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8 es] # ho A dialética do avesso Anricos JORGE GRESPAN* Depois da morte de Marx, parece que Engels procurou em vao, entre os papéis deixados pelo amigo, 0 texto sobre dialética que ele prometera escrever, De fato, em carta ao préprio Engels, na época em que redigia os Grundrisse, Marx comenta 0 acaso que colocou em suas maos 0 exemplar da Légica de Hegel deixado em Londres por Bakunin. Acaso feliz, porque “folhear” o livro ajudou-o muito nos problemas relativos ao “método de elaboragio [Bearbeiten]” de seu préprio manuscrito. E acrescenta: “se houver novamente tempo para tais trabalhos, eu teria muito prazer [...] em tornar acessivel ao entendimento humano comum 0 racional no método que Hegel descobriu e em seguida mistificou”’. Deixemos de lado a lasti- ma tradicional por Marx nao ter escrito este texto. Afinal, sua reexposigao critica da economia politica, empreendida a partir desta época, constitui 0 substrato dos problemas metodolégicos e a base para sua discussio. E no campo desta obra sistematica que se deve propor a questao de uma dialéti- ca materialista. Se Marx nao redigiu o prometido trabalho, por outro lado seu comentario confessa claramente o “grande servigo” prestado a seu “método de elaboracao” pela dialética de Hegel, certamente referindo-se a sua parte “racional”. Assim, no conhecido texto acima citado, o fundamental é destacar a contraposi¢io entre o elemento “racional” ¢ o “mistificador” na interpreta- ¢ao da I6gica hegeliana. Mas o que seria o “racional no método” de Hegel? E como separé-lo da “mistificagao”? Tais perguntas vém desafiando hé mui- * Professor de Teoria da Historia, na FFLCH/USP. ‘Carta de 16 de janeiro de 1858. Marx-Engels Werke, vol. 29, p. 260. 26 * A DIALETICA DO AVESSO to tempo os intérpretes de Marx, e eu gostaria de retomar aqui algumas solu- Ges recentes e interessantes, que discutirei, acrescentando minhas proprias observagGes’. A inversao materialista Antes de tudo, porém, voltemos a Marx. E preciso ficar claro, em primeiro lugar, que sua retomada da dialética na critica do capitalismo e da economia po- litica ndo decorre de uma mera adesao a este método’, como se ele devesse va- ler por si mesmo, independentemente do objeto a que se aplicasse @BStauneile- renga entre método e objeto, forma ¢ contetido, seria em si mesma totalmente fGOMIAIBtica. Ao contrario, é porque seu objeto se constitui de modo contradi- trio que Marx percebe ter de investig4-lo dialeticamente. Por isso, ele afirma, numa famosa proposicdo: “[iujitodajalciéncialserialsupértluayyseyawformayde “ aparecimento e a esséncia das coisas coincidissem imediatamente™. Ou seja, em coisas que aparecem de forma distinta do que sfo essencialmente distinguem- se dois niveis de realidade — o da esséncia e o de suas manifestagdes. Melhor ainda, ambos os niveis coincidem, mas nao “imediatamente”, e sim por media- Ges, através das quais a esséncia aparece com uma apar€ncia diferente. Ea pro- pria esséncia, contudo, que determina esta sua forma diferente de manifestacio, e 86 0 faz por ser contraditéria. Se nao o fosse, apareceria diretamente como © que 6, e “toda ciéncia seria supérflua”’. AISGIeHCia yalquelMarx Se irefereydesta “maneira, € dialética, tinica forma pela qual € possfvel conceber a contradi¢ao . Nao € em qualquer objeto que Marx distingue dois niveis de realidade, em que se constitui uma . Bem como nao ?Trata-se principalmente de dois artigos publicados em 1974 no Anudrio Hegeliano: Fulda, H. F. “These zur Dialektik als Darstellungsmethode (im ‘Kapital’ von Marx)", e também Theunissen, M. “Ktise der Macht. These zur Theorie des dialektischen Widerspruchs", in Hegel Jahrbuch, Koln, Pahl-Rugenstein Verlag. Embora nao esteja inteiramente de acordo com as “teses” af expostas, por Sua importancia e sua fecundidade elas deverdo ser criticamente consideradas no meu proprio texto. >£ 0 que sugere Theunissen, op. cit. pp. 323-325, e aqui temos j4 um desacordo, quando insiste em que Marx buscava desde os escritos de juventude “aplicar” a Iégica das “determinages da feflexao” hegelianas a historia e, mais tarde, 4 economia politica. “Marx, Das Kapital, Livro Ill, Manx-Engels Werke, volume 25, Berlim, Dietz Verlag, 1983, p. 825. (A seguir citado como K: |, Il ou Ill, conforme o livro, e depois a pagina.) A traducao brasileira utilizada é ada colecdo Os economistas, S40 Paulo, Abril Cultural, 1983, p. 271. (A seguir citada entre parénteses depois da alema por C, seguida pelo nimero do livro em algarismo latino e da pagina em arébico.) £0 que diz outro autor alemao, para quem a concepgao de ciéncia em geral por Marx seria “essen- jalista”. Cf. Lange, E. M. “Wertformanalyse, Geldkritik und Konstruktion des Fetischismus bei Marx”, in Neve Hefte fur Philosophie, Gottingen, Vanderhorch & Ruprecht, 1978, n® 13, pp. 1-46. CRITICA MARXISTA # 27 E todo objeto que deve ser considerado dialeticamente, portanto, mas especifi- camente 0 que tiver uma natureza contraditéria. Compreende-se, assim, 0 percurso da relagao de Marx com a dialética, as- sinalado por ele mesmo no importante posfacio da segunda edicao alema de O capital. L4, referindo-se certamente aos seus textos de juventude, ele diz ter criticado “o lado mistificador da dialética hegeliana ha 30 anos [...] numa €poca em que ela era ainda a moda do dia”. Depois, porém, quando “elabo- rava 0 primeiro livro de O capital”, aparentemente revoltou-se contra os “epigo- nos pretensiosos e medfocres” que tratavam Hegel como “cachorro morto” e “de- clarou-se abertamente discfpulo daquele grande pensador, flertando aqui e ali no capitulo sobre a teoria do valor com seu modo peculiar de expressio”*. Mas esta sua retomada dos méritos da dialética ocorre até antes da década de 1860: a carta a Engels, citada acima, pertence 4 época em que redigia a pri- meira versio madura da critica 4 economia politica (1858) e evidencia que a Légica de Hegel ja entao Ihe prestava grande servigo no “método de elabora- 40” do material’. Ou seja, depois das objecdes de juventude, que ressaltavam o aspecto erroneo e “mistificador” da dialética, o empreendimento da@Hiea ea. Dai perceber mea a economia politica como contraditéria, que podia por isso ser alvo de uma critica interna, isto ¢, aquela que aceita -inicialmente os princfpios e conceitos do que quer criticar ¢ os desenvolve, para i ". Esta inversio é, alias, o procedimento que define a dialética mesma desde Platao. Desse modo, nao é por simples repulsa & atitude dos “epfgonos” da cul- tura alema que ele se confessa “discfpulo” de Hegel, mas porque seu objeto de estudo e sua critica exigem tratamento dialético. Conforme a seqiiéncia do citado posficio: Em sua forma mistificada a dialética foi uma moda alemi, pois cla parecia transfigurar o existente. Em sua figura racional, ela é um escandalo e um hor- 6K, L, 27 (C11, 20). 