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Dissertação de mestrado
Orientador: Prof. Dr. Walter Piva Rodrigues
RESUMO
ABSTRACT
1 “O reconhecimento dos direitos humanos de caráter econômico e social foi o principal benefício
que a humanidade recolheu do movimento socialista, iniciado na primeira metade do século XIX.
O titular desses direitos, com efeito, não é o ser humano abstrato, com o qual o capitalismo
sempre conviveu maravilhosamente. É o conjunto dos grupos sociais esmagados pela miséria, a
doença, a fome e a marginalização. Os socialistas perceberam, desde logo, que esses flagelos
sociais não eram cataclismos da natureza nem efeitos necessários da organização racional das
atividades econômicas, mas sim verdadeiros dejetos do sistema capitalista de produção, cuja
lógica consiste em atribuir aos bens de capital um valor muito superior ao das pessoas.”
COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 4ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2010. Pág. 66.
-9-
provocado a mudar seu papel no curso do processo. Sendo assim, todas as
perspectivas de restringir essa atuação seriam consideradas ultrapassadas.
Os últimos anos testemunharam significativa ascensão do Poder
Judiciário, principalmente no que toca aos Tribunais de sobreposição. Esse
crescimento serviu bem a democracia e ajuda no avanço do processo político e
social, promovendo os direitos fundamentais e resguardando o jogo democrático.
Nas palavras de Paolo Comanducci2, o constitucionalismo moderno
(denominado neoconstitucionalismo) deixa em segundo plano o objetivo da
limitação do poder estatal e passa a dar ênfase à necessidade de garantir a
efetividade dos direitos encartados na carta da república, flexibilizando a rígida
concepção de separação de poderes.
Bruce Ackerman em seu artigo publicado na Harvard Law Review
The new separation of powers3 esclarece que o princípio da separação de
poderes (cláusula pétrea na Constituição brasileira) dispõe de três ideais
legitimadores. Primeiro, a separação de poderes deve servir ao projeto de
autogoverno popular. Segundo, a necessidade de evitar que as leis democráticas
restem puramente simbólicas (o que inevitavelmente ocorrerá se não houver um
judiciário que possa implementá-las imparcialmente). E terceiro, a proteção e
aprimoramento dos direitos fundamentais. Sem esses três nortes a democracia se
mostra evidentemente inútil.
Cabe esclarecer, conforme destaca Cass R. Sustein4, que garantir a
plenitude desses direitos não significa um iludido alinhamento com os movimentos
sociais. Nesse delinear, emerge a ideia do instituto jurídico do ativismo judicial, de
modo a trazer à baila suas características principais, bem como eventuais
classificações julgadas relevantes para o enfoque do presente trabalho.
Pois bem, traçado o mapa dissertativo, cumpre apontar certos
parâmetros que justificariam a propositura do tema apresentado. O dilema
2
COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: un análisis metateórico. Tradução
de Miguel Carbonell. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalimo(s). Madri: Trotta, 2003
3
Disponível em:
http://www.palermo.edu/derecho/eventos/pdf/Ackerman_The_New_Separation_of_Powers_HLR.p
df. Acesso em: 21 de abril de 2012.
4
SUNSTEIN, Cass R. A Constitution of Many Minds: Why the Founding Document Doesn't Mean
What It Meant Before. Princeton: Princeton University Press, 2009.
- 10 -
apriorístico é o da plausível e salutar tensão entre o protagonismo judicial e a
integridade da democracia.
Essa dialética, acima destacada, ora se apoiará na efetiva divisão
dos poderes, tal qual imposta pela Constitucional de 1988, delineada nas linhas
da carta da Revolução Francesa, e outrora na necessidade de efetivação,
sobretudo pelo Judiciário, dos direitos e garantias também elencados nos
diplomas citados.
Outro enfoque da presente dissertação consistirá na análise e crítica
de eventual associação entre mutação constitucional e o ativismo judicial, sendo
essa mutação, por vezes, a afirmação da integridade social, como fora lançada
por Ronald Dworkin5.
Sendo assim, restará ao presente trabalho, da mesma forma, a
análise da judicialização da política e suas consequências.
Importante destacar, igualmente, que, em que pese as origens do
ativismo judicial estarem montadas no neopositivismo, conforme bem veremos em
capítulo próprio, sua expansão se deu em virtude da busca pela eficiência
processual. A ideia se sustenta em traçar um paralelo entre a chamada terceira
onda renovatória, proposta por GARTH e CAPPELETTI em Acesso à justiça6.
Em verdade, o que se buscará afirmar é que a eficiência processual,
qual seja um dos pilares do processo moderno, não é apenas um de seus
instrumentos, mas sim um paradigma do processo civil.
Enfim, o estudo pretende analisar os reflexos do ativismo judicial no
processo civil brasileiro, sua necessidade e seus limites, pois é ante essa
conjectura que se pode chegar ao ponto de equilíbrio necessário ao sistema. O
foco é o de resguardar a possibilidade da atuação jurisdicional ativista e gestora
das lides que lhes são postas de maneira eficiente.
5
OLIVEIRA, Larissa Pinha de. Parâmetros Hermenêuticos da Mutação Constitucional. Dissertação
de Mestrado em Direito na PUC-Rio. Disponível em: http://www.maxwell.lambda.ele.puc-
rio.br/17610/17610_1.PDF. Acesso em 11 de março de 2013.
6
CAPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988.
- 11 -
2. O SURGIMENTO DO ATIVISMO JUDICIAL
NEOCONSTITUCIONALISMO
7
CUNHA Jr., Dirley da. Controle de Constitucionalidade. Teoria e Prática. Salvador: Jus Podvm,
2006. Pág. 21.
8
TRINDADE, José Damião de Lima. Anotações sobre a história social dos direitos humanos.
Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/direitos/tratado1.htm.
Acesso em: 10 de março de 2013.
- 12 -
No entanto, afirmam os autores que as premissas do sistema
constitucional (constitucionalismo primitivo) surgiram com o advento das primeiras
sociedades. Nessas coletividades não havia cartas legais escritas, em sua
maioria eram regidas por seus usos e costumes, com o estado fortemente ligado
a convicções religiosas.
A doutrina majoritária costuma citar também o povo hebreu como
exemplo de precursores do constitucionalismo. Conforme se pode verificar na
obra de André Ramos Tavares9, as lições de Karl Loewenstein indicam que os
hebreus já possuíam um “Estado” teocrático limitado pela Torah. Os Juízes (como
eram chamados os governantes) tinham que seguir as disposições da Torah (Lei
de Deus). É nesse sentido que o autor alemão vê, nesse caso, um introito do
Constitucionalismo.
A formação da cidadania e dos direitos dos cidadãos teve seu
gérmen nas sociedades gregas. Sócrates, ao colocar o homem como a medida de
todas as coisas, valorizou a necessidade de limitação do governo pela lei. Esse
conflito fica evidente ao dizer que é necessário que os homens bons sigam as leis
más, para que os homens maus sigam as leis boas10. Por outro lado, Platão e
Aristóteles11 afirmavam a criação de uma teoria de governo até hoje seguidas por
nós, a qual contribuiu para a posterior afirmação do constitucionalismo.
Por fim, vale destacar a definição histórico-descritiva de J. J. Gomes
Canotilho sobre o constitucionalismo, na qual quer se enfatizar o movimento
histórico do constitucionalismo inserido no contexto filosófico da modernidade,
livre de aspectos valorativos ou apropriações ideológicas, in verbis12:
9
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010. Pág. 5.
10
VAQUERO, Humberto Lúcio Menezes de. O direito constitucional à razoável duração do
processo e seus reflexos nos direitos humanos e fundamentais. Dissertação de mestrado.
Universidade de Fortaleza, 2010. Disponível em:
http://www.uol01.unifor.br/oul/conteudosite/F1066349535/Dissertacao.pdf. Acesso em: 05 de
março de 2013;
11
ARISTÓTELES. Política. Tradução de Mário da Gama Kury. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 1997.
12
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Livraria
Almedina, 1997. Pág. 45-46.
- 13 -
meados do século XVIII, questiona nos planos político, filosófico e
jurídico os esquemas tradicionais de domínio político, sugerindo, ao
mesmo tempo, a invenção de uma nova forma de ordenação e
fundamentação do poder político. Este constitucionalismo, como o
próprio nome indica, pretende opor-se ao chamado
constitucionalismo antigo, isto é, o conjunto de princípios escritos ou
consuetudinários alicerçadores da existência de direitos estamentais
perante o monarca e simultaneamente limitadores do seu poder.
Estes princípios ter-se-iam sedimentado num tempo longo - desde
os fins da Idade Média até ao século XVIII.”
13
Disponível em: http://www.archives.gov/exhibits/charters/bill_of_rights.html
14
Disponível em: http://www.constitution.org/eng/habcorpa.htm
15
Disponível em: http://www.constitution.org/eng/petright.htm
- 14 -
Ao falarmos das influências francesas no constitucionalismo,
importante citar os ditames do abade liberal Emmanuel de Sieyès16. O autor foi
um dos grandes impulsionadores do movimento constitucionalista. Pouco antes
do início da revolução francesa, publicou sua obra “Qu'est-ce que le Tiers-État”
(Quê é o Terceiro Estado?), na qual proclamou a existência de um poder
intrínseco à nação ao povo.
Esse poder, que emana do povo, estaria acima do poder
anteriormente constituído (monarquia), trata-se do poder constituinte. Sieyès
legitima, portanto, a ascensão do terceiro Estado (o povo) ao poder político,
delineando as premissas do constitucionalismo.
Na conjuntura do constitucionalismo moderno é impossível fugir da
temática do positivismo. O movimento positivista, proclamado por Auguste Comte,
se instala numa sociedade marcada por transformações históricas.
Trata-se da sociedade pós-revolução francesa, em evidente
transição do feudalismo para o capitalismo, do absolutismo para o
constitucionalismo, nos seus entremeios borbulham acirradas revoluções sociais,
como a francesa e a revolução industrial inglesa.
Com efeito, foi essa transformação social que impôs uma mudança
no sistema jurídico-político. As ideias de poder natural desfizeram-se na queda do
16
“O quê é o terceiro estado? Tudo. O quê tem sido ele, até agora, na ordem política? Nada. (...) O
quê é preciso para que uma nação subsista e prospere? Trabalhos particulares e funções
públicas. (...) Os trabalhos (particulares) que sustentam a sociedade (...) sobre quem recaem?
Sobre o Terceiro Estado. As funções públicas (...) seria supérfluo percorrê-las detalhadamente
para mostrar que o Terceiro Estado integra os dezenove vigésimos dela, com a diferença de que
se ocupa de tudo o que é verdadeiramente penoso, de todos os cuidados que ordem privilegiada
recusa. Somente os postos lucrativos e honoríficos são ocupados pelos membros da ordem
privilegiada. (...) O Terceiro Estado abrange, pois, tudo o que pertence à nação. E tudo o que não
é Terceiro Estado não pode ser olhado como da nação. (...) Não há, no total, duzentos mil
privilegiados das duas primeiras ordens. Comparem este número com o de 25 a 26 milhões de
almas (...). Mas é difícil convencer as pessoas que só enxergam seus próprios interesses. (...) A
nobreza deixou de ser esta monstruosa realidade feudal que podia oprimir impunemente; hoje ela
não passa de uma sombra que, em vão, tenta assustar toda a nação. (...) Ele comporá uma
Assembleia Nacional. (...) Os representantes do Terceiro Estado terão, incontestavelmente, a
procuração dos 25 ou 26 milhões de indivíduos que compõem a nação, excetuando-se cerca de
200 mil nobres ou padres. Isso já basta para que tenham o título de Assembleia Nacional. Vão
deliberar, pois, sem nenhuma dificuldade, pela nação inteira (...)”. (SIEYÈS, Emmanuel Joseph. A
constituinte burguesa: qu'est que le tiers état. Tradução de Norma Azevedo. 4ª ed. Rio de Janeiro:
Lúmen Júris, 2001. Pág. 63-69, 89-93, 103-104, 113 e 135.)
- 15 -
feudalismo e do absolutismo. Como afirma José Damião de lima Trindade17, O
capitalismo seria a realização concreta dessas leis.
