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17/08/2018 - 05:00

'Brasil virou uma caixa de Pandora'


Por Amália Safatle

Uma gastrite leva o ex-ministro da Educação do governo Dilma a escolher o


restaurante português A Bela Sintra, no bairro paulistano dos Jardins, para
este "À Mesa com o Valor". Com curta, mas intensa passagem de seis meses
pela pasta em 2015, o professor de filosofia Renato Janine Ribeiro, de 68
anos, foi aconselhado a evitar carnes vermelhas. Como o bacalhau ocupa o
segundo lugar em sua preferência, segue com prazer a recomendação médica.
Mas não abre mão do vinho. "In vino veritas", recita, ao abrir a conversa. Na
leitura atenta da carta, a decisão: um Papa Figos, nome de ave rara da região
do Douro.

É raro ver pessoas com passagem pelo poder público descrevendo para a sociedade seus erros e acertos com riqueza de
detalhes - no máximo, publica-se um relatório formal. Em "A Pátria Educadora em Colapso" (Três Estrelas), Janine,
escritor profícuo, conta as agruras da área de educação no momento em que as torneiras do investimento público secavam
frente à crise fiscal galopante e as bases de sustentação política da presidente ruíam. O livro é o 19º de sua autoria,
somando-se a títulos como "Ao Leitor Sem Medo" (1985), "A Sociedade Contra o Social" (2001, Prêmio Jabuti de ensaios) e
"A Boa Política" (2017).

No livro recém-publicado, o intelectual de esquerda não poupa críticas nem mesmo à atuação de grupos ditos progressistas
naqueles tempos fervilhantes que antecederam o impeachment de Dilma Rousseff. Seja no governo, seja nas páginas da
obra, o professor de ética e filosofia política da USP, aposentado desde 2011, reafirma o compromisso em dizer a verdade,
até mesmo para desfazer o estereótipo do político mentiroso. Hoje professor visitante na Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp), onde contribui para formar o Instituto de Estudos Avançados, prepara um curso de pós-graduação sobre
utopia versus redução de danos.

No vinho mora a verdade, e então Janine revela uma passagem que acabou omitida do livro. O episódio deu-se quando um
jornalista o questionou sobre o fato de a então presidente Dilma não recebê-lo no gabinete. Apesar de o lema do segundo
governo ter sido "Pátria Educadora", houve apenas três audiências do ministro da Educação com ela, "o que é bizarro", diz.

Janine respondeu ao repórter de modo furtivo, dizendo que durante as viagens do Dialoga Brasil, programa de prestação
de contas à sociedade que incluía encontros presenciais nas capitais brasileiras, mantinha com Dilma conversas constantes
sobre os assuntos do ministério. Não era verdade. "Não gostei de ter dito. O ruim é que menti muito mais para proteger o
governo do que me proteger. Eu me dou por contente de que tenha sido somente uma vez. Na política, mentir é o normal."

O surpreendente, diz ele, é que as pessoas gostem de acreditar nas mentiras. "Em 2014, as promessas de Dilma eram
impraticáveis, e no entanto ela ganhou. A sociedade estava feliz de ouvir ilusões. Por que na campanha queremos tanto que
nos mintam?", pergunta.

O ex-ministro arrisca uma explicação falando da tendência do brasileiro ao messianismo, a cegueira que se opõe à luz da
razão. Vê na filosofia a oportunidade não só de responder a indagações, mas de melhorar a qualidade da pergunta. É mais
ou menos o que o moveu ao propor o curso "Merlí", inspirado na série que "bomba" na Netflix e ajuda a popularizar a
filosofia. Ministrado no Casa do Saber no primeiro semestre, o curso teve três aulas, cada uma sobre um episódio. A
receptividade foi tanta que os alunos pediram a continuidade. Assim, ele já prepara um "Merlí 2", sobre mais três

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episódios.

