You are on page 1of 6

Revista eletrônica acadêmica

22 J. R. B. Bastos

Artigo científico

A importância da escolarização à luz da perspectiva histórico-cultural


The importance of schooling by considering a historical-cultural approach
(1)
Janaína Ribeiro Bueno Bastos

Resumo. Este estudo resgata as contribuições da psicologia histórico- (1)


Mestranda em Educação (USP); pedagoga do
cultural para o campo da educação. Para tal, discorre sobre os pressu- IFSP campus São Roque. Correspondência:
postos vigotskianos, estabelecendo um diálogo que elucida o papel da Rod. Pref. Quintino de Lima, 2.100, São Roque,
escola bem como a importância da escolarização para o desenvolvimento SP; e-mail: jrbb@usp.br
do indivíduo. Desta forma, as considerações finais compreendem a perti-
nência da abordagem de Vygotsky para a esfera educacional, conside-
rando, ainda, a necessidade do estabelecimento de um compromisso da
escola com a sociedade no sentido de proporcionar ao educando a apro-
priação de conhecimentos e habilidades necessárias para o exercício da
cidadania em seu meio sociocultural. Para a concretização do estudo foi Recebido em: 10 set. 2013
adotado como método a revisão bibliográfica. Aceito em: 15 out. 2013
Palavras-chave: Psicologia histórico-cultural; escolarização; desenvol- Publicado em: 30 abr. 2014
vimento.

Abstract. The present paper considers some contributions of the historical-cultural psychology for educational ap-
proaches. To do so, Vygotsky’s presuppositions are analyzed and a dialogue that elucidates schooling for individual de-
velopment is taken into account. Thus, final considerations engulf the importance of vygostykian approaches to an ed-
ucational view by considering the need to establish the compromise of the school and the society towards the acquisi-
tion of necessary knowledge and abilities for proper citizenship within their social-cultural media. Bibliographical re-
search was the methodology applied in this study.
Keywords: Historical-cultural psychology; schooling; development.

1 Introdução
o desenvolvimento humano? Na buscar de elucidar a
Na presente pós-modernidade, antigos valores e
referida ansiedade, faz-se necessário, primeiramente,
paradigmas têm se tornado objeto de questionamentos
compreender o processo de desenvolvimento humano
e transformações. Diversas instituições têm perdido
para estabelecer um possível diálogo sobre a contribu-
sua relevância, tendo em vista seu caráter vinculado às
ição da escola para o mesmo.
ideologias dominantes da era modera. Nesse contexto,
A fim de empreender essa investigação, tomam-se
a Instituição Escolar não se encontra isenta dessa ten-
como embasamento teórico as concepções da psicolo-
dência, uma vez que questionamentos têm emergido e
gia histórico-cultural, abordagem fundamentada por
colocado em dúvida sua real importância e contribui-
Vygotsky, tendo em vista a reconhecida atualidade e
ção para o desenvolvimento humano. Muito se tem
pertinência de seus estudos para o campo da educação,
comentado sobre a ineficácia e o descarte futuro da
cujos fundamentos serão explorados ao longo do tra-
instituição escolar, tendo em vista as novas tecnologias
balho.
que têm surgido junto ao fenômeno da globalização, as
Para a concretização deste trabalho, foi tomada
quais fornecem informações e estímulos a uma veloci-
como método a revisão bibliográfica, realizada através
dade que escola alguma poderia concorrer.
de pesquisa em livros, artigos acadêmicos, fontes ele-
Em tempos de crise e mal-estar na educação esco-
trônicas e revistas publicadas sobre o tema em ques-
lar, torna-se pertinente questionar: Qual é o papel da
tão.
escola? Qual seria a importância dessa instituição para

2 A perspectiva histórico-cultural
psicologia, visto que essa nova ciência encontrava-se
De acordo com Cole & Scribner (2009), a aborda-
dividida entre duas linhas antagônicas: de um lado es-
gem histórico-cultural surgiu no cenário da Psicologia
tavam os psicólogos behavioristas, que buscavam es-
Soviética no início do século XX. A Rússia enfrentava
tudar o comportamento humano a partir da relação
durante o período pós-revolução uma séria crise na

www.revistaifspsr.com
Volume 1 – Número 4 – Ano 2 – abril de 2014 – ISSN 2317-9066
Revista eletrônica acadêmica
23 J. R. B. Bastos

