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Trans/Form/ A ç ã o , São P a u l o

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O TRÁGICO:
EX PERIÊN CIA E CON CEITO

U baldo P U P P I *

RESUMO: O conceito do trágico está de algum m odo liga do à violência . O presente estudo preten­
de estabelecer a relaçilo essencial vigente entre violência institucional e situaçilo trágica, a situação trági­
ca sendo ao mesm o tempo conseq üência e denún cia da violência institucional. Assim entendido, o trági­
co é primeiramen te expresso sob forma poética, na arte dramá tica denominada precisamen te' tragédia;
em seguida , por derivação, sob forma conceitual, na análise da própria realidade histórica . A análise da
história a tual poderá revelar todo o po tencial trágico acum ulado na violência do poder.

UNITERMOS: Trágico; tragédia ; violência do poder; violência sofrida ; violência denunciada; de­
núncia poética; denúncia conceitual.

I N T R O D U Ç Ã O DO T E M A pulado, mesmo quando apoiado em res­


E AO T E M A peitáveis tradições interpretativas . Ao
contrário daquelas participações taxinô­
À primeira v i s t a , o significado da tra­ micas que Aristóteles c o n siderava c o m o
gédia é um desses conceitos que não o fere­ facilmente reconhecívei s , m a s que desig­
cem dificuldade à compreensão . V incula­ nava como " inominadas " , c h ega-se à
se ele obviamente com a manifestação da constatação que estam o s agora diante d e
violência, A surpresa porém , e quase sem­ u m " nome " que e n c o b r e u m significado
pre a decepção , começa quando se procu­ ainda ignorado . E tanto maior é a errân­
ra conhecer a natureza dessa vinculação . cia, aqui , quanto mais se o supõe obvia­
Não é de per si a ação truculenta ou a tru­ mente conheci d o ; ou, inversamente, tanto
culência do actante que define a tragédia . mais misterioso se revela quanto maior a
Nem toda truculência é trágica, o que não preocupação em elucidá-lo .
quer dizer que alguma vez deixe de ser
violenta . Antecipando, para p o sterior­ Se por um lado são descartadas as in­
mente fundamentar a afirmação , sej a dito terpretações tradicionais, p o r outro lado é
em seco que a situação con figurada pelo preciso prevenir contra estereótipos ideo­
conceito do trágico tem sua causa e ori­ lógicos contem porâneos . Uma possível
gem na estrutura d o poder . Procurar de­ coincidência de expressão com eles , impli­
terminar com precisão essa relação entre ca que se estará p o stulando aqui o u tra
violência e estrutura de poder, é toda a pauta de leitura que a deles , e a partir da
pretensão deste artig o . qual poderão ser avaliado s . A perspectiva
dessa leitura, de alcance universal, não foi
Não s e trata, c o m o se v ê , de u m a elaborada a partir de uma situação parti­
postura convencional . Precisamente p o r cular e de suas circunstâncias, mas tem
isso obriga a descartar previamente a ilu­ por fundo de referência a própria história
são provocada pela costumeira segurança e alguns de seus avatares mais pertinente s .
com a qual o conceito do trágico é mani- Está a í a razão p e l a q u a l proporciona o

• Professor T i t u l a r do Departamento de F i l o s o f i a - F a c u l d a d e de E d ucação, F i l o s o f i a , C i ê n c i a s Sociais e da Documenta·


ção - U N E S P - 1 7 500 - M a r i l i a - S P - Brasi l .

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PUPPI, U. - o trágico: experiência e conceito. Trans/Form/ Ação, São Paulo, 4 : 4 1 -50, 1 98 1 .

