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MANUEL

CASTELLS
LIBRETO
SALVADOR
COMO VIVER
JUNTOS

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MANUEL
CASTELLS
Expediente (Espanha, 1942)
Fronteiras do Pensamento©
Sociólogo espanhol. Um dos pensadores
mais influentes do mundo, sua obra é re-
Curadoria
Fernando Schüler ferência na discussão das transformações
Concepção e Coordenação Editorial
sociais do final do século XX.
Luciana Thomé
Michele Mastalir
“Não podemos pensar em nossas vidas fora
Pesquisa
Francisco Azeredo
da rede. A comunicação é o centro da vida.”
Juliana Szabluk

Editoração e Design
Lume Ideias

Revisão Ortográfica
Renato Deitos

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VIDA E OBRA
Atualmente, leciona na Universidade Aberta
da Catalunha, onde dirige o Internet Interdiscipli-
Nascido em Héllin, na Espanha, Castells é um nary Institute, é professor emérito na Universida-
dos pensadores mais influentes do mundo e o maior de de Berkeley e professor ilustre no MIT. Seu mais
analista da contemporaneidade quando se trata de recente livro, Redes de indignação e esperança,
movimentos sociais e do ativismo na era das novas relaciona as novas formas de comunicação da so-
tecnologias. Ele estava no Brasil, em junho de 2013, ciedade em rede, apontando caminhos para que a
quando eclodiram no País as primeiras ondas de ma- autonomia comunicacional das telas se expanda
nifestações nas ruas, que inicialmente reivindicavam à realidade social como um todo. Na edição brasi-
a redução nas tarifas de transporte público. leira desse livro, o autor incluiu um posfácio sobre
o Brasil e suas impressões das manifestações que
Com doutorado em sociologia pela Universidade
presenciou. De acordo com ele, “o que é irreversível
de Paris, suas pesquisas abrangem diferentes cam-
no Brasil e no mundo é o empoderamento dos cida-
pos – da política econômica às sociologias urbana e
dãos, sua autonomia comunicativa e a consciência
cultural. Professor nas áreas de sociologia, comuni-
dos jovens de que tudo o que sabemos do futuro é
cação e planejamento urbano e regional, investiga os
que eles o farão. Mobilizados”.
efeitos da informação sobre a economia, a cultura e
a sociedade em geral, e é o principal teórico da era da Em seus estudos, encontrou o poder destas re-
informação e das sociedades conectadas em rede. des na construção da sociedade contemporânea,
uma sociedade horizontalizada, que progride com
Sua obra virou referência obrigatória na discus-
base na interação. A informação e a comunicação
são das transformações sociais do final do século
são vetores de poderes dominantes, de resistência
XX. É autor de dezenas de livros traduzidos para
e de mudanças sociais. Ao mesmo tempo em que a
diversos idiomas, com destaque para a trilogia A
internet garante a comunicação livre, os conteúdos
era da informação, composta por A sociedade em
dessa liberdade dependem dos atores sociais.
rede, O poder da identidade e Fim de milênio. Em
A sociedade em rede, analisa a dinâmica social e Manuel Castells afirma que a sociedade é mo-
econômica na era da informação, buscando com- vida por um capitalismo informacional de caráter
preender as transformações que as novas tecnolo- competitivo, produtivo e tecnológico, capaz de
gias estão produzindo em nossas vidas. funcionar interconectado em escala planetária.

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IDEIAS
Membro da Academia Real Espanhola de Econo-
mia e Finanças, da Academia Europeia e da Aca-
demia Britânica, foi agraciado, em 2012, com o Prê- “A maior parte dos cidadãos do mundo não se sente
mio Holberg, concedido pelo governo da Noruega. representada por seu governo e parlamento. Partidos
Também recebeu a Medalha Erasmos, outorgada são universalmente desprezados pela maioria das pes-
pela Academia Europeia, e o Prêmio Kevin Lynch soas. A culpa é dos políticos. Eles acreditam que seus
de Design Urbano, pelo MIT. cargos lhes pertencem, esquecendo que são pagos pelo
povo. Boa parte, ainda que não a maioria, é corrupta, e
as campanhas costumam ser financiadas ilegalmente
no mundo inteiro. Democracia não é só votar de quatro
em quatro anos nas bases de uma lei eleitoral trapacei-
ra. As eleições viraram um mercado político, e o espaço
público só é usado para debate nelas. O desejo de par-
ticipação não é bem-vindo, e as redes sociais são vistas
com desconfiança pelo establishment político.”

