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Sistema Regional de Inovação: Um estudo de caso do Consórcio Público

para o Desenvolvimento do Alto Paraopeba – MG


Márcio Carneiro Reis – Marcelle Santos Vieira

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar as possibilidades de se constituir um Sistema


de Inovação nos municípios que formam um Consórcio Público no Alto Paraopeba,
considerando os diversos atores regionais e a prospecção que os mesmos argumentam para
a implementação de estratégias de desenvolvimento sustentado. A perspectiva da inovação
regional pretende um avanço consistente em formatos que ultrapassem as proposições
básicas até então pensadas e que estimulem novas vocações empreendedoras e comerciais,
em sinergia com a estrutura já consolidada e com as intervenções constantes em
planejamento futuro. Os principais resultados encontrados apontam para a relevância da
atuação do Consórcio Público, espaço privilegiado de governança, capaz de possibilitar,
além da cooperação, a geração de processos de inovação que atendam o maior número de
demandas dos diversos segmentos sociais e econômicos. Foi considerada também a
possibilidade de criação de uma cadeia de fornecedores que possibilite a inserção de
pequenas e médias empresas no mercado local, que atualmente é predominado por grandes
mineradoras e siderúrgicas. Além disso, foram visualizadas prováveis formas de
incrementar as atividades turísticas e ecologicamente sustentáveis da Região do Alto
Paraopeba.

Palavras-Chave: Sistemas de Inovação, políticas de inovação e Desenvolvimento Regional.

ABSTRACT

This study aims to examine the possibilities of forming an Innovation System in the small
cities that form a Public Consortium in Alto Paraopeba, considering the various regional
players and the prospect they argue for the implementation of strategies for sustainable
development. The prospect of regional innovation want a consistent advance in formats
that go beyond those basics propositions hitherto thought and stimulate new business and
entrepreneurial vocations, in synergy with the structure already established and with the
interventions listed in future planning. The main results show the impact of actions by the
Public Consortium, special area of governance, capable of providing, in addition to
cooperation, the generation of innovative processes that meet the highest of various social
and economic demands. It was also considered the possibility of creating a belt of suppliers
that allows the insertion of small and medium companies in the local market, heavily
dominated by large mining and steel companies. In addition, forms were seen likely to
increase tourism and ecologically sustainable activities in Alto Paraopeba.

Keywords: Systems of Innovation, innovation policies and Regional Development.


1. INTRODUÇÃO

Nos dias atuais, observa-se que as organizações buscam incessantemente conquistar


vantagem competitiva perante os seus concorrentes. Possas (2002) em sua análise acerca
da concorrência schumpeteriana, considerou que a dinâmica concorrencial é caracterizada
por um posicionamento ativo das empresas, tendo como premissa diferenciar-se dos seus
rivais por meio da introdução de inovações no mercado, com o objetivo principal de obter
lucros extraordinários.

De acordo com Johnson e Lundvall (2005), observa-se um novo tipo de competição, no


qual a criação de competências e habilidades voltadas para a introdução de inovações no
mercado torna-se um fator essencial para todos os atores nos mercados globais.

Segundo Hasenclever e Tigre (2002), a partir da introdução de inovações, as organizações


são capazes de transformar ou criar novos mercados, vislumbrando um universo de
oportunidades e margens de lucros cada vez maiores. Adicionalmente, o desenvolvimento
de estratégias de inovação por parte das empresas deve considerar as suas estruturas
internas, bem como suas interações externas com o sistema de inovação mais amplo no
qual se estabelecem.

Britto (2002) em sua análise acerca das formas de cooperação entre empresas descreveu a
respeito da crescente investigação em torno dos fatores que contribuem para o melhor
desempenho das organizações. De acordo com o autor, nota-se que existem vertentes de
variadas escolas de pensamento, que consideram a análise das relações entre empresas e
entre estas e as demais instituições, um enfoque mais relevante do que apenas a
investigação sobre a empresa individual.

Além disso, considera-se que a complexidade inerente às interdependências entre as


empresas e outras instituições, constitui um aprofundamento em relação aos temas
aproximados ao conceito genérico de rede de empresas. Dentre estes temas, convém
destacar os “Sistemas Nacionais e Regionais de Inovação baseados na especialização e
interação de diversos tipos de agentes envolvidos com a realização de atividades
inovativas” (BRITTO, 2002, p.346).

Tendo em vista as oportunidades oferecidas pelos Sistemas de Inovação para a promoção


do desenvolvimento econômico em diversas regiões, o presente artigo pretende investigar
como pode ser conformado um Sistema Regional de Inovação junto aos agentes instalados
em Minas Gerais, mais especificamente, entre os municípios que formam o Consórcio
Público para o Desenvolvimento do Alto Paraopeba, a saber: Belo Vale, Congonhas,
Conselheiro Lafaiete, Entre Rios de Minas, Jeceaba, Ouro Branco e São Brás do Suaçuí.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. Fundamentos da Inovação

Segundo Schumpeter, (1982) a inovação contempla cinco fatores, a saber: (I) introdução de
um novo produto ou de uma nova qualidade de um bem; (II) criação de um novo método
de produção; (III) abertura de um novo mercado; (IV) conquista de uma nova fonte de
matérias-primas ou de bens semimanufaturados, e (V) estabelecimento de uma nova
organização de qualquer natureza.

Em relação à atividade inovativa, Freeman & Perez (1988 apud FURTADO, 2006, p.183-
184), introduziram em uma teoria integrada, associada à tese das ondas longas, que foi
desenvolvida primeiramente por Kondratiev em 1926 e depois, aprofundada por
Schumpeter em 1939. Os autores definem diversas modalidades de inovação, quais sejam:

 Inovações progressivas ou incrementais que se dão de forma regular, com o objetivo de


aperfeiçoar os produtos e processos já existentes.

 Inovações radicais, que são eventos descontínuos. Estas inovações são de natureza
diferente das anteriores.

 Sistemas tecnológicos novos ou constelações de inovações radicais e incrementais,


relacionados entre si técnica e economicamente.

