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cAPítulO 1

introdução à engenharia
e ciência dos materiais

(Cortesia da NASA)

MetaS de aprendizageM
Ao final deste capítulo, o aluno será capaz de:

1. Entender a engenharia e ciência dos materiais 4. Citar um material de cada grupo e relacionar algumas
como uma área do conhecimento científico. aplicações dos diferentes tipos de materiais.
2. Enumerar a classificação básica dos materiais sólidos. 5. Avaliar o quanto sabe e o quanto não sabe sobre materiais.
3. Relacionar as características essenciais 6. Estabelecer a importância da engenharia e ciência dos
de cada grupo de materiais. materiais na seleção de materiais para várias aplicações.

O Phoenix Mars Lander é o “robô-cientista” por trás da O Lander é equipado com uma série de ferramentas de
mais recente empreitada científica da NASA, o Programa engenharia e de instrumentos científicos. Os principais ins-
de Exploração de Marte. Os dois principais objetivos cien- trumentos a bordo são: (1) um braço de robô dotado de uma
tíficos da missão Phoenix são determinar se de fato nun- filmadora (construído pelo Jet Propulsion Laboratory [JPL],
ca houve vida em Marte, e entender o clima marciano. A University of Arizona, e Max Planck Institute, na Alemanha),
aeronave é uma obra-prima da engenharia, representando (2) instrumentos para análise microscópica, eletroquímica e
o desejo humano de obter conhecimento. Imaginem os de- de condutividade (JPL), (3) um analisador de gazes liberados
safios em engenharia e ciência dos materiais ao se projetar por aquecimento da amostra (University of Arizona e Univer-
uma nave para resistir e operar de maneira eficaz sob uma
sity of Texas, em Dallas), (4) vários sistemas de obtenção de
variedade de condições extremas. Durante o lançamento,
imagens, e (5) uma estação meteorológica (Canadian Space
por exemplo, a aeronave e seus sensíveis instrumentos são
Agency). As principais categorias de materiais (metais, polí-
submetidos a cargas colossais; já ao longo da etapa de cru-
zeiro, a aeronave deve resistir a tempestades solares e ao meros, cerâmicas, compósitos e materiais eletrônicos) foram
impacto de micrometeoros; na fase de reentrada, descida e utilizadas na estrutura do Lander e em seus instrumentos.
aterrissagem, por sua vez, a temperatura sobe milhares de A missão Phoenix Mars Lander usa as mais avança-
graus, e a aeronave é sujeita ainda a uma tremenda força das tecnologias, conhecimentos e experiências na área de
de desaceleração quando o paraquedas é aberto; finalmen- engenharia e ciência dos materiais para gerar novos co-
te, durante a operação em Marte, a aeronave deve suportar nhecimentos sobre Marte, os quais podem abrir caminho
as temperaturas extremamente baixas do ártico marciano, para a exploração humana do espaço e o povoamento de
além das tempestades de areia. outros planetas.
2 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

1.1 mAteRiAis e engenhARiA


A humanidade, os materiais e a engenharia evoluíram com o decorrer do tempo e ainda continuam a
fazê-lo. Vivemos em um mundo em constante evolução, e os materiais não são exceções. Historicamen-
te, o avanço das civilizações dependeu do aperfeiçoamento dos materiais com que trabalhar. O homem
pré-histórico estava restrito aos materiais disponíveis na natureza, como pedras, madeiras, ossos e peles.
Com o tempo, eles evoluíram dos materiais da Idade da Pedra para as subsequentes Idades do Ferro e
do Cobre (Bronze). Deve-se observar, porém, que estes avanços não aconteceram de maneira uniforme
em toda parte – veremos que isto também ocorre na natureza, inclusive em escala microscópica. Mes-
mo nos dias atuais, estamos restritos a materiais que podemos obter da crosta terrestre e da atmosfera
(Tabela 1.1). Segundo o dicionário Webster’s, materiais podem ser definidos como substâncias das quais
qualquer coisa é constituída ou feita. Embora genérica, do ponto de vista das aplicações em engenharia,
esta definição abrange quase todas as situações relevantes.
A produção e o processamento de materiais em produtos acabados constituem uma grande parte da eco-
nomia atual. Os engenheiros projetam a maioria dos produtos manufaturados, bem como os sistemas de
processamento necessários à sua produção. Uma vez que os produtos requerem materiais para sua fabrica-
ção, o engenheiro deve conhecer a estrutura interna e as propriedades dos materiais objetivando escolher os
materiais mais adequados a cada aplicação e ao desenvolvimento dos melhores métodos de processamento.
Os engenheiros de pesquisa e desenvolvimento criam novos materiais ou modificam as proprieda-
des de materiais existentes. Os engenheiros de projeto (projetistas) utilizam tanto materiais já existen-
tes quanto materiais modificados ou novos para projetar e criar outros produtos e sistemas. Algumas
vezes, estes engenheiros encontram um problema em seu projeto que demanda a criação de um novo
material por parte dos engenheiros de pesquisa e desenvolvimento. É o caso, por exemplo, do projeto
de um transporte civil de alta velocidade (high-speed civil transport – HSTC) (Figura 1.1), que exige
o desenvolvimento de materiais para altas temperaturas capazes de suportar até 1.800 ºC (3.272 ºF),
possibilitando velocidades do ar na faixa
tabela 1.1 de Mach 12 a 25 de matriz cerâmica1.
Materiais mais comuns na crosta e na atmosfera terrestres
em porcentagem, em peso e em volume.
Visando esta aplicação e outras simila-
res, atualmente vêm sendo realizadas
elemento % em peso da crosta terrestre pesquisas para se desenvolver compó-
sitos de matriz cerâmica, compostos in-
Oxigênio (O) 46,60
termetálicos refratários e superligas de
Silício (Si) 27,72 cristal único.
A exploração espacial é uma área
Alumínio (Al) 8,13
que exige o máximo de engenheiros e
Ferro (Fe) 5,00 pesquisadores em materiais. O projeto
e construção da Estação Espacial In-
Cálcio (Ca) 3,63
ternacional (International Space Sta-
Sódio (Na) 2,83 tion – ISS) e do Veículo Explorador de
Marte (Mars Exploration Rover – MER)
Potássio (K) 2,70
são exemplos de atividades em pesquisa
Magnésio (Mg) 2,09 e exploração espacial que demandam o
máximo de engenheiros e cientistas na
Total 98,70
área de materiais. Para a construção da
gás % em volume do ar seco ISS, um grande laboratório de pesquisa
movendo-se pelo espaço à velocidade de
Nitrogênio (N2) 78,08
27.000 km/h, foi necessário a seleção
Oxigênio (O2) 20,95 de materiais para operação em um am-
biente muito distinto do que conhecemos
Argônio (Ar) 0,93
na Terra (Figura 1.2). Eles devem ser le-
Dióxido de carbono (CO2) 0,03 ves a fim de se minimizar o peso útil du-
rante o lançamento. O invólucro externo

1Mach 1 é igual à velocidade do som no ar.


Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 3

deve oferecer proteção contra o impacto de


minúsculos meteoros e do lixo espacial. A
pressão interna do ar, de aproximadamente
15 psi (uma atmosfera), está continuamen-
te tensionando os módulos. Além disso, os
módulos devem suportar tensões imensas
durante o lançamento. A seleção de materiais
para o MER também representa um desafio,
principalmente ao se considerar que durante
a noite o veículo estará sujeito a temperatu-
ras que podem cair a –96 ºC. Estas e outras
restrições requerem novas possibilidades de
seleção de materiais durante o projeto de sis-
temas complexos.
Deve-se ter em mente que a utilização de
materiais e os projetos de engenharia mudam
continuamente e que o ritmo desta mudança
se acelera. Não há como prever os avanços
de longo prazo nesta área. Em 1943, a pre-
visão era de que pessoas ricas nos Estados Figura 1.1
Unidos teriam seus próprios girocópteros. Vista do transporte civil de alta velocidade mostra o Hyper-X com Mach 7 e motores
Quão errada estava esta previsão! Enquanto em operação. Os anéis indicam a velocidade do escoamento na superfície.
isso, o transistor, o circuito integrado e a te- (© The Boeing Company.)
levisão (incluindo-se aí a televisão colorida
e a de alta definição) eram menosprezados. Trinta anos atrás, muitas pessoas não acreditariam que um
dia os computadores se tornariam um produto de uso doméstico tão comum quanto um telefone ou um
refrigerador. E, mesmo hoje, ainda achamos difícil de acreditar que um dia as viagens espaciais estarão
disponíveis comercialmente e que será possível colonizar Marte. Contudo, a ciência e a engenharia
expandem e transformam em realidade nossos sonhos mais impossíveis.
A busca por novos materiais prossegue continuamente. Como um exemplo, destaquemos o fato de
que engenheiros mecânicos buscam novos materiais para altas temperaturas, a fim de que os aviões
a jato possam operar com maior rendimento. Por sua vez, en-
genheiros elétricos também procuram desenvolver novos ma-
teriais para que dispositivos eletrônicos possam operar mais
rapidamente e a temperaturas mais altas. Engenheiros espaciais
procuram desenvolver materiais com maior razão resistência/
peso para a construção de veículos espaciais. Engenheiros
químicos e de materiais procuram materiais mais resistentes à
corrosão. Muitos setores da indústria têm em vista materiais,
dispositivos e sistemas microeletromecânicos (MEMs) para
serem usados como sensores e atuadores em suas aplicações.
Mais recentemente, o campo dos nanomateriais vem atraindo a
atenção de muitos cientistas e engenheiros em todo o mundo.
Propriedades estruturais, químicas e mecânicas singulares dos
nanomateriais abriram novas e impressionantes possibilidades
de aplicação em uma série de problemas de engenharia e medi-
cina. Estes são apenas alguns exemplos da busca de engenhei-
ros e cientistas por materiais e processos novos e aperfeiçoados
para uma vasta gama de aplicações. Em muitos casos, o que
ontem era impossível, hoje é realidade!
Engenheiros de todas as áreas devem ter algum conhecimen-
to básico e aplicado de materiais para engenharia, de modo que,
ao utilizá-los, sejam mais eficazes em seu trabalho. O propósito Figura 1.2
deste livro é servir como uma introdução ao estudo da estrutura A Estação Espacial Internacional (ISS).
interna, das propriedades, do processamento e das aplicações (© Stocktrek/age fotostock.)
4 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

de materiais para engenharia. Devido à enorme quantidade de informações disponíveis sobre este as-
sunto e, em vista das limitações deste livro, procedeu-se a uma seleção do conteúdo a ser apresentado.

1.2 engenhARiA e ciênciA dOs mAteRiAis


A ciência dos materiais tem como objetivo principal a obtenção de conhecimentos básicos sobre a
estrutura interna, as propriedades e o processamento de materiais. A engenharia dos materiais volta-se
principalmente para a utilização de conhecimentos básicos e aplicados acerca dos materiais de tal forma
que estes possam ser transformados em produtos necessários ou desejados pela sociedade. O termo
engenharia e ciência dos materiais engloba tanto a ciência como a engenharia dos materiais e constitui
o assunto deste livro. No espectro do conhecimento sobre materiais, a ciência dos materiais localiza-se no
extremo do conhecimento básico, enquanto a engenharia dos materiais se encontra no limite do conhe-
cimento aplicado, não havendo entre elas uma linha divisória (Figura 1.3).
A Figura 1.4 mostra um diagra-
Engenharia e ciência ma constituído por três círculos
Ciência dos materiais dos materiais Engenharia dos materiais concêntricos que estabelecem a
Conhecimento resultante relação entre as ciências básicas (e
Conhecimento
da estrutura, a matemática), a engenharia e ciên-
propriedades,
básico sobre processamento e
Conhecimento aplicado cia dos materiais e as outras áreas
sobre materiais
materiais desempenho de da engenharia. As ciências básicas
materiais para
engenharia localizam-se no interior do círculo
mais interno, ou núcleo do diagra-
Figura 1.3 ma, ao passo que as muitas áreas
Espectro do conhecimento sobre materiais. O emprego simultâneo de informações oriundas da engenharia (mecânica, elétrica,
da ciência e da engenharia dos materiais permite aos engenheiros transformar materiais em
produtos necessários à sociedade.
civil, química etc.) se localizam no
terceiro círculo, mais externo. As
ciências aplicadas, como a meta-
lurgia, a cerâmica e a ciência dos polímeros, situam-se no
anel central. Vê-se, então, que a engenharia e a ciência dos
materiais formam uma ponte entre as informações sobre
Engenharia materiais oriundas das ciências básicas (e da matemática)
e as várias áreas da engenharia.
Mecânica
Medicina Ciências
Química
aplicadas
Civil
1.3 tiPOs de mAteRiAis
Ciências Metalurgia
básicas cerâmica
Por questões de conveniência, a maioria dos materiais para
Ciências Mecânica engenharia é dividida em três categorias básicas principais:
Engenharia e ciência
biológicas Física dos materiais materiais metálicos, materiais poliméricos e materiais
Química cerâmicos. Neste capítulo, serão feitas as distinções entre
Matemática Polímeros
Geociências estas categorias com base em algumas de suas importantes
Elétrica propriedades mecânicas, elétricas e físicas. Nos capítulos
Engenharia Nuclear subsequentes, serão estudadas as diferenças entre a estru-
de minas, tura interna destes tipos de materiais. Serão consideradas
mineral e Aeroespacial
geológica também duas categorias segundo o processamento e a apli-
cação, a dos materiais compósitos e a dos materiais ele-
trônicos, devido à sua grande importância na engenharia.

