESCO, 1949. Disponível em:
<http://www.fundaciongsr.es/documentos/manifiestos/mani49.htm>. Acesso em: 17 mar. 2008.
________. Manifiesto de la UNESCO sobre la biblioteca pública. UNESCO, 1972. Disponível em:
<http://www.fundaciongsr.es/documentos/manifiestos/mani72.htm>. Acesso em: 17 mar. 2008.