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RAIMUND ABRAHAM DIANA AGREST TADAO ANDO GIULIO CARLO ARGAN

| PHILIP BESS | GEOFFREY BROADBENT | ALAN COLQUHOUN | JACQUES


DERRIDA I PETER EISENMAN KENNETH FRAMPTON MARCO FRASCARI

UMA NOVA AGENDA PARA A ARQUITETURA


| MARIO GANDELSONAS| DIANE GHIRARDO | MICHAEL GRAVES | VITTORIO
GREGOTTI | KARSTEN HARRIES | FRED KOETTER | REM KOOLHAAS | LIANE

LEFAIVRE | WILLIAM MCDONOUGH | ROBERT MUGERAUER | CHRISTIAN

NORBERG-SCHULZ | JUHANI PALLASMAA | DEMETRI PORPHYRIOS | ALDO ROSSI

ANTOLOGIA TEÓRICA 1965-1995 COLIN ROWE | THOMAS L. SCHUMACHER |


DENISE SCOTT BROWN | IGNASI DE SOLA-MORALES RUBIO | ROBERT A.

M. STERN | MANFREDO TAFURI | BERNARD TSCHUMI I ALEXANDER

TZONIS | ROBERT VENTURI ] ANTHONY VIDLER KATE NESBITT (ORG.)

I
No Brasil, a sensação predominante nas ultimas décadas é que os espaços de discussão
de arquitetura e urbanismo tornaram-se cada vez mais escassos. Enquanto avançava
a pesquisa especializada, a arquitetura parecia perder relevância cultural: sumiam pú¬
blico e críticos, periódicos de arquitetura convertiam-se em vitrines de escritórios e
fabricantes, dissolviam-se os elos entre a arquitetura, as artes e o pensamento, assim
como entre reflexão e prática projetual, levando o meio profissional brasileiro à deso¬
rientação e ao conformismo mais conveniente.
É provável que este curto-circuito que se produziu no país depois da construção de
Brasília tenha algo a ver com a forma como a modernidade arquitetônica passou a ser
interpelada entre nós. Sobretudo desde o golpe militar de 1964. De um lado, a partir da
exacerbação do viés produtivista da arquitetura moderna em favor da construção esta¬
tal e especulativa pesada; de outro, a partir da denúncia de sua face aparatosa e autori¬
tária em meio à crise das promessas de desenvolvimento social e autonomia nacional.
A impressão que se tem é que, com o passar dos anos, o debate da profissão chegou a
um ponto de saturação tal que, enrijecidas em suas próprias convicções, nenhuma das
posições em voga no país - ultra, pró, pós ou anti modernas - tem muita coisa a nos
dizer quando o assunto é o que fazer da arquitetura para além do mero consentimento
com exercícios de estilo pessoal, de escola ou oportunidade.
Neste sentido, Uma nova agenda para a arquitetura, organizada pela professora norte-
americana Kate Nesbitt, traz uma contribuição inestimável ao leitor brasileiro. Ao reunir
um conjunto influente de textos teóricos produzidos entre 1965 e 1995, permite romper
com o longo isolamento que condenou o meio local dos arquitetos a um diálogo de surdos.
A antologia, dividida em quatorze capítulos temáticos, reúne 51 dos principais tex¬
tos de teoria contemporânea de arquitetura, cada um dos quais precedidos de uma
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UMA NOVA AGENDA PARA A ARQULTETUR A


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9 Agradecimentos
11 Prefácio
15 Introdução

89 CAPíTULO 1 Pós-modernismo: as respostas da arquitetura à crise do modernismo

91 Complexidade e contradição em arquitetura: trechos selecionados


de um livro em preparação (1966) ROBERT VENTURI
95 O pós-funcionalismo (1976) PETER EISENMAN
1 01 Argumentos em favor da arquitetura figurativa (1982) MICHAEL GRAVES
108 A pertinência da arquitetura clássica (1989) DEMETRI PORPHYRIOS
I 15 Novos rumos da moderna arquitetura norte-americana: Pós-escrito
no limiar do modernismo (1977) ROBERT A. M. STERN

127 CAPíTULO 2 Semiótica e estruturalismo: 0 problema da significação

129 Semiótica e arquitetura: consumo ideológico ou trabalho teórico (1973)


DIANA AGREST E MARIO GANDELSONAS

141 Um guia pessoal descomplicado da teoria dos signos na arquitetura (1977)


GEOFFREY BROADBENT

163 CAPíTULO 3 Pós-estruturalismo e desconstrução:


os temas da originalidade e da autoria

1 65 Uma arquitetura onde o desejo pode morar (1986) - Entrevista de JACQUES


DERRIDA a EVA MEYER
172 Arquitetura e limites 1 (1980) BERNARD TSCHUMI
177 Arquitetura e limites 11 (1981) BERNARD TSCHUMI
183 Arquitetura e limites m (1981) BERNARD TSCHUMI
1 88 Introdução: Notas para uma teoria da disjunção arquitetônica (1988)
BERNARD TSCHUMI

191 A arquitetura e o problema da figura retórica (1987) PETER EISENMAN


199 Derrida e depois (1988) ROBERT MUGERAUER

11
219 CAPíTULO 4 Historicismo: o problema da tradição

221 Três tipos de historicismo (1983) ALAN COLQUHOUN


232 O fim do clássico: o fim do começo, o fim do fim (1984) PETER EISENMAN
252 Do contraste à analogia: novos desdobramentos do conceito
de intervenção arquitetônica (1985) IGNASI DE SOLà-MORALES RUBIó

265 CAPíTULO 5 Tipologia e transformação

267 Sobre a tipologia em arquitetura (1963) GIULIO CARLO ARGAN


273 Tipologia e metodologia de projeto (1967) ALAN COLQUHOUN
284 A terceira tipologia (1976) ANTHONY VIDLER

291 CAPíTULO 6 A teoria urbana depois do modernismo: contextualismo,


Main Street e outras ideias

293 Cidade-colagem (1975) - COLIN ROWE e FRED KOETTER


322 Contextualismo: ideais urbanos e deformações (1971) THOMAS L. SCHUMACHER
337 Uma significação para os estacionamentos dos supermercados A&P, ou Apren¬
dendo com Las Vegas (1968) ROBERT VENTURI e DENISE SCOTT BROWN
355 Pós-escrito: introdução à nova pesquisa sobre “A cidade contemporânea” (1988)
REM KOOLHAAS

357 Por uma cidade contemporânea (1989) REM KOOLHAAS

361 Para além do delírio (1993) REM KOOLHAAS

369 CAPíTULO 7 A Escola de Veneza

371 Território e arquitetura (1985) VITTORIO GREGOTTI


377 Uma arquitetura analógica (1976) ALDO ROSSI
384 Reflexões sobre meu trabalho recente (1976) ALDO ROSSI
388 Problemas à guisa de conclusão (1980) MANFREDO TAFURI
399 CAPíTULO 8 Agendas éticas e políticas

401 Comunitarismo e emotivismo: duas visões antagónicas sobre ética


e arquitetura (1993) PHILIP BESS
415 A arquitetura da fraude (1984) DIANE GHIRARDO
423 A função ética da arquitetura (1975) KARSTEN HARRIES
427 Projeto, ecologia, ética e a produção das coisas (1993) WILLIAM MCDONOUGH
438 Os princípios de Hannover (1992) WILLIAM MCDONOUGH ARCHITECTS

441 CAPíTULO 9 Fenomenologia do significado e do lugar

443 O fenômeno do lugar (1976) CHRISTIAN NORBERG-SCHULZ


461 O pensamento de Heidegger sobre arquitetura (1983) CHRISTIAN NORBERG-SCHULZ
474 Uma leitura de Heidegger (1974) KENNETH FRAMPTON
481 A geometria do sentimento: um olhar sobre a fenomenologia da arquitetura (1986)
JUHANI PALLASMAA

491 CAPíTULO 10 Arquitetura, natureza e espaço construído

493 Por novos horizontes na arquitetura (1991) TADAO ANDO


498 Negação e reconciliação (1982) RAIMUND ABRAHAM

501 CAPíTULO 1 1 Regionalismo crítico: cultura local versus civilização universal

503 Perspectivas para um regionalismo crítico (1983) KENNETH FRAMPTON


520 Por que regionalismo crítico hoje? (1990) ALEXANDER TZONIS e LIANE LEFAIVRE

533 CAPíTULO 12 Expressão tectônica

535 O exercício do detalhe (1983) VITTORIO GREGOTTI


538 O detalhe narrativo (1984) MARCO FRASCARI
556 Rappel à Vordre, argumentos em favor da tectônica (1990) KENNETH FRAMPTON
571 CAPíTULO 13 Feminismo, gênero e o problema do corpo

573 O prazer da arquitetura (1977) BERNARD TSCHUMI


584 À margem da arquitetura: corpo, lógica e sexo (1988) DIANA I. AGREST
599 Visões que se desdobram: a arquitetura na era da mídia eletrónica (1992)
PETER EISENMAN

609 CAPíTULO 14 Definições contemporâneas do sublime

611 En Terror Firma: na trilha dos grotextos (1988) PETER EISENMAN


617 Uma teoria sobre o estranhamente familiar (1990) ANTHONY VIDLER

623 Bibliografia
635 Sobre os autores
645 índice remissivo
662 Fontes das ilustrações
CAPÍTULO 10

Arquitetura, natureza
e espaço construído
TADAO ANDO .
POR NOVOS HORIZONTES NA ARQUITETURA
Este artigo polêmico, cujo título faz uma homenagem ao famoso manifesto de Le
Corbusier, comenta sucintamente os defeitos da arquitetura moderna e pós-mo-
e derna. A referência ao "horizonte", no título, indica uma necessidade de ampliação
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O"
<c de perspectivas. A palavra não foi escolhida por acaso; pode-se interpretá-la como
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um sinal da importância da fenomenologia e do sítio no processo projetual e na
S
ffl teoria de Ando. Entrando na última década do milénio, Ando sugere a necessidade
Q.
de um "desenvolvimento através e além do modernismo", que somente poderá
ser realizado por meio de uma "ação crítica". Alguns aspectos dessa crítica são o distancia¬
mento da função que ele impõe deliberadamente aos seus projetos ("nem sempre dou a
meus espaços uma clara articulação funcional"),' a tranquilidade resultante da simplicidade
da forma e a inserção da natureza. O confronto com a natureza e a realidade concreta dos
materiais tem a intenção de provocar reflexão.
Ando reconhece que a arquitetura cria uma nova paisagem e por isso tem a responsabili¬
dade de ressaltar as características particulares de um determinado lugar. Em outro trabalho,
Ando afirmara que "a finalidade da arquitetura é basicamente a construção do lugar".2 Essa
leitura da interação entre a paisagem e a construção levou Ando a descobrir uma tensão vital
que conduz a um despertar espiritual, semelhante talvez à concepção do habitar em Martin
Heidegger. Embora o vocabulário de Ando se inspire em conceitos fenomenológicos, ele nem
sempre se refere especificamente a essa tradição filosófica.3 Pode-se supor que ele conheça
os escritos de Christian Norberg-Schulz e de Kenneth Frampton sobre Heidegger e a arqui¬
tetura, e provavelmente também os de Vittorio Gregotti (caps. 9, 7). Seu forte compromisso
com o sítio lembra a postura de Gregotti e de Raimund Abraham.
Apesar das aparentes semelhanças com esses teóricos, Ando chama a atenção para
uma importante diferença entre as atitudes ocidentais e orientais para com a natureza: a
cultura japonesa enfatiza um limiar espiritual entre a construção e a natureza, enquanto
a cultura ocidental lhes interpõe uma fronteira física.
Ao aspirar a "um nível de abstração e universalidade" e ao mesmo tempo ao reconhe¬
cer o caráter diferenciado da cultura regional, o autodidata Ando tem sido citado como um
exemplo do regionalismo crítico de Frampton (cap. 11).
A obra desse arquiteto internacionalmente respeitado é lúcida e bem resolvida do ponto de
vista tectônico. Embora muitas vezes o concreto pareça ser o seu único material, Ando também
encaminha o uso da luz e do vento como elementos físicos de suas construções. Os textos
teóricos de Ando atingem um grau de expressão poética semelhante ao de seus edifícios.

1. Kenneth Frampton (org.). TadaoAndo: Buildings Projects Writings. Nova York: Rizzoli, 1984, p. 134.
2. Ibid., p. 133.
3. Ibid., p. 134. Em outro artigo, ele cita Gaston Bachelard.
]
493
TADAO ANDO

Por novos horizontes


na arquitetura
O pensamento arquitetônico apoia-se na lógica abstrata. Por abstrato me refiro a
uma exploração meditativa que atinge a cristalização da complexidade e riqueza do
mundo, e não a uma redução de sua realidade pela diminuição de sua concretude. Os
melhores aspectos do modernismo não terão se originado desse tipo de pensamento
arquitetônico?
O pós-modernismo surgiu no passado recente para denunciar a pobreza do mo¬
dernismo em um momento no qual esse movimento estava se deteriorando, tornando-
se convencional e abandonando o papel que se arrogara como força de revitalização
cultural. A arquitetura moderna havia se tornado mecânica, e os estilos pós-moder-
nos se empenharam em recuperar a riqueza formal que o modernismo aparentemente
descartara. Esse esforço sem dúvida alguma representou um passo na direção certa,
ao voltar-se para a história, o gosto e o ornamento, e devolveu à arquitetura uma certa
concretude. No entanto, também este movimento rapidamente se atolou em expres¬
sões de vulgaridade, produzindo uma enxurrada de brincadeiras formalistas que mais
confundiram do que inspiraram.
O caminho mais promissor para a arquitetura contemporânea é o de um desen¬
volvimento que atravesse e supere o modernismo. Isso significa substituir os métodos
mecânicos, letárgicos e medíocres, aos quais o modernismo sucumbiu pela vitalidade
meditativa e abstrata que caracterizou os seus primórdios, de modo a criar coisas esti¬
mulantes para o pensamento que sejam capazes de nos levar ao século xxi. A criação
de uma arquitetura capaz de infundir novo vigor no espírito humano deve abrir cami¬
nho no impasse atual da arquitetura.

LÓGICA TRANSPARENTE

A criação arquitetônica funda-se na ação crítica. Nunca se resume a um método para a


solução de problemas por meio do qual determinadas condições são reduzidas a ques¬
tões técnicas. A criação arquitetônica supõe a contemplação das origens e da essência
dos requisitos funcionais de um projeto e a subsequente determinação dos seus pro¬
blemas essenciais. Somente dessa maneira o arquiteto pode manifestar na arquitetura
o caráter de suas origens.