“O fenômeno mais importante na sociedade atual


é a autonomia, a capacidade de a pessoa decidir a
sua própria vida, para todo mundo. O que mais nos
importa é decidir nossa vida – com nossas limitações.
A internet é uma tecnologia velha – foi criada em
1969 –, mas o mais importante é que ela é também
um produto cultural. Foi organizada a partir de valo-
res como liberdade e autonomia. Portanto, o tipo de
tecnologia em rede e o tipo de padrão cultural basea-
do na autonomia coincidem.”

“A vida na rede não é uma vida separada da inte-


ração física. Não vivemos mais em um mundo físico
ou virtual, mas num mundo híbrido. Todos estamos
na rede, mas todos não estamos só na rede.”

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ESTANTE

“O fundamental na sociedade de informação é


a capacidade instalada de passar da informação ao
conhecimento – e o conhecimento, à aplicação dos REDES DE INDIGNAÇÃO
conhecimentos, aos projetos pessoais ou profissio- E ESPERANÇA –
nais que tenhamos. O caos se produz quando você MOVIMENTOS SOCIAIS
não sabe o que procura. Quando você sabe, basta NA ERA DA INTERNET
organizar o caos.” Networks of outrage and
hope – Social movements
“A sociedade em rede é global, mas com carac- in the internet age
terísticas específicas para cada país, de acordo com 1ª edição – 2012 / Edição em
sua história, sua cultura e suas instituições. Trata- português – Zahar, 2013
-se de uma estrutura em rede como forma predomi-
nante de organização de qualquer atividade. Ela não
surge por causa da tecnologia, mas devido a impe-
rativos de flexibilidade de negócios e de práticas so- Neste livro, Castells examina os diferentes movimentos
ciais, mas sem as tecnologias informáticas de redes em massa que aconteceram no início da segunda década
de comunicação ela não poderia existir. Nos últimos do século 21, como a Primavera Árabe, os Indignados na
20 anos, o conceito passou a caracterizar quase to- Espanha e os movimentos Occupy nos Estados Unidos,
das as práticas sociais, incluindo a sociabilidade, a Islândia, Tunísia e Egito. O autor oferece uma análise
mobilização sociopolítica, baseando-se na internet pioneira das características sociais dos movimentos,
em plataformas móveis.” especialmente aquelas propiciadas pela internet.

“Hoje qualquer mensagem que se quer livre e au-


tônoma não passa por um partido ou por um jornal.
Se há uma mensagem que se conecta com outras
mentes conectadas na rede, então essa aceitação dá
início a um movimento. Os atores são coletivos, sem
burocracia, sem hierarquia, sem líderes.”

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A SOCIEDADE EM REDE /
A ERA DA INFORMAÇÃO:
A GALÁXIA DA INTERNET
ECONOMIA, SOCIEDADE E
The internet galaxy –
CULTURA – VOLUME 1
Reflections on the internet,
The rise of the network society /
business and society
The Information Age: Economy,
1ª edição – 2001 / Edição em
Society and Culture – Vol. I. português – Zahar, 2003
1ª edição – 1996 / Edição em
português – Paz e Terra, 2009

Baseado em pesquisas feitas nos Estados Unidos, O livro analisa a internet como espinha dorsal das
Ásia, América Latina e Europa, o autor busca formular sociedades contemporâneas e da nova economia mundial,
uma teoria que dê conta dos efeitos fundamentais da desvendando sua lógica, suas imposições e a liberdade
tecnologia da informação no mundo contemporâneo. que ela oferece. Apresentando muitos dados e pesquisa,
Neste livro, Castells esclarece a dinâmica econômica e Castells se afasta das prescrições e previsões para ajudar
social da nova era da informação. a compreender como a internet é o meio pelo qual nos
tornamos habitantes de uma rede global.

