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MUDANÇAS NO CONTEXTO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL:

UMA TENDÊNCIA AO ENSINO COLABORATIVO

Nelson Colossi*
Aldo Consentino**
Etty Guerra de Queiroz***

RESUMO
Este trabalho insere-se na linha atual de preocupações advindas de uma
sociedade em constante transformação, como conseqüência dos caminhos
tomados para o desenvolvimento, particularmente sobre as mudanças que
ocorrem nas Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil. Tem como
perspectiva a exposição e discussão das transformações que afetam estas
instituições, tomando como base a compreensão do modelo de campo de
forças de Lewin. Buscou-se observar a configuração do campo de forças
nas IES, bem como das transformações em curso, para finalmente chamar
a atenção para uma tendência dentro do campo de força das instituições,
* Administrador de Empresas pela
que se concentra na propagação do ensino colaborativo. Universidade Federal do Rio Grande
do Sul ( UFRGS ), Doutor em
Palavras-chave: IES, mudanças organizacionais, ensino colaborativo. Administração Universitária pela
George Washington University.
Professor no Curso de Mestrado e
Doutorado em Administração da
Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC).
ABSTRACT E-mail: colossi@cse.ufsc.br
** Engenheiro Eletricista pela Universidade
Societies transforming itself as a consequence of the direction choosen Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
for its own development. It is worried about the changes that occur within Doutorando em Engenharia da
Produção pela Universidade Federal
the upper-education institutions in Brazil (IES).This work focus on these
de Santa Catarina (UFSC).
changes, having as perspective the presentation and quarrel of the hashings E-mail: ac@cse.ufsc.br
and their effect over these institutions. By observing the Lewin‘s Field
*** Administradora de Empresas pela
of forces, as well as of the occurring changes and finally, pay attention to Universidade Federal de Viçosa
the tendencies within the Field of forces, which concentration in itself is (UFV), Mestranda em Administração
the growing of the collaborative learning. pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC).
Key words: IES, organization changes, collaborative learning. E-mail: egqueiroz@bol.com.br

Rev. FAE, Curitiba, v.4, n.1, p.49-58, jan./abr. 2001 49


INTRODUÇÃO valorização do ser humano e do espírito passa a ser a
própria essência da vida. Este rápido panorama
Analisando-se a sociedade atual, observam-se evidencia a importância da Educação Superior no país,
transformações que incitam mudanças profundas na vida que, indubitavelmente, é uma das mais respeitadas
humana individual e associada. O indivíduo nasce, instituições sociais. A busca e o acesso a oportunidades
educa-se, trabalha e passa a vida ligado a organizações, de ingresso no ensino superior representam valores
e estas, na realidade, são responsáveis pela consistência importantes na sociedade brasileira.
do destino social. Este artigo pretende mostrar as formas de
A dinâmica e a velocidade cada vez maior das conscientização e atitudes que revelam as mudanças
mudanças sociais, políticas, econômicas e culturais emergentes no sistema de ensino superior no Brasil.
da sociedade moderna caracterizam o que se Sua discussão central será fundamentada na visão de
convencionou chamar de “novo milênio”. No passado LEWIN (1965) sobre campo de forças que geram
as mudanças significativas na vida humana exigiriam mudanças, como pressuposto para entender a
no mínimo o tempo correspondente a uma geração essência destas transformações.
para ocorrer. Gradativamente passaram a ser imprevi-
síveis. Trata-se da “era da incerteza”, conforme 1 PANORAMA GERAL
denominou GALBRAITH (1976) ou, ainda, da “era de
descontinuidade”, como classificou DRUCKER (1974). A educação é um processo social que muitas vezes
O sentido de “novo milênio” identifica-se, assim, envolve grupos pequenos, como a família, ou grandes,
com as transformações globais que caracterizam o como a comunidade. Os processos educacionais
mundo moderno. Informatização, globalização e dependem muito do estado em que se encontra, de
sociedade do conhecimento são alguns fatores que maneira geral, o corpo social. O fato é que toda mudança
estão pressionando o status quo da vida atual. Como na estrutura política, econômica, social deste grupo mais
decorrência, tem-se a consolidação da sociedade do amplo influencia na educação. Segundo LEWIN (1965),
conhecimento. Sobretudo mudanças profundas de é muito mais fácil o grupo mudar a educação do que a
valores e crenças pessoais e culturais marcam a educação mudar a sociedade.
sociedade atual. Tais mudanças no ambiente externo atingem a
Além desses fatores, ou mesmo como conseqüência realidade do Ensino Fundamental, que no Brasil tem
deles, assiste-se à falência do atual modelo econômico- sido objeto de valiosos estudos. Trata-se de assunto
político, preocupado prioritariamente com a tríade: inesgotável, porém falta, em sua maioria, uma análise
tecnologia – consumo – lucro, e desatento às questões satisfatória no contexto da Constituição de 1988,
ecológicas e ambientais. Até então o ser humano se especialmente após a Emenda Constitucional n.º 14,
depara com a realidade de ser um animal capaz de de setembro de 1996, que introduziu alterações nos
gerar desequilíbrios significativos no meio ambiente. Tem artigos pertinentes a essa matéria. Importa saber da
percebido que seu comportamento demonstra que, principal finalidade do Ensino Fundamental, enfocando
dentre os animais existentes, é o único que não consegue o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para
viver em equilíbrio com o meio ambiente. Para o meio o exercício da cidadania e sua qualificação para o
ambiente o homem é o maior agressor. Ele nasce, cresce trabalho. Institucionalmente, são três as finalidades do
e se multiplica dentro de um ambiente do sistema, supre ensino: contribuir na formação da personalidade do
todas as energias de que necessita, danificando o educando, tanto do ponto de vista físico quanto ético;
ambiente, e depois muda de lugar. Assim, dentre as oferecer-lhe consciência de seu papel na sociedade
mudanças de que se falou aqui, presentes na atualidade, para o devido exercício da cidadania; e ministrar-lhe
está a conscientização da necessidade de manutenção os ensinamentos exigidos em nossos dias,
do equilíbrio com a natureza. possibilitando-lhe acesso aos postos de trabalho, num
Sobretudo é a dinâmica do controle da vida sistema de produção cada vez mais automatizado.
humana institucional e associada que mais surpreende. Assim, o Ensino Fundamental se destina à
Mudanças de valores e crenças pessoais e culturais formação integral da criança, e não apenas à sua
apontam para uma nova visão de mundo, em que a informação relativamente às diversas formas de