Figura 1.4 1.3.1 materiais metálicos


Este diagrama ilustra como a engenharia e ciência dos materiais
estabelece uma ponte entre as informações das ciências básicas e as
áreas da engenharia. Esses materiais são substâncias inorgânicas compostas de
(Reimpresso com autorização da National Academy of Sciences, cortesia da National um ou mais elementos metálicos, podendo também con-
Academic Press.)
ter alguns elementos não metálicos. Alguns exemplos de
Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 5

elementos metálicos são o ferro, o cobre, o alumínio, o níquel e o titânio. Elementos não metálicos,
como carbono, nitrogênio e oxigênio, também podem estar presentes em materiais metálicos. Os metais
possuem uma estrutura cristalina na qual os átomos estão dispostos de maneira ordenada. São em geral
bons condutores térmicos e elétricos. Muitos deles são relativamente resistentes e dúcteis à temperatura
ambiente, sendo que vários se mantêm bastante resistentes mesmo a altas temperaturas.
Os metais e as ligas2 são comumente divididos em duas classes: as ligas e metais ferrosos, que con-
têm uma grande porcentagem de ferro, como, por exemplo, aços e ferros fundidos, e as ligas e metais
não ferrosos, que não contêm ferro ou que o contêm apenas em pequena quantidade. Alguns exemplos
de metais não ferrosos são o alumínio, o cobre, o zinco, o titânio e o níquel. A distinção entre ligas fer-
rosas e não ferrosas deve-se ao fato de que aços e ferros fundidos são produzidos em quantidades muito
maiores e são muito mais usados do que outras ligas.
Os metais, em sua forma pura ou em ligas, são usados em vários ramos da indústria, incluindo-se
aeroespacial, biomédica, semicondutores, eletrônica, energia, construção civil e transportes. Nos Esta-
dos Unidos, a produção dos principais metais, tais como alumínio, cobre, zinco e magnésio, acompanha
de perto o crescimento da economia. Entretanto, a produção de ferro e aço tem sido menor do que a
esperada devido à competição no mercado global e a razões econômicas, sempre prementes. Os enge-
nheiros e pesquisadores em materiais estão continuamente tentando aprimorar as propriedades de ligas
já existentes ou projetar e produzir novas ligas mais resistentes, inclusive a altas temperaturas, e com
melhores propriedades de fluência (ver Seção 7.4) e fadiga (ver Seção 7.2). As ligas existentes podem
ser aperfeiçoadas pelo aprimoramento de sua química, pelo controle da composição e por técnicas de
processamento. Por volta de 1961, por exemplo, superligas novas ou aprimoradas à base de níquel ou
de ferro-níquel-cobalto estavam já disponíveis para uso nas palhetas de alta pressão de turbinas a gás
de aeronaves. O termo superliga foi cunhado em vista do desempenho superior destas ligas a tempera-
turas elevadas, aproximadamente 540 ºC (1.000 ºF), e sob altos níveis de tensão. As Figuras 1.5 e 1.6
mostram uma turbina a gás PW4000 construída principalmente com ligas e superligas metálicas. Os
metais usados nas partes internas da turbina devem ser capazes de suportar altas temperaturas e pressões
durante a sua operação. Por volta de 1980, técnicas de fundição aprimoradas permitiram produzir grãos
colunares solidificados direcionalmente (ver Seção 4.2) e ligas fundidas à base de níquel de cristal único
(ver Seção 4.2). No início dos anos 1990, ligas fundidas de cristal único solidificadas direcionalmente
tornaram-se padrão em muitas aplicações de turbinas a gás em aeronaves. O desempenho superior de
superligas a temperaturas de operação elevadas levou a uma melhora significativa no rendimento
de turbinas de aeronaves.
Muitas ligas metálicas, como ligas de titânio, aço inoxidável e ligas à base de cobalto, são também
usadas em aplicações biomédicas, como em implantes ortopédicos, em válvulas para o coração, ou em dis-
positivos de fixação e parafusos. Esses materiais possuem maior resistência, rigidez e biocompatibilidade;
esta última é uma consideração importante, porque o ambiente no interior do corpo humano é extrema-
mente corrosivo e, portanto, os materiais usados nessas aplicações devem ser insensíveis a esse ambiente.
Além do aprimoramento químico e do controle da composição, pesquisadores e engenheiros tam-
bém se concentram no melhoramento de novas técnicas de processamento desses materiais. Processos
como compactação isostática a quente (ver Seção 11.4) e forjamento isotérmico permitiram um aumen-
to da resistência à fadiga de muitas ligas. Mais ainda, as técnicas da metalurgia do pó (ver Seção 11.4)
continuarão sendo importantes, porque permitem a melhoria das propriedades de algumas ligas com um
custo reduzido do produto final.

1.3.2 materiais poliméricos

A maioria dos materiais poliméricos consiste em longas cadeias ou redes moleculares que normalmente
têm como base materiais orgânicos (precursores que contêm carbono). Estruturalmente, a maior parte dos
materiais poliméricos é não cristalina, mas alguns apresentam uma mistura de regiões cristalinas e não
cristalinas. A resistência e a ductilidade dos materiais poliméricos variam muito. Devido à natureza de
sua estrutura interna, estes materiais são, predominantemente, maus condutores de eletricidade. Alguns
deles são bons isolantes, usados em aplicações de isolamento elétrico. Uma das aplicações mais recentes

2Uma liga metálica é uma combinação de dois ou mais metais, ou de um metal (ou metais) e um não metal (ou não metais).
6 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

desvio do ventilador

Figura 1.5 Figura 1.6


A turbina para aeronaves (PW4000) mostrada acima é fabricada Vista em corte da turbina a gás PW4000, de 112 polegadas
principalmente com ligas metálicas. As mais recentes ligas à base (284,48 cm), mostrando o trecho de desvio do ventilador.
de níquel, de alta resistência mecânica e a altas temperaturas, são (Cortesia de Pratt & Whitney Co.)
utilizadas em sua fabricação. Essa turbina faz uso de muitas tecno-
logias avançadas e comprovadas para aumentar seu desempenho
e durabilidade. Incluem materiais das palhetas de cristal único de
segunda geração, discos de pó metálico e um controle eletrônico
autônomo (full authority)* aperfeiçoado.
(Cortesia de Pratt & Whitney Co.)