As ideias de Comte, a partir de sua obra Système de Politique
Positive18 (1851) se espalharam de modo a confirmar as bases teórico-filosóficas
do constitucionalismo19. O positivismo idealizado por Comte buscava a construção
de uma nova razão de ciência. O objetivo dessa razão era de firmar a produção
de novos conhecimentos seguros e certos, sempre a partir de conceitos que
pudessem determinar o objeto de investigação e a metodologia utilizada. Essa
racionalidade positivista passa a influenciar o constitucionalismo, na medida da
fixação ordenada e sistêmica do direito positivo.
Pois bem, outro ponto que se julga importante cuidar é o da
influência do constitucionalismo na formação do Estado de Direito Constitucional.
Pode se afirmar, como visto anteriormente, que esse modelo de Estado se deu
em virtude da crise dos antigos regimes absolutistas.
17
TRINDADE, José Damião de Lima. Anotações sobre a história social dos direitos humanos.
Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/direitos/tratado1.htm.
Acesso em: 10 de março de 2013;
18
COMTE, Auguste. Système de Politique Positive ou Traité de Sociologie Instituant la Religion
de l'Humanité – Paris, 1851-1854 - 4 volumes.
19
Comte não apenas fundou um método universal de análise e conhecimento, ele também levanta
a possibilidade de uma síntese de todos os ramos do conhecimento em uma filosofia universal: "A
verdadeira filosofia tem como objetivo sistematizar, tanto quanto possível durante toda a existência
indivíduo humano e, sobretudo coletiva contemplada em ambas as três ordens de fenômenos que
caracterizam os pensamentos, sentimentos e ações. "Podemos ver que o ponto positivo é um
momento de reflexão para o progresso do conhecimento, e também o surgimento de um estado de
síntese entre os níveis relativos da existência humana. No entanto, o pensamento de Comte não é
síntese dialética não é ultrapassada ou uma solução de contradições, a "negação da
negação". Em vez disso, é ao mesmo tempo em que opera sobre o pensamento positivo relativo é
sintético. De fato, os dois significados positivos esfregar sem ser notado uma passagem ou uma
articulação: não há mudança de significado. Com efeito, por um lado, o positivo é real e relativo
versus absoluto quimérica, e, por outro lado, o positivo é sintético, em oposição ao negativo. Por
outro sentido, é o movimento do pensamento de Comte e ambiguidade que provar: o espírito
positivo não poderia tanto banir a idéia de absoluto e dar a tarefa final a introdução da filosofia
universal e definidos. Então, há uma mudança no pensamento de Comte entre os dois grandes
períodos criativos. (http://www.larousse.fr/encyclopedie/personnage/Comte/114286)
- 16 -
Transcorrido o período do apogeu do sistema absolutista, a citada
influência constitucionalista teve como principais traços a tentativa de minimizar o
poder subjetivo do Estado e a criação de uma concepção de sistema político,
efetivando suas funções e garantias20. Neste sentido, LOEWENSTEIN21 explica
que:
Tradução:
20
FERRAJOLI, Luigi. El garantismo y la filosofia del derecho. Nº 15. Bogotá: Universidad
Externado de Colombia, 2000, pág. 87.
21
LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la Constituición. Barcelona: Editorial Ariel, 1986. Pág. 150.
22
RUDÁ, Antônio Solón. Direito Penal Constitucional: da formação dos Estados modernos à
política de criminalização como forma de controle social. Disponível em:
http://jus.com.br/revista/texto/17441/direito-penal-constitucional-da-formacao-dos-estados-
modernos-a-politica-de-criminalizacao-como-forma-de-controle-social/2#ixzz2Ta5TkMRX Acesso
em: 17 de março de 2013
- 17 -
O conceito primário de estado tendia a concentrar os poderes nas
mãos dos governantes, sem qualquer tipo de limitação. Houve, como afirmado
anteriormente, uma ruptura. Vale citar como exemplo dessa ruptura a
promulgação da Constituição dos EUA (1787). A independência das colônias da
América do Norte foi um marco importante para a afirmação do constitucionalismo
moderno, culminando na chamada revolução burguesa.
Essa revolução, em especial, contribuiu em diversos aspectos para a
formação do constitucionalismo, do neoconstitucionalismo e, sem sombra de
dúvidas, ao ativismo judicial. Insta, portanto, elencar alguns pontos de suma
relevância: i. a afirmação do poder por meio de uma Constituição escrita e a
consequente supremacia constitucional; ii. O nascimento do sistema de controle
difuso de constitucionalidade pelo judiciário (Madison vs. Marbury); iii. O sistema
de governo presidencialista, salvaguardando a separação dos poderes; iv. O
sistema federalista de Estado como forma de repartição vertical de poder; v. o
bicameralismo democrático como forma de regular o poder do parlamentarismo,
no qual o povo elege os representantes; vi. a democracia representativa; dentre
tantos outros.
23
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 3ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1985. pág. 267.
- 18 -
Constituição mexicana, que é mais avançada do que aquela. Mas,
foi a de Weimar que exercera maior influência no constitucionalismo
de após a Primeira Guerra Mundial, inclusive na brasileira de 1934”
- 19 -
afirmação da legalidade como expressão da vontade popular; o princípio da
democracia representativa e o da dignidade da pessoa humana.
- 20 -
representatividade ou sua ausência, na medida em que os juízes aplicam o direito
na inercia dos outros poderes (questão será devidamente abordada mais
adiante).
Sendo assim, o neoconstitucionalismo se desenvolve, nas ideias de
Luís Roberto Barroso24, a partir de três marcos: o marco histórico (pós-guerra), o
marco filosófico (aproximação do direito com a ética) e o marco teórico (força
normativa das normas constitucionais).
24
BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo - O triunfo tardio do Direito Constitucional no
Brasil. Disponível em: http://www.migalhas.com.br/arquivo_artigo/art20060502.htm. Acesso em: 27
de janeiro de 2013.
25
BARROSO. (Neoconstitucionalismo). pág. 3.
26
MARQUES, Gabriel. Curso de Direito Constitucional I. Disponível em:
http://pt.scribd.com/doc/97172325/CURSO-DE-CONSTITUCIONAL-I-PROF-GABRIEL-
MARQUES-2012-1. Acesso em: 22 de março de 2013. Pág. 9.
- 21 -
Fundamental do Bonn”, formando uma das fontes mais importantes no que tange
aos direitos fundamentais.
No Brasil, o renascimento do direito constitucional se dera no
ambiente de reconstitucionalização do país, na conjuntura da discussão prévia,
convocação, elaboração e promulgação da Constituição de 1988. A Carta Cidadã
promoveu a passagem de um regime autoritário e intolerante para um Estado
democrático de direito27.
Os instrumentos de controle de constitucionalidade e a ampla
previsão dos sistemas de freios e contrapesos dão ao sistema jurídico brasileiro
uma possibilidade de efetividade plena do novo constitucionalismo.
27
O país era regido pela Constituição de 1937, conhecida como “Constituição Polaca”, pois tinha
inspirações na Polônia com caráter fascista, porém lutava contra países nazistas. Uma nova
Constituição surge em 1946, momento onde o país passava por uma relativa instabilidade politica
que dura de 1946 até 1963. O mundo estava no auge da Guerra Fria, onde as grandes forças
mundiais temiam que o país inclinasse para o Socialismo. Isso fez com que surgisse a ideia de
parlamentarismo em 1961, observa-se um Parlamentarismo adotado que vigorou de 1961 a 1963
quando houve votação para república e o dia 01/04/1964, o golpe militar. Em 05 de outubro de
1988 é promulgada a nova constituição, com garantias individuais. Arco: Art.5º, LVXIII incisos.
Nessa Constituição a dignidade da pessoa humana aparece no Art. 1º, inciso III. Fundamentos da
Constituição. Sob a Constituição de 1988, o direito constitucional no Brasil passou da
desimportância ao apogeu em menos de uma geração. Uma Constituição não é só técnica. Tem
de haver, por trás dela, a capacidade de simbolizar conquistas e de mobilizar o imaginário
das pessoas para novos avanços. (MARQUES, Gabriel. Curso de Direito Constitucional I.
Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/97172325/CURSO-DE-CONSTITUCIONAL-I-PROF-
GABRIEL-MARQUES-2012-1. Acesso em: 22 de março de 2013. Pág. 10).
28
MARQUES,2012. pág. 18.
- 22 -
sua dimensão correta e seus princípios. Por sua vez, aproveita do positivismo a
preocupação em viabilizar a aplicação de normas.
O neoconstitucionalismo é a expressão de tal pensamento filosófico
no cerne da Constituição. O pós-positivismo buscou, então, ultrapassar a
legalidade estrita, mas sem desprezar o direito posto.
Nesse conjunto de novas ideias, pode-se atribuir como resultado o
surgimento da força normativa dos princípios; o surgimento de uma hermenêutica
constitucional e a reforma da teoria dos direitos fundamentais edificada sobre o
fundamento da dignidade humana. Em resumo, esse novo conceito é
exemplificada nas palavras de Pietro Sanchís29:
29
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y ponderación judicial, em
“Neoconstitucionalismo(s)”, org. Miguel Carbonell, Madrid: Trotta, 2003.
- 23 -
Conforme enuncia Luís Roberto Barroso30, o neoconstitucionalismo
ou novo direito constitucional se apresenta como sendo um conjunto amplo de
transformações ocorridas no Estado e no direito constitucional.
30
FERREIRA, Eduardo O. O novo constitucionalismo. Visão Jurídica. Ed. Escala. São Paulo-SP,
2010, nº 48. pág. 96-98.
- 24 -
Reino Unido, Holanda e Luxemburgo, mantêm o padrão de supremacia
parlamentar, sem adoção de qualquer modalidade de controle constitucional.
No Brasil, o controle de constitucionalidade difuso ou incidental vige
no sistema desde a Constituição de 1891. Por sua vez, o controle direto ou
abstrato, foi introduzido na Constituição de 1965, por meio de uma emenda
constitucional.
Foi, todavia, na Carta de 88 que essa jurisdição constitucional
expandiu-se verdadeiramente. Ampliou-se, de forma significativa o direito de
propositura, bem como a criação de novos mecanismos como: a ação declaratória
de constitucionalidade, a arguição de descumprimento de preceito fundamental, a
ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão e a intervenção federal.
A corte constitucional tanto por meio das ações de controle direto,
como pelo julgamento de recursos extraordinários, estabelece nessa linha
temporal, uma nova interpretação constitucional. Trata-se de uma forma de
interpretação jurídica.
A necessidade de se conceder respostas constitucionalmente
adequadas fez com que os intérpretes da norma máxima se tornassem
participantes, através da interpretação, do processo de criação do direito,
firmando ou suprindo o trabalho do legislador.
Apesar dessa classificação (marco teórico, histórico e filosófico)
amplamente aceita, alguns doutrinadores, como é o caso de Dimitri Dimoulis, em
sua “Crítica ao neoconstitucionalismo”31, coloca que nenhum desses elementos
permitiria definir de maneira satisfatória o neoconstitucionalismo.
31
Entre os estudos brasileiros sobre o neoconstitucionalismo apresenta particular relevância o
trabalho “Neoconstitucionalismo e a constitucionalização do direito” do Professor Luís Roberto
Barroso, inicialmente publicado em 2005. Isso se dá em razão de sua ampla divulgação editorial e
do fato de ter se tornado referência básica para o debate nacional, sendo citado em praticamente
todos os posteriores trabalhos sobre o tema. Partiremos da reconstrução dos elementos de
definição indicados nesse texto. Segundo Barroso, o neoconstitucionalismo apresenta três
características básicas:
– Reconhecimento da força normativa da Constituição. Até a Segunda Guerra Mundial, a
Constituição era entendida, na Europa, como “documento essencialmente político”, sem força
jurídica e sem atribuição de um papel ativo ao Judiciário como guardião da Constituição. Nas
últimas décadas, ao contrário, foi plenamente reconhecida a força normativa da Constituição,
ocorrendo a constitucionalização ou o “triunfo tardio” do direito constitucional.
– Expansão da jurisdição constitucional. A partir da Segunda Guerra Mundial foram criadas Cortes
Constitucionais em vários países europeus, propiciando uma tutela mais adequada dos direitos
fundamentais.
- 25 -
O neoconstitucionalismo fez com que as constituições deixassem de
ser vislumbradas como meras cartas políticas, não podendo se constituir de
simples recomendações, sendo imperiosa sua análise como um conjunto de
normas fundamentais de ampla eficácia jurídica, fundamental para os cidadãos.