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conhecimento teórico e prático. Pois, de acordo com A Universidade é um exemplo de instituição que
as palavras de REALE (2000), nada é mais perigoso faz parte desse sistema, cabendo-lhe o compromisso
do que a oferta excessiva e indiscriminada de de gerar o saber, o qual está relacionado com a
informações. Trata-se de discutir as finalidades verdade, justiça, igualdade e com o belo. A verdade,
essenciais do ensino, para que se chegue a conclusões como base para a construção do conhecimento; a
mais certeiras, no que diz respeito a sua implementação. justiça, em que se ampara a relação entre os homens;
a igualdade, porque é parte fundamental na consecução
2 A EDUCAÇÃO SUPERIOR COMO da estabilidade social; e a beleza, como um instrumento
através do qual se expressam sentimentos, o que diminui
INSTITUIÇÃO SOCIAL
a superioridade do apelo racional que é parte das
No que se refere ao ensino superior essa situação opções de busca do homem.
permanece. Muitas vezes tal discussão apresenta um
caráter paradoxal. Quando observadas as normas e leis 3 EVOLUÇÃO E PROJEÇÃO DO ENSINO
que o regulamentam vêm inúmeras reflexões, devido às SUPERIOR NO BRASIL
várias formas de interpretação dadas pelos interessados
na matéria. Suas propostas de implementação refletem O interesse da sociedade pela educação superior
a resistência que existe em função da necessidade de tem aumentado significativamente. Na realidade, pode-
acompanhar os modelos de visão que atendem aos seus se dizer que a história do progresso humano coincide
interesses. Apesar de pressões da Lei de Diretrizes e com a história dessas instituições.
Bases de 1996, das mudanças globais, de transformações No Brasil, a educação superior é parte integrante
na percepção quanto à qualidade de ensino, há uma da história da sociedade brasileira. A literatura mostra
tendência à manutenção das características atuais do que a chegada da Família Real Portuguesa em 1808,
ambiente ligado ao ensino superior, pois sua estrutura de fugindo das forças napoleônicas, foi a razão inicial
poder é composta por diferentes blocos de interesse. para a criação das primeiras escolas superiores
Nas raízes da expansão do ensino superior, observa-se brasileiras, devido principalmente a pressões
a predominância dos critérios de busca de atendimento exercidas pelas elites da sociedade de forma geral.
de necessidades voltados para o mercado, ou seja, Alguns levantamentos revelam o aparecimento das três
prevalecem critérios econômicos. Ocorre, assim, a primeiras instituições de ensino superior no Brasil:
comercialização do ensino superior, a predominância de Escola de Medicina do Rio de Janeiro, Escola de
critérios utilitaristas, com o prejuízo de ações que Medicina da Bahia e Escola de Engenharia e Arte
privilegiem os aspectos sociais e o atendimento aos Militar do Rio de Janeiro.
interesses de um pequeno grupo. Cabe discutir a forma Algumas datas ilustram, também, a trajetória da
de compreensão empregada ao ambiente de Educação educação superior no Brasil. Em 1827 foram criados
Superior, que deve ser muito mais do que a simples os Cursos de Ciências Jurídicas em São Paulo e em
categorização do status educacional de um indivíduo. Olinda. Em 1889, a República se desenvolve com a
A educação superior é uma instituição social, cujo criação de 14 Escolas Superiores. A Universidade de
papel fundamental é formar a elite intelectual e científica Manaus, criada em 1909, mostrou a força do ciclo da
da sociedade a que serve. Uma instituição social borracha e, em 1912, a Universidade do Paraná, no
caracteriza-se pela estabilidade e durabilidade de sua contexto do ciclo do café. Posteriormente foram criadas
missão. Além disso, é estruturalmente assentada em a Universidade do Rio de Janeiro, em 1920, de Minas
normas e valores emanados do grupo ou sociedade em Gerais, em 1927, de São Paulo, em 1937, e, em 1961,
que se insere. Uma instituição social é, fundamentalmente, a Universidade de Brasília.
um ideal, uma doutrina. Assim, a educação superior é Hoje, o ensino superior no Brasil viabiliza-se em
uma instituição social, estável e duradoura, concebida a cerca de 900 instituições de ensino. Pouco mais de
partir de normas e valores da sociedade. É, acima de uma centena é constituída como universidade. As
tudo, um ideal que se destina, enquanto integrador de demais são estabelecimentos isolados de ensino
um sistema, à qualificação profissional e promoção do superior ou federações de escolas integradas. Segundo
desenvolvimento político, econômico, social e cultural. dados oficiais do Ministério da Educação de 1994,

