Considerações iniciais sobre o alcoolismo. Conceito e fatos geradores
O alcoolismo, segundo o conceito da medicina, é uma enfermidade cujos fatores geradores são genéticos, psicossociais e ambientais e se materializa através da necessidade irresistível que o dependente possui de ingerir bebidas alcoólicas. Representa um transtorno de conduta, ou seja, um excesso àquilo que é socialmente aceito. O alcoolismo é progressivo e fatal e a negação do problema é parte integrante do quadro patológico do alcoólatra. Embora existam fatores genéticos, há também aspectos psicológicos que levam ao alcoolismo, tais como: necessidade de aceitação social, necessidade de fuga da realidade e insegurança. Resumidamente, pode-se dizer que a dependência do álcool é o resultado da intercessão de uma variedade muito grande de fatores tanto fisiológicos, como psíquicos e ambientais. Diagnóstico Nos primeiros contatos com um paciente alcoólico, identificam-se alguns sintomas físicos, dos quais destacam-se os mais freqüentes: insônia, pesadelos, angústia, depressão, amnésia, náuseas matinais, vômitos matinais, dispepsia, diarréia recorrente, hemorragia digestiva, palpitações, dispnéia, infecções respiratórias recorrentes, traumatismos freqüentes, mialgias, poliúria, impotência e amenorréia. Percebe-se, ainda, sinais psicológicos do alcoolismo: ansiedade, irritabilidade, excitabilidade, esquecimento, confusão, descuido com a aparência. Não se pode ignorar para o diagnóstico do alcoolismo as mudanças neurológicas, fisiológicas e sociais do indivíduo. Tratamento Existem várias possibilidades de tratamento para o alcoolismo, das quais se destaca: internação, tratamento farmacológico, terapia ambulatorial, psicoterapias individual e de grupo, terapia comportamental e os grupos de ajuda (Ex.: A.A.). No entanto, qualquer que seja o tratamento utilizado, é importante que o profissional conscientize o paciente de que possui uma doença que requer cuidados especiais e que o acompanhamento por pessoa habilitada é fundamental para reverter o quadro caótico que tomou conta de sua vida. Infância e adolescência em uma dinâmica familiar alcoólica. A formação das crenças humanas Quando nascemos, nossos pais ou pessoas que desempenham seus papéis são a nossa fonte de ligação com o mundo externo. Dependemos deles para tudo. São eles que nos alimentam, nos dão amor e proteção. A partir de experiências com os pais e, posteriormente, com o mundo, as crianças vão desenvolvendo crenças acerca do certo e do errado e criando imagens de si mesmos. Através das crenças, o indivíduo vai formando modelos operativos, ou seja, formas de reagir diante das diferentes situações. Sabe-se que quando alguém depara-se com determinado objeto, aproximadamente 20% do que vê representa a realidade concreta da coisa, enquanto que 80% da imagem está relacionada com a memória das experiências do indivíduo e com seus padrões de pensamentos (suas crenças). Daí a importância das crenças enquanto elementos de interação com o universo externo. Conforme já dito, os pais ou equivalentes têm um papel importantíssimo na formação das crenças. Mas não é só. As figuras dos pais servem como modelo de identificação para a criança ou jovem, ou seja, a pessoa se utiliza de um modelo que lhe dá parâmetros a serem copiados. Os pais servem também como paradigmas para a diferenciação da criança, ou seja, atuam como modelos daquilo que se procura diferenciar. Alcoolismo na dinâmica familiar Quando um indivíduo se torna um alcoólatra, sua família inevitavelmente acaba se envolvendo com as conseqüências que o álcool traz. Buscando resolver os transtornos que o alcoólatra produz, as pessoas que estão a sua volta acabam por super protegê-lo, o que, muitas vezes, o prejudica. Isto se verifica quando, por exemplo, um alcoolista sofre acidente de trânsito por dirigir embriagado e o parente tenta minimizar o ocorrido para confortá-lo. Quem colabora para a manutenção do vício, como o parente do caso citado, é tecnicamente chamado de co-dependente. O alcoolismo na maioria das vezes é encarado como um segredo da família nuclear. A família, não raro, nega o alcoolismo do ente próximo. É uma forma de minimizar a dor e a vergonha causada pelo parente alcoólatra. Infância