Essa nova forma de interpretação e sistemática constitucional requer
a consideração da Constituição não somente em seu sentido formal, mas também
no sentido substancial ou material, esses são os paradigmas do
neoconstitucionalismo.
As consequências do neoconstitucionalismo para a sociedade se
evidenciam como de suma importância no contexto social. Pode-se destacar o a
elevação da relevância dos princípios constitucionais – como ocorrera na decisão
acerca das uniões homoafetivas, fundamentada no princípio da dignidade da
pessoa humana.
Ainda, o significativo aumento da jurisdição constitucional, em que a
corte constitucional passa a ter papel essencial na implementação e decisão
acerca de direitos fundamentais, dando a estes uma eficácia nunca antes vista no
ordenamento.
Por fim, vale destacar a legitimação do ativismo judicial como
característica fundamental para esse trabalho. Vale destacar que foi com o
advento do neoconstitucionalismo que o Poder Judiciário passa a ser chamado
para efetivar os direitos fundamentais e para delinear de fato o regime
democrático. De todo modo, esse assunto será bem analisado no item a seguir.
- 26 -
2.2. O SURGIMENTO DO ATIVISMO JUDICIAL
32
MORO, Sérgio Fernando. Jurisdição constitucional como democracia. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004. Pág. 103.
- 27 -
flexíveis33. A mobilidade do ordenamento passou a acompanhar as
transformações culturais, sociais, econômicas e jurídicas.
Tratou-se de uma mudança da antiga técnica legislativa casuística,
na qual o legislador, a partir dos casos concretos, criava as normas e listava os
possíveis casos a serem solucionados. No entanto, com a evolução das
sociedades notou-se que o texto normativo casuístico não exauria todas as
temáticas necessárias.
Sendo assim, implementou-se a nova a técnica legislativa, muito
embora a anterior ter sido mantida. Essa nova técnica tem por característica
marcante a utilização de “cláusulas gerais”. São cláusulas que se constituem de
um texto normativo aberto, sem definição rígida na hipótese que e no
consequente normativo.
Desde então, coube ao operador do direito aduzir em quais
hipóteses a cláusula irá incidir, bem como quais as consequências resultantes,
trazendo maior mobilidade e, em primeira análise, certa insegurança.
Pode-se citar como exemplos de cláusulas gerais, no Código de
Processo Civil, o artigo 14, II (cláusula da boa-fé processual); o artigo 461, §5º
(cláusula de efetivação das decisões); e o artigo 1109 (cláusula de adequação do
procedimento de jurisdição voluntária).
As cláusulas gerais são textos normativos, dos quais se é possível
extrair as normas necessárias para o caso concreto. Nessa operação, o operador
interpreta o texto, para dele extrair as normas, que podem ser regras ou
princípios.
O exercício e a aplicação da interpretação dessas cláusulas garante
a sobrevivência das letras dos ordenamentos diante do decurso do tempo.
Essa maior mobilidade do sistema abranda a rigidez da norma
casuística. Desse modo, o sistema fica vivo e atualizado34, de modo a prolongar a
viabilidade dos institutos jurídicos, amoldando-se às necessidades sociais,
evitando o engessamento da norma.
33
NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 8ª ed. São
Paulo: RT, 2011. apud WIACKER, Franz. Privatrechtsgeschichte,Textstufen klassicher Juristen,
Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1996. § 25, III, 3, pp. 476/477.
34
SANTOS, Orlando Gomes. A caminho dos microssistemas. in Novos temas de direito civil. RJ:
Forense, 1983, p. 42
- 28 -
Por outro lado, a flexibilização total não se posta como solução para
todos os males. Há necessidade de um equilíbrio sistêmico35. Um sistema
fundado em cláusulas rígidas e casuísticas e com cláusulas gerais que permitam
sua amplitude devida evidencia um caminho para o deslinde desse embate.
O sistema atual é caracterizado pela técnica legislativa mista. Há
tanto normas casuísticas como cláusulas gerais e conceitos indeterminados, os
quais não se confundem.
Os conceitos legais indeterminados são palavras ou expressões
indicadas na lei, de vago conteúdo, tais quais: “boa-fé”, “má-fé”, “urgente”,
“imprevisto”, “justa causa”, “excessiva onerosidade”, dentre outras.
A presença dessas palavras na lei confere ao aplicador da norma
certa margem discricionária para verificar, no caso concreto, se aplica ou não o
comando legal incidente.
Nas normas que contém conceitos indeterminados, ao revés do que
ocorre nas cláusulas gerais, a norma traz a solução ao caso concreto, com a
hipótese e a consequência jurídica. Trata-se apenas da utilização de um termo
vago no corpo do texto legal.
Como bem exposto anteriormente, as cláusulas gerais são normas
jurídicas orientadoras, cujo conteúdo elenca diretrizes indeterminadas, cabendo
ao juiz criar a solução adequada ao caso concreto. Vejamos, a título de exemplo,
a cláusula geral de boa-fé e de função social. Sobre as cláusulas gerais, vale citar
José Carlos Barbosa Moreira36:
35
Para Ronald Dworkin, a atitude do direito é construtiva, sua finalidade, no espírito interpretativo,
é colocar o espírito acima da prática para mostrar o melhor caminho para um futuro melhor,
mantendo a boa-fé com relação ao passado. (DWORKIN, Ronald. O império do direito. Tradução
Jefferson Luiz Camargo. 2ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, pág. 492).
36
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Regras da experiência e conceitos juridicamente
indeterminados. In: Temas de Direito Processual. Segunda série. São Paulo: Saraiva, 1980. Pág.
62.
- 29 -
Com intensa produção sobre o tema, Judith Martins Costa37
classifica as cláusulas gerais basicamente em três tipos:
- 30 -
subsunção, ampliando a margem de interpretação. Vejamos a opinião de Luís
Roberto Barroso38 nesse sentido:
- 31 -
caracteristicamente diferenciador destas normas perante o
ordenamento jurídico, o nódulo essencial que faria com que as
cláusulas gerais fossem aquilo que são.
40
POLI, Luciana Costa. O ativismo judicial como ferramenta de implementação do princípio da
sustentabilidade. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 14, n. 14, p. 210-
230, julho/dezembro de 2013.
41
MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo
obrigacional. São Paulo: RT, 1999, pág. 23
- 32 -
deontologia42. Tendo em vista que o texto normativo jamais atingirá toda a
amplitude de demandas, não alcança aos que não tem representação legislativa e
aos que não tem acesso às vias judiciais, há necessidade de se conferir validade
ao ativismo, orientado, sobremaneira, pelas cláusulas gerais.
Estatizar o texto normativo seria impor ao malfadado legislativo que
reduzisse a letra de lei todas as situações do cotidiano, num emaranhado de
milhares/milhões de normas que perdem sua aplicabilidade e eficácia, tendo por
consequência a tão combatida insegurança jurídica.
Esse é o pensamento encartado na obra de Alberto Gosson Jorge
Júnior43, ao citar Judith Martins-Costa:
42
A deontologia jurídica há de compreender e sistematizar, inspirada em uma ética profissional, o
status dos distintos profissionais e seus deveres específicos que dimanam das disposições legais
e das regulações deontológicas, aplicadas à luz dos critérios e valores previamente decantados
pela ética profissional. Por isso, há que distinguir os princípios deontológicos de caráter universal
(probidade, desinteresse, decoro) e os que resultam vinculados a cada profissão jurídica em
particular: a independência e imparcialidade do juiz, a liberdade no exercício profissional da
advocacia, a promoção da justiça e a legalidade cujo desenvolvimento corresponde ao Ministério
Público, etc. (NALINI, José Renato. Ética Geral e Profissional. São Paulo: Revista dos Tribunais,
5ª ed., 2006. 256/257).
43
JORGE JUNIOR, Alberto Gosson. Cláusulas gerais no novo código civil. São Paulo: Saraiva,
2004. pág. 40.
44
REALLE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
- 33 -
A teoria também se apresenta na forma gráfica, reproduzida pela
imagem de dois círculos concêntricos. O maior, representando a Moral e o menor,
inserido no primeiro, que seria o Direito.
Trata-se da ideia de que é possível a realização do máximo de
utilidade com o mínimo de restrições pessoais, numa perspectiva que reduz o
direito a uma simples moral do útil coletivo.
Nesse sentido, podemos concluir que o excesso legislativo,
notadamente na edição de textos normativos determinados e expressos à
situações certas, de grupos certos, representa um diminuto em relação à
elevação da moral social. As cláusulas gerais, aplicadas pelo instrumento ativista,
representam, noutra via, uma elevação da moral e da confiança social, as quais
devem ser sobressaltadas.
- 34 -
3. CONCEITO E APLICABILIDADE DO ATIVISMO
JUDICIAL
45
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva da
5ª ed. alemã. São Paulo: Malheiros, 2008.
- 35 -
Sustentando a força normativa dos princípios, Bobbio46 os insere no
conceito amplo de normas:
46
BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 7ª ed. UnB, Brasília, 1996, pág. 159.
47
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998,
pág. 255.
- 36 -
da doutrina, entre princípios e normas, mas entre regras e princípios,
sendo as normas o gênero, e as regras e os princípios a espécie.
Daqui já se caminha para o passo final da incursão teórica: a
demonstração do reconhecimento da superioridade e hegemonia
dos princípios na pirâmide normativa; supremacia que não é
unicamente formal, mas sobretudo material, e apenas possível na
medida em que os princípios são compreendidos e equiparados e
até mesmo confundidos com os valores, sendo, na ordem
constitucional dos ordenamentos jurídicos, a expressão mais alta da
normatividade que fundamenta a organização do poder.
- 37 -
pouquíssima aplicabilidade prática, atualmente não há vigor jurídico mais amplo
que o da carta constitucional.
A supremacia da Constituição pode ser vista sob dois aspectos: o
interno e o externo. O primeiro exige que suas normas não conflitam entre si;
preponderam as normas originárias sobre as derivadas. O segundo exige respeito
hierárquico das normas infraconstitucionais para com as normas constitucionais.
Adotando-se a classificação de Alexandre de Moraes48, a qual
destaca que a Constituição Federal de 1988 é considerada “super-rígida”,
podemos observar a força cogente máxima dessa carta. Para alterá-la, há um
processo legislativo diferenciado, e em, alguns casos, não pode haver alteração.
Sendo assim, se existe subordinação no âmbito da própria carta, haverá, com
ainda mais força, diante das outras normas.
Vale destacar que essa relação de subordinação não se apresenta
nas Constituições flexíveis (como ocorre, por exemplo, no Reino Unido).
Importante pontuar, da mesma forma, que somente as constituições rígidas
admitem o chamado controle de constitucionalidade, o qual pode representar
importante reflexo no âmbito do ativismo judicial.
Esse princípio ensina, então, que nenhum ato jurídico pode subsistir
validamente em contraste com a Constituição. Assim declarou o juiz da Suprema
Corte norte americana, John Marshall49, toda lei contrastante com a Constituição
é nula.
Com efeito, as normas anteriores ao texto constitutional, sejam
material ou formalmente, podem ser recepcionadas ou revogadas por não
recepção. No caso das normas posteriores ao texto constitucional, podem ser
declaradas inscontitucionais (observadas as regras de controle de
constitucionalidade, que no Brasil ocorre por meio difuso e concentrado).
48
“(...) uma vez que em regra poderá ser alterada por um processo legislativo diferenciado, mas
excepcionalmente, em alguns pontos é imutável (CF. art. 60, §4°-cláusulas pétreas)”. MORAES,
Alexandre de. Direito Constitucional. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pág. 5
49
Gibbons v. Ogden (1824): The nullity of an act, inconsistent with the Constitution, is produced by
the declaration, that the Constitution is the supreme law. The appropriate application of that part of
the clause which confers the same supremacy on laws and treaties, is to such acts of the State
legislatures as do not transcend their powers, but though enacted in the execution of
acknowledged State powers, interfere with, or are contrary to the laws of Congress, made in
pursuance of the Constitution, or some treaty made under the authority of the United States. In
every such case, the act of Congress, or the treaty, is supreme; and the law of the State, though
enacted in the exercise of powers not controverted, must yield to it.