 Mudanças de “paradigma técnico-econômico”, que implica a força de destruição


criadora, essência da teoria de ciclos longos.

Lundvall (2001) destaca que deveria haver uma atenção maior para a constituição do novo
paradigma técnico-econômico, conforme abaixo:

Argumentar-se-á que, na elaboração dos novos sistemas tecnológicos visando a


enfrentar os problemas inerentes ao aprendizado da economia globalizada, áreas
como a social e a ecologia sustentada podem ser a chave para o próximo
paradigma técnico-econômico, da mesma forma como o engajamento dos
Estados Unidos na Guerra Fria desempenhou papel fundamental na criação da
base para a moderna tecnologia de informação global (LUNDVALL, 2005,
p.201).
Diante da percepção acerca do potencial da inovação para o desenvolvimento, pode-se
afirmar que a inovação se caracteriza pela junção entre o novo e o mercado, ou seja, está
completamente vinculada ao fato econômico. (SALERNO e KUBOTA, 2008, p.17).

Rosenberg (1979, apud FURTADO, 2006, p. 181-182) enfatiza a importância das


inovações que são advindas pelos usuários no processo de difusão de inovações. Propõe-se,
desta forma, os termos de learning-by-using em complemento ao de learning-by-doing,
que resulta da experiência acumulada de produtores. Considera-se um conjunto complexo
de transformações que envolvem produtores e usuários, inerentes ao processo de inovação,
a saber:

 Desenvolvimento de habilidades técnicas dos usuários (learning-by-using);

 Desenvolvimento de habilidades na fabricação de máquinas (learning-by-doing);

 Complementaridade entre diferentes técnicas dentro de atividades de produção;

 Aperfeiçoamento em paralelo da velha e da nova tecnologia, e

 Contexto Institucional.

Possas (2006) postulou que a inovação é o elemento preponderante para o caráter


evolucionário da concorrência, que por sua vez caracteriza-se na diferença, criação,
eliminação e recriação de “novas combinações”. Neste enfoque, a inovação surge como
uma tentativa da empresa ganhar força perante a concorrência e passa a ser buscada então,
nos segmentos em que a firma considera ter maiores chances de estabelecer vantagens
competitivas.

Cabe enfatizar ainda que as mudanças provocadas pelas inovações também alteram o que
pode ser uma vantagem competitiva e seu peso relativo. Desta forma, inovações adicionais
são induzidas e o processo como um todo também está sujeito às decisões tomadas
anteriormente. Possas (2006) ainda argumenta:

A história importa e é irreversível. Ocorre uma trajetória de dependência (path


dependence). Se uma firma introduz uma inovação, não se volta mais ao
ambiente que existia antes. Os determinantes mudam. Por isso, é impossível
estabelecer leis de mudança. No máximo, pode-se criar cenários plausíveis. Os
conhecimentos técnicos, organizacionais e do mercado que as firmas detêm
também devem evoluir, pois muitos vão se tornando obsoletos e novas fronteiras
devem ser abertas (POSSAS, 2006, p.22 e 23).
De acordo com Heller (2006), o conceito de path dependence parte do princípio de que
uma sequência de escolhas econômicas é condicionada pela situação criada por escolhas
anteriores.

De acordo com Nelson (2006) a vinculação entre a ciência e a tecnologia, originada há


cerca de cem anos, proporcionou o surgimento de laboratórios de pesquisas como o
principal local para o desenvolvimento de inovações (partindo das indústrias químicas e
elétricas para as demais). Este tipo de arcabouço institucional, formado por cientistas e
engenheiros, passou a se associar a determinadas empresas produtivas. Contudo, nem todas
as atividades e investimentos realizados por empresas em inovação são realizados em
laboratórios de P&D, sendo que a ocorrência destas atividades pode variar de ramo para
ramo. Muito do trabalho inovador, inserido em empresas pequenas ou nas dedicadas a
prover produtos para clientes individuais, pode não ser computado como P&D. Porém,
mesmo considerando estes casos, e nas atividades de P&D que se baseiam em fontes
externas, em grande parte dos ramos, os esforços mais importantes em inovação são
desenvolvidos pelas próprias empresas.

A partir de meados da década de 1970, iniciaram os debates relacionados à capacitação


tecnológica das nações mais desenvolvidas. Estas discussões foram desencadeadas pelo
baixo crescimento dos países mais avançados em termos de industrialização, que estavam
sendo ultrapassados pelo desenvolvimento intenso do Japão: um país que se consolidava
com grande poder econômico e tecnológico. Neste contexto, a atividade inovadora da
firma - foco central da análise do progresso técnico da abordagem schumpeteriana - passou
a ser concebida por uma visão sistêmica da inovação, a qual considera a ação coordenada
de diferentes atores (universidades, empresas, instituições financeiras e de pesquisa e
órgãos governamentais de políticas públicas) como aspecto preponderante para a conquista
de melhores performances pelos países (SBICCA e PELAEZ, 2006).

2.2 Sistemas de Inovação (SI)

A partir deste enfoque, surge então o conceito de Sistema Regional de Inovação, originado
a partir dos estudos acerca dos Sistemas Nacionais de Inovação e sobre os aspectos
relacionados ao desenvolvimento regional. Considera-se que os sistemas de inovação não
podem ser entendidos como fórmulas programadas, uma vez que estes assumem diferenças
consideráveis, em virtude de suas especificidades regionais e locais (MARCANTONIO,
ANTUNES JUNIOR e PELLEGRIN, 2006).
Ainda analisando a importância desse aspecto “específico” para a abordagem dos Sistemas
de Inovação, Lastres, Cassiolato e Arroio (2005, p. 36) fazem a seguinte consideração:

