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Introdução
Pouco se discute no âmbito doutrinário acerca da manifestação do autor em réplica às
alegações do réu em sede de contestação.
Observe-se que, inclusive, ao ajuizar uma ação, muitos advogados deixam de aclarar
todos os seus argumentos na peça vestibular, prorrogando-os para a manifestação em
réplica, tendo em vista a previsão de possíveis alegações da defesa.
“Art. 326. Se o réu, reconhecendo o fato em que se fundou a ação, outro Ihe opuser
impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, este será ouvido no prazo de
10 (dez) dias, facultando-lhe o juiz a produção de prova documental.
Art. 327. Se o réu alegar qualquer das matérias enumeradas no art. 301, o juiz
mandará ouvir o autor no prazo de 10 (dez) dias, permitindo-lhe a produção de prova
documental. Verificando a existência de irregularidades ou de nulidades sanáveis, o
juiz mandará supri-las, fixando à parte prazo nunca superior a 30 (trinta) dias.”
2. A Defesa do Réu
Antes de abordar os artigos ora colacionados, necessária é a exposição, ainda que
sucinta, quanto às possíveis espécies de defesa facultadas ao réu.
Dessa forma, com a citação válida e eficaz, ao réu incumbe o ônus da defesa, o que não
implica em um dever, mas a sua inércia é punida com as conseqüências da revelia.
Há, ainda, hipóteses que encerram questões versando sobre direitos indisponíveis, que
não são atingidas pela simples revelia, surgindo a necessidade de manifestação do
Ministério Público, mas esse não é o foco do presente estudo.
A inércia, então, configura a primeira possibilidade facultada ao réu.
Se, todavia, convier ao réu ingressar nos autos e manifestar-se quanto à pretensão
aduzida pelo autor, o sistema processual, sobretudo em sua fase de conhecimento,
permite-lhe exercer a defesa de forma ampla.
A defesa pode compreender matéria processual e de mérito. Pode ser exercida através
de Contestação ou Exceções, permitindo ao réu, inclusive, deduzir pretensões em face
do autor através do instituto da reconvenção ou formular pedido contraposto.
Nesse ínterim, importante destacar que tenho notado certa displicência ao ser abordada
a questão de preliminares ao mérito. Em muitas oportunidades, matérias versando sobre
intervenção de terceiros e outros institutos envolvendo o mérito da causa vêm sendo
deduzidas em forma de preliminar, quando, em verdade, não encerram nenhuma das
hipóteses do art. 301, além de se referirem ao próprio mérito da demanda.
Contudo, a técnica jurídica é, muita vez, suplantada quando se defronta com o Princípio
da Instrumentalidade das Formas, aqui entendido de forma ampla, mas não passa
despercebida do bom operador do direito.
A defesa de mérito, por sua vez, pode ser direta ou indireta e suscitável através da peça
contestatória, observando-se as disposições específicas quanto ao ônus da impugnação
especificada e ao princípio da eventualidade.
A defesa de mérito direta é aquela que nega o fato constitutivo do direito do autor. O réu
insurge-se contra a pretensão do autor negando a existência ou o modo como ocorreram
os fatos alegados, ressaltando que o ônus da prova incumbe ao autor, salvo as exceções
legais.
A título de exemplo, a negativa de se haver entabulado o contrato em que se funda a
ação ou a afirmação de que a cláusula contratual invocada pelo demandante não se
presta a atingir a finalidade que este lhe atribui são exemplos de defesas de mérito
diretas.
“…o réu pode defender-se de várias maneiras. Pode opor-se mediante a alegação de
que o processo não está em ordem, está viciado, que a ação não pode ser exercida pelo
autor ou, ainda que o autor não tem o direito pleiteado. Nos primeiros casos a defesa é
processual, porque impugna o instrumento (ação e processo) de que se pretende valer o
autor para a afirmação de seu direito; no último a defesa é de mérito, porque nega o
próprio direito alegado pelo autor. A defesa processual é uma defesa indireta,
porquanto o resultado pretendido, se obtém mediante uma alegação que não discute o
mérito. A defesa de mérito, substancial ou material, pode, também, ser direta ou
indireta: é indireta quando consiste em opor fato extintivo, modificativo ou impeditivo
do direito do autor; é direta quando consiste em resistência que ataca a própria
pretensão (material) do autor, negando-a.” Grifei.
“As defesas de mérito são diretas ou indiretas, conforme consistam em negar os fatos
alegados na demanda inicial ou as conseqüências jurídicas pleiteadas pelo autor, ou
em invocar fatos novos, influentes sobre a existência ou vida do direito deste (fatos
impeditivos, modificativos ou extintivos: art. 326)…”
“O réu nega a eficácia jurídica dos fatos alegados pelo autor quando sustenta que a
norma invocada não se aplica ao caso, ou propõe uma interpretação diferente para o
texto, ou procura demonstrar que a orientação dos tribunais o favorece etc.”
‘Fato extintivo é aquele que tem força de fazer extinguir o direito que decorre de
qualquer relação jurídica e ao qual correspondia obrigação do réu. São exemplos o
pagamento, perdão de dívida e prescrição.
Fato impeditivo é circunstância não elementar do fato constitutivo, mas que lhe
obstacula os efeitos. É a hipótese da incapacidade dos contratantes e da ilicitude real
do objeto do contrato.
Como citado no trecho da r. sentença supra transcrita, são exemplos de fatos extintivos
costumeiramente lembrados pela doutrina o pagamento, ainda que em atraso; a
remissão; a decadência e a prescrição.
Por seu turno, são exemplos de fatos impeditivos a nulidade do contrato e a exceção de
contrato não cumprido.
O primeiro deles, ventilado no art. 326, refere-se à contestação em que se opuser fato
impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, quando o réu reconhecer o
fato em que se fundou a ação.
O dispositivo legal colaciona a hipótese de defesa indireta do mérito, afigurando-se,
portanto, a oportunidade do autor em se manifestar, no lapso temporal de 10 dias,
quanto às argumentações deduzidas pelo réu.
Assim, ao rigor da legislação, o prazo de 10 dias para o autor se manifestar acerca das
alegações do réu somente se configura quando verificada na contestação a defesa
processual ou a defesa indireta de mérito, do que se infere, por óbvio, que não há
previsão para manifestação do autor em réplica quando a contestação versar
exclusivamente em defesa direta de mérito.
Nada obsta, contudo, que o Magistrado, dentro de seu livre convencimento, com vistas a
motivação do ato decisório, determine as diligências que entender necessárias,
inclusive, concedendo prazo ao autor para se manifestar quanto as alegações aduzidas
na contestação, ainda que a defesa tenha sido exercida exclusivamente na forma de
mérito direto.
Nesse momento, surge então a dúvida quanto ao prazo para que o autor se manifeste
nessa circunstância.
Lembramos aqui que os prazos podem ser legais, quando fixado pelo legislador;
convencionais, em raras hipóteses permitidas pelo Código (como a disposta no art. 265,
II c/c § 3º); ou judiciais, quando fixado pelo juiz em casos de omissão da lei, consoante
art. 177.
Para situações como tal, surge novo prazo legal, em observação ao disposto no art. 185,
verbis:
“Art. 185. Não havendo preceito legal nem assinação pelo juiz, será de 5 (cinco) dias o
prazo para a prática de ato processual a cargo da parte.”
Essa assertiva destaca-se, sobretudo, quando o réu juntar novos documentos com o
oferecimento da contestação, tendo em vista a disposição do art. 398, verbis:
“Art. 398. Sempre que uma das partes requerer a juntada de documento aos autos, o
juiz ouvirá, a seu respeito, a outra, no prazo de 5 (cinco) dias.”
“… Mas também acontece que às vezes o próprio juiz se omite e chama a parte à
manifestação, sem explicitar prazo. Para essa hipótese, novo prazo legal surge, por
aplicação da regra disposta no art. 185 do Código de Processo Civil…”
Posto isso, dúvidas não pairam acerca da correta observação do prazo para a
manifestação do autor considerando as diversas hipóteses colacionadas.
Essa circunstância conduzirá o autor a adotar uma das seguintes posturas: manifestar-se
após a juntada de cada contestação; ou manifestar-se após a juntada da última.
Por analogia, entendo ser aplicável a disposição do art. 241, III, do Código de Processo
Civil: “Art. 241. Começa a correr o prazo: (…) III – quando houver vários réus, da
data da juntada aos autos do último aviso de recebimento ou mandado citatório
cumprido; (…)”
Logo, havendo vários réus, o início do prazo para apresentar defesa consubstancia-se na
ocasião em que for juntado o último comprovante de citação. Assim, no caso da réplica,
em se tratando de vários réus, parece-nos que o mais adequado seria considerar como
dies a quo a data da intimação da juntada da última contestação, posto que em
consonância com o princípio da economia processual.
Porém, adotada essa tese, pode o juiz dela não se convencer e entender preclusa
qualquer manifestação quanto às contestações anteriormente juntadas, pelo que entendo
apreciável o autor pugnar nos autos pela manifestação, em uníssono, após a juntada da
última defesa.
4. Conclusão
O presente estudo surgiu da necessidade de melhor analisar o instituto da réplica. Pouco
destaque lhe é dado pela doutrina e insuficiente enfoque cristaliza-se na jurisprudência.
No embate diário travado entre autor e réu, a experiência nos revela que detalhes podem
assumir a postura de questões fundamentais.
No início dessa explanação, foi aduzido que muitos argumentos, em que pesem serem
do conhecimento da parte autora já na ocasião do ajuizamento da demanda, são
prorrogados para serem deduzidos em réplica, posto que permitem ao autor refutar,
sistematicamente, possíveis e previsíveis alegações da defesa.
Todavia, se não observadas as formalidades processuais aqui abordadas, sobretudo
àquelas pertinentes ao prazo para a manifestação, o autor pode ser punido por sua
intempestividade.
Para o operador atento, essas questões não podem passar incólumes, pois o exercício da
profissão lhe outorga a competência e a obrigação de exercê-la segundo a melhor
técnica e com as ferramentas de que dispõe, sempre atento à ética e boa-fé da advocacia.
GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro, vol. 2, pág.s 107/108, Editora Saraiva, São Paulo, 1984.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, ed. Malheiros, 2003, p. 327.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Código de Processo Civil Interpretado. Coordenação de Antônio Carlos Marcato, Ed. Atlas,
2005, p. 1.020.
Processo n. 2002.01.1.057573-4. 06/10/2003.
Obra citada, p. 558.
SANTOS, Nelton dos. Código de Processo Civil Interpretado. Coordenação de Antônio Carlos Marcato, Ed. Atlas, 2005, p. 444