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INSTITUTO SAPIENTIA DE FILOSOFIA – ISF

LUCAS MARCIEL DA SILVA

A QUESTÃO DE DEUS NOS ESCRITOS DE KANT

Francisco Beltrão – PR
2017
LUCAS MARCIEL DA SILVA

A QUESTÃO DE DEUS NOS ESCRITOS DE KANT

Trabalho apresentado à disciplina de Teodisseia,


ministrada pelo Prof. Pe. Vitor Muller, como critério
avaliativo do 5º Período do Curso de Filosofia do
Instituto Sapientia de Filosofia.

Francisco Beltrão – PR
2017
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 3
2 A QUESTÃO DE DEUS NA “HISTÓRIA NATURAL GERAL” .................................... 4
3 A QUESTÃO DE DEUS NA “NOVA DILUCIDATIO” ................................................... 5
4 A QUESTÃO DE DEUS NA OBRA METAFÍSICA DO ANO DE 1763 ......................... 7
5 A CRÍTICA DE TODA A TEOLOGIA QUE PARTE DA RAZÃO ESPECULATIVA 9
6 A PROVA MORAL DA EXISTÊNCIA DE DEUS .......................................................... 11
7 CONCLUSÃO...................................................................................................................... 14
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 15
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1 INTRODUÇÃO

O que se segue intenciona resumir, de forma breve, o artigo já nomeado, de


autoria de Giovanni B. Sala, SJ. Sendo assim, as ideias explanadas referem-se ao
pensamento do citado autor.
Kant ficou conhecido na história como o “destruidor das provas da existência
de Deus”. No entanto, tal atribuição é unilateral, pois não tencionava o filósofo destruir
a ideia de Deus e, ainda, sua busca era de acessar o conhecimento Dele de forma
racional: “Kant lutou durante toda a sua vida pelo Absoluto pessoal a que nós
chamamos Deus” (SALA, 2002, p. 147)
Os escritos kantianos a respeito da Teologia filosófica podem ser repartidos em
quatro partes: a primeira nas duas publicações do ano de 1755, a “História natural
geral e teoria do céu” e a “Habilitationsschrift” (“Nova dilucidatio”); a segunda na obra
metafísica pré-crítica intitulada “o único fundamento de prova possível para uma
demonstração da existência de Deus”; a terceira no capítulo de Teologia no segundo
livro da “Dialética Transcendental da Crítica da Razão Pura”; e a quarta parte que trata
da prova moral da existência de Deus.
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2 A QUESTÃO DE DEUS NA “HISTÓRIA NATURAL GERAL”

Kant realizou seus estudos no período intitulado como sendo o da “Filosofia da


Escola”, sob um ligação e tradição metafísica com a Escolástica do medievo, ao
despontar das teorias de Newton, sob a plataforma do pensamento científico que
perpassava pelo mundo culto. Dessa forma Kant aborda, em 1755, de duas maneiras
a questão de Deus. A primeira sob um parâmetro de uma cosmogonia, a partir de
princípios de Newton e a segunda a partir de princípios metafísicos.
Na “História Natural Geral”, “Kant procura desenvolver a explicação mecânica
do Universo quer na linha da construção sistemática do Universo quer na da sua
origem” (SALA, 2002, p. 149). Para o filósofo Deus criou uma matéria originária
caótica, que por meio de suas forças mecânicas internas foi produzindo
progressivamente um Universo belo e ordenado segundo a sua finalidade.
Kant faz sua elaboração buscando responder às possíveis contraposições a
serem levantadas pela explicação mecânica do Universo. Pois, caso se descubra, as
razões mecânicas da origem e ordem do universo, não se necessita mais do “governo
supremo” por parte de Deus, ou seja, a Ciência da Natureza bem desenvolvida
corresponde ao enfraquecimento da prova “físico teológica”. Há valor para o filósofo a
prova de Deus a partir da beleza e da ordem do Universo, no entanto ele crê que é na
insuficiência da Natureza que se prova Deus como criador, ou seja, “existe um Deus
precisamente porque a Natureza, mesmo no caos, só pode proceder regular e
ordenadamente” (KANT apud SALA, 2002, p. 149). O centro da prova kantiana está
no fato de que naturezas diversas só produzem consequências necessariamente
úteis.
Kant não dá relevância ao agir de Deus nos fenômenos singulares, mas
relaciona a Natureza no todo com Deus como, em suas próprias palavras, o que “tem
em si a fonte das essências mesmas e das suas leis primeiras da ação”. A Natureza
assim concebida ter sua finalidade existente antes dela na mente de Deus, mas ela
mesma é capaz de atingir seu fim por um viés puramente mecânico. Deus assim é um
criador do universo.
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3 A QUESTÃO DE DEUS NA “NOVA DILUCIDATIO”