mecânica existente entre estímulo-resposta, com prin- logo, as funções psicológicas superiores se desenvol-
cípios derivados da psicologia animal; do outro, os vem no indivíduo a partir da interação deste com a so-
fundadores do movimento Gestalt (psicologia da for- ciedade e com a cultura construída ao longo da histó-
ma: encontra no fenômeno da percepção as condições ria.
para a compreensão do comportamento humano; a Poder-se-ia dizer que a característica básica do
comportamento humano em geral é que os pró-
maneira como o indivíduo percebe um determinado
prios homens influenciam sua relação com o ambi-
estímulo é que irá desencadear seu comportamento), ente e, através desse ambiente, pessoalmente modi-
que defendiam o papel da percepção como determi- ficam seu comportamento, colocando-o sob seu
nante do comportamento, o que também culminava controle (VYGOTSKY, 2009, p. 50).
em um reducionismo das funções complexas tipica-
mente humanas. Para Vygotsky, a dimensão sociocultural diz respei-
Segundo Rego (1997), Lev Semenovich Vygotsky to ao próprio grupo social que fornece ao indivíduo
juntamente com seus principais colaboradores, Ale- um ambiente estruturado, no qual cada elemento pos-
xander Romanovich Luria, Alexei Nikolaievich Leonti- sui um significado pré-estabelecido por seus integran-
ev e seu grupo de estudo, contrapondo-se as tendên- tes. Porém, a cultura não é concebida como um meio
cias da época, buscou construir uma teoria marxista pronto, no qual o indivíduo será submetido; mas como
do funcionamento intelectual humano. Essa nova a- um “palco de negociações”, ou seja, um ambiente di-
bordagem visava explicar as chamadas funções psico- nâmico no qual seus membros recriam e reinterpre-
lógicas superiores, ou seja, as características do pen- tam informações, conceitos e significados, portanto,
samento tipicamente humanas que diferem os homens em constante movimento (OLIVEIRA, 1997).
dos animais, constituindo, assim, a perspectiva históri- Segundo Oliveira (2009), o homem ao longo do
co-cultural ou sócio-histórica. processo de desenvolvimento internaliza formas de
De acordo com Oliveira (1997), as proposições de comportamentos culturalmente estabelecidas, prove-
Vygotsky definem o homem como um ser social, mem- nientes do grupo no qual está inserido. É através das
bro de uma espécie biológica que se desenvolve ape- relações que o indivíduo estabelece com seus pares
nas no interior de um grupo cultural, sendo que as que a cultura tornar-se-á parte da própria natureza
funções psicológicas superiores do ser humano com- humana do mesmo, o que, por sua vez, possibilitará a
preendem complexos processos mentais que envol- construção das funções psicológicas superiores ao
vem o controle consciente do comportamento, ação in- longo de sua história social. As condições anteriores
tencional e capacidade de abstração, com caráter vo- permitem à abordagem sócio-histórica inferir que a li-
luntário e intencional. Conforme afirma Rego: nha natural e a linha cultural do desenvolvimento hu-
mano se encontram inter-relacionadas, em um proces-
Diferente do animal, o ser humano não se orienta so no qual o ser biológico torna-se um ser sócio-
somente pela impressão imediata e pela experiên-
histórico. Assim, seu desenvolvimento enquanto ser
cia anterior, pois pode se abstrair, fazer relações,
reconhecer as causas e fazer previsões sobre os a- humano só será possível a partir de sua interação com
contecimentos, e depois de refletir e interpretar, o meio físico e social, conforme afirma Leontiev: “Cada
tomar decisões. Nesse sentido, ele é livre e inde- indivíduo aprende a ser um homem. O que a natureza
pendente das condições do momento e do espaço
lhe dá quando nasce não lhe basta para viver em soci-
presentes (REGO, 1997, p. 47).
edade. É lhe ainda preciso adquirir o que foi alcançado
Desta forma, as funções psicológicas superiores di- no decurso do desenvolvimento histórico da sociedade
ferem das funções elementares do ser humano. As fun- humana” (LEONTIEV, 1978, p. 267 apud BOCK, 1994,
ções elementares são ações reflexas inatas, ou seja, en- p. 30).
contram-se presente no indivíduo desde o nascimento, Oliveira (1997) afirma que a perspectiva histórico-
como a ação reflexa de sucção, as quais podem ser cultural compreende que a relação que o indivíduo es-
consideradas como diretas, visto que não dependem tabelece com o mundo não constitui uma relação dire-
de nenhum elemento auxiliar para se desenvolverem. ta, como no caso das funções elementares, mas sim
Para Vygostsky (2009), a perspectiva histórico- mediada, ou seja, existem mediadores entre o homem
cultural compreende que as características tipicamen- e o mundo real que, por sua vez, interferiram na forma
te humanas não são inatas, ou seja, não dependem a- de agir e na imagem que o indivíduo construirá de si
penas de um processo de maturação para se manifes- mesmo.
tarem na vida de um indivíduo; nem tampouco se Essa afirmação remete a um conceito elementar da
constituem pelas pressões externas do meio, mas re- teoria de Vygotsky: a ideia de mediação. Segundo a au-
sultam da interação dialética do homem e seu meio tora, mediação pode ser entendida como o processo de
sociocultural, ou seja, à medida que o ser humano intervenção de um elemento em uma dada relação; ou
transforma o meio no qual está inserido para suprir seja, uma relação deixa de ser direta entre os elemen-
suas próprias necessidades, transforma-se a si mesmo; tos que a constituem para ser mediada por um terceiro

