Contextualizando Teorias e Práticas de Pesquisa de Bricolagem
Matt Rogers Universidade de New Brunswick, Canadá Pesquisa Bricolagem (p. 1)
A bricolagem como pesquisa pode ser considerada uma abordagem crítica, de
múltiplas perspectivas, múltiplas bases teóricas e metodológicas para investigação (DENZIN; LINCOLN, 1999; KINCHELOE, 2001, 2004a, 2004b, 2004c, 2004d, 2005a; BERRY, 2004a, 2004b, 2006, 2011). A base etimológica de bricolagem vem da expressão tradicional francesa que denota artesãos que criativamente utilizam sobras de materiais de outros projetospara construir novas peças de artesanato. Para moldar seus projetos de bricolagem, bricoleurs utilizam apenas ferramentas e materiais que estão ao alcance (LEVI-STRAUSS, 1966). De maneira geral, quando a metáfora é usada no domínio da pesquisa qualitativa, denota práticas metodológicas explicitas baseadas numa noção de ecletismo, design emergente, felxibilidade e pluralidade. Além disso, implica abordagens que examinam fenômenos a partir de múltiplas perspectivas e, algumas vezes, perspectivas teóricas e metodológicas concorrentes. Defensores desta abordagem, como Berry (2004a), explicam que esta abordagem possiblita que pesquisadores adotem uma multiplicidade de dimensões epistemológicas e políticas através de suas investigações. (p. 1-2)
Abordagens metodológicas baseadas na multiplicidade não só oferecem
possibilidades únicas para construção do conhecimento, mas também criam oportunidades para ação política informada. (KELLNER, 1999). “quanto mais perspectivas para a análise e crítica de alguém, melhor será a compreensão que alguém terá do fenômeno e mais preparado alguém estará para desenvolver leituras alternativas e práticas opositivas.” (KELLNER, 1999, p. xii). (p. 2) Claude Levi-Strauss: a metáfora de produção do sentido dos Bricoleurs
Uso da metáfora da bricolagem pelo antropologista Levi-Strauss influenciou
Denzin e Lincoln, Kincheloe e Berry a desenvolverem o conceito como uma abordagem eclética para investigação social. Denzin e Lincoln, Kincheloe e Berry, no entanto, evocam a metáfora em relação pesquisa e a utilizam dentro de uma enquadramento pós- estruturalista; ao passo que o uso de Levi-Strauss refere-se à produção de sentido em termos mais gerais e o antropologista fez uso da metáfora como uma parte do projeto estruturalista (Lincoln, 2001). O Estruturalismo, como um método de investigação, originou-se na linguística do século 20. As práticas estruturalistas iniciais concentraram-se na configuração da linguagem (ou seja, as regras estruturais fundacionais que governam o compartilhamento de sentido através da comunicação verbal e textual). Nos anos de 1950, as práticas estruturalistas moveram-se para além das fronteiras da linguística, passando a ser aplicadas mais amplamente dentro das ciências sociais (STURROCK, 1979, 2003). Quando aplicadas a atividade humana, práticas estruturalistas objetivam revelar a estrutural subjacente que governa fenômenos como inteligência, interação social, e cultura humana. Levi-Strauss emprega a metáfora da bricolagem em sua busca por estruturas subjacentes que governam a produção de sentido humano. Mais especificamente, ele usou a metáfora no contexto de seu desafio ao então pensamento dominante dentro da antropologia que bifurcava a racionalidade mítica e científica. Desestabilizando a oposição binária estruturalista, Levi-Strauss sugere que todas as formas de racionalidade resultam de uma estrutura inata da mente que levam as pessoas a buscarem entendimento. (p. 3)
Para Levi-Strauss, nas sociedade que adotam racionalidades míticas, os
processos de produção de sentido espelham um processo de bricolagem. Para Levi-Strauss, bricoleurs de produção de sentido mítico combinam a imaginação deles com quaisquer ferramentas de conhecimento que tenham à mão no repertório deles (ritual, observação, práticas sociais) e quaisquer artefatos que estejam disponíveis no contexto deles (discursos, instituições, conhecimentos dominantes) para atender às tarefas diversas de produção de conhecimento. Apesar do uso da metáfora da bricolagem ter sido usado por Levi-Strauss como parte de um projeto estruturalista, sua inflência pode ser observada para além de círculos estruturalistas, sendo adotada por pesquisadores e acadêmicos