Para Kant o Absoluto não em como fundamento de sua existência a própria


essência ou a própria possibilidade. Pois o que é assim é causa de si mesmo, devendo
existir antes e depois de si. Com isso, Kant quer opor-se à ter algo antes da existência
de Deus. Ideia que limita a prova de Santo Anselmo e Descartes.
No entanto a concepção de Deus como essência que tem a razão da sua
existência em si não é refutada e sim mantida. “Em Deus a explicação e o explicado,
o fundamento e o fundamentado são uma só e mesma coisa” (SALA, 2002, p. 151),
há uma Unidade perfeita.
A prova da existência de Deus de Descartes é refutada, uma vez que para ele
a essência de Deus é a sua própria existência, numa perspectiva apriorística, onde
distingue-se a existência no entendimento e a existência na realidade. Assim, não se
pode afirmar que algo que é pensado conceitualmente exista na realidade, mas
apenas que aquilo que existe deve ter o fato de ser pensada como sua característica.
Kant comete uma incongruência, aponta Sala, pois ao mesmo tempo em que
afirma que em Deus não pode haver qualquer razão de ser em si mesmo, no debate
contra o argumento cartesiano ele afirma ser a essência de Deus o fundamento da
sua existência, diferenciando a razão de ser, que é puramente pensada por nós, e a
existência real a que possa se tornar. Com isso, Kant se opunha ao Racionalismo,
que defendia o argumento de Santo Anselmo.
“Apesar de não haver qualquer fundamento ontológico para a existência de
Deus, há contudo um fundamento para o conhecimento que nos possibilita conhecer
a priori esta existência” (SALA, 2002, p.152). A prova apriorística, como é chamada,
é explicada como segue-se:

O seu ponto de partida é o possível enquanto possível que podemos penar


previamente à existência das coisas, No conceito possível Kant distingue um
elemento formal e um material. O primeiro consiste em que o nosso
entendimento pode combinar realia e, mediante eles, criar conceitos de
possibilidade. Mas esses elementos materiais (realia) não poderiam ser
dados ao nosso pensamento, se não existisse algures. Mais ainda, a
existência dos conteúdos reais dos conceitos de possibilidade é uma
existência absolutamente necessária. (...) desta tese resulta que o existente
como fundamento do possível é absolutamente necessário (SALA, 2002,
p.152)
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Segue Kant mostrando que aquilo que se trata de conteúdo real


necessariamente existente dos conceitos de possibilidade constitui a essência infinita
e única, conhecida como Deus. Para o filósofo aquilo que são os elementos reais
(realia), que são dados como matéria para os conceitos possíveis, são o todo da
realidade. Mas disso tem-se um traço panteísta no pensamento kantiano, pois os
mesmos realia que estão em nosso pensamento existem em Deus.
Ainda, na obra supracitada, Kant estabelece uma prova a partir da “comunidade
casual das coisas”, na qual as substâncias múltiplas existentes no Universo não
poderiam estar em comunidade dinâmica se não tivessem um autor comum que as
tenha projetado e criado em relação. Esta é a fundação metafísica para seu
pensamento Físico-teológico.
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4 A QUESTÃO DE DEUS NA OBRA METAFÍSICA DO ANO DE 1763