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existem quase 2.000.000 de alunos matriculados em social e cultural. Neste novo cenário, as IES passam a
cursos de graduação e pós-graduação no Brasil. As representar a fonte de propostas para superar desafios
universidades – federais, estaduais e municipais – de desenvolvimento social e econômico.
abrigam menos de 50% dessas matrículas. Ocorrem, portanto, mudanças na sociedade, e
A expansão do ensino superior até 1994, no mudam com isto as formas de comunicação. VELOSO
Brasil, tem traços de qualidade insuficiente, resultado (1999) ressalta o oportunismo dos meios de
de um processo de crescimento destituído de comunicação como a principal instituição socializadora
avaliações das instituições e cursos. A marca do dos tempos atuais, dado que por eles é controlado todo
ensino superior nesta fase é dada pelo caráter elitista o funcionamento social. Com as mudanças na forma
do setor público, que restringe o número de vagas de obtenção de informação, muda a necessidade de
oferecidas no período noturno. O cidadão que produção, comercialização e, por conseguinte, a oferta
trabalhasse, em sua maioria integrante da população no mercado de trabalho. Isto denota o caráter flexível
de menor renda, teria oportunidade de acesso apenas que deve ser exigido também das instituições de ensino
às instituições privadas, com qualidade inferior. superior, que no caso do Brasil enfrentam dificuldades
VAHL apud HAWERTOOD (1999) designa devido à rigidez da estrutura. Os estudantes, no Brasil,
como oportunista a fase de expansão do ensino superior necessitam de instituições que atendam a sua
das décadas de 60 a 90, incentivada pela crescente necessidade de formação sintonizada com a nova
demanda e pelas facilidades propiciadas pelo governo configuração do mercado de trabalho.
nos projetos de investimento em ensino superior, em
que este ingressa no campo da comercialização. Ocorre 4 ENFOQUE SOBRE MUDANÇAS
que a expansão se deu sem o devido planejamento; a
explosão de crescimento destas instituições aconteceu A grande contribuição da teoria de campo de
segundo critérios econômicos. Como prova disto têm- LEWIN (1965) não está compreendida na sua
se as instituições que surgiram para suprir uma qualidade de proposição formal, mas na habilidade que
expectativa ou necessidade da sociedade local ou ela concede na construção de modelos de processos
regional. Surgem pelo interesse de atuar em áreas que despertam a atenção para certo tipo de variáveis
geográficas economicamente atrativas para o que necessitam ser conceitualizadas e observadas.
empreendimento em questão. A partir da utilização da teoria de Lewin pode-
O principal desafio era reconhecer a necessidade se compreender a dinâmica dos processos de
de avaliação das instituições e apontar novos rumos mudança. Nesse sentido, a teoria de campo criada
para a busca de conhecimento. Na troca de valores por Lewin é caracterizada como um método para
identificada pelos responsáveis pela educação no País, analisar relações causais e estabelecer condições de
o ensino superior, mediado pelo processo adequado descrever estas mesmas relações. Como exemplo
de aprendizagem, deve ter sua estrutura de pode-se citar a idéia de que, para decidir qual a
planejamento remodelada. Segundo dados melhor forma de realizar uma mudança, não é
apresentados em 1999 pelo Ministério da Educação, suficiente considerar uma única propriedade e, sim,
os planos de governo a partir de 1995 seriam deve-se examinar o ambiente como um todo.
orientados pelos princípios de expansão, Assim, uma vez que o comportamento é
diversificação do sistema, avaliação, supervisão, compreendido como uma mudança de algum estado
qualificação e modernização. de um campo de força num determinado tempo,
É sempre preciso observar que nas transformações transpõe-se este raciocínio para as organizações e
econômicas é que se encontram regras e padrões para observa-se que o comportamento organizacional é a
a adequação do ensino. A educação dos tempos atuais resultante entre a relação que há entre as barreiras e as
relaciona-se profundamente com um “campo de forças” habilidades para transpô-las. Para compreender isto é
ligado ao futuro. MENEZES (1983) considera que a importante a utilização do conceito de campo de força
busca pela educação reflete a crença disseminada na que envolve os fatos dentro da organização e, também,
função de instrumento de qualificação profissional e de entender as forças resultantes deste campo de forças.
promoção de desenvolvimento político-econômico, Desse modo, para compreender a mudança na estrutura

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do conhecimento ou nas informações, é necessário da seguinte forma: o sistema social é dividido em
empreender estudos sobre todas as forças que partes, segundo a forma de associação dos padrões,
favoreçam a construção de um conceito. atitudes e expectativas e normas de comportamento.
Nas mudanças organizacionais, ou seja, em que Observando instantes de mudança, de LEWIN
o campo de força tende para uma resultante, qual (1965), nota-se que eles podem ser divididos em três
seja, melhoria de desempenho, aumento de fases: ruptura do estado estável inicial, depois um
produtividade ou reorganização administrativa, existem período de turbulência com probabilidade de
forças de impulso e forças de reação contrárias a estes adaptação e, finalmente, um período de consolidação
impulsos ou a essas mudanças. LEWIN (1965) da mudança em uma nova circunstância de
adverte que as forças impulsionadoras podem estabilidade. LEWIN (1965) trabalhou a idéia de que
despertar e ativar as forças de restrição, e é por isto o status quo representa um equilíbrio entre a barreira
que nem sempre as forças impulsionadoras são as de mudanças e as forças que estão favorecendo estas
que melhor proporcionam aumento do desempenho mudanças, isto desde o ano de 1928, data em que
organizacional. Muitas vezes é a redução das forças consagrou sua Teoria de Campo. Ele acreditava que
restritivas o meio mais eficaz de encorajar mudanças uma diferença entre as forças pelo enfraquecimento
e aumentar o desempenho da organização. do estado das barreiras ou um fortalecimento da
Baseando-se nesta teoria, pode-se afirmar que direção das forças é o suficiente para produzir um
um programa de mudança planejada destina-se a criar abalo que desencadeia o início da mudança.
ou aumentar as forças impulsionadoras de mudança na
organização e, ao mesmo tempo, remover ou 5 CAMPO DE FORÇAS EM IES NO BRASIL:
enfraquecer as forças restritivas ou de resistência a
EM BUSCA DA TRANSFORMAÇÃO
mudanças. As forças impulsionadoras são
representadas pelas mais variadas estratégias de Na figura 1, a seguir, que relaciona a situação das
mudança e inovação organizacional, enquanto as forças forças de mudanças no ensino superior no Brasil, há
restritivas podem ser reunidas para fim técnico didático, uma representação da situação onde se encontram
em três grupos básicos: a) forças oriundas da cultura tensões/forças que são geradas pelas necessidades
organizacional; b) forças impulsionadas por interesses relacionadas aos acontecimentos ligados à educação
pessoais; c) forças oriundas de percepções diferentes superior no Brasil, bem como às transformações
de objetivos da organização. As forças de restrições políticas, sociais e econômicas que ocorrem e suas
representadas por valores, cultura e interesses pessoais correspondentes resistências. As forças que tendem
(que guiam e influenciam os comportamentos dos para uma locomoção, ou seja, as forças impulsionadoras
indivíduos) atenuam a força impulsionadora. do campo de forças do ambiente das IES, também
LEWIN (1965) é o responsável pelo conceito correspondem a novas frentes de necessidades
de resistência a mudanças. Entretanto, seu modelo é reconhecidas pelo próprio ambiente.
muito diferente do que é utilizado nos dias atuais. Tal Analisando o campo de forças das IES, fica clara
conceito foi desenvolvido baseado na pessoa como a existência de forças que impulsionam as mudanças
um campo complexo de energias no qual todo em seu ambiente interno, conforme mostra a figura,
comportamento é concebido através da mudança em dentre as quais pode-se citar: a) a nova Lei de
algum estado do campo. Para o autor, a resistência a Diretrizes e Bases, que estabelece critérios para
mudanças pode ocorrer e deve vir de algum lugar credenciamento e descredenciamento; b) o provão,
dentro do sistema. Isto vem ao encontro das idéias como uma forma de avaliação de desempenho nos
de KOTTER (1997), segundo o qual há possibilidade cursos; etc.) a avaliação institucional, que em conjunto
para a resistência estar localizada de forma individual, oferece garantias de expansão do ensino com
mas isto é muitas vezes mais provável de ser qualidade e qualificação do docente e pessoal técnico-
encontrado em qualquer lugar do sistema. Uma breve administrativo. No cenário econômico têm-se: perda
revisão do trabalho de LEWIN é necessária para do poder aquisitivo da classe média; modificações
avaliar sua perspectiva. Alguns autores descrevem a de valores sobre o ensino superior; competição entre
forma de mudança organizacional e social de LEWIN novas instituições e aumento de custos da educação.

