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28/08/2017 Parecer Nº 43/PP/2008-G - Ordem dos Advogados

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2009 (/advogados/pareceres-da-ordem/conselho-geral/2009/) Parecer Nº 43/PP/2008-G

Parecer Nº 43/PP/2008-G
9 DE JANEIRO, 2009

Foi solicitado a este Conselho Geral, pelo Sr. Dr. …, Ilustre Advogado, um parecer sobre as seguintes questões:

1) Qual o entendimento e alcance do direito de retenção sobre documentos, valores e/ou objectos que tenham sido entregues ao Advogado no
exercício do seu mandato;

2) Qual o critério determinante para se aferir quais os casos subsumíveis no direito de retenção e os subsumíveis no direito de compensação; e,
finalmente

3) Apreciação da legitimidade do exercício de direito de retenção efectuado pelo consulente.

São, portanto, estas as questões sobre as quais se irá discorrer e que se afiguram da maior relevância para o exercício da nossa nobre profissão.

1) Entendimento e alcance do direito de retenção do Advogado

O direito enunciado encontra o seu esteio legal no n.º 3 do art. 96.º do E.O.A e afigura-se-nos como uma manifestação do direito de retenção
previsto nos arts. 754.º e segs. do Código Civil.

Durante muito tempo, como judiciosamente refere Antunes Varela, nas suas lições(1) , este direito “foi concebido como simples meio de coacção. O
credor que, por determinadas circunstâncias, tivesse em seu poder uma coisa pertencente ao seu devedor, poderia recusar a entrega dela enquanto
este lhe não pagasse o que devia.”.

O mesmo autor adiantou ainda a definição do direito de retenção “como o direito conferido ao credor, que se encontra na posse de certa coisa
pertencente ao devedor de, não só recusar a entrega dela enquanto o devedor não cumprir, mas também, de executar a coisa e se pagar à custa do
valor dela, com preferência sobre os mais credores.”.

O direito de retenção emerge, assim, não como um meio de coerção do cumprimento de uma obrigação, mas antes como um verdadeiro direito real
de garantia.

No art. 754.º do C.C. estão previstos os requisitos genéricos de que depende a existência e o exercício do direito de retenção – são eles:

1) A detenção lícita de uma coisa que deve ser entregue a outrem;

2) Que o retentor seja credor da pessoa com direito à entrega;

3) Que o crédito do retentor resulte de despesas com a coisa ou de prejuízos provenientes da própria coisa retida.

O art. 754.º afigura-se, assim, como “uma verdadeira cláusula geral do direito de retenção, estabelecendo as condições em abstracto necessárias para
que a um crédito seja reconhecida essa garantia, enquanto que no art. seguinte, sob a epígrafe "casos especiais" se enumeram algumas situações onde
o credor goza de igual direito”. (v. Parecer do CG n.º E-1077/1996, de 11 de Maio de 1996).

Ora, na al. c) do n.º 1 do art. 755.º prevê-se expressamente que o mandatário (forense ou não) goza, também, do direito de retenção sobre as coisas
que lhe tenham sido entregues para execução do mandato, pelo crédito resultante da sua actividade.

Conjugando, agora, o regime geral previsto no C.C. com o regime específico aplicável ao mandato forense, disciplinado no n.º 3 do art. 96.º E.O.A.,
conclui-se que, não obstante a natureza real do direito, este último Diploma prescreve um requisito adicional para o seu exercício que é, justamente,
que a consequência da retenção dos valores ou objectos não ponha em causa a prova do direito do cliente ou lhe cause prejuízo grave, pois, nesse
caso, tal direito (embora de natureza, como vimos, real), cederá em função do interesse do cliente, por força daquela norma.

2) Critério determinante para se aferir quais os casos subsumíveis no direito de retenção e os subsumíveis no direito de compensação

https://portal.oa.pt/advogados/pareceres-da-ordem/conselho-geral/2009/parecer-n%C2%BA-43pp2008-g/ 1/5
28/08/2017 Parecer Nº 43/PP/2008-G - Ordem dos Advogados

Antes de nos debruçarmos sobre a questão colocada, será imperativo definir e distinguir o direito de compensação.

Como refere, ainda, aquele autor citado, a compensação é o “meio de o devedor se livrar da obrigação, por extinção simultânea do crédito
equivalente de que disponha sobre o seu credor”.

Está-se, aqui, perante dois créditos, que mutuamente se extinguem ou, pelo menos, parcialmente assim ocorrerá.

São seus requisitos–pressupostos, pois, os seguintes:

1) Reciprocidade dos créditos (mútua liberação, total ou parcial, de duas dívidas);

2) Validade, exigibilidade e exequibilidade do contracrédito (do compensante), do crédito activo;

3) Fungibilidade do objecto das obrigações;

4) Existência e validade do crédito principal.