www.revistaifspsr.com
Volume 1 – Número 4 – Ano 2 – abril de 2014 – ISSN 2317-9066
Revista eletrônica acadêmica
24 J. R. B. Bastos

elemento, tornando-se um ato complexo. Assim, a i- De acordo com Oliveira (1997), as referidas práti-
deia de mediação envolve dois aspectos complementa- cas culturais, bem como a utilização de instrumentos e
res: o processo de representação mental e os sistemas os sistemas de signos serão internalizados pelo indiví-
simbólicos que se colocam entre o indivíduo e o objeto duo ao longo de seu desenvolvimento humano, que
de conhecimento, possuindo origem social. segundo a abordagem histórico-cultural assume uma
direção que vai do plano social para o individual atra-
Desse modo, os sistemas simbólicos (entendidos vés do processo de internalização. Segundo a autora, a
como sistemas de representação da realidade), es-
partir da interação que o homem estabelece com seus
pecialmente a linguagem, funcionam como elemen-
tos mediadores que permitem a comunicação entre pares é que aquilo que antes estava apenas na dimen-
indivíduos, o estabelecimento de significados com- são social e externa (ou seja, interpsíquica) passará a
partilhados por determinado grupo cultural, a per- fazer sentido para o indivíduo, migrando para o plano
cepção e interpretação dos objetos, eventos e situa-
individual e interno, denominado intrapsíquico, o que
ções do mundo circundante. É por essa razão que
Vygotsky afirma que os processos de funcionamen- constitui o processo de internalização. O processo de
to mental do homem são fornecidos pela cultura, internalização não implica em uma assimilação passi-
através da mediação simbólica (REGO, 1997, p. 55). va das funções psíquicas, mas sim em uma reconstru-
ção feita pelo próprio indivíduo, que, ao ser internali-
Logo, as relações que o ser humano estabelece com zada, implicará em uma nova reestruturação mental, o
outros indivíduos dentro de um determinado contexto que resultará no alargamento e enriquecimento de seu
cultural são o que lhe permite participar de práticas funcionamento psicológico.
sociais historicamente construídas e, portanto, incor- Logo, faz-se notório o papel fundamental que a cul-
porar dados comportamentos do grupo no qual está tura exerce no desenvolvimento do ser humano, bem
inserido, o que possibilitará o desenvolvimento de su- como a importância da dimensão social na formação
as funções psicológicas superiores, tipicamente huma- das funções psicológicas superiores, tipicamente hu-
nas (REGO, 1997). manas.