quadro categorial requerido para analisar Perfilhando a estratégia da dialética


e compreender a tragédia vivida pelo inventiva, foi for m ulada a seguinte hipó­
mundo atual: tragédia generalizada, con­ tese heurística, isto é , uma hipótese inicial
substanciada na violência d o poder d a e provisória, por o p osição aos axiomas do
qual a violência d a sociedade é o u tra face, apriorismo teórico , que são antes um ver­
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e mal dissimulada pelos órgãos geradores dadeiro " anipotheton 4 epistemológico .
da informação o ficial . Preserva ela tanto q uanto p o ssível a gêne­
O sentido real do trágic o , por oposi­ se e os dados da q u estão "o conceito do
ção ao seu sentido ficcional e p oétic o , até trágico nasceu , for m o u -se e desenvolveu­
hoje não mereceu estudos apropriados se no contexto da ficção poética, d e onde
que o integrassem como categoria filosó­ foi transferido para o plano da vida real .
fica . A nível das concepções mais vulgari­ Contudo, em sua dimensão existencial -
zadas, duas delas dividem a s preferências , pessoal e histórica, - esse conceito � er­
Segundo a primeira, o trágico seria u m a manece confuso e obscuro, incerto e po­
tonalidade afetiva , p r ó p r i a d a existência, lissêmico " .
no rastro de Unamuno : uma forma de A hipótese, uma vez formulada, con­
sentimento heróic o , previsível em u m a vi­ duziu a pesquisa em direção às duas linhas
da efetivamente assumida e independente­ complementares aí implicadas . A primei­
mente do contexto históric o : " sentimento ra consistiu em buscar no teatro, nas
trágico da vida " . N a segunda concepção , obras precisamente denominadas tragé­
o trágico seria u m a s o bredeterminaçã o , dias, o significado originário e paradig­
n o sentido que a p sicanálise atribui a e s s a mático do termo pesquisad o ; isso, sem de­
palavra, o que faria d o trágico u m mero tença na estranh a etimologia d o termo,
epifenômeno da vida afetiv a , conotado questão no caso irrelevante . A segunda li­
no lugar-comum " bom senso não faz tra­ nha de pesquisa obrigou a b u scar na lin­
gédia . " guagem e nos filósofos a conceituação
que dela se fez, não só ou princ ipalmente
Se sob o prestígio dessas o u de outras
como gênero teatral, mas a partir do gêne­
influências, pouco importa o fato é que
ro teatral .
todo o mundo acredita possuir algum en­
tendimento do trágic o . Do contrário , não Este artigo , sej a dito a título de escla­
empregaria a palavra, nem sâberia de q u e recimento, não é a pesquisa in fieri, nem o
s e está falando quando a ouve pronuncia­ fac-símile da pesquisa uma vez chegada a
da. É , aliás, a esse nível que se institui dia­ termo ; tampouco pretende reproduzir
leticamente para cada u m a problemática pari passu as etapas que cond uziram à de­
cuj o aprofundamento , p o r sua vez, nega, finição procurad a . Tanto mais que em to­
supera e talvez recupera aquele entendi­ da pesquisa desse gênero faz-se presente,
mento primeiro e' sempre provisório . É se daí não se origina a própria intenção da
ponto pacífico que a intenção de aprofun­ pesquisa, a imponderável participação de
damento pode permanecer aleatória e in­ um questionamento inveterado e vivido
fundada, sem acessão a esse estágio metó­ que acaba por fixar-se como cu riosidade
dico . Além disso, a estratégia metódica da obsessiv a . O artigo será pois uma temati­
dialética inventiva é de outra ordem q u e a zação econômica e a posteriori do resulta­
estratégia do apriorismo cientí fico . A pri­ do de todo um processo inventivo e metó­
meira é própria de u m processo crítico­ dico, respeitadas as linhas de clivagem da
hermenêutico em demanda de critérios problemática instituída.
teórico-interpretativos, ao passo que a se­
DO TEATRO À V I D A
gunda é caracterí stica d o processo rigida­
mente teórico que opera por ruptura epis­ A primeira linha de pesquisa, acima
temológica e subsunção lógica . mencionada, levou à leitura programada

