Professional Documents
Culture Documents
Palavras-chave
faltando”. Hoje, a ideia inicialmente aceita de que a qualquer canal ou meio, informação adequada
competência informacional consiste essencialmente às necessidades, levando ao uso correto e ético
em conjunto de habilidades individuais ligadas à da informação na sociedade” (JOHNSTON e
manipulação da informação em um suporte digital WEBBER, 2006, p. 113).
constitui apenas uma das muitas dimensões sugeridas
pelo termo, que vem crescendo em complexidade Singh (2008), por sua vez, considera que o principal
à medida que as pesquisas sobre o tema evoluem. propósito da competência informacional seja o
desenvolvimento da habilidade de construir sentido,
Na Austrália, onde os estudos e as práticas cujo resultado seria o aprendizado independente e
envolvendo a competência informacional têm o pensamento autônomo. O autor enfatiza que a
encontrado ampla ressonância, o Council of exploração e a análise da ecologia informacional e
Australian University Librarian (CAUL) adaptou da diversidade sociocultural constituem-se como
o conceito elaborado pela ALA e conceituou o componentes essenciais do processo da competência
termo como a habilidade de definir, localizar, informacional.
acessar, avaliar e usar a informação de forma ética
e socialmente responsável como parte de uma Muitos autores concordam ainda que a competência
estratégia de aprendizado ao longo da vida (2001). informacional está no centro de vasta gama de
competências (literacies) emergentes, resultantes da
Lloyd (2006) sugere que a competência informacional sociedade da informação, e que povoam a produção
não deve ser definida de acordo com suas intelectual da área, tais como competência cultural,
características baseadas em habilidades, nem como competência digital, competência visual, competência
uma série de habilidades descontextualizadas, “pois tecnológica, dentre outras (LANGFORD, 1998).
reduzir o objeto a esse nível limita nossa concepção Shanbhag (2006), por exemplo, afirma que a
do fenômeno e nossa compreensão daquilo que competência informacional evoluiu de um conceito
significa ser competente em informação”. Para a para uma disciplina que reúne múltiplas competências,
pesquisadora, tornar-se competente em informação múltiplas habilidades em uma variedade de contextos.
consiste em um processo holístico influenciado por Langford (1998) argumenta ainda que se todas essas
relações sociais, físicas e textuais com a informação, competências implicam um ato de comunicação e se
as quais demandam uma série de práticas e atestam a a comunicação envolve codificação e decodificação
complexidade e a variedade das fontes de informação de informação em uma variedade incontável de
dentro de um contexto (LLOYD, 2006, p. 571). registros, então toda competência constrói-se como
Em artigo anterior, ela entende a competência competência informacional.
informacional como uma metacompetência, na
medida em que se constituiria como uma faculdade Competência informacional crítica
criadora, permitindo a aquisição de novas habilidades Em estudo bastante citado, Shapiro e Hughes (1996)
e novos conhecimentos. (2003). aproximam a ideia de competência informacional da
Johnston e Webber (2006) também buscam essência do pensamento iluminista do século XVIII,
apontar a competência informacional como uma colocando a reflexão crítica no centro da concepção
disciplina de fundamental relevância na sociedade de indivíduo inserido na sociedade da informação:
da informação e argumentam que “uma pessoa Mas a competência informacional deve ser, na
competente em informação é um ser socialmente verdade, mais amplamente entendida como uma
e autoconsciente e não um simples repositório arte neoliberal, que vai desde saber como usar os
de habilidades e conhecimento” (2006, p. 112). computadores e acessar a informação até a reflexão
Para esses autores, a competência informacional crítica sobre a natureza da informação em si, sua
define-se como “a adoção de um comportamento infraestrutura técnica, e o seu contexto e impacto
informacional apropriado para identificar, mediante social, cultural e mesmo filosófico [...]