3 O papel atribuído à escola


quais os membros mais experientes do grupo tentam
Na abordagem histórico-cultural, o processo de de-
fazer com que membros menos experientes adquiram
senvolvimento vai do plano social para o plano indivi-
as capacidades indispensáveis para participarem ati-
dual. Logo, pode-se ressaltar o papel fundamental que
vamente do mesmo denomina-se educação (COLL,
a interação do indivíduo com o outro desempenha no
1999).
processo de internalização, o qual possibilitará ao su-
De acordo com Rios (2008) diversas instituições da
jeito se apropriar de algo que foi socialmente constru-
sociedade humana têm dentre seus objetivos, a pre-
ído, visto que o mesmo nasce em uma sociedade estru-
servação e a transmissão de cultura, sendo que a edu-
turada por costumes e valores (OLIVEIRA, 1997).
cação é o processo pelo qual ocorre essa transmissão,
Segundo Coll (1999), ao considerar-se a importân-
e a escola, em nossa sociedade, é a organização social
cia da internalização pelo indivíduo de determinados
encarregada especificamente dessa tarefa:
elementos culturais, a transmissão de cultura faz-se
necessária, justamente pelo fato de a mesma não estar Pode-se dizer, em sentido amplo, que a educação,
naturalmente incorporada à esfera biológica do indi- definida como processo de transmissão de cultura,
víduo, mas sim na dimensão social do mesmo. Em está presente em todas as instituições. Entretanto,
em sociedades como a nossa há uma instituição cu-
primeira instância, a cultura é transmitida à criança ja função específica é a transmissão da cultura – es-
pelos responsáveis que compõem o grupo de contato ta instituição é a escola. Ela é o espaço de transmis-
mais próximo, ou seja, a família; posteriormente, po- são sistemática do saber historicamente acumulado
derá ser transmitida inclusive por instituições organi- pela sociedade, com o objetivo de formar indiví-
duos, capacitando-os a participar como agentes na
zadas pela sociedade, a qual o grupo familiar integra. construção dessa sociedade (RIOS, 2008, p. 34).
Porém, os grupos familiares e as instituições que
compõem as sociedades possuem expectativas em re- Assim, pode-se inferir que a escola se constitui em
lação a um novo membro, de acordo com o contexto uma instituição que reorganiza o meio a fim de pro-
no qual estão inseridos, e passam a estruturar o meio, porcionar ao educando o contato sistemático e intenso
a fim de proporcionar situações que permitam ao in- com o conhecimento acumulado e organizado cultu-
divíduo adquirir as habilidades consideradas necessá- ralmente, com o intuito de promover a aprendizagem
rias, de forma a torná-lo um ser ativo e participativo e o desenvolvimento pleno do ser. A instituição esco-
do grupo, à medida que compartilha da mesma cultu- lar, ao proporcionar ao aluno a aquisição das habilida-
ra. Assim, o conjunto de práticas sociais por meio das des consideradas pela sociedade como fundamentais

www.revistaifspsr.com
Volume 1 – Número 4 – Ano 2 – abril de 2014 – ISSN 2317-9066
Revista eletrônica acadêmica
25 J. R. B. Bastos