A primeira, a prova ontoteológica, parte da possibilidade interna das coisas. Ele


distingue a existência em sentido negativo (ela não é uma determinação de conteúdo
de um conceito possível) e em sentido positivo (algo é colocado absolutamente com
todos os seus predicados através do ser e, assim, posto em si mesmo).
Em Kant o critério de realidade é a experiência sensível, a partir de onde se fixa
o alcance do conhecimento. Assim a existência não é derivada da análise de um
conceito. Parte ele assim da possibilidade das coisas, como dito acima, onde o
possível deriva de algo que é existente, ou seja, deve haver um existente, o ente
necessariamente existente, pois a “suspensão do ser tem como consequência a
suspensão de todo o possível. (...) A Ontoteologia de Kant depende inteiramente do
princípio da impossibilidade da suspensão de toda a possibilidade” (SALA, 2002, p.
154), com isso é necessário que haja o ser, e o ens necessarium é uma necessidade
real absoluta.
Em sua teoria, Kant trata mais do “material” do possível que do “real”. Parte do
real metafísico do possível para o ens necessarium como totalidade das realidade, o
que vai de encontro como pensamento panteísta. O possível nessa concepção é
consequência do necessariamente existente, este que é o primeiro fundamento real
de todo possível.
O ens necessarium é apresentado por Kant com os seguintes atributos
ontológicos: a essência necessária é única, simples, imutável e contém a máxima
realidade. O filósofo ultrapassa ainda as propriedades ontológicas pelo seu caráter
intelectual e pessoal.
Ao finalizar a prova Ontoteológica ele a conecta com a Físico-teológica, ou
ainda, a prova apriorística com a posteriori. As coisas são de autoria de um mesmo
“autor supremo, sábio, com, revelam unidade, harmonia e finalidade – as
propriedades, pois, das quais parte a prova físico-teológica.” (SALA, 2002, p.155)
A Ciência da Natureza corrobora a premissa da prova ao mostrar que a
harmonia e a finalidade das coisas dependem das leis internas à matéria. Disso
conclui-se que aquele que ordenou o Universo também o criou, uma vez que ele criou
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a matéria e a deu as suas leis internas. Disso tem-se que a Natureza tem nela mesma
a possibilidade das coisas, a ordem necessária, e a ordem acidental (contingente)
exercidas pelas forças mecânicas da matéria.
Dessa ordem dupla derivam dois tipos de Físico-teologia. A que segue o
método habitual em que Deus é seu “mestre de obras” apenas e na que Ele é seu
criador, sendo a Natureza dependente totalmente dele.
De maneira sistemática Kant organiza duas provas da existência de Deus em
duas apriorísticas e duas a posteriori, e impõe ele critérios para atestar sua validade.
Na aplicação desses critérios, apenas a sua própria prova ontológica é dada como
válida, à qual ele atribui como sendo o “único fundamento de prova possível de uma
demonstração da existência de Deus”. Ainda, para o filósofo é “sem dúvida necessária
a convicção na existência de Deus, mas não é tão necessária a sua demonstração”
(KANT apud SALA, 2002, 157). Querendo dizer ele que não é importante para o
homem o conhecimento que Deus existe.
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5 A CRÍTICA DE TODA A TEOLOGIA QUE PARTE DA RAZÃO ESPECULATIVA