- 38 -
Nas palavras de Nelson Nery Júnior50, esse princípio vincula, ainda,
a interpretação de todo o ordenamento jurídico com base na Constituição:
- 39 -
Nesse condão, o juiz, na qualidade de intérprete da Constituição, no
exercício da função jurisdicional, não deve ficar adstrito à inercia do legislador ou
administrador, cabendo-lhe o poder-dever de aplicar os princípios constitucionais
diretamente, por meio de uma hermenêutica construtiva, de um ativismo judicial
construtivo.
51
STF, Inq 1864/PI, Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, v.u., j. 02/04/2007, DJ 03/08/2007.
- 40 -
FEDERAL COMPETENTE, PARA PROSSEGUIMENTO DO FEITO
EM RELAÇÃO AOS CO-RÉUS.
1. O art. 9º da Lei n° 10.684/03 goza de presunção de
constitucionalidade, não obstante esteja em tramitação nesta Corte
ação direta de inconstitucionalidade, sem pedido de liminar.
2. Comprovado nos autos, através de ofício da Procuradoria Federal
Especializada, o pagamento integral do débito imputado ao
parlamentar federal indiciado, é imperativo o reconhecimento da
extinção da pretensão punitiva estatal.
3. Denúncia não recebida em relação ao parlamentar, por estar
extinta a punibilidade dos fatos a ele imputados, nos termos do art.
9º, § 2º, da Lei n° 10.684/03. 4. Os autos devem ser remetidos ao
juízo federal competente da Seção Judiciária do Piauí, para regular
prosseguimento em relação aos co-réus”
52
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma
dogmática constitucional transformadora. 7ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 193.
- 41 -
Importante destacar, em primeiro lugar, a dúplice característica da
natureza interpretativa do princípio em voga. Uma é a de princípio de
interpretação e outra é a de técnica empregada no controle de
constitucionalidade53. No que tange ao controle de constitucionalidade, a técnica é
denominada de ‘declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de
texto’.
No seu viés de método de interpretação o princípio indica que,
diante de possíveis interpretações de normas infraconstitucionais o intérprete
deverá optar pela que esteja em conformidade com a Constituição, ainda que
essa escolha não seja a que decorra mais obviamente do texto, bem como aduz
Luís Roberto Barroso54.
Nesse diapasão, Inocêncio Mártires Coelho55 bem destaca que o
princípio alhures concretiza uma regra de prudência política, ou sejam uma
política constitucional, sob o seguinte alerta:
“Essa prudência, por outro lado, não pode ser excessiva, a ponto de
induzir o intérprete a salvar a lei à custa da Constituição, nem
tampouco contrariar o sentido inequívoco da lei, para
constitucionalizá-la de qualquer maneira. No primeiro caso porque
isso implicaria interpretar a Constituição conforme a lei, e, assim,
subverter a hierarquia das normas; no segundo, porque toda a
conformação exagerada implica, no fundo, usurpar tarefas
legislativas e transformar o intérprete em legislador, na exata medida
em que a lei resultante dessa interpretação conformadora, em sua
letra como no seu espírito, seria substancialmente distinta daquela
resultante do trabalho legislativo.
53
Nesse sentido foi a manifestação do plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da
Representação 1417/DF, da relatoria do Ministro Moreira Alves, v. u., j. 09/12/1987, DJ
15/04/1988.
54
BARROSO, Luiz Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O Começo da História. A Nova
Interpretação Constitucional e o Papel dos Princípios no Direito Brasileiro. Biblioteca Digital Fórum
Administrativo – Direito Público –FA. Belo Horizonte: Fórum, ano 4, n. 37, mar. 2004, pág. 5
55
COELHO, Inocêncio Mártires. Métodos e Princípios da Interpretação Constitucional. Fórum
Administrativo – Direito Público –FA. Belo Horizonte: Fórum, ano 3, n. 23, jan. 2003, pág. 6.
- 42 -
Afinal de contas, em sede de controle de constitucionalidade, como
todos sabem, os tribunais devem comportar-se como
legisladores negativos, anulando as leis contrárias à
Constituição, quando for o caso, e jamais como produtores de
normas, ainda que por via interpretativa” (grifo nosso)
3.1.4. A UNIDADE
56
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma
dogmática constitucional transformadora. 7ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 202.
- 43 -
dificuldades geradas pela peculiaríssima natureza do documento
inaugural e instituidor da ordem jurídica. É que a Carta fundamental
do Estado, sobretudo quando promulgada em via democrática, é o
produto dialético do confronto de crenças, interesses e aspirações
distintos, quando não colidentes. Embora expresse um consenso
fundamental quanto a determinados princípios e normas, o fato é
que isso não apaga ‘o pluralismo e antagonismo de idéias
subjacentes ao pacto fundador’.
É precisamente por existir pluralidade de concepções que se torna
imprescindível a unidade na interpretação. Afinal, a Constituição não
é um conjunto de normas justapostas, mas um sistema normativo
fundado em determinadas idéias que configuram um núcleo
irredutível, condicionante da inteligência de qualquer de suas partes.
O princípio da unidade é uma especificação da interpretação
sistemática, e impõe ao intérprete o dever de harmonizar as tensões
e contradições entre normas (...)”
57
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 1991. pág. 162.
- 44 -
contradições (antinomias, antagonismos) entre as suas normas
e, sobretudo, entre os princípios jurídicos-políticos
constitucionalmente estruturantes. Como ‘ponto de orientação’,
‘guia de discussão’ e ‘factor hermenêutico de decisão’ o princípio
da unidade obriga o intérprete a considerar a Constituição na
sua globalidade e procurar harmonizar os espaços de tensão (...)
existentes entre as normas constitucionais a concretizar. Daí que o
intérprete deva sempre considerar as normas constitucionais, não
como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos
integrados num sistema interno unitário de normas e princípios”.
58
SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, São Paulo,
ano 91, n. 798, pág. 23-50, abr. 2002.
- 45 -
que conferem à regra ad proporcionalidade a individualidade que a
diferencia, claramente, da mera exigência de razoabilidade.”
59
GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades públicas e processo penal. 2ª ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1982, pág. 151 e 166.
60
SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, São Paulo,
ano 91, n. 798, pág. 23-50, abr. 2002. Pág. 20.
- 46 -
No caso da razoabilidade, pode-se afirmar que está ligada à razão.
Seria uma justa adequação entre motivos, razões e circunstâncias, sempre de
acordo com os valores fundamentais consagrados na Constituição.
Luís Roberto Barroso e Ana Paula de Barcellos assim descrevem
esse princípio61:
61
BARROSO, Luís Roberto. O Começo da História. A Nova Interpretação Constitucional e o
Papel dos Princípios no Direito Brasileiro. Biblioteca Digital Fórum Administrativo – Direito
Público –FA. Belo Horizonte: Fórum, ano 4, n. 37, mar. 2004, pág. 5
- 47 -
3.1.6. A EFETIVIDADE
62
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 1991. pág. 162.
- 48 -
Este princípio se relaciona intrinsecamente à força normativa da
Constituição, estabelecendo que deve ser atribuído ao enunciado constitucional a
interpretação que lhe conceda maior efetividade, bem como anuncia Paulo
Bonavides:
63
BARROSO, Luis Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O Começo da História. A Nova
Interpretação Constitucional e o Papel dos Princípios no Direito Brasileiro. Biblioteca Digital
Fórum Administrativo – Direito Público –FA. Belo Horizonte: Fórum, ano 4, n. 37, mar. 2004, pág. 6
64
BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação constitucional. 3ª ed., rev. e ampl. São
Paulo: Celso Bastos, 2002, pág. 176-177.
- 49 -
Assim, evidente que a necessidade pontuar esse princípio está na
obrigação do intérprete em harmonizar os dispositivos constitucionais, de modo a
fixar todo sistema.
65
LEAL, Saul Tourinho. Ativismo ou altivez? O outro lado do Supremo Tribunal Federal.
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado do Instituto Brasiliense de Direito Público -
IDP como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre. Disponível em:
http://dspace.idp.edu.br:8080/xmlui/bitstream/handle/123456789/87/disserta%E7%E3o_Saul%20T
ourinho%20Leal.pdf?sequence=1. Acesso em: 18 de dezembro de 2012. Pág. 22.
66
FORTE, David F. The Supreme Court in American Politics: Judicial Activism vs. Judicial
Restraint. Lexington, Mass: D.C. Heath, 1972.
67
MARSHALL, William P. Conservatives and the Seven Sins of Judicial Activism. University of
North Carolina (UNC) at Chapel Hill - School of Law. September 2002. University of Colorado Law
Review, Vol. 73, 2002.
- 50 -
Fica claro que tal oposição ao processo legislativo e executivo
democrático só se justifica na medida em que forem desatendias ou esquecidas
as proposições de direitos fundamentais constitucionalmente eleitas.
Passo seguinte, o autor define a dimensão do ativismo jurisdicional,
o qual nada mais é do que uma ampliação dos limites jurisdicionais do Poder
Judiciário, de sua correição, modificação ou complementação face às leis e os
atos administrativos.
Nessa ordem, mereceu destaque o ativismo criativo, qual seja, a
utilização da interpretação como forma de criação e implementação de novos
direitos, tendo como base a afirmação jurídica de direitos morais, fundamentando-
se no pós-positivismo e no neoconstitucionalismo.
Por fim, o autor proclama a dimensão do chamado ativismo
remedial, o qual se afirma pela imposição pelo judiciário de obrigações positivas
aos poderes eleitos, seja pela alteração, implementação, ou determinação de
políticas públicas, interferência em órgãos estatais e regulamentações legais,
dentre outros.
68
PIZÓN, Gabriel de Vega. La discrecionalidad administrativa. In: Temas de derecho
administrativo contempoáneo. Bogotá: Universidad del Rosário, 2005, pág. 173.
- 51 -
interpretação gramatical, sistemática, teleológica ou histórica, cabe ao julgador
aplicar as normas e princípios constitucionais ao caso concreto.
A expressão ativismo judicial foi utilizada pela primeira vez nos
Estados Unidos, no artigo The Supreme Court: 1947, publicado na Revista
Fortune, vol. XXXV, nº 1, no mês de Janeiro de 1947, escrito pelo historiador
Arthur M. Schlesinger Jr.69.
Em que pese a doutrina majoritária considerar o nascimento do
termo com o artigo de Schlesinger, Carlos Eduardo de Carvalho70 afirma que o
vocábulo ativismo judicial foi empregado pela primeira vez em 1916 pela imprensa
belga.
No entanto, o termo foi consagrado nos EUA, em face da força com
que a Suprema Corte aplicou o instituto. Corroborando, Dierle José Coelho
Nunes71, afirma que a expressão era utilizada e defendida desde o final do século
XIX:
69
Em verdade, Schlesinger não teria criado o termo, mas sim sendo o primeiro a propaga-lo com
difusão e amplitude. Thomas Reed Powell, colega de Schlesinger em Harvard, teria sido o criador
da expressão tão em voga nos dias atuais (GREEN, Craig. An Intellectual History of Judicial
Activism. Emory Law Journal Vol. 58 (5), 2009, p. 1203, n. 19.)
70
CARVALHO, Carlos Eduardo de. Ativismo judicial em crise. Disponível em:
http://jus.com.br/revista/texto/12781/ativismo-judicial-em-crise/print. Acesso em 15 de dezembro
de 2012.
71
KLEIN, Franz. Zeit- und Geistesströmungen im Prozesse. Frankfurt am Main: Vittorio
Klostermann, 1958.p. 25. Apud NUNES, Dierle José Coelho; BAHIA, Alexandre Gustavo Melo
Franco. Ativismo e protagonismo judicial em xeque. Argumentos pragmáticos. Jus Navigandi,
Teresina, ano 13, n. 2106, 7 abr. 2009. Disponível em: http://http://jus.com.br/revista/texto/12587 .
Acesso em: 23 de abril de 2013.
- 52 -
maiores são os reflexos de sua atuação, devendo, por isso, seus membros
sujeitarem-se ao crivo da sociedade72.
Schlesinger afirmarou, ainda, que saber as questões que dividem os
juízes da Suprema Corte é de suma importância visto que “suas decisões ajudam
a moldar a nação por anos”.73
O artigo sugere um contraponto entre a ideia de judicial
activism (ativismo judicial) em face da ideia de self restraint (auto comedimento).