para o exercício da cidadania, torna-o apto para parti- cial e de condições para a construção de novos co-
nhecimentos (REGO, 1997, p. 105).
cipar ativamente de seu contexto social.
Assim, o ensino escolar possui um papel relevante Todavia, para que os educandos tenham acesso ao
na formação de conceitos pelo educando, visto que as conhecimento e às experiências necessárias para uma
atividades desenvolvidas na escola introduzem novos aprendizagem efetiva, pode-se inferir que a escola
modos de operação intelectual, que permitem à crian- precisa estar compromissada em proporcionar melho-
ça tomar conhecimento de seus próprios processos de res situações de aprendizado. O âmbito escolar neces-
raciocínio e construir generalizações mais amplas a- sita valorizar o aluno e o professor como sujeitos do
cerca da realidade, modificando sua relação com o conhecimento, de forma a estimular um ensino volta-
mundo (REGO, 1997). do para a reflexão, que permita ao educando apropri-
A perspectiva histórico-cultural ao defender a ori- ar-se dos saberes necessários para a formação cidadã.
gem social das funções psicológicas superiores, bem Entretanto, a escola brasileira não tem desempe-
como o aprendizado como elemento impulsionador do nhado suas atribuições de maneira eficiente e eficaz,
desenvolvimento do indivíduo, aponta para a impor- tendo em vista a exclusão de uma parcela significativa
tância da escolarização, em função da mesma propor- da população do ensino escolar, bem como a defasa-
cionar ao educando o acesso ao conhecimento social- gem contida nas metodologias de ensino, o que reflete
mente construído. Do mesmo modo, é a educação que na aprendizagem dos educandos.
possibilitará ao aluno tornar-se um ser ativo e partici- Contudo, os motivos pelos quais a escola brasileira
pativo na sociedade, na medida em que se apropria de não tem cumprido seu papel não podem ser tratados
habilidades e conhecimentos necessários para exercer sob uma ótica reducionista; porém, sem ter a preten-
sua cidadania autonomamente. Semelhantemente, Le- são de culpabilizar unicamente a escola pelo proble-
ontiev infere acerca da relação existente entre o pro- ma, pode-se afirmar que quando a mesma por diferen-
gresso histórico e progresso educacional: tes motivos não cumpre seu papel em tornar o conhe-
Quanto mais progride a humanidade, mais rica é a cimento acessível ao aluno, pode-se inferir que está
prática sócio-histórica acumulada por ela, mais cooperando para o processo de alienação do ser hu-
cresce o papel específico da educação e mais com- mano.
plexa é a sua tarefa. Razão por que toda a etapa no-
De acordo com Duarte (2001), o conceito de alie-
va no desenvolvimento da humanidade, bem como
nos diferentes povos, apela forçosamente para uma nação pode ser entendido como a ação de impedir o
nova etapa no desenvolvimento da educação; o indivíduo de apropriar-se daquilo que integra suas ne-
tempo que a sociedade consagra à educação das ge- cessidades e possibilidades de ser humano, o que co-
rações aumenta; criam-se estabelecimentos de en-
labora para sua desumanização, visto que “alienação é
sino, a instrução toma formas especializadas, dife-
rencia-se o trabalho do educador do professor; os sempre alienação em face de alguma coisa e, mais pre-
programas de estudo enriquecem-se, os métodos cisamente, em face das possibilidades concretas de de-
pedagógicos aperfeiçoam-se, desenvolve-se a ciên- senvolvimento genérico da humanidade” (HELLER,
cia pedagógica. Esta relação entre o progresso his-
1992, p. 37 apud DUARTE, 2001, p. 341).
tórico e o progresso da educação é tão estreita que
se pode sem risco de errar julgar o nível geral do Desta forma, o sentido de alienação compreende
desenvolvimento histórico da sociedade pelo nível um fenômeno de origem social, em função de a mesma
de desenvolvimento do seu sistema educativo e in- ter como principal característica a omissão de uma de-
versamente (LEONTIEV, 1978, p. 273 apud BOCK,
terminada sociedade e os obstáculos postos pelos in-
1994, p. 31).
tegrantes da mesma, na busca de evitar que outros
Assim, tendo em vista a importância da escolariza- conquistem os bens materiais e intelectuais historica-
ção na própria constituição do indivíduo, sobretudo mente produzidos, necessários para seu desenvolvi-
em uma sociedade letrada, industrializada e burocrati- mento humano.
zada como a sociedade capitalista, os postulados de A ideia de possibilidade de desenvolvimento hu-
Vygotsky remetem a problemática existente na ques- mano também diz respeito às potencialidades existen-
tão sociopolítica do saber, no que se refere à transmis- tes no indivíduo, tal como a aquisição e operação com
são social do conhecimento à população, a despeito de os sistemas de signos culturalmente construídos; o
sua condição econômica. Logo, nessa perspectiva, fato- domínio das formas de linguagem e sistemas numéri-
res como a exclusão, fracasso e evasão escolar com- cos; a capacidade de autonomia intelectual e o exercí-
preendem situações de extrema gravidade, conforme cio da criticidade.
afirma Rego:
Todas essas habilidades potencialmente presentes
Isto quer dizer que o fato de o indivíduo não ter a- no educando devem ser trabalhadas pelo âmbito edu-
cesso à escola significa um impedimento da apro-
priação do saber sistematizado, da construção de
cacional tendo como objetivo a formação básica do ci-
funções psicológicas mais sofisticadas, de instru- dadão. Contudo, para superar alienação, a escola ne-
mentos de atuação e transformação de seu meio so- cessita firmar um compromisso político não apenas

www.revistaifspsr.com
Volume 1 – Número 4 – Ano 2 – abril de 2014 – ISSN 2317-9066
Revista eletrônica acadêmica
26 J. R. B. Bastos

com o educando, mas também com a própria socieda- Em outras palavras, a escola e o educador ao esta-
de, ao desenvolver um trabalho pedagógico que possi- belecerem um compromisso político com a sociedade,
bilite a apropriação do conhecimento construído soci- se comprometem com o desenvolvimento do educan-
almente ao longo da história; desta forma, a escola do. Assim, surge a necessidade de uma articulação en-
cumprirá seu papel, ao colaborar para que as potencia- tre Estado, escola e família para a realização de um
lidades do aluno se concretizem. trabalho pedagógico em prol da efetivação do potenci-
De acordo com Rios (2008) o conceito de política al existente, na luta contra a manutenção de formas de
encontra-se associado à ideia de poder, à capacidade alienação social inseridas no âmbito educacional. Po-
de influência, à possibilidade de escolha e à definição rém, sem diminuir a importância das demais institui-
de alternativas de ação. Logo, firmar um compromisso ções citadas para a formação do cidadão bem como
político significa tomar partido, ou seja, não permane- para o desenvolvimento humano, torna-se pertinente
cer indiferente perante as alternativas; escolher parti- ressaltar o fato de a educação escolar se caracterizar
cipar em relação à vida social (HELLER, 1982 apud como uma poderosa ferramenta de formação, em fun-
RIOS, 2008). ção da própria sistematização do conhecimento que
funda e estrutura a mesma.