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de toda a produção teatral c o nhecida co­ ca, na demiurgia d o autor dramátic o , não
mo trágica e considerada significativa pa­ é conceb ida para vencer, m a s , pela fatali­
ra o tema : em gabinete de bib lioteca o dade de sua derrota n a qual são m ostra­
equivalente de um trabalho de cam p o . A das todas as últimas conseqüências a que
constatação d ireta que daí resultou foi a leva a violência institu í d a , é propo sta co­
de que a concepção do trágico investida mo denún c i a .
na ação dramática possui três termos es­
Há d u a s óticas, portanto, n a situação
senciais e definiente s ; cada u m d o s dois
trágica, uma indissociável d a outra: a óti­
primeiros sendo constituídos de uma série
ca da personagem , que ignora a verdadei­
de componentes , e o terceiro indicando a
ra causa ou causa remota d a violência so­
relação especial que se estabelece entre
frida, e tudo o que consegue enxergar, o
eles. A primeira série é a d o s componentes
vê do ponto de vista do vencido ; a ótica
existenciais, vividos pela personagem trá­
do autor, que denuncia ao p ú blico a vio­
gica sob a égide d a fatalidade o u inevita­
lência institucional e causa d o i n fortúnio
bilidade: o mito do destino . A segunda, é
que, por sua vez, causa o ponto de vista
a série dos componentes externo s , que de­
do vencido . Denúncia pelo s o frimento até
sencadeiam o processo d o destin o . O ter­
as últimas conseqüências , eis o comple­
ceiro term o , a vítima do destino , literal­
mento definidor d a situação trágic a . N a
mente o " destinatário " , o u personagem
íntegra: " situação de violência institucio­
trágica, na origem é sempre concebida co­
nal, sofrida individualmente até as últi­
mo herói. E ste último ter m o , aparente­
mas conseqüências como denúncia " .
mente insignificante, adquire, em deter­
minado estágio ideológico da história, ca­ Dessa definição derivam d o i s corolá­
pital importância para a caracterização d o rios. Primeir o : a causa d o i n fortúnio vivi­
trágico . do pela personagem trágica é desconheci­
Diante da força desencadeada pelos da para ela, não para o autor ; a incons­
componentes extern o s , isto é , do " desti­ ciência do Édipo Rei é u m estratagema
no" (/JÕ t e a) , o " destinatário " so fre montado na con sciência e p o r decisão d e
inexora velmen te, em seus com ponentes Só foc1es . Segundo corolário : o a u t o r trá­
existenciais , um efeito corresp ondente de gico faz arte, não produz reforma nem
violência (àváYXrr) . O " destino-ativo " , promove revoluçã o . E nquanto tal, não re­
/JOtea (m oira ) , produz o u induz o forma nem revoluci o n a ; denuncia . A tra­
"destino-passivo " , àváYlCrr (anan q ue) . A gédia é uma arte de denúncia . D e nuncia o
moira é concebida como uma instituição contexto opressor, a violência contextual,
mítica que sela a so rte (anan q ue) de in­ servindo-se da personagem trágica c o m o
divíduos escolhi d o s . A situação trágica é , instrumento de sua denúncia . O público,
portanto, u m a situação de violência insti­ supostamente incon sciente c o m o a perso­
tucional sofrida individualmente n o plano nagem , é levado, p o r mediação d a ideolo­
existencial . gia do vencido, ao nível de consciência do
autor . Que portanto a tragédia intervenha
Não é passivamente, porém , que o positivamente na formação d a consciên­
"destinatári o " da violência so fre e reag e . cia coletiva é tão irrecusável como irrecu­
Passivo tem d o i s significa d o s : " ser o s u ­ sável é o fato que só a consciência coletiva
porte d a violência" e " reagir acomodada­ cria condições aceitáveis para a s verdadei­
mente" . O " destinatári o " suporta a vio­ ras trans formações sociai s .
lência, mas luta agonicamente, isto é , co­
mo herói, contra sua causa próxima e A definição acima é pertinente e
em issária, mesmo sem saber que na esca­ abrangente . Contém os c o nceitos essen­
tologia trágica será sempre um herói ven­ ciais não redu ndantes e convém a todas as
cido . Precisamente, a personagem trági- singularidades do definido . É portanto a

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. chave que permite compreender, não só as tos e à ação de Marx , - j á é a vítima trá­
diferenças entre as diversas concepções d a gica da inj ustiça social, esta não é todavia
tragédia, mas, sob a s diferenças, também associada às relações de produçã o .
'
aquele fundo comum que as constitui a
M ais recente metamorfose no gêne­
todas como legí timas tragédias . P o r falta
ro, a tragédia " social " está excelentemen­
de bem compreender essas d i ferenças não
te representada entre nós com "A Gota
se chega a bem definir o conceito d o trági­
d' Á gua " , de Paulo P ontes e Chico Buar­
co, como inversamente, por falta de bem
que de Holanda, que se inspira, como em
definir o conceito d o trágico, não se chega
plano afastado, na " M edéia" de E urípe­
a bem compreender essas d i ferenç a s .
des e, como em primeiro plano, na " M e­
É assim que ao nascer, na G récia An­ déia" de Eduvaldo Viana Filho . A varian­
tiga, a tragédia é de cunho essencialmente te contemporânea da tragédia denuncia,
religioso , como todo o mundo sabe. Res­ sempre por meio de pobres personagens
ta, porém , saber que ela é de natureza reli­ marcadas como vítimas exemplares, a vio­
giosa para poder caracterizar a violência lência institucional contida nas contradi­
da religião mítica num m o m ento d e emer­ ções da formação econômica e política
gência dos direitos d a razão e d a auto­ manipulada por centros esotéricos de de­
afirmação do homem . Cabe a René Gi­ cisão .
rard 3 o mérito de ter demonstrado que a O estudo da tragédia em sua natureza
tragédia grega foi a primeira e grandiosa e em sua história autoriza tirar as seguin­
denúncia histórica d a violência institucio­ tes conclusões . 1 . E xiste uma caracterí sti­
naI S . ca existencial do fenômeno denominado
trágico . 2 . O s componentes existenciais
Com Shakespeare, sobretudo o d a do fenômeno trágico se revelam indissolu­
maturidade, a denúncia religiosa d a tragé­ velmente relacionados com compo nentes
dia grega é sub stituída pela denúncia da externos, que são de o r dem contextual ou
violência maquiavélica, institucional na institucional , e pelos quais são desenca­
política ou instituída p o r políticos sem es­ deados . 3. O conjunto dos componentes
crúpulo. Pela primeira vez a tragédia ves­ externos do fenômeno trágico variou no
te roupas novas, con feccionadas agora no correr da história da tragédia, acompa­
a telier da política, com o estofo d a ambi­ nhando grosso m odo as variações da pró­
ção e vontade de poder, d a intriga e astú­ pria história das ideologia s : de m ítico­
cia, de evicções e desterros o u homicídio s . religiosa na origem , se estende e se substi­
Já é a tragédia " p olítica " , n o sentido d e tui gradualmente pelo " p olític o " , numa
Machiavel, m a s n ã o ainda a tragédia " so ­ primeira passagem , e pelo " social " , nu­
cial" no sentido m oderno . ma segunda passagem . 4 . Obviamente,
Shakespeare p orém , fiel nesse parti­ certos comp onentes existenciais do fenô­
cular à norma clássica, ainda centraliza o meno trágico também so freram altera­
desenrolar da tragédia em torno do herói ções, enquanto outros perm aneceram
pinçado na classe social dom inante e " no inalterado s . I nalterado permanece o " so­
auge da fama e da prosperidade" 1 . Büch­ frer as conseqüências de modo exem­
ner, com W oyzec k , é quem derruba de seu piar " , isto é, " até as últimas con seqüên­
trono o herói tradicional e , em seu lugar, cias, como denúncia " ; alteradas, em cada
exalta a humildade da personagem trági­ passagem , serão as relações existenc iais
ca, constituída de anti-heróis anônimos, (individuais e sociais) provocadas a partir
chamando assim a atenção d o espectador de contextos, quer " m í tico-religioso " ,
para a classe social dominada . M a s se quer "político " , quer " social " .
W oyzec k , - proletário d a primeira revo­ É chegado o momento para a explica­
lução industrial, anterior porém aos escri- ção, j á aflorada antes, sobre o componen-