em uma dinâmica familiar alcoólica Neste ambiente caótico instala-se um mecanismo de defesa denominado negação, utilizado pela família para conservar uma aparência de família normal. Porém, isto é extremamente prejudicial para a criança pois desconsidera suas percepções e seus sentimentos. Com medo de trair a família contando a verdade a criança acaba se isolando das outras pessoas. Se a infância for marcada de sofrimento, ansiedade e medo, a pessoa acaba por desenvolver expectativas negativas com relação ao futuro e defesas rígidas quanto à proximidade com os outros, já que tem como referência mágoa e imprevisibilidade. Portanto, a tendência da criança é de isolamento e fuga do contato íntimo com as pessoas. Em uma dinâmica familiar alcoólica é comum observar nos filhos a baixa auto-estima e até comportamentos auto-destrutivos. Não menos comum, é a criança desenvolver exacerbado desejo de perfeccionismo, na tentativa inconsciente de ordenar o ambiente familiar instável. Importante notar que em um ambiente alcoólico, geralmente, a criança é agredida emocional e fisicamente pelo ascendente alcoolista, o que resulta um forte sentimento de culpa na criança pelo fato do parente beber. Adolescência em uma dinâmica familiar alcoólica O processo de separação dos filhos em relação aos pais atinge seu momento mais crítico quando o filho entra na fase da adolescência e começa a expor suas opiniões e vontades. É neste momento que os adolescentes começam a questionar e a confrontar os valores paternos e maternos e suas autoridades. Nesta fase, os jovens estão vivenciando as crises de identidade, amadurecendo suas noções de vínculo de integração nas interrelações pessoais e definindo suas imagens de futuros progenitores. Em uma família estável, os pais compreendem a fase pela qual seus filhos estão passando, tornando-se solidários a estes e encorajando-os na busca de independência. Por outro lado, numa família marcada pelo alcoolismo encontramos pais sem paciência para lidar com a ansiedade do jovem e entender sua rebeldia. Ao revés, reagem a esta, através de agressões verbais e até mesmo físicas, sabotando qualquer indício de independência do jovem. Os pais alcoólatras são normalmente inseguros e apresentam um déficit emocional grande, com isso necessitam do controle para que os filhos lhes obedeçam. Numa casa marcada pelo alcoolismo, é comum perceber que o parceiro co-dependente coloca sobre os filhos a responsabilidade da perfeição, fantasiando uma família estruturada e estável. Diante disto, alguns filhos, impossibilitados de corresponder às expectativas de perfeição, apresentam problemas de rebeldia, através de manifestações agressivas, físicas ou verbais, além de uma série de outras condutas socialmente repreendidas. Com essas atitudes eles acabam afastando-se das outras pessoas e isolando-se do convívio social. Por outro lado, existem aqueles filhos cuja reação é de perfeccionismo e alto grau de competitividade. Estes indivíduos tentam o tempo inteiro provar para si que são melhores que os outros. Buscam, ainda, organizar seu mundo interno, que se encontra num extremo caos, apesar da máscara de perfeição. Esses indivíduos são os chamados filhos parentais: aqueles que aceitam a imposição de um dos pais, que tenta fazer com que os filhos não apresentem os defeitos do ascendente alcoólatra. Estes jovens tendem a ter uma visão distorcida dos papéis de pai e filho, assumindo uma responsabilidade quase paternal pelo ascendente alcoolista. De outra parte, existem aqueles que, na tentativa de fugir da realidade dolorosa criada pelo alcoolismo, evitam o ambiente familiar e buscam nos amigos o apoio que não encontram na família. Conclusão Diante da presença do alcoolismo familiar, seja qual for a reação do jovem ou criança (agressiva, negação do problema ou criação de máscara de perfeccionismo) é inequívoco que seus problemas emocionais dificilmente serão solucionados sem o auxílio de profissional habilitado. Neste ensejo, é de fundamental importância a consciência de que o alcoolismo é uma doença que extravasa o âmbito individual e que, por conseqüência, seu tratamento deve se estender a toda a família nuclear e não só ao ascendente alcoolista e à criança ou adolescente.