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NA WEB
O PODER DA IDENTIDADE
/ A ERA DA INFORMAÇÃO:
SITE OFICIAL
http://www.manuelcastells.info/en/
ECONOMIA, SOCIEDADE E
CULTURA – VOLUME 2 WIKIPEDIA
The power of identity / The http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Castells
Information Age: Economy,
Society and Culture – Vol. II.
1ª edição – 1997 / Edição em ENTREVISTAS
português – Paz e Terra, 2008
“A mudança está na cabeça das pessoas”
Entrevista concedida para a revista Época sobre os protestos
no Brasil e no mundo, publicada em outubro de 2013
http://is.gd/castells1
O conflito entre as forças tecnoeconômicas e os (http://epoca.globo.com/ideias/noticia/2013/10/bmanuel-castellsb-mudanca-esta-na-
cabeca-das-pessoas.html)
movimentos sociais são discutidos do ponto de vista da
construção da identidade na base do autoconhecimento
“A rede torna mais difícil a opressão”,
e reconhecimento como fontes de significado. O autor
diz Manuel Castells
aborda o processo de individuação, com linguagem clara e Entrevista para o jornal sobre a nova sociedade
direta, estimulando a reflexão sobre as condições de vida global, publicada em junho de 2013
do ser humano no mundo atual. http://is.gd/castells2
(http://zh.clicrbs.com.br/rs/entretenimento/noticia/2013/06/a-rede-torna-mais-dificil-a-
opressao-diz-manuel-castells-4164803.html)

“O povo não vai se cansar de protestar”


Entrevista para o jornal O Globo, publicada em junho de 2013
http://is.gd/castells3
(http://oglobo.globo.com/brasil/manuel-castells-povo-nao-vai-se-cansar-de-
protestar-8860333)

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“Dilma é a primeira líder mundial Redes de indignação e esperança
a ouvir as ruas” Castells divulga seus estudos e conclusões sobre os
Entrevista para a revista Isto É sobre a crise no Brasil em conflitos civis mundiais em conferência no Fronteiras do
2013, publicada em junho de 2013 Pensamento em junho de 2013
http://is.gd/castells4 http://is.gd/castells8
(http://www.istoe.com.br/assuntos/entrevista/detalhe/311021_ (http://www.fronteiras.com/videos/redes-de-indignacao-e-esperanca)
DILMA+E+A+PRIMEIRA+LIDER+MUNDIAL+A+OUVIR+AS+RUAS+)

Por um Brasil que desconhecemos


Se um país não quer mudar, não
Vídeo do Fronteiras do Pensamento, publicado em
é a rede que irá mudá-lo
junho de 2013, no qual Castells explica a dinâmica dos
Entrevista para o jornal Folha de S.Paulo sobre a internet e
movimentos sociais e analisa, de forma comparativa, as
o processo eleitoral brasileiro, publicada em setembro de 2010
manifestações no Brasil.
http://is.gd/castells5
(http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po2109201022.htm)
http://is.gd/castells9
(http://www.fronteiras.com/videos/por-um-brasil-que-desconhecemos)

A máquina humana
Entrevista para a revista Isto É sobre a trilogia Escola e internet: o mundo da
A era da informação, publicada em junho de 1999 aprendizagem dos jovens
http://is.gd/castells6 Vídeo especial com depoimento de Castells produzido pelo
(http://www.istoe.com.br/assuntos/entrevista/detalhe/31800_ Fronteiras do Pensamento em 2013
A+MAQUINA+HUMANA) http://is.gd/castells10
(http://www.fronteiras.com/videos/escola-e-internet-o-mundo-da-aprendizagem-dos-jovens)

