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Miriam Struchiner
Laboratório de Tecnologias Cognitivas NUTES/UFRJ (mchiner@nutes.ufrj.br)
Resumo:
Muito embora diferentes classificações sobre o papel do tutor/orientador a distância venham sendo
amplamente discutidas na literatura, ainda há poucos dados ancorados em pesquisas sobre a prática de
tutoria em contextos a distância, mediados pelas novas tecnologias da informação e da comunicação. Tendo
em vista que estas informações são de fundamental importância para o planejamento de ambientes e
processos educativos a distância, este trabalho tem como finalidade oferecer subsídios para esta discussão,
com base na análise dos resultados obtidos – as lições aprendidas – sobre os fatores potencializadores e
limitantes do trabalho de tutoria/orientação a distância, em três estudos sobre programas de EAD, via Web.
Abstract:
Although the roles of distance education tutors have being widely discussed in the literature, there are still
few data anchored in research based on tutor’s praxis in real distance educational contexts Considering that
this information is of great importance for planning distance learning processes and environments, this
paper has the objective to offer arguments to this discussion, based on the results and analyses from three
distance education experiences. Based on the lessons learned we present the factors that may facilitate or
limit the distance tutoring/orientation work.
Apoio: CNPq, CAPES, PAPED/SEED/MEC
1. Introdução
A presente análise foi realizada a partir do levantamento e da caracterização dos principais fatores
identificados como potencializadores e limitantes do trabalho de tutoria/orientação, nos cursos investigados.
Os estudos analisados contaram com três principais fontes de dados: observação do desenvolvimento dos
cursos, realização de questionários e entrevistas (com alunos, tutores/orientadores e coordenadores).
No quadro 2, são apresentadas as características gerais destas três experiências.
Entra quadro 2
3. Lições aprendidas
A partir das três experiências relatadas, apresenta-se uma síntese dos fatores que potencializaram ou
limitaram as atividades de tutoria/orientação a distância.
Os fatores que potencializaram as atividades podem ser classificados em três categorias: fatores
pedagógicos, tecnológicos e gerenciais.
Fatores pedagógicos:
Estratégia pedagógica baseada na resolução de situações-problema
Este modelo pedagógico, utilizado no curso (B), permitiu envolver as experiências dos alunos,
estimulando o desenvolvimento de uma aprendizagem ativa e autônoma. Ao mesmo tempo em que exigia
maior dedicação e elaboração por parte do tutor/orientador, tornou a atividade de tutoria/orientação mais
aberta e flexível. Esta estratégia não é a melhor, nem a única que propicia os elementos acima citados, mas,
configura um exemplo oportuno para o desenvolvimento de ambientes construtivistas de aprendizagem.
Diversidade de ferramentas comunicacionais
A possibilidade de utilizar ferramentas comunicacionais com funções específicas (quadro de avisos, e-
mail e fórum de discussão, por exemplo) facilita o trabalho do tutor/orientador, pois permite atender
diferentes estilos de conversação (interação mais pessoal ou coletiva, por exemplo). As ferramentas
comunicacionais possibilitam diminuir a sensação de isolamento nos cursos de EAD, potencializando a
construção coletiva de conhecimento.
Familiarização dos tutores com todos os elementos e estrutura do curso
O habitual, em cursos a distância, é que haja equipes especializadas para as diferentes etapas de
desenvolvimento e implementação. Normalmente, este processo envolve especialistas de conteúdo,
desenhistas instrucionais, programadores visuais e de informática, além de tutores/orientadores. Os
tutores/orientadores quase nunca participam do processo de concepção e planejamento do curso. Portanto, é
necessário que se familiarizem tanto com o conteúdo, como com a abordagem pedagógica e o ambiente de
aprendizagem. Esta familiaridade garante maior segurança e domínio em relação ao processo educativo, o
que potencializa a atividade de tutoria/orientação.
Fatores tecnológicos:
Existência de ferramentas de acompanhamento das atividades do curso
Uma vez que todas as atividades acontecem a distância, as ferramentas de acompanhamento facilitam
as atividades dos tutores, criando estratégias de organização do trabalho e gerenciamento das atividades dos
alunos. Assim, a partir destas ferramentas, os tutores/orientadores podem visualizar o número de acessos, os
caminhos percorridos, os materiais consultados e enviados etc. No curso (A), os tutores podiam acompanhar
as atividades a partir do histórico de navegação dos alunos. Embora facilitasse o trabalho, esta ferramenta
ainda deverá ser aperfeiçoada, já que sua “leitura” e interpretação não é tão amigável. No curso (B), os
tutores/orientadores contaram com a ferramenta de Alunos por orientador (cadastro dos alunos relacionados
ao orientador), Controle de Acesso (disponibiliza os dados sobre a rotina de utilização do curso pelos alunos
sob sua orientação) e Análise dos trabalhos (dá acesso à visualização e correção dos trabalhos dos alunos).