A abordagem de sistemas de inovação tem sido criticada por sua falta de


formalização. (...) argumenta-se que o desenvolvimento dessa abordagem jamais
intencionou reproduzir padrões convencionais de formalização. O objetivo
central foi o de elaborar um quadro de referência útil para analisar a dinâmica da
inovação. Esta abordagem não insere a inovação e os processos de aprendizado
em um modelo tipo “camisa-de-força”, desenvolvido com base na experiência
específica de um ou de alguns poucos países avançados. Tal modelo dificilmente
poderia ser reproduzido em outras economias do Norte, quanto mais do Sul.
Dessa forma, o que é tido por alguns como uma desvantagem é visto por nós
como importante elemento positivo por fornecer um referencial analítico flexível
e útil. Do pondo de vista específico dos países menos desenvolvidos, a utilidade
dessa abordagem reside precisamente no fato de que seus principais blocos
constituintes – a diversidade de atores sociais, econômicos e políticos, a
especificidade dos contextos, a abordagem sistêmica, a observância de
relacionamentos micro, meso e macro, etc. – permitem que as especificidades
locais sejam consideradas. De particular relevância é que este enfoque enfatiza a
importância da contextualização na análise do processo de aprendizagem e
capacitação. Aqui reiteramos que, na discussão sobre geração e uso de
conhecimentos relevantes para a economia, contexto importa e geopolítica, mais
ainda.

Segundo Sbicca e Pelaez (2006), um Sistema de Inovação pode ser definido como sendo
um conjunto de instituições públicas e privadas que atuam coordenadamente, contribuindo
para o desenvolvimento e a difusão de novas tecnologias. Argumenta-se que o SI “é um
instrumental de intervenção através do qual os governantes de um país podem criar e
implementar políticas de Estado a fim de influenciar o processo inovativo de setores, de
regiões ou mesmo de nações” (SBICCA e PELAEZ, 2006, p. 417).

Nessa rede de relações, destacam-se alguns atores fundamentais: as universidades e os


centros de pesquisa (os quais possuem como objetivo principal a pesquisa básica, que não
necessariamente se caracteriza por finalidade produtiva imediata), bem como o Estado e as
Empresas (estes últimos orientados a fornecer a pesquisa aplicada, destinada à promoção
de soluções ao setor produtivo). (SBICCA e PELAEZ, 2006).

Antes, porém, de conceituar acerca dos Sistemas Regionais de Inovação (SRIs), convém
destacar os conceitos relacionados aos Sistemas Nacionais de Inovação (SNIs), de onde
surgiram os principais trabalhos relacionados ao tema.

2.2.1. Sistemas Nacionais de Inovação (SNIs)

Albuquerque (1996), a respeito do Sistema Nacional de Inovação e sua aplicabilidade ao


caso brasileiro, propôs a seguinte definição a respeito de um SNI:
Sistema Nacional de Inovação é uma construção institucional, produto de uma
ação planejada e consciente ou de um somatório de decisões não-planejadas e
desarticuladas, que impulsiona o progresso tecnológico em economias
capitalistas complexas. Através da construção desse sistema de inovação
viabiliza-se a realização de fluxos de informação necessária ao processo de
inovação tecnológica (ALBUQUERQUE, 1996, p. 57).

O autor ainda define os arranjos institucionais que conformam um SNI, de acordo com a
descrição abaixo:

Esses arranjos institucionais envolvem as firmas, redes de interação entre


empresas, agências governamentais, universidades, institutos de pesquisa,
laboratórios de empresas, atividades de cientistas e engenheiros. Arranjos
institucionais que se articulam com o sistema educacional, com o setor industrial
e empresarial, e também com as instituições financeiras, completando o circuito
dos agentes que são responsáveis pela geração, implementação e difusão das
inovações (ALBUQUERQUE, 1996, p. 57).

Nelson (2006) comparou diversos modelos de Sistemas Nacionais de Inovação. Em seu


estudo, o autor delimitou os aspectos mais importantes que deveriam ser considerados para
sua análise comparativa entre os países, como: a alocação das atividades de P&D e suas
fontes de financiamento; as características das empresas, os papéis desempenhados pelas
universidades e as políticas governamentais voltadas para o estímulo e criação da inovação
industrial.

Comparando os modelos de SI do Brasil e da Coréia, verifica-se que nas décadas de 1960 e


1970, os dois países aceleraram seu desenvolvimento industrial, comandados por fortes
regimes autoritários e vultosos esquemas de investimentos financeiros. Mesmo diante
destas semelhanças, as duas nações seguiram caminhos diferentes. Na década de 1980, o
Brasil já tinha atingindo um nível de industrialização, caracterizado pela Segunda
Revolução Industriali. Por outro lado, a Coréia estava atrasada no que se refere à integração
de sua estrutura industrial. Todavia, a Coréia era mais avançada do que o Brasil, no que
tange ao âmbito social. A Coréia realizou o seu programa de reforma agrária e se
reestruturou educacionalmente. Por outro lado, no Brasil, a estrutura social manteve-se
caracterizada pela desigualdade e os investimentos no âmbito social e na reforma agrária
não foram realizados (SBICCA e PELAEZ, 2006).

Conforme destaca Araújo (2000), os anos 1980 foi marcado por uma mudança de
paradigma, no qual a matéria-prima “petróleo” é substituída pelo fator “conhecimento”.
Neste sentido, a revolução científica passa a comandar o cenário mundial e novos setores
surgem na dinâmica econômica global. A autora detalha a trajetória seguida pelo Brasil
neste contexto:
No Brasil, não acompanhamos essa locomotiva e passamos a década nos
debatendo na crise da dívida, transferindo poupança para o exterior, paralisando
o investimento, aprofundando a crise financeira do setor público e convivendo,
na segunda metade da década, com a ameaça constante da hiperinflação. Na
segunda parte da década, os choques estabilizantes se sucedem, cada vez mais
próximos um do outro. O curto prazo domina o cenário nacional. O governo, as
famílias, a maioria das empresas entram na lógica do curto prazo. O modelo
industrializante das décadas anteriores claudica, a ausência de investimento
degrada a infra-estrutura econômica, deteriora os serviços sociais, dificulta que
as empresas acompanhem os avanços que seguem se efetivando em outros países
(ARAUJO, 2000, p. 22).