dos materiais poliméricos é na produção de discos de vídeo digitais (DVDs) (Figura 1.7). Em geral, estes
materiais têm baixa densidade e se decompõem ou amolecem a temperaturas relativamente baixas.
Historicamente, nos Estados Unidos, os materiais plásticos têm apresentado o maior crescimento entre
os materiais básicos, com uma taxa anual de 9% em peso (Figura 1.14). Todavia, a taxa de crescimento
dos plásticos em 1995 caiu para menos de 5%, uma diminuição significativa. Tal queda era, entretanto,
esperada, pois os plásticos já haviam substituído os metais, o vidro e o papel na maioria dos mercados de
grande volume em que atualmente encontram aplicação, como o de embalagens e o da construção.
Segundo algumas previsões, os plásticos para uso em engenharia, como
o nylon, devem se manter competitivos em face dos metais. A Figura 1.8
mostra os custos previstos para as resinas plásticas de uso em engenharia
em comparação com alguns metais comuns. As indústrias fornecedoras de
polímeros concentram-se cada vez mais no desenvolvimento de misturas
polímero-polímero, também denominadas ligas poliméricas ou misturas,
visando aplicações específicas para as quais nenhum polímero único é apro-
priado. Na medida em que as misturas são produzidas a partir de polímeros
já existentes, cujas propriedades são bem conhecidas, o seu desenvolvimento
é mais barato e mais confiável do que a síntese de um novo e único polímero
para uma aplicação específica. Tomemos como exemplo os elastômeros (um
tipo de polímero altamente deformável), que são normalmente misturados
a outros plásticos a fim de se melhorar a resistência ao impacto do material
resultante. Essas misturas são muito usadas em para-choques de automó-
Figura 1.7 veis, no acondicionamento de ferramentas de corte, em materiais esportivos
Fabricantes de resinas plásticas estão
desenvolvendo plásticos de policarbonato e nos componentes sintéticos de muitas instalações cobertas de atletismo, que
comerciais ultrapuros e de alta fluidez para são geralmente feitas de uma combinação de borracha e poliuretano. Revesti-
fabricação de DVDs. mentos de acrílico em cores brilhantes, aos quais se adicionam várias fibras
(© Getty/RF.)
e materiais de enchimento, são usados para revestir o piso de quadras de
*N. de T.: O “Sistema Digital de Controle do Motor datado de Autoridade Plena” (Full Authority Digital Engine Control –
FADEC) refere-se ao controle completo, ou autônomo, dos parâmetros da operação da turbina pelo computador, sem a
intervenção humana. O objetivo é atingir o rendimento máximo da turbina para cada condição de voo.
Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 7

tênis e parques infantis. Por outro 40


Latão amarelo comercial
lado, outros materiais poliméricos
de revestimento são empregados 30

Custo por polegada cúbica (centavos de dólar)


para proteção contra corrosão,
ambientes quimicamente agres- 20
sivos, choque térmico, impacto, Aço laminado a frio
15
desgaste e abrasão. A busca por Zinco
novos polímeros e ligas polimé-
ricas é em virtude de seu baixo 10
custo e de suas propriedades ade-
quadas a várias aplicações.
6 Lingote de alumínio

1.3.3 materiais cerâmicos Plásticos para engenharia


4
Materiais cerâmicos são mate- 3
Aço laminado a quente

riais inorgânicos constituídos de Lingote de magnésio


elementos metálicos e não metá- 2
licos quimicamente ligados. Os 1970 74 78 82 86 90
materiais cerâmicos podem ser
Figura 1.8
cristalinos, não cristalinos ou uma Custos históricos e esperados de resinas plásticas para engenharia em comparação a alguns
mistura de ambos. Eles, em sua metais comuns de 1970 a 1990. Os plásticos para engenharia devem permanecer competitivos
maioria, têm alta resistência mecâ- frente ao aço laminado a frio e outros metais.
(De Modern Plastics, August 1982, p. 12, e novos dados, 1998. Reimpresso com permissão de Modern Plastics.)
nica em altas temperaturas, porém
tendem a ser quebradiços (pouca
ou nenhuma deformação precede a ruptura). As vantagens dos materiais cerâmicos para aplicações em
engenharia envolvem baixo peso, grande resistência e dureza, boa resistência ao calor e ao desgaste,
atrito reduzido e propriedades isolantes (Figuras 1.9 e 1.10). As propriedades isolantes combinadas à
alta resistência ao calor e à corrosão os tornam apropriados para isolamento de fornalhas de tratamento
térmico e de fundição de metais como aço.
Nos Estados Unidos, a taxa histórica de crescimento de materiais cerâmicos tradicionais, tais como
cerâmica, vidro e pedra, tem sido de 3,6% ao ano (1966 a 1980). A taxa esperada de crescimento desses
materiais de 1982 a 1995 seguiu o crescimento da economia americana. Nas últimas décadas, uma família
inteiramente nova de materiais cerâmicos de óxidos, nitretos e carbonetos, com propriedades aprimora-
das, têm sido fabricados. A nova geração de materiais cerâmicos, denominada cerâmicas para enge-
nharia, cerâmicas estruturais ou cerâmicas avançadas, possui maior resistência mecânica, bem como
maior resistência ao desgaste, à corrosão (mesmo em altas temperaturas) e a choques térmicos (advin-
dos de exposições súbitas a temperaturas muito altas ou muito baixas). Entre os materiais cerâmicos
avançados estão alumina (óxido), nitreto de silício (nitreto) e carboneto de silício (carboneto).
Uma aplicação aeroespacial importante dos materiais cerâmicos avançados é o uso de placas cerâ-
micas para revestimento dos ônibus espaciais. As placas cerâmicas são feitas de carboneto de silício,
em virtude de sua capacidade em atuar como blindagem térmica e de retornar rapidamente à tempe-
ratura usual quando é removida a fonte de calor. Esses materiais cerâmicos protegem termicamente a
subestrutura interna de alumínio da nave espacial durante a subida e durante a reentrada na atmosfera
terrestre (ver Figuras 11.43 e 11.44). Outra aplicação importante dos materiais cerâmicos avançados,
e que evidencia a versatilidade, a importância e o crescimento futuro dessa classe de materiais, é o seu
uso na fabricação de ferramentas de corte. Por exemplo, o nitreto de silício é um excelente material para
fabricação de ferramentas de corte por sua alta resistência a choques térmicos e à fratura.
As aplicações dos materiais cerâmicos são realmente ilimitadas, pois podem ser utilizados na área
aeroespacial, na fabricação de metais, na biomedicina, na indústria automotiva e em muitas outras áreas.
As duas principais desvantagens destes materiais referem-se ao fato de que são (1) difíceis de serem
transformados em produtos acabados, sendo, portanto, caros, e ao fato de serem (2) quebradiços e com
8 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

Entrada de ar
Descarga
Rotor do
turbocompressor
Braço do
Carcaça balancim

Ponta
das
varetas
Revestimento Exaustão
do tubo de
descarga Válvulas

Câmara de
combustão
Placa de válvulas

Coroa do pistão

Revestimento do cilindro

Tuchos Cames

(a) (b)

Figura 1.9
(a) Exemplos de uma nova geração recentemente desenvolvida de materiais cerâmicos para aplicações avançadas em motores. Os componen-
tes de cor escura são válvulas de motores, assentos de válvulas e pinos do pistão fabricados em nitreto de silício. O componente de cor clara é
um material de revestimento de tubulação fabricado em um material cerâmico à base de alumina.
(Cortesia de Kyocera Industrial Ceramics Corp.)
(b) Possíveis aplicações de componentes cerâmicos em um motor turbo-diesel.
(Segundo Metals and Materials December, 1988.)

uma baixa resistência à fratura em comparação aos metais. Se as técnicas para o desenvolvimento de
materiais cerâmicos de alta dureza forem aperfeiçoadas, sua utilização em aplicações da engenharia
poderia ter um crescimento exponencial.