No curso (C) os tutores não contaram com qualquer ferramenta de gerência.
Fatores gerenciais:
Liderança da coordenação do curso
É fundamental que a coordenação do curso se coloque no papel dos tutores para conhecer e vivenciar o
processo educativo e melhor gerenciar a dinâmica do curso. A coordenação deve assumir o papel de
integração da equipe, potencializando as atividades dos tutores.
Apoio de monitores tecnológicos
Tendo em vista as inúmeras dificuldades com o uso da tecnologia, ainda apresentadas pela maioria dos
participantes (coordenadores, tutores e alunos), o apoio de monitores especializados é um elemento muito
importante para auxiliar as atividades de tutoria. Os monitores não apenas apóiam as dúvidas dos alunos,
como as dos próprios tutores. Os tutores, assim, ficam liberados da sobrecarga das dúvidas dos alunos em
relação ao uso da tecnologia e podem se concentrar na orientação pedagógica.
Na classificação dos fatores que limitaram as atividades de tutoria/orientação, além das três categorias
apresentadas acima, identificou-se a categoria “fatores culturais”.
Fatores pedagógicos:
Falta de experiência com a prática de orientação a distância
As atividades de EAD ainda são uma novidade para a maioria dos professores, lançando inúmeros
desafios para as suas práticas docentes. Dificilmente será possível transferir os mesmos hábitos/estratégias da
sala de aula para as atividades de EAD, o que traz, de início, uma certa insegurança para os professores. Com
a prática, novas competências são desenvolvidas para o melhor aproveitamento das atividades de
tutoria/orientação.
Falta de uma compreensão sólida e comum sobre a abordagem pedagógica proposta
Embora, atualmente, grande parte dos cursos de EAD sejam apresentados como propostas inovadoras
e construtivistas, nem sempre isto é compatível com os modelos oferecidos. Além disso, nem sempre existe
uma compreensão sólida sobre este modelo, que seja compartilhada por todos os profissionais envolvidos.
No processo de planejamento e desenvolvimento de um curso, é fundamental, além da análise profunda e
crítica sobre qual a visão educativa que o curso pretende oferecer, propiciar estratégias de discussão e
integração desta visão com toda a equipe. Isto possibilita o desenvolvimento profissional e pessoal de cada
um e favorece a concretização de um projeto coletivo.
Problemas nas ferramentas comunicacionais – limitação da interatividade entre os participantes.
Como as ferramentas comunicacionais são o principal meio de contato e diálogo entre os participantes,
quando há problemas técnicos as atividades de tutoria ficam prejudicadas, limitando a interatividade e
distanciando a comunidade.
Capacitação de tutores limitada aos aspectos técnicos do curso
Grande parte dos cursos de capacitação para tutores se limita aos aspectos técnicos relacionados ao uso
das ferramentas do curso. Os aspectos pedagógicos e os elementos e estratégias peculiares da EAD são,
muitas vezes, deixados em segundo plano ou nem abordados, o que acaba prejudicando o desempenho dos
tutores. Isto se deve a dois principais motivos: 1) à familiaridade ainda pequena em relação aos aspectos
pedagógicos envolvidos na EAD e 2) ao fato de se considerar que, sendo professores, estes já são
competentes na prática pedagógica.
Fatores tecnológicos:
Limitações técnicas do uso da tecnologia
As limitações tecnológicas de nossa rede de computadores ainda são bastante intensas, o que dificulta
muito as atividades a distância pela Internet; dentre as limitações, pode-se citar a lentidão da rede e o seu
custo de uso. A dificuldade de acesso à Internet é um dos elementos que mais provoca a desistência e o
insucesso desta modalidade de EAD.
Fatores gerenciais
Pequeno tempo de dedicação dos tutores
A falsa idéia de que a EAD exige menos tempo de dedicação dos professores ainda persiste. Na
verdade, as atividades de EAD, quando realizadas com seriedade e com a visão de priorizar os processo de
autonomia, interação e cooperação, acabam requerendo dos professores um tempo de dedicação maior do
que o imaginado. Isto pode acabar trazendo conflitos e desorganização para o processo educativo,
dificultando as atividades de tutoria/orientação. É necessário ter sempre em mente que as atividades de EAD
requerem, além das demandas normais de qualquer atividade educativa, uma reorganização das relações de
ensino-aprendizagem, o que é um grande desafio e exige maior tempo de dedicação e compromisso.
Fatores culturais
Desafios do modelo pedagógico que privilegia uma postura mais ativa e autônoma dos alunos
A cultura da transmissão do conhecimento ainda está enraizada em nossa sociedade, dificultando o
desenvolvimento de propostas educativas mais abertas que estimulem uma postura ativa e autônoma dos
alunos. Geralmente, os alunos mantêm uma postura passiva, esperam que o professor dite todo o andamento
do processo educativo e desejam receber sempre respostas prontas para as suas dúvidas. Um dos papéis dos
orientadores/tutores é procurar transformar esta visão, redirecionando suas práticas para uma ação de apoio
ao aprendizado.