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te que sempre permanece inalterado n o fe­ concepção aristotélica da catarse é incom­


nômeno trágico, consignado na quarta pleta e detém -se em medíocre resultad o :
conclusão acima : " s o frer (as c onsequên­ provocar a compaixão d a vítima e o tem or
cias da violência institucional) , de modo que o mesmo venha a ocorrer com cada
exemplar, até as últimas consequ�ncias, um . Aristóteles viu bem o papel d a com­
como denúncia" N a origem d a tragédia,
_ paixão , sob cuj o i m p acto surge a solida­
essa característica é associada à figura d o riedade para com a v í ti m a . Mas ao invés
herói . Por um processo a posteriori de sa­ de vinculá-la à mensagem d o " exemplo " ,
cralização, a vítima trágica é transforma­ reflui para u m primário embora natural
da em herói festej ado . Aristó teles não o sentimento de defesa e segurança indivi­
compreendeu , e a interpretação que d á2 dual diante das ameaças d o contexto vio­
relacionando a maj estade da tragédia com lento , cuja inj úria s o frida continuaria
a exigência da alta linhagem d a persona­ portanto inconsciente nos " destinatá­
gem trágica, para assim convertê-la em rios" e incólume n a sociedade onde caIl,l­
herói, é mera ideologia d e classe domi­ peia impune . O estagirita não se aperce­
nante . Na verdade, a figura d o herói é a beu da audácia contestatória dos trágicos
imagem mítica, não só do trágic o , m a s gregos, contribuindo pelo contrário para
tam bém da denúncia d a violência dos esvaziá-la . Freud fez u m a leitura aristoté­
deuses . O heró i , com efeito, é vítima arbi­ lica da tragédia grega, e a p sicanálise orto­
trária, e uma vez aplacada a ira dos deu­ doxa se ressente até hoje dessa leitura .
ses, descarregada sobre ele, a normalida­ Este novo enfoque da catarse autori­
de retoma à comunidade, c u mulada ade­ za substituir a figura d o herói pelo d a
mais de favores, mas sempre e ainda co­ exemplaridade, que ela t e m p o r função
mo bem mostrou R. G irard, graças à mes­ proteger e preservar . Não é pois pela im­
ma vítima, agora considerada como víti­ portância de sua origem , c o m o quer Aris­
ma sacrificial . Ela não é ré, nem seu so fri­ tóteles, que a vítima trágica se transforma
mento expiação, mas uma como espécie em heró i ; é por sua exemplaridade que ela
metafísica de exutório , por onde são dre­ se destaca como denúncia . A figura d o he­
nados - e portanto revelados - os ma­ rói era tão-somente a crisálida m í tica do
lefícios da violência dos deuses . D a í o va­ realismo do exemplo . A identificação da
lor exemplar do herói como denúncia des­ "diferença" d o exemp l o p o r meio da alta
sa violência e como símbolo em negativo posição da personagem , não s ó trai e põe
de sua superação . a perder o verdadeiro alcance d a catarse,
A função da catarse, característica da mas deriva da mesma ideologia elitista
tragédia, situa-se precisamente aqui: pro­ que j ustificava o estatuto dos escravos,
teger esse valor de exem p l o , preservar a atribuindo-lhes, ontológica e p oliticamen­
imagem da vítima, evitando assim que sua te, condição inferi o r . Se a crise moderna,
"diferença" sej a reduzida a acontecimen­ não ainda o fim , d a ideologia elitista põe
to rotineiro, como conviria à manutenção termo à conotação da " d i feren ç a " d o
da violência institucional . O efeito catár­ exemplo por meio d o sta tus da persona­
tico sobre o público, com efeito, leva-o a gem , persiste ainda e sempre como essen­
solidarizar-se com a vítima e, portanto , a cial à tragédia a neces sidade d e di ferencia­
assumir a mensagem que ela própria é . A ção do valor exemplar pelo efeito da ação
catarse atua sobre o público " lavando-lhe catártica .
a alma " , e simultaneamente " abrindo-lhe
os olhos" para assim tirar a vítima da in­ UMA TAREFA D E F I L Ó S O F O S
significância, da in-diferenç a ; da rotina,
enfim , que a convivência com a violência A segunda linha de p e s q u i s a , acima
poderia acarreta r . Sob esse enfoque, a anunciada, consiste em b u scar nos filóso-