7Além desta carta de 16 de janeiro de 1858, citada a nota 1 acima, em 31 de maio deste mesmo ano Marx novamente escreve a Engels, referindo-se a dialética hegeliana como “sem divida, a tilti- ma palavra de toda a filosofia”. Marx-Engels Werke, vol. 29, p. 329. A insisténcia demonstra que Marx deve ter estudado a [égica por todos esses meses. “rinterna” aqui se opée a critica de juventude da economia politica, que a rejeitava praticamente em bloco, em nome da alienagdo e da desumanizagao que ela pressupunha. Sobre o significado desta critica intema, cf. meu texto: “A crise na critica @ economia politica”, in Critica Marxista, n® 10, 2000, pp. 94-110. 28 @ A DIALETICA DO AVESSO ror para a burguesia e seus porta-vozes doutrindrios, porque ela inclui no en- tendimento positivo do existente ao mesmo tempo também o entendimento de sua negagdo, de seu declinio necessario, apreendendo cada forma passada no fluxo do movimento, portanto, conforme seu lado ef€mero; ela nao se deixa impressionar com nada, € critica e revoluciondria por natureza.” é ialética, por sua vez, porque é interna: @ontradigao. Além disso, o positivo, negativamente apreendido, é autonega- dor, explicitando daf seu carater “efémero”, sua determinag&o “no fluxo do movimento” e do tempo — por isso é “revoluciondrio”. Por outro lado, esta passagem permite j4 comegar a esclarecer o signifi- cado dos termos ‘@acionaljew*mistificador’ pelos quais Marx se refere ao “método que Hegel descobriu”. 0 lado “racional”’ ¢ o “eritico e revolucionario”, que “inclui no entendimento positivo do existente a0 mesmo tempo também 0 entendimento de sua negacdio”, isto é, que aponta a presenca do negativo na autonegacdo do positivo. Neste sentido deve ser compreendido 0 comentario sobre Stuart Mill, em que Marx diz: “tanto quanto € estranha para ele a ‘con- tradicao’ hegeliana, a fonte de toda a dialética, ele se sente 4 vontade em con- tradigées triviais””. Diferentemente de uma simples contradi¢ao formal, no Ambito apenas da légica do discurso, a contradigao a que Marx se refere como “hegeliana” é a dialética do real, que produz efetivamente tendéncias opostas. Porque nao percebe e nao reconhece esta tiltima, Stuart Mill a esca- moteia com um discurso harmonizador e af, sim, incorre em contradigGes, s6 que “triviais”. A contradig&o do real é a de tipo “hegeliano”, dessas maneira, de acordo com a qual uma certa realidade se constitui de modo autonegador €, com isso, autocritico. Até aqui Marx resgata o lado “racional” da dialética de Hegel. Mas assim como foi seu objeto de estudo, ¢ nao uma preferéncia filoséfica subjetiva, que Ihe impés tal resgate, € esse mesmo objeto que o leva a criticar 0 lado err6- neo daquele método. CGnifornieGinidalo ltextoldo jpostacioyaldialéticalhegeliana ‘usando aqui a mesma expressao utilizada na religiao para a “transfiguragio de “Cristo” (Verkldrung): trata-se da transposi¢ao de algo que esté na terra para 0 (@b. Sem diivida esta objegao alude ao cardter hiperbélico da dialética de He- ‘gel, que vé todo o real — natureza e espirito — como contraditério, enquanto 9K, 1,27 (C,11, 21). "°K, 1, 623, nota 41 (C, 12, 176, nota 41). CRITICA MARXISTA ¢ 29 ‘costuma ser interpretado o procedimento pelo qual a dimensao “racional” da dialética € depurada do “misticismo” hegeliano. O texto do posfacio diz sobre isso o seguinte: Meu método dialético é fundamentalmente nao sé diverso do hegeliano, como seu oposto direto. [...] A mistificagdo que a dialética sofre nas maos de Hegel nao impede de modo algum que ele tenha exposto suas formas gerais de mo- vimento pela primeira vez. de forma abrangente e consciente. Ela est para ele de cabega para baixo. Deve-se inverté-la [umstiilpen], para descobrir 0 caroco [Kern] racional no envolt6rio [Hiille] mistico." De acordo com este texto conhecido e, sem diivida, crucial, @@G(6(O(EAS0 _aquilo que dela se mantém em Marx. Trata-se de duas dialéticas distintas. Mais ainda, “nao s6 diversas”, como diretamente “opostas”.” Com isso, 0 assa a se definir como uma (GGRWEFSAG?, pela qual assume sua(@OSiGa0 -verdadeira. Se a “transfiguragao mistificadora” operada por Hegel esta associada a u “idealismo”; que na critica de Marx inverte a relago entre materialidade € pensamento”, colocando este tiltimo como produtor daquela, entio por a dialé tar corretamente vida material como produtora das representagdes mentais. Certamente, este significado da “inversao” da dialética aponta para uma in- terpretaco possfvel e fértil em conseqiiéncias, tendo sido o caminho tradicio nal seguido pelos comentadores da obra de Marx. O problema € que, nesta interpretagao, @IGuelseinvene uelapenasialor- - € seu contetido ou substrato efeti- @. Posta a vida material no lugar da idéia onipotente de Hegel, a mesma ope- "K, 1, 27 (C,11, 20-21). " Sobre a distingdo entre “diversidade” e “oposicao”, ver a segunda secao deste trabalho. ' © mesmo posfacio que venho citando diz: “para Hegel, o processo de pensamento, que ele até transforma num sujeito autnomo sob o nome de Idéia, é o demiurgo do real, que forma s6 sua man- ifestacao externa. Para mim, ao contrario, 0 ideal nada é seno o material transposto e traduzido na cabega humana". K, |, 27 (C, 11, 20). Cf. também a famosa Introdugao de 1857, em que define o “concreto” como “sintese de miltiplas determinagées”: Marx, K. Grundrisse der Kritik der Politischen Okonomie, Dietz Verlag, Berlim, 19/4, p. 21; a tradugdo brasileira no caso desta Introdugao foi publicada com o titulo “Para a critica da economia politica” na colegio Os econo- mistas, So Paulo, Abril Cultural, 1982, pp. 14-15. 