Essas expressões foram usadas para classificar os juízes da Suprema Corte dos
EUA da época, conforme as posições que assumiam diante de temas
controvertidos e de conotação política74.
Na definição de Arthur, os juízes ativistas substituem a vontade do
legislador pela sua própria, pois no intuito de atuar ativamente na promoção das
liberdades civis e dos direitos das minorias, dos menos favorecidos e dos
indefesos. Por sua vez, os juízes comedidos acreditavam que a Suprema Corte
não deveria intervir na política agindo com “deferência à vontade do legislador”75.
O autor acreditava que a oposição entre os juízes ativistas e os
defensores do auto comedimento judicial resultava num “conflito fundamental
sobre a própria função do judiciário em uma democracia”.
Essas divergências ideológicas e funcionais, tais quais as
apresentadas hodiernamente, demonstravam um embate sobre qual o papel da
Corte Constitucional no sistema de governo.
A rigor, o conflito estava na possibilidade ou não, ou mesmo na
extensão, na qual a Corte Constitucional poderia intervir no campo político da
sociedade democrática, como bem resumido pelo próprio Schlesinger:
72
CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Revista do Instituto do Direito Brasileiro, ano 2
(2013), nº 6. Disponível em: http://www.idb-fdul.com. Acesso em 11 de maio de 2013;
73
SCHLESINGER Jr., Arthur M. The Supreme Court: 1947. Fortune Vol. 35 (1), 1947, p. 73.
74
O jornalista, ainda, dividiu a Corte em duas correntes. Os componentes da primeira – Hugo
Black, Willian O. Douglas, Frank Murphy e Wiley Rutledge – chamou judicial activists (ativistas
judiciais), haja vista tais magistrados exercerem papel afirmativo no exercício do bem-estar social.
Por seu turno, os juízes Felix Frankfurter, Harold Burton e Robert H. Jackson, integrantes da
segunda corrente, foram chamados champions of self-restraint (campeões do auto comedimento),
visto que, para eles, o Judiciário tinha um papel limitado dentro do sistema estadunidense.
(TEIXEIRA, Anderson Vichinkeski. Ativismo judicial: nos limites entre racionalidade jurídica e
decisão política. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1808-
24322012000100002&script=sci_arttext. Acesso em: 03 de março de 2013.)
75
SCHLESINGER Jr., Arthur M. The Supreme Court: 1947. Fortune Vol. 35 (1), 1947, pp. 75/77.
- 53 -
“O grupo Black-Douglas acredita que a Suprema Corte pode cumprir
um papel afirmativo em promover o bem-estar social; o grupo
Frankfurter Jackson advoga uma política de autorrestrição judicial.
Um grupo é mais preocupado com o emprego do poder judicial em
favor de sua própria concepção de bem social; o outro com expandir
o campo de liberdade de conformação dos legisladores, mesmo se
isso significar sustentar conclusões que eles particularmente
condenam. Um grupo considera a Corte como um instrumento para
alcançar resultados sociais desejados; o segundo como um
instrumento para permitir que os outros poderes de governo
alcancem os resultados que o povo deseja, sejam bons ou ruins. Em
suma, a ala Black Douglas parece estar mais preocupada em
resolver casos particulares de acordo com suas próprias pré-
concepções sociais; a ala Frankfurter-Jackson com preservar o
judiciário em seu espaço estabelecido, mas limitado no sistema
Americano.”76
Ao que tudo indica a corte era bem dividida, sendo parte ativista e
parte comedida. Todavia, Esse equilíbrio teve fim com as mortes de Wiley
Rutledge e Frank Murphy, que foram substituídos, respectivamente, por John
Marshall e Earl Warren.
Earl Warren, que se tornaria o Chief Justice (Presidente da Suprema
Corte) lideraria a chamada “Corte Warren” que ficaria famosa pelo seu evidente
posicionamento ativista.
Conforme afirma Luís Roberto Barroso77, a expressão foi, então,
amplamente difundida, para qualificar a atuação da Suprema Corte durante os
anos em que foi presidida por Earl Warren (1953-1969), como se pode verificar
abaixo:
76
SCHLESINGER, 1947. pág. 201.
77
BARROSO, Luís Roberto. A americanização do direito constitucional e seus paradoxos: Teoria e
jurisprudência constitucional no mundo Contemporâneo. Disponível em:
http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-
content/themes/LRB/pdf/a_americanizacao_do_direito_constitucional_e_seus_paradoxos.pdf.
Acesso em 21 de abril de 2013;
- 54 -
“O exemplo histórico mais claro desta atitude e disposição foi a
Corte Warren nos Estados Unidos da América, especialmente no
julgamento do caso Brown vs Board of Education, que produziu uma
imensa mudança numa política pública que o Poder Legislativo
daquele país se recusava a fazer”78.
78
TATE, Chester Neal; VALLINDER, Torbjörn. The global expansion of judicial power. New York;
London: New York University Press, 1995. Pág 40.
79
PAGANELLI, Celso Jefferson Messias; IGNACIO JUNIOR, José Antonio Gomes; SIMÕES,
Alexandre Gazetta. Ativismo Judicial: Paradigmas Atuais. 1ª ed. São Paulo: Letras Jurídicas, 2011.
Pág. 132.
80
LEAL, Saul Tourinho. Ativismo ou altivez? O outro lado do Supremo Tribunal Federal.
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado do Instituto Brasiliense de Direito Público -
IDP como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre. Disponível em:
http://dspace.idp.edu.br:8080/xmlui/bitstream/handle/123456789/87/disserta%E7%E3o_Saul%20T
ourinho%20Leal.pdf?sequence=1. Acesso em: 18 de dezembro de 2012.
81
Godoy esclarece: “O mentor de tal concepção foi o Juiz Marshall, que o fez, no entanto, no
quadro de problemático jogo político, no qual leituras ingênuas, puras e analíticas do direito não
tinham o menor espaço”. (GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Constitucional
Comparado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2006. p. 52)
82
Em sentido contrário, cf. MENDELSON, Wallace. Was Chief Justice Marshall an Activist?
- 55 -
originária, pois contrariava a Constituição, abrindo as portas para o judicial review
(revisão judicial) pelo judiciário dos atos praticados pelo Congresso, nada mais do
que o controle de constitucionalidade.
Por outro lado, podemos afirmar que a corte foi também ativista,
visto que afirmou/criou um poder espetacular para si própria sem que a
Constituição nada dissesse especificamente sobre ele83. Esse poder judicial de
revisão e controle afirmado na clássica argumentação do juiz John Marshall, teria
sido o resultado dos princípios e propósitos da Constituição.84
Saul Tourinho destaca em seu trabalho que desses fatos em diante
o termo em tela passou a ser usado com bastante frequência, vejamos o
destaque:
83
HAND, Learned. The Bill of Rights. Cambridge: Harvard University Press, 1958, p. 4.
84
BLOOM JR., Lackland H. Methods of Interpretation. How the Supreme Court Reads the
Constitution. New York: Oxford University Press, 2009, pp. 170/171.
85
BICKEL, Alexander M. The Least Dangerous Branch. 2nd ed. New Haven, CT: Yale University
Press, 1986;
BORK, Robert. Coercing Virtue: The Worldwide Rule of Judges. Washington, DC: AEI Press, 2003;
CANON, Bradley C.; JOHNSON, Charles A. Judicial Policies: Implementation and Impact. 2nd ed.
Washington, DC: Congressional Quarterly Books, 1998;
- 56 -
Outro termo, relacionado com o ativismo, que surge dos julgados
norte-americanos é o strict scrutiny. Podendo ser traduzido como escrutínio
rigoroso ou procedimento de análise rigoroso, trata-se de um padrão mais
rigoroso de análise nas revisões judiciais que implementado pela Suprema Corte
dos EUA.
Sendo assim, afastava-se a anteriormente usada presunção de
constitucionalidade das leis considerando-as quase que presumidamente
inconstitucionais quando estas visassem a redução ou abolição de qualquer
direito fundamental.
Evidentemente, tais casos são excepcionais. Via de regra, os atos
normativos, desde que tenham cumprido os requisitos formais para sua
elaboração devem ser considerados presumidamente constitucionais. Os padrões
de análise menos rigorosos foram chamados de ‘revisão racional’ (presunção de
constitucionalidade) e escrutínio intermediário (presunção relativa).
Tais noções de níveis de análise foram introduzidas pela famosa
nota de rodapé nº 4 introduzida no julgamento pela suprema corte do caso United
CARRESE, Paul O. The Cloaking of Power: Montesquieu, Blackstone, and the Rise of Judicial
Activism. Chicago: University of Chicago Press, 2003.
DWORKIN, Ronald. Law's Empire. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1988;
_______________. Taking Rights Seriously. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1977;
GRAGLIA, Lino A. Disaster by Decree. Ithaca, NY: Cornell University Press, 1976;
HART, Hebert. L. A. The Concept of Law Oxford: Oxford University Press, 1961;
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KILGORE, Carrol D. Judicial Tyranny: An Inquiry into the Integrity of the Federal Judiciary.
Nashville: Thomas Nelson, 1977;
MILLER, Arthur Selwyn. Toward Increased Judicial Activism. Westport, UK: Greenwood Press,
1982;
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Ireland: Cork University Press, 2001;
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Consequences of Judicial Activism. Westport: Praeger Paperbacks, 2002;
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Study of Judicial Activism. Chicago: University of Chicago Press, 1982;
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Wang, 2002;
WOLFE, Christopher Wolfe. Judicial Activism. 2nd ed. Totowa, NJ: Rowman & Littfield Publishers,
1997;
- 57 -
States v. Carolene Products Co.86 (1938), em que se discutia a
constitucionalidade do programa de reestruturação de Roosevelt, o New Deal.
Outro notável caso em que a Suprema Corte aplicou tais padrões da
análise foi o Korematsu v. United States87 (1944), no qual o analisou a
constitucionalidade de discriminação nipo-americanos.
A suprema corte sem nenhuma emenda constitucional ou lei,
produziu uma revolução por meio da jurisprudência. Essa revolução começou
com a abolição da segregação racial nas escolas públicas88, obrigando os
estados a possibilitar que negros e brancos pudessem frequentar as mesmas
escolas.
Ainda, sem nenhuma modificação legislativa, a suprema corte, por
meio da jurisprudência, implementou novas regras acerca dos direitos dos
acusados penalmente, como o de serem representados por advogados e de lhe
serem declarados seus direitos no momento da prisão (frase determinada pela
suprema corte89, cuidando, então de grupos deveras vulnerável.
A Corte Warren ainda estabeleceu o direito de privacidade, em 1965,
afirmando ser inconstitucional o estado proibir o uso de pílulas anticoncepcionais,
86
________. 304 U.S. 144. United States v. Carolene Products Co. (No. 640). Argued: April 6,
1938. Decided: April 25, 1938. 7 F.Supp. 500, reversed. Disponível em:
http://www.law.cornell.edu/supremecourt/text/304/144. Acesso em06 de janeiro de 2014;
87
________. 323 U.S. 214. Korematsu v. United States (No. 22). Argued: October 11, 12, 1944.
Decided: December 18, 1944. 140 F.2d 289, affirmed. Disponível em:
http://www.law.cornell.edu/supremecourt/text/323/214. Acesso em 06 de janeiro de 2014;
88
Brown v. Board Education (1954): esse julgamento, a Corte Warren julgou a
inconstitucionalidade da segregação racial nas escolas com base no princípio da igualdade, que
estaria presente desde a décima quarta emenda constitucional (1868). Esse julgamento mudou o
entendimento da corte suprema americana, que, em 1896 diante do caso Plessy v. Ferguson,
diante do qual a suprema corte decidira pela constitucionalidade da segregação dos transportes
ferroviários. Importante destacar que a Corte Warren não só decidiu pela inconstitucionalidade da
segregação bem como determinou a dessegregação imediata em todo o país. Essa decisão abriu
as portas para todo o processo de fim da segregação racial nos EUA.