pós-estruturalistas. Neste novo contexto, bricolagem se torna uma abordagem para produção de sentido que desafia a base da racionalidade estrutural. Mais especificamente, desafia premissas epistemológicas e ontológicas de que o mundo tem estruturas universais que existem idenpendentemente das racionalidades humanas. Norman Denzin e Yvonna Lincoln: a pesquisa qualitativa como um bricoleur No capítulo introdutório de SAGE Handbook of Qualitative Reasearch, Norman Denzin e Yvonna Lincoln (1999) tomam emprestado a metáfora de bricolagem de Levi-Strauss para descrever tendências emergentes na pesquisa qualitativa. Fazendo uso da metáfora, eles descrevem como paradigmas pós-colonial e pós-postivista/ pós-modernista/ pós-estruturalista têm conduzido pesquisadores a desenvolverem abordagens ecléticas com uma multiplicidade teórica e metodológica para produção de sentido na pesquisa. O capítulo dos autores esboça uma linha do tempo de momentos históricos que influenciaram os pesquisadores no decorrer do século XX. A metáfora da bricolagem vem à tona neste percurso, no qual acadêmicos norte-americanos fazem um relato das eras da pesquisa qualitatida dos anos de 1900 até o momento presente. O relato desses acadêmicos detectam rupturas significantes em fundamentos epistemológicos, ontológicos, éticos, e políticos que influenciaram pesquisadores em momentos específicos. Esse relato indica que enquanto a pesquisa qualitativa tradicional era baseada em recionalidades positivistas, gerações sucessivas adotaram abordagens mais interpretativas, pós-postivistas, pós-coloniais, pós-modernas, construtivistas, e pós-estruturalistas. (p. 4)
Para Denzin e Lincoln, estas mudanças para discursos “pós-“ levaram
pesquisadores a engajarem-se nas dimensões complexas de investigação e, consequentemente, assumirem práticas que espelham o trabalho eclético de um bricoleur. Neste contexto, os acadêmicos utilizam a metáfora da bricolagem para articular como os pesquisadores adotaram a flexibilidade e a pluralidade através da ligação de múltiplas disciplinas (humanidades, ciências sociais), múltiplas metodologias (etnografia, análise do discurso, desconstrução, genealogia Foucaultiana), e diferentes perspectivas teóricas (feminismo, Marxismo, pós-colonialismo) em suas investigações. Para Denzin e Lincoln, a adoção de uma abordagem de bricolagem ajudou pesquisadores a respeitarem a complexidade de processos de produção de sentido e as contradições do mundo, pois a combinação de práticas metodológicas múltiplas, materiais empíricos, perspecitvas e observadores em um único estudo é melhor compreendido como uma estratégia que acrescenta rigor, amplitude, complexidade, riqueza e profundade a qualquer investigação. Há, conforme Denzin e Lincoln, cinco tipos de bricoleurs que abraçam este rigo e complexidade: o bricoleur interpretativo, o bricoleur metodológico, o bricoleur teórico, o bricoleur político, e o bricoleur narrativo. Um bricoleur interpretativo é um pesquisador que compreende que pesquisa é um processo interativo, formado pela própria história pessoal, pela biografia, pelo gênero, pela classe social, pela raça e etnia, tanto do pesquisador como das pessoas inseridas no contexto. Adotando epistemologias pós-postivistas, o bricoleur interpretativo reconhece que conhecimento nunca é livre de posicionamento subjetivo ou interpretações políticas. O bricoleur interpretativo não examina apenas o objeto de investigação, mas também como o posicionamento deles afeta os processos de pesquisa deles. A análise reflexiva denota não apenas como o posicionamento humano influencia os processos de pesquisa, ela expõe como um objeto de investigação pode ser interpretado de múltiplos perspectivas. (p. 5)
Um bricoleur metodológico é um pesquisador que combina múltiplas