30 * A DIALETICA DO AVESSO racdo descobriria contradigdes agora nas relagées sociais de produgao e nas forcas produtivas, € nao mais nos conceitos criadores. iVEHESENAIORIERIGO ial. Deste modo, porém, con- tetido e forma so separados e concebidos numa dicotomia nao-dialética, em que a “inversao” do contetido nao implica a da forma, como se ambos fossem aspectos indiferentes um ao outro, no relacionados. Neste caso, a dialética materialista nfo poderia ser chamada exatamente de dialética, e Marx teria construido seu materialismo mediante o sacrificio dela. Impée-se, pois, pensar dialeticamente todo o procedimento, de modo, que também a forma légica se altere com seu contetido real. De acordo com a interpretacdo de Fulda", neste sentido, o préprio termo utilizado por Marx para definir a “inversio” admite um significado um pouco diferente, tam- bém coerente com sua critica a Hegel. De fato, 0 verbo umstiilpen, empre- gado no texto do posfacio, pode querer dizer “entornar” um vasilhame, vird-lo para baixo e derramar 0 que contém — significado adequado ao ato de colocar de cabega para cima o que estava de “cabega para baixo”, confor- me a interpretagio tradicional. No entanto, 0 verbo se refere muito mais fre- qiientemente ao gesto de arregacgar a manga de uma camisa ou a boca de uma calga, pois vem do substantivo Stulpe, que designa justamente estas partes do vestudrio, bem como o cano de uma bota ou de uma luva compri- da. Assim, a “inversdo” proposta por Marx pode ser entendida como 0 ato de virar do avesso, ou melhor, desvirar do avesso algo que estava nesta po- sigdo trocada. Fulda propée a elegante metéfora de uma luva que, ao ser des- calgada, fica do avesso, eUnisHilpeniquenéizenicolocislajdorladojeerto. A imagem € boa, até porque condiz com a do texto de Marx, que falava de um ‘GEibigo cacionaly eysesstesenberte emmroateyseni supolidrioniticns ico: para extrai-lo, é preciso rasgar a casca e a came da fruta, expondo-o, e nao sim- plesmente volté-la para baixo. a Na metéfora da luva, quando ela é desvirada do avesso, o lado de fora, que havia ficado para dentro ao descalgé-la, volta para fora; e o de dentro, que estava para fora, volta para dentro. Para além deste aparente jogo de pa- lavras ha uma implicagao légica fundamental: segundo Fulda, A dialética especulativa, como pensava Marx, é uma inversio das relagGes reais, na medida em que explica o real [...] como mera manifestaco exterior, ¢ na medida em que afirma haver um lado interno das coisas; este lado é o essen- Fulda, op. cit. na nota 2, p. 27. CRITICA MARXISTA © 31 cial; e com isso toda a miiltipla e conflitante realidade forma uma unidade perfeita e harménica. ...] Esta dialética 6 adquirida — fraudulentamente - as custas da inversdo de todas as relagdes reais do interno e do externo, do uno e do miltiplo, da manifestacdo e da esséncia, do sujeito e do predicado.” Do mesmo modo que para Marx, para Hegel ha uma esséncia que se ma- nifesta na realidade exterior de forma diferente, até contraria ao que €, sendo necessdria uma “ciéncia” dialética e rigorosa para descobri-la e entender por que ela se exterioriza ao mesmo tempo em que se inyerte. S6 que a superficie de onde parte a “ciéncia” é diferente em cada autor, bem como a esséncia inter- na que ela alcanga. Melhor ainda, manifestacao e esséncia se definem inver- Samentelemicadaautor Por isso Marx diz que seu “método dialético” é 0 “oposto direto” do idealista. Para H@gél) a realidade teria umadigurapmiltis pla e conflitante” de coisas diversas e sé a dialética seria capaz de descobrir, por baixo desse caos aparente, a “unidade perfeita e harménica” da esséncia interior. Como seria possfvel uma férmula oposta? Segundo Fulda, ela decorre da avaliacao da filosofia hegeliana em geral que Marx vinha elaborando desde a juventude. Assim, se a dialética deves- se descobrir uma “unidade harménica” e conciliadora para além dos confli- tos e diferengas aparentes, ela teria uma fungao eminentemente apaziguado- ra — seria tudo menos critica. Olerrolprincipallde Hegel consistirialem “que ele apreende a contradigao dos fendmenos como unidade na esséncia, na Idéia’’"’, enquanto uma verdadeira critica deveria explicar a “contradicio dos fenémenos” através de uma contradicao ainda mais rica e profunda, essen- cial. De fato, é interessante recordar aqui o comentario sobre Stuart Mill, acima citado, em que WfaiRUiSigUelCOitnadigOes iia MeO GialétiGa: aquelas poderiam ser as aparentes na superficie do real, sob as quais seria preciso encontrar esta Ultima, isto €, uma contradigdo interna e essencial. Também é interessante retomar outro texto j4 mencionado (nota 10), que define o método materialista pela tarefa de estabelecer “no entendi- mento positivo do existente ao mesmo tempo também o entendimento de sua negacao”, ou seja, @Heontraramnegacaomo: existent positivamiente: lapreen> dido, determinando assim 0 positivo, aparentemente harm6nico. como resul- tado de sua prépria esséncia autonegadora, contraditéria. A “inversao” da dialética hegeliana por Marx consiste, portanto, em que as figuras légicas — as “determinagées da reflexao” de Hegel - “diferenga” e “{dentidade” esto em posigdes contrarias para cada um dos autores. A “mis- 5 Idem, ibidem, p. 206. 6 Marx, K. Friihe Schriften, apud Fulda, op. cit., p. 207. 32 # A DIALETICA DO AVESSO tificagio” idealista, tradicionalmente interpretada @6MO"penisar_que aqbase material da sociedade seria produzida pela superestrutura das representagdes mienitais, tem aqui ainda outro sentido, formalmente oposto iFia(olextemio\elaparente) determinada essencialmente, porém, por umattiiiidads ou “identidade” profunda e oculta que a dialética deveria revelar. Como re- sultado do procedimento de “inversao” materialista, por outro lado, extrai-se 0 “carogo racional”, sendo sua figura ]égica a descoberta da diferenga contra- ditéria e fundante de identidades superficiais. Oulsejayirctomandojaimetaforadayluya desvirada do avesso: em Hegel a diferenga estaria no lado de fora e a identidade no de dentro; enquanto em Mae, a0 contrdrio, a Aeitidadewelquelaparecemouladowerfora, determinada por uma @iferenigainoladowdeldentto. Se para Hegellalidenlidadeyeyoyiic> imento”ypreponderantejnajdeterminagdoydaydiferenga, para Marx, “inversa- mente”, é a diferenga que predomina sobre a identidade e a determina, mais dolqueliporelaldeterminada) Em outras palavras,ambas as figuras l6gicas Sendet@fifiinaim reciprocament®, conforme a exigéncia da dialética; mas 0 idealismo afirma que é a identidade que constitui o todo maior, englobando aidiferencajeyamresolvendo; enquanto o materialismo pensa, senao a prepon- derncia da diferenga, pelo menos que é irredutivel a qualquer unidade iden- titéria e conciliadora. Hegel teria o mérito de haver “descoberto” esta muitua determinagao de identidade e diferenga, que € a prépria contradigéio; mas “em seguida mistificou” esta relagéio Iégica, ao estabelecer que a identidade predomina para compor um @mundogunoyerpsuaydiversidadeyesconflitoyss aparentes. Mas ainda hd mais do que isso. O argumento de Fulda explica a transforma- co da dialética idealista em materialista a partir das consideragdes de Marx so- bre a filosofia hegeliana em geral, a partir das observacGes e objegdes metodolé- gicas que ele fez a essa filosofia desde seus escritos de juventude. E preciso ter em mente, porém, que @ielaboragaomdesumadialéticaymaterialistayseydéyprinci, palmente no contexto da critica interna & economia politica, realizada na obra de maturidade, conio