VÍDEOS E LINKS Roda Viva


Entrevista concedida para o programa Roda Viva da TV
Manuel Castells: temos que criar seres humanos Cultura em julho de 1999
capazes de assumir o risco da liberdade http://is.gd/castells11
Artigo publicado no jornal espanhol La Vanguardia em abril (http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/141/entrevistados/manuel_castells_1999.htm)
de 2015 e reproduzido no site do Fronteiras do Pensamento
http://is.gd/castells7
(http://www.fronteiras.com/artigos/manuel-castells-temos-que-criar-seres-humanos-
capazes-de-assumir-o-risco-da-liberdade)

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ARTIGO

COMUNICAÇÃO AUTÔNOMA
E REINVENÇÃO DA DEMOCRACIA
POR MARIA CLARA AQUINO BITTENCOURT

Doutora e mestre em Comunicação e Informação


pela UFRGS. Pós-doutora em Ciências da
Comunicação pela Unisinos. Professora do Programa
de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da
Unisinos. É membro dos Grupos de Pesquisa Estudos
em Jornalismo (GPJor) e Laboratório de Investigação
do Ciberacontecimento (LIC), na mesma instituição.

O surgimento da sociologia como disciplina


ocorre em meio a transformações econômicas, po-
líticas e culturais, como as revoluções Industrial e
Francesa, que acarretam uma série de mudanças na
vida em sociedade. Os fenômenos sociais tornam-
-se objeto de uma ciência agora parte das ciências
humanas, e são investigados através do foco em
processos, relações e conexões entre indivíduos que
se agrupam sob diferentes formas. Desde então, o
conhecimento produzido pela sociologia avança os
limites da própria área, interessando outros setores
do convívio humano.

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Nesse sentido, o sociólogo espanhol Manuel era então professor de Daniel Cohn-Bendit, protago-
Castells vem construindo uma obra que pensa as nista daquela geração francesa de manifestantes.
relações de questões sociais da contemporaneida- Dessa época Castells traz seu interesse pelos
de com a tecnologia da informação, entrelaçando movimentos sociais e pelo poder de transformação
apontamentos sobre economia, política e cultura. A das massas através da articulação com a força da
abrangência de suas colocações é tão significativa apropriação tecnológica, o que o leva a inicialmente
para entender o contexto social deste século, que olhar para a sociologia urbana, no início dos anos
Castells foi apontado pelo Social Sciences Citation 1970. Enxerga em Touraine a figura de mentor, e as-
Index como o quinto estudioso das ciências sociais sim colabora para o desenvolvimento da sociologia
mais citado no mundo e o mais importante estu- urbana marxista, na qual os movimentos sociais
dioso citado no campo da comunicação, na primeira são pensados como elemento central na modifica-
década do século XXI. ção da cidade. Acaba, no entanto, transcendendo
Nascido em 1942, foi criado por uma família con- as estruturas marxistas nos anos 1980 e colocan-
servadora, em meio à Espanha fascista. Diante das do a informação e as tecnologias de comunicação
dificuldades da geração jovem espanhola, reconhe- como os eixos centrais de seus estudos.
cia, na época, a necessidade de resistir ao ambiente A trilogia The Information Age: Economy, Society
na tentativa de manter sua própria identidade, o que and Culture (1996, 1997, 1998) dá início a uma trajetó-
o levou a se politizar por volta dos 15 anos de idade. ria de publicações que torna Castells uma das princi-
Iniciou seus estudos em Direito e Economia em Bar- pais referências na pesquisa social. Os três volumes
celona, mas só conseguiu finalizá-los em Paris. Foi lá revelam o caráter visionário de suas pesquisas, mas,
que realizou doutorado em Sociologia, na Sorbonne, ao mesmo tempo em que o sociólogo não inibe seus
atraído pela possibilidade de estudar as mudanças textos sobre cenários possíveis, escapa com elegân-
sociais. Em 1966, foi nomeado professor-assistente cia da pretensão de determinar o futuro a partir dos
da Universidade de Paris, com apenas 24 anos, traba- dados. A ocorrência de uma revolução e a formação
lhando ao lado de professores como Alain Touraine, de um novo paradigma da tecnologia da informação
Henri Lefebvre e Fernando Henrique Cardoso. Foi no são os fios condutores que alinhavam temas como as
departamento onde trabalhava que explodiu o movi- convergências tecnológica e midiática. Ambas tão de-
mento que ficou conhecido como Maio de 68. Castells batidas hoje através de autores como Henry Jenkins,