494
Quando concebi o projeto do Museu Histórico Chikatsu-Asuka, em Osaka, em
um sítio fundamental para a história antiga do Japão, compreendi a importância vital
de conceber uma arquitetura que não desfigurasse a grandeza da paisagem local. Con-
centrei-me então na capacidade da arquitetura de introduzir uma nova paisagem e
procurei criar um museu que pudesse acolher a paisagem ao seu redor nas exposições
que programasse.
Na sociedade contemporânea, a arquitetura é condicionada por fatores económicos e
na maior parte das vezes governada pela padronização e mediocridade. O projetista sério
deve questionar inclusive os requisitos dados e refletir profundamente sobre o que real¬
mente lhe está sendo encomendado. Esse tipo de investigação poderá revelar-lhe o caráter
específico latente em uma encomenda e esclarecer o papel vital que uma lógica intrínseca
cumpre na realização de uma obra arquitetônica. Quando a lógica permeia o processo de
projeto, o resultado é uma clareza de estrutura, ou da ordem espacial - acessível não só
à percepção como à razão. Uma lógica transparente que impregna o todo e transcende a
beleza superficial, ou a mera geometria, com seu valor intrínseco.

ABSTRAÇÃO

O mundo real é complexo e contraditório. No cerne da criação arquitetônica está a


transformação da concretude do real, por meio de uma lógica transparente, em uma
ordem espacial. Não se trata de uma abstração que suprime, mas de uma tentativa de
organizar o real em torno de um ponto de vista intrínseco para ordená-lo mediante o
poder de abstração. O ponto de partida de um problema arquitetônico - seja o lugar, a
natureza, o estilo de vida ou a história - se expressa nessa evolução para o abstrato. So¬
mente um esforço dessa natureza é capaz de produzir uma arquitetura rica e variada.
Quando desenho uma residência - um continente para a habitação humana - pro¬
curo alcançar precisamente essa união entre a forma geométrica abstrata e a atividade
humana diária.
Na Row House (residência Azuma), em Suniyoshi, peguei uma casa de uma sé¬
rie de três habitações geminadas de madeira e a reconstruí como um espaço fechado
de concreto, na tentativa de gerar um microcosmo no seu interior. A casa se divide
em três seções, e a seção do meio é um pátio a céu aberto. Esse pátio é um exterior
que preenche o interior, e seu movimento espacial é invertido e descontínuo. Como
forma geométrica simples, a caixa de concreto é estática; mas como nela penetra a
natureza e a casa é ativada pela vida humana, sua existência abstrata adquire vibração
no encontro com essa concretude. Minha principal preocupação nesse projeto foi es¬
tabelecer o grau de austeridade da forma geométrica capaz de se confundir com a vida
humana. Esta preocupação também prevalece na Koshino House, na Kidosaki House,
e em outros de meus projetos residenciais ou outros tipos de construções. A abstração

495
geométrica se choca com a concretude humana e, então, a aparente contradição se
dissolve na incongruência. A arquitetura criada naquele momento é preenchida por
um espaço que provoca e inspira.

NATUREZA

Eu procuro instilar a presença da natureza em uma arquitetura construída com auste¬


ridade mediante uma lógica transparente. Os elementos naturais - água, vento, luz e
céu - trazem o contato com a realidade de volta a uma arquitetura derivada da refle¬
xão ideológica, nela despertando a vida criada pelos próprios homens que a habitam.
A tradição japonesa abraça uma sensibilidade para com a natureza diferente da oci¬
dental. A vida humana não tem a pretensão de se opor à natureza e não se empenha em
controlá-la, mas antes busca uma associação íntima com a natureza a fim de unir-se com
ela. Pode-se até mesmo dizer que, no Japão, todas as formas de exercício espiritual são
tradicionalmente realizadas no contexto da inter-relação do homem com a natureza.
Esse tipo de sensibilidade engendrou uma cultura que diminui a ênfase na fronteira
física entre a residência e a natureza circundante e que, ao contrário, instala um limiar
espiritual. Ao mesmo tempo em que protege a habitação humana da natureza, procura
trazê-la para dentro da casa. Não há uma demarcação clara entre interior e exterior, mas

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Tadao Ando, Museu das Crianças, Himeji, Hyogo, 1987-89. Vista externa.

496
uma permeabilidade recíproca. Infelizmente, hoje a natureza perdeu muito de sua antiga
abundância e a nossa capacidade de percebê-la também se enfraqueceu. Por isso, a arqui¬
tetura contemporânea tem um papel a cumprir no sentido de proporcionar às pessoas
lugares arquitetônicos que as façam sentir a presença da natureza. Quando isso acontece,
a arquitetura transforma a natureza por meio da abstração e modifica o seu significado.
Quando a água, o vento, a luz, a chuva e outros elementos naturais são abstraídos na
arquitetura, esta se transforma em um lugar no qual as pessoas e a natureza se defrontam
em permanente estado de tensão. Creio ser esse sentimento de tensão que poderá des¬
pertar as sensibilidades espirituais latentes no homem contemporâneo.
No Museu das Crianças, em Hyogo, organizei cada um dos elementos arquitetô¬
nicos de modo a permitir encontros genuínos com a água, a floresta e o céu, em con¬
dições ideais. Quando a presença da arquitetura transforma um lugar, dando-lhe uma
nova intensidade, é possível descobrir uma nova relação com a natureza.

LUGAR

A presença da arquitetura - a despeito de seu caráter autossuficiente - cria inevitavel¬


mente uma nova paisagem. Isso implica a necessidade de descobrir a arquitetura que o
próprio sítio está pedindo.
O Edifício Time, situado à margem do rio Takase, em Kyoto, nasceu do envolvi¬
mento com a delicada corrente do rio que passa por perto. A praça do edifício em que
se pode molhar a mão na água, o deque que passa por cima do córrego como uma
ponte, o plano horizontal de aproximação que provém das margens do rio e não de
uma estrada - todos esses elementos servem para extrair o máximo de vida possível
do extraordinário cenário da construção. O conjunto habitacional de Rokko, em Kobe,
nasceu do cuidado com um sítio igualmente singular: neste caso, uma encosta de no
máximo 6o° de inclinação. A ideia do projeto foi a de fazer a construção afogar-se
ao longo da encosta, controlando a sua projeção acima do solo a fim de misturá-la à
densa floresta ao seu redor. Dessa maneira, a cada habitação é assegurada uma visão
magnífica do oceano a partir de um terraço proporcionado pelo teto da casa vizinha
abaixo. Todos os meus projetos, seja o Museu das Crianças, em Hyogo, seja o Museu da
Floresta de Túmulos, em Kumamoto, seja o edifício central da Raika, ou o complexo
comercial Festival, em Okinawa, são fruto de um esforço para criar uma paisagem, jo¬
gando integralmente com as características do lugar.
Eu componho arquitetura procurando encontrar uma lógica essencial inerente ao
lugar. A pesquisa arquitetônica supõe uma responsabilidade de descobrir e revelar as
características formais de um sítio, ao lado de suas tradições culturais, clima e aspectos
naturais e ambientais, a estrutura da cidade que lhe constitui o seu pano de fundo, e os
padrões de vida e costumes ancestrais que as pessoas levarão para o futuro. Sem senti-

497
mentalismos, minha ambição é transformar o lugar, pela arquitetura, em um plano abs¬
trato e universal. Somente dessa maneira, a arquitetura pode repudiar o universo da tec¬
nologia industrial e tornar-se uma “grande arte”, no verdadeiro sentido da expressão.

[“Toward New Horizons in Architecture” foi extraído de Tadao Ando. Nova York: Museum
of Modern Art, 19991, pp. 75-76. Cortesia do autor e da editora.]

RAIMUND ABRAHAM . NEGAÇÃO E RECONCILIAÇÃO


Os dois autores reunidos neste capítulo, entre outros como Vittorio Gregotti e
William McDonough (caps. 7, 8), abordam a questão das relações da arquitetura
o com a natureza. É interessante contrastar a visão fenomenológica de Raimund
1(0
o
Abraham com a de Tadao Ando, já que ambos desenvolvem uma metodologia de
2
© projeto que se baseia em uma avaliação da arquitetura moderna.
A.
(D
0 sítio tem grande importância tanto para Abraham como para Ando, mas
CL
cz as suas abordagens são opostas. Enquanto Ando procura levar a natureza a uma
união ou associação com a humanidade, confrontando-as de modo cuidadosamente estru¬
turado, Abraham fala de uma conquista e negação do sítio e de sua topografia. Fica evi¬
dente que Abraham opera com um esquema de pensamento ocidental e antropocêntrico,
que não põe em questão os direitos da espécie humana de manipular livremente 0 meio
ambiente. A atitude de Abraham apoia-se nos argumentos de Martin Heidegger sobre a ca¬
pacidade do sítio de "reunir e preservar [ou instalar]" a quaternidade formada pelo homem,
as divindades, 0 céu e a terra. Mas a agressiva "intervenção e colisão" do arquiteto parece
contradizer a noção heideggeriana de reserva (liberação de alguma coisa para que ela se
tome a sua própria essência). Christian Norberg-Schulz e outros interpretaram a noção de
reserva como uma recomendação para se cultivar e cuidar da terra. Abraham admite que
o processo projetual, em seu caso, é secundário, e só pode pretender "reconciliar as con¬
sequências" do seu ato destrutivo primeiro.
Outros aspectos da busca de Abraham pelo sentido da arquitetura são mais ins-
tigantes. Rejeitando a "especulação formal" como uma origem, ele prefere investigar
"0 evento arquitetônico primordial": a interação com o sítio. Essa origem está além da
história, da estética e do estilo, e envolve questões metafísicas. Como Juhani Pallas-
maa (cap. 9), Abraham identifica um valor na arquitetura, que, por meio da justaposição
entre o ideal e 0 material, é capaz de celebrar tanto a presença como a ausência
do homem, tanto 0 eterno como 0 temporal. Seus projetos a lápis ilustram obses¬
sivamente a força das associações evocadas por escavações grotescas na terra e
confinamentos espaciais. O corpo habita e dá forma a esses espaços bem como às
representações do arquiteto.
]
498
RAIMUND ABRAHAM

Negação
e reconciliação
O sensual e o espiritual que se enfrentam como opostos no senso
comum aparecem reconciliados na verdade expressa pela arte.
G. w. p HEGEL, On the Arts

Um lugar em que todas as coisas se congregam é concentrado, e o


sítio se reúne a si mesmo, de modo supremo e radical. Seu poder
de reunião congrega e conserva tudo o que havia agrupado, não
como uma concha encapsulada em si mesma, mas penetrando
com sua luz em tudo o que foi coligido, para só assim o libertar
em sua própria natureza.
MARTIN HEIDEGGER, “On the Way to Language”

Se imaginarmos o tempo como um processo que se transforma por meio de uma ne¬
gação constante, então a base do tempo é a autocrítica e seus produtos são a incessante
divisão e separação. A forma em que o tempo se manifesta é a reiterada interpretação
de uma verdade eterna ou um arquétipo.
A era moderna começou como uma crítica de todas as mitologias e, por conse¬
guinte, a arquitetura moderna é a primeira da história a se afirmar não apenas pela crí¬
tica dos antecedentes culturais, mas também pela crítica da arte per se. A arquitetura
moderna não nos proporcionou nem um novo tratado nem um novo estilo, mas, ao
contrário, produziu uma ruptura radical na continuidade histórica. Essa forma radi¬
cal de crítica indicou a possibilidade de um fim irreversível do estilo:

Tudo varia conforme o tempo e o lugar, e não podemos nos ater, em parte alguma, a
uma qualidade invariante como a que a ideia de estilo pressupõe, nem mesmo quando
separamos as coisas em função de suas circunstâncias. Mas, quando temos em vista a
duração e as circunstâncias, o que vemos são relações movediças, momentos passagei¬
ros e lugares mutáveis na existência histórica. Quaisquer continuidades ou dimensões
imaginárias, como o estilo, somem de vista quando as procuramos. O estilo é como o

499
arco-íris: somente podemos vê-lo brevemente, na pausa entre o sol e a chuva, e ele se
esvai quando chegamos ao lugar em que pensamos tê-lo avistado.
GEORGE KUBLER, The Shape of the Time

O fim do estilo tornou-se o sinónimo do repúdio à especulação formal como uma


possível força propulsora de um novo começo na arquitetura.
Na verdade, meu próprio trabalho pessoal originou-se do princípio da interven¬
ção e da decomposição como a quintessência do evento arquitetônico primordial, um
princípio totalmente antitético a qualquer forma de manipulação histórica ou estética.
A palavra Ort (site,“sítio”) significava originalmente em alemão a ponta afiada de uma
lança e sugere uma reunião ou junção.
É a conquista do próprio sítio, a transformação de sua natureza topográfica que
evidencia as raízes ontológicas da arquitetura. O processo projetual é apenas um ato
secundário e subsequente, cujo propósito é reconciliar e harmonizar as consequências
da negação, do conflito e da intervenção inicial.
Entendo o processo de criação arquitetônica como algo que oscila entre a negação
e a conciliação: é um embate contínuo entre o ideal e a matéria, a ideia e a imagem, o
intelectual e o fisiológico, o tecnológico e o espiritual. Mais precisamente, o espaço ar¬
quitetônico só pode ser definido como a colisão entre o espaço geométrico e o espaço
fisiológico, ou entre o ideal e a matéria, e, se o ideal representa a noção de infinitude ou
eternidade, a matéria pode ser concebida como a representação simbólica do corpo - a
sua presença e a sua ausência. Enquanto as faculdades conceituais do homem aspiram
ao infinito, o seu corpo é essencialmente frágil, temporal, um corpo que será devastado,
à semelhança da própria matéria, pela ação crítica e inexorável do tempo.

Toda civilização é uma metáfora do tempo, uma versão da mudança. A preeminência do


agora talvez pudesse reconciliar- nos com a realidade que a religião do progresso, com o
mesmo zelo das antigas religiões, tentou ocultar ou disfarçar: a realidade da morte.
OCTAVIO PAZ, “The New Anthology”

A arquitetura sempre foi e sempre será um monumento ao eterno, uma celebração à


ausência e à presença do homem. Se ainda resta alguma esperança de reinvenção do
icônico no mundo moderno, ela somente poderá originar-se de uma reinterpretação
da existência arquetípica do homem. Isto é, não há possibilidade de se estabelecerem
novos ícones a partir dos signos e objetos retirados ou transpostos de épocas históri¬
cas perdidas. Em arquitetura, ou bem os novos ícones nascerão do reconhecimento de
nossos limites ontológicos intrínsecos ou bem eles jamais virão a surgir.