Já no início dos anos 1990 toda essa situação foi agravada com o congelamento
discricionário de todos os ativos financeiros no Primeiro Plano Collor, demandando altas
taxas de juros. Com o processo de liberalização econômica, a incerteza em relação ao
futuro passou a ser ainda maior, refletindo a crescente pressão competitiva que foi
adicionada ao setor industrial e que exacerbou as estratégias defensivas do setor privado.
Somente a partir de 1992 que este cenário passou a se alterar, tendo a adoção de medidas,
como a redefinição do Estado na economia e suas conseqüentes políticas de privatização e
diminuição da regulamentação do governo, como motores para a mudança econômica
(SBICCA e PELAEZ, 2006).

Araújo (2000) postula que a década de 1990 se inicia com a mesma ótica do curto prazo
dos anos anteriores. Inversamente à postura adotada pelos países avançados, o Brasil
prosseguiu destruindo, mais do que construindo o seu aparato de produção de Ciência &
Tecnologia, essencialmente público. Esta realidade proporcionou maior atraso à nação.

A elucidação da trajetória brasileira nas últimas décadas, exposta acima, permitiu a


seguinte consideração:

Pode-se considerar que no caso brasileiro não houve ainda a formação de um


sistema nacional de inovação. Como se viu, dos três elementos fundamentais do
SNI apenas universidades e institutos de pesquisa formaram relações
promissoras com empresas estatais, se bem que elas acabaram sendo
enfraquecidas posteriormente, em razão de alterações nas políticas
macroeconômicas. O processo inflacionário presente ao longo da história
brasileira aumentou a incerteza já inerente a todo o processo de inovação e
prejudicou a tomada de decisões sobre inovações tecnológicas e gerenciais. Não
existiu na realidade uma política de C&T articulada com as políticas econômicas
adotadas pelo Estado. Estas últimas tiveram como objetivo a redução da inflação
e, ainda nos anos 1990, estavam voltadas para o alcance da estabilidade
econômica. Inexistiu a articulação com o meio empresarial, necessária para a
realização de programas de P&D e para estimular todo o sistema de inovação, de
forma a proporcionar resultados em produtividade e competitividade das
empresas nacionais e do país (SBICCA e PELAEZ, 2006, p. 442-443).
2.2.2 Sistemas Regionais de Inovação (SRIs)

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE (2009) afirmou


sobre a importância que os Sistemas Regionais de Inovação exercem no apoio à
implantação de políticas de inovação. Além disso, o desempenho inovativo que deles
emerge, pode contribuir para melhorar a economia competitiva global de específicas
regiões por meio do crescimento da produtividade das firmas. Importante destacar que os
objetivos das políticas regionais de inovação são relevantes para os atores políticos
provenientes dos campos de desenvolvimento regional e de Ciência & Tecnologia.

De acordo com Marcantônio, Antunes Júnior e Pellegrin (2006), designa-se como Sistema
Regional de Inovação (SRI) aquele conjunto de atores que tratam a inovação e a
competitividade pela ótica regional.

Theis, Matted e Meneghel (2006), num estudo acerca da contribuição da universidade para
o desenvolvimento de um sistema regional de inovação na cidade de Blumenau (SC),
afirmam que a abordagem acerca dos sistemas de inovação se refere a um sistema social
caracterizado pelo aprendizado e interação entre um determinado número de atores.

Os autores ainda destacam a importância da universidade Furb [Universidade Regional de


Blumenau] na conformação do SRI em Blumenau, a partir da constituição de quatro
instâncias que contribuíram fortemente para o desenvolvimento regional: (I) parque
tecnológico; (II) pólo de software; (III) pré-incubadora, e (IV) Instituto de Pesquisas
Tecnológicas. Entre as quatro instâncias citadas, apenas o projeto do parque tecnológico
logrou em insucesso, devido à falta de articulação entre os governos local e estadual. No
entanto, os demais projetos foram bem-sucedidos, com a participação direta da
Universidade Furb, contribuindo para que a cidade Blumenau viesse a ser considerada
como uma das principais desenvolvedoras de software do país.

2.3 Desenvolvimento Regional e Políticas de Inovação

2.3.1. Desenvolvimento Regional

Conforme é salientado por Araújo (2000), as importantes transformações que vem


marcando o mercado global nos últimos anos fornecem tendências que se tornam cada vez
mais hegemônicas:
Dentre elas, a tendência à globalização dos fluxos comerciais, produtivos, tecnológicos e
financeiros, sob o comando de verdadeiros “atores globais”. A enorme mobilidade desses
fluxos globalizados, auxiliada pela redução crescente dos custos de transportes e pela
revolução das comunicações, impõe novos desafios aos atores que operam em espaços
locais. A crise dos Estados nacionais é outro elemento importante do presente contexto, ao
mesmo tempo em que, com rapidez nunca vista, novos espaços locais (muitos deles
urbanos) surgem e se projetam, enquanto outros entram em crise ou se degradam
(ARAUJO, 2000, p. 25).

Neste contexto, a globalização tem se compatibilizado com movimentos de


descentralização, nos quais os espaços locais surgem com papel de destaque e as cidades
passam a ser reconhecidas como atores políticos relevantes, atuando como articuladores
entre os interesses da sociedade civil, o setor privado e diferentes instâncias do Estado.
Esta tendência descentralizadora possui como fundamento valorizar espaços locais como
espaços de poder, embora não seja essa a tradição brasileira (ARAUJO, 2000).

Marcantonio, Antunes Júnior e Pellegrin (2006) em seu estudo acerca dos modelos de
inserção de Ciência, Tecnologia e Inovação no desenvolvimento regional analisam as
constantes transformações que o ambiente mercadológico nacional tem sofrido nas últimas
duas décadas. Neste contexto de transformações intensas, os autores enfatizam a idéia de
Casarotto (1998) de que, para a promoção do desenvolvimento, três fenômenos precisam
ser destacados: (I) globalização/mundialização da economia; (II) regionalização social, e
(III) descentralização política.

Vale citar que os dois primeiros fatores são conflitantes entre si, uma vez que a
globalização promove o acirramento da competição em âmbito mundial, enquanto a
regionalização implica em estimular a articulação entre diversos atores, visando tornar as
empresas mais competitivas regionalmente. Já o processo de descentralização política
busca estimular e desenvolver, a partir do estabelecimento de objetivos comuns, a
formação de redes para cooperação entre atores de diferentes realidades locais e regionais.