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FIGURA 1 - FORÇA DE MUDANÇAS NO AMBIENTE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

FORÇA DE RESISTÊNCIA FORÇA DE MUDANÇAS

NOVA LDB

SITUAÇÃO ATUAL
RESISTÊNCIA NATURAL A MUDANÇAS
Credenciamento e recredenciamento
Provão
Avaliação institucional DEFESA DE INTERESSE DE GRUPOS,
Qualificação docente e do pessoal técnico- PRIVILÉGIOS PESSOAIS E
administrativo INSTITUCIONAIS

NOVO CENÁRIO SÓCIO-ECONÔMICO

Perda do poder aquisitivo da classe média

Mudança de valores sobre ensino superior


MEDO DE ACOMPANHAR NOVAS
POSTURAS EDUCACIONAIS
Competitividade entre instituições nacionais de ensino

Custos crescentes da educação

GLOBALIZAÇÃO

Influências mundiais no sistema educacional

Competição entre instituições de ensino internacionais MEDO DE ACOMPANHAR


NOVAS POSTURAS
Novos interesses: IES como empreendimento EDUCACIONAIS

Inovações tecnológicas no ensino

CONCEPÇÃO DE QUALIDADE
MEDO DE ACOMPANHAR
Cultura da qualidade em educação superior NOVAS POSTURAS
EDUCACIONAIS
Ênfase no ensino centrado do aluno

Valorização da pesquisa e extensão


CONSERVADORISMO INGÊNUO
Ensino superior como instituição social

FONTE: Elaboração dos autores

Acresce-se a isto o aparecimento de novas nuanças conexão de tráfego de dados, favorecendo o usuário
políticas que acompanham o processo de globalização, em termos da qualidade em educação superior.
exercendo influência direta no sistema educacional. As mudanças organizacionais atingem
As trocas decorrentes da internacionalização dos subsistemas dentro da sociedade, relacionados com
mercados podem se constituir na competição de a estrutura, cultura, tecnologia, ambiente e pessoas.
instituições internacionais de ensino superior passando Mudar seria alterar as variáveis estruturais e os
a ser tratadas como um empreendimento, muitas vezes aspectos que se relacionam com elas. Na tecnologia,
em detrimento do seu objetivo mais comum. Há obtêm-se mudanças pelas alterações no processo de
também, entre as forças impulsionadoras da trabalho, no produto e em equipamentos. O ambiente
globalização, as inovações tecnológicas do ensino, organizacional pode sofrer mudanças pela troca de
como a Internet, que, de acordo com pesquisas do local de trabalho, entre as pessoas dentro da empresa,
Instituto Brasileiro de Pesquisa (2000), vem sendo por alterações em suas atitudes, comportamentos,
intensificada pelo crescimento na adoção de habilidades e perspectivas. No subsistema social
computadores e pelo aumento na velocidade de denota-se a possibilidade de mudanças de valores,