[“Negation and Reconciliation” foi extraído de Perspecta: The Yale Architectural Journal,
n. 19, 1982, pp. 5-6. Cortesia do autor e da editora.]

500
CAPÍTULO 11
1

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KENNETH FRAMPTON . PERSPECTIVAS PARA UM REGIONALISMO CRÍTICO
Este ensaio foi publicado em Perspecta: The Architectural Journal, em 1983, e
desenvolve um dos temas da agenda apresentada por Frampton no ensaio "The
o Isms of Contemporary Architecture".1
'8. Desde a sua publicação, o "regionalismo crítico" tem tido enorme influência
5c
entre os arquitetos. A expressão, que Frampton tomou emprestada dos teóricos
</>
0 Alexander Tzonis e Liane Lefaivre (ver neste capítulo), de certo modo já indica a
a
n abordagem por ele proposta, pois o ensaio de Frampton sintetiza alguns aspectos da
"teoria crítica" frankfurtiana com um interesse fenomenológico na especificidade do lugar. O
texto realça ainda importantes questões fenomenológicas, políticas e culturais relacionadas
com o problema das fronteiras.
Neste, como em outros trabalhos de Frampton, há uma constante referência à pro¬
blemática marxista da manipulação do consumidor ("admass seduction") e ao problema
da arquitetura concebida e percebida como uma moda efémera ("formas individualistas
de narcisismo") ou como cenografia. Essa mercantilização do abrigo nega a expressão e a
identidade locais. A crítica de Frampton propõe como alternativa uma arquitetura autêntica
baseada em dois aspectos essenciais da disciplina: a consciência do lugar e a tectônica. A
intenção é reconstituir as bases da arquitetura sem prescrever uma estratégia exclusiva.
Assim, uma obra exemplar de arquitetura "evoca a essência onírica do lugar com a inesca-
pável materialidade da construção".
A noção de "construir o lugar", atribuída a Vittorio Gregotti (cap. 7) e evidenciada na obra
de Louis Kahn e Alvar Aalto, é essencial ao regionalismo crítico. A ênfase e o comprometi¬
mento com a topografia (o modelo do lugar construído) contrastam drasticamente com o ideal
próprio ao Estilo Internacional de um terreno plano e desobstruído. Raimund Abraham, Tadao
Ando (cap. 10) e Mario Botta ilustram uma primeira estratégia pós-moderna da paisagem.
Igualmente importantes na abordagem do regionalismo crítico são o aproveitamento
das habilidades artesanais e materiais locais, além de uma receptividade à luz e ao clima
da região. Essas características ajudam a criar uma arquitetura mais espacial e experimen¬
tal do que orientada para a imagem. Manifestações mais recentes do regionalismo crítico
destacam as questões climáticas e insistem em afirmar que uma arquitetura baseada nas
práticas construtivas regionais é mais correta do ponto de vista ecológico, além de dife¬
renciada do ponto de vista estético. Frampton critica, por exemplo, a ubiquidade do ar-con-
dicionado, responsável pela exportação de uma arquitetura universal para todo o planeta.
De modo geral, o regionalismo crítico incentiva a resistência à homogeneização do am¬
biente construído, que é um dos resultados da modernização das técnicas construtivas e da
industrialização dos materiais. No entanto, Frampton não defende a adoção de elementos
estilísticos vernaculares nem se opõe à arquitetura moderna. Seu objetivo é estabelecer "uma
visão teórica alternativa que sirva para dar continuidade ao exercício crítico da arquitetura [...]
capaz de agregar o legado libertador e poético do movimento moderno do pré-guerra".2

503
Frampton busca uma arquitetura que seja "capaz de condensar o potencial artístico
da região e, ao mesmo tempo, de reinterpretar as influências culturais vindas de fora". A
crítica da modernização universal que ele propõe deve brotar dos "enclaves" locais ou
dos bolsões de resistência. Os arquitetos podem respaldar essa expressão de identidade
política facilitando a compreensão do lugar.
A versão da teoria de Frampton publicada em Perspecta cita um número maior de ar¬
quitetos e projetos e é mais centrada nas questões da cidade e da democracia que outros
artigos posteriormente publicados sobre o mesmo assunto. Um outro aspecto que distin¬
gue o seu ensaio é o exame das "formas analógicas", uma ideia que provavelmente deriva
de Aldo Rossi (cap. 7). Além disso, nesta versão, o ensaio trabalha a distinção estabelecida
por Paul Ricoeur entre cultura (um fenômeno local e particular) e civilização universal domi¬
nante, como uma oposição entre natureza e tecnologia. 0 regionalismo crítico busca fazer
uma síntese arquitetônica de ambos os conceitos.

]
1. Kenneth Frampton, "The Isms of Contemporary Architecture", in Modern Architecture and the
Critical Present, Architectural Design Profiles, 1982, pp. 61-82.
2. Kenneth Frampton, "Place-Form and Cultural Identity", in John Thackara (org.). Design After Moder¬
nism: Beyond the Object. Nova York: Thames and Hudson, 1 988.

KENNETH FRAMPTON

Perspectivas para
um regionalismo crítico
[...] O fenômeno da universalização, apesar de ser um avanço para a humanidade, ins¬
titui uma espécie de sutil destruição não só das culturas tradicionais - o que não che¬
ga a ser um mal irreparável -, mas também do que denominarei provisoriamente de
núcleos criadores das grandes civilizações e das grandes culturas, esse núcleo a partir
do qual interpretamos a vida, e que chamarei de antemão de núcleo ético e mítico da
humanidade. O conflito nasce daí. Temos a impressão de que essa única civilização
mundial exerce simultaneamente uma espécie de ação de atrito ou de erosão a expen-
sas dos recursos culturais que constituíram as grandes civilizações do passado. Essa
ameaça se expressa, entre outros efeitos perturbadores, pela notória difusão de uma

504
civilização medíocre, que é a derrisória contrapartida do que acima chamei de cultura
elementar. No mundo inteiro, em todos os lugares, encontramos os mesmos filmes
de péssima qualidade, as mesmas máquinas caça-níqueis, as mesmas atrocidades de
plástico ou alumínio, a mesma distorção do idioma pela propaganda etc. Tudo se pas¬
sa como se a humanidade, ao ascender en masse a uma cultura de consumo básica,
também estagnasse, em massa, no nível de uma subcultura. É este o problema crucial
com que defrontam os países que emergem do subdesenvolvimento. Para enveredar
pelo caminho da modernização, será necessário jogar fora a cultura do passado que foi
a raison d’être de uma nação? [...] Daí se origina o paradoxo: de um lado, a nação tem
de fincar raízes no seu passado, forjar para si mesma um espírito nacional e desfraldar
essa reivindicação cultural e espiritual perante a entidade colonialista. Mas, para po¬
der tomar parte da civilização moderna, é necessário participar simultaneamente da
racionalidade científica, técnica e política, o que muitas vezes exige o abandono puro
e simples de todo um passado cultural. O fato é que nem toda cultura pode suportar
e absorver o choque da civilização moderna. E o paradoxo é: como modernizar-se e
retornar às fontes? Como despertar uma velha civilização adormecida e se integrar na
civilização universal [...]
Ninguém pode prever o que acontecerá com nossa civilização quando ela de fato se
encontrar com civilizações diferentes por outros meios que não o choque da conquista
e da dominação. Mas temos de admitir que esse encontro ainda não se deu no plano
de um diálogo autêntico. É por isso que estamos hoje em uma espécie de calmaria ou
interregno, em que já não praticamos o dogmatismo de uma verdade única e ainda não
somos capazes de vencer o ceticismo em que nos envolvemos. Estamos dentro de um
túnel, no crepúsculo do dogmatismo e no alvorecer de diálogos verdadeiros.1

O termo regionalismo crítico não pretende denotar o vernacular como algo produzido
espontaneamente pela ação conjunta do clima, da cultura, do mito e do artesanato,
mas, ao contrário, identificar as “escolas” regionais recentes cujo objetivo é represen¬
tar e atender, em um sentido crítico, as populações específicas em que se inserem. Um
tal regionalismo depende, por definição, de uma associação entre a consciência polí¬
tica de uma sociedade e a profissão de arquiteto. As precondições para o surgimento
de uma expressão crítica regional incluem não apenas certa prosperidade local, mas
também um forte desejo de realizar efetivamente uma identidade. Uma das principais
forças motivadoras de uma cultura regionalista é um sentimento anticentrista, isto é,
uma aspiração por algum tipo de independência cultural, económica e política.
O filósofo Paul Ricoeur desenvolveu a tese de que uma “cultura mundial” híbrida
somente se tornará uma realidade por meio da fertilização recíproca entre uma cultura
de raízes locais, por um lado, e uma civilização universal, por outro. Essa proposição
tão paradoxal de que uma cultura regional deve ser também uma forma de cultura

505
mundial parte da noção de que o desenvolvimento em si transformará necessaria¬
mente a base da cultura local. Em seu ensaio de 1961, “Civilização universal e cultu¬
ras nacionais”, Ricoeur afirmou que, em última análise, tudo depende da capacidade
da cultura regional de recriar uma tradição de raízes locais e de, ao mesmo tempo,
apropriar-se das influências estrangeiras seja no plano da cultura seja no da civilização.
Esse processo de fertilização recíproca e reinterpretação é, por definição, impuro. Isso
fica bem evidente, por exemplo, na obra do arquiteto português Álvaro Siza Vieira. Na
arquitetura de Siza, o método da colagem usado por Alvar Aalto para a forma constru¬
tiva é mediada por tipologias normativas inspiradas nos trabalhos dos neorracionalis-
tas italianos.
É necessário distinguir, para começar, o regionalismo crítico da evocação sim¬
plista de um vernacular sentimental ou irónico. Refiro-me, naturalmente, àquela nos¬
talgia do vernacular que vem sendo atualmente entendida como um retorno tardio ao
ethos da cultura popular; se não fizermos essa distinção, acabaremos por confundir a
capacidade de resistência própria ao regionalismo com as tendências demagógicas do
populismo. De fato, ao contrário do regionalismo, o objetivo central do populismo é
funcionar como um signo comunicativo ou instrumental.1 Esse signo não busca evocar
uma percepção crítica da realidade, mas a sublimação do desejo de uma experiência
imediata pela prestação de informações. Seu objetivo tático é alcançar da forma mais
económica possível um nível idealizado de gratificação em termos comportamentais.
Por isso, as grandes afinidades do populismo com as técnicas retóricas e as imagens
publicitárias não são meras coincidências.
O regionalismo crítico, por outro lado, é uma expressão dialética. Busca inten¬
cionalmente desconstruir 0 modernismo universal a partir de imagens e valores lo¬
calmente cultivados e, ao mesmo tempo, deturpar esses elementos autóctones com
o uso de paradigmas originários de fontes alienígenas. Seguindo a abordagem cultu¬
ral disjuntiva praticada por Adolf Loos, o regionalismo crítico reconhece que não há
outra tradição viva disponível ao homem moderno senão os procedimentos sutis da
contradição sintética. Qualquer tentativa de burlar a dialética desse processo criativo
por meio dos métodos ecléticos do historicismo resultará inevitavelmente numa ico¬
nografia consumista disfarçada de cultura.
Meu argumento é que o regionalismo crítico continua a desenvolver-se esporadi¬
camente nas frestas culturais que articulam das maneiras mais inesperadas a Europa e
as Américas. Essas manifestações fronteiriças podem ser descritas como “interstícios
de liberdade”,3 para usar uma expressão de Abraham Moles. A existência de expressões
culturais desse tipo comprova que o modelo do centro hegemónico cercado por satéli¬
tes dependentes é uma descrição inadequada e demagógica de nosso potencial cultural.
Típico de um regionalismo explicitamente anticentrista foi o renascimento do
nacionalismo catalão, que surgiu com a fundação do Grupo R no começo da década

506
de 1950. Esse grupo, liderado por J. M. Sostres e Oriol Bohigas, nasceu em meio a uma
complexa situação cultural. Por um lado, tinha de ressuscitar os valores e procedimen¬
tos racionalistas e antifascistas do GATEPAC (a ala espanhola do CIAM antes da Segunda
Guerra Mundial); por outro lado, continuava consciente da responsabilidade política
de evocar um regionalismo realista, um regionalismo acessível à população em geral.
Esse projeto de mão dupla foi anunciado publicamente pela primeira vez por Bohi¬
gas em seu ensaio “Possibilidades para uma arquitetura barcelonesa”,4 publicado em
1951. As várias forças que contribuíram para a forma heterogénea do regionalismo ca¬
talão exemplificam, em retrospecto, a natureza essencialmente híbrida de uma genuína
cultura moderna. Primeiro, havia a tradição catalã das construções em alvenaria, que
data, obviamente, do período heroico do modernismo; segundo, havia a influência do
neoplasticismo, diretamente inspirado no livro de Bruno Zevi, La Poética delia Archi-
tettura Neoplastica, de 1953, e, por último, o estilo revisionista do neorrealismo italiano,
exemplificado sobretudo nas obras de Ignazio Gardella.5
A carreira do arquiteto barcelonês J. A. Coderch seguiu um curso tipicamente re-
gionalista, haja vista a sua hesitação, até recentemente, entre uma alvenaria vernacular
moderna mediterraneizada - evocando Veneza -, visível, por exemplo, em seu edifício
de apartamentos de oito andares, de tijolos, construído no Paseo Nacional, em Barce¬
lona, em 1952-54 (um volume definido pelos panos contínuos de venezianas ao longo
de toda a superfície exterior do edifício e pela cornija tabular em balanço) e a com¬
posição vanguardista neoplástica de sua Casa Catasús, concluída em 1957, em Sitges.
O projeto de Martorell, Bohigas e Mackay oscila entre os mesmos polos: de um lado, a
adoção de uma construção vernacular em alvenaria, parecida com os trabalhos de Co¬
derch e Gardella, e, de outro, o estilo público neobrutalista, cujo melhor exemplo, aliás,
é o racionalismo técnico da Escola Thau, de sua autoria, construída nos subúrbios de
Barcelona em 1975.
A manifestação mais radical da decadência recente do regionalismo catalão pode
ser vista no trabalho de Ricardo Bofill e do Taller de Arquitectura. Se os primeiros
projetos de Bofill (como o edifício de apartamentos da Calle Nicaragua de 1964) mos¬
travam evidente afinidade com a reinterpretação de Coderch da construção vernacu¬
lar de tijolos, o Taller adotaria uma retórica mais exagerada nos anos 1970. A partir
do conjunto de Xanadu, construído em Calpe (1967), os arquitetos ingressariam em
um romantismo flamboyant. Essa sintaxe de castelos atingiu sua apoteose no gran¬
dioso, mas também ostensivo conjunto residencial de Walden 7, em Saint-Just Des-
vern (1957), inteiramente revestido de ladrilhos. Com seus vazios de doze andares de
altura, suas salas pouco iluminadas, sacadas minúsculas, e o revestimento cerâmico
que agora está se desprendendo, o edifício Walden 7 sugere aquela tênue fronteira
em que um forte impulso inicial começa a degenerar em um populismo ineficaz - um
populismo cujo objetivo final não é proporcionar um ambiente significativo e habi-