Kant empenha-se em criticar todas as provas da existência de Deus que partem


da razão especulativa, como sugere o próprio título capitular. É a “demolição” de Kant
em sua doutrina a três provas: a que referencia a Anselmo, a da contingência e da
finalidade. Ele afirma, assim ser impossível conhecer a Deus pela especulação
racional. Sendo a única prova válida a elaborada por ele mesmo, como intitula a obra
analisada: “O único fundamento de prova possível para uma demonstração da
existência de Deus”.
No que diz respeito à refutação da prova cartesiana, na qual do conceito de
Deus como perfeitíssimo deduz-se sua existência. É refutado por Kant com a sentença
“nomeadamente que a existência não é de todo um predicado” (KANT apud SALA,
2002, p.158). Para SALA, a refutação de Kant é contestável por não ter ele distinguido
e esclarecido as interpretações possíveis da frase citada anteriormente. No entanto,
resume SALA a refutação: “não podemos saltar por cima da estrutura do nosso
conhecimento na qual conceito e juízo, pensamento e conhecimento são dois
momentos realmente distintos” (2002, p. 159). Além disso, alguns de seus argumentos
são de difícil compreensão.
Quanto à refutação à prova da contingência, esta divide-se na refutação de
duas partes desta mesma prova. A primeira parte da prova consiste em partir do
existente no domínio da experiência para chegar a uma existência necessária (que
tem em si o fundamento da existência). A segunda parte da prova é demonstrar o ens
necessarium a que foram atribuídas as propriedades de Deus, para identificar este ser
necessário como Deus, ou seja, provar que o ens necessarium é um ens realissimum.
Esta parte baseia-se na necessidade lógica de que o ens realissimum exista
necessariamente.
O argumento de refutação da segunda parte da prova de contingência é o
mesmo utilizado para a prova cartesiana. Além disso, não se pode estabelecer uma
relação entre o ens realissimum com o ens necessarium a partir daquele, pois
permanece-se no nível do pensamento e não se pode, a partir daí, acessar qualquer
conhecimento existente. Em outra obra Kant refuta a segunda parte do argumento
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afirmando que mesmo que se exija uma existência necessária, não se pode identificar
quem ou o que é o ens necessarium a partir da contingência. O ens necessarium
como afirmado na prova kantiana se deriva de ser ele a entidade suprema da
realidade. Entretanto não se pode relaciona-lo ao ens realissimum e nem estabelecer
a que se refere, se é Deus, no sentindo teísta, ou o mundo, ou outra coisa.
A prova físico-teológica consiste em relacionar o mundo nas sua ordem e
finalidade instituída com um autor divino. Assim descreve-se a refutação a esta prova:

A crítica à prova processa-se mediante o princípio da proporção entre o efeito


e a causa: a perfeição, grandeza e ordem finitas do mundo não permitem
deduzir “com rigor lógico” um autor infinito e suficiente face ao todo do mundo.
O mesmo deve ser dito em relação à unicidade deste autor: nós não
conhecemos o todo do Universo e, por isso, a tese da sua unidade e apenas
uma extrapolação da unidade da parte do mundo que nos é conhecida.
Assim, a prova não é capaz de conduzir a um único autor como sendo Deus
(SALA, 2002, p.162)

Em outra obra, Kant critica esta prova partindo da afirmação dela de que o autor
da Natureza é inteligente e livre. Ele afirma que ela pode até mesmo demonstrar um
“mestre de obras” do Universo, não, porém, um autor infinito e único.
Das quatro provas possíveis da existência de Deus, Kant refutou três e
permaneceu apenas considerando a sua, a ontoteológica como verdadeira. No
entanto a partir da crítica da ontologia racionalista, Kant deixou cair sua própria prova,
esta que passou um uma transformação. O filósofo de Königsberg firmou-se na
convicção de que o conceito real das possibilidades é empírico. Assim, o possível fica
sujeito ao domínio da experiência, sendo suspenso o pressuposto da prova a priori da
existência de Deus. A partir disso, Kant reformulou seu argumento transformando-o
no ideal transcendental. A experiência somente atinge realidades limitadas, mas seu
conhecimento pressupõe o conhecimento de uma realidade ilimitada, assim, as coisas
finitas são efeitos da realidade suprema. No entanto esta realidade foi relegada a um
nível puramente conceitual.
O argumento ontoteológico foi elaborado como sendo o ideal transcendental,
ou seja, este último corresponde à ideia apriorística de Deus.
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6 A PROVA MORAL DA EXISTÊNCIA DE DEUS