O indivíduo competente informacional reuniria, 2008). Como afirma Harris, o processo de criação,
assim, tanto as competências inicialmente previstas localização, avaliação e uso da informação nos
pelos bibliotecários quanto uma perspectiva crítica mais variados suportes e formatos não acontece
em relação à informação e ao conhecimento no vácuo, longe dos contextos da comunidade,
e ao seu próprio tempo, na medida em que onde significados e valores estão em jogo. Nesse
permitiria uma percepção mais abrangente de sentido, o autor observa que muitas das normas para
como nossas vidas são moldadas pela informação o desenvolvimento da competência informacional
que recebemos cotidianamente. Nesse sentido, os ignoram a influência da inter-relação entre os
autores ampliam o conceito e o papel social da membros da comunidade em que os indivíduos
competência informacional, que seria muito mais estão inseridos e os processos informacionais.
do que uma reunião de habilidades para acessar e
empregar adequadamente a informação e passaria Com efeito, enquanto muitos pesquisadores
a funcionar como uma ferramenta essencial na dedicam-se intensamente à elaboração e à
construção e manutenção de uma sociedade livre, implementação de normas e programas para o
verdadeiramente democrática, em que os indivíduos desenvolvimento de habilidades relacionadas à
fariam escolhas mais conscientes e seriam capazes competência informacional, outros grupos vêm
de efetivamente determinar o curso de suas vidas. buscando refutar a ideia de que um indivíduo
possa se tornar competente em informação apenas
A Declaração de Alexandria sobre competência informacional mediante critérios uniformemente estabelecidos.
e aprendizado ao longo da vida, documento elaborado no Reece (2007, p. 482) observa que o conceito de
ano de 2005 em colóquio realizado na Biblioteca de competência informacional desenvolveu-se de
Alexandria, ratifica os elementos de democratização e modo a abarcar habilidades cognitivas abstratas
justiça social inerentes à competência informacional cada vez mais complexas, as quais envolvem uma
ao afirmar que: visão crítica de mundo. Para a autora, a competência
informacional é uma forma de pensamento crítico
A competência informacional está no cerne do
aplicada ao domínio da informação.
aprendizado ao longo da vida. [...] O aprendizado de
toda a vida prepara os indivíduos, as comunidades Muitos desses estudos baseiam-se na vertente da
e as nações a atingir suas metas e a aproveitar as teoria crítica, que postula a educação emancipatória
oportunidades que surgem no ambiente global em
e a experiência formativa.* É o caso de Elmborg
evolução para um benefício compartilhado. Auxilia-os e
suas instituições a enfrentar os desafios tecnológicos,
(2006), para quem a dimensão crítica da competência
econômicos e sociais, para reverter a desvantagem e informacional apontada por Shapiro e Hughes
incrementar o bem-estar de todos. (Grifo nosso.) (1996), de características libertadoras, encontra
respaldo nas teorias educacionais de Paulo Freire,
A partir dessa afirmação, Jacobs (2008) observa que, segundo as quais a escola encarna a ideologia
tendo em vista que a competência informacional socialmente dominante, treinando em consonância
opera dentro de um contexto sociopolítico, é com a ética capitalista seus estudantes, os quais
também ela direcionada politicamente. Assim, ao passam a entender a educação como consumidores
limitar o potencial da competência informacional a
normas e diretrizes, arriscar-se-ia minimizar, quando * A chamada Teoria Crítica da sociedade é resultado da revisão
não negar, a natureza política que lhe é inerente. do pensamento marxista, levada a cabo por Adorno, Horkheimer,
Marcuse e outros membros da Escola de Frankfurt e da qual Ha-
bermas foi o principal herdeiro. Em linhas gerais, para esses teóri-
Por constituírem processos de caráter sociopolítico,
cos, a emancipação constitui-se como o objetivo por excelência da
a produção, a disseminação e o uso da informação educação, que, nesse sentido, deve visar à construção de um co-
estão intimamente ligados ao envolvimento de nhecimento crítico e de uma práxis “que possa romper com a ética
conformista do positivismo que está a serviço da descoberta das leis
indivíduos em uma comunidade, não podendo
que regem a sociedade, sem contudo almejar a sua transformação”.
ser descritos a partir do isolamento (HARRIS, (BATISTA, 2000, p.190).
09), segundo o qual competência informacional era da informação, como a habilidade de definir,
é um conceito amplo que abrange habilidades localizar, acessar, avaliar e usar a informação de
em informação, habilidades em tecnologias de forma ética e socialmente responsável como parte
informação, habilidades em bibliotecas, habilidades de uma estratégia de aprendizado ao longo da vida,
em resolução de problemas e habilidades cognitivas, o que justifica a visão de alguns pesquisadores que
além de atitudes e valores que possibilitam ao não veem os recursos digitais e em meio eletrônico
estudante atuar efetivamente no contexto da como foco da competência informacional, mas
informação. sim como instrumentos facilitadores para o seu
desenvolvimento.