Mas a sede pelas perguntas, avalia o filósofo, não está ainda disseminada na
sociedade brasileira de forma geral, talvez por deficiências que vêm da
formação cultural e educacional. Não é curiosa, questionadora. Ao contrário:
aceita, resigna-se, espera a salvação externa, especialmente em períodos de
crise profunda e desesperança. Com isso, observa Janine, todas as aberrações
são possíveis, como a que ele vê em parte das intenções de voto para as
eleições presidenciais, a menos de três meses do pleito.

"O Lula não repetiria depois o detalhe (...), "Existe essa coisa do sebastianismo, o rei que sumiu no deserto e voltará para
mas entenderia o cerne da questão. Ele é
resgatar Portugal para sua grandeza. O Brasil tem isso no imaginário pela
muito rápido em pegar o espírito das coisas"
figura do milagre. Crê justamente porque é absurdo, pois é assim que a fé se
manifesta: o pão que vira corpo, o vinho que vira sangue."

Regados ao vinho português, chegam os pratos. Janine escolheu um bacalhau à lagareiro, posta levemente empanada e
frita, levada ao forno com azeite, cebola e alho, servida com batatas ao murro, brócolis e azeitonas.

A crítica do professor em meio às garfadas não se atém ao messianismo da direita, que, para além do Brasil, vem
coalhando o mundo de populistas conservadores. Essa onda atinge também a esquerda, na figura messiânica encarnada
pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Mas, na esquerda, pontua, qualquer esperança de um messias soa como
contradição ainda maior.

"Temos esse problema porque Lula assumiu o papel do salvador, dado que é uma pessoa fora de esquadro, um líder
carismático como poucos na história do Brasil. O [ex-governador Leonel] Brizola [1922-2004] era um pouco, mas muito
menos que Lula."

Janine chama esse fenômeno de contradição porque, segundo ele, nenhuma política na esquerda funciona caso não emerja
de baixo para cima. Era o que o PT fazia por meio de conferências nacionais, nas quais mobilizava as bases da sociedade
para debater os temas que virariam políticas públicas. Ao definir uma política de amamentação, por exemplo, primeiro
eram ouvidas as mães e as mulheres grávidas nos municípios, Estados, até chegar a Brasília. "Era algo 'grassroots'".

O garçom completa nossos copos d'água, enquanto Janine fala de sua família, de sua casa e de animais de estimação. Ele é
pai de Rafael e Felipe, do primeiro casamento, sendo que o mais velho entrou na faculdade, cursa ciências sociais na USP.
Hoje Janine está casado com a cientista política Juliana Fratini, que tem gêmeas de 5 anos, e mora no bairro da Aclimação.

"In vino veritas, in acqua sanitas' é o aforismo completo atribuído a Plínio, o Velho, escritor romano do século I. Se no
vinho mora a verdade, na água reside a saúde. Janine aposta que será a saúde a grande pauta da campanha eleitoral de
2018, ao lado de segurança. Esqueçam o bordão da educação. Isso porque, segundo o professor, a sociedade sente-se
doente, em todos os sentidos, e as soluções no campo da saúde são quase milagrosas.

No saneamento básico, por exemplo, a precariedade é tamanha que bastaria um pequeno esforço para a expectativa de
vida voar. Na saúde, em geral, não é preciso mexer na mentalidade das pessoas, no máximo melhorar alguns hábitos.

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Janine em encontro com o ex-presidente dos EUA Barack Obama
Créditos: Arquivo pessoal

Já o avanço na educação e na cultura passa por uma nova consciência, é preciso muitas vezes que a cabeça das pessoas
mude, o que se choca com valores adquiridos e leva tempo. Para resolver os problemas da educação, afirma, é preciso uma
grande concertação de diversas alas da sociedade, não há como ficar de fora de um debate tão complexo.

Para ele, somente a educação poderá estimular a curiosidade e iluminar um país que deseja saídas fáceis e milagrosas. Na
saúde e na segurança, muitas soluções podem ser terceirizadas, o que soa bem mais cômodo para uma sociedade hoje
refratária à participação na arena pública e desencantada com a política, pondera. "Além disso, ao contrário da falta de
saúde, a falta de educação não dói."