Limitações culturais do uso da tecnologia
O primeiro passo para o orientador passar confiança e segurança para os seus alunos a distância é
demonstrar conforto com a tecnologia, procurando conhecer a fundo todo o ambiente, seus recursos e
ferramentas. Isto também facilitará o atendimento às dúvidas técnicas dos alunos.
Dificuldade de lidar com situações onde os alunos apresentam maior conhecimento sobre determinado
conteúdo
Pela facilidade de enviar perguntas e comentários diversos (a qualquer hora, quando desejar) e pela
abertura e flexibilidade propostas em muitos ambientes de aprendizagem, pode acontecer de os orientadores
receberem questões que não saibam responder. Isto pode ser embaraçoso para os professores, que devem
aprender a lidar com estas situações. É sempre bom poder relembrar que a atividade educativa é uma
atividade de construção social, que se dá por meio da troca e cooperação de diferentes conhecimentos e
expertises.
Dificuldade de exposição, devido à linguagem escrita
A falta de familiaridade com o formato de interação viabilizado pela Internet, onde idéias e
posicionamentos são registrados de forma permanente, através da expressão escrita, pode ser um fator de
inibição que explica a participação de caráter mais observador de alguns participantes. Esta postura mais
observadora pode acabar limitando as atividades dos tutores, que devem procurar alternativas para orientar
estes alunos.
4. Conclusões
Tendo em vista a idéia de que o aluno a distância deve encontrar em si mesmo as motivações e as
necessidades para aprender, sendo capaz de fazer opções sobre seu próprio processo de educação, apresenta-
se um grande desafio para a EAD, que é o de estabelecer pedagogia menos diretiva, onde os alunos possam
definir seus ritmos, preferências curriculares e de metodologias de aprendizagem. O planejamento do
processo educativo deve levar em conta as habilidades e competências dos participantes, assim como suas
condições sócio-culturais (situação familiar, profissional, social, ambiental). Como discutem Struchiner et al.
(1998), a mediação pedagógica construtivista pode ser traduzida em competências do tutor/orientador, que
deverá compreender a construção do conhecimento como um processo dinâmico e relacional; deverá ter uma
visão clara da metodologia a ser realizada, dos processos adequados de avaliação e desenvolver uma postura
de atuação compatível com esta visão. Desta maneira, o tutor/orientador possui um papel fundamental,
direcionando seus esforços na personalização da EAD, mediante um apoio sistemático e organizado, que
ajude os alunos na utilização dos materiais educativos oferecidos, que propicie o estímulo e a orientação
individual e coletiva, facilitando e motivando as situações de aprendizagem. No entanto, esta inegável
importância relegada ao tutor/orientador deve vir acompanhada da compreensão de que sua atuação, como
foi apresentado neste trabalho, é influenciada por uma série de elementos. Assim, como pode ser observado
em nossas Lições aprendidas, os fatores envolvidos no trabalho de tutoria/orientação a distância contemplam
desde aqueles relativos à concepção pedagógica do curso (fatores pedagógicos), passando pelos relacionados
aos recursos e ferramentas disponíveis para auxiliar o seu trabalho (fatores tecnológicos e gerenciais), indo
até a postura e expectativa dos alunos, além da visão sobre o processo de ensino-aprendizagem, contemplada
por todos os participantes envolvidos (fatores culturais).
Finalmente, vale ressaltar que a literatura define tantas listas de qualidades e recomendações para o
trabalho de tutoria/orientação a distância que, para alcançá-las, precisaríamos de perfeitos “super-homens”
(Aretio, 2001); na verdade, mais do que procurar seguir recomendações, é necessário ter a oportunidade de
refletir sobre elas, com a prática e com os possíveis erros.
5. Referências Bibliográficas
BERGE, Z.L. Facilitating Computer Conferencing: recommendations from the field. Educational
technology. 35(1) 22-30, 1995.
GOLD, S. A Constructivist Approach to Online Training for Online Teachers. JALN. V5, I1. Maio de 2001.
KRELLING, P.C.L.. Ação tutorial: redesenho de uma ação. In: Congresso virtual educa. Madrid. Atas de la
Conferencia Internacional sobre Educación, Formación y Nuevas Tecnologias. CD-ROM, 2001.
STRUCHINER, M., REZENDE, F., RICCIARDI, R.M. & CARVALHO, M.A. (1998) Elementos
Fundamentais para o Desenvolvimento de ambientes Construtivistas de Aprendizagem a Distância.
Tecnologia Educacional, 26(142):.3-11.