507
tável, mas criar uma forma cenográfica fotogênica. Em última análise, apesar de sua
vaga homenagem a Gaudí, Walden 7 consagra uma forma de apelo às massas. É a
arquitetura do narcisismo par excellence, pois a retórica formal visa, sobretudo, à alta
moda e ao marketing da personalidade extravagante de Bofill. A utopia hedonista me¬
diterrânea que o arquiteto pretende realizar desmorona a um escrutínio mais rigoroso,
sobretudo no nível dos tetos-terraços, um ambiente potencialmente sensual que não
se realiza em uma forma real de ocupação.
Nada poderia estar mais distante das intenções de Bofill do que a arquitetura do
mestre português Álvaro Siza Vieira, cuja carreira, começando por sua piscina da
Quinta de Conceição, concluída em 1965, pode ser tudo menos fotogênica. Percebe-se
isso claramente não só na natureza evasiva e fragmentária das imagens publicadas de
seus trabalhos quanto num texto escrito em 1979:

A maior parte dos meus trabalhos nunca foi publicada; algumas coisas que eu fiz somen¬
te foram desenvolvidas em parte, outras sofreram profundas modificações ou foram
destruídas. Era de se esperar. Uma proposta arquitetônica cujo objetivo é ir fundo [...]
uma proposta que tem a intenção de ser mais do que uma materialização passiva, que se
recusa a reduzir essa mesma realidade, que analisa cada um de seus aspectos meticulo¬
samente, uma proposta dessa ordem não pode encontrar respaldo em uma imagem fixa,
não pode seguir uma evolução linear [...] Cada projeto deve captar com o máximo rigor
um momento preciso da imagem passageira, em todas as suas nuanças, e, quanto mais
exatamente se reconhece essa qualidade passageira da realidade, mais claro será o seu
desenho [...] Esta talvez seja a razão pela qual somente obras marginais (uma habitação
tranquila, uma casa de fim de semana em um lugar distante) conservaram-se da ma¬
neira como foram originalmente projetadas. Mas algo se mantém. Guarda-se uma peça
aqui, outra ali, dentro de nós, talvez perfilhada por alguém, deixando marcas no espaço
e nas pessoas, fundindo-se em um processo de transformação total.6

Talvez pudéssemos dizer que essa hipersensibilidade para a natureza fluida e ainda
assim específica da realidade é o que faz com que a obra de Siza seja bem mais estru¬
turada e enraizada que as tendências ecléticas da Escola de Barcelona; isso porque,
ao tomar a arquitetura de Aalto como ponto de partida, Siza parece ter conseguido
alicerçar seus edifícios na conformação de uma determinada topografia e na refinada
especificidade do contexto local. Nesse sentido, seus projetos são respostas rigorosas
ao tecido urbano e à paisagem litorânea da região do Porto. Igualmente importante
é a extraordinária sensibilidade de Siza aos materiais locais, ao trabalho artesanal e,
sobretudo, à sutil luminosidade da região - a sensibilidade a um tipo de filtragem e
penetração da luz. Tal como a Universidade Jyvâskylã (1957) ou o Sãynãtsalo City Hall
(1949)> de Aalto, todos os edifícios projetados por Siza são delicadamente assentados

508
e escalonados sobre o terreno. Da sua Casa Bires, construída em Póvoa de Varzim, em
1976, às Vivendas Sociais SAAL, em Bouça, de 1977, sua abordagem é visivelmente mais
tátil e material do que visual e gráfica. Até nos pequenos prédios bancários, dos quais
o melhor talvez seja a agência do banco Pinto & Sotto Mayor, em Oliveira de Azeméis,
de 1974, seus projetos são concebidos e estruturados topograficamente.
No trabalho teórico do arquiteto austríaco residente em Nova York, Raimund
Abraham, também se podem descobrir conotações regionalistas latentes, já que ele
sempre se destacou por enfatizar a criação do lugar e os aspectos topográficos do am¬
biente construído. Sua Casa de Três Paredes (1972) e a Casa com Paredes de Flores
(1973) são obras ontológicas típicas do começo da década de 1970 ao evocarem a es¬
sência onírica do local e a inescapável materialidade da construção. Abraham con¬
servou sua sensibilidade para a natureza tectônica da forma construída e a capaci¬
dade desta de transformar a superfície do terreno nos projetos que ele preparou para
a International Bauausstellung em Berlim, a IBA, principalmente nos últimos projetos
para South Friedrichstadt, concebidos em 1981.
Uma atitude igualmente tátil, embora mais especificamente regionalista, pode
ser observada nos trabalhos do veterano arquiteto mexicano Luis Barragán, cujos
melhores projetos de residências (muitas delas construídas no subúrbio de Pedregal)
são extremamente topográficos. Paisagista, tanto quanto arquiteto, Barragán sempre
procurou fazer uma arquitetura sensual e mundana, uma arquitetura feita de espaços
fechados, marcos, fontes, cursos d’água, cores saturadas; uma arquitetura assentada na
rocha vulcânica e na vegetação exuberante; uma arquitetura que remete apenas indire¬
tamente à estância colonial mexicana. Para se ter uma ideia da sensibilidade de Barra¬
gán com relação às suas raízes míticas, é suficiente citar um trecho de suas memórias
sobre o pueblo apócrifo de sua juventude:

As lembranças mais remotas de minha infância são da fazenda de minha família perto
do vilarejo de Mazamitla. Era um pueblo cercado de colinas, constituído de casas co¬
bertas com telhas cerâmicas e imensas cavernas que serviam de abrigo contra as fortes
chuvas que caem naquela região. Até a cor da terra era interessante, porque era verme¬
lha. Nesse vilarejo, o sistema de distribuição de água consistia em grandes troncos de
árvore cortados e cavados na forma de calhas, apoiados numa estrutura de forquilhas,
de cinco metros de altura, e preso em cima dos telhados. Esse aqueduto atravessava
toda a cidade e chegava aos pátios das casas, onde havia grandes fontes de pedra para
receber a água. Nos pátios ficavam os estábulos, com vacas e galinhas, tudo junto. Do
lado de fora, na rua, ficavam as argolas de ferro para prender os cavalos. É claro que
pingava água das canaletas feitas de troncos, cobertas de musgo, pela cidade inteira, o
que emprestava ao vilarejo uma atmosfera de conto de fadas. Não, não existem foto¬
grafias do lugar. Está tudo na minha memória.7

509
Essas recordações foram certamente filtradas pelo envolvimento de Barragán com a
arquitetura islâmica ao longo de toda a sua vida. Sentimentos e preocupações seme¬
lhantes aparecem em sua oposição à invasão de privacidade no mundo moderno e na
crítica à lenta erosão da natureza que acompanha a civilização do pós-guerra.

A vida cotidiana está se tornando demasiadamente pública. Rádio, televisão, telefone,


tudo invade a privacidade. Por isso, os jardins devem ser murados e não ficar expostos
ao olhar das pessoas [...] Os arquitetos estão se esquecendo da necessidade da meia-luz
para os seres humanos, a espécie de luz que infunde tranquilidade nas salas de estar
e nos quartos de dormir. Metade do vidro que é usado em tantas construções - nas
residências e nos escritórios - deveria ser eliminada para proporcionar a qualidade de
luz que nos permite viver e trabalhar de modo mais concentrado. [...] Antes da era da
máquina, inclusive nas áreas urbanas, a natureza era a fiel companheira das pessoas [...]
Hoje, a situação se inverteu. O homem não se encontra com a natureza, mesmo quando
sai da cidade para entrar em comunhão com ela. Fechado dentro de seu carro reluzente,
trazendo na alma a marca do mundo do qual saiu o automóvel, o homem é um corpo
estranho no meio da natureza. Um outdoor basta para sufocar a voz da natureza. A na¬
tureza se torna um fragmento da natureza, e o homem, um fragmento do homem.8

Na época da construção de sua primeira casa e de seu primeiro escritório em Tacubaya,


na Cidade do México, em 1947, Barragán já tinha tomado certa distância da sintaxe
universal do chamado Estilo Internacional. E, no entanto, sua obra sempre esteve com¬
prometida com a forma abstrata tão característica da arte de nosso tempo. Sua incli¬
nação para os grandes planos quase abstratos e inescrutáveis da paisagem talvez tenha
atingido o auge no projeto do jardim de Las Arboladas, de 1961, e no monumento ro¬
doviário, Satellite City Towers, concebido em parceria com Mathias Goertiz, em 1967.
O regionalismo também se manifestou em outras regiões do continente americano.
No Brasil, na década de 1940, nos primeiros trabalhos de Oscar Niemeyer e Affonso
Reidy; na Argentina, na obra de Amancio Williams - principalmente na sua Casa da
Ponte em Mar del Plata, de 1945, e, mais recentemente, talvez, no Bank of London and
South America, de Clorindo Testa, construído em Buenos Aires, em 1959; na Venezuela,
na Cidade Universitária, construída segundo 0 projeto de Carlos Raoul Villanueva, en¬
tre 1945 e i960; na costa oeste dos Estados Unidos, primeiro em Los Angeles, no final
da década de 1920, na obra de [Richard] Neutra, [Rudolph] Schindler, [Ken] Weber e
[Irving] Gill e, mais tarde, nas escolas da Bay Area e Southern Califórnia, fundadas por
William Wurster e Hamilton Harwell Harris, respectivamente. Ninguém falou com mais
clareza sobre a ideia de um regionalismo crítico do que Harwell Harris em sua palestra
sobre “Regionalismo e Nacionalismo”, proferida no Conselho Regional da AIA para o
Noroeste dos Estados Unidos, em Eugene, Oregon, em 1954:

510
Contrapondo-se ao regionalismo de restrição há um outro tipo de regionalismo: o
regionalismo da libertação, expressão de uma região que está especialmente sintoni¬
zada com o novo pensamento da época. Denominamos essa manifestação de “regional”
somente porque ainda não surgiu em nenhum outro lugar. Faz parte do espírito dessa
região ser mais consciente do que o habitual e mais livre do que o comum. O valor
dessa região está no fato de que as suas manifestações têm significação para o mundo
exterior. Para dar expressão arquitetônica a esse regionalismo é necessário que haja
construções - de preferência muitas construções - em uma mesma época. Somente
assim, a expressão pode ser suficientemente geral, variada e poderosa para ser capaz
de capturar a imaginação das pessoas e proporcionar um clima amistoso durante um
tempo suficientemente longo para que uma nova escola de arquitetura se desenvolva.
São Francisco foi feita para Maybeck. Pasadena foi feita para Greene & Greene. Ne¬
nhum deles poderia ter feito o que fez em qualquer outro lugar ou época. Cada um usou
os materiais próprios do lugar, mas não são os materiais que distinguem a obra [...].
Uma região pode cultivar ideias. Uma região pode aceitar ideias. Imaginação e
inteligência são necessárias a ambas. Na Califórnia, nos últimos anos das décadas de
1920 e 1930, as ideias europeias modernas encontraram um regionalismo ainda pouco
desenvolvido. Na Nova Inglaterra, por outro lado, o modernismo europeu deparou
com um regionalismo mais rígido e restritivo que, de saída, lhe ofereceu resistência e
depois se rendeu. A Nova Inglaterra aceitou todo o modernismo europeu porque seu
próprio regionalismo se reduzira a uma coleção de restrições.9

Em que pese a sua evidente liberdade de expressão, um regionalismo a tal ponto libe-
rador é difícil de sustentar hoje na América do Norte. Na atual proliferação de formas
de narcisismo altamente individualistas - um corpo de obras que, ao fim e ao cabo, é
mais cínico, complacente e comodista do que enraizado somente dois escritórios
de arquitetura demonstram atualmente uma correta receptividade à evolução de uma
cultura regional que seja ao mesmo tempo específica e crítica.
O primeiro exemplo inclui as casas simples e sensíveis ao local projetadas por Andrew
Batey e Mark Mack para a região do Napa Valley, na Califórnia; o segundo está na obra do
arquiteto Harry Wolf, cujos projetos, até o momento restritos à Carolina do Norte, foram
feitos para Charlotte. A sensibilidade de Wolf à especificidade do lugar aparece mais ni¬
tidamente talvez em seu projeto para o concurso para a Fort Lauderdale Riverfront Plaza.
A descrição desse projeto mostra tanto uma aguda percepção da especificidade do lugar
como uma profunda reflexão sobre a posição histórica de Fort Lauderdale:

A adoração do sol e a medição do tempo pela luz solar remontam à história mais re¬
mota da humanidade. É interessante notar, no caso de Fort Lauderdale, que, seguindo-
se um círculo latitudinal de 26 ao redor do globo terrestre, poderíamos ligar o Fort

511
Lauderdale à antiga Tebas - ao trono de Ra, o rei-sol egípcio. Um pouco mais a Leste,
encontraríamos Jaipur, na índia, onde, no anos antes da fundação de Fort Lauderdale,
foi construído o maior relógio equinocial de sol do mundo.
Conhecedores desses grandiosos antecedentes históricos, procuramos descobrir
um símbolo que reunisse o passado, o presente e o futuro de Fort Lauderdale [...] Para
capturar o sol como símbolo, instalamos um grande relógio de sol no terreno da praça,
com seu gnômon dividindo o lugar pelo eixo norte-sul. O gnômon da dupla haste se
levanta desde o sul, a um ângulo de 26o 5’ paralelo à latitude de Fort Lauderdale [...].
Todas as datas significativas da história de Fort Lauderdale estão registradas na
haste maior do grande disco do relógio de sol. Alinhamos com exatidão os ângulos do
sol, mediante cálculos precisos, de modo a fazer com que os raios do sol atravessem as
duas hastes e lancem círculos brilhantes de luz que se depositam na lateral do relógio
que, do contrário, ficaria à sombra. Essas faixas de luz iluminam um marcador histó¬
rico que serve para lembrar os anos significativos.
No lado leste da praça, há um grande mapa da cidade gravado no chão, que
mostra o encontro do New River com a enseada. A borda leste da construção é esca¬
vada na forma do rio e deixa a luz passar por baixo da praça e entrar nos escritórios
ao longo de seu percurso.
O rio continua a correr até alcançar 0 semicírculo da área onde seu curso cria
um muro de água nivelado no plano da praça, formando uma cascata de quase cinco
metros que cai no lago embaixo. O mapa segue o curso ascendente do rio até que ele
chega ao gnômon do relógio solar, onde a junção da haste e do rio coincide exatamen¬
te, na escala do mapa, com o lugar onde está a haste.10