Casarotto (1998 apud MARCANTONIO, ANTUNES JUNIOR e PELLEGRIN, 2006, p.1)


argumenta que uma coordenação territorial eficaz deve considerar: (a) diversos atores em
torno de um propósito; (b) envolvimento dos mesmos na fase de concepção do
projeto; (c) realização de projetos direcionados ao desenvolvimento local, e (d)
existência de um gestor que represente as intenções dos atores envolvidosii.
De acordo com Johnson e Lundvall (2005), os países em desenvolvimento se deparam com
imensos desafios, exigindo que eles observem que a elaboração de estratégias deve
abranger o aumento da competitividade internacionalmente de forma social e
ecologicamente sustentável. Neste contexto surge a preocupação com o desenvolvimento
do capital tangível, que pode ser ameaçado pela negligência conferida à sustentabilidade
ambiental. De outra forma, a utilização eficiente do capital intelectual possui dependência
do capital social. “Assim não é sustentável uma estratégia de desenvolvimento que focaliza
somente o capital produtivo e o intelectual” (JOHNSON e LUNDVALL, 2005, p. 88).
Portanto, a acumulação do capital produtivo não deve desgastar o capital natural, tampouco
o estímulo à acumulação do capital intelectual deve prejudicar a existência do capital
social.

Nesse sentindo é que Lastres, Cassiolato e Arroio (2005) argumentam que a capacidade de
inovação é bastante influenciada pelos aspectos inerentes ao capital socialiii. Isto porque o
sentimento de pertencimento de um grupo, que estimula a constante interação e cooperação
dentro de uma cultura local, são fatores que contribuem para a ocorrência da inovação.

Diante das inúmeras transformações impostas pelo novo contexto econômico mundial, o
aprendizado institucional, juntamente com o capital social, tornam-se aspectos de extrema
relevância para os países em desenvolvimento e a inovação exerce um papel de estímulo à
sustentabilidade, conforme salientado por Johnson e Lundvall (2005, p. 88-89):

A inovação pode ter um papel positivo no apoio à sustentabilidade. No que diz


respeito ao desenvolvimento de substitutos para recursos naturalmente escassos,
a inovação técnica pode, por exemplo, ajudar a lidar com o fato de que o capital
natural nem sempre pode ser reproduzido. De forma similar, a inovação e o
redesenho institucional – por exemplo, visando a reduzir a corrupção e a
aumentar a participação popular na implementação de programas de
desenvolvimento – podem contribuir para superar uma crise quando o capital
social é frágil. Em ambos os casos, é importante observar que a atuação
desimpedida das forças de mercado enfraquecerá as bases do crescimento
econômico. Tanto o capital social quanto o natural serão destruídos.

2.3.2 Políticas de Inovação

De acordo com Lundvall (2001), os formuladores de políticas estão cada vez mais
próximos da teoria econômica, tendo em vista que, ao longo da década de 1990, houve a
transição do foco da política científica com objetivos sociais amplos, para o foco da
política de inovações e o seu impacto no desempenho da economia. “Por isso é útil cotejar
as implicações políticas de diferentes abordagens teóricas com a inovação e o aprendizado”
(LUNDVALL, 2001. p. 201).
Em relação à crescente importância do papel do conhecimento e da transferência deste, na
captação do conhecimento global para a criação do desenvolvimento regional, faz-se
necessário que os governos se articulem em torno de estratégias nacionais específicas que
visem incluir políticas voltadas à absorção e transmissão do conhecimento (JOHNSON &
LUNDVALL, 2005).

Ainda segundo Lundvall (2001), como o processo de aprendizagem é socialmente


vinculado, as políticas de inovação também devem estar voltadas para a qualidade e
interação entre pessoas e organizações, tendo em vista que a busca pela competência por
parte das empresas se torna um objetivo legítimo.

Petit (2005) ainda considerou que importantes mudanças estruturais realizadas durante
muitos anos e específicas de cada país são objeto das novas políticas. Essas mudanças são:
(I) difusão das TICs (tecnologias de informação e comunicação); (II) investimentos em
educação efetuados pelos países, especialmente após a 2ª Guerra Mundial, e (III) crescente
envolvimento internacional entre países, impulsionado pela liberalização do comércio e
pela expansão do fluxo entre fronteiras de intangíveis. Alguns exemplos de políticas
podem ser citados para cada uma dessas vertentes descritas acima:

 (I) difusão das TICs  é de extrema importância assegurar que pequenas empresas e
consumidores menos favorecidos possam tirar proveito das novas tecnologias. Uma
opção é ligar a difusão das TICs com a educação da força de trabalho.

 (II) investimentos em educação  Petit (2005, p.143) considera:

A educação tornou-se um dado social importante, isto é, um objetivo importante


de realização pessoal para homens e mulheres. A educação gera competências
para usar equipamentos e serviços associados às TICs. Em um ambiente em
constante mudança, um objetivo importante para as políticas públicas é evitar
uma obsolescência muito rápida desse conhecimento. Outro objetivo é seguir e
tomar parte no desenvolvimento dessas tecnologias, o que requer uma boa
interação entre universidades e empresas e, mais especificamente, entre a
pesquisa pública e a privada.

 (III) internacionalização entre países  O processo de desregulamentação desde a


década de 1980 foi a primeira fase das transformações que ainda irão persistir:

Os Estados Nações têm agora em suas agendas de política a coordenação e a


harmonização das condições para acesso e uso da ampla rede logística
constituída por tais atividades. Essa agenda inclui o desenho de novos
regulamentos que se fazem necessários em razão do desenvolvimento das
transações de intangíveis, e nesse quesito o tema central é o direito de
propriedade intelectual (PETIT, 2005, p. 143)
Freeman (2005) ainda considerou que as novas ondas de mudanças técnicas e seus
condicionantes são pontos de partidas para o desenvolvimento de políticas tecnológicas e
econômicas efetivas, tanto na esfera pública, quanto na privada. Contudo, faz-se necessário
o constante ajustamento e reformulação dessas políticas, na medida em que forem impostas
mais mudanças. Ao mesmo tempo, a elaboração de políticas demandará informação,
conhecimento e compreensão dos sistemas relevantes, além de se ater para “a possível
necessidade de regulação política para limitar ou prevenir conseqüências sociais
indesejáveis de qualquer nova tecnologia” (FREEMAN, 2005, p. 60).