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fos O conceito existencial d o trágico, isto 1 . Em nenhum dos filósofos que clas­
é, o trágico como c onceito d o real; não sicamente propuseram classificações ou
mais, ou não apenas , como conceito poé­ estruturas das tonalidades afetivas do ser
tico . Um conceito , porém , sob pena de to­ humano (pouco importa se com o nome
tal indeterminação, nunca é solitári o . Ne­ de paixões, emoções, ou ainda sentimen­
cessariamente ele é solidário : na ordem d a tos) , o trágico , assumido hipoteticamente
inclusão, do sentido , d a referência, d a como uma dessas tonalidades específicas ,
afirmação , da estrutura, d o sistema . N a d e modo algum comparece: P latã o , Aris­
ordem da inclusão , de próximo em próxi­ tóteles, Tomás de Aquino, Descartes,
mo se inscreve, pelo j og o das relações de Bergson .
semelhança e d i ferença, em classes suces­ 2 . Tampouco comparece como " exis­
sivamente mais amplas, até as últimas ca­ tencial " (eksistentia!) em filósofos que re­
tegorias genéricas . N o extrem o oposto a correram a esse conceito o u a conceitos fi­
essas categorias genéricas últimas, a classe losóficos afin s : nem em H e idegger, na " a­
mais próxima é que c o n fere as últimas de­ nalítica existencial " , nem em Sartre, Ga­
term inações específic a s . É p o i s , pela in­ briel Marcel ou M erleau P o n t y . H á exce­
clusão do conceito d o trágico em sua clas­ ção para Kierkergaard e Unamuno, mas
se mais próxima que ele receberá sua de­ para eles, precisamente, o conceito do trá­
term inação mais p recisa e sua definição gico não é classificável, p o r situar-se nos
essencial . Desde S ócrates, essa é uma tare­ limites entre a razão e a Fé. Não são am­
fa de filósofos: neles deve m o s buscar o bos instrutivos à pesquisa porque, de um
que procuram o s . lado, extrapolam d a filosofia, colocando
questões de ordem teológica, e , de ou tro
Ler porém todos o s filósofos indiscri­ lado, extrapolam d o próprio conceito do
minadamente, nem é factível para u m trágico , que não foi elaborado sob regime
mortal, m e s m o que também filó s o f o , nem cultural de fé sobrenatural, mas d e razão
é bom critério . É p reciso planej ar metodi­ natural . Além d o mais, a Revelação cris­
camente a leitura com base em u m critério tã, na qual se funda a teologia d a fé, des­
ao mesmo temp o racional, econômico e trói as condições de existência do anti­
suficiente . O critério a qui assumido para go trágico de cunho religioso * . P ara não
orientar a leitura d o s filó sofos foi o se­ trair, pois, o significado originário do
guinte . H á a priori uma tríplice p o s s sibili­ conceito do trágico , que tem sua história e
dade de classi ficar o conceito real d o trá­ sua evolução embutidas na história do
gico: ora como u m a emoção especí fica en­ teatro , ou para não lhe atribuir simplista- '
tre outras, no sentido d e tonalidade afeti­ mente um significado vale-tudo, que leva­
va; ora como um " ex i s tencial" (eksis ten­ ria à confusão das línguas, é preciso antes
tia!) entre outros, na concepção que lhe dá determinar-lhe o significado preciso e as
Heidegger opondo " ek sistential " a " eki s ­ variantes pelas quais passou, e que consti­
tentiell " , este situando .,.� na classe ante­ tuem hoje a sua tradição . S ó a partir daí
rior ; ora como u m � {�Et�O limite entre se tornaria inteligível todo outro emprego
outras, no sentido ae\J..a�er� . Adotando derivado da palavra . Apelar pela tradição
essa tríplice possibilida<j.e' ��Tn'o três pistas nem sempre é apego ao passad o , pode ser
para a leitura d o s (jlósofo� a pesquisa exigência histórica de racionalidade e cla­
i�
chegou às seguintes consta açpes ., reza de pensamento .