Na Europa, a obra do arquiteto italiano Gino Valle também pode ser classificada
como crítica e regionalista, considerando que toda a sua carreira se concentrou na
cidade de Udine, na Itália. Ali, Valle daria início a uma das primeiras reinterpretações
no pós-guerra do vernacular lombardo italiano, com seu projeto para a Casa Quaglia,
construída em Sutrio, em 1956. Durante toda a década de 1950, Valle dedicou-se ao
desenvolvimento de um plano industrial para a região da Lombardia que culminou
no projeto da fábrica Zanussi Rex, construída em Pordenone, em 1961. Paralelamente,
Valle desenvolveria a sua habilidade para com uma expressão regional mais rica de
modulações e texturas nas termas que construiria em Arta, em 1964, e no projeto para
o Teatro Cívico de Udine, concluído um ano antes. Como vimos, o regionalismo mui¬
tas vezes não resulta de um esforço coletivo, mas do trabalho de um profissional talen¬
toso que se empenha para produzir algum tipo de expressão com raízes locais.
Fora do Oeste dos Estados Unidos, o regionalismo surgiu pela primeira vez no pós-
guerra nas cidades-estado remanescentes do continente europeu. Há um grande número
de arquitetos regionais originários dessas áreas intermediárias durante os dez primeiros

512
anos após a guerra. Na geração do pré-guerra que se manteve fiel a essa inflexão regional,
podemos incluir os arquitetos Ernst Gisel, de Zurique, Jorn Utzon, de Copenhague, Vitto¬
rio Gregotti, de Milão, Gino Valle, de Udine, Peter Celsing, de Estocolmo, Mathias Ungers,
de Colónia, Sverre Fehn, de Oslo, Aris Konstantinidis, de Atenas, Ludwig Leo, de Berlim, e
o velho Cario Scarpa, de Veneza. Louis Kahn também pode ser considerado um arquiteto
de orientação regionalista, na medida em que se manteve ligado à Filadélfia, como mito
e como realidade, durante toda a sua vida. Uma demonstração de sua preocupação com
a conservação das qualidades urbanas do centro de Filadélfia é o fato de ele ter revelado
essa área em seu aspecto de cidadela: como um setor fechado, como Carcassone, por uma
rodovia em vez de um bastião, e guarnecido em todo o seu perímetro por blocos cilíndri¬
cos de estacionamentos, em vez de torres de castelos.
A Suíça, com suas intricadas fronteiras culturais e linguísticas e sua tradição de cos¬
mopolitismo, sempre revelou fortes tendências regionalistas, não raro com acentuados
tons críticos. A sutil combinação de inclusão e exclusão nos cantões suíços sempre fa¬
voreceu o culto a formas extremamente densas de expressão em áreas muito limitadas,
mas, apesar disso, embora o sistema de cantões preserve a cultura local, a Confedera¬
ção Helvética facilita a penetração e assimilação de ideias estrangeiras. O projeto de
Dolf Schnebli de i960 para uma casa de campo abobadada, à maneira corbusieriana,
em Campione d’Itália, na fronteira suíço-italiana, pode ser considerado como tendo
inaugurado a resistência da cultura regional suíça à norma internacional miesiana. Essa
resistência logo encontrou eco em outras regiões do país, na Casa Rotalini, também
corbusieriana, de Aurélio Galfetti, em Bellinzona, e na versão do Atelier 5 do estilo béton
brut de Le Corbusier, conforme se vê nos projetos para casas particulares em Motier
e Flamatt, e na Siedlung Halen, construída nos arredores de Berna em i960. O regio-
nalismo ticinense atual tem origem não só na obra pioneira de Schnebli, Galfetti e no
Atelier 5, mas também nos projetos neowrightianos de Tita Carloni.
A força da cultura de província certamente reside em sua capacidade de condensar o
potencial artístico da região e de, ao mesmo tempo, reinterpretar as influências culturais
vindas de fora. A obra de Mario Botta é emblemática a esse respeito, por se concentrar
em questões diretamente relacionadas com um lugar específico e adaptar os vários méto¬
dos racionalistas provenientes do exterior. Aluno de Carloni e depois orientado por Cario
Scarpa em Veneza, Botta teve a sorte de trabalhar, ainda que por um breve período, com
Louis Kahn e Le Corbusier, no curto período em que ambos estavam projetando monu¬
mentos para a cidade. Obviamente influenciado pelos dois arquitetos, Botta desde então
se apropriou da metodologia dos neorracionalistas italianos ao mesmo tempo em que
conservou, durante o aprendizado com Scarpa, uma extraordinária aptidão para o enri¬
quecimento artesanal da forma e do espaço. Talvez o exemplo mais perfeito desta última
tendência seja a aplicação do intonacare lúcido (emboço polido) ao redor da lareira de uma
casa de fazenda que ele reformou em Ligriano em 1979.

513
Duas outras características importantes do trabalho de Botta parecem testemu¬
nhar o seu regionalismo: de um lado, a constante preocupação com o que ele chama
de construir o sítio e, de outro lado, a profunda convicção de que hoje só é possí¬
vel compensar a perda da cidade histórica de modo fragmentário. Sua obra de maior
porte até agora, a escola em Morbio Inferiore, se apresenta como um território mi-
crourbano, uma compensação cultural para a evidente perda da qualidade urbana de
Chiasso, a cidade mais próxima. Referências fundamentais à cultura da paisagem de
Ticino são também por vezes evocadas por Botta como tipos. A casa de Riva San Vi¬
tale é um exemplo disso, por sua referência indireta à casa de veraneio tradicional, ou
roccoli, que já foi muito comum na região.
Além dessa referência específica, as casas de Botta geralmente se apresentam
como marcos na paisagem, seja como pontos de referência, seja como limites. A casa
em Ligornetto, por exemplo, estabelece o limite onde termina o vilarejo e começa o
mundo agrário. O sentido visual do projeto provém da entrada da casa, na forma de
uma mira de espingarda que se desvia do campo e converge para o povoado. As casas
de Botta sempre têm esse tratamento, apresentam-se como um misto de bunker e de
belvedere, onde a fenestração se abre para vistas previamente selecionadas da paisa¬
gem e, por isso mesmo, filtram, com estoica dramaticidade, o desenvolvimento pre¬
datório dos subúrbios na região de Ticino ao longo dos últimos vinte anos. Ademais,
suas casas nunca são dispostas em conformidade com a silhueta de determinado ter¬
reno, mas, ao contrário/constroem o sítio”,11 afirmando-se como formas originais
em contraste com a topografia e o céu. A surpreendente capacidade desses projetos
de se harmonizarem com a natureza da região, ainda em boa parte agrícola, decorre
diretamente de sua forma analógica e do acabamento que os caracterizam, a saber,
da estrutura de bloco de concreto, de aspecto despojado, e das formas côncavas, se¬
melhantes à de silos ou celeiros, que aludem às estruturas agrícolas tradicionais das
quais deriva esse formato.
Apesar dessa demonstração de uma sensibilidade moderna e convincente para com
o familiar, o aspecto mais crítico dos trabalhos de Botta não se encontra em suas ca¬
sas, mas em seus projetos para espaços públicos, especialmente nas duas propostas de
construção de grande porte que ele elaborou em parceria com Luigi Snozzi. Ambos são
construções em forma de “viadutos” e, como tal, revelam certa influência do projeto de
1968, de Louis Kahn, para o Palácio dos Congressos de Veneza, bem como dos primei¬
ros esboços de Aldo Rossi para Gallaratese, de 1970. A primeira proposta, para o Centro
Administrativo de Perugia, de 1971, foi idealizada como “uma cidade dentro da cidade”,
e suas implicações mais gerais se devem à possibilidade de sua aplicação em distintas si¬
tuações megalopolitanas em todo 0 mundo. Tivesse sido construído, esse centro regio¬
nal, projetado como uma ampla galeria, poderia ter afirmado sua presença na área ur¬
bana sem comprometer a cidade histórica ou fundir-se com o desenvolvimento caótico

514
dos subúrbios adjacentes. Clareza e adequação comparáveis foram obtidas na proposta
de 1978, apresentada pelos dois arquitetos para a Estação Ferroviária de Zurique. As
vantagens da estratégia urbana adotada nesse projeto são tão admiráveis que merecem
uma breve enumeração. A estrutura de ponte com vários níveis proporcionaria não só
quatro planos horizontais separados para a acomodação de lojas, escritórios, restauran¬
tes etc., mas também poderia constituir um novo edifício principal na extremidade das
plataformas cobertas. Paralelamente, poderia destacar uma fronteira urbana indistinta
sem comprometer o perfil histórico do terminal preexistente.
No caso de Ticino, pode-se reconhecer a presença de uma Escola Regionalista
pelo fato de que, desde fins da década de 1950, a região vem construindo uma quan¬
tidade de obras excepcionais, muitas delas resultantes de projetos coletivos. É o que
se pode verificar não só na diversidade de colaboradores com os quais Botta tem tra¬
balhado, como também nas parcerias formadas sem a sua participação pessoal. Mais
uma vez, todo o mérito cabe à geração mais velha, de Galfetti, Carloni e Schnebli,
que muitas vezes trabalharam em associação com jovens arquitetos. Não há espaço
aqui para listar todos os arquitetos participantes, mas é possível ter uma ideia do al¬
cance desse trabalho conjunto, assinalando que a “Escola de Ticino” reuniu bem mais
de vinte arquitetos que, em parcerias variadas, seriam responsáveis pela construção
de cerca de quarenta notáveis edifícios entre i960 e 1975.
Não surpreende que Tadao Ando, um dos arquitetos japoneses mais interessados
no regional, tenha se instalado em Osaka e não em Tóquio, e que sua obra teórica te¬
nha formulado, com mais clareza que qualquer outro profissional de sua geração, um
grupo de preceitos muito próximo da ideia do regionalismo crítico. Isso se revela cla¬
ramente na tensão que ele percebe entre o processo de modernização universal e a
idiossincrasia da cultura local. Em um ensaio intitulado “From Self-Enclosed Modera
Architecture toward Universality” [Do autofechamento da arquitetura moderna para a
universalidade], Ando escreveu o seguinte:

Nascido e criado no Japão, exerço aqui minha atividade de arquiteto. E acredito poder
dizer que o método que escolhi é o de aplicar 0 vocabulário e as técnicas desenvolvidas
por um modernismo aberto e universalista ao domínio fechado dos estilos de vida indivi¬
duais e da diferenciação regional. Mas me parece difícil tentar exprimir as sensibilidades,
os costumes, a consciência estética, a cultura peculiar e as tradições sociais de uma deter¬
minada raça por meio de um vocabulário modernista, aberto e internacionalista [...].12

Prosseguindo a leitura desse ensaio, entendemos que, para Ando, uma “arquitetura
moderna fechada” tem dois sentidos. De um lado, ele se refere literalmente à criação
de enclaves, ou mais precisamente, de palácios de justiça, em virtude dos quais o ho¬
mem é capaz de recuperar e conservar algum vestígio daquela tríade antes consagrada -

515
homem, natureza, cultura - contra o ataque destrutivo do desenvolvimento das mega-
lópoles. Neste sentido, Ando escreve:

Depois da Segunda Guerra Mundial, quando o Japão enveredou pelo caminho do


rápido crescimento económico, os critérios de valor das pessoas mudaram. O anti¬
go sistema familiar, essencialmente feudal, entrou em decadência. Mudanças sociais,
como a concentração da informação e dos locais de trabalho nas cidades, levaram
a uma superpopulação das aldeias e pequenas cidades agrícolas e pesqueiras (como
provavelmente também ocorreu em outras partes do mundo). A excessiva densida¬
de das populações urbanas e suburbanas impossibilitou a preservação de um aspecto
anteriormente característico da arquitetura residencial japonesa: a relação de intimi¬
dade com a natureza e a abertura para o mundo natural. O que chamo de arquitetura
moderna fechada é um resgate da unidade entre a casa e a natureza que as residências
japonesas perderam no processo de modernização.13

Nos conjuntos residenciais de casas particulares com pequenos pátios internos, quase
sempre construídos no interior de estruturas urbanas de grande densidade, Ando em¬
prega o concreto armado para sublinhar a tensa homogeneidade da superfície em vez
do peso, já que para ele o concreto

é o melhor material para tornar perceptíveis à luz do sol as superfícies [...] [sob o sol]
[...] as paredes se tornam abstratas, são negadas e se aproximam do limite final do
espaço. Sua realidade se perde e somente o espaço que elas delimitam dá a impressão
de realmente existir.14

Embora a importância capital da luz esteja presente nos textos teóricos de Louis Kahn
e Le Corbusier, Ando percebe o paradoxo de uma limpidez espacial emergindo da
luz como peculiarmente pertinente ao caráter japonês e, com esse entendimento, ele
torna explícito o segundo, e mais geral, significado de seu conceito de uma moderni¬
dade que se fecha em si mesma.