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comportamentos, normas e cultura. Ressalta-se que, encontram dificuldades para atuar no mercado de
no caso da cultura, deve haver uma reserva na medida trabalho. Para o autor, o mercado “vive uma constante
em que, conforme RIBEIRO (1969), trata-se de uma evolução (obrigatória, pela competitividade dos dias
réplica conceitual da realidade que é transmitida de hoje) que não foi acompanhada no decorrer da
através de símbolos de geração a geração. Assim, educação desse novo profissional”. (1999, p.2).
torna-se mais fácil mudar a estrutura do que a cultura, PALDÊS (1998) concorda com esses argumentos,
uma vez que esta exige uma reformulação nos valores ao afirmar que uma das finalidades do ensino superior é
centrais da organização. constituir-se na etapa final da formação cultural e
A compreensão da dinâmica do processo de profissional do cidadão, endereçando-o para as funções
mudanças dentro das organizações, e especificamente de investigação científica, produção e difusão do
no caso das IES, revela os caminhos possíveis para conhecimento. Todavia, o recém-graduado subitamente
uma redução nas barreiras impostas, pois atribui um vê-se em um mundo onde a globalização, a
maior domínio da situação pelo conhecimento do todo. instantaneidade das comunicações e os modernos
Assim acontece quando se reconhecem as tensões recursos tecnológicos eliminaram os limites geográficos,
ou forças ligadas às necessidades relacionadas à estabelecendo novos parâmetros geopolíticos, que
educação superior no Brasil. É o caso da busca por geram rápidas e profundas transformações, cada vez
uma maior flexibilidade no sistema de ensino, que na mais aceleradas e bruscas.
atualidade exige uma reformulação para a adequação Autores, entre os quais pode-se citar CAMPOS
das necessidades impostas. et al. (citado em MONTEIRO , COSENTINO e
MERLIN, 2000), afirmam que essa nova configuração
tende a ser desenvolvida a partir de três ambientes
6 A UNIVERSIDADE DO PRÓXIMO MILÊNIO: distintos, caracterizados pela conexão, colaboração e
ENSINO COLABORATIVO comunicação. O ambiente conectivo possibilita
conexões rápidas e flexíveis entre indivíduos, grupos e
Muito se tem falado de novas modalidades de sociedades. Já o ambiente colaborativo permite a
ensino, criadas através da utilização de tecnologias utilização das conexões para a resolução conjunta de
de última geração. Qualquer tecnologia dentre as problemas e a produção de novos conhecimentos. E,
existentes, mesmo as mais antigas, apresenta por fim, o ambiente comunicativo permite a construção
vantagens e desvantagens, afetas a cada situação em de um significado mútuo para os novos conhecimentos.
particular, sem que haja um claro predomínio em Todo esse novo contexto educacional é
termos de eficácia. O problema não reside enfatizado por MASON (1998), quando estabelece
especificamente na tecnologia, senão na forma de que as tendências ou correntes ligadas ao ensino na
ensino: evidências no sentido da caracterização de educação superior são grandemente influenciadas pela
uma nova Universidade, com novas modalidades importância da interatividade no processo de
pedagógicas de ensino e aprendizagem sendo aprendizagem. Para o autor, tais requerimentos tendem
propostas (MONTEIRO, COSENTINO e MERLIN, a promover uma mudança de regras, que transforma
2000; WOODS JR. 2000; CENA, 2000). o professor de ‘sábio’ em ‘guia’, gerando, com isso,
Para muitos estudiosos, como WOODS JR. a necessidade de desenvolver habilidades ou
(2000), a estrutura de ensino e a formação profissional competências para a gestão do conhecimento e para
nacional são geralmente precárias, não tendo o trabalho em grupo. Tais especificidades propiciam
condições de acompanhar as exigências de mudanças a chamada aprendizagem cooperativa.
ocorridas no mercado de trabalho. Isto se considerados Portanto, a mudança tenderá a ocorrer também
o distanciamento entre o conteúdo das disciplinas, por meio da experiência do professor ou instrutor.
constante nos currículos, e a velocidade das Nesse caso, o professor transforma-se em condutor,
transformações nos vários campos do conhecimento em bandeirante ou desbravador de conhecimentos.
científico e tecnológico, característica da atualidade. Associado a esse novo papel exige-se a configuração
Sobre o tema, FERREIRA (1999) destaca que os de novas tendências ou correntes pedagógicas, que
profissionais graduados costumam ter uma formação efetivamente representem transformações similares,
diferenciada das demandas da realidade. Portanto, não só nos alunos (ou aprendizes, como se quer hoje),

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mas, principalmente, na qualificação dos professores. A Internet combina interatividade com fotos,
Desejam-se professores e alunos que interajam nesse áudio, video e texto impresso; utiliza hiperlinks para
ambiente colaborativo como verdadeiros construtores reforçar conhecimentos ou apresentar explicações;
de disciplinas, num processo evolutivo que transforma permite que sejam efetuadas avaliações on-line. Enfim,
a disciplina, adequando-a às necessidades do como bem destaca SANGSTER, citado por LEE,
ambiente. Os professores, atuando como verdadeiros GROVES e STEPHENS (1996), esse instrumento
tutores dos alunos, e os alunos, transformando-se de representa um novo conceito em tecnologia: a livraria
simples receptores passivos do conhecimento em em sua mesa de trabalho, o dicionário em seus dedos,
solucionadores de problemas, construirão um todo o som em seus ouvidos. Não há nada que possamos
agindo diretamente na construção da disciplina e no ver ou ouvir que não possa ser disponibilizado por ela.
perfil profissional dos alunos. Finalmente, trata-se de um recurso que está se
Neste ambiente de constante mudança e tornando cada vez mais presente, tanto nos escritórios
aperfeiçoamento, a Universidade deve contar com o quanto nas indústrias, ou mesmo em residências. A
apoio maciço de técnicas de comunicação, tais como Internet dependerá do uso de computadores a ela
videoconferência, Internet e programas correlatos, conectados, e este recurso está sendo alvo de
como correio eletrônico e chats. inúmeros projetos de popularização e difusão por
parte dos governos, como incentivos, financiamentos,
7 A INTERNET COMO FERRAMENTA ou mesmo a simples disponibilização, a usuários, de
ESSENCIAL equipamentos pertencentes a órgãos públicos ou
privados como o SENAC, SENAI ou SEBRAE, por
O uso da Internet já está bastante disseminado exemplo. Este aspecto contribuirá substancialmente
como ferramenta de ensino, permitindo a oferta de para as alterações que estão sendo propostas, uma
cursos a distância e, em casos mais simples, o apoio vez que se estará ampliando de forma acentuada o
a atividades presenciais, apesar de não se constituir acesso à universidade por alunos dela separados pelo
em um meio completo, pois embora possa utilizar tempo, pela distância ou por outras circunstâncias.
videos, áudios e textos, não o faz tão eficientemente
quanto o videocassete, a televisão ou os livros. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por que, então, usar a Internet para o ensino?
Porque ela apresenta duas vantagens principais sobre Embora se fale sobre o conceito de campo de
os demais tipos de mídia (MCMANUS, 1995): em forças, relacionado à mudança, é importante compreender
primeiro lugar, ela combina as vantagens dos demais que, em sua essência, o campo de forças não descreve
tipos; por exemplo, apresenta recursos de som e video as mudanças. Na verdade é utilizado para representar o
melhor que qualquer livro, é mais interativa que qualquer estado da distribuição das forças no espaço.
videocassete e, finalmente, pode reunir, com baixo Ocorrem mudanças na sociedade, transformam-
custo, pessoas dispersas geograficamente. A segunda se as formas de comunicação, obtenção de informações,
vantagem é que, sem dúvida, é o recurso que possibilita as formas de produção, comercialização, e, por
a maior quantidade e diversidade de informações no conseqüência, muda a oferta no mercado de trabalho.
mundo atual. Através dela é perfeitamente possível Nesse contexto, o jovem que deseja qualificar-se
incorporar em um curso toda a informação disponível profissionalmente tem dificuldades, pois a estrutura da
na rede. Por exemplo, ao se projetar um módulo para formação em nível superior do País é rígida. Este jovem
o ensino de Administração da Produção, pode-se incluir necessita, assim, de uma instituição que ofereça
links para indústrias ou federações, sites com formação compatível com a nova configuração do
informações sobre técnicas de kanban ou filosofia just- mercado de trabalho.
in-time, links para sites contendo estatísticas de No mundo atual, a universidade deve atender à
produção setoriais, simuladores de produção, etc. Este demanda por mudanças solicitadas por um meio
tipo de acesso imediato a informações e recursos não ambiente cada vez mais agressivo, devendo buscar
é possível em qualquer dos tipos de mídia existentes, manter sob controle as resistências à sua implantação,
e, segundo o autor, isso constitui realmente uma de forma a privilegiar abordagens que se aproximam
vantagem estratégica. à do ensino colaborativo.