vimos. Assim, oGUbStatojpatalatinyersao”*Wdardialéticaremuito mais especifico, reportando-sc & critica’ de Marx a concepgao hegeliana da socie- Gadercivil, tal como é exposta na Filosofia do direito. Esta critica, também for- mulada na juventude, s6 depois integra-se organicamente @ outra, interna, da economia politica. E com isso vemos como €6ilelGbjetomMeyestda que impés a Marx, conforme dito acima, o resgate critico da dialética de Hegel. Mais exatamente, @StaiultimaMoilviradaldGMaVvesso, porque pareceu@HSiis ciente a Marx a perspectiva hegeliana, pela qual a sociedade civil seria uma multiplicidade de caréncias individuais e tenderia ao desyurramento, se nao fosse a aga do Estado, efetivamente capaz de conciliar as pendéncias priva- aside \confetiraoitodotunidade politica. O elementomniversal, produtor ape- CRITICA MARXISTA © 33 nas de mais diferencas no “momento” da sociedade civil, 36 seria “posto para si” com o Estado, podendo dar coesao a um todo que entao aparece enquanto totalidade dialética. Avidentidade politica predominaria sobre as diferengas Privadas, embora as conservasse como sua base. Ora, a @bjecaomdeuviarm como sabemos, é que @alitimidade\estatall corte somicntelno plano juridico, nao conseguindo resolver no plano social os conflitos de interesse particular, que se determinam justamente no plano social. ASsimiyseyjuridicamentelalsocieda- de civil e seu Estado se articulam como um todo identitario, em que todos in- dividuos s&o iguais perante a lei, por outro lado essa identidade superficial, aparente, repousa numa desigualdade profunda, social, entre a classe dos pro- prietarios privados dos meios de produgao e a dos trabalhadores, “privados” dessajpropriedadeyistoysydelatexcluidos. Como na imagem da luva, em Hegel a diferenga inicial, externa, no plano da sociedade civil passa a uma unidade profunda, politica; enquanto em Marx a igualdade juridica, externa, se deter- mina pela desigualdade social, por diferengas e antagonismos essenciais. A diferenga social € que predomina sobre a igualdade juridica, sendo por- tantoGiffedtitivEha cla, no sentido de que qao\podesereliminadaenysoln- cidhadalpor Sewintemedi>. Mais ainda, a@esigualdadeysociab determina o préprio ordenamento juridico civil-burgués, na medida em que ele se baseia fia)propricdade|privada. F, uma vez que essa instituicgdo define as regras do intercambio comercial e dos contratos a partir do direito de que os indivi- duos se revestem enquanto proprietérios privados de mercadorias, é ela que estabelece as condigdes em que estes aparecem reciprocamente como iguais. Por seu turno Malligialdade permite a divieimovimentagaoldos recursos ima teriais e humanos, condigio sine qua non da acumulagao de capital. Fnfim, essa acumulacgao reproduz a situagdo social de diferenciacao entre trabalha- dores “livres”, juridicamente iguais a seus empregadores, e estes, propriet4- TIOSIEXClUSiVOS|G\EXCludentes|dosmeiosdelprodugao. Fecha-se um circulo de miitua determinacao entre a identidade externa e a diferenga profunda, mas é esse tiltimo “momento” que compée 0 todo. Toda essa engenhosa, interessante e extremamente fértil formulagao da complexa e espinhosa relagao entre a dialética idealista e a materialista, en- tretanto, também apresenta seus problemas. Em particular, a @Gneepgaolhe- geliana @ilaparece um tanto Simplificada) Realmente, o-caminho légico que parte da mera diferenga externa —a diversidade — para a identidade do funda- mentoyéspercorridoymediantesammegacdio: a diferenca passa a ser vista como oposicao, quando a @egatividadevexteriaqdostdiferentesyevinteriorizadayenn cada um deles: e 2 oposi¢ao se descobre resultante de uma contradi¢ao, pois a diferenga dos opostos é ela mesma determinada pela relaco entre eles, isto é, por sua unidade contraditoria. Assim, @UMOMENtOlessencialmaclsumialsin- plesidentidad® O conceito inicial de identidade —a coincidéncia de algo con- 34 * A DIALETICA DO AVESSO sigo mesmo — também se altera, passando a ser a coincidéncia consigo atra- vés do outro, 0 retorno a si que tem na oposicao com este outro um momen- to que ndo pode ser eliminado. _mo “momento” constitutivo, parte integrante de um todo formado por ele GHESHIOE POF SEMIS POSOGUS|EISINElAI® $6 que o outro continua como opos- to do primeiro, mesmo quando integrado a ele. Nesse sentido, Gadalumidos opostos é um todo que deve abarcar, contraditoriamente, sua negacio. Se algo consegue afirmar o que é apenas pela negacio necessdria do que nao é, entdo ele se afirma negando o outro que, porém, faz parte dele mesmo; ou seja, ele se afirma, negando-se. Nayoposicdowdespontayjayaycontnadigaoy figura ldgica ue se define na, or sua simultanea e mutua inclusdo e > Pi exclusio. tio, € 0 que os determina, que os afirma em sua oposigao. Bla ¢, para Hegel. criativa, viva: Algo é vivo apenas na medida em que ele contém a contradicao em si, € de fato, ele € a forga de abrigar [sich fassen] em si e suportar a contradigao. Quando um existente no consegue compreender [iibergreifi] na sua determinagao positiva "8 A férmula determinatio est negatio est na carta n® 50 da correspondéncia de Espinosa, escrita em 2 de junho de 1674 a seu amigo Jarig Jelles, a respeito da matéria e da figura dos compos. Cf. Espinosa, col. Os Pensadores, 2? ed., Sio Paulo, Abril Cultural, 1979, p. 293. Mais tarde, foi cita- da em varios livros de Hegel, como a Enciclopédia das ciéncias filosdficas (12 parte, § 91, aden- do), a Ciéncia da légica, (Livro | = a doutyina do ser=, 12 parte — qualidade -, cap. 2, A, b, obser- vacio) ¢ ainda as Licdes sobre histéria da filosofia (12 parte, 12 seco, cap. 1) 36 © A DIALETICA DO AVESSO ) 20 mesmo tempo a sua negativa, entio ele nao é a propria unidade viva, nao © fundamento, mas se afunda na contradicao. S6 como forga viva, que se determina contraditoriamente por sua determi- nacao positiva e também pela negativa, no conflito criativo das duas, é que algo € vivo e “funda” a partir de si outras coisas. O “fundamento”, portanto, nao € uma identidade simples desse algo consigo mesmo, mas € contradité- tio. Ele “se afunda na contradic¢ao”, mas nao pode por isso anular-se: deve fazé-lo, s6 para dai superar e repor continuamente a contradigao enquanto forga criadora, “fundamento”. Esse “afundar-se na contradigao” €, contudo, uma categoria légica preci- sa. Na oposicao, o lado positivo € 0 negativo referem-se um ao outro, ¢ assim cada um inclui seu outro como parte integrante de si. Por outro lado, nenhum dos dois se rebaixa a ser simples parte do outro; cada um s6 pode se definir como algo inteiro, um todo. De acordo com Theunissen, “eles contém um ao ou- tro como momentos e excluem um ao outro enquanto totalidade””. Ou