A variedade de pontos de vista aqui exposta
demonstra que a abordagem da competência Uma fase experimental e exploratória é vivenciada
informacional deve levar em conta uma complexa na década de 1990, que tem por foco discutir
gama de processos individuais e coletivos, o significado e as implicações da competência
constituindo um campo fértil de pesquisa e de ação informacional para os programas educacionais.
de potencial transformador. Esses trabalhos basearam-se em investigações a
respeito dos modos de percepção de estudantes e
CONSIDERAÇÕES PARCIAIS profissionais sobre o assunto a partir da aplicação de
modelos experimentais para o desenvolvimento da
Este trabalho se propôs a elucidar significados para competência informacional. A noção de competência
a competência informacional, a fim de compor bases informacional é marcada pela identificação e
histórico-conceituais que servirão de núcleo para exploração de uma variedade de paradigmas, os quais
pesquisas nesta área. a vinculam aos estudos cognitivos, construtivistas
e pelo interesse por estudos baseados na esfera do
Uma parte dos trabalhos reunidos neste artigo tem
trabalho.
por intenção estabelecer traços característicos da
competência informacional, conforme sua época de Em uma perspectiva crítica, a competência
desenvolvimento. Um olhar para fora do contexto informacional deve ser mais amplamente entendida
brasileiro evidencia que, na década de 1980, os como uma “arte” que vai desde saber como usar os
estudos tratavam da competência informacional computadores e acessar a informação até a reflexão
numa fase inicial – a de habilidades informativas crítica sobre a natureza da informação em si, sua
e elaboração de normas direcionadas aos setores infraestrutura técnica, e o seu contexto e impacto
educacionais, com foco na construção de modelos social, cultural e mesmo filosófico, o que permitiria
descritivos dos processos de aprendizagem por meio uma percepção mais abrangente de como nossas
da busca e do uso da informação. vidas são moldadas pela informação que recebemos
cotidianamente.
É nesta fase que se criam os conceitos da noção de
competência informacional e nesse mesmo bojo Na fase iniciada no ano 2000, os pesquisadores,
de turbulências que se criticam sua legitimidade conforme se infere nas buscas realizadas, estão
científica. Isso ocorre em razão da dificuldade de desenvolvendo uma consciência coletiva em relação
uma definição rigorosa com relação ao campo de ao espaço de estudos construído em torno da
conceitos, seu status epistemológico e a polissemia competência informacional, o que nos parecem
resultante de seu uso nos discursos acadêmicos, sinais promissores que fazem emergir o papel social
já que a noção de competência informacional da competência informacional como um caminho
não é estática e limitada, mas configura-se como essencial na construção e manutenção de uma
um conceito dinâmico que continua a crescer sociedade livre, verdadeiramente democrática, em
para incorporar uma gama cada vez maior de que os indivíduos fariam escolhas mais conscientes e
habilidades necessárias aos indivíduos inseridos na seriam capazes de determinar o curso de suas vidas.
______. Information literacy landcapes: an emerging picture. Journal RIOS, T. A. Compreender e ensinar: por uma docência de melhor
of Documentation, v. 62, n. 5, 2006. Disponível em: <http://www. qualidade. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2006.
emeraldinsight.com/Insight/viewContentItem.do;jsessionid=0EF
CE9F66518FD6EE8826F5252FE2D77?contentType=Article&co ROPÉ, F.; TANGUY, L. (Orgs.). Saberes e competências. Campinas, SP:
ntentId=1571837>. Acesso em: 15 nov. 2008. Papirus, 1997.
MACDONALD, M.C.; RATHEMACHER, A.J.; BURKHARDT, J.M. SHANBHAG, S. Alternative models of knowledge production: a step
Challenges in building an incremental, multi-year information literacy foward in information literacy as a liberal art. Library Philosophy and
plan. Reference Services Review, v. 28, n. 3, 2000. Disponível em: <http:// Practice, v. 8, n. 2, 2006. Disponível em: <http://vnweb.hwwilsonweb.
www.emeraldinsight.com/Insight/viewPDF.jsp?contentType=Arti com/hww/results/results_common.jhtml;hwwilsonid=RTC1Z21G
cle&Filename=html/Output/Published/EmeraldFullTextArticle/ RXD0NQA3DILSFGOADUNGIIV0>. Acesso em: 3 jun. 2009.
Pdf/2400280303.pdf>. Acesso em: 03 dez. 2008.