Já o exercício do direito de retenção firma-se, como se viu, em requisitos–pressupostos completamente distintos, já que a sua função e ratio, no
sistema jurídico, são, também e obviamente, diversos.

Em suma, enquanto o direito de compensação pressupõe reciprocidade de créditos que mutuamente se extinguem, a retenção visa garantir o
pagamento de um crédito pelo devedor, e enquanto aquele tem como consequência a extinção dos créditos compensados, o direito de retenção é,
meramente, uma garantia especial de cumprimento de uma obrigação que, claro está, não se encontra ainda extinta.

Ou seja, a compensação faz extinguir o direito creditício do credor, enquanto a retenção apenas faculta ao credor a possibilidade de garantir que,
futuramente, o seu crédito será, efectivamente, satisfeito.

Será, portanto, a existência ou não de créditos recíprocos e a consequência do exercício de cada um daqueles direitos que permitirá, com facilidade
até, destrinçar os casos subsumíveis no direito de compensação dos no direito de retenção.

3) Apreciação da legitimidade do exercício do direito de retenção pelo consulente

Embora a situação concreta veiculada pelo Colega consulente tenha já sido objecto de apreciação pelo Conselho Distrital d… …, ao abrigo da al. f) do
art. 50.º do E.O.A., entende-se que, pela relevância da questão colocada, que diz respeito ao exercício da profissão e que, além do mais, directamente
afecta os interesses dos Advogados, deve a mesma ser clarificada por este Conselho Geral, ao abrigo das competências que lhe estão cometidas,
nomeadamente e ex vi pela al. d) do n.º 1 do art. 45.º do EOA.

O consulente invocou a existência de um crédito por Honorários e Despesas, decorrente dos serviços profissionais que havia prestado aos seus
“outrora constituintes”, e que ascendem a €24.131,90, crédito esse exaustivamente discriminado na Nota de Honorários e Despesas da qual deu
conhecimento àqueles por carta que lhes foi remetida em 29 de Julho deste ano (Cfr. Doc. n.º 1, que se considera reproduzido).

Pode ler-se na mesma que o Colega renuncia ao mandato que lhe foi conferido pelos mandantes, seus constituintes, no único processo judicial que
ainda se encontra pendente e corre os seus termos no Tribunal Judicial de … .

Ora, em virtude de tal renúncia, foi apresentada a respectiva Nota de Honorários e Despesas, relativa a todos os processos nos quais foram
representados pelo consulente, sendo-lhes, ainda, dito que, do montante de €87.000 que havia sido transferido para a conta bancária titulada por
este, no âmbito do processo supra mencionado, o mesmo exercia o direito de retenção do valor correspondente ao montante em dívida, a título de
Honorários e Despesas, estipulando um prazo máximo de 30 dias para que aqueles procedessem à liquidação destes.

Daqui se conclui, desde já, não ter ocorrido, efectivamente, qualquer “compensação”, por parte do consulente, primeiro, por não se verificar, in casu,
o requisito da reciprocidade de créditos a compensar; segundo, não se vislumbrar, do teor da missiva enviada pelo consulente aos seus constituintes,
qualquer intenção de a efectivar, mas antes, e precisamente, o seu oposto.

Com efeito, o consulente não pretendeu pagar-se com aquele valor, mas, simplesmente, retê-lo, fixando um prazo dentro do qual os seus ex-
constituintes deveriam liquidar os Honorários e Despesas.

Ora, esta fixação de prazo para o pagamento destes reflectirá, só por si, a intenção da retenção, apenas, daquele valor e não a sua apropriação como
pagamento.

Além disso, o consulente, na mesma carta, referiu, expressamente, que procedeu à emissão de cheque, que se encontra à disposição dos mesmos no
escritório do consulente, no valor de €62.868,10, correspondente à diferença entre a quantia transferida para a sua conta bancária e o saldo da Nota
de Honorários e Despesas.

https://portal.oa.pt/advogados/pareceres-da-ordem/conselho-geral/2009/parecer-n%C2%BA-43pp2008-g/ 2/5
28/08/2017 Parecer Nº 43/PP/2008-G - Ordem dos Advogados

Daquela retenção deu, ainda, simultânea e diligentemente, conhecimento ao Conselho Distrital d… … tendo sido, posteriormente, objecto de
apreciação por esse Conselho (Cfr. Doc. n.º 2, que se dá por reproduzido).