seja, se, para 0 lado positivo, o negativo é apenas um momento a que ele tem de se referir, este negativo nao poderia ser, portanto, ele mesmo, uma totalidade da qual o proprio positivo seria sé simples parte componente. Para definir-se como algo — necessariamente algo inteiro —, 0 positivo nao pode se deixar re- duzir a “momento” da definigao de seu oposto. Daf que recuse a ele 0 estatuto de totalidade que reivindica para si proprio. E o mesmo vale, inversamente, para o ontro, Desse modo, a oposigao dos dois termos se apresenta como opo- A prépria Gomtadigae muda de figura, entio, na @ialéteadneweam@. dns mutuamente negativos, 4 ue So “EHS! MeSMOS CONtRATIEOTIOS. Eles incluem o outro como “HORIEHD @esimutwamenteexcludentes Na medida, porém, em que cada uma se deter- mina somente através da negaco da outra; na medida em que tudo, e nao s6 parte, do que cada uma é se define pela outra; nessa medida, @Xeluimaoutra my “Gitcaic), monegneto. © com isso, a @ontadi¢aoyaparecesplenamentexde- @@rmineealenquantoleontradigao : “para si” ou “posta”, e nao somente “em si”, de acordo com o “modo peculiar de expressao” de Hegel. B aqui que a con- tradigao “se afunda” e em que emerge como fundamento criador, vivo. Ela se 1 Hegel. Wissenschaft der Logik, Il, p. 59, apud Theunissen, op. cit., p. 319. 2 Theunissen, op. cit., p- 321. CRITICA MARXISTA # 37 “p6e” e, daf, se resolve contraditoriamente. Esta € sua defini¢ao completa na dialética idealista. E numa dialética materialista, como ela poderia ser definida? Diz Theunissen, num dos mais importantes estudos sobre o tema, que ‘miHe- ‘gel [...| 0 mesmo todo se separa em duas totalidades. Fundamentar desta . Pois ’”. Retomemos, por- tanto, a relacdo entre capital e trabalho na obra de Marx, base tanto de sua critica 4 economia politica como, dai, de qualquer discussao sobre suas concepgies légicas. Como vimos no item anterior, & primeira vista ogtraballiadonassalariadoye (Cieapitalistalsaojuridicamenteigials, por se defrontarem como (GHERAASHAS. Por outro lado, de acordo com as proprias determinagoes da cir- culagao de mercadorias, ambos aparecem numa oposi¢4o: um é proprietario de (GREG) que pagard como SAlAfiO, e o GutroNMalmeTeadoriatforeaMdeltrabalho, que venderd ao primeiro. Sua oposig&o decorre do fato de eles atuarem como portadores das @tias formas opostas|doWwalon —ticteadorialeMdinheito. De qual- quer modo, lembrando as figuras légicas da dialética, (Marx jalultrapassoulolnt- (velidajidentidadeyoujigualdadeyjuridica, alcancando o da diferenca dos opos- tos. Mas nessa esfera da circulacdo a forca de trabalho se apresenta como uma mercadoria em geral, oposta ao capital que aparece enquanto dinheiro em ge- talye ndo'especificamente enquanto capital) Nas palavras de Marx, contudo, © contrério mesmo do capital néo pode ser de novo uma mercadoria especifica, pois, enquanto tal, ela nao forma oposigao ao capital, j4 que a substéncia do pré- priv capital € valr-de-uso; ele ndo € esta ou aquela mercadoria, mas toda mer- cadoria. [...] Portanto, 0 tnico valor-de-uso que pode formar uma oposiciio ao capital € 0 trabalho.” Para explicar entio, por que na circulagdo o trabalhador € vendedor da Aqui ocorre a@esigualdade|decisiva, configurando uma oposi¢ao de capital e trabalho que determina todas as outras do sistema capitalista. *" Idem, ibidem, p. 327. lax, K. - Grundrisse der Kritik der Politischen Okonomie (aqui, a edigio do Marx-Engels Werke, vol. 42, a seguir citada como G, seguido pelo n® da pagina), Dietz Verlag, Berlim, 1974, pp. 182-183 38 ¢ A DIALETICA DO AVESSO (@eISEAPIA, num ato denominado por Marx degubordinagdopsformal’, aludin- dow formalidade da lei e do contrato, Essa forga de trabalho ¢ obrigada a pro- passando a ser nele incluida como seu @i0miéhto, como Gapitaliwatidveb E o capital se apre- senta como uma totalidade estabelecida formalmente, pela compra do trabalho vivo. Por isso, Theunissen observa que Maix@*aceitajajestruturahegelianayna >* Em outras palavras, mesmo tendo integrado a si a forga de trabalho, chamando-a de capital (varidvel), o capital s6 pode obrigé-la a produzir para ele se reproduzir na esfera da produgao o despojamento original, a desigualdade fundamental. Para isso, ele aparece en- carnado nos meios de produgao diante do trabalho vivo — sua parte constante oposta A parte varidvel —, “rebaixando-se” ele mesmo a momento da totalida- de maior que ele compoe com “seu outro”, 0 trabalho. bs i . 0 tra @alhowvivo; por outro lado, enquanto totalidade, ele inclui em si “seu outro” como capital varidvel. Ea mesma “estrutura” légica da oposigo contraditéria de Hegel, vista pelo Angulo de um dos termos, o capital. Mas com seu oposto, 0 trabalho, nfo ocorre o mesmo. Segundo uma pas- sagem importante e dificil dos Grundrisse, separagéo de propriedade e trabalho aparece como lei necesséria deste inter- cambio entre capital e trabalho. O quanto tal é: 1- L.lo trabalho separado de todo meiv de trabalho, de todo objeto de trabalho, de sua inteira objetividade [...] completo despojamento, @SStitUId de todagobje- (@ividade, pura existéncia subjetiva do trabalho. O trabalho como a pobreza abso- lua: aepobrezatnsoyenquantoycarencie, as (@Bjetiva. Ou ainda como o ndo-valor existente [...] 2- trabalho ndo-objetiva- do, ndo-valor, positivamente apreendido, ou negatividade referida a si mesma (..] lHGRIRORHGTEORTOTObjetosmasieomoyatividads: no como valor por si mesmo, e sim como a fonte viva do valor. [...] NEGRA@ENnOg Tal SumImcOntEa- (GBB; ou melhor, que cle seja a proposicaio de qualquer forma contradit6- ria, [em que ambos os lados — JG] condicionam-se mutuamente e decorrem % Theunissen, op. cit., p. 327 CRITICA MARXISTA # 39 diveseBnciarde trabalhortal:cotie ¢le:é.pressuposto coin o/oposte docapi- tal, como existéncia oposta do capital, e por outro lado, por seu turno pres- supde o capital.” Definido como G(SPOSOMOKAPIEAD 0 trabalho é Spostorcomoyomao=capi- @, isto ¢,@ABANSMAc=Objetivadd, givo. “Negativamente apreendido”, ele é “exclusdo completa da riqueza objetiva’”, sendo despojado dos meios materiais para produzir, ao se defrontar com a “riqueza objetiva” enquanto proprieda- de alheia que o domina. Dai que ele nao possa também incluir e rebaixar o capital a seu momento, compondo por seu lado uma totalidade. Em principio, ele deveria poder fazé-lo, j4 que “positivamente apreendido” o trabalho nao- objetivado aparece enquanto substancia, “como a fonte viva do valor [...] co- mo possibilidade universal da riqueza”. Além disso, ele & “sujeito e atividade”, ou seja, € relagéo consigo mediada pela relag&o com seu outro, com 0 objeto sobre 0 qual trabalha e que transforma. @GMOMCMESituMdoMeiodalobjetivi- dade”, porém, ndo