1.3.4 materiais compósitos

Um material compósito pode ser definido como dois ou mais


materiais (fases ou constituintes) integrados de modo a formar
um novo material. Os constituintes mantêm suas propriedades,
mas o compósito resultante terá propriedades diferentes destes.
A maioria dos materiais compósitos consiste em um material de
enchimento ou de reforço apropriado e uma resina aglutinadora
adequada a fim de que se obtenham as características específicas
e as propriedades desejadas. Normalmente, os componentes não
se dissolvem um no outro, podendo ser identificados fisicamen-
te por uma interface entre eles. Os compósitos podem ser de vá-
rios tipos. Alguns dos tipos predominantes são materiais fibrosos
Figura 1.10 (compostos de fibras em uma matriz) e particulados (compostos
Mancais de rolamento de esferas cerâmicos de alto desempenho de partículas em uma matriz). Muitas combinações diferentes de
são fabricados em nitreto de carbono e de silício por meio da
tecnologia de pó metálico.
materiais de reforço e da matriz são usadas para se fabricar com-
(© David A. Tietz/Editorial Image, LLC.) pósitos. Para tomarmos um exemplo, o material da matriz pode
Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 9

ser um metal como o alumínio, ou uma cerâmica como a alumina, ou ainda um polímero como o epóxi.
Dependendo do tipo de matriz usado, os compósitos podem ser classificados em compósitos de base metálica
(metal matriz composite – MMC), compósitos de base cerâmica (ceramic matriz composite – CMC) e com-
pósitos de base polimérica (polymer matrix composite – PMC). Os materiais fibrosos ou particulados tam-
bém podem ser selecionados de qualquer uma destas três categorias principais de materiais, cujos exemplos
são carbono, vidro, aramida, carbeto de silício e outros. As combinações de materiais utilizados no projeto de
compósitos dependem principalmente do tipo de aplicação e do ambiente no qual o material será utilizado.
Os materiais compósitos substituíram componentes metálicos principalmente na indústria aeroespa-
cial, aviônica, na indústria automotiva, na construção civil e na indústria de material esportivo. Prevê-se
um aumento médio anual de aproximadamente 5% na utilização futura destes materiais. Uma das razões
para tal é a sua alta resistência e o seu quociente rigidez/peso. Alguns compósitos avançados têm rigidez
e resistência semelhantes a de alguns metais, porém com densidade significativamente menor e, por
conseguinte, com peso resultante mais baixo. Essas características os tornam extremamente atraentes
em situações nas quais o peso do produto é um fator crucial. De maneira geral, e semelhantemente aos
materiais cerâmicos, a desvantagem principal da maioria dos compósitos é a sua fragilidade e a sua bai-
xa resistência à fratura. Algumas destas deficiências podem ser mitigadas, em determinadas situações,
pela escolha adequada do material da matriz.
Dois tipos proeminentes de materiais compósitos modernos usados em aplicações de engenharia
são reforços em fibra de vidro em uma matriz de poliéster ou epóxi e fibras de carbono em uma matriz
de epóxi. A Figura 1.11 mostra de maneira esquemática como materiais compósitos de fibra de carbono
em epóxi foram usados nas asas e motores do avião de passageiros C-17. Desde o início da construção
destes aviões, novos procedimentos e modificações destinados a reduzir custos têm sido implementados
(ver Aviation Week & Space Technology, 9 de junho de 1997, p. 30).

1.3.5 materiais eletrônicos

Os materiais eletrônicos não constituem uma grande categoria de materiais pelo volume de produção,
todavia são um tipo de material extremamente importante nas tecnologias de engenharia avançadas. O
material eletrônico mais importante é o silício puro, modificado de várias maneiras a fim de se alterar
suas características elétricas. Uma infinidade de complexos circuitos eletrônicos pode ser miniaturizada
em uma pastilha de silício de cerca de ¾ de polegadas quadradas (1,90 cm2) (Figura 1.12). Dispositivos
microeletrônicos tornaram possíveis novos produtos como satélites de comunicação, calculadoras, re-
lógios digitais e robôs (Figura 1.13).
A utilização do silício e de outros materiais semicondutores no estado sólido e a própria microe-
letrônica vêm exibindo um crescimento extraordinário desde 1970, o qual deve continuar no futuro.
O impacto dos computadores e de outros equipamentos industriais que utilizam circuitos integrados
fabricados com pastilhas de silício tem sido espetacular. A
extensão do impacto de robôs computadorizados na manu-
Componentes não estruturais,
fatura moderna ainda não foi totalmente entendida. Os ma- revestimentos e assentos
teriais eletrônicos certamente desempenharão um papel vital de tropas
nas “fábricas do futuro”, nas quais quase todos os processos
de manufatura poderão ser realizados por robôs auxiliados
por máquinas-ferramentas controladas por computador.
Carbono
Ao longo dos anos, os circuitos integrados vêm sendo Carbono/aramida
fabricados com uma densidade crescente de transistores Aramida
dispostos em uma única pastilha de silício, com um tama- Vidro

nho dos transistores correspondentemente menor. Em 1998,


por exemplo, a resolução ponto-a-ponto da menor medida
em uma pastilha de silício era de 0,18 µm e o diâmetro da
Figura 1.11
lâmina de silício utilizada era de 12 polegadas (300 mm). Visão geral da ampla gama de componentes fabricados em
Outro aprimoramento pode ser a substituição do alumínio compósitos utilizados no avião C-17 da Força Aérea Americana.
pelo cobre nas interconexões, em razão da maior condutivi- Esta aeronave tem envergadura de 50 m (165 ft) e emprega
6.800 kg (15.000 ib) de materias compósitos avançados.
dade deste último. (De Advanced Composites, May/June 1988, p. 53.)
10 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

Figura 1.12 Figura 1.13


Microprocessadores modernos possuem um número enorme Braços robotizados empunhando autopeças.
de conexões conforme mostrado nesta fotografia de um (CORBIS/RF.)
microprocessador Pentium II da Intel.
(© IMP/Alamy RF.)