4 Considerações finais
Assim, a prática pedagógica desenvolvida no âmbi-
Tendo em vista a revisão bibliográfica realizada no
to educacional deve estar comprometida com o desen-
presente trabalho, considero a pertinência da aborda-
volvimento pleno do educando, trabalhando a partir
gem histórico-cultural, ao compreender o ser humano
de seu nível de desenvolvimento real, tendo em vista a
como um sujeito histórico-social que possui potencial
concretização de suas habilidades em potencial. Logo,
de desenvolvimento, o qual, por sua vez, se concretiza
a escola necessita considerar os saberes adquiridos
através das relações que o mesmo estabelece com ou-
pelo educando em suas vivências cotidianas, o que im-
tros indivíduos.
plica na valorização de sua cultura e história de vida;
Sendo assim, o desenvolvimento do potencial hu-
na compreensão do aluno como indivíduo que ao a-
mano encontra-se atrelado às oportunidades que o
dentrar no espaço da educação formal, possui uma
grupo social oferece. Logo, pode-se inferir que tanto a
prévia leitura de mundo proporcionada por seu meio
sociedade quanto a escola exercem influência direta
social.
na qualidade do desenvolvimento do indivíduo.
Desta forma, ressalto a pertinência do paradigma
Analisando as contribuições do paradigma funda-
fundamentado por Vygotsky para o resgate do papel
mentado por Vygotsky para o campo da educação, faz-
da escola para o desenvolvimento do ser humano: a-
se necessário considerar a relevância do papel atribu-
firmação essa que não possui a pretensão de isentar à
ído ao escola, enquanto mediadora entre o educando e
escola da crise que perpassa sua estrutura, mas antes
o objeto de conhecimento, bem como a importância da
visa elucidar e valorizar o papel dessa instituição, rea-
efetivação do processo de aprendizado como impulsi-
firmando assim, a importância da mesma realizar com
onador social do desenvolvimento, visto a intenciona-
excelência a parte que lhe cabe.
lidade da prática educativa.

Referências

BOCK, A. M. A perspectiva sócio-histórica de Leontiev e a crítica à naturalização da formação do ser humano: A


adolescência em questão. In: DUARTE, N. (Org.). A psicologia de A. N. Leontiev e a educação na sociedade contem-
porânea. Campinas: Papirus, 2004.

COLE, M; SCRIBNER, S. Introdução. In: VYGOTSKY, L. S. A Formação social da mente. Trad. José C. Neto; Luís S. M.
Barreto; Solange C. Afeche. 7.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

COLL, C. Psicologia da Educação. Porto Alegre: Artmed, 1999.

DUARTE, N. Vigotski e o “Aprender a aprender”: crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vi-
gotskiana. 2.ed. Campinas: Autores Associados, 2001.

LIBÂNEO, J. C. Didática. 28.ed. São Paulo: Cortez, 2008.

www.revistaifspsr.com
Volume 1 – Número 4 – Ano 2 – abril de 2014 – ISSN 2317-9066
Revista eletrônica acadêmica
27 J. R. B. Bastos

MOYSÉS, L. Aplicação de Vygotsky à educação matemática. 3.ed. Campinas: Papirus, 1987.

OLIVEIRA, M. K. de. Vygotsky: Aprendizado e desenvolvimento - um processo sócio-histórico. 4.ed. São Paulo:
Scipione, 1997.

REGO, T. C. Vygotsky: Uma perspectiva histórico-cultural da educação. 4.ed. Petrópolis - RJ: Vozes, 1997.

RIOS, T. A. Ética e Competência. 18.ed. São Paulo: Cortez, 2008.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Trad. José C. Neto; Luís S. M. Barreto; Solange C. Afeche. 7.ed. São
Paulo: Martins Fontes, 2009.

Como citar este artigo científico

BASTOS, J. R. B. A importância da escolarização à luz da perspectiva histórico-cultural. Scientia Vitae, vol. 1, n.


4, ano 2, abr. 2014, p. 22-27. Disponível em: <www.revistaifspsr.com/>; acesso em: ___/___/____.

www.revistaifspsr.com
Volume 1 – Número 4 – Ano 2 – abril de 2014 – ISSN 2317-9066

You might also like