ferramentas de pesquisa para realizar uma tarefa de produção de sentido. Isto significa que um bricoleur metodológico se envolve em abordagens fluidas, ecléticas e criativas para a investigação. Wickens (2011) é citado como exemplo de pesquisadora que se apropria da abordagem metodológica de bricolagem ao fazer uso de múltiplos métodos de análise para explorar redes de poder e perspectivas ideológicas amplas em uma série de romances sobre temas questionadores acerca de lésbicas, gays, bisexuais e transexuais. Para Wickens (2011), a combinação de métodos permitiu uma análise profunda, rica e fluida dos textos, assim como também permitiu conexões interpretativas críticas entre os excertos textuais dentro de romances para jovens adultos e discursos em curso em torno das questões LGBTQ. Ela usa, portanto, a bricolagem de métodos para expor como o poder opera discursivamente dentro dos textos. A bricolagem metodológica é mais do que apenas uma abordagem eclética. Um bricoleur metodológico respeita a complexidade do processo de produção de sentido, permitindo que contingências contextuais determinem os métodos de coleta de dados e análise devem ser usados. Além disso, o bricoleur metodológico usa apenas as ferramentas e meios “à mão” para realizar o trabalho de produção de conhecimento. Para Denzin e Lincoln (1999, p.4), a bricolagem necessita de um “improviso... [as] escolhas relacionadas a qual prática interpretativa empregar não são necessariamente feitas antecipadamente.” (p. 6)
Bricoleurs permitem que a dinâmica e o contexto determinem quais questões
devem ser feitas, quais métodos devem ser empregados e quais perspectivas interpretativas devem ser usadas. Isto implica que bricoleurs têm aptidão para criatividade – ele sabem como combinar artisticamente teorias, técnicas e métodos. Além disso, eles são capazes de criar suas próprias ferramentas metodológicas quando necessário; “se um pesquisador precisa inventar, ou montar novas ferramentas ou técnicas, ele o fará” (DENZIL; LINCOLN, 1999, p. 4). Bricoleurs teóricos trabalham através, e entre, múltiplos paradigmas teóricos. A partir de diferentes, e às vezes conflituosas, perspectivas, um bricoleurs teórico desempenha múltiplas leituras sobre um artefato, texto, ou fenômeno. Este processo permite que bricoleurs compreendam os diferentes contextos teóricos no qual um objeto pode ser interpretado – proporcionando uma perspectiva múltipla, pós-estruturalista, mostrando a pluralidade de complexidades que influencia o fenômeno. Uma descrição que leva em conta múltiplas perspectivas, embora não seja “mais correta” do que qualquer outra interpretação, acrescenta profundidade, rigor e multiplicidade à investigação. A bricolagem existe para questões que não são suscetíveis a uma resposta fácil. Bricoleurs políticos são pesquissadores conscientes de como conhecimento e poder estão conectados. “O bricoleur político é consciente de ciência é poder, pois todo resultado de pesquisa tem implicações políticas” (DENZIL; LINCOLN, 1999, p. 6). De forma semelhante à dos educadores que adotam pedagogias críticas, os bricoleurs políticos desenvolvem formas contra-hegemônicas de investigação que concorrem contra construtos sociais opressivos e injustiças. Bricoleurs políticos produzem conhecimento que beneficia aqueles que são marginalizados. A noção de bricoleur político influenciou a articulação de Kincheloe do bricoleur crítico. Bricoleurs narrativos entendem que a investigação é uma representação, isto é, uma narrativa. Uma vez que a realidade objetiva não pode nunca ser capturada, textos de pesquisa podem apenas representar interpretações específicas de um fenômeno. (p. 7)
Textos estão sempre posicionados a partir de perspectivas contextuais
específicas. O bricoleur narrativo tem conhecimento de que pesquisadores contam histórias sobre o mundo por eles estudado. Portanto, as narrativas, ou histórias contadas pelos cientistas são relatos preparados e enquadrados dentro de tradições narrativas específicas, frequentemente definidos como paradigmas (positivistas, pós-positivistas, construtivismo). (DENZIN; LINCOLN, 1999) Bricoleurs narrativos apreciam como ideologias e discursos moldam como o conhecimento é produzido. Em vez de tomar essas ideologias e discursos por certo, eles buscam entender a influência deles sobre processos de pesquisa e textos. Bricloeurs narrativos, portanto, tentam problematizar e eveitar representações de pesquisa unívocas. Isto implica que bricoleurs narrativos estableçam as técnicas deles a partir de múltiplas perspectivas, vozes e fontes. Denzin e Lincoln (1999) consideram a bricolagem seja mais do que pesquisa de múltiplos métodos. Para eles, trata-se de uma abordagem que possibilita que os pesquisadores respeitem a complexidade de produção de sentido e o processo de investigação. Dessa forma, a bricolagem desafia a base tradicional de pesquisas multi-métodos. Por exemplo, o bricoleur desafia o princípio tradicional de que pesquisadores devem permanecer como observadores neutros num contexto de pesquisa. Em vez de idolatrar a habilidade de neutralidade, bricoleurs envolvem-se com a dimensão política da investigação. (p. 8) Joe Kincheloe: para a bricolagem crítica