89
Essa obrigatoriedade surgiu do julgamento, pela Suprema Corte, do caso Miranda vs. Arizona
State, passando, desde então a ser conhecida como Miranda warning ou Miranda rights. Como
usualmente visto nos filmes, o agente policial tem o dever, via de regra, de alertar aquele que está
sofrendo a restrição de seus direitos, assim dizendo: “You have the right to remain silent. If you do
say anything, what you say can be used against you in a court of law. You have the right to consult
with a lawyer and have that lawyer present during any questioning. If you cannot afford a lawyer,
one will be appointed for you if you so desire. If you choose to talk to the police officer, you have
the right to stop the interview at any time.” Tradução: Você tem o direito de permanecer em
silencio. Se disser alguma coisa poderá ser usado contra você no tribunal. Você tem o direito de
ser assistido por um advogado e tê-lo presente durante seu interrogatório. Se você não puder
pagar um advogado, lhe será indicado um se assim o quiser. Se você quiser falar durante seu
interrogatório, poderá deixar de fazê-lo a qualquer momento.
- 58 -
visto que o estado não tem o direito de invadir um quarto de casal para definir
como seriam suas relações sexuais. Constam, ainda, precedentes sobre a
liberdade de expressão.
Importante destacar, nesse período histórico, a atuação do Tribunal
Constitucional Alemão90 conhecido como Bundesverfassungsgericht, ou BVerfG.
Na Alemanha, o Tribunal que não está sujeito a recursos ordinários, estando afeto
apenas às questões constitucionais, estabelecido no segundo pós-guerra, no qual
os membros, sem nenhum contágio com o nazismo, ajudaram a fazer uma
transição democrática que serviram de exemplo para o mundo todo.
O Tribunal germânico julgou, em 1958, um de seus casos mais
importantes, o chamado ‘caso Lüth91’. Diante desse caso, o Tribunal entendeu
que o direito fundamental à liberdade de expressão deveria prevalecer sobre a
regra geral estabelecida no Código Civil que protegia a ordem pública,
estabelecendo a chamada teoria horizontal dos direitos fundamentais, ou seja,
esses direitos se sobrepõe a todos os outros direitos postos, a qual se espalhou
por diversos países.
90
“Como vimos, por meio da análise do percurso histórico tomado pela jurisprudência do Tribunal
Constitucional Federal alemão, pode-se perceber que, a partir do momento em que tal Corte
começa a apresentar uma forte tendência ao ativismo judicial, emerge a controvérsia quanto à
legitimidade de suas decisões, o que enseja, na doutrina, uma busca intensa por uma
racionalidade metodológica apta a justificar tal prática. Na Corte, os direitos deixam de ser
concebidos como subjetivos, e passam a ser entendidos como princípios de uma ordem jurídica
objetiva e total, passíveis de otimização e ponderação” (CARVALHO, Juliana Brina Corrêa Lima
de. Sobre os Limites da Argumentação Jurídica: a desconstrução do ativismo judicial fundado na
ponderação de princípios e a reinvenção da legitimidade jurídica nos pensamentos da Jürgen
Habermas e Chantal Mouffe. Revista do Direito Público, Londrina, v.8, n.1, p.9-52)
91
VALE, André Rufino do. 50 anos do caso Lüth. Disponível em:
http://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/index.php/cienciajuridica/article/view/724/505. Acesso em:
06 de janeiro de 2014.
- 59 -
nenhuma complexidade. Basta a literal e sistemática do ordenamento, da doutrina
e jurisprudência, e o Estado-juiz estará apto a vincular aquele fato da vida à
norma que lhe convergir.
Todavia, nos interessa nesse ponto do estudo, os casos de certa
complexidade. Tais casos são assim classificados, visto que não há para eles
solução pré-pronta no ordenamento.
Pode ser (i) que haja profunda divergência sobre as interpretações
possíveis; ou (ii) que a linguagem da norma seja de proposital amplitude
tornando-a, conforme o posicionamento adotado, aberta ou ambígua (vide, por
exemplo, termos muito frequentes como ‘calamidade pública’, ‘interesse social’,
‘relevância’, ‘urgência’, ‘moralidade’, ‘eficiência’, ‘solidariedade’, dentre tantos
outros). Ainda, é possível, (iii) que haja desacordos morais razoáveis entre os
intérpretes do ordenamento. São pessoas pensando de maneira diferente sobre o
mesmo assunto, de modo a gerar incisivo embate acerca do tema abordado.
Tais episódios, ditos complexos, autorizariam o avanço da
interpretação pelo julgador. Assim, o magistrado se torna coparticipante do
processo de criação do direito. A rigor, caberá ao magistrado criar a norma a
vigorar no concreto.
A norma jurídica não é só enunciado normativo abstrato. Ela é
composta pelos fatos relevantes. É a normatividade e a facticidade. Não há
normatividade antes da interação da norma com os fatos. Sem que a norma
interaja com os fatos, de nada vale a sua existência.
Nessa atividade criativa do magistrado, caber-lhe-á recorrer à
filosofia, à moral, aos valores sociais, à ideologia social vigente nessa matéria.
Enfim, o juiz não deverá transpor sentimentos pessoais, mas sim declarar o
sentimento social, a vontade pública.
Vale colacionar as palavras de Luiz Fux, proferidas em na posse de
Joaquim Barbosa como presidente do Supremo Tribunal Federal:
- 60 -
interesses. Pouca ou nenhuma importância alcançam aqueles que
jamais saíram das sombras e correm o risco de ser esquecidos.
Diversamente, quando fazem valer o seu dia na corte essas pessoas
vêm seus direitos garantidos, em uma arena em que não sai
vencedor a forçados poderosos, mas sim a força dos argumentos.”
- 61 -
Vejamos a lição de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart
94
a respeito do tema:
94
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 4.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.pág. 198.
- 62 -
3.4.1.1. ESPÉCIES DE TUTELA ANTECIPADA
95 ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de tutela. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 77
- 63 -
antecipada. Trata-se do caso em que o direito perquirido em juízo, ou parte dele,
é incontroverso.
Teori Albino Zavascki96 comenta a respeito:
96
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de tutela. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 108
- 64 -
3.4.1.2. TUTELA ANTECIPADA DE OFÍCIO: POSSIBILIDADE
97
SCHMIDT JUNIOR, Roberto Eurico. Tutela antecipada de ofício. Curitiba: Juruá, 2008. pág. 143.
- 65 -
Cândido Rangel Dinamarco98 analisa ainda o juízo de mal maior,
como sendo um dos deveres do juiz na concessão da tutela de urgência,
vejamos:
98
DINAMARCO, Cândido Rangel. Nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2007. Pág.
323
99
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência: fundamentos da tutela antecipada. São
Paulo: Saraiva, 1995. pág. 338.
100
DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro interpretada. São Paulo:
Saraiva, 1994. pág. 161
- 66 -
espaço, aplicando critério teleológico na interpretação da lei, sem
desprezar os demais pontos interpretativos. Procederá com técnica
teleológica, mostrando a utilidade em vincular o ato
interpretativo do magistrado à sua decisão, tendo em vista um
dado momento. O fim social é o objetivo de uma sociedade
encerrado na somatória de atos que constituirão a razão de sua
composição; é, portanto, o bem social que pode abranger o útil, a
necessidade social e o equilíbrio de interesses etc. O intérprete
aplicador poderá: a) concluir que um caso que se enquadra na
lei não deverá ser por ela regido porque não está dentro de sua
razão, não atendendo à finalidade social; b) aplicar a norma a
hipóteses fáticas não contempladas pela letra da lei, mas nela
incluídas, por atender a seus fins. Consequentemente, fácil será
perceber que um comando legal não deverá ser interpretado fora do
meio social presente; imprescindível será adaptá-lo às necessidades
sociais existentes no momento de sua aplicação. Essa diversa
apreciação e projeção no meio social, em razão da ação do tempo,
não está a adulterar a lei, que continua a mesma.”
- 67 -
partes não é senão um meio, que serve para conseguir a
finalidade do processo na medida em que dá lugar àquele
impulso destinado a satisfazer o interesse público da atuação
da lei na composição dos conflitos. A aspiração de cada uma das
partes é a de ter razão: a finalidade do processo é a de dar razão a
quem efetivamente a tem. Ora, dar razão a quem tem é, na
realidade, não um interesse privado das partes, mas um interesse
público de toda a sociedade. (grifos nossos).”
101
PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2005. pág. 118
- 68 -
Mais uma vez, trazendo à baila as lições do ministro Fux102:
102
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência: fundamentos da tutela antecipada. São
Paulo: Saraiva, 1995. pág 76
103
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência: fundamentos da tutela antecipada. São
Paulo: Saraiva, 1995. pág . 41
104
Apud. Pág. p. 338, nota de rodapé nº 153
- 69 -
Ora, se o Estado tem o dever de velar pela inteireza dos direitos
consagrados no ordenamento positivo, se a jurisdição é sucedânea
diante do descumprimento das normas, se o Estado, ao prestar a
jurisdição, inculca no cidadão a seriedade necessária ao
estabelecimento normativo da paz porque sinaliza com a atuação da
justiça em caso de transgressão, e, por fim, se jurisdição é sinônimo
de soberania, nada justifica que o exercício da soberania não se
perfaça ex officio, mas dependente do requerimento da parte”105.
105
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência: fundamentos da tutela antecipada. São
Paulo: Saraiva, 1995. Pág. 77, nota de rodapé nº 159
106
SCHMIDT JUNIOR, Roberto Eurico. Tutela antecipada de ofício. Curitiba: Juruá, 2008. pág.
120
107
SILVA NETO, Francisco Antônio de Barros e.A antecipação da tutela nos processos
declaratórios. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2005. pág. 187
- 70 -
Mais uma vez a lição de Luiz Fux a respeito do tema:
108
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência: fundamentos da tutela antecipada. São
Paulo: Saraiva, 1995. pág 80-81.
109
(http://stj.jus.br/portal_stj//publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=110983)
110
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2ª ed. São
Paulo: Malheiros, 2008.
- 71 -
(...) “a ideia de ativismo judicial está associada a uma participação
mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e
fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação
dos outros dois Poderes.”
111
BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas normas. 9.ed. Rio
de Janeiro: Renovar, 2008.
112
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil: Comentado artigo
por artigo. 4. tiragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. pág. 20.
- 72 -
pode causar prejuízo, mas a omissão. O juiz que se omite é tão
nocivo quanto o que julga mal. Prudência e equilíbrio não se
confundem com medo, e a lentidão da justiça exige que o juiz deixe
de lado o comodismo do velho procedimento ordinário- no qual
alguns imaginam que ele não erra- para assumir as
responsabilidades de um novo juiz, de um juiz que trata dos “novos
direitos” e que também tem que entender- para cumprir sua função
sem deixar de lado a sua responsabilidade ética e social- que as
novas situações carentes de tutela não podem, em casos não raros,
suportar o mesmo tempo que era gasto para a realização dos
direitos de sessenta anos atrás, época em que foi publicada a
célebre obra de Calamandrei, sistematizando as providencias
cautelares.”
- 73 -
A quebra da inércia jurisdicional se efetiva na propositura da ação.
Dai em diante, o sistema atribui ao condutor da lide diversos instrumentos
processuais para que o caminho seja direcionado ao fim almejado pelo Estado e
pelos jurisdicionados, qual seja, a justa solução do conflito posto.
Vale dizer que já existe no ordenamento previsão expressa da
possibilidade da concessão de tutela antecipada de ofício. O artigo 3º, da Lei
12.153/09, que disciplina o procedimento nos Juizados Especiais da Fazenda
Pública, trouxe, expressamente, a primeira previsão legal de possibilidade de
concessão de tutela antecipada de ofício.
autores do anteprojeto. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007. pág. 857
- 74 -
instrumentos a fim de garantir a efetividade do provimento judicial, inclusive
aplicando multas e impondo medidas coercitivas de plano.
Observando, ainda, que nos processos coletivos, o titular do bem da
vida é representado por um legitimado, este legitimado não pode escolher de que
forma quer receber o provimento jurisdicional, como nas ações individuais,
justifica-se, ainda mais, a concessão da tutela antecipada de ofício pelo
magistrado.
Até no que toca à discussão sobre a previsão legal do requisito de
‘requerimento da parte’, o artigo 12, da LACP, não o inclui como requisito
específico para a concessão da antecipação da tutela nas ações coletivas.
Marcelo Abelha Rodrigues114 defende que em razão da natureza
pública dos direitos pleiteados nas ações coletivas, o magistrado deve se
aproximar ainda mais da efetividade da prestação jurisdicional, sendo certo que
sua atuação é necessariamente mais ativa.