Lundvall (2001) chamou a atenção para a necessidade de um espectro mais amplo de


políticas associar-se à estratégia de acompanhar os desafios impostos pela economia do
aprendizado. Diante disso, os objetivos principais relacionados às políticas de inovação,
devem contribuir para: (a) capacitação das empresas e de firmas voltadas ao conhecimento
da população em geral e aprimoramento humano; (b) novas formas de organização; (c)
formação de redes, bem como aos novos papéis a serem desempenhados (d) pelas
empresas de serviços e (e) pelas universidades, como disseminadoras do aprendizado.

Além disso, uma alternativa que se coloca é implantar políticas de inovação que tenham
por objetivo sanar problemas causados pela aceleração da transformação. Os dois
principais problemas apontados por Lundvall (2001) são a polarização social e regional e
os riscos ambientais causados pela rápida transformação. Embora o aspecto de polarização
social e regional não seja um fenômeno novo na história do capitalismo, ele se dá
atualmente, devido às diferenças enraizadas ao longo do tempo no campo da educação e
capacitação. Por isso é que os sistemas educacionais deveriam ser adaptados à realidade de
cada contexto e deveriam ser formuladas políticas com vistas a estimular o acesso às
Tecnologias de Informação e Comunicação de regiões marginalizadas. No tocante aos
riscos ambientais causados pela rápida transformação, precisam existir maiores esforços
transdisciplinares e multitecnológicos, que exijam maior conhecimento dos grupos e
interações existentes.

2.3.3. Políticas de Sistemas de Inovação

Conforme salientado por Lastres, Cassiolato e Arroio (2005) a agenda para políticas
públicas e privadas de longo prazo tornou-se mais extensa e complexa. Em complemento,
as condições nacionais e locais podem levar a inúmeros caminhos, que demandam uma
multiplicidade de alternativas, e estas podem assumir diferentes formas e contextos. Tudo
isso implica não haver apenas uma solução e receita de políticas. Além do mais, a
consolidação do novo regime de acumulação financeira, resulta de mudanças político-
institucionais que conduziram os processos de re-regulamentação, privatização e
liberalização em todo o globo. Os autores ainda enfatizam a importância da dimensão
nacional dentro da abordagem dos sistemas de inovação, que pressupõe que a efetividade
das políticas locais é reforçada por sua articulação com as estratégias nacionais e até
supranacionais. Este argumento é contrário à suposição exagerada do aumento do papel
das instâncias locais e do chamado terceiro setor, em detrimento da importância dada ao
governo nacional.

Lastres, Cassiolato e Arroio (2005), em sua análise acerca da importância dos contextos
social, político e institucional, reforçam:

O processo de inovação é cumulativo, depende de capacidades endógenas e


baseia-se em conhecimentos tácitos. A capacidade inovativa de um país ou
região decorre das relações entre os atores econômicos, políticos e sociais.
Reflete condições culturais e institucionais, historicamente definidas. Nesse
sentido, a abordagem de sistemas nacionais de inovação reforça a tese de que a
geração de conhecimentos e tecnologias é localizada e está restrita às fronteiras
nacionais e regionais, o que se contrapõe à idéia de um suposto tecnoglobalismo.
A pretensa globalização do novo paradigma tecnoeconômico mascara a
existência de uma grande diversidade mundial de soluções locais e nacionais
para problemas econômicos e sociais (LASTRES, CASSIOLATO e ARROIO,
2005, p. 32).

Adicionalmente, para propor políticas e compreender a dinâmica do desenvolvimento


industrial e tecnológico, “é fundamental considerar e atuar sobre os condicionantes do
quadro macroeconômico, político, institucional e financeiro específico de cada país”
(LASTRES, CASSIOLATO e ARROIO, 2005, p. 40). Convém reforçar ainda a tese
proposta pelos autores de que a consideração de condições gerais para implementar
políticas se deterioram de forma significativa e que tal tarefa não é simples, uma vez que
lida com situações de alta complexidade.

Johnson e Lundvall (2005) postulam o fim da hegemonia do Consenso de Washingtoniv, no


tocante às políticas de desenvolvimento. A ênfase recaia sobre o equilíbrio
macroeconômico e a correção de preços relativos, além de ter o objetivo de definir uma
estratégia de desenvolvimento do tipo “best practices”. Embora as considerações
apontadas pelo Consenso de Washington sejam relevantes, elas devem ser
complementadas com inovações institucionais. “Quanto mais se enfatizam as instituições,
o conhecimento e as relações entre elas, torna-se mais óbvio que existem diferentes
caminhos de desenvolvimento e que cada país, até certo ponto, tem de desenvolver sua
própria estratégia” (JOHNSON e LUNDVALL, 2005, p. 84). No que se refere à crescente
importância do papel do conhecimento e da transferência deste na captação do
conhecimento global para a criação do desenvolvimento regional, faz-se necessário que os
governos se articulem em torno de estratégias nacionais específicas que visem incluir
políticas voltadas à absorção e transmissão do conhecimento.