Kinchaloe a articulação da bricolagem de Denzin e Lincoln para o próximo
nível, adotando e ampliando as cinco categorias de bricoleurs. Para Kinchaloe, a crítica da investigação inclui: 1. Um distanciamento de abordagens de pesquisa positivistas e monológicas que reforçam estruturas sociais marginalizantes, opressivas e violentas; 2. Uma adoção de buscas de pesquisa que apreciem a complexidade do mundo (isto inclui processos de investigação que não estudam objetos como coisas separadas em si mesmas, mas sim como objetos do mundo conectado) e, finalmente, 3. Um movimento em direção a abordagens de pesquisa emancipatórias baseadas em teorias críticas e racionalidades epistemológicas interdisciplinares/ pós-modernistas/ pós-estruturalistas. A abordagem metológica de Kinchaloe explora holisticamente o papel dos discursos, ideologias e poder na definição de fenômenos. Dentro deste contexto, bricoleurs não apenas buscam desenvolver compreensões complexas de um fenômeno (por exemplo, a multiplicidade de maneiras qu um fenômeno pode ser interpretado), eles obejtivam desestabilizar desequilíbrios de poder, injustiça social, marginalização e opressão perpetrada através de práticas tradicionais de produção de sentido. Desafiando Paradigmas Positivistas
A bricolagem de Kinchaloe existe como uma resposta crítica à pesquisa
positivista. A base epistemológica do positivismo sugere que o conhecimento do mundo é obtido apenas através de análise científica objetiva de fatos empíricos. O positivismo considera que a pesquisa científica conduzirá ao desenvolvimento de um entendimento do mundo, e interação humana, em “termos concretos e universais” (HYSLOP-MARGISON; NASEEM, 2007, p. 15). Berry (2006, p. 89) considera que “projetos de pesquisa positivistas e outras pesquisas tradicionais tendem a trabalhar com a estrutura singular, linear, passo-a-passo.” Para Kinchaloe a construção do conhecimento humano não conduz a “verdades” universais nem pode ser considerado um processo linear ou ordenado. A produção de conhecimento num paradigma positivista é apenas possível se pesquisadores usam métodos de coleta de informação “corretos” e observam o mundo. (p. 8-9)
Para Kinchaloe, estas abordagens são monológicas – o conhecimento é
produzido através de métodos singulares, abordagens monodisciplinares que se recusam a dar conta de racionalidades alternativas, múltiplos conhecimentos, ou complexidades inerentes ao processo de investigação. A abordagem monológica de pesquisa é problemática, conforme Kinchaloe, por dois motivos: restringe a produção de conhecimento e negligencia dinâmicas de poder. A pesquisa monológica examina objetos em si mesmos, separados dos contextos sócio-históricos dos quais eles são constituídos. (KINCHALOE, 2008). Isto significa que métodos monológicos são inadequados para estudar fenômenos educacionais, pois, na educação, contextos, relacionamentos, e política, tudo desempenha papel mediador complexo. De igual forma, Hyslop-Margison e Naseen (2007, p. 21) assinalam que alguns positivistas lógicos argumentam que desde que a lógica e os processos de investigação são virtualmente identicos independente dos fenômenos estudados, nenhuma distinção é necessária entre as regras metodológicas das ciências naturais e sociais. O positivismo lógico concentra-se primordialmente na observação e análise do comportamento como se tal análise podesse ocorrer fora do contexto. A adoção dessa abordagem é uma tentativa de separar o comportamento humano do indivíduo ou da circunstância social no qual ocorre. Embora a compreensão completa de fatores que constituem um fenômeno seja impossível, remover um fenômeno do seu contexto impossibilita o reconhecimento da multiplicidade de fatores que o constituem. (KINCHALOE, 2004c). (p. 10)
Para Kinchaloe (2005a), o conhecimento é situado temporal e culturalmente.