Espaços desse tipo passam despercebidos no utilitarismo da vida cotidiana e raramente


se fazem notar. Apesar disso, são capazes de estimular a recordação de suas formas
mais íntimas e de incentivar novas descobertas. É este o propósito do que denomino
de arquitetura moderna fechada. Uma arquitetura desse tipo é capaz de modificar-se
com a região onde finca suas raízes e de crescer em várias modalidades individuais.
Apesar de fechada, estou convencido de que, como metodologia, ela é aberta para a
universalidade.15

516
O que Ando tem em mente é o desenvolvimento de uma arquitetura “transóptica”, na
qual a riqueza da obra esteja além da percepção inicial de sua ordem geométrica. O va¬
lor tátil dos componentes tectônicos é fundamental para essa revelação espacial mu-
tante, conforme ele escreveu em 1981 a respeito de sua Residência Koshino:

A luz muda de expressão com 0 tempo. Creio que os materiais arquitetônicos não se
reduzem à madeira e ao concreto, que têm formas tangíveis, mas vão além ao incluir
a luz e o vento, que apelam aos nossos sentidos. [...] O detalhe é o elemento mais im¬
portante na expressão da identidade. [...] Assim, para mim, o detalhe é um elemento
que diz respeito à composição física da arquitetura e, ao mesmo tempo, é o gerador de
uma imagem da arquitetura.16

Que essa oposição entre civilização universal e cultura autóctone possa ter fortes
conotações políticas foi assinalado por Alex Tzonis em seu artigo sobre a obra dos
arquitetos gregos Dimitris e Susana Antonakakis, intitulado “The Grid and Pathway”
[A grelha e o caminho], no qual ele demonstra o papel ambíguo exercido pela univer¬
salidade do Schinkelschuler na fundação do Estado grego:

Na Grécia, o regionalismo historicista, em sua versão neoclássica, já era contestado an¬


tes da chegada do Estado do bem-estar social e da arquitetura moderna. Isso se deve a
uma crise muito peculiar que estourou no fim do século xix. O regionalismo histori¬
cista havia se desenvolvido aqui não só por causa da guerra de libertação, mas nascera
dos interesses relacionados com a expansão de uma elite urbana desligada do mundo
camponês e de seu “atraso” rural, e com a criação de uma dominação da cidade sobre o
campo. Disso decorreu o atrativo especial do regionalismo historicista, baseado no livro
e não na experiência, com sua monumentalidade que lembra uma outra elite distante e
esquecida. O regionalismo histórico havia unido as pessoas, mas também as dividira.17

As várias reações que se seguiram à vitória do estilo neoclássico dos nacionalistas gre¬
gos no século xix variaram do historicismo vernacular dos anos 1920 a uma atitude
modernista mais cabal que, imediatamente antes e depois da Segunda Guerra Mun¬
dial, primeiro proclamou a modernidade como um ideal e depois tentou participar
diretamente do processo de modernização da sociedade grega.
Tzonis observa que, na Grécia, o regionalismo crítico só começou com os projetos
da década de 1930 de Dimitri Pikionis e Aris Konstantinidis, sobretudo na Casa Eleusis
(1938), deste último, e em seu jardim construído em Kifissia, em 1940. Depois disso, o
regionalismo se manifestou com grande força na área para pedestres que Dimitri Pi¬
kionis projetou para o monte Philopappus, em 1957, sobre um terreno imediatamente
adjacente à Acrópole de Atenas. Sobre esse projeto, Tzonis assinala que

517
Pikionis se propôs fazer uma obra de arquitetura livre do exibicionismo tecnológico e
da composição pretensiosa (tão típica da arquitetura dominante nos anos 1950), um
objeto completamente despojado, quase desmaterializado, um ordenamento de “luga¬
res feitos para a ocasião”, que se abrem em torno do monte para a contemplação solitá¬
ria, para a conversação íntima, para uma pequena reunião ou uma grande assembleia.
Para urdir esse trançado extraordinário de nichos, passagens e situações, Pikionis
seleciona os elementos adequados nos espaços vividos da arquitetura popular, mas nesse
projeto o nexo com o regional não é feito de sentimentos ternos. Numa atitude com¬
pletamente diversa, esses invólucros de acontecimentos concretos são estudados com
um método friamente empírico, como se fossem documentados por um arqueólogo.
Tampouco sua escolha e posicionamento são executados para instigar emoções fáceis e
superficiais. São antes plataformas para ser usadas no dia a dia e para suprir o que a vida
cotidiana não promove no contexto da arquitetura contemporânea. A pesquisa do local
é a condição para chegar ao concreto e ao real, e para reumanizar a arquitetura.18

Ao longo de sua carreira, Konstantinidis, ao contrário de Pikionis, foi se aproximando


da racionalidade da grelha universal, e é esta afinidade que leva Tzonis a situar a obra
de Antonakakis em algum lugar entre o caminho autóctone de Pikionis e a grelha
universal de Konstantinidis. É correto entender esse dualismo como outra manifesta¬
ção da interação da cultura com a civilização, e se assim for, quais são as suas conse¬
quências mais gerais? Referindo-se à obra de Antonakakis e ao regionalismo crítico
em geral, Tzonis diz que “[...] trata-se de uma ponte sobre a qual toda arquitetura
humanista do futuro deverá passar, mesmo que o caminho leve a uma direção com¬
pletamente diferente”.19
Talvez a obra de Antonakakis que exprime de forma mais concisa essa conjunção
entre a grelha e o caminho seja o edifício residencial da rua Benakis, em Atenas, execu¬
tada segundo o seu projeto em 1975. Trata-se de uma construção em que um conceito de
movimento em labirinto, inspirado nas ilhas de Hidra, é entrelaçado à estrutura de uma
grelha racionalista - a estrutura de concreto ABA que sustenta a forma do edifício.
Se algum princípio central do regionalismo crítico puder ser isolado, ele certa¬
mente será o compromisso com o lugar e não com o espaço, ou, na terminologia de
Heidegger, com a proximidade do Raum em vez da distância do Spatium. Essa ênfase
no lugar também pode ser interpretada como propiciando o espaço político da apre¬
sentação pública, para usar a expressão de Hannah Arendt. É muito difícil alcançar
essa conjunção entre o cultural e o político na sociedade do capitalismo tardio. Entre os
episódios nos quais de algum modo foi possível realizar essa conjunção na última dé¬
cada, vale destacar 0 desenvolvimento de Bolonha nos anos 1970. No caso de Bolonha,
fez-se uma avaliação da morfologia fundamental e da tipologia do tecido urbano, e a
legislação socialista foi introduzida no sentido de conservar esse tecido urbano tanto

518
nas áreas antigas como nas novas. Contudo, apenas em cidades tradicionais como esta,
que foram governadas por formas responsáveis de controle político, há condições de
viabilizar um tal plano. Ali onde não existem essas condições culturais e políticas, é
bem mais difícil elaborar uma estratégia cultural criativa. A megalópole universal é
claramente avessa a uma densa diferenciação cultural. Na verdade, ela visa reduzir
o ambiente a pura mercadoria. Como um ábaco de expansão, ela consiste em pouco
mais do que uma paisagem alucinatória em que a natureza se dilui em instrumento
e vice-versa. O regionalismo crítico parece oferecer a única possibilidade de resistir
à avidez dessa tendência. Seu preceito cultural mais valioso é a criação do “lugar”; o
modelo geral a ser empregado em todo futuro desenvolvimento é o enclave, isto é, o
fragmento arraigado contra o qual a incessante inundação de um consumismo alie-
nante, sem lugar, poderá ser posto momentaneamente em xeque.

[“Prospects for a Critical Regionalism” foi extraído de Perspecta: The Yale Architectural
Journal 20. 1983, pp. 147-62. Cortesia do autor e da editora.]

1. Paul Ricoeur, “Universalization and National Cultures”, in History and Truth. Evanston, IL:
Northwestern University Press, 1961, pp. 276-283.
2. Jan Mukarovsky, Structure, Sign and Function. New Haven: Yale University Press,1970, p. 228. Talvez
eu esteja exagerando o caso, entretanto Mukarovsky escreveu que “o signo artístico, ao contrário
do signo comunicativo, não serve, isto é, não é um instrumento”.
3. Abraham Moles, “The Three Cities”, in Anthony Hill (org.), Directions in Art, Theory and Aesthetics.
Londres: Faber and Faber, 1968, p. 191.
4. Oriol Bohigas, “Posibilidades de una arquitectura Barcelonesa”, in Destino. Barcelona: 1951. Ver
também Oriol Bohigas, “Disenar para un público o contra un público”, in Seix Barral, Contra una
arquitectura adjetivada. Barcelona: 1969.
5. Ver Case Borsalino, de Ignazio Gardella, construídas em Alessandria, Itália, em 1952.
6. Álvaro Siza, “To Catch a Precise Moment of Flittering Images in All its Shades”, Architecture and
Urbanism n. 123, dez. 1980, p. 9.
7. Emilio Ambasz, The Architecture of Luis Barragdn. Nova York: Museum of Modern Art,1976, p. 9.
8. C. Banford-Smith, Builders in the Sun: Five Mexican Architects. Nova York: Architectural Book
Publishing Co., 1967, p. 74.
9. Harwell H. Harris, “Regionalism and Nationalism”, Student Publications of the School of Design,
North Carolina State of the University of North Carolina at Raleigh, v. 14, n. 5.
10. Descrição apresentada pelo escritório Harry Wolf Associates, em 3 de setembro de 1982, acompa¬
nhando o projeto que concorreu à Fort Lauderdale Riverfront Plaza Competition.
11. Vittorio Gregotti, L’Architettura come Territoria. Botta elaborou sua concepção da construção do
terreno a partir da tese que Gregotti apresenta neste livro.
12. Tadao Ando, “From Self-Enclosed Modern Architecture Toward Universality”, The Japan Archi¬
tects n. 301, maio 1982, pp. 8-12.

519
13. Ibid.
14. Ibid.
15. Ibid.
16. Ibid.
17. Alexander Tzonis e Liane Lefaivre, “The Grid and the Pathway: An Introduction to the Work of
Dimitris and Susana Antonakakis, with Prolegomena to a History of the Culture of Modern Greek
Architecture”, Architecture in Greece, n. 15, 1981, pp. 164-178.
18. Ibid.
19. Ibid.

ALEXANDER TZONIS E LIANE LEFAIVRE . POR QUE REGIONALISMO


CRÍTICO HOJE?
Os criadores do termo "regionalismo crítico ", 0 arquiteto Alexander Tzonis e a his¬
o toriadora Liane Lefaivre, relatam neste artigo a história do regionalismo no século
l<C
c*
£ XX e sustentam a viabilidade atual desse enfoque como paradigma crítico. Para se
c defenderem das acusações de que a arquitetura regionalista tem como resultado
Qi

ÇL> um nacionalismo chauvinista e kitsch, os autores acenam com uma estratégia de


CL
«3 análise na tradição "crítica" do filósofo Immanuel Kant e da Escola de Frankfurt.
Crítico, nesse sentido especializado, significa questionar tanto o mundo como ele é como
as visões de mundo subjacentes. Tzonis e Lefaivre afirmam que esse tipo de visão crítica
é bem-sucedido na arquitetura quando uma construção é "autorreflexiva, autorreferente e
contém, além de mensagens explícitas, metamensagens implícitas".
A noção de região desses autores não é estática ou fechada. Sua visão do regio¬
nalismo crítico difere também de outros regionalismos anteriores, a não ser pelo inte¬
resse comum em torno do lugar e pelo emprego de elementos arquitetônicos locais para
confrontar uma arquitetura universalizante. A técnica modernista de desfamiliarização é
usada para representar elementos regionais sob uma óptica não familiar. O recurso a esse
instrumento poético força um diálogo entre 0 observador e a construção. Tzonis e Lefai¬
vre garantem que todos os arquitetos possuem os conhecimentos necessários para a
desfamiliarização ("identificação, decomposição e recomposição de elementos") e que o
regionalismo não limita os arquitetos a trabalhar em suas próprias regiões.
Os dois autores reconhecem dever a ideia de regionalismo a Lewis Mumford, histo¬
riador das cidades e da arquitetura. Em suas obras da década de 1940, Mumford também
estava preocupado com a dominação da tecnologia e com as (imitações do Estilo Interna¬
cional. Na visão dos três escritores, o regionalismo surge como uma linha secundária do
modernismo. O artigo publicado a seguir usa uma abordagem histórica que contrasta com
0 tom polêmico e com as intenções do ensaio de Kenneth Frampton. Tzonis e Lefaivre não
propõem uma recapitulação nostálgica das tradições locais, nem rejeitam completamente
essas tradições. A proposta de reavaliação crítica da cultura local, empregando estraté-

520
gias modernistas, eleva o regionalismo sugerido pelos autores acima do paroquial.
Finalmente, o reconhecimento por parte do regionalismo crítico dos contextos locais
assume uma relevância especial à medida que o mundo assiste ao agravamento de
uma crise ecológica.
]
ALEXANDER TZONIS E LIANE LEFAIVRE

Por que regionalismo


crítico hoje?
Nos últimos dez anos, desde que foi criada,1 a proposta do “regionalismo crítico” tem
sido vista como alternativa a um modernismo caduco e ao irmão mais novo, embora
precocemente enfermo, do pós-modernismo: o desconstrutivismo.
No entanto, para muitas pessoas, inclusive as que acreditam que o pós-moder-
nismo está desaparecendo e que o desconstrutivismo não é um bom substituto para
ele, o significado e a adequação do regionalismo parecem questionáveis. Como é pos¬
sível ser regionalista em um mundo que tende a uma economia globalizada e tecno¬
logicamente interdependente, onde a mobilidade universal transporta os arquitetos e
os usuários da arquitetura através das fronteiras e dos continentes em uma velocidade
sem precedentes? Mais ainda, como alguém pode ser regionalista se hoje as regiões,
como entidades sociais, culturais e políticas baseadas em uma identidade étnica, estão
se desintegrando a olhos vistos? E como é possível ser crítico e regionalista ao mesmo
tempo? Tudo isso parece muito contraditório.
É verdade que, hoje, nenhuma construção é capaz de suscitar emoções como as
que a Catedral de Estrasburgo despertou, em 1772, no coração do primeiro regionalista
romântico, o jovem Goethe, aquela sensação de valor arquitetônico individual e local
que simbolizava um desejo de emancipação dos cânones universais e alienígenas do
desenho, a sensação de pertencer a uma só comunidade racial. Nenhuma construção
fala ao observador contemporâneo da mesma forma direta e imediata, “sem a ajuda de
um tradutor”, como a Catedral falou aos sentimentos do escritor alemão, e nenhuma
faz o observador correr para abraçá-la como Goethe quis abraçar a Catedral de Estras¬
burgo.2 Igualmente, nenhuma construção contemporânea possui, como edificação e
para John Ruskin - um regionalista romântico de meados do século xix -, aquelas po¬
derosas qualidades de “simpatia”, “afinidade”, “memória” e “familiaridade”, “o pro-