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já eram tensionadas por Castells a partir da consti- cidando cenários políticos, econômicos, culturais e
tuição de sistemas altamente integrados, reunindo sociais pelo mundo.
microeletrônica, telecomunicações e computadores Focado na dinâmica social regida hoje pela for-
associados a sistemas de informação. O espaço de ça das redes de conexão através da internet, Cas-
fluxos é outro conceito fruto de The Information Age, tells não compartilha da visão que separa o es-
elaborado para pensar sobre as reconfigurações do paço virtual do espaço físico. Em referência a The
tempo e do espaço transformados pelo paradigma in- Gutenberg Galaxy (1962), obra em que Marshall
formacional. É até hoje utilizado com frequência por McLuhan já refletia sobre como a tecnologia da in-
diversos estudiosos de diferentes áreas. A construção formação impactava a cognição humana e a orga-
identitária no mundo globalizado e a interferência nização social, Castells publica The Internet Galaxy,
das relações de poder nessa construção ganham es- Reflections on the Internet, Business and Society
paço no segundo volume da série, enquanto o tercei- (2001). No conjunto de capítulos que inicia com um
ro dá conta de tratar sobre pobreza e exclusão social, resgate da história da internet, percebe-se com niti-
globalização, identidade e Estado em Rede, União dez seu posicionamento sobre a impossibilidade de
Soviética, a região do Pacífico Asiático e a Europa. dissociar-se a internet da vida real. Nessas páginas,
Uma trilogia longa, densa em dados numéricos, Castells mostra a formação de uma cultura especí-
que situa o impacto da tecnologia na vida social, fica do meio, a cultura da rede, destacando como os
reunindo apontamentos fundamentais para com- sistemas tecnológicos são socialmente produzidos.
preender mudanças que definirão boa parte do Essa interdependência entre a ação social e a
desenvolvimento humano ao longo do século XXI. tecnologia é recuperada em Communication Power
No decorrer dos anos, Castells navega pela história (2009), em que Castells concentra seus esforços em
de diversas nações, confrontando presente e pas- identificar por que, como e por quem as relações de
sado em estudos que avaliam e interpretam da- poder são construídas e exercidas através do ge-
dos de desenvolvimento sob a ótica da tecnologia. renciamento de processos de comunicação, e como
Não se trata apenas de um montante de números essas relações podem ser alteradas por atores que
e tabelas. Há densidade analítica e crítica em seus buscam mudança social através da influência sobre
escritos, que moldam qualitativamente o supera- a mente pública – ou dos públicos. Sua hipótese é a
bundante quantitativo de suas investigações, elu- de que a forma mais fundamental de poder se en-