Assim, e salvo o devido respeito, parece-nos que aquele Conselho Distrital laborou em equívoco ao entender que “Preenchidos que estão os
requisitos (…) poder-se-ia considerar-se legítimo o exercício do direito de retenção por parte do Requerente. Porém, o que resulta expressamente
dos factos expostos é que o Requerente não exerceu o direito de retenção que, como referido, legitimamente lhe assistia, mas, isso sim, operou a
compensação, pagando-se por conta da verba que, por lapso, foi depositada na sua conta bancária.”.

Aqui chegados, cabe, em suma, aquilatar sobre a legitimidade do exercício, pelo Advogado, do direito de retenção sobre valores (pecuniários) do
cliente que tem em seu poder, para garantia do pagamento dos honorários e reembolso de despesas que lhe sejam devidos.

A. Arnaut(2) , em anotação ao art. 96.º, n.º 3 do E.O.A., e por remissão para o Acórdão do Conselho Superior de 18-7-86, publicado na Revista da
Ordem dos Advogados 49-946, aduz o seguinte: “Quando cesse a representação, o advogado goza do direito de retenção da documentação ou
valores, para garantia do pagamento dos seus honorários e despesas, salvo se os documentos forem necessários para prova do direito do seu cliente,
ou se a retenção lhe ocasionar graves prejuízos”.

Se é certo que na situação sobre a qual se debruçou aquele aresto estavam em causa documentos na posse do causídico e não valores, como in casu,
não deve olvidar-se que, as mais das vezes, aqueles são mais relevantes para os clientes que meras quantias em dinheiro.

Logo, por maioria de razão e em face do n.º 3 do art. 96.º, tem de concluir-se que a retenção de valores dos clientes é perfeitamente admissível, se
verificado aquele condicionalismo e se tal retenção não causar a estes graves prejuízos.

Refere o Acórdão CS n.º R-121/2003, de 9 de Janeiro de 2004 que “Para análise do direito de retenção dever-se-á conjugar o regime geral com o
especialmente previsto para o mandato forense, em que o direito de retenção sobre objectos, documentos ou valores dos clientes está intimamente
ligado com o termo do mandato e em relação aos bens que não sejam imprescindíveis para a prova do direito ou cuja retenção possa trazer a este
prejuízos graves, ou seja o direito de retenção do advogado sofre as restrições composta pelo nº 1 do artigo 84.º do EOA(3) .”).

Ora, voltando ao caso do consulente, não se vislumbra que a retenção do valor de €24.131,90, devido a título de honorários e despesas, de um valor
global de €87.000, a que os constituintes têm direito (e tendo-lhes sido emitido um cheque do valor correspondente à diferença entre estes valores)
possa constituir qualquer prejuízo relevante e grave para os mesmos.

Até porque “Não há dependência do direito de retenção em relação à aprovação da nota de honorários.” (Cfr. refere o Acórdão do Conselho
Superior supra citado).

E tanto mais que se desconhece se os “outrora constituintes” do consulente puseram em causa aqueles honorários, através, nomeadamente, de um
eventual pedido de emissão de laudo dirigido ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados, que, aliás, ainda poderão pedir na anunciada acção
judicial.

CONCLUSÕES:

1) O direito de retenção define-se como o direito conferido ao credor, que se encontra na posse de certa coisa pertencente ao devedor, de não só
recusar a entrega dela enquanto o devedor não cumprir, mas também de executar a coisa e se pagar à custa do valor dela, com preferência sobre os
demais credores;

2) O direito de retenção, que assiste ao Advogado, vem regulado nos arts. 96.º n.º 3 do E.O.A. e 754.º e 755.º do C.C., onde se prevêem os requisitos
específicos e gerais, respectivamente, para o exercício legítimo de tal direito;

3) Enquanto o exercício do direito de retenção apenas faculta ao credor a possibilidade de garantir que, no futuro, o seu crédito será, efectivamente,
satisfeito, o de compensação faz extinguir o direito creditício do credor;

4) Da conduta do consulente não se vislumbra qualquer intenção de apropriação de qualquer quantia dos ex-constituintes, como pagamento dos
Honorários e Despesas, mas, unicamente, uma retenção do valor correspondente ao seu crédito, como forma de garantia deste, pelo que foi legítimo
o exercício de tal direito.

À próxima sessão do Conselho,

Lisboa, 9 de Janeiro de 2009.

> Nota:
1 -VARELA, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Reimp. da 7.ª Edição, 2003, Coimbra, p. 577.

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28/08/2017 Parecer Nº 43/PP/2008-G - Ordem dos Advogados

2- ARNAUT, António, Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado, 10.ª Edição, 2006, Coimbra Editora.
3-Na anterior redacção do Decreto-Lei 84/84, de 16 de Março; actual art. 96.º n.os 2 e segs. da Lei 15/2005, de 26 de Janeiro.

Relator: A. Pires de Almeida

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