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REFERÊNCIAS

CENA, Johanna AND. Bridging gaps between cultures, classrooms and schools: a close look attn online collaborative
learning. Disponível em: http://www.ifets.ieee.org/periodical/vol.3 2000/d01.html
DRUCKER, P.F. Uma era de descontinuidade. Rio de janeiro: Zahar,1974.
FERREIRA, Marcelo. Ensino a distância pela Internet. 1999. Disponível em: http://www.geocities/WallStreet/7939.
GALBRAITH, Jonh Kenneth. A sociedade justa: uma perspectiva humana. Rio de Janeiro: Campus,1976.
INSTITUTO BRASILEIRO DE PESQUISA. Estatística do ensino no Brasil. Jul. 2000. Disponível em:
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KOTTER, P. John. A escolha de estratégias para mudanças. São Paulo: Nova Cultural, 1997.
LEE, Stuart; GROVES, Paul; STEPHENS, Christopher. Internet teaching: existing tools & projects for on-line teaching.
1996. Disponível em: http://info.ox.ac.uk/jtap/reports/teaching.
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Rev. FAE, Curitiba, v.4, n.1, p.57-58, jan./abr. 2001 57


Avaliação e aprendizagem
na educação superior
JOE GARCIA*

RESUMO
Este artigo apresenta uma análise teórica sobre as relações entre avaliação e aprendizagem
na educação superior. Tendo por base a perspectiva fornecida por um conjunto de pesquisas
a respeito da avaliação no contexto do ensino universitário, analisamos a influência que as
práticas de avaliação exercem sobre a abordagem dos alunos em relação à aprendizagem.
Também exploramos o conceito de estilo de pensamento, fundamentados nos escritos de
Sternberg (1997). Ao final, tecemos algumas considerações acerca da importância das escolhas
avaliativas exercidas pelos professores que atuam na graduação.
Palavras-chave: ensino superior, avaliação da aprendizagem.

RESUMEN
Este artículo presenta un análisis teórico sobre las relaciones entre evaluación y
aprendizaje en la enseñanza superior. Teniendo como base la perspectiva suministrada
por un conjunto de investigaciones sobre la evaluación en el contexto de la enseñanza
universitaria, analizamos las influencias que las prácticas de evaluación ejercen sobre
el abordaje de los alumnos en relación al aprendizaje. También exploramos el concepto
de estilo de pensamiento, a partir de los escritos de Sternberg (1997). Al final, tejemos
algunas consideraciones acerca de la importancia de las elecciones evaluativas realizadas
por el profesor que se desempeña en la graduación.
Palabras clave: enseñanza superior, evaluación del aprendizaje.

* Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná


(joe@sul.com.br).

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 201
ABSTRACT
This article presents a theoretical analysis of the relationship between assessment and learning in
higher education. Based on the perspective provided by a set of research projects on assessment
in higher education, we analyze the influence that assessment practices exert on the students’
approach to learning. Also, we explore the concept of thinking styles, based on the writings by
Sternberg (1997). Finally, we dedicate some thoughts to the importance of teachers’ assessment
choices at the undergraduate level.
Keywords: higher education, learning evaluation.

202 • Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009
INTRODUÇÃO
Um observador atento à mídia internacional, nas últimas duas décadas, por
certo, percebeu importantes mudanças na educação superior, em diversos países. A
Conferência Mundial sobre Educação Superior, realizada em Paris, pela Unesco, no
final dos anos 90, afirmou um processo de transformação universitária em todo o
mundo (Bernheim; Chaui, 2008, p. 27). O conhecimento na sociedade contempo-
rânea e as expectativas das nações em relação a um futuro econômico desejado, por
exemplo, têm exercido papéis importantes na produção dessas transformações. De
modo ainda mais amplo, esse movimento está relacionado às profundas mudanças
sociais, econômicas e culturais, no qual a universidade é chamada a rever teorias,
modelos, conceitos e práticas. Nesse cenário, destacamos a importância de investi-
gar e repensar a avaliação da aprendizagem na educação superior.
No centro das mudanças na educação superior estaria o desafio de redesenhar
o currículo, pois as mudanças ali configuradas indicariam a medida efetiva de
transformação realizada em qualquer instituição universitária (Bernheim; Chaui,
2008, p. 31). A arquitetura do currículo precisa considerar diversas questões; en-
tretanto desejamos, neste artigo, destacar e analisar a relação entre avaliação e
aprendizagem. Conforme argumentamos mais adiante, as práticas avaliativas uti-
lizadas pelos professores na graduação, por exemplo, podem influenciar o desen-
volvimento dos estudantes.
Há outros avanços a serem introduzidos nos currículos da educação superior.
Deseja-se, por exemplo, currículos capazes de delinear experiências de aprendiza-
gem por meio das quais os estudantes cultivem o pensamento crítico e reflexivo,
desenvolvam capacidades de elaboração teórico-conceitual, aprendam a resolver
problemas complexos, e que elaborem competências coerentes às novas exigências
do mundo do trabalho. Mas as transformações desejadas no currículo devem in-
cluir, entre outros itens, uma revisão nos fundamentos e nas práticas de avaliação da
aprendizagem dos educandos desse nível de ensino.
As transformações na educação superior não podem ser separadas das mudanças
nas ideias e práticas que a constituem, bem como dos sujeitos que ali encontramos.
Além disso, uma vez que essas transformações precisam estar articuladas ao currí-
culo, é importante considerar a centralidade das experiências de aprendizagem –
como são concebidas, desenvolvidas e avaliadas. Isso apresenta diversas implicações,
tais como repensar a própria noção de educação que norteia os currículos dos cursos
na universidade e as diversas práticas pedagógicas exercidas pelos professores, entre
elas a avaliação.