• Em contraposição, o horizonte cristão é por excelência instância de denúncia da violência i n ibidora, repressora e vio­
ladora dos d ireitos do homem e , m a i s a i n d a , de toda reverente conside ração de existências hum a n a s . E s s a instância, num
sentido, já foi anexada à própria teologia, integrando, sem porém esgotá - I a , a hoje denominada teologia da libertação . Em
outro sentido, a m plia e reforça as possib ilidades da arte trágica de con teúdo sócio-político-eco n ô m i c o .

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3 . Rigorosamente falando , o conceito pers, nem coincide com a s p r o p o s tas tan­


existencial do trágico também j amais foi to do pensador dinamarq uês, como do es­
catalogado como situação-limite. E s s a panho l . Com efeit o , a situação-limite j as­
conclusão precisa ser explicad a . E m senti­ periana é puramente metafísica, abstrai
do estrito, situação-limite é um conceito da história, quando na verdade não é na
de clas�e, peculiar a Karl Jaspers, que não realidade ontológica que se encontra o
inclui o trágico . E m sentido amplo, po­ trágico e sim na história . A l i , tem ele ape­
rém , o trágico para Kierkergaard e Una­ nas as condições permissivas de sua possi­
muno seria uma situação-li m ite, sem pre­ bilidade, inscritas na finitude d o ser d o
juízo no caso para a restrição feita acima homem ; aqui, as c o n d i ç õ e s c o ncretas de
a respeito de ambos sobre a hipótese do sua efetuação , e a sua própria efetuação .
trágico como existencial (eksisten tiaJ). A
As duas outras propostas localizam o
diferença entre a p o sição de um e de ou­
trágico na con fluência da razão natural
tros pode ser formulada assim : para J as­
pers , a situação�limite é um c onceito de com a fé do cristão , reduzindo ou condu­
zindo finalmente o trágico a u m fenôme­
classe, mas a classe não inclui o trági c o ;
no de forte conteúdo teológic o . A isso,
para Kierkergaard e U n a m u n o , o trágico
entretanto , é preciso obj etar , embora ao
seria uma situação-limite, mas a situação­
limite não é uma classe . preço de alguma redundância, que: pri­
meiro, o trágico não foi elaborado em
4 . 0 s filósofos que trataram do trági­ função de situações teológicas n o sentido
co, o trataram predominantemente c o m o pós-cristão d o term o ; seg u n d o , o Júm en
conceito poético , i s t o é, com referência à teológico , a fé do cristão, de acordo com
tragédia enquanto gênero teatra l . Quando sua natureza e com toda s u a melhor tradi­
o trataram metaforicamente, a partir d o ção de vida e de doutrina, não violenta a
teatro, c o m o conceito existencial ou como natureza e a razão do h o m e m , mas pelo
situação-limite, extrapolaram d o suporte: contrário a eleva na escala d o ser e d o
este perde, ou não adquire, - seu signifi­ operar, e n ã o pode p o r conseguinte c o n s ­
cado preciso, enquanto a metáfora se tor­ tituir e m si e p o r si c o n d i ç ã o su ficiente pa­
na tão imprec isa como o suporte . Entre o s ra uma situação trágica ; terceiro, o in­
primeiros , os que o trataram predominan­ divíduo, no que lhe concerne em próprio,
temente como conceito poétic o , estão : sem pre pode dramatizar, " fazer tragé­
Aristóteles , Hegel, Nietzsche, Lukács . dia" a respeito de tudo e d e nada, mas is­
Entre os segund o s : os j á mencionados so a nível das sobredeterm inações e das
Kierkergaard e Unamuno . L ugar a parte idiossincrasias . A análise crítica d o s filo­
ocupam autores que cruzam regiões de sofemas e da biografia d o s dois autores
fronteira com a filosofia: Freu d , R. Gi­ não descarta a hipótese de contaminação
rard, Domenac h . de suas buscas e contradições íntimas por
D o ponto de vista ao q u a l chegou a intrometimentos dessa ordem . D e qual­
pesquisa, tornou-se possível afirmar que a quer modo, contudo, é preciso reconhecer
classe à qual pertence o conceito do trági­ que um certo modo de tradução (traição)
co, tal como foi elaborado por ocasião da ideológica do discurso cristão, como aliás
leitura da poesia trágica , é a classe da de todo sistema de valores , pode ser oca­
situação-limite . M a s se, p o r um lado, é sião de situações trágicas , isto é , de mitos
preciso alargar o conceito de situação­ e relações sociais decorrentes que violen­
limite de Jaspers, por outro lado é preciso tam a natureza , a razão e a liberdad e . M as
restringir o conceito do trágico de Kier­ não é esse o con tex to visualizado pelos
kergaard e Unamun o . Tal c om o é propos­ mencionados autores, o que não garante
to nesta pesq uisa, o trágico não é uma não tenham sido condiciqnados por ele .
situação-limite nos term o s estritos de J as- Se, na ótica da praxis social, esse desvio é