SHAPIRO, J.; HUGGES, S. K. Information literacy as a liberal art:
MATOUSH, T.L. New forms of information literacy. Reference services enlightenment purposals for a new curriculum. Educon Review, n. 31,
review, v. 34, n.1, 2006, p. 156-163. Disponível em: <http://www. v. 2, 1996. Disponível em: <http://www.educause.edu/pub/er/
emeraldinsight.com/Insight/viewContainer.do;jsessionid=0EFCE review/reviewarticles/31231.html>. Acesso em 3 dez. 2008, p. 31-35.
9F66518FD6EE8826F5252FE2D77?containerType=Issue&contai
nerId=23618>. Acesso em: 16 nov. 2008. SINGH, J. Sense-making: information literacy for lifelong learning and
information management. Journal of Library and Information Technology,
MINISTRY OF EDUCATION; NATIONAL LIBRARY OF NEW v. 28, n. 2, Mar. 2008, p. 13-17. Disponível em: <http://publications.
ZEALAND. The school library and learning in information landscape: drdo.gov.in/ojs/index.php/djlit/article/view/285/115>. Acesso
guidelines for schools. Wellington, NZ, 2002. Disponível em: <www. em: 22 out. 2008.
natlib.govt.nz/downloads/The-school-library-and-learning-in-the-
info-landscape.doc>. Acesso em: 3 jun. 2009. SMIT, J.W.; BARRETO, A. de A. Ciência da informação: base
conceitual para a formação do profissional. In: VALENTIN, M.L.
MUTCH, A. Information literacy: an exploration. International (Org.). Formação do profissional da informação. São Paulo: Polis, 2002.
Journal of Information Management, v. 17, n. 5, p. 377-387, 1997.
Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/science?_ SNAVELY, L.; COOPER, N. The information literacy debate.
ob=PublicationURL&_tockey=%23TOC%235916%231997%23 The Journal of Academic Librarianship, v. 23, n. 1, Jan. 1997. p.
999829994%2312772%23FLP%23&_cdi=5916&_pubType=J&_ 9-14. Disponível em: <http://web.ebscohost.com/ehost/
auth=y&_acct=C000037882&_version=1&_urlVersion=0&_useri results?vid=2&hid=108&sid=aebe8dbf-950b-4fbb-856d-
d=687353&md5=6de18af8d4e77570867092786bc01349>. Acesso 004aa4ae0ac9%40SRCSM2&bquer y=(JN+%22Journal+of
em: 18 dez. 2008. +Academic+Librarianship%22+and+DT+19970101)&bda
ta=JmRiPWxpaCZ0eXBlPTEmc2l0ZT1laG9zdC1saXZl>. Acesso
O’SULLIVAN, C. Is information literacy relevant in the real world? em: 29 out. 2008.
Reference Services Review, v. 30, n.1, 2002, p. 7-14. Disponível em:
<http://www.emeraldinsight.com/Insight/viewContainer.do;jsess THORNTON, S. Pedagogy, politics and information literacy. Politics,
ionid=0EFCE9F66518FD6EE8826F5252FE2D77?containerType v. 28, n.1, 2008, p.50-56. Disponível em: <http://www3.interscience.
=Issue&containerId=17849>. Acesso em: 22 out. 2008. wiley.com/journal/119400568/issue> Acesso em: 26 fev. 2009.
REECE, G.J. Critical thinking and cognitive transfer: impication WARD, D. Revisioning information literacy for lifelong meaning. The
for the development of online information literacy tutorials. Journal of Academic Librarianship, v. 32, n. 4, Jul. 2006, p. 396-402. <http://
Research Strategies, v. 20, 2007, p. 482-493. Disponível em: <http:// www.sciencedirect.com/science?_ob=ArticleURL&_udi=B6W50-
www.sciencedirect.com/science?_ob=ArticleURL&_udi=B6W60- 4K66F25-4&_user=687353&_coverDate=07%2F31%2F2006&_
4N6Y5J41&_user=687353&_coverDate=12%2F31%2F2005&_ rdoc=1&_fmt=&_orig=search&_sort=d&view=c&_
alid=890474669&_rdoc=32&_fmt=high&_orig=search&_ acct=C000037882&_version=1&_urlVersion=0&_userid=68735
cdi=6584&_sor t=d&_docanchor=&view=c&_ct=141&_ 3&md5=9f38e96fa442024a88d1ba6789d1e910 >. Acesso em: 22
acct=C000037882&_version=1&_urlVersion=0&_userid=68735 out. 2008.
3&md5=a03bbf507cf61a74179a565971622e58>. Acesso em: 15
fev. 2009.