521
fundo sentido de ressonância”, que falam do passado como se ele continuasse no pre¬
sente e nos dizem “tudo o que precisamos saber sobre o sentimento e a realização dos
objetivos nacionais”. Será que uma construção ainda evoca o mesmo sentimento de
revolta e integridade moral? Hoje, contemplar a topografia de uma região como fonte
de inspiração, como fez [Eugène Emmanuel] Viollet-le-Duc quando tomou o Mont-
Blanc como imagem arquetípica, uma construção paradigmática que serviu de modelo
para seu único edifício, “La Vedette”,3 não é mais que um exercício de anacronismo.
Tampouco podemos voltar a cultuar o genius loci à maneira dos regionalistas pitorescos
do começo do século xvm,4 aqueles “bravos bretões” que, nas palavras de Alexander
Pope, usavam os elementos locais para expressar seu desejo de emancipação das “des¬
prezíveis” leis “estrangeiras” e do “escárnio formal” da ordem clássica absolutista.
[Marcel] Proust, cujas diferentes ideias sobre os mecanismos da familiarização
e da memória se desenvolveram a partir de seus estudos da obra de Ruskin,5 certa¬
mente estava certo. Em No Caminho de Swann (1913), primeiro livro de Em busca do
tempo perdido, termina com o herói lembrando-se tristemente das casas e avenidas de
Combray e da Paris de sua juventude, que não passavam então de imagens “fugidias”,
impressões irrecuperáveis do passado. “A realidade que eu conheci não existia mais”,
suspira melancolicamente. É o lamento de um intelectual “cosmopolita” ambivalente,
do ponto de vista cultural, político, étnico e sexual, mas também é o sinal de uma civi¬
lização que perdera suas regiões identificáveis, suas estruturas sociais coletivas e suas
representações correspondentes, um sintoma da percepção mágica de que a comuni¬
dade e o lugar não podem ser retomados.
Levando em conta essa perda da região, como pode uma arquitetura regionalista
ser outra coisa senão, no melhor dos casos, uma entrega à nostalgia de um tempo que
já passou, e que não tem nada a ver com a arte de Proust, mas com o que chamamos
de síndrome de Proust, a citação de fragmentos regionais muito estilizados e sua fu¬
são em um arremedo, um pastiche, um kitsch, que só beneficia os estabelecimentos
comerciais, restaurantes, hotéis e semelhantes; ou, no pior dos casos, uma forma de
atavismo, um pano de fundo para alucinações neotribais racistas e xenófobas? Como
essa arquitetura regionalista, libertária ou totalitária, comercial ou propagandística,
em toda a sua excessiva familiaridade do“como se fosse”, pode ser outra coisa senão
uma espécie de pornografia arquitetônica?
Gostaríamos de mostrar que uma corrente contemporânea de arquitetura regiona¬
lista - o regionalismo crítico - é um movimento mais original, que surgiu como uma
resposta aos novos problemas criados pela globalização contemporânea, da qual é for¬
temente crítico, e que as poéticas desse novo movimento são muito diferentes, senão
antagónicas, das de outras técnicas arquitetônicas regionalistas do passado. De fato,
o novo regionalismo surgiu no momento em que se começava a compreender que as
percepções tradicionais das regiões como entidades fechadas e estáticas, equivalentes a

522
grupos insulares igualmente invariantes, estavam tão obsoletas quanto os desgastados
modos de expressão da arquitetura regionalista tradicional. A compreensão disso cres¬
ceu à medida que a cultura, a economia e a tecnologia se universalizaram, enquanto as
regiões se mesclaram e se fundiram em capitais, as capitais em metrópoles, as metrópo¬
les nas “conurbações”6 de Patrick Geddes e nas “megalópoles” de Jean Gottman,7 e estas,
por sua vez, se integraram nos “ world-realms”8 pós-industriais de Melvin Webber.
Essa nova tendência de regionalismo não é apenas uma defesa contra a obsoles¬
cência da região em si, mas também uma reação à mudança perversa do regionalismo
romântico em regionalismo comercial e também totalitário da Heimatsarchitektur, que
se difundiu durante a década anterior à Segunda Guerra Mundial, a que já nos refe¬
rimos. Para começo de conversa, esse novo regionalismo tem em comum com toda a
tradição regionalista, desde seus primórdios - regionalismo romântico e regionalismo
pitoresco -, um compromisso com a condição de se ter um lugar [ placeness ] e com
o uso dos elementos arquitetônicos regionais como meio de fazer face a uma ordem
universalista de arquitetura considerada opressiva ou dominadora. Mas o novo regio¬
nalismo também apresenta uma ideia nova, que é fundamental para o regionalismo
crítico: uma definição do “lugar” que vai além da etnicidade, para não dizer que é con¬
trária ao germe da insularidade nacionalista. Grande parte dessa discussão foi iniciada
nos trabalhos de Lewis Mumford.
Em The South in Architecture,9 Mumford evoca a arquitetura de [Henry Hobson]
Richardson como exemplo de regionalismo. O livro não deixa de ter uma dramática
simplicidade na explicação de certos fenômenos históricos complexos. Sua impor¬
tância histórica se deve, porém, à interpretação da arquitetura de Richardson, des¬
conhecida na época, como um regionalista. Os projetos de Richardson são elogiados
por Mumford por constituírem um confronto crítico e uma alternativa ao despotismo
da arquitetura da Beaux-Arts, que o historiador associa à “exploração imperialista e à
colonização e conquista da Ásia, Africa e Américas”, assim como ao processo de insti¬
tucionalização do sistema bancário na Costa Leste - contemporâneo de Richardson -,
cuja expressão arquitetônica “privilegiou as fachadas”. Mumford enaltece Richardson
por se recusar a “privilegiar as fachadas” e por cumprir a “função social da arquite¬
tura” por intermédio do regionalismo.
Mumford opõe o regionalismo de Richardson ao regionalismo totalitário que na
época vinha sendo propugnado pela Alemanha nazista. Ele mostra que a arquitetura
pode fornecer uma identidade e exprimir a especificidade de um programa “sem a dei-
ficação da Heimatsarchitektuf\ o “culto das relíquias de uma outra era imperial” e a
criação neotribal de um “abismo insuperável entre os povos da terra”. Mumford pro¬
põe um conceito de regionalismo que defende, pelo contrário, a ideia de uma humani¬
dade comum, livre de dimensões raciais, tribais ou étnicas. Por último, mas não menos
importante, Mumford usa o exemplo de Richardson para comparar de modo polêmico

523
o regionalismo com outra espécie de “despotismo”, o da “ordem mecânica” e dos ab¬
surdos de uma utilização insensata da tecnologia.
Depois da guerra, Mumford não voltou a atacar a Heimat. Sua opção regio-
nalista concentrou-se no Estilo Internacional desenvolvido no pós-guerra, que lhe
pareceu ter-se distanciado dos objetivos originais do movimento moderno na ar¬
quitetura e sucumbido às forças que devia reformar. Mumford se insurgiu contra
uma arquitetura falsamente moderna, que procurava imitar o moderno repetindo
automaticamente os efeitos de superfície que, novamente, “privilegiavam as facha¬
das”. Assim, o Estilo Internacional substituiu a Beaux-Arts como alvo da crítica do
historiador. Em 1947, sua famosa coluna “Skyline”, na revista The New Yorker ,10
assume um tom provocativo e polêmico, quase belicoso. Referindo-se à guinada
“personalista” de Henry- Russell Hitchcock e ao novo entusiasmo de Siegfried Gie-
dion pelo “monumental e pelo simbólico”, ele se queixa de que a arquitetura mo¬
derna estava sendo subvertida internamente por críticos muito identificados com
as preocupações do movimento moderno com a objetividade e a realidade evidente.
Como um confronto crítico com o que lhe parecia ser o “modernismo” degradado
do pós-guerra, Mumford propõe o chamado estilo californiano da Bay Region de
William Wurster e seus associados, considerando-o “uma forma local e humana
de modernismo”, que, sendo “um produto do encontro das tradições do Oriente
e do Ocidente”, é “muito mais genuinamente universal do que o Estilo Internacio¬
nal dos anos 1930”, porque permitia “adaptações regionais
O artigo provocou enorme alvoroço e ocasionou um debate público realizado no
Museu de Arte Moderna de Nova York, na noite de 11 de fevereiro de 1948. 0 título do
evento, “O que está acontecendo com a arquitetura moderna?”, refletia as preocupa¬
ções dos organizadores.11 Entre os oradores estavam alguns dos mais importantes no¬
mes do modernismo do pós-guerra: Alfred Barr Jr., diretor do Museu, Henry-Russell
Hitchcock, Philip Johnson, Walter Gropius, Marcel Breuer, Serge Chermayeff, George
Nelson e o próprio Mumford.
A maioria dos participantes não entendeu a redefinição de regionalismo apre¬
sentada por Mumford. Apesar de sua insistência em dizer que “se trata de um exem¬
plo de internacionalismo, não um exemplo de localismo e de esforço limitado”,12
Alfred Barr referiu-se ao regionalismo de forma depreciativa, como uma Neue
Gemútlichkeit, o International Cottage Style. Gropius interpretou o regionalismo
como “um preconceito sentimental nacionalista e chauvinista”. A única exceção foi
Hitchcock, que se mostrou sensível ao verdadeiro impacto crítico da ideia central
do movimento. “A crítica - pois é de crítica que se trata - que está implícita” no
artigo de Mumford é, na opinião de Hitchcock, “uma crítica do Estilo Internacional
concebido em um sentido limitado [...].” Mas, em seguida, Hitchcock observa que
“essa crítica e os passos que foram dados devem subordinar-se a um problema mais

524
geral”, que ele identificou, à sua maneira sabidamente formalista, “ao problema da
expressão na arquitetura”.13
As ideias de Mumford são sempre lidas, admiradas e respeitosamente ignoradas.
Ou, então, são subvertidas, como nas versões “regionalistas” epidérmicas das fachadas
protegidas por estruturas de concreto rendilhado, muito divulgadas na época, como o
Instituto Paquistanês de Ciência e Tecnologia de Edward Durrell Stone, a Universidade
de Bagdá, de Walter Gropius, e o projeto de Yamasaki para o concurso para a Embai¬
xada dos Estados Unidos em Londres. Enquanto se realizam esses esforços de resgate
da “fachada imperial”, a tecnocracia, a burocracia e as construtoras estabelecem seu
estilo igualmente imperial, tendo como único resultado a generalização da anomia e
da atopia.
Foi na Europa que se adotou a nova concepção do regionalismo como um con¬
fronto crítico ante o estado da arquitetura após a Segunda Guerra Mundial, embora a
palavra “regionalismo” raramente tenha sido usada. Isso aconteceu poucos anos depois
do debate de Mumford no MOMA. Há pelo menos um sentido em que se pode dizer
que os europeus desenvolveram a tese de Mumford: na “arquiteturalidade” com que
realizaram as análises e na capacidade de concretizar estas ideias em projetos de escala
muitas vezes considerável.
Em um artigo intitulado “Regionalism and Modern Architecture” [O regionalismo
e a arquitetura moderna]”,14 o jovem James Stirling comparou o regionalismo com o
que nomeou de o “assim chamado Estilo Internacional combinado com uma grande
dose de neo -historicismo eclético monumental”, então predominante, passando a
promover “o novo tradicionalismo” em nome das realidades tecnológicas e econó¬
micas locais. Os projetos de Stirling para seu Village Project (1955) e para o conjunto
habitacional Preston Infill (1957-59), que leva em consideração o regional e os bairros
operários vizinhos, contêm uma forte crítica à nova monumentalidade do pós-guerra.15
Uma série de outros interessantes projetos regionalistas foi elaborada na Inglaterra,
segundo as mesmas diretrizes, pelos “novos empiristas”, cujo enfoque regionalista so¬
freu a influência da arquitetura escandinava ou de [Alvar] Aalto. A questão do regio¬
nalismo também seria discutida pelo Team X, como uma crítica da nova monumenta¬
lidade, exprimindo-se em inúmeros projetos, principalmente nos primeiros projetos
de Candilis, Josic e Woods, no norte da África. Muitos arquitetos e teóricos italianos,
que compunham o grupo iNA-Casa, também criticaram a arquitetura neoformalista
e tecnocrática do Estilo Internacional dos anos 1950, assim como Giancarlo de Cario,
principalmente em suas lojas e prédios de apartamentos de Matera, e o não menos im¬
portante Ernesto Rogers, ambos como editorialistas da revista Casabella e autores do
projeto da Torre Velasca (1958 ) em Milão.
A Torre Velasca foi muito divulgada pela imprensa internacional, que reconheceu
em sua abordagem regionalista uma crítica ao Estilo Internacional. Gerhard Kallman

525
escreveu uma das mais argutas resenhas da Architectural Forum, em fevereiro de 1958.
A revista avaliava que o projeto era “um corajoso ensaio na tão negligenciada arte de
adequar a arquitetura moderna à continuidade histórica da construção” ao mesmo
tempo em que evitava “uma tentativa de reviver uma prática folclórica” e um “ecle-
tismo sentimental”. O próprio Rogers, em seu artigo para Casabella, intitulado “Our
Responsability toward Tradition” (ago. 1954) atacou o dogmatismo dos modernistas
“que não compreendem que o estilo moderno contrasta com o antigo exatamente por¬
que lançou as bases de um novo tratamento dos problemas”. O artigo também criti¬
cou o “populismo neoarcadiano” que considerava “anacrónico, quando não hipócrita
ou pura mentira demagógica”.
Na segunda metade da década de 1950, a obra de Kenzo Tange, principalmente a
sua Sede da Prefeitura de Kagawa, de 1956, projeto com que o Japão entrou definitiva¬
mente para 0 circuito internacional de arquitetura, deu uma contribuição importan¬
tíssima para o desenvolvimento do regionalismo no pós-guerra e para uma tentativa
de redefinir a arquitetura moderna durante um debate realizado em 1959, quando o
edifício foi apresentado na reunião do CIAM, em Otterlo. Respondendo aos entusiásti¬
cos elogios de Ernesto Rogers ao regionalismo do edifício, como “um excelente exem¬
plo do que devemos fazer”, Tange foi mais cauteloso. “Não posso aceitar o conceito
de um regionalismo total”, afirmou, acrescentando que “a tradição pode ser desenvol¬
vida pelo questionamento de suas próprias deficiências”, deixando implícita a mesma
recomendação para o regionalismo.
Essa última frase de Tange sintetiza a antinomia do raciocínio, em parte um
adendo, em parte uma rejeição dos elementos regionais, típica da prática em curso
do que temos denominado de regionalismo crítico. A antinomia é o segundo ele¬
mento essencial da definição do conceito. A palavra “crítico” não indica apenas uma
atitude de “confronto”. O regionalismo do pós-guerra de Mumford era hostil com
relação ao modernismo atópico, anômico, “fachadista”, e os regionalistas românti¬
cos do século xix insurgiam-se abertamente contra a difusão “imperialista” do câ¬
none clássico. Mas isso não os tornava necessariamente críticos no sentido mais
especializado da palavra que estamos usando, isto é, um regionalismo que se exa¬
mina a si mesmo, se questiona e se julga, que não enfrenta somente o mundo, mas
também a si mesmo.
Nesse segundo sentido, a ideia de “crítica” tem origem nos ensaios serenos de [Im¬
manuel] Kant16 e se desenvolve nos textos agitados da Escola de Frankfurt.17 Os es¬
tudos críticos questionam não somente o mundo estabelecido, como fazem as obras
de confronto, mas também a própria legitimidade das possíveis visões de mundo que
o interpretam racionalmente. Tomando emprestada uma frase de [Jurgen] Haber¬
mas, poder-se-ia dizer que “eles desfazem a ilusão objetiva” na arquitetura. Isso acon¬
tece quando um edifício é autorreflexivo e autorreferente, e quando contém, além de