Ainda conforme levantado por Johnson e Lundvall (2005), muitos estudos relacionados aos
sistemas de inovação mostram a existência de diferenças marcantes entre eles, no tocante a
padrões de especialização e estrutura institucional, revelando que esses contrastes se
originam de profundas raízes históricas. Diante deste argumento, os autores constroem
uma visão acerca do que seria necessário elaborar para obter uma boa estratégia de
desenvolvimento, baseada na abordagem de sistemas de inovação:

Uma estratégia de desenvolvimento baseada em uma abordagem de sistemas


nacionais de inovação teria como ponto de partida uma análise de todas as partes
da economia que contribuem para o desenvolvimento de competências e para a
inovação. Focalizaria as redes e as sinergias entre as partes que compõem o
sistema como um todo e, particularmente, tentaria identificar os pontos nodais e
as redes cruciais de estímulo e aprendizado. Tentaria também identificar as redes
e interações ausentes, reduzindo o desempenho inovativo da economia.
Universidades excelentes e um bom treinamento acadêmico são pouco relevantes
se o setor privado não tem conexões, diretas ou indiretas, com o sistema
universitário. Se as empresas experimentam grandes dificuldades em formar
redes e em cooperar para produzir e utilizar o conhecimento, pode ser de pouca
utilidade estimular o desenvolvimento de competências no âmbito de uma única
empresa. O antigo conceito gerencial de análise de forças, fraquezas,
oportunidades e ameaças pode ser utilizado aqui. As oportunidades e as ameaças
estão relacionadas à potencial equiparação com o desenvolvimento global,
enquanto forças e fraquezas incluem tanto a localização de aglomerações
produtivas fortes, quanto as conexões ausentes no sistema. É importante
considerar as rápidas mudanças no ambiente global e, portanto, elementos de
prospectiva tecnológica e social que podem auxiliar na localização de requisitos
associados à quebra de antigos relacionamentos e no estabelecimento de novas
interações (JOHNSON e LUNDVALL, 2005, p. 100).

Admite-se que quanto menor for a abrangência territorial e política de um Sistema


Regional de Inovação, maior serão as chances de geração de políticas de inovação que
possam atender as características intrínsecas de cada região. “Políticas regionais de
inovação podem ser estabelecidas a partir de características locais, levando em
consideração sua inserção nacional e internacional” (MARCANTONIO, ANTUNES
JUNIOR e PELLEGRIN, 2006, p. 4).
4. METODOLOGIA

4.1. Caracterização da Pesquisa

No que se refere à presente pesquisa, considerou-se a utilização da abordagem qualitativa.


Quanto aos fins, caracterizou-se como Pesquisa Descritiva. Em relação aos meios, foi
utilizada a metodologia de um Estudo de Caso.

O instrumento de pesquisa utilizado foi o método de entrevista semi-estruturada, que tem


por finalidade obter um maior grau de liberdade, em detrimento de uma entrevista
estruturada que visa à objetividade. Quanto ao procedimento de análise de dados foi
utilizado o método denominado Configuração Alternativa da Hermenêutica em
Profundidade, elaborada por Pedro Demo (2001). Este procedimento possibilita abarcar
também fases anteriores da pesquisa, como por exemplo, a utilização dos conhecimentos
obtidos por meio do referencial teórico e da formação histórica dos entrevistados na
interpretação dos resultados.

5. ESTUDO DE CASO

De acordo com a Revista CODAP (2010), o Consórcio Público para o Desenvolvimento do


Alto Paraopeba foi constituído oficialmente em 2006, com base na legislação federal que
regulamentou a formação de parcerias dessa natureza (Lei 11.107/05).

No entanto, a história da entidade teve seu início em 2003, quando representantes dos
poderes públicos locais começaram a articular um projeto inovador para as cidades
localizadas na referida Região. O principal interesse dos prefeitos e políticos que
participavam das discussões era buscar uma solução para a integração regional dos
municípios que tinham muito em comum, mas se distanciavam em termos de
administração pública e que por diversas vezes demonstravam indisposição de ordem
político-partidária entre si (REVISTA CODAP, 2006).

Atualmente, participam do Consórcio Público sete municípios, a saber: Belo Vale,


Congonhas, Conselheiro Lafaiete, Entre Rios de Minas, Jeceaba, Ouro Branco e São Brás
do Suaçuí. Estes municípios estão localizados na Região denominada Alto Paraopeba, no
Estado de Minas Gerais, e abrigam suas atividades em um entorno reconhecido
essencialmente por suas ricas características minerais, que lhe conferem enormes
oportunidades de crescimento econômico. Daí pode se ressaltar a relevante dependência
dos municípios da região em relação à indústria do ferro e do aço. A Figura 1 demonstra a
proximidade de localização entre os municípios supracitados.

Pode-se afirmar que os resultados da parceria entre os municípios por meio do Consórcio
Público, apareceram rapidamente, a partir dos avanços observados nas reuniões, além do
Governo Estadual ter sido receptivo à idéia e da intenção do Governo Federal em
transformar os consórcios tradicionais em públicos. As dificuldades, entretanto, não
deixaram de existir, pois algumas lideranças acreditavam que o consórcio era fruto de um
partido exclusivamente. Esta percepção foi sendo aos poucos modificada, quando as
lideranças passaram a perceber que a parceria não era de natureza partidária e sim para
promover o desenvolvimento regional integrado, na linha de políticas públicas, angariando
recursos, promovendo um ordenamento territorial e auxiliando em programas e projetos
para a melhoria da formação profissional dos trabalhadores, entre outros aspectos
(REVISTA CODAP, 2006).

No Referencial Teórico, fez-se referência à importância da conformação de arranjos


institucionais que dessem estabilidade às relações entre os atores participantes de um SRI.
Conforme salientado por Albuquerque (1996), esses quadros institucionais abrangem as
firmas, redes de empresas, governo, universidades, institutos de pesquisa, bem como
atividades de cientistas e engenheiros que se articulam com os sistemas educacional,
governamental, empresarial e financeiro, formando um conjunto de agentes que são
responsáveis pelo desenvolvimento de inovações.

Neste sentido, a conformação do Consórcio Público para o desenvolvimento do Alto


Paraopeba demonstra ser um importante passo nessa direção, pois cria o marco legal e
político institucional, capaz de organizar a ação conjunta dos setores públicos municipais
em prol da constituição e fortalecimento do Sistema Regional de Inovação na região do
Alto Paraopeba.