1.4 cOncORRênciA entRe mAteRiAis


Os materiais competem entre si por mercados novos e por aqueles já existentes. Depois de certo tempo,
muitos fatores emergem e tornam possível a substituição de um material por outro em certas aplica-
ções. O custo certamente é um fator. Se um avanço marcante ocorre no processamento de certo tipo de
material de maneira a reduzir substancialmente o seu custo, este material poderá substituir algum outro
em determinadas aplicações. Outro fator que leva a substituições de materiais é o desenvolvimento de
novos materiais com propriedades específicas para certas aplicações. Consequentemente, à medida que
o tempo passa, varia o uso que se faz dos diversos materiais.
A Figura 1.14 mostra graficamente como a produção por peso de seis materiais variou nos anos
recentes nos Estados Unidos. O alumínio e os polímeros exibiram um aumento notável na produção
desde 1930. Em volume, a produção destes materiais é ainda mais acentuada, dado que o alumínio e os
polímeros são materiais leves.
1012 A competição entre os mate-
Madeira
riais é evidente na composição
Aço do carro americano. Em 1978, o
Produção anual nos Estados Unidos (libras)

1011 Cimento carro americano pesava em média


4.000 libras (1.800 kg) e consistia
de aproximadamente 60% de fer-
Polímeros
ro fundido e aço, de 10 a 20% de
1010
Alumínio plásticos e de 3 a 5% de alumínio.
Comparativamente, em 1985 o
Cobre
carro americano pesava em média
109 3.100 libras (1.400 kg) e consistia
de cerca de 50 a 60% de ferro fun-
dido e aço, de 10 a 20% de plás-
10 8 ticos e de 5 a 10% de alumínio.
Logo, no período de 1978 a 1985
a porcentagem de aço diminuiu,
a de polímeros aumentou e a de
1910 1930 1950 1970 1990 alumínio permaneceu aproxima-
Ano damente a mesma. Em 1997, o
carro doméstico americano pesava
Figura 1.14
Concorrência entre seis importantes materiais produzidos nos Estados Unidos com base no peso
em média 3.248 libras (1.476 kg),
(em libras). O aumento rápido na produção de alumínio e polímero (plásticos) é evidente. sendo que os plásticos respondiam
(De J.G. Simon, Adv. Mat. & Proc.,133:63 (1988) e novo dado. Usado com autorização de ASM International.) por cerca de 7,4% desse valor (Fi-
gura 1.15). A tendência no uso de
Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 11

materiais em automóveis parece ser mais alumínio e aço e menos ferro fundido. A quantidade de plásticos
(em porcentagem) em automóveis parece ser aproximadamente a mesma (Figura 1.16).
Em algumas aplicações, somente alguns materiais cumprem os requisitos do projeto de engenha-
ria, ainda que possam ser relativamente caros. A turbina para modernos aviões a jato (Figura 1.5), por
exemplo, requer para sua perfeita operação superligas para alta temperatura à base de níquel, materiais
caros, para os quais nenhum substituto mais barato foi encontrado até o momento. Por conseguinte,
embora o custo seja um fator importante em projetos de engenharia, os materiais utilizados devem
também cumprir especificações de desempenho. De qualquer modo, a substituição de um material por
outro acontecerá sempre na medida em que novos materiais são continuamente descobertos e novos
processos, desenvolvidos.

1.5 AvAnçOs Recentes nA tecnOlOgiA e nA ciênciA dOs


mAteRiAis e suAs tendênciAs FutuRAs
Nas décadas recentes, foram empreendidas várias iniciativas promissoras em ciência dos materiais que
podem vir a revolucionar o futuro desta área do conhecimento. Os materiais inteligentes (dispositivos
em escala micrométrica) e os nanomateriais são duas categorias de materiais que afetarão profundamen-
te os principais ramos da indústria.

1.5.1 materiais inteligentes

Embora já existam há vários anos, alguns dos materiais inteligentes vêm encontrando novas aplicações.
Esses materiais são sensíveis a estímulos do ambiente externo (temperatura, tensão, luz, umidade e cam-
pos elétrico e magnético) e respondem a tais estímulos variando suas propriedades (mecânicas, elétricas
ou de sua aparência), sua estrutura ou suas funções. Estes materiais são genericamente denominados
materiais inteligentes. Sensores e atuadores são exemplos de dispositivos que fazem uso desse tipo de
materiais. O componente sensorial detecta uma mudança no ambiente e o atuador efetua uma função
ou resposta específica. Assim, alguns materiais inteligentes mudam de cor ou adquirem determinada
coloração quando expostos a variações de temperatura, de intensidade luminosa ou de corrente elétrica.
Entre os materiais inteligentes mais importantes tecnologicamente e que podem operar como atuado-
res, encontramos as ligas com memória de forma e as cerâmicas piezelétricas. As ligas com memória
de forma são ligas metálicas que sob tensão revertem à sua forma original caso a temperatura aumente
acima de uma determinada temperatura de transformação crítica. A mudança à forma original se deve a
uma mudança na estrutura cristalina quando a temperatura ultrapassa a temperatura de transformação.

2.000
Emprego de materiais (libras/carro)

Aço Plástico
Ferro Alumínio
1.500
Plásticos
10-20%
Alumínio Outros Ferrosos 50-60%
5-10% 1.000
(15-20% HSLA)*

500

3.248 libras 0
1985 1992 1997
1997 real
Ano analisado

Figura 1.15 Figura 1.16


Distribuição do peso, em porcentagem, entre os principais Previsão e uso de materiais no carro americano.
materiais utilizados no carro médio americano de 1985. (Segundo J.G. Simon, Adv. Mat. & Proc., 133:63 (1988) e novos dados acrescentados em
*HSLA – Aço de baixa liga de alta resistência (High Strength Low Alloy Steel). 1997.)
12 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

Uma aplicação biomédica destas ligas é utilizá-las como reforço expansível (stent) de paredes arteriais
enfraquecidas ou para a expansão de artérias contraídas (Figura 1.17). A malha expansível é colocada
primeiramente na posição correta por meio de uma sonda, conforme mostrado na Figura 1.17a. A malha
então se expande até o seu tamanho e formas originais assim que sua temperatura atingir a temperatura
do corpo (Figura 1.17b). Para fins de comparação, o método convencional para se expandir ou refor-
çar uma artéria é por meio do uso de tubos de aço inoxidável, os quais são expandidos por um balão.
Exemplos de ligas com memória de forma são as ligas de níquel-titânio e as de cobre-zinco-alumínio.
Os atuadores também podem ser feitos de materiais piezelétricos, ou seja, materiais que geram um
campo elétrico quando expostos a uma força mecânica. Inversamente, uma mudança em um campo
elétrico externo causará uma resposta mecânica no mesmo material. Estes materiais podem ser usados
para detectar e reduzir vibrações indesejadas de um dispositivo por meio da resposta de um atuador.
Dessa forma, ao ser detectada uma vibração, uma corrente elétrica é aplicada com a finalidade de gerar
uma resposta mecânica que se contraponha ao efeito da vibração.
Consideremos agora o projeto e o desenvolvimento de sistemas em escala micrométrica que usam
dispositivos e materiais inteligentes para detectar, comunicar-se e atuar: este é o mundo dos sistemas
microeletromecânicos (MEMs). Originalmente, o termo MEM se referia a dispositivos que integra-
vam tecnologia, materiais eletrônicos e materiais inteligentes em uma pastilha semicondutora para pro-
duzir o que comumente conhecemos como micromáquina. Os dispositivos MEMs originais possuíam
elementos mecânicos microscópicos fabricados em pastilhas de silício com a tecnologia dos circuitos
integrados, e eram usados como sensores ou atuadores. Entretanto, o termo “MEMs” atualmente foi
ampliado para abarcar qualquer dispositivo miniaturizado. As aplicações de MEMs são inúmeras, como
nas microbombas, nos sistemas de travamento, ou ainda em motores, espelhos e sensores. Como exem-
plo mais específico, tomemos o caso da utilização dos MEMs em airbags de automóveis, para detectar
tanto a desaceleração como o peso da pessoa sentada no carro, de modo a abrir o airbag à velocidade
correta.