Para respeitar esta complexidade, ele sugere que bricoleurs adotem um processo que ele denomina de hermenêutica simbiótica. Este processo implica o desenvolvimento de uma consciência ontológica e epistemológica complexas dos objetos de investigação. Isto significa que os bricoleurs buscam identificar as maneiras como os fenômenos são interconectados com outros fenômenos e socialmente construídos num diálogo entre cultura, instituições e contextos históricos. Ontologicamente, os bricoleurs examinam como as dinâmicas sócio- históricas influenciam e moldam o objeto de investigação. Epistemolocamente, os bricoleurs exploram como as bases de conhecimento de um dado contexto cercam um objeto de investigação. Análises epistemológicas, portanto, ajudam os bricoleurs a compreenderem como racionalidades dominantes influenciam compreensões de um fenômeno. Bricoleurs, para Kinchaloe, não se envolvem com a hermenêutica simbiótica como uma forma de desenvolver certezas a respeito de um fenômeno, muito menos para criar uma representação mais precisa. Para ele, “não há nenhum sentido trasnhistórico, não ideológico que bricoleurs ambicionem alcançar.” (KINCHALOE, 2004a, p. 5). Mais propriamente, uma análise simbiótica aprecia uma multiplicidade de fatores ontológicos e epistemológicos que constituem os fenômenos. Para Kinchaloe, a demanda positivista por uma certeza objetiva é problemática porque desconsidera a conexão entre conhecimento e poder. Para Foucault, a verdade não existe para ser descoberta, ela negociada culturalmente, tomando como base uma série de regras ontológicas e discursivas. Adotar este posicionamento implica acreditar que as regras que a sociedade utiliza para distinguir o que é verdadeiro do que é falso são arbitrárias. Foucault denominou estas regras sócio-históricas de episteme. Epistemes são negociadas politicamente, estando, portanto, atadas às relações de poder dominantes em uma época histórica. Isto significa que, nas sociedades, apenas certos grupos e instituições podem ganhar priminência e tornarem-se sancionados como titulares do conhecimento. As regras de produção de conhecimento numa dada episteme podem incluir: quem é sancionado para ser um produtor de conhecimento (especialistas, cientistas etc.); quais métodos devem ser seguidos para produzir a verdade (científico, quantitativo, qualitativo); ou quais instituições são sancionadas como produtoras de conhecimento (igrejas, governos, escolas, empresas). Para Foucault, grupos que detêm o poder mantêm a construção de conhecimento deles legitimada, minando conhecimentos alternativos. Para Berry (2004a), abordagens positivistas têm silenciosamente fortificado condições opressivas para grupos que têm pouco poder para produzir conhecimento. (p. 11-12)
As fundações logocêntricas positivistas e “práticas de pesquisas tradicionais
são geralmente, embora de forma involuntária, implicadas na reprodução de sistemas de opressão de classe, raça, e gênero.” (KINCHELOE; MCLAREN; STEINBERG, 2011). Em tais contextos, o bricoleur crítico de Kinchaloe trabalha para desmontar a hegemonia positivista na pesquisa que, inconscientemente, apoia condicões sociais opressivas, marginalizantes e violentas. Por isso, Kinchaloe sugere que a hermenêutica crítica, conhecimentos das margens, e ação política sejam inseridos em todos os projetos de bricolagem. A hermenêutica crítica é um processo interpretativo usado para explorar como o poder tacitamente forma fenômenos, textos, conhecimentos e sujeitos. (KINCHELOE, 2005b). A hermenêutica crítica é empregada pelo bricoleur crítico para compreender as maneiras históricas e sociais pelas quais o poder opera para moldar sentido e as consequências deste para a vida. Os bricoleurs críticos buscam conhecimentos que normalmente são silenciados por pesquisas narrativas dominantes. Estas ações se relacionam com a conceptualização de Foucault de conhecimentos subjugados. Conhecimentos subjugados são desqualificados como insuficientemente elaborados, ingênuos e hierarquicamente inferiores por estarem abaixo do nível de de exigência de erudição e cientificidade. (p. 13)
Para Kinchaloe, o confronto com a diferença, tão básico para o conceito de
bricolagem, capacita os pesquisadores a produzirem novas formas de conhecimento que informam decisões e ações políticas em geral. Para Kinchaloe, a crítica da bricolagem está dedicada a envolver-se em ação política.