Contudo, este tipo de arranjo institucional é dependente da cooperação e da solidariedade


entre as partes envolvidas. A descontinuidade administrativa nos poderes públicos
municipais, neste contexto, torna-se uma grande ameaça ao arranjo institucional proposto
pela estratégia dos consórcios públicos. Esta ameaça pode ser minimizada, no caso dos
SRIs, pela valorização da participação de atores não públicos, como as empresas e a
sociedade civil organizada, além das universidades.
Adicionalmente, ações estruturantes, ainda no que diz respeito aos SRIs, a ampliação da
eficiência dos sistemas de educação e maior aproximação entre empresas, centros de
pesquisa e instituições de ensino superior podem proporcionar maior perenidade ao arranjo
como um todo e ao Sistema de Inovação em particular.

6. SÍNTESE DOS RESULTADOS ENCONTRADOS

Por meio dos resultados encontrados foi possível observar, entre inúmeras questões
relevantes, a importância que o papel do Consórcio Público exerce na Região do Alto
Paraopeba, na visão dos entrevistados. Alguns salientaram que a simples existência do
Consórcio Público e suas recorrentes ações, já configuram em uma inovação.

Importante salientar as variadas visões que os entrevistados expressaram sobre Inovação.


Enquanto alguns respondentes consideraram a inovação num sentindo amplo, outros
vincularam o conceito de forma restrita ao desenvolvimento técnico e ao campo do
conhecimento científico.

Merecem destaques algumas forças e oportunidades visualizadas, em relação aos


municípios que formam o Consórcio Público:

 A grande maioria dos entrevistados considerou a possibilidade de criação de uma


cadeia de fornecedores que agregue valor às atividades minero-siderúrgicas na região.

 Consolidação da Agenda 21v como processo de estímulo ao diálogo entre os atores,


com o objetivo de trazer bons resultados para o desenvolvimento regional. Foi inserida
a visão de que as iniciativas tomadas por esse tipo de cooperação podem contribuir, no
futuro, para que a atividade exploratória da região seja melhor recebida pela sociedade
local, tendo em vista as ações sustentáveis que são relevadas pela Agenda 21.

 Proposição de iniciativas voltadas ao fortalecimento e competitividade da agricultura


familiar, em detrimento da forte valorização conferida ao aspecto social do trabalho do
campo. Tal argumento pode ser concebido como uma excelente fonte para a introdução
de novas vocações regionais. Outras áreas foram citadas neste sentido: turismo voltado
para as riquezas ecológicas, culturais e religiosas; atendimento às demandas
tecnológicas das grandes empresas; aperfeiçoamento do setor de saúde de Conselheiro
Lafaiete, e criação de uma infra-estrutura de serviços para a cadeia produtiva do aço de
manutenção e de fabricação de equipamentos para a mineração.
 A Universidade local foi citada como possível indutora da cultura do
empreendedorismo nos jovens da comunidade, a fim de existir um espírito
empreendedor e assunção de um papel de articulação em torno de formação de
parcerias entre os diversos atores, em função da credibilidade que a entidade possui por
se tratar de um agente autônomo e imune às influências políticas.

 Contribuição da Metodologia DRS (Desenvolvimento Regional Sustentável), originada


de uma Instituição Financeira, para o fortalecimento da competitividade e introdução
de inovações na Região do Alto Paraopeba.

A seguir, serão relacionadas as principais ameaças e fraquezas inerentes aos municípios


que formam o Consórcio Público:

 Alto déficit educacional por parte dos estudantes locais, necessitando de


aperfeiçoamento do ensino básico.

 Necessidade de ter medidas compensatórias, devido aos prejuízos ao meio ambiente


ocasionados pelas atividades minerais exploratórias.

 Importância de uma maior integração entre as três esferas de poder: Local, Estadual e
Federal, uma vez que existe incompatibilidade política entre as três instâncias.

 Baixa capacidade da sociedade da região para aproveitar os vultosos investimentos que


já estão sendo injetados e os que ainda estão previstos a serem concretizados.

 A resistência à mudança e o modelo mental por parte da população local, bem como o
estilo de liderança política praticada na região podem ser entraves significativos à
constituição de um Sistema Regional de Inovação.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os principais resultados alcançados com esta pesquisa indicam que a constituição de um


Sistema de Inovação na região será de grande utilidade, especialmente no que se refere à
introdução de novas vocações econômicas entre os municípios que formam o Consórcio
Público para o Desenvolvimento do Alto Paraopeba, tendo em vista a grande
predominância das atividades de mineração e siderurgia no território. Além disso, pode-se
afirmar que a cooperação entre atores, fator fundamental para a conformação de um
Sistema Regional de Inovação é algo que já iniciou entre os municípios, tendo o Consórcio
Público como um dos principais pontos nodais neste contexto.

No entanto, existiram importantes limitações nesta pesquisa, relacionadas à


contextualização das trajetórias sociais e históricas dos municípios que formam o
Consórcio Público e, principalmente, faltou uma análise mais aprofundada da economia e
sociedade da região, visando aprimorar o estudo dos vértices do Sistema Regional de
Inovação e a necessidade de ampliar o número de atores a serem entrevistados.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FIGURA 1 – Municípios participantes do Consórcio Público para o desenvolvimento
do Alto Paraopeba
Fonte: Adaptado de Barbieri e Ruiz (2010).

i
Modelo baseado na utilização de energia elétrica, motores de combustão interna, aço e química pesada e,
ainda, com departamentos de P&D nas firmas (SBICCA & PELAEZ, 2006)
ii
Grifo dado pela autora deste trabalho.
iii
Capital Social pode ser entendido como um conjunto de hábitos e normas sociais que interferem na
confiança, interação e aprendizado de um sistema social (JOHNSON e LUNDVALL, 2005).
iv
De acordo com os autores Johnson e Lundvall (2005, p. 84) o Consenso de Washington adotava uma visão
de desenvolvimento orientado pelo mercado, que emergiu na década de 1980 e desdobrou-se em políticas
recomendadas por organismos internacionais como a OECD, o Fundo Monetário Internacional e o Banco
Mundial.
v
A Agenda 21 é um documento mundial, criado em 1992 na Conferência Eco-92, que contou com a
participação de cerca de 180 países. É uma carta de intenções que visa, por meio da participação dos vários
setores da sociedade, conciliar métodos de proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica.

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