1.5.2 nanomateriais

Os nanomateriais são genericamente definidos como aqueles materiais com escala de comprimento
característica (isto é, diâmetro da partícula, tamanho do grão, espessura da camada etc.) menor do que
100 nm (1 nm = 10–9 m). Os nanomateriais podem ser metálicos, poliméricos, cerâmicos, eletrônicos ou
compósitos. Neste sentido, os agregados de pó cerâmico de menos de 100 nm de tamanho da partícula,

(a) (b)

Figura 1.17
Ligas com formato de memória usadas em malhas expansíveis (stents) para o alargamento de artérias obstruídas
ou enfraquecidas: (a) malha expansível montada em uma sonda e (b) malha introduzida em uma artéria
danificada para reforçá-la.
(Fonte: http://www.designinsite.dk/htmsider/inspmat.htm.)
(Cortesia de Nitinol Devices & Components ©Sovereign/Phototake NYC.)
Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 13

os metais com tamanho de grão de menos de 100 nm, os filmes poliméricos com espessura menor do
que 100 nm e os fios eletrônicos com diâmetro menor do que 100 nm são todos considerados nanoma-
teriais ou materiais nanoestruturados. Em escala nanométrica, as propriedades do material não são nem
as propriedades características do nível atômico ou molecular nem as de uma escala macroscópica.
Embora atividades de pesquisa e desenvolvimento muito intensas tenham sido dedicadas a este assunto
na última década, as primeiras pesquisas em nanomateriais datam dos anos 1960, quando fornalhas de
chama química foram usadas para produzir partículas com tamanho menor do que um mícron (1 mí-
cron = 10–6 m = 103 nm). As aplicações iniciais dos nanomateriais eram como catalisadores químicos e
pigmentos. Os metalurgistas sempre souberam que, pelo refinamento da estrutura do grão de um metal
em níveis ultrafinos (submícron), é possível aumentar substancialmente sua resistência e sua dureza em
comparação com o metal de grãos maiores (escala de mícrons). O cobre puro nanoestruturado, por
exemplo, tem um limite de escoamento seis vezes maior do que aquele do cobre de grãos maiores.
As razões para a atenção extraordinária que estes materiais vêm recebendo recentemente estão liga-
das ao desenvolvimento de (1) novas ferramentas que tornaram possíveis a observação e a caracteriza-
ção destes materiais, e de (2) novos métodos de processamento e síntese de materiais nanoestruturados
que permitiram aos pesquisadores produzi-los mais facilmente e com mais eficiência.
As futuras aplicações dos nanomateriais estão limitadas somente pela imaginação e um dos maio-
res obstáculos à concretização deste potencial é a capacidade para produzir estes materiais de maneira
eficiente e econômica. Consideremos a manufatura de implantes dentários e ortopédicos a partir de na-
nomateriais com melhores características de biocompatibilidade, melhor resistência mecânica e maior
resistência ao desgaste quando comparados aos metais. Um exemplo é a zircônia nanocristalina (óxido
de zircônio), um material cerâmico duro e resistente ao desgaste, quimicamente estável e biocompatí-
vel, que pode ser produzido em forma porosa e que, quando usado como material de implante, permite
que o osso cresça entre seus poros, resultando em uma fixação mais estável. As ligas metálicas atual-
mente usadas para esta aplicação não permitem esta interação e frequentemente se tornam frouxas com
o tempo, exigindo assim cirurgias adicionais. Os nanomateriais também podem ser usados na produção
de tintas ou materiais de revestimento muito mais resistentes às intempéries e a ranhuras. Mais ainda,
dispositivos eletrônicos como transistores, diodos e mesmo lasers podem ser produzidos em um nano-
fio. Esses avanços da ciência dos materiais terão impacto tecnológico e econômico em todos os ramos
da indústria e em todas as áreas da engenharia.
Bem-vindo ao mundo fascinante e extremamente interessante da engenharia e ciência dos materiais!

1.6 PROjetO e seleçãO


O engenheiro de materiais deve ter grande familiaridade com as várias classes de materiais, com suas
propriedades e estrutura, com os processos de produção envolvidos, questões ambientais e econômicas
e outros. À medida que aumenta a complexidade do componente em consideração, também aumentam
a complexidade da análise e o número de fatores envolvidos no processo de seleção de materiais. To-
memos o caso da seleção de materiais para o quadro e o garfo de uma bicicleta. O material selecionado
deve ser suficientemente forte para suportar a carga sem deformação permanente ou fratura. Deve ainda
ser suficientemente rígido de modo a não sofrer excessiva deformação elástica ou falha por fadiga (devi-
do à carga repetitiva). A resistência à corrosão do material pode ser outro fator a se considerar ao longo
da vida da bicicleta. Além disso, o peso do quadro é importante caso a bicicleta venha a ser usada em
corridas esportivas, pois, neste caso, ela deve ser leve. Quais materiais cumprem todos estes requisitos?
Um processo de seleção de materiais adequado deve levar em conta questões de resistência, rigidez,
peso, forma dos componentes (fator de forma), além de utilizar diagramas para esta seleção a fim de
determinar os materiais mais indicados para uma dada aplicação. A descrição detalhada do processo
de seleção de materiais está fora do escopo deste livro, mas este exemplo é usado como um exercício de
identificação de vários materiais candidatos a esta aplicação. Constata-se que muitos deles podem cum-
prir os requisitos de resistência, rigidez e peso, incluindo-se aqui algumas ligas de alumínio, de titânio,
de magnésio, aço, plástico reforçado com fibras de carbono (CFRP) e até mesmo madeira. A madeira
tem propriedades excelentes para esta aplicação, mas a ela não se pode dar facilmente a forma de um
quadro e um garfo de bicicleta. Uma análise posterior mostra que o CFRP é a melhor escolha, pois pro-
porciona um quadro resistente, rígido, leve, resistente à corrosão e à fadiga. Entretanto, seu processo de
fabricação é oneroso. Por conseguinte, se o custo for um dos pontos a considerar, este material pode não
14 Fundamentos de Engenharia e Ciência dos Materiais

ser a escolha mais adequada. Os materiais restantes, todos ligas metálicas, são adequados e relativamen-
te fáceis de serem produzidos no formato desejado. Assim, se o custo for um critério importante, o aço
emerge como a escolha mais adequada. Por outro lado, se o peso da bicicleta for importante, as ligas de
alumínio despontam como os materiais mais convenientes. As ligas de titânio e de magnésio são mais
caras do que as ligas de alumínio e aço, embora sejam mais leves do que este último. Contudo, as ligas
de titânio e magnésio não oferecem vantagens substanciais com relação ao alumínio.