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um ópio para o povo, n a ótica d o Jogos e di fique e que sua onipotência se dissimule
do ethos, pode ser trágico para o in­ sob um véu : devo morrer, devo. so frer, de­
divíduo . vo lutar, estou s u bmetido ao acaso,
encontro-me inevitavelmente preso aos la­
Assim reformulada, a situação-limite
ços da culpabilidad e . Essas situações fun­
é a classe à qual c o nvém o trági c o , j á an­
damentais implicadas em nossa vida, n ó s
tes caracterizado c o m o "um so frimento
a chamamos situações-limites . I s s o q u e r
exemplar até as últimas con seqüências " .
dizer q u e n ã o podemos ultrapassá-las,
Por trágico , enquanto a fetando pessoas e
não podemos transformá-la s " .
situações reais , entendo p o i s u m a
situação-limite espec i ficada c o m o um so­ B asta aí inserir o fator histórico , c o m
frimento exemplar provocado pela violên­ a s devidas implicações . Digamos então
cia institucional . que as situações-limites nos são impostas,
ou pela realidade ontológica, c o m o quer
Uma vez circunscrito o tema e pro­ ele, ou pela história, como também quere­
posta a definição d o trág i c o , resta anali­ mos nós; as primeiras aparecendo m e s m o ,
sar em detalhe as duas partes constitutivas e m última análise, como condição da pos­
da definição . Toda definição prop riamen­ sibilidade aleatória das segundas . Quanto
te dita é produzida mediante a determina­ às implicações d o fator históric o , devem
ção do gênero próximo e d a d i ferença es­ elas ser aclaradas a partir das d i ferenças
pecí fica . A primeira parte d a definição específicas . A d i ferença especí fiE;a da
proposta, " situação-limite " , constitui o situação-lim ite trágica é um " s o frimen­
gênero próxim o ; a segunda parte, " so fri­ to" que, possuindo um caráter obviamen­
mento exemplar provocado p o r violência te pessoal, se revela no entanto " exem­
institucional " , constitui a d i ferença es­ plar " para a comunidade, à qual é mani­
pecí fic a . O que, porém , é gênero próximo festado . E é m anifestado à c o m u nidade
para a definição d o trágic o , j á é determ i­ para a tomada de consciência do p o tencial
nação do gênero ulterior e m ais geral " si­ de violência freqüentemente d i s farçado
tuação " . Antes p o i s de saber o que é nas pregas das relações sociais e da estru­
"situação-lim ite " , é necessário reportar­ tura e manipulação d o poder . Mas, além
se à " situação " . A análise fenomenológi­ de postular um " s o frimento exemplar " , o
ca faz ver que é na situação que se p roces­ fenômeno trágico não p redetermina mais
sa a interação, o efeito sinérgic o , entre de nada. Não diz c o m o será esse sofrimento
um lado reações pessoais e de outro lado o e quais tonalidades a fetivas serão aciona­
mundo físico e as formas institucionais (e­ das . A firma apenas que o sofrimento , pa­
conômicas, sociai s , política s , culturai s , ra ser verdadeiram ente exemplar, deve
religiosa s ; enfim , históricas) . atingir " suas últimas conseqüências " , o
Elucidado o conceito geral de situa­ que quer dizer: os lim ites p revisíveis da
ção , deve esta ainda ser determinada em iniqüidade e atrocidade embutidas nas
sua modalidade de situação-lim ite . C o m formações históricas .
adições q u e ampliam a concepção olimpi­ O trágico , portanto , é o sinal natural
camente m etafísica de Jaspers, de uma grave anom alia no corpo social .
refundindo-a e m função d o histórico, a Assim como o so frimento e o mal-estar fí­
concepção aqui adotada é m u ta tis sicos são o sinal algésico de alerta para o
mutandis a . dele, bem representada nesta desvelamento da d isfunção que ameaça a
passagem tirada da Einführung in die saúde e a integridade físic a , assim tam ­
PhiJosophie : " E u posso trabalhar para bém o trágico , na ordem da experiência
mudar uma situação . M a s h á aquelas que vivida, é a denúncia tácita das formas his­
subsistem em sua essência , m e s m o que tóricas violentas ; denúncia c o m vistas a
sua aparência m o m entaneamente se m o - uma tomada de consciência c o letiva . E i s