tem como formar uma totalidade, rebaixando, no caso, 0 (C@pitalaiseummomento. Assim, como dizia Theunissen numa citacio anterior, “€86 0 capital, e nao o trabalho, que se poe como totalidade”. O capital, de qualquer forma, é contraditério em sua oposi¢ao ao traba- Iho assalariado. Numa bela passagem, Marx deixa isso claro, com uma meté- fora poderosa: O @SpHED tem um GPEISSIVTAD peculiar, o impulso a@eWalenzaelalenar (GSS, a sugar a maior massa possivel de mais-trabalho com sua parte constante, os meios de produgio. @iGapitaletabAalnOUNOHON uc CONENE- Os ~ trabalho morto -encamam 0 poder autonomiza- cumennn Nees > cnet ene ine mente elguantorpartererenquantoWotalidade de seu processo de constituicao; © @UfavesiMelesTorcapitaliseropseraoytrabalhowyivo, obrigando-o a produzir mais-valia, “sugando” sua atividade, sua vitalidade. Desse modo, 0 “impulso vital” do trabalho morto vem, na verdade, de seu outro, do trabalho vivo, pois S6 este produz valor. Na@iiagemldon vampire , a Gidaldoleapitaliacwen on Ginalmentedersimesmo, MaswalforgadeltrAaballio, cuja objetivacdo constitu ‘a substincia do valor das mercadorias, poist@PCHASESUSANCOMEbEINGNING? 0 “morto” retona a vida e nela permanece. Ao fazé-lo, porém, ele Ihe retira a vida "da qual, por outro Jado, depende. ¥G, 217-218, grifo do autor. K, I, 247 (C, 11, 189). 40 © A DIALETICA DO AVESSO Este impulso de exclusao determina a tendéncia de o trabalho morto negar 0 vivo, manifesta na tendéncia ao aumento da composigiio organica do capital. ‘A exclusao de seu oposto, no entanto, significa eliminar a “fonte viva do va- lor” de que vive o proprio capital, definido como valor que se valoriza. Se dei- xar de se valorizar, ele deixard de existir enquanto capital. EREIGIESEGNSpOSt implica, entdo, excluir-se de si mesmo, negara si proprio, contradizer-se. Na medida em que tal contradig&o se estabelece apenas pelo angulo do capital, porém, ela corresponde & primeira figura da logica he; elian; sei A contradigao “em si” — oposigao contraditéria. Pois Embora “substancialmente”, enquanto valor, o capital seja inteu titufdo pelo trabalho, formalmente ele o subordina de tal modo que 0 define Comoypobrezajabsolutal, despojado da propriedade dos meios de produgao e mera parte integrante de um todo maior. Formalmente o capital transcende o trabalho vivo, de modo que, ao negé-lo, afirma sua outra parte, 0 capital cons- tant, Embora seja contradit6rio que ele tenda a diminuir sua parte variével em favor da constante, com o aumento da composi¢ao organica, ele com isso ndo se elimina completamente, ndo se exclui totalmente de si ao excluir 0 outro que, formalmente, é sé uma parte dele. O capital nao “se afunda na contradi- do” inteiramente. Daf Theunissen afirmar (nota 23) que “fundamentar desta forma a contradicao é impossfyel para Marx”. Essa assimetria na relacdo entre capital e trabalho assalariado ¢ a forma assumida pela contradicao na dialética materialista. Em Hegel sem dtivida a esséncia nao € uma identidade imediata, como vimos no primeiro item; nem sequer correto dizer apenas que ela € uma identidade mediada, pois @0aS fiediacdes poderiam ser logicamente consistentes com ela. Ao contrario, suas mediagGes a contradizem, com 0 que a esséncia se constitui enquanto contradi- ao. Por outro lado, como esta contradigdo € plenamente desenvolvida, é “pos- ta para si”, ela é forma viva de um fundamento criador. Nao s6 se encontra na esséncia interna da realidade uma dimensio negativa, contraditéria, mas tam- bém, seSta MeSHAMesAcao, uma dimensao positiva, que “poe”, cria realidades novas. BitJMAEXp/pOreim, o aspecto positivo esté completamente inserido no egativo, subordinado a este, que € o predominante, pois a contradigao, de- terminada unilateralmente pelo capital, nunca se resolve de modo pleng. Por isso mesmo est4 afastada a pussibilidade de uma solugéo idealista para os conflitos no mundo do capital. E também por isso sua dialética € caracteriza- da como irredutivelmente “critica e revolucionaria”. CRITICA MARXISTA # 41 Mas por que, de qualquer modo, a estrutura Iégica da contradi¢aio mate- tialista nao pode passar de uma forma a outra, isto é, de “em si” a “para si”? sues peep Teens ataT EG? Certa- mente, nao devido a opgdes filoséficas pessoais, a uma necessidade talvez de coer€ncia com seu projeto materialista, que seria externa a seu objeto es- pecifico; mas sim devido a necessidade determinada por este objeto mesmo. Recapitulemos. O capital se constitui compondo uma totalidade apenas formal’com 0 tra- (GAIHGESSALAHAD, ¢ nao também substancial, pois a SSUBSANSIIONAlGr, con- forme a defini¢ao de O capital, € 0 @ABAINGUBSFALO . Daf ser este Ultimo que compoe substancialmente 0 todo, jé que o capital é valor que se valoriza. Ao excluir a possibilidade de que esse momento sc realize, isto ¢, de que o tra~ balho efetivamente o rebaixe a parte integrante, o capital est impedindo que a substancia apareca como o que é na verdade — a totalidade “do valor e da riqueza”. Ora, (GGBSHAGIA, que nao s6 se determina, como se autodetermina. ‘ ” signi- fica aqui o GORMMUCHES|SeIprojetata; movimento pelo qual ele apreende nao apenas sua existéncia substancial, mas também que esta, com suas especificagdes e particularidades, é fruto dele mesmo em seu processo de autoconstituicio. Mas 0 capital nao pode descrever perfeitamente tal movimento, porque ele nao é a verdadeira substancia. ela se define de fa- to como “atividade, negatividade referida a si mesma”, nas palavras dos Grundrisse citadas acima, aproximando-se da definig&o hegeliana de “‘sujeito”. ‘SeRMlespojadalWalpropHedAdEUOS“OLJEIGS, meios de producto. Seu caréter “subjetivo” vem da sua “pobreza [...] como plena exclusao da riqueza objeti- va”. Nao € esta riqueza, enquanto “substancia”, que se eleva 4 autodetermina- ¢ao, & posigao de um verdadeiro “sujeito”. Ao contrario, ela se coloca como © oposto da “atividade” que a cria, definindo-a como atividade vazia de obje- tividade, incapaz mesmo de existir por si propria enquanto atividade (SUBS em uma pura GiibjetividadeteimalpuralObjetividade. E esta tiltima, autonomizada enquan- to capital, subordina formalmente a outra parte, pretendendo por isso elevar-se a posicdo de “sujeito”, pois @ifeigaldeltrabalio Sore Ipostalem atividadeluande © capital a emprega, organiza e associa tecnicamente aos meios de producao. % K, 1, 52-53 (C, 1 1, 47-48), 42 #A DIALETICA DO AVESSO Daf ele se apresentar como ‘Siijeitommdomprocesso. Mas éléisomienterse a parte subjetiva da “substancia” que ele separou da parte objetiva. E por meio dessa separagao real e da conse- giiente subordinacdo formal do trabalho ao capital que ocorre © quid pro quod, a (iNeRseoRIoMMovimentowdialéticy, A forca de trabalho € uma “negati- vidade referida a si mesma”, isto €, uma @liGAGIeOnSigomnediataypelawelas (G40 com seu outro, com o objeto sobre o qual trabalha e que transforma. Mas esse objeto nao pertence mais a ela, de forma que ela retorna a si de mios va- zias. Por isso, se a forga de trabalho é uma “negatividade referida a si”, esse , da ci- sao na “substancia” que a impede de passar a “sujeito” e confere a seu opos- to essa condi¢ao formal. Por outro lado, devido a simples formalidade dessa sua condigio,Giapp ” no dizer de 0 capital”: enquanto “sujeito”, ele sera sempre inadequado a “substincia’, j4 que esta consiste nao nele mesmo, mas em “seu outro”. De acordo com Theu- cia”, que se torna “contetido” ao conferir a sia forma adequada de movimen- to. Mas esse nao € 0 caso no mundo capitalista, Entende-se, desse modo, que nem sempre 0 capital consegue presidir bem o processo pelo qual ele adota as formas necessarias para sua circulagao ~ mercadoria e dinheiro — ¢ para sua produgiio e reprodugao, gerando desproporcionalidades e, em geral, uma tendéncia crdnica ao desmedido, base de suas crises recorrentes. Além disso, totalidades sempre se excluem, portanto, mas jamais se incluem a ponto de configurat um mesmo todo, considerado de dois pontos de vista completa- mente superpostos, que é precisamente a definigao acabada da contradigao hegeliana, Para alcancar esse ponto, as totalidades, substancial e formal, de- veriam coincidir, Mas a substancial, do trabalho, nunca pode ascender acon- digdo de “sujeito”, atividade auténoma e autodeterminada, sob pena de des- ™K, |, 168-9 (C, 11, 130). 8 Theunissen, op. cit., p. 328. CRITICA MARXISTA * 43 truir 0 capital; ¢ @gtotalidadesformalycompostajporjestequlaimonersujeitoy apenas porque rouba a substancialidade do trabalho ¢ confere a ela um movi- mentosuma subjetividaderquedlheyalheia. Permanece, pois, uma diferenga irredutivel entre as duas e a contradicAo se constitui sé como formalidade e pelo lado do capital, jamais podendo se resolver num fundamento positivo. Ha assim uma oposi¢ao radical e insoltivel no fundamento da realidade capi- talista, que sempre se repde e apenas se oculta por tras de identidades super- ficiais. Aq@iiadequagaslerenica entre contetido e forma do capital repousa, por- tanto, na GHVEPSaS(AS|SUbStaNcialSISUjEilO, que implica a inversdo da posigao l6gica da identidade e da diferenga, de que tratou o item anterior. Ao contra- rio da dialética hegeliana, em Marx a contradigau profunda, apenas “em si”, nao se resolve porque consiste nao numa simples oposigdo entre substancia e sujeito, mas sim numa toreao em que a subjetividade € um poder alheio A substancia. Desse modo, por um lado, a @@iitradigaolimaterialistalconuinua! marcada pela diferenga, enquanto a idealista passa a se definir como funda- Hiento — contraditoriojlmas: positive. Por outro lado <@lusuRpagaeldalsubjete Vidadeldoliraballio|constitii ofetichismoldoleapital: como todo formal, Gitra- balho morto, objetivado, adquire uma vida artificial, atividade de empregar e OHARIZAROMMALAIHOWVIVO. Ou seja, inverte-se a relagéo de sujeito e objeto, pois a forca de trabalho é objetivada e 0 capital aparece como 0 sujeito. Essa torcao fetichista ¢ que define a dialética materialista, 0 “caroco racional” de toda a dialética, de que se desenvolve a concepeao inteira da obra de Marx, cujas repercuss6es sobre sua arquiteténica e seu modo de exposigao devem ser enfim examinadas. O que est em jogo aqui é, mais que tudo, o proprio diagnéstico marxista da sociedade burguesa. Conclusao: 0 fetichismo revisitado F a assimetria da oposigao contradit6ria entre capital ¢ trabalho assala- FGA que explica o movimento complexo da exposi¢ao das categorias pelas quais O capital descteve 0 processo contraditério efetivo. Tal como na rea- lidade do sistema capitalista, @SUGHMASmnIaIS bStAataS Sem prelscuintceram como momento das mais “concretas”, apresentadas depois e a partir delas, emborajambas|seloponhamdialeticamente. E mesmo com essa oposi¢io o nivel mais abstrato nao chega a configurar uma totalidade da mesma enverga- dura que o mais “concreto”, 0 que constituiria uma contradigdo “para_si” e fundaria um quadro categorial novo. Apesar de dialleticamentesallexposieao ter uma forma recursivo-progressiva, com 0 que vem depois sendo pressu- (posto do que vem antes, tanto quanto este é daquele, ha um dominio das for- mas mais ricas e complexas, nas quais as mais abstratas e iniciais nao sao eliminadas, mas redefinidas em seu papel. DAiGueleleaminholdalexposicap 44 © A DIALETICA DO AVESSO €ategorial seja o da “concre¢ao”, no sentido do “concreto enquanto sintese de iiultiplasideterminagdes!ycontraditorias, como diz a Introdugdo de 1857". ‘Assim pode ser entendida, por exemplo, a j4 mencionada @lagaolentte a/subsungao formal e a real do trabalho ao capital. A propriedade privada dos meios de produgao, juridicamente assegurada ao capitalista, exclui 0 trabalhador evojobrigarayvendersuasforeardetrabalho. Quando essa aliena- ¢4o penetra no proprio processo de produgao imediata, o trabalhador nao tem sequer o controle técnico desse processo, pois a ferramenta escapa de ‘sas maos e passa A maquina, para quem agora ele trabalha. Esse monopé- Tio do uso e do saber da técnica pelc capital nao invalida seu monopélio juridico também da propriedade sobre 0 meio de produgao; ao contrario, tem neste sua base. Pur outro lado, se a subsungio formal se realiza na es- fera da circulagéo da mercadoria forga de trabalho, a real se realiza como processo posterior na da produgao imediata. Mas ai, recursivamente, ocor- re a alienacdo entre trabalho e propriedade que funda a propria subsungao formal. Desse modo, esta passa a se definir como parte integrante da sub- sungao real. E a propria relacao em geral entre a esfera da circulacao e a da produgao sambémvobedeceraessailégica, As determinagoes ja da circulagao simples nao sio simplesmente anuladas pelas da producao capitalista, mas também nao sio mantidas como se a elas no se acrescentasse algo fundamental, isto 6, que Ihes dé um novo fundamento. F gaperadoljustamenteo contetido daci> EGIAGAOISIMIPIES) 0 objetivo de vender para comprar valores-de-uso, produtos que satisfacam necessidades de consumo. Masia circulagao simples existe dentro da capitalista, quando o que circula sao simples mercadorias € dinhei- ro, € ndo capital-mercadoria e capital-dinheiro; quando nao ha investimento, mas simples compra de bens de consumo pelos assalariados ou pelos capita- listas que também usam assim parte da mais-valia. Nao € que a circulagao simples seja mera hipétese irrealista, portanto