Ainda que ausente o requerimento da parte, após serem ouvidos os
órgãos envolvidos, a maioria da doutrina defende a autorização de antecipação
da tutela de ofício pelo magistrado, a fim de garantir-lhe efetividade.
Para Luiz Fux115, a adequação do sistema de direito às
necessidades prementes da coletividade, são necessárias e, dessa forma, não há
como não garantir ao magistrado a interpretação mais ampla da legislação, no
sentido de utilizar-se de todos os institutos disponíveis para a garantia e
satisfação do bem almejado. Em destaque:
114
ABELHA, Marcelo. Ação Civil Pública e Meio Ambiente. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2003. pág. 156 e 161.
115
FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidencia: fundamentos da tutela antecipada. São
Paulo: Saraiva, 1996. pág. 79-80.
116
FUX, Luiz. Op. cit., p. 76.
- 75 -
princípios devem ser amenizados, a fim de que se tenha maior efetividade na
tutela.117
No tocante a prestação condenatória de pagamento, alguns autores
defendem que a medida restaria implicada em difícil reparação, se não,
completamente irreparável. Sérgio Cruz Arenhart118 afirma que isso pode ser
superado por outras formas de execução que não a expropriatória, tendo esse
entendimento já afirmado em decisão superior.119
De toda forma, qualquer que seja o provimento jurisdicional
pleiteado, há que se deixar claro a preocupação do magistrado, quando da
antecipação da tutela de ofício, que esta possa ser suspensa no curso do
processo, quando se tem o conflito entre o direito coletivo pleiteado e um possível
dano à esfera pública.
Nesses casos, essencial a aplicação da razoabilidade e ponderação
por parte do julgador, tendo em vista o interesse público presente tanto na
concessão da tutela antecipada quanto na sua suspensão.
Inclusive porque no âmbito das ações coletivas, dos danos gerados
por uma medida antecipatória não pode ser atribuído ao legitimado, menos ainda
aos detentores do direito tutelado, sendo certo que a responsabilização apenas
seria dada em caso de má-fé comprovada.
Se nas ações individuais, a concessão de medida antecipatória deve
vir acompanhada de uma análise detalhada e cuidadosa por parte do magistrado,
nas ações coletivas ainda mais necessária cautela do julgador, eis que o bem da
vida em questão transcende a esfera pessoal atingindo as esferas públicas e
coletivas, para tanto, seja qual for o direito ali pleiteado.
117
ARENHART, Sérgio Cruz. Reflexões sobre o princípio da demanda. Disponível em:
ARENHART, S. C. Reflexões sobre o princípio da demanda. Acesso em: 20 de julho de 2014.
118
ARENHART, Sérgio Cruz. A tutela de direitos individuais homogêneos e as demandas
ressarcitórias em pecúnia. In: GRINOVER, A.P.; MENDES, A.G.C.; WATANABE, K. Direito
processual coletivo e o anteprojeto de Código brasileiro de processos coletivos. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2007. pág. 24-25.
119
STJ, REsp 1243386/RS, Terceira Turma, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 12/06/2012. STJ, REsp
767741/PR, Terceira Turma, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 15/12/2009.
- 76 -
4. CRÍTICAS AO ATIVISMO JUDICIAL
- 77 -
Na divisão clássica de Montesquieu, tem-se que os poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário possuem atribuições independentes e
específicas, que lhe são próprias e determinadas para cada esfera de atuação,
cabendo-lhes exercê-las de forma privativa (com exceção, é claro da
possibilidade constitucional que legitima um determinado poder à fiscalização
recíproca de outro – como bem firmado pela teoria dos checks and balances, ou
pesos e contrapesos).
Montesquieu, pela tradução de Pedro Vieira Mota120, descreve crítica
segura e lógica no tocante a importância da separação dos poderes:
- 78 -
organização dos respectivos serviços, cada um é livre, observadas
apenas as disposições constitucionais e legais; assim é que cabe ao
Presidente da República prover e extinguir cargos públicos da
Administração federal, bem como exonerar ou demitir seus
ocupantes, enquanto é da competência do Congresso Nacional ou
dos Tribunais prover os cargos dos respectivos serviços
administrativos, exonerar ou demitir seus ocupantes; às Câmaras do
Congresso e aos Tribunais compete elaborar os respectivos
regimentos internos, em que se consubstanciam as regras de seu
funcionamento, sua organização, direção e polícia, ao passo que o
Chefe do Executivo incumbe a organização da Administração
Pública, estabelecer seus regimentos e regulamentos. Agora, a
independência e autonomia do Poder Judiciário se tornaram ainda
mais pronunciadas, pois passou para a sua competência também a
nomeação dos juízes e tomar outras providências referentes à sua
estrutura e funcionamento, inclusive em matéria orçamentária (arts.
95, 96, e 99).”
122
A jurisdição é a função atribuída a terceiro imparcial (a) de realizar o Direito de modo imperativo
(b) e criativo (c), reconhecendo /efetivando/protegendo situações jurídicas (d) concretamente
deduzidas (e), em decisão insuscetível de controle externo (f) e com aptidão de tornar-se
indiscutível. DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Introdução ao direito processual
civil e processo de conhecimento. Vol. 1. 14ª ed. Salvador: Juspodivm, 2012. Pág. 95.
- 79 -
Ainda, em vista do dinamismo do Direito e das situações novas
criadas pela vida moderna, a subsunção do fato concreto ou cotidiano à amplitude
da legislação vigente, não raro, exige do magistrado um exercício que extrapola o
que taxativamente positivado na teoria da tripartição dos poderes, bem como, a
sistemática do checks and balances.
Os efeitos do remédio constitucional do mandado de injunção, por
exemplo, concebidos na posição concretista individual intermediária, visam
remover por meio de decisão judicial, o obstáculo legislativo ao exercício do
direito constitucional.
Grande exemplo é a decisão proferida no Mandado de Injunção
número 283 pelo Ministro Sepúlveda Pertence123:
123
STF - MI: 283 DF , Relator: SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de Julgamento: 20/03/1991,
TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: DJ 14-11-1991 PP-16355 EMENT VOL-01642-01 PP-
00001 RTJ VOL-00135-03 PP-00882.
- 80 -
Nacional e a entrar em vigor no prazo de doze meses a contar da
promulgação da Constituição" - vencido o prazo nela previsto,
legitima o beneficiário da reparação mandada conceder a impetrar
mandado de injunção, dada a existência, no caso, de um direito
subjetivo constitucional de exercício obstado pela omissão legislativa
denunciada. 3. Se o sujeito passivo do direito constitucional obstado
e a entidade estatal a qual igualmente se deva imputar a mora
legislativa que obsta ao seu exercício, e dado ao Judiciário, ao
deferir a injunção, somar, aos seus efeitos mandamentais típicos, o
provimento necessário a acautelar o interessado contra a
eventualidade de não se ultimar o processo legislativo, no prazo
razoável que fixar, de modo a facultar-lhe, quanto possível, a
satisfação provisória do seu direito. 4. Premissas, de que resultam,
na espécie, o deferimento do mandado de injunção para: a) declarar
em mora o legislador com relação a ordem de legislar contida no art.
8., par.3., ADCT, comunicando-o ao Congresso Nacional e a
Presidência da Republica; b) assinar o prazo de 45 dias, mais 15
dias para a sanção presidencial, a fim de que se ultime o processo
legislativo da lei reclamada; c) se ultrapassado o prazo acima, sem
que esteja promulgada a lei, reconhecer ao impetrante a faculdade
de obter, contra a União, pela via processual adequada, sentença
liquida de condenação a reparação constitucional devida, pelas
perdas e danos que se arbitrem; d) declarar que, prolatada a
condenação, a superveniência de lei não prejudicara a coisa julgada,
que, entretanto, não impedira o impetrante de obter os benefícios da
lei posterior, nos pontos em que lhe for mais favorável.”
- 81 -
A posição concretista, individual e intermediária, isto é, inter partes e
capaz de remover o obstáculo ao exercício do direito, mas não permitindo a
execução do direito em si, já denota alvoroço no tocante na tripartição dos
poderes; à medida que determina ao Congresso Nacional o cumprimento de
alguma diretriz sob pena de alguma sanção, mostra a clara interferência e auto
imposição de um poder na esfera de atuação do outro.
Outro exemplo a ser citado do clássico concretista direto, é o
julgamento do Mandado de Injunção número 3322124 pelo Ministro Celso de Mello:
124
STF - MI: 3322 DF , Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 20/10/2011,
Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-232 DIVULG 06-12-2011 PUBLIC 07-12-2011.
- 82 -
ESTADO - A COLMATAÇÃO JURISDICIONAL DE OMISSÕES
INCONSTITUCIONAIS: UM GESTO DE FIDELIDADE, POR PARTE
DO PODER JUDICIÁRIO, À SUPREMACIA HIERÁRQUICO-
NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - A VOCAÇÃO
PROTETIVA DO MANDADO DE INJUNÇÃO - LEGITIMIDADE DOS
PROCESSOS DE INTEGRAÇÃO NORMATIVA (DENTRE ELES, O
RECURSO À ANALOGIA) COMO FORMA DE SUPLEMENTAÇÃO
DA “INERTIA AGENDI VEL DELIBERANDI” - PRECEDENTES DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RECURSOS DE AGRAVO
IMPROVIDOS.”
- 83 -
Assim, é possível levar à Suprema Corte uma gama inimaginável de
temas constitucionais, principalmente aqueles concernentes à implementação de
direitos fundamentais sociais. Nesse sentido já deliberou o Supremo125:
125
RE 436.996-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 22-11-05, Segunda Turma, DJ de 3-
2-2006.
126
GOSSELIN, Frederic. PODEMOS FALAR DE CONCORRÊNCIA ENTRE O JUIZ E O
LEGISLADOR? O paper apresentado no seminário do Centro de Direito Público intitulado É o juiz
ou o legislador: quem governa? Disponível em:
http://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/index.php/cadernovirtual/article/viewFile/41/18. Acesso
em: 28 de julho de 2014.
- 84 -
outras linhas como um Tribunal da ordem judiciária tem o poder de
controlar se o poder legislativo legiferou de maneira adequada e
suficiente permitindo ao Estado que respeite um direito consagrado
pela norma superior, proporcionando que o direito seja julgado
dentro de um prazo razoável em face do artigo 6.1 da Convenção
Européia dos Direitos do Homem. Os Presidentes da Câmara e do
Senado não deixaram de manifestar surpresa por que não dizer
indignação, a respeito desse acórdão, um deputado honorário,
jurista dentre outros, qualificando essa decisão nada mais nada
menos de um acórdão puramente político que visa substituir o nosso
Estado democrático em uma sociedade corporativista, fundada no
governo dos juízes”127.
Para ele, a teoria da Tripartição dos Poderes não pode impedir que o
Judiciário sancione uma falha do poder Legislativo já que o Estado tem
responsabilidade civil em caso de regulamentação de norma não justificando que
o mesmo legislador omita-se deste mister culposamente.
A crítica que se faz é que o estabelecimento de alguns limites à
intervenção judicial é medida necessária. No entanto, deixar este equilíbrio a
cargo dos próprios magistrados pode desprivilegiar a segurança jurídica, de modo
a surtir efeitos econômicos e sociais indesejados.
A inafastável conclusão de que o juiz ativista transpõe os limites dos
poderes constitucionais não pode ser declarada como inverídica. Essa tese
careceria de firmes arrimos.
O que se pretende é destacar situações extremas em que essa
necessidade é premente diante da ausência de vias de socorro.
Vale dizer, a solução não parece satisfatória, pois não apresenta
garantias de atuação responsável de todos os três poderes, seja para aquele que
vai criar as leis e deixa de fazê-lo a contento; seja para aquele que vai suprir a
omissão por ordem mandamental; tal qual, aquele que não conseguirá cumprir tal
ordem por simples impossibilidade material de fazê-lo. Vê-se aí que as três
127
Jornal Le Soir, 06 de setembro de 2006, p. 19.
- 85 -
funções básicas de cada um dos Três Poderes estabelecidos podem restar, em
algum momento, gravemente comprometidas.