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 203
No cenário amplo da investigação educacional, o debate sobre a avaliação da
aprendizagem na educação superior precisa ainda ser ampliado e atrair um número
maior de interlocutores. Tal como constatado por Chaves (2004, p. 2), apenas re-
centemente, na literatura educacional brasileira, têm surgido trabalhos que discutem
esse tema. Embora esse debate esteja concentrado particularmente nas últimas duas
décadas, as análises realizadas fornecem algumas lições importantes. Se desejamos
que os estudantes desenvolvam um pensamento criativo e reflexivo, por exemplo,
teremos de desenhar um currículo compatível com essa expectativa, o que implica
não somente selecionar novos conteúdos e competências para serem trabalhados
com os alunos, mas repensar de modo amplo os diversos aspectos do processo de
ensino-aprendizagem, incluindo as práticas de avaliação que estamos utilizando no
ensino universitário.
A importância da avaliação no contexto das práticas educacionais é talvez uma
marca de nossa época. Isso reflete a obrigatoriedade dessa prática nos projetos educa-
cionais, em qualquer nível de ensino, bem como a complexidade das questões sobre
avaliação. Assim, por exemplo, como formar indivíduos capazes de elaboração teó-
rico-conceitual, se nossas práticas de avaliação estiverem atentas somente à tarefa de
classificar os estudantes em relação às suas capacidades de reter determinado conjunto
de informações factuais? A avaliação da aprendizagem na educação superior, de modo
geral, ainda deveria avançar das práticas focalizadas que Luckesi (1994) denominou
de “verificação da aprendizagem”. A avaliação precisa ser exercida como uma “produ-
ção de sentidos”, o que não pode estar restrito à utilização de instrumentos que apenas
explicam o passado (Dias Sobrinho, 2008, p. 194). Além disso, a avaliação precisa
guardar relação com as finalidades sociais mais amplas da educação, com o que de-
sejamos no futuro. Finalmente, a adesão a uma ou outra forma de avaliação necessita
ser vista também como um ato moral, pois nossas escolhas qualificam o modo como
vemos e interagimos com nossos alunos (Villas Boas, 2000, p. 150).
Transformar o currículo, desenhar experiências de aprendizagem e decidir sobre
estratégias de avaliação representam alguns dos principais desafios com os quais con-
vivem os professores universitários. Nesse sentido, há várias perguntas que devem ser
consideradas em relação à avaliação. O que avaliar? Como avaliar? Quais os melhores
métodos para avaliar a aprendizagem dos estudantes na graduação, considerando as
diretrizes atuais para a educação superior? Certamente, há diversas formas de respon-
der a cada uma delas. Tais escolhas são complexas e até mesmo subjetivas (Gerard,
2002), que envolvem muito mais que instrumentos e métodos, pois mobilizam valores
e solicitam uma visão bastante ampla sobre o ato de educar.

204 • Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009
Tradicionalmente, as práticas de avaliação da aprendizagem na educação supe-
rior recaem sobre um conjunto limitado de escolhas. Geralmente, tais estratégias
se concentram no uso de procedimentos da “avaliação somativa”, exercidos ao final
de determinado período ou unidade de ensino. Isso implica, por exemplo, a ma-
nutenção de uma antiga e persistente cultura avaliativa que tende a destacar parti-
cularmente a utilização de provas escritas para avaliar o grau de aprendizagem dos
alunos. Além disso, esse reducionismo parece alterar a percepção dos professores
quanto à variedade de atividades que podem ser envolvidas na avaliação, tendo em
mente inferir o desempenho dos estudantes (Depresbiteris, 2004, p. 54). Também
poderíamos questionar se a insistência na utilização da avaliação somativa tem-se
mostrado efetivamente produtiva na educação superior.
É interessante considerar que as formas predominantes de avaliação da aprendi-
zagem na educação superior refletem não somente as escolhas pedagógicas exercidas
pelos professores, mas também as diretrizes curriculares dos cursos universitários,
ou, ainda, de modo mais amplo, a própria cultura institucional que os influencia.
Repensar a avaliação nesse cenário, portanto, é um desafio complexo, que reúne
diversas questões e perspectivas a serem analisadas. Neste artigo, entretanto, desen-
volvemos uma elaboração teórica circunscrita a uma direção determinada. Tendo
por base algumas investigações sobre a avaliação da aprendizagem na educação su-
perior, analisamos a influência que exercem as práticas avaliativas utilizadas pelos
professores sobre o desenvolvimento cognitivo dos estudantes.
O texto está organizado da seguinte forma: inicialmente exploramos algumas
questões sobre a avaliação e aprendizagem na educação superior; em seguida, ana-
lisamos as relações entre avaliação e abordagem de aprendizagem, e estilos de pen-
samento; ao final, apresentamos algumas considerações sobre a importância das
escolhas avaliativas dos professores que atuam na graduação.

RELAÇÕES ENTRE AVALIAÇÃO E APRENDIZAGEM


Há vários níveis de relacionamento entre avaliação e aprendizagem. Diversos es-
tudos sobre a avaliação da aprendizagem na educação superior sugerem a existência
de uma relação estreita entre as práticas de avaliação exercidas pelos professores e
os diferentes níveis de desenvolvimento dos estudantes no decorrer da graduação.
Tais práticas podem influenciar, por exemplo, a natureza das experiências de apren-
dizagem experimentada pelos alunos, como eles se envolvem com os estudos, que
conhecimentos são importantes e como se veem no ensino universitário (Brown;
Bull; Pendlebury, 1997, p. 7).