O restaurante na área nobre de São Paulo agora é só ruído, as mesas lotam em plena quinta-feira, com executivos e
famílias falando alto. A contragosto, Janine precisa elevar o tom de sua voz macia para que o gravador a registre.

O filósofo exaspera-se ao lembrar que um grupo de empresários da Confederação Nacional da Indústria ovacionou o
candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL). Para ele, o mais grave foi aplaudir quando o ex-capitão reclamou de que não
podia fazer piadas depreciando minorias. Em seu entendimento, esse é o passo para o fracasso econômico: "Se um
empresário pensa desse jeito, não vai passar em nenhuma concorrência europeia. A chance de ter sucesso fora despenca!".
Com isso, Janine não quer dizer que a homofobia, por exemplo, impede o desenvolvimento econômico, mas quase, porque
alija talentos, excluindo pessoas que fogem ao padrão de comportamento e tendem a ser questionadoras e criativas.

"O que muita gente não percebeu é que o sucesso daquele Brasil de mão de obra barata que entrega matéria-prima não
processada está no fim. Mas, com grupos conservadores que não aceitam esse mundo novo, fica muito difícil avançar" Em
sua visão, a elite brasileira é basicamente econômica, não é cultural. Até pode saber se portar em um restaurante, mas não
possui formação humanística e interesse genuíno pela cultura e grandes questões civilizatórias e filosóficas, avalia o
intelectual que morou na França entre 1972 e 1976 para fazer mestrado na Sorbonne e também lecionou na Universidade
Columbia, em Nova York, de 2003 a 2004.

Para o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679), objeto do mestrado e doutorado de Janine, a grande diferença entre o
ser humano e os outros animais não era a razão, e sim a curiosidade, aquela que nos permite ir mais longe. Só o humano
faz a pergunta "por quê?". Quanto mais tem curiosidade, menos predador possui, dizia o autor de "Leviatã". À medida que
aumenta a educação, aumenta a curiosidade.

Assim, a ideia de um governo que tivesse como lema "Brasil, Pátria Educadora" fazia todo sentido na cabeça do ministro
Janine, cuja nomeação, em abril de 2015, havia sido bem recebida por educadores. Mas, como bem sintetiza, era a
expressão certa na hora errada. O slogan, que não foi criado em conjunto com o Ministério da Educação, mas, sim, "em
algum canto do Palácio do Planalto, ou no cérebro de um marqueteiro", passou de bom lema a alvo perigoso. No segundo
mandato, as promessas eleitoreiras da chapa Dilma-Temer murchavam a olhos vistos.

Com o descontrole fiscal dos anos anteriores, somado a adversidades como o fim do ciclo de alta das commodities, a
economia iniciava o mergulho na mais profunda e duradoura recessão da história. Obviamente não restava mais dinheiro e
veio o corte no Orçamento.

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Lula até que o aconselhou: "Dilma dirá que não tem dinheiro, mas cobre,
cobre que ela soltará". Mas como a matemática é uma ciência exata, não havia
de onde tirar. O governo ainda sofreria com efeitos da falta de diálogo e de
jogo de cintura da presidente, descritos no livro. "Sem verba e sem verbo", a
educação, que seria vitrine, virou vidraça. Tornou-se alvo dos opositores e,
surpreendentemente, dos grupos de esquerda e dos próprios educadores.
Embora a crise já estivesse estampada nos jornais, essas turmas pressionavam
o Ministério da Educação por verbas de todo tipo.
Janine no restaurante A Bela Sintra:
bacalhau em vez de carne vermelha para
Para economizar algum recurso que fosse, Janine mandava o ministério e as
evitar a gastrite
universidades desligarem o ar-condicionado quando fazia frio e as luzes
durante o dia. Enquanto isso, era inundado com demandas para criar um novo campus, contratar funcionários e
professores, construir prédios. Os grupos eram também intolerantes à ideia de buscar recursos para a educação em fontes
que não fossem somente o Orçamento público, como o setor privado.