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contra na habilidade de moldar a mente humana. era palco de protestos articulados em rede contra o
Como é através da comunicação que a mente inte- aumento da tarifa de ônibus.
rage com o ambiente natural e social, Castells apon- Networks of outrage and hope é resultado de um
ta como a comunicação medeia a maneira como as trabalho sobre movimentos que iniciam em mea-
relações de poder são construídas e modificadas em dos de 2009, cada um oriundo de conjunturas po-
todos os domínios da prática social, incluindo a prá- lítica e econômica particulares, mas todos com um
tica política. Neste livro, Castells define o conceito padrão comum que, para ele, tem nos ensinado o
de comunicação autônoma, com base na possibili- perfil da mudança política e social de nossas socie-
dade que a internet oferece de os indivíduos produ- dades. A ação comunicativa é a base dessas ações
zirem, acessarem e compartilharem conteúdos sem coletivas que figuram neste livro, de forma que a
mediação. Esse conceito é chave para entender sua internet, seus usos e desvios, são mais uma vez os
obra mais recente, que ajuda a pensar a constituição elementos centrais da argumentação sobre como a
dos movimentos sociais cada vez mais em rede, em estrutura em rede das sociedades interfere em suas
função de múltiplas apropriações tecnológicas. configurações políticas.
No Brasil, os protestos de junho de 2013 acon- Por fim, não há como dissociar o pensamento
teceram pouco depois de uma visita de Castells de Castells do conceito de midiatização. Como res-
ao País. Na época, a edição em português de Ne- salta o dinamarquês Stig Hjarvard (2012), há hoje
tworks of outrage and hope: Social Movements in uma permeabilidade entre mídia e sociedade que
the Internet Age (2012) ainda não havia chegado no não mais permite pensar a mídia como algo sepa-
País, mas o texto já era comentado no meio aca- rado das instituições sociais e culturais. José Luiz
dêmico das pesquisas sobre movimentos sociais. Braga (2012), um dos maiores nomes dos estudos
Em sua participação no Fronteiras do Pensamen- sobre midiatização no Brasil, entende que uma das
to em 2013, Castells destacou a necessidade, cada consequências mais significativas da midiatização
vez mais urgente, de refundação da democracia. na sociedade é o atravessamento dos campos so-
“Há lugares em que nascem utopias que tentam ciais (BOURDIEU, 1983). Vive-se um contexto em
se transformar em práticas sociais”, disse em sua que o campo midiático é legitimado por outros
conferência no Salão de Atos da UFRGS, sobre o campos para por eles se expressar. O que vivencia-
caso de Porto Alegre – que em março daquele ano mos diariamente através de usos e experimenta-

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ções da tecnologia informacional são eventos que ______. The Internet Galaxy, Reflections on the Internet, Business
and Society. Oxford, Oxford University Press, 2001.
determinam ações sociais e políticas que estimu- ______. Communication power. Oxford/New York, Oxford
lam a tentativa de subversão de uma lógica midi- University Press, 2009.
ática instaurada pelos meios de massa e baseada
______. Networks of Outrage and Hope. Social Movements in the
na distribuição unilateral de informação. Ainda que Internet Age. Cambridge, MA, Polity Press, 2012.
essa subversão não ocorra, em alguns casos, pelo
menos esse modelo de comunicação já desgastado HJARVARD, Stig. Midiatização: teorizando a mídia como agente
de mudança social e cultural. In: Revista Matrizes, ano 5. n. 2,
é colocado em discussão. A atuação dos movimen- jan/jun/2012, São Paulo.
tos sociais em redes e as inúmeras formas através
MCLUHAN, Marshall. The Gutenberg Galaxy: The Making of
das quais aproveitam a tecnologia da informação
Typographic Man. 1st Ed.: University of Toronto Press; reissued by
para a produção e circulação de informação são Routledge & Kegan Paul. 1962.
para Castells, além de objetos de estudo, as pos-
sibilidades mais próximas de reinvenção da demo-
cracia através da comunicação autônoma.

REFERÊNCIAS

BOURDIEU, P. Questões de sociologia: algumas propriedades dos


campos. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983.

BRAGA, J. L. Circuitos versus campos sociais. In: MATTOS, M.


A.; JANOTI JUNIOR, J.; JACKS, N. Mediação e Midiatização. Livro
Compós 2012. Salvador, Brasília. EDUFBA, Compós, 2012.

CASTELLS, Manuel. The Rise of the Network Society, The


Information Age: Economy, Society and Culture Vol. I. Malden,
MA; Oxford, UK: Blackwell, 1996.
______. The Power of Identity, The Information Age: Economy, Society
and Culture Vol. II. Malden, MA; Oxford, UK: Blackwell, 1997.
______. End of Millennium, The Information Age: Economy, Society
and Culture Vol. III. Malden, MA; Oxford, UK: Blackwell, 1998.

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