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por que, originando-se c o m o experiência não é a experiência d o trá g i c o , e q u e a q u i ­


vivida, depende ainda de sua tematização l o q u e o teatro p r o v o c a é u m a experiência
para ser manifestado e comunicad o . A te­ do trágico de outra ordem q u e a sua expe­
matização do trágico a s s u m e duas form a s riência real .
rentes, que s ã o duas f o r m a s explícitas de
Com efeit o , a análise conceitual d o
denúncia da violência institucional : a for­
trágico n ã o se d e s t i n a a tran s m i t i r a expe­
ma da arte, particularmente o teatro , on­
riência que tem atiza, m a s a fazer entender
de ocupa um espaço p rivilegiado s o b o
a situação trágica: daí seu caráter de de­
nome precisamente de tragéd i a ; e a form a
núncia direta e fundad a . Inversamente, a
da análise conceitu a l . Na tragéd i a , a de­
tematização pela arte se destina a produ­
núncia se identifica com o próprio teatro ,
zir nova experiência . P oi s , se a tragédia é
formando um com plexo semiótico no
a tematização poética de u m a eXperiência
qual o discurso poétic o , de forma dialógi­
real , ela por sua vez desperta no expecta­
ca, se associa à ação m i m ética , ao passo
dor uma experiência poétic a .
que a análise conceitual se traduz em de­
núncia direta e explícita . A serviço desta Há p o r conseguinte, além da expe­
se põe todo discurso crítico c o m p rometi­ riência real do trágic o , uma sua experiên­
do com a libertação do h o m e m , p o u c o cia poética . E s ta experiência apenas re­
importa se proveniente da praxis política, produz em .emoções o q u e o paciente s o fre
do ensaio , do j ornali s m o , da ciência, d a de verdade como experiência real . A fun­
filosofia ou da teologia . ção dessa experiência catártica não é a de
eludir a crueldade de u m a situação histó­
rica real , substituindo-a pela escapatória
EXPER I Ê N C IA DO TRÁG I C O E F O R ­
de um estetismo inoperante e tranqüiliza­
M A S D E E X P R E S SÃO
dor; pelo contrár i o , c o m o foi visto mais
A pesquisa, q u e começou pela preo­ acima, por sua própria natureza estética a
cupação com as dimensões d o conceito d o catarse visa proteger e p reservar a figura
trágico, d e aparência a p r i n c í p i o c o m p le­ do exemplo proposto como denúncia da
xa e obscura, chega finalmente a conclu­ violência institutional . M a i s d o q u e de
sões no fundo simples e clara s . Sobre o s costume, aqui o estetis m o é o maior inimi­
go da experiência p oétic a . A experiência
pressup ostos da fundamentação sucinta­
mente indicada acima, torna-se legí t i m o poética, na medida em q u e é verdadeira,
sabe os riscos que corre . Para o esteti s m o ,
afirmar que só existe u m a experiência real
não h á essa consciência, e l e j á sucu m b i u .
do trágico, com ou sem sua con seqüente
tematização, sob u m a ou outra de suas Os riscos da experiência p oética não
formas gerais de expressão : a arte e o con­ são porém motivo para tem ê-Ia, pois a fi­
ceito . Mas seria igualmente legítim o resu­ nai de contas a poesia é tão arriscada e in­
mir dizendo q ue , s o b qualquer das formas declinável c o m o a própria v id a . Não é a
de expressão , o que se com unica é a expe­ poesia, mas a falta de p o e s ia , q u e violen­
riência trágica, e que a experiência provo­ ta, oprime, rep r i m e , tortura, mata, des­
cada pela comu nicação é sempre a mes­ mata, polui, esteriliza . O tec n o b urocrata
ma? Não é bem assim . A verdade a qui é faz sem poes i a . O esteti s m o deixa fazer . A
outra e de certo m o d o paradoxal, u m a vez poesia trágica denuncia e c o m promete,
que o que a análise conceitual comunica com a denúncia, seu portad o r .

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P U P P [ , U. - o trágico: experiência e conceit o . Trans/Form/ Açio , São Paulo, 4 : 4 1 -50, [ 98 1 .

P U P P I , U . - The Tragic: experience and concept . Trans/Forml Ação, São Paulo , 4 : - 1 9 8 1 .

ABSTRACT: The concept of th e tragic is someh o w connected with vio/ence. The present enquiry
has the purpose of esta blishing the essentiaJ re/ationship existing between institutiona/ vio/ence and the
tragic situation, the /atter being at the sam e time conseq uen ce and denouncement of the form er. Un­
derstood tha t way, the tragic is first expressed under a poetica/ form which is precise/y caJ/ed tragedy in
drama tic arts: then under a conceptua/ form , in the ana/ysis of the historica/ rea/ity itself, by derivation.
The ana/ysis of current history may reveaJ alJ the poten tiality of the tragic accum u/ated on the vio/ence
ofpo wer.

KEY- WORDS: Tragic; tragedy; vio/ence of po wer; endured vio/ence; denounced vio/ence; poetica/
denouncement; conceptua/ den o un cemen t.

REFER�NC IAS B I B L I OG RÁFICAS

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2. ARISTÓTEL E S . - Poética, 1 45 3 a 7-22 .
5. P U P P I , U . - Uma teoria da cultura: comentá­
3. G IRARD , R. - La vioJence et Je sacre. P aris , rio crítico . Trans/Form/Açilo, São Paulo ,
Grasset , 1 97 2 . 1 : 24 1 -65 , 1 974.

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