1.7 ResumO ..............................................................................................................

A ciência dos materiais e a engenharia dos materiais (ou, sim- esses tipos de materiais. Os materiais inteligentes e os dis-
plesmente, engenharia e ciência dos materiais) constituem positivos em escala micrométrica, bem como os nanomate-
uma ponte de conhecimento sobre materiais entre as ciências riais, são apresentados como novas classes de materiais, com
básicas (e a matemática) e as várias áreas da engenharia. A aplicações importantes e inovadoras em muitos setores da
ciência dos materiais busca principalmente conhecimentos indústria.
básicos sobre materiais, enquanto a engenharia dos materiais Os materiais competem entre si por novos mercados ou
se volta, sobretudo, para a utilização de conhecimentos práti- por mercados já existentes, possibilitando a substituição de
cos sobre materiais. um material por outro em algumas aplicações. A disponibi-
Os três tipos principais de materiais são os metálicos, os lidade de matéria-prima, o custo de produção e o desenvol-
poliméricos e os cerâmicos. Outros dois tipos de materiais vimento de novos materiais e processos para novos produtos
muito importantes para a engenharia moderna são os com- são fatores primordiais que levam a mudanças na utilização
pósitos e os materiais eletrônicos. Este livro tratará de todos de materiais.

1.8 PROBlemAs ........................................................................................................

Problemas de conhecimento e compreensão 1.11 Faça uma lista dos componentes principais da quadra
de basquete de sua universidade. Para cada componente,
1.1 O que são materiais? Liste oito materiais para enge- determine a classe de materiais utilizados em sua estru-
nharia comumente encontrados. tura (identifique materiais específicos, se possível).
1.2 Quais são as categorias principais dos materiais para 1.12 Faça uma lista dos componentes principais do seu au-
engenharia? tomóvel (pelo menos 15 componentes). Para cada um
1.3 Quais são algumas das propriedades importantes de deles, determine a classe de materiais em sua estrutura
cada uma das cinco categorias de materiais para enge- (identifique materiais específicos, se possível).
nharia? 1.13 Faça uma lista dos componentes principais do seu com-
1.4 Defina materiais compósitos e dê um exemplo de um putador (pelo menos dez componentes). Para cada um,
material dessa categoria. determine a classe de materiais utilizados em sua estru-
1.5 Faça uma lista das características de materiais estrutu- tura (identifique materiais específicos, se possível).
rais para aplicações espaciais.
1.14 Faça uma lista dos componentes principais na sua sala
1.6 Defina materiais inteligentes, dando um exemplo de um
de aula, incluindo elementos construtivos (pelo menos
material desse tipo e de uma de suas aplicações.
dez componentes). Para cada um, determine a classe
1.7 O que são MEMs? Dê um exemplo de sua aplicação.
de materiais em sua estrutura (identifique materiais es-
1.8 O que são nanomateriais? Quais são algumas das ale-
pecíficos, se possível).
gadas vantagens de se usar nanomateriais em vez de
materiais análogos convencionais?
1.9 Superligas à base de níquel são usadas em componen- Problemas de aplicação e análise
tes estruturais de turbinas para aeronaves. Quais são
as propriedades principais deste metal que o tornam 1.15 Liste algumas mudanças no uso de materiais que você
adequado a esta aplicação? tenha observado ao longo do tempo em alguns produ-
1.10 Faça uma lista de itens em sua cozinha (pelo menos tos manufaturados. Quais razões você acredita ter ha-
cinco). Para cada item, determine a classe de materiais vido para essas mudanças?
(identifique materiais específicos, se possível) usados 1.16 (a) Que tipo de material é o cobre OFHC (isento de oxi-
na fabricação do item. gênio e de alta condutividade)? (b) Quais são as proprie-
Capítulo 1  Introdução à Engenharia e Ciência dos Materiais 15

dades desejadas para o cobre OFHC? (c) Quais são as cruciais desse item; (b) determine o material seleciona-
aplicações do cobre OFHC na indústria de energia? do para cada um desses componentes; (c) esquematize
1.17 (a) A qual classe de materiais pertence o PTFE? (b) um processo para montagem da lâmpada.
Quais são suas propriedades principais? (c) Quais são 1.27 (a) Relacione os fatores pertinentes à seleção do qua-
suas aplicações na manufatura de utensílios de cozinha? dro de uma bicicleta esportiva do tipo mountain bike;
1.18 Por que razão os engenheiros civis devem ter familia- (b) Aço, alumínio e ligas de titânio já foram emprega-
ridade com a composição, as propriedades e o proces- dos como metais básicos na estrutura de uma bicicleta;
samento de materiais? dê os principais pontos fracos e fortes de cada um; (c)
1.19 Por que razão os engenheiros mecânicos devem ter As bicicletas mais modernas são fabricadas em com-
familiaridade com a composição, as propriedades e o pósitos avançados. Explique as razões para esta esco-
processamento de materiais? lha e cite um compósito específico usado na estrutura
1.20 Por que razão os engenheiros químicos devem ter fa- de uma bicicleta.
miliaridade com a composição, as propriedades e o 1.28 (a) Enumere os critérios principais para a seleção de
processamento de materiais? materiais para a fabricação do capacete esportivo de
1.21 Por que razão os engenheiros industriais devem ter segurança; (b) Identifique materiais que satisfaçam es-
familiaridade com a composição, as propriedades e o
tes critérios; (c) Por que um capacete de metal maciço
processamento de materiais?
não seria uma boa escolha?
1.22 Por que razão os engenheiros de petróleo devem ter
1.29 Por que é importante ou útil classificar os materiais em
familiaridade com a composição, as propriedades e o
diferentes grupos, como foi feito neste capítulo?
processamento de materiais?
1.30 Uma dada aplicação requer um material que deve ser
1.23 Por que razão os engenheiros elétricos devem ter fami-
liaridade com a composição, as propriedades e o pro- bastante duro e resistente à corrosão, às condições am-
cessamento de materiais? bientes de temperatura e pressão. Além disso, seria van-
1.24 Por que razão os engenheiros biomédicos devem ter tajoso, mas não absolutamente necessário, se o material
familiaridade com a composição, as propriedades e o escolhido também fosse resistente ao impacto. (a) Se
processamento de materiais? você considerar somente os requisitos principais, quais
classes de materiais você examinaria para esta aplica-
Problemas de síntese e avaliação ção? (b) Por outro lado, se considerar tanto os requisitos
principais como os secundários, quais classes de mate-
1.25 Quais fatores podem levar a uma previsão incorreta da riais você examinaria?
utilização de materiais na indústria? 1.31 Dê tantos exemplos quanto puder de como a engenha-
1.26 Considere os componentes de uma lâmpada comum. ria e ciência dos materiais são importantes para o alpi-
Pede-se que você: (a) identifique alguns componentes nista na fotografia da capa.

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