Contribuições do filme Escritores da Liberdade na construção de uma
“identidade docente” (Reescrita com acréscimo de uma citação de Paulo Freire) Ser professor é ser humano no mais amplo sentido do termo. Um ser humano que, entre outros aspectos, conhece suas limitações e capacidades. A docência é uma tarefa bastante árdua, porém pode ser recompensadora se for bem conduzida. Ela exige dedicação, seriedade e responsabilidade. O professor deve estar preparado e disposto a doar-se. O objetivo deste texto é refletir de que maneira o filme Escritores da Liberdade, trabalhado em aula, vem a contribuir para a formação de nossa identidade como futuros professores. Essa reflexão também traz embasamento teórico em textos de autoria de Miguel Arroyo, tecendo relações entre filme e teoria. Podemos começar questionando até que ponto a atividade docente interfere em nossa vida pessoal ou vice-versa; ou o que significa saber conduzir bem nosso trabalho. Essas indagações são importantes para nossa autorreflexão e aprimoramento. No filme a professora encontra dificuldades em separar esses dois aspectos importantes, os que dizem respeito à vida profissional e particular. Segundo Arroyo (2000, p. 27) “Poucos trabalhos e posições sociais podem usar o verbo ser de maneira tão apropriada. Poucos trabalhos se identificam tanto com a totalidade da vida pessoal”. O autor não poderia estar mais correto ao fazer essa afirmação, pois às vezes não conseguimos identificar os limites entre nossa identidade pessoal e nossa identidade docente, e nos é difícil pensar o quanto isso é necessário. No filme em questão isso fica claro no momento em que a professora opta pela docência, seus alunos, sua classe, em detrimento do casamento. Além disso, o “ser professor” goza naturalmente de uma indefinição social, que foi se construindo ao longo de vários anos. A sociedade nos designa máscaras, as quais adotamos a fim de sermos bem aceitos. Qualificação e competência na maioria das vezes não estão em jogo quando pensamos em profissionais voltados à educação infantil e séries iniciais, por exemplo. Em Escritores da Liberdade a professora encontra resistência por parte de alguns colegas de profissão no momento em que se propõe a dar seguimento ao trabalho desenvolvido junto à sua classe, permanecendo com eles até a formatura. Seus colegas alegam que ela não possui capacidade nem “tempo de escola” para assumir uma turma de terceiro ano. A professora mais velha e mais “experiente” nos leva a refletir na comparação que Arroyo faz entre competência técnica e o, por assim dizer, lado humano da docência, o lado amoroso do professor. O questionamento aqui é se um professor competente pode ao mesmo tempo ser amoroso e humano. Para a diretora da escola, uma antagonista à outra professora, competência seria mais importante do que qualquer laço afetivo entre professor e aluno. Podemos ainda salientar que atribuir “competência técnica” a um professor, através de qualificação, foi uma tentativa de fazer com que a imagem do mesmo melhorasse diante da sociedade. A melhor contribuição que o filme Escritores da Liberdade dá à atividade docente é no que toca ao lado humano da mesma. O filme mostra não só uma profissional competente, mas também uma profissional que se preocupa com o desenvolvimento humano dos seus alunos. A professora assume a posição de uma verdadeira educadora, mais que do que mera ensinante de sua disciplina, nesse caso Inglês. Ela vai além se colocando no lugar dos educandos, sabendo ver e ler a realidade de cada um. Nesse sentido podemos dizer que nossa profissão tem uma função dupla e social: por um lado ensinamos efetivamente a matéria, porém por outro, e o que conta ou contaria mais para o sucesso de nossa atividade, educamos nossos alunos, os ensinamos a ser humanos. No filme vemos que a professora foi bem sucedida em sua tentativa de promover e instigar a “humanidade” entre a sua classe, fazendo-a enxergar alternativas nunca antes visualizadas dentro do contexto social vivenciado por cada um. O segredo de uma educação mais humana está justamente na medida de humanidade que o próprio professor tem. Em outras palavras o lado humano de um indivíduo está ligado à sua cultura, às suas vivências e experiências. O professor representa, em sala de aula, um elo entre gerações e faz parte do seu trabalho transmitir toda bagagem cultural de que disponha.
Somente aprendemos a ser humanos em uma trama complexa de
relacionamentos com outros seres humanos. Esse aprendizado só acontece em uma matriz social, cultural, no convívio com determinações simbólicas, rituais, celebrações, gestos. No aprendizado da cultura. (ARROYO, 2000, p.54)
Esse aprendizado cultural se dá através daquilo que Jerome Brunes
denomina como caixa de ferramentas da cultura, onde compara professores com artífices, mestres na construção de significados e não só de ensinar os produtos do conhecimento. É nesse sentido a contribuição de Paulo Freire (2013, p. 47) quando diz que “... ensinar não é transferir o conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”. Esse é um aspecto muito importante na prática e no filme vemos que a professora literalmente aplicou esse princípio quando propôs a escrita dos diários. Junto com os alunos construiu o conhecimento dentro da própria realidade que eles viviam. Como professores também devemos aprender a utilizar a circunstâncias que temos a nosso favor e transmitir muito mais do que conteúdo, possuir muito mais do que técnica. Esse é um dos aspectos mais relevantes que o filme nos traz. A história de uma professora no início de carreira que se dá conta de que o sistema de ensino, a forma tradicional de ensinar não era suficiente para preparar aqueles alunos para a vida. O que ela fez foi proporcionar a eles as ferramentas culturais básicas para entender os significados da mesma. A professora exerceu a humana docência e seu exemplo deve se tornar fonte de inspiração para todos aqueles que desejam seguir essa profissão.