Inarredável admitir, no entanto, que o ativismo judicial talvez seja o
primeiro passo para fazer agir as outras pontas estatais, futuramente atuando
como puro e simples controle de constitucionalidade. Neste sentido Giovani
Bigolin128:
128
BIGOLIN, Giovani. A reserva do possível como limite à eficácia e efetividade dos direitos
sociais. In: Revista Doutrina. Disponível em:
http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/15658-15659-1-PB.pdf. Acesso em: 14 de
agosto de 2014.
- 86 -
A aplicação da lei ao caso concreto, temperada pela jurisprudência,
pela doutrina, pela analogia, pelos princípios gerais do direito, pelos costumes e
pela equidade, tem o condão de germinar para as partes a regra para os casos
em concreto. Essa é a forma padrão a ser perseguida pelos magistrados nos
casos em que dispõe dos parâmetros elencados acima para judicar.
O Direito como ciência jurídica e social, dinâmico por natureza,
concentra normas positivadas com características de generalidade e abstração;
entretanto, ao fato concreto nem sempre é possível a subsunção plena à norma, o
que o afasta da adequação à realidade social – premissa primária do Direito. A
respeito do tema cita-se Arthur Kauffman129:
129
KAUFMANN, Arthur; HASSEMER, Winfried. Introdução à Filosofia do Direito e à Teoria do
Direito Contemporâneas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 315-316.
130
GADAMER, Hans-Georg. O problema da consciência histórica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora
FGV, 2003, p. 392.
- 87 -
editadas pelo STF. Assim, verifica-se o reposicionamento do paradigma da
separação constitucional de competências, conforme Ricardo Pinha Alonso131:
131
ALONSO, Ricardo Pinha. JUIZ: APLICADOR OU CRIADOR DO DIREITO?. Disponível em
http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/050307.pdf. Acesso em: 28 de julho de
2014.
- 88 -
iniciativa, seja na intervenção no parlamento pelos membros que
sustentam o governo, seja ainda na possibilidade de veto aos
projetos aprovados pela Casa Legislativa.”
JUDICIÁRIO
- 89 -
democrática legitimou o judiciário como supridor de ineficiência legislativa e
executor de políticas públicas executivas.
No entanto, essa atuação que não é função típica desse órgão,
outrora garantida como exceção, passou a ser a regra. Vide, a título de exemplo,
a corriqueira situação em que um cidadão hipossuficiente que precisa de um
remédio não mais busca o amparo da Secretaria de Saúde que o atende, mas
busca uma tutela judicial para suprir a omissão do executivo.
Ainda, essa atuação sobrecarrega a função jurisdicional que, na
maioria das vezes, carece de estrutura material e pessoal para atender as
demandas ordinárias.
A questão é: até que ponto é benéfico à sociedade ter um Poder
Judiciário mais sobressaltado? ; quais os limites imputados ao Judiciário? Vale
dizer que há projetos de Lei que pretendem regrar essa situação (“Anteprojeto de
Lei de Políticas Públicas” debatido no Curso de Pós Graduação da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, de autoria de Ada Pellegrini Grinover e
Kazuo Watanabe).
Realizadas as primeiras indagações sobre o tema, observa-se que a
hipertrofia de um dos poderes legitimados não se trata de tema recorrente.
Historicamente, no período Pós-Revolução Francesa, com a criação do Estado
Liberal, com clara distinção entre o público e o privado houve, também, a forte
atuação do Estado em garantir a certeza das relações sociais por meio do
exercício estrito da legalidade. Neste período nasceram os direitos fundamentais,
conhecidos como de primeira geração, e tinham como principal pressuposto o
ideário de liberdade.
Com o surgimento do Estado Social de Direito, no século XX,
marcado por uma maior defesa intervencionista estatal efetiva no campo
econômico e social, das prestações positivas do Estado na aplicação da
igualdade material e na realização da justiça social. Este período relaciona-se
com os direitos sociais de segunda geração, ligados a ideia de igualdade.
Atualmente, vive-se a "Era do Judiciário", a qual está diretamente
ligada ao reconhecimento dos direitos fundamentais de terceira geração, quais
sejam, os direitos coletivos, de solidariedade e fraternidade, direitos concernentes
- 90 -
ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à defesa do consumidor, da criança, do
idoso etc., e, na concepção dos doutrinadores mais modernos, podemos incluir os
direitos de quarta geração, que correspondem aos novos direitos sociais
decorrentes da evolução da sociedade e da globalização.
De acordo com as considerações de Oscar Vilhena132:
132
VILHENA, Oscar. Supremocracia. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-24322008000200005. Acesso em
23/11/2014.
- 91 -
Conforme ensina Karine Lyra Corrêa133:
133
CORRÊA, Karine Lyra. A nova interpretação do STF sobre os efeitos do mandado de injunção
e o princípio da separação de poderes. Disponível em: http://www.arcos.org.br/artigos/a-nova-
interpretacao-do-stf-sobre-os-efeitos-do-mandado-de-injuncao-e-o-principio-da-separacao-de-
poderes/. Acesso em: 30 de julho de 2014
134
TEUBNER, Gunther. Juridification of social spheres: a comparative analysis in the areas of
labor, corporate, antitrust and social welfare law. Disponível em:
http://cadmus.eui.eu/handle/1814/22297. Acesso em: 02 de setembro de 2014.
- 92 -
Verifica-se que o ativismo judicial que inicialmente conferiu maior
efetividade as normas jurídicas concretizando o espírito da lei, na a busca da paz
e da justiça social. Todavia, em última análise pode ser caracterizado como um
fenômeno de ruptura com a norma, de modo afastar o texto legal.
Veja bem, não se trata de rechaçar as técnicas interpretativas da
legislação vigente, mas sim alertar para as consequências negativas de ter um
dos poderes mais atuante que os demais.
O Judiciário não pode se negar a decidir o caso concreto. No
entanto, o debate se instala na necessidade de aprimoramento de todas as
funções estatais, distribuindo entre todas as esferas de governo as decisões e a
execução dos mandamentos constitucionais, necessários para a resolução dos
conflitos.
A dependência do judiciário é uma das inevitáveis consequências do
ativismo. Aceitar o ativismo significa aceitar esse efeito colateral. Trata-se,
portanto de permitir uma desestruturação do sistema que, a primeira vista,
desconstrói o sistema democrático.
Em suma, a análise cinge-se aos limites dessa dependência e de
sua legitimidade nas hipóteses em que se admite o ativismo, principalmente no
que toca à implementação de direitos e garantias fundamentais, na medida da
omissão dos outros poderes.
- 93 -
A judicialização da política consiste na intervenção do Poder
Judiciário, pela via indireta, nas decisões políticas. Vejamos o que dispões sobre
o tema Manoel Messias Peixinho135:
135
PEIXINHO, Manoel Messias. O Princípio da Separação dos poderes, a Judicialização da
Política e Direitos Fundamentais, Anais do XII Congresso Nacional do Conpedi. Brasília, 20 a
22/11/2008. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/brasilia/07_252.pdf.
Acesso em 26/11/2014.
136
SANTOS, Boaventura de Souza. Judicialização da política. Centro de Estudos Sociais.
Universidade de Coimbra, maio 2003. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/opiniao/bss/078en.php.
Acessado em 28/11/2014.
137
CASTRO, Marcos Faro de. O Supremo Tribunal Federal e a Judicialização da Política.
Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_34/rbcs34_09.htm. Acesso
em: 26/11/2014.
- 94 -
dessas questões até recentemente ficavam reservadas ao
tratamento dado pelo Legislativo ou pelo Executivo); e
(2) o interesse de políticos e autoridades administrativas em adotar:
(a) procedimentos semelhantes aos processo judicial e (b)
parâmetros jurisprudenciais em suas deliberações (muitas vezes, o
judiciário é politicamente provocado a fornecer esses parâmetros)."
HIRSCHL, Ran. Towards Juristocracy: The Origins and Consequences of the New
138
- 95 -
representantes do povo. O poder executivo seria, assim, o órgão legitimado a fim
de avaliar a necessidade de se imlementar e ampliar políticas públicas.
Via de regra, o judiciário deveria se limitar a declarar a necessiade
de implementar tal ou qual política, jamais invadindo o legítimo espaço da
discricionariedade administrativa.
Mas, a permissividade da expansão e atuação ativista, conduz a
uma ampliação da judicialização da política. Em determinados casos, naqueles
em que se considera legítimo o ativismo, o judiciário estaria plenamente
legitimado para não só declarar a necessidade de certa política, mas sim de
compelir ao executor que a faça de determinada maneira ou de outra.
Em que pese a crítica lançada, é certo que o que delinearão os
passos da judicialização. A situação atual é urgente e seu remédio também é.
Sendo assim, o judiciário lança mão de seus instrumentos, tal qual o ativismo, a
fim de cadenciar o sistema.
Em contraponto, o transcorrer dessa atuação ao longo do tempo
poderá romper o intuito inicial visto que seu ciclo não tem ponto final certo. O
conflito de princípios e valores não pode afastar a necessidade de efetivar os
direitos fundamentais dos cidadãos. Mas é necessário estabelecer os limites e os
parâmetros dessa atuação, haja vista que suas consequências podem se
contrapor com a ideia inicial que a permitia.
- 96 -
5. CONCLUSÕES
- 97 -
Na descrição do instituto colheu-se que a expressão ‘ativismo’ surgiu
num contexto semelhante, em que, na década de 1940, a Corte Constitucional
dos EUA passou a se posicionar diante do Estado omisso.
Pois bem, diante da nova sistemática da técnica legislativa,
superando a normatização casuística, com a implementação das chamadas
cláusulas gerais, observou-se um maior avanço na atuação do Estado-Juiz,
principalmente quando se vale do ativismo judicial.
O ativismo, em qualquer de suas dimensões (contra majoritário,
jurisdicional, criativo ou remedial), propõe a busca pela efetividade na aplicação
do Direito, com base na força normativa dos princípios, numa interpretação
regrada pela razoabilidade e pela proporcionalidade.
De outra banda, de se notar a necessidade de implementar a
permissividade de concessão de tutela antecipada de ofício, nos casos
excepcionais, conforme disposto no presente estudo, no clamor pela efetivação
dos direitos e garantias fundamentais. Não há parcialidade visto que, ao garantir a
efetividade do processo, observada a reversibilidade da medida, contribui-se para
a celeridade da justiça no caso concreto.
Uma vez quebrada a inércia jurisdicional, com propositura da ação,
cabe ao condutor da lide utilizar todos os instrumentos processuais necessários
para direcionar à justa solução do conflito posto. A previsão expressa da
possibilidade da concessão de tutela antecipada de ofício, no artigo 3º, da Lei
12.153/09, já evidencia a normatização dessa proposta.
Com relação à segurança jurídica deve-se focar, em primeiro lugar,
na segurança quanto ao julgador e sua deontologia. O texto normativo jamais
atingirá toda a amplitude de demandas, bem menos àqueles sem representação.
Sendo assim esperar que dele haja segurança jurídica seria limitar o debate aos
representados. A segurança está na livre atuação do magistrado e de todos os
instrumentos que se dispõe para a efetivação do processo.
Entretanto, é de rigor pontuar que a necessidade de se resguardar
as barreiras constitucionais estabelecidas na divisão de poderes não pode ser
superada. A proposta apresentada é de, apenas nas hipóteses de crise
- 98 -
democrática configurada, no intuito de aplicar valores constitucionais de maior
valor, que o juiz deve lançar mão do ativismo.
Em verdade, é urgente a necessidade de aprimoramento de todas
as funções estatais. Sobrecarregar um dos pilares constitucionais não soluciona o
problema posto. Exige-se, assim, uma maior distribuição da execução dos
mandamentos constitucionais entre todas as esferas de governo, a fim de que
todos participem das decisões necessários para a resolução dos conflitos.
Nesse esteio, estabelecidos os parâmetros da atuação ativista, bem
como os passos necessários para as mudanças que afastariam a necessidade de
implementa-lo.
Em suma, a análise cinge-se aos limites dessa dependência e de
sua legitimidade nas hipóteses em que se admite o ativismo, principalmente no
que toca à concretização de direitos e garantias fundamentais, na medida da
omissão dos outros poderes.
Vejamos, por fim, algumas enumerações conclusivas:
- 99 -
5. A segurança jurídica não se limita ao direito positivado pelo texto
normativo. Ela precisa ser observada no âmbito dos três poderes;
- 100 -
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