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 205
Um aspecto central do desenvolvimento cognitivo e social durante a vida aca-
dêmica, na graduação, reside justamente em “tornar-se estudante”, tendo em vista,
inclusive, conquistar espaço e sucesso dentro da comunidade de determinado cur-
so. Nesse processo, os estudantes recebem a influência de diversas fontes e forças
modeladoras, que atuam em seu desenvolvimento cognitivo, bem como em outros
aspectos relacionados ao modo como experimentam e se adaptam às expectativas
da vida acadêmica. Entre elas, destacamos as experiências avaliativas a que são sub-
metidos na graduação.
Com base na análise de várias publicações de pesquisa, a respeito da avaliação
na educação superior, no período entre 1980 e 2002, Struyven, Dochy e Janssens
(2005) argumentam que a avaliação exerce importante influência sobre a aprendiza-
gem dos estudantes. De um lado, as expectativas em relação às estratégias avaliati-
vas utilizadas pelos professores determinam o modo como eles lidam com as tarefas
acadêmicas e se preparam para as atividades de avaliação. Em complemento, as
experiências de avaliação proporcionadas aos estudantes influenciam suas atitudes
futuras em relação à aprendizagem.
As experiências de avaliação são parte importante do currículo, não só na edu-
cação superior como nos demais níveis educacionais. É possível afirmar que tais
experiências avaliativas são formativas sob diversos aspectos. Elas podem influenciar
o modo como os estudantes planejam e utilizam o tempo dos estudos, atribuem
prioridade e significado às diversas tarefas acadêmicas, e, de modo amplo, como eles
se desenvolvem academicamente. Além disso, quando expostos à cultura avaliativa
de determinado curso, e, portanto, sujeitos às rotinas, prioridades e conhecimentos
atrelados a determinadas formas de avaliação, os estudantes tendem a desenvolver
atitudes e práticas em relação à aprendizagem.
Há uma conexão delicada entre o engajamento dos estudantes e suas visões so-
bre a avaliação na educação superior. Alguns estudos mostraram que o modo como
os estudantes tomam notas é influenciado pelas expectativas quanto às formas de
avaliação utilizadas pelos professores (Rickards; Friedman, 1978; Nolen; Haladyna,
1990). As pesquisas de Ramsden (1997, 1981) sugerem que pode haver perda na
qualidade das experiências de aprendizagem de estudantes universitários, em razão
de métodos de avaliação inapropriados e da carga excessiva de tarefas acadêmicas, o
que também encorajaria atitudes superficiais de aprendizagem.
De modo amplo, pode-se afirmar que existe relação entre as formas de avaliação
adotadas pelos professores e as atitudes de aprendizagem apresentadas pelos alunos
na graduação. Diferentes tipos de avaliação tendem a determinar a atitude de apren-

206 • Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009
dizagem dos estudantes; entretanto, ela seria dinâmica e modificável, em função do
contexto de aprendizagem e das práticas avaliativas experimentadas pelos estudan-
tes (Struyven; Dochy; Janssens, 2005, p. 333). Isso destaca o importante papel dos
professores, que podem influenciar a abordagem de aprendizagem adotada pelos
estudantes. No entanto, o conhecimento a respeito das formas como os professores
podem melhor orientar os alunos quanto a suas abordagens de aprendizagem de-
pende ainda de muita investigação.
Na próxima seção, avançamos nossa análise, explorando as relações entre as
práticas de avaliação adotadas pelos professores e as abordagens de aprendizagem
assumidas pelos alunos.

AVALIAÇÃO E ABORDAGENS DE APRENDIZAGEM


Os estudos sobre as abordagens dos estudantes em relação à aprendizagem ini-
ciaram-se formalmente com a pesquisa realizada, há algumas décadas, por Marton
e Säljö (1976). Nesse estudo, eles observaram o modo como um grupo de estudantes
lidava com a tarefa que envolvia a leitura de um texto acadêmico, tendo em vista
responder a determinado conjunto de perguntas sobre ele.
Segundo esses pesquisadores, duas formas distintas de abordagem dessa experi-
ência de aprendizagem foram observadas. Parte dos alunos adotou a abordagem de
aprendizagem focalizada na compreensão do texto como um todo. A outra parte do
grupo assumiu uma abordagem focalizada na memorização e reprodução de con-
teúdos factuais do texto, que supostamente seriam perguntados mais tarde. Essas
duas abordagens originaram os conceitos de “abordagem profunda” e “abordagem
de superfície” em relação à aprendizagem. A seguir consideramos cada uma delas.
A “abordagem profunda” envolve o esforço efetivo de análise e compreensão de
conceitos e princípios, por exemplo, subjacentes ao material de estudo e estaria mais
relacionada à aprendizagem autêntica, bem como articulada ao modo de lidar com
situações-problema em contextos novos e mais próximos da atuação profissional
além dos estudos da graduação. Essa noção também se refere ao modo de interagir
com conteúdos de aprendizagem como meios para compreender mais profunda-
mente os significados a eles subjacentes.
A “abordagem de superfície” estaria relacionada a uma atitude mais passiva de
aceitação das informações fornecidas pelos professores e materiais didáticos, bem
como à memorização de conteúdos factuais, desarticulada de compreensão efetiva e
retenção de longo termo. Por meio dessa abordagem, os estudantes interagem com
os conteúdos curriculares para obter aquilo que lhes parece necessário aprender,

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 207
tendo em vista determinada atividade ou forma de avaliação, mas sem a intenção
de relacionar os conhecimentos estudados a uma perspectiva conceitual mais ampla
(Snow; Corno; Jackson, 1996, p. 282).
A aprendizagem profunda se refere a certas práticas de ensino que priorizam a
autonomia dos estudantes, os processos interpretativos e a elaboração conceitual.
Além disso, haveria relação entre esse estilo de aprendizagem e a motivação intrín-
seca. A aprendizagem superficial, por seu turno, estaria relacionada a práticas de
ensino mais diretivas, que priorizam a memória e nas quais os estudantes assumem
papéis mais passivos.
Algumas estratégias de avaliação solicitam aos estudantes que forneçam deter-
minados tipos de