Aos meados dos anos 60, Kant não reconhecia mais qualquer prova da
existência de Deus por via de razão especulativa. Ao mesmo tempo em que recusava
à teologia racional, Kant começa a perceber que “os verdadeiros fins da existência
humana, nomeadamente a moral e a religião, se salvaguardam melhor através da fe
moral do que através do grande arsenal da erudição” (SALA, 2002, p.165)
Sob o estímulo de Rousseau, Kant buscava uma ligação entre os preceitos
éticos do homem e a esperança na imortalidade e a fé em Deus. Agora já não se
acessa a Deus por via da razão especulativa, mas, sim, da razão prática. E esta
perspectiva moral do homem não se pode demonstrar, amas postula-se, ou seja, tem
que existir Deus, pois esta exigência legitima a lei moral em nós.
A prova moral pode ser encontrada em duas versões, a partir de pontos de
partida diversos oferecidos pela eticidade do homem. Respectivamente a primeira
versão corresponde à fundamentação da exigência de cumprir a lei, uma
obrigatoriedade que pergunta: “Quem nos compele de modo incondicionado ao
dever?” A segunda versão aborda a finalidade da lei moral: “para onde aponta a
exigência incondicionada desta lei?”. Kant parte desta segunda versão. A primeira ele
não aceita, pois cabe à própria consciência moral do sujeito a sua concepção, assim
não pode ser Deus a fundamentação para a lei moral.
Kant desenvolve três perguntas: 1 que posso saber?; 2 que devo fazer?; 3 que
me é permitido esperar?. Da terceira questão deriva a prova moral da existência de
Deus: se eu faço aquilo que devo, o que é-me permitido, então, o que esperar? Após
as analises, tem-se que o que se pode esperar com o cumprimento da lei moral é a
beatitude. Esta que pressupõe uma entidade suprema para equilibrar a moralidade e
a beatitude:

Portanto, assim como devemos agir no uso prático da razão segundo a lei
moral, assim também no uso teórico da mesma razão temos que “supor” a
existência de Deus e de uma vida futura, porque estas duas realidades são
pressupostos da obrigatoriedade da lei moral (SALA, 2002, p.167)

A existência de Deus é pressuposto da obrigatoriedade da lei moral.


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A partir disso acontece um formalismo que separa a obrigatoriedade da lei do


objeto e da finalidade do agir e há uma absolutização da ideia de autonomia. Para
resolver esta questão que coloca em risco a prova da existência de Deus, Kant
introduz o conceito do sumo bem. Percebe-se um desequilíbrio entre exigência da
razão moral prática e incapacidade do homem em realizar esta exigência. O sumo
bem só pode ser realizado diante da existência de um “Autor inteligível da Natureza”,
Deus é a condição da beatitude, sem Ele a lei moral perde sua obrigatoriedade. Pega-
se, diante desse conceito de sumo bem a dimensão da beatitude, que conecta-se com
a moralidade resultando em um mandamento do homem, mas ao qual não pode
corresponder. Assim reafirma-se a existência de Deus, pois só pode existir uma
obrigação absoluta na perspectiva de uma finalidade absoluta.
Em uma reestruturação da prova moral pode-se partir de uma situação em que
um homem autonomamente pode exclamar: “Não é a validade da lei moral de um
modo geral mas sim “apenas a intenção da finalidade última a ser realizada” (SALA,
2002, p.169) disso tem-se que a lei moral permanece em vigor independente de sua
finalidade ser realizável. Mas com esta perspectiva, o homem que não acredita em
Deus nem crê na vida futura deparar-se-ia com uma cova, ou seja, sem a finalidade
não há disponibilidade de obedecer a lei moral. Por isso, um homem honesto deve
supor a existência de um Autor moral do Universo.
No entanto a mesma reflexão sofre uma virada de interpretação em outra obra,
sustentando que o caráter de dever da lei independe de sua finalidade para além da
vida na Terra ou de um legislador transcendente. Em outro lugar Kant afirma que “Se
se nega a Deus, então o virtuoso é um bobo” (KANT apud SALA, 2002, p.170)
A partir do exposto, SALA faz algumas objeções e reflexões acerca da prova
moral da existência de Deus. O centro da conclusão de Kant está na conexão entre
bom comportamento e bem-estar. Um homem autêntico moralmente é aquele que age
sem buscar benefício pessoal. Assim a prova moral da existência de Deus implica
uma recompensa moral? O que é a beatitude como finalidade do imperativo moral?
Conclui SALA:

“Face à objeção de que a doutrina acerca de uma conexão essencial entre


cumprimento da lei moral e a beatitude do homem, sobre a qual repousa a
prova da existência de Deus, se limita a ser a cópia de uma moral teônoma
da recompensa, na qual a virtude é degradada num puro meio para alcançar
a beatitude... (2002, p.172)
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Distingue o autor do artigo três questões:


a) A questão da possibilidade de viver moralmente sem fé em Deus (pode haver
uma transcendência em direção a Deus que alguém sem culpa desconhece);
b) A questão da formação da consciência moral (o dever ser a única motivação
da ação moral é uma ilusão, pois uma atitude moral autêntica implica outros
elementos, como o objeto, a finalidade da ação e a motivação que se tem para realiza-
la);
c) A questão metafísica (A boa vontade é boa pois é vontade do bem para o
bem. A beatitude é forma plena da moralidade, é o próprio homem como pessoa
realizada, livre e responsável. A proteção da dignidade humana só é possível no
horizonte da transcendência)
Por fim, vê-se que Kant que principiou buscando uma prova racional da
existência de Deus, chegou à prova moral de sua existência, que consiste em cada
homem “conhece-lo” à medida em que se colocada de acordo com a lei moral.
Estabelece-se assim uma “religião da boa conduta de vida”. Não obstante a esta
designação religião, a afirmação de que Deus existe, guiada pelo contexto da lei
moral, não dá “acesso a qualquer conhecimento verdadeiro da entidade
transcendente”. (SALA, 2002, p.174)
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7 CONCLUSÃO

Isto posto, em consonância com o autor do artigo resumido, percebe-se que a


concepção de Deus adotada e defendida por Kant é a do Iluminismo, na qual Deus é
o governante do mundo, conceituado apenas moralmente.
Esta definição sustentada pela prova moral da sua existência, opondo-se à
concepção de Deus da Igreja, erige, como anteriormente afirmado, uma religião da
“boa conduta de vida” em que os homens estão além das diferenças de confissões
religiosas e cujos deveres são aqueles competentes ao indivíduo ético-civil, e nenhum
propriamente para com Deus.
Como escreveu KANT (apud SALA, 2002, p.175) “não pode haver, (...) modo
ais seguro de agradar ao Poder invisível que governa o mundo, para pelo menos ser
feliz num outro mundo, do que uma boa conduta de vida”.
Assim, tanto religião quanto a existência e concepção de Deus, são reduzidas
à moralidade entre os homens.
SALA (2002, p.175) afirma que Kant acreditou, de fato, na existência de Deus.
No entanto, de sua busca restou apenas o homem autônomo, para quem a ideia de
Deus é apenas uma necessidade moralizante e não o conhecimento ou experiência
com o transcendente, com o Deus que é pessoa e realidade metafísica.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SALA, Giovanni B., in OLIVEIRA, M.; ALMEIDA, C. (orgs.). O Deus dos filósofos
modernos. Vozes, Petrópolis: 2002. 246p.

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