Sem dinheiro, começava o estrangulamento de sua gestão - e as decepções, que culminaram na sua exoneração, da qual
tomou conhecimento primeiramente pela imprensa. Dilma precisava do cargo para ajudar a salvar seu mandato e o
substituiu pelo ex-senador Aloízio Mercadante (PT).

Em que pese a dificuldade circunstancial no Orçamento, o ex-ministro rechaça um pensamento muito comum de que o
Brasil não precisa expandir os gastos em educação, e sim gastar melhor a verba já disponível. Ele concorda que aplicar
melhor o recurso é necessário, e que só dinheiro não basta, é preciso haver projetos inteligentes, engajamento e
comprometimento. Ainda assim, em sua visão, falta muito dinheiro para o ensino, pois a lacuna do Brasil nessa área é
secular. Sua argumentação vem com exemplos: a Alemanha investe 6% do Orçamento na educação, como o Brasil, mas o
PIB alemão é cinco vezes maior, e três vezes superior em poder de compra. "Uma coisa é um país que tem a educação no
DNA, onde os prédios foram bem construídos, os professores são todos formados, a população inteira é filha, neta e
bisneta de pessoas alfabetizadas. Aqui há escolas sem banheiro", compara.

Há ainda uma ponderação estratégica para investir fortemente em educação: ampliar a igualdade de oportunidades e
desarmar a exclusão social erigida durante mais de 500 anos. "Hoje temos apenas um terço ou um quarto da população
desfrutando de todas as vantagens. Se todos passarem a ter acesso, nossa produção poderá multiplicar por três, por quatro.
O país vai explodir em qualidade", defende.

Mas como fazer isso com o país afundado no abismo fiscal? A saída que Janine vê é o aumento de impostos para os mais
ricos. Não considera boa a ideia de que se cobre mensalidade no ensino superior, de modo a subsidiar a educação pública.
Além de a gratuidade do ensino superior ser prevista pela Constituição, seria preciso estabelecer critérios, preços
diferentes conforme a demanda do curso, criar todo um aparato burocrático, o que possivelmente levaria a um ambiente
de judicialização e liminares. "Se a ideia é fazer a pessoa que tem condições financeiras pagar pela educação, que seja
recolhendo mais impostos. É muito mais simples."

Com o Estado quebrado e reformas não realizadas, que outras alternativas existirão? O tema das contas públicas será
especialmente desafiador para a esquerda, caso volte ao poder, pois esta se vale da expansão de gastos para promover
políticas sociais e angariar apoio da população. "A esquerda não sabe lidar com a falta de verba. A direita sabe, promove
arrocho, políticas recessivas. Às vezes, funciona", diz Janine. Nesse contexto, o resgate da imagem do PT, aposta ele,
dependerá muito da capacidade dos governos petistas de investirem no social em períodos de crise profunda.

Para ele, o discurso usado pela esquerda no episódio do impeachment da ex-presidente Dilma é simplesmente o de que ela
foi vítima de um golpe. Não fez a autocrítica considerando os erros que levaram um governo vitorioso em quatro eleições
sucessivas ficar tão vulnerável no espaço de seis meses, diante de um partido aparentemente sem futuro como o PSDB.

Sobre a falta de verba, já discorremos. A de verbo, segundo Janine, tem a ver com a pouca habilidade política da então
presidente, mais que nunca necessária para enfrentar um conluio formado por forças conservadoras.

Embora mostre por Dilma todo o apreço, ressaltando, no livro, sua sensibilidade e comprometimento com as pessoas
desfavorecidas, Janine observa quão difícil é para ela o contato com os pares, as pessoas do mesmo universo cultural. Há
inúmeras histórias de humilhações e broncas desmerecidas, conta. Um ministro que conheceu não queria ser recebido pela

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presidente, e dizem que não era o único. Eles tinham medo de ouvir uma
grosseria.