526
mensagens explícitas, metamensagens implícitas que conscientizam o observador so¬
bre a artificialidade de seu modo de ver o mundo.
Uma característica essencial das construções ligadas ao regionalismo crítico é o
fato de serem críticas em dois sentidos. Além de proporcionarem imagens que con¬
trastam com o estilo anômico, atópico e misantrópico de grande número dos projetos
construídos em todo o mundo, elas suscitam no espírito do observador questões rela¬
cionadas com a legitimidade da própria tradição regionalista a que pertencem.
As poéticas do regionalismo crítico realizam sua função autorreflexiva por meio
do efeito de “desfamiliarização”. Esse conceito, criado pelo formalista russo Victor
Shklovsky,18 foi inicialmente aplicado à literatura, mas também pode ser empregado na
arquitetura, conforme constatamos em nossos estudos sobre a arquitetura clássica.19
No que diz respeito ao regionalismo, o efeito da desfamiliarização só é instrumental na
fase crítica atual.
O regionalismo romântico, apesar de sua postura de confronto, empregou a fa¬
miliarização. Selecionou elementos regionais associados na memória com épocas
passadas e inseriu-os em novas edificações, construindo contextos cenográficos para
despertar afinidade e “simpatia” no observador, formando cenas familiares que, ape¬
sar de contrastarem emocionalmente com a despótica arquitetura atual, insensibili¬
zavam a consciência. O regionalismo sentimentaloide, barato e nauseante, com seus
ambientes Heimat fáceis e imediatos, que excitam e simulam uma familiaridade ex¬
cessiva e narcisista, tem tido um efeito ainda mais narcotizante - senão alucinatório
- sobre a consciência.
De sua parte, o regionalismo crítico reage - hoje de modo mais polêmico do que
na década de 1950 - a essa explosão de ambientes regionalistas forjados, que são ainda
mais comuns em sua versão comercial do que nas formas totalitárias da década de 1930.
Ele seleciona os elementos regionais por sua potencialidade de funcionar como apoio,
físico ou conceituai, aos contatos humanos e às comunidades, o que poderíamos cha¬
mar de elementos “definidores do lugar”, incorporando-os por “estranhamento” e
não por “familiaridade”. Em outras palavras, o regionalismo crítico faz com que eles
pareçam distantes, difíceis de apreender, e até mesmo perturbadores. Isso confere ao
sentido de lugar uma estranha sensação de deslocamento e põe fim ao “abraço” sen¬
timental entre os edifícios e seus consumidores, “desautomatiza” a percepção e, dessa
maneira, “atiça a consciência”, para usar outra expressão de Shklovsky. Assim, com o
uso de recursos poéticos apropriados de desfamiliarização, o regionalismo crítico faz
com que o edifício pareça entrar em um diálogo imaginário com o observador; esta¬
belece um processo de difícil negociação coletiva em lugar da rendição fantasiosa, que
decorre da familiarização e da sedução, que se seguem à familiarização excessiva; leva
o observador a um estado metacognitivo, uma democracia da experiência, como diria
Jerome Bruner, e conjura um “fórum de mundos possíveis”.20

527
O regionalismo crítico atual, que nasce com a censura de Mumford ao moder¬
nismo postiço do Estilo Internacional, ao contrário das fases anteriores do regiona¬
lismo, não apoia a emancipação de um grupo regional nem põe um grupo contra o
outro. Ele tenta engendrar a identidade de um “grupo global” em oposição ao “eles”,
isto é, ao exército tecnocrático e burocrático alienígena de ocupação que impõe a
regra ilegítima da anomia e da atopia. O regionalismo crítico, além disso, não só nos
alerta por meio da poética de suas formas contra a perda da identidade do lugar e
da comunidade, mas também contra a nossa incapacidade “reflexiva” de tomarmos
consciência dessa perda no momento em que ela ocorre. A relação do novo regiona¬
lismo com o exercício de uma arquitetura mundial também é especial. As operações
de identificação, decomposição e recomposição de elementos regionais de modo a
“estranhá-los” fazem parte das habilidades universais dos arquitetos. Essas opera¬
ções podem ser realizadas por qualquer arquiteto competente, responsável e bem-
informado, que esteja empenhado em compreender as limitações locais, e não só por
aqueles nascidos na região. O regionalismo crítico não pressupõe um paroquialismo
profissional.
Nesse breve esboço da poética do regionalismo crítico, não tentamos identifi¬
car nenhum critério geral de estilo. Não formulamos respostas a questões práticas
como: “as casas de madeira são menos atópicas do que as de concreto?” ou “as
lanchonetes de concreto são mais anômicas do que as de alvenaria?”. Não fize¬
mos listas de critérios projetuais físicos de como ser um regionalista crítico. E por
uma boa razão. A poética do regionalismo crítico não contém uma lista de regras
projetuais de distribuição, motivos e genera, como faz a definição do classicismo,
o pictórico ou o movimento de Stijl. Ao contrário, como procede a arquitetura
da Nova Objetividade, extrai suas formas do contexto. Em outras palavras, sua
poética geral é o projeto específico que parte do regional, das limitações que pro¬
duziram lugares e representações coletivas em determinadas áreas. Para citar ape¬
nas um exemplo: no regionalismo crítico espanhol, esses elementos incluem a pu¬
reza prismática e o colorido vivo das fachadas de alvenaria, os pátios internos dos
conjuntos residenciais chamados de corrala, os pátios de manzanas, os miradores
- todos elementos regionais historicamente ligados à formação do genius loci con¬
creto das cidades, que são selecionados, “desfamilarizados” e recompostos nos
novos projetos.21
Existe ainda outra modalidade poética do regionalismo crítico, encontrada com
mais frequência nos Estados Unidos, na qual as características regionais - mais ligadas
à natureza do que à cultura - são integradas ao projeto. É o caso da composição de pré¬
dios como abrigos, respeitando as limitações do ambiente regional e incorporando os
recursos locais. É o oposto da anomia e da atopia que resultam de uma violação à força
bruta da natureza para controlar as condições ambientais - não a força enquanto tal,

528
mas uma causa da arrogância do pensamento esbanjado à toa, uma arrogância pre¬
sente mesmo quando há dinheiro e máquinas para esbanjar, à qual se combina a ar¬
rogância de uma visão mesquinha do mundo implícita na “glutonaria” do projeto. Em
outras palavras, a “topicidade”, ou condição de se ter um lugar, e a contenção da ano-
mia e da atopia são apoiadas pelas mensagens implícitas de um projeto bem balan¬
ceado, “económico” e “ecológico”.
Mas é impossível dizer, apenas olhando para um edifício - como se faz, por exemplo,
com os templos clássicos - que se trata de uma boa obra de regionalismo crítico. Kenneth
Frampton, cujos ensaios foram os que mais ajudaram a suscitar e difundir o tema do regio¬
nalismo crítico, formulou esse argumento com muita clareza quando escreveu:

[...] A estratégia fundamental do regionalismo crítico é intermediar o impacto da


civilização universal com elementos derivados indiretamente das peculiaridades de
determinado lugar. O que dissemos acima deixa claro que o regionalismo crítico
depende da manutenção de um nível elevado de consciência crítica. Sua inspiração
principal encontra-se na atenção a aspectos como o espectro e a qualidade da luz
local, ou na tectônica derivada de uma modalidade peculiar de estrutura, ou na topo¬
grafia de determinada localidade.22

Tampouco alegamos que o regionalismo crítico deve ser visto como contraditório à
atual tendência de privilegiar a alta tecnologia e a economia e cultura globalizadas.
Na verdade, o regionalismo crítico se opõe apenas aos subprodutos contingentes
indesejáveis dessas tendências, que são gerados pelos interesses privados e pela in¬
cúria pública.
Penso que, após duas décadas extremamente criativas, embora muito frustrantes,
durante as quais a arquitetura oscilou entre visões sonhadoras de engajamento social,
completamente divorciadas das referências conceituais e práticas da disciplina, que
criaram exercícios socialmente vazios no quadro formal autónomo da arquitetura, es¬
tamos nos aproximando de uma perspectiva mais equilibrada, mais em contato com
a realidade. Uma das questões que identificam essa nova perspectiva é o problema da
arquitetura do lugar, a formulação de uma atitude crítica quanto à forma e ao espaço
da comunidade em um mundo que se caracteriza pela mobilidade e integração. O re¬
gionalismo crítico surge como um movimento seriamente empenhado nesse problema.
Temos, portanto, bons motivos para dizer que ele surgiu como uma das abordagens
mais interessantes na arquitetura contemporânea.

[“Why Critical Regionalism Today?” foi extraído de Architecture and Urbanism n. 236,
maio 1990, pp. 22-33. Cortesia dos autores e da editora.]

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1. Ver A. Tzonis, L. Lefaivre, “The Grid and the Pathway”, Architecture in Greece n. 5, 1981; A. Tzonis,
L. Lefaivre e A. Alofsin, “Die Frage des Regionalismus”; N. Andritzky, L. Burckhardt e O. Hoff¬
man (orgs.), Fur eine andere Architektur. Frankfurt: Fischer, 1981.
2. Ver W. Goethe, “Von deutscher Baukunst”, N. Pevsner (trad.), in Architectural Review xcvm,
pp. 155SS. Nesse texto, Goethe argumenta, equivocadamente, que o gótico era alemão. Na verdade,
o gótico era francês. Geralmente se reconhece que a primeira construção gótica foi a igreja da
abadia de St. Denis, na lie de France, obra supervisionada pelo abade Suger para seus patronos, a
dinastia dos Capetos. Para uma análise geral sobre o papel de Goethe na revitalização do gótico
na Alemanha, ver W. D. Robson-Scott, The Literary Background of the Gothic Revival in Germany.
Oxford: Oxford University Press, 1965.
3. Esse argumento foi levantado por Jacques Gubler no estudo sobre “Viollet-le-Duc et 1’Architecture
Rurale”, publicado no catálogo da exposição Viollet-le-Duc, Centenaire de la Mort à Lausanne,
Exposition au Musée de 1’Ancien Évêche. Lausanne: 1979.
4. Para um esboço da biografia do regionalismo desde sua fase mais remota e “emblemática”, nos
primórdios do Renascimento, e passando pelo regionalismo pitoresco do século XVIII até o re¬
gionalismo romântico do século xix, ver nosso artigo “EI Regionalismo Crítico y la Arquitectura
Espanola Actual”, in A & V 3, Madri: 1985, pp. 4-19.
5. Proust traduziu para o francês a Bíblia de Amiens de Ruskin, e as referências explícitas e implícitas
a Ruskin em Em busca do tempo perdido são um elemento importante na estrutura do romance.
Há um estudo sobre a extensão da influência de Ruskin sobre Proust no excelente On Reading
Ruskin, de Marcel Proust. New Haven: Yale University Press, 1987, organizado e traduzido por J.
Autret, W. Burford e P. Wolfe, com uma introdução de R. Macksey.
6. Patrick Geddes, Cities in Evolution. Londres: 1915.
7. Jean Gottman, Megalopolis. Cambridge: MIT Press, 1961.
8. Melvin Webber, “The Urban Place and the Nonplace Urban Realm”, in M. Webber et al., (orgs.),
Explorations into Urban Structure. Filadélfia: University of Pennsylvania Press, 1964, pp. 79-137.
Para uma longa crítica contemporânea sobre a tese de Webber, ver S. Chermayeff e A. Tzonis,
Advanced Studies in Urban Environments. New Haven: Yale University Press, 1967.
9. L. Mumford, The South in Architecture. Nova York: Harcourt, Brace & Co., 1941.
10. L. Mumford, “Skyline”, The New Yorker,11 out. 1947.
1 1 . The Museum of Modern Art Bulletin v. xv, n. 3, primavera de 1948, pp. 35SS.
12. Ibid.,p. 18.
13. Ibid.,p. 9.
14. Ver Architect’s Yearbook n. 8 (1957).
15. Nova monumentalidade é uma expressão cunhada por Giedion para indicar a arquitetura monu¬
mental dos anos 1950.
16.1. Kant, The Critique of Pure Reason,1791.
17. Para um tratamento sintético do desenvolvimento da ideia de teoria crítica, veja Raymond Geuss,
The Idea of a Critical Theory, Habermas and the Frankfurt School. Cambridge: Cambridge Univer¬
sity Press, 1981.
18. Shklovsky fazia parte do grupo dos “formalistas russos”, a vanguarda de teóricos da literatura
muito influentes na época da Revolução Russa. Ver o artigo de Shklovsky, “Art as Technique”, in L.
T. Lemon e M. Reis (orgs.), Russian Formalist Critique. Lincoln: University of Nebraska Press, 1965.

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19. A. Tzonis e L. Lefaivre, Classical Architecture: The Poetics of Order. Cambridge: MIT Press, 1986.
Ver principalmente o último capítulo, “Critical Classicism: the Tragic Function”.
20. Jerome Bruner, Actual Minds, Possible Worlds. Cambridge: Harvard University Press, 1986.
21 . Ver nosso artigo “El Regionalismo Crítico y la Arquitectura Espanola Actual”, in A & V n. 3, op. cit.
22. Em “Towards a Critical Regionalism: Six Points for an Architecture of Resistance”, in H. Foster
(org.), The Anti-Aesthetic, Essays on Postmodern Culture. Port Townsend: Bay Press, 1983, p. 21.

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