mero pressuposto légico para desenvolver 0 conceito de capital; ela existe, embora de modo subordinado a Circulagaoyesprodugaoycapitalista, Com sua transformagao em momento de um processo maior, € dado a ela agora o papel de executar fases do movimen- to mais amplo. NaSIiamlsrrOyentaoyconstatar/sua existéncia, mas sim cons- tatar s6 sua existéncia, reduzindo os objetivos do capital a apenas atender a necessidades sociais de consumo. Daf que os principios constitutivos dessas duas esferas — a igualdade ju- #idiéa dos vendedores e compradores majeiteulagao c a @esigualdadey social entre trabalhadores e capitalistas@ajprodugao — tenha também a forma da contra- Texto jd mencionado na nota 12, com respectiva tradugao brasileira, CRITICA MARXISTA # 45 dicao “em si”. Acreditasseumuifasivezes que essa desigialdade anulelaquela igualdadewdefinindo-aycomoysinplespilusaopideol6gica Mas permanece o principio dartrocaldelequivalentes — suposto basico da circulaciio simples — nas compras e vendas das mercadorias que entram no processo de producaio do capital, admitindo-se inclusive, para se definir adequadamente a mais-va- lia, que especialmente a forca de trabalho é paga conforme seu valor. NIGSHO quando a reprodugao dos processos sociais de alienacdio e compra da forga de trabalho “inverte a lei burguesa de apropriacdo”, conserva-se essa relagaio en- trejasiduasiesferas) Marx diz, a esse respeito: © que aparecia antes como processo real e aqui como relagdo juridica, isto é, reconhecido como condicao geral da produgdo e, dai, legalmente reconhecido, posto [gesetz] como expiessav da vonlade geral —G@VEHEEITEVEIEES [zeigt nach], através de uma dialética necessdria. enquanto div6rcio de trabalho e propriedade e enquanto apropriagaio de trabalho alheio sem troca, sem equiva- lente.” Como vimos ao final do primeiro item, daqumajeontradicaojentreyalorbi- fa juridica'e/a social. Mas nao no sentido de que esta faria daquela uma ilu- ~av. A igualdade nao € apar€ncia iluséria da desigualdade verdadeira; € sua GREED Os homens se defrontam na esfera da circulagao j4 em situag6es sociais opostas, mas também ainda como possuidores de mer- cadorias equivalentes. SHali@WaldaaeleSielGESigleldade Sa lo pOstaSenquantO Processo superficial e processo subjacente, que no se invalidam mutuamente, configurando uma @iialidade que é 0 nticleo da apreensio da sociedade bur- guesa por Marx. Para entender sua relacao e decifrar a apar€ncia de igualda- de, é preciso ter em mente que, como a@iRSHlaGaSiSipalte Mol pROCeSsO gIObal, a igualdade é momento da desigualdade mais profunda, que necessita daquela apar€ncia: o trabalhador tem de ser “livre” para que 0 capital possa contraté- lo ou demiti-lo conforme os interesses de sua valorizacéo. O que € ilusorio € que s6 exista igualdade e liberdade, e nao também de- Sigdaldade. Explicar as relagdes sociais burguesas apenas ou principalmente como sendo de igualdade seria considerar 0 todo extrapolando o prinefpio vi- gente em seu momento ndo-fundamental. Marx acredita que’a igualdade'seja decisiva para distinguir 0 capitalismo dos outros modos de produgao em que sejobtém/ojexcedente\pela\coercao|violenta: Mas isso nao significa que ela seja o fundamento do sistema, baseado, antes, na desigualdade, esta sim de- terminante da igualdade no mercado. A critica é que apontar a igualdade como a caracteristica mais importante significa reduzir a relacdio entre capi- talista e trabalhador 4 de comprador e vendedor da forga de trabalho, quando *G, 421 46 © A DIALETICA DO AVESSO fealmente esta ultima relacdo s6 existe porque o trabalhador é desapropriado dos meios de producao. Tal desigualdade é que permite a situag’o em que aimnbostaparecemcomolsuais, em que o trabalhador vende a sua mercadoria em troca de uma soma de dinheiro a ela equivalente. Mesmo com a “inyerstiowdaplesburguesasdeyapropriacao, Gowpontomdewis> ‘ta da forma, da subsuncao formal, juridica, a situagao da troca de equivalentes eopreseryada. Uma forma decisiva para que 0 mercado aparega como o media- dor das relagées entre capitalista e assalariado, compelindo apenas economica- mente este tiltimo ao trabalho e, com isso, assegurando sua “liberdade” para poder ser desempregado ou transferido de uma ocupagao para outra, conforme a necessidade do capital. Nesse sentido, ajalienagaoysignificayqueyayformayda: apropriagao pelo trabalho ¢ da troca de cquivaicntes deve permanecer, embora Scjajoutrosseusconteido, E a “mistifieagao”, conseqiientemente, é que a forma parega adequada ao contetido. que a produgao capitalista se caracterize 6 pela igualdadeidosiagentes, definidos simplesmente enquanto vendedores e compra- dores em geral. A ilusao idéol6gica é, enfim, tomar a parte pelo todo. A forma légica da oposig’o contraditéria permeia toda essa apreensao da Sociedade burguesaipor)Marx, Ammbasjastinstancias — a fOritiaD da circulacdo e ag@eabda producao, a igualdadeyuridicajeadesigualdade\social=sao;opos- (@as, e nao simplesmente complementares; negam-se, mas também se afirmam “eciprocamente. Como, porém, a instancia formal € mero momento oposto € incluido da instncia real, que por outro lado a transcende, a contradigao se apresenta af apenas “em si” mesma. Para que ela passasse a sua segunda de- terminagio, contradig&o “para si”, a instancia real também deveria ser rebai- xada a momento da formal, que apareceria do mesmo modo como totalidade. S6 que, entéio, a contradic se resolveria dialeticamente, definindo-se como “fundamento” de outra realidade, numa 6@lUGA6|puramentelesicalqueloma> (EHALSHIGWESHSa. Nao haveria, assim, “mistificagdo”, pois@paktejeqoytodo Céincidiriam no duplo movimento que vai da forma ao contetido e deste 4 forma. Mas se sé a forma € parte € s6 0 contetido é todo, confundi-los é “mistificar” a sociedade burguesa através de uma “mistificacao” légica da identidade e da diferenca. Somente a diferenca, contudo, enquanto desigualdade social, € que @orma um todo, subordinando a si a identidade, enquanto igualdade juridica. Bporque a dialética idealista completa logicamente a passagem dessa contra- igao “em si” para a contradic&o “posta”, que ela acredita ser o Estado capar. lewresolverosiconflitosidajsociedadeyeivilyPor isso, e nao tanto por uma con- a ‘fustio de base material e superestrutura juridica, 0 idealismo nao possui 0 conceito de “ideologia”. REctSarSiialSelugabllsgicaaprecndendololcapita> Jismo conforme a primeira determinag&o da contradicio, que niio passa por si ‘mesma a segunda, implica, finalmente, encontrar 0 “carogo racional” da dia- ‘ética, desvirando do avesso seu “envoltério mistico”. CRITICA MARXISTA ¢ 47

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