Leitora voraz, estudiosa, Dilma achava que entendia dos assuntos mais que o
interlocutor - diferentemente de Lula, que chamava as pessoas para fazer
exposições sobre os assuntos que queria conhecer e os aprendia ouvindo. "Eu
tenho a impressão de que a Dilma lê mais do que escuta. O Lula não repetiria
depois o detalhe do que você disse, mas entenderia o cerne da questão. Ele é
muito rápido em pegar o espírito das coisas. Essa é a arte do estadista. Agora,
se você acha que sabe tudo..."

Janine enviou o livro a ambos, com as devidas dedicatórias. Não sabe se Lula recebeu o exemplar na carceragem de
Curitiba e ainda não tinha tido nenhum retorno de Dilma, a quem se refere no livro como "o enigma".

O garçom oferece uma segunda garrafa de Papa Figos, que é recusada. Seria a hora de adoçar as bocas com os quitutes
portugueses à base de açúcar e ovos, oferecidos em carrossel sobre a mesa. O entrevistado escolhe ovos moles com canela.
E o assunto da política persiste. Ainda sobre a prática de "terceirizar os erros", Janine lembra que o PT chegou a denunciar
as Jornadas de Junho, em 2013, como a primeira etapa do golpe. "Ao contrário", discorda, "foram um momento de muita
vida e de rápida politização de uma sociedade despolitizada".

Ele identifica aquele período com a música dos Titãs, a gente não quer só comida, quer a qualidade da educação, da saúde.
Era, de certa forma, um descontentamento com a política de inclusão pelo consumo promovida desde Lula. As pessoas
queriam ser mais do que compradoras girando a roda da economia interna. Elas queriam ser cidadãs. "Para meu espanto,
Dilma não soube pegar isso para ela. E Marina [Silva] não quis. Em 2013, o prato foi oferecido para a Marina", avalia.

Teria tido o receio de ser chamada de oportunista? "Foi o que ela me disse. Mas é nessas horas que a liderança realmente
se mostra. Ela não teve capacidade de se mostrar líder, tendo deixado duas vezes de fidelizar seus eleitores. Ter 20% dos
votos a partir do nada é uma façanha admirável", diz. Ele vê Marina Silva, candidata à Presidência pelo Rede, como uma
das poucas pessoas no Brasil que poderia ter feito uma discussão de alto nível na campanha. "Tem todos os atributos,
história de vida, avidez por leitura, capacidade de escuta. Se pareço criticar Marina, é porque ela tem uma qualidade
gigantesca que não está valorizando."

A seu ver, um erro da campanha de Marina em 2014 foi deixar-se tomar por uma agenda econômica "quase neoliberal",
que tem pouco a ver com as causas éticas de sua origem: meio ambiente e inclusão social. Embora não dê para
implementar política social e ambiental sem as contas públicas ajustadas, como o próprio PT sofreu na pele, Janine acha
que Marina fala demais sobre economia.

Fato é que, passados cinco anos da efervescente participação da sociedade nas Jornadas de Junho, chegamos a 2018 com
as muitas pessoas tendo aversão à política. "Houve um fracasso gigantesco de lá pra cá".

Com o passar do tempo, o A Bela Sintra vai esvaziando-se. Resta apenas uma mesa ruidosa a poucos metros, com
"parabéns a você" e tudo mais. Lá fora, o clima não é exatamente de festa. Há um mau-humor geral. O ministro que já teve
esperança avalia que o Brasil virou uma espécie de Pandora, de cuja caixa saem todos os males.

"Vivemos uma tragédia que precisa de um romancista ou cineasta para cobrir. Não é com o filme 'O Processo' [de Maria
Augusta Ramos, sobre o impeachment]. É realmente ir fundo." Algo tipo o quê? "Tipo um Shakespeare. A gente tem de sair
disso, mas sair de verdade. Essa eleição está difícil de resolver porque a discussão está muito em nomes e não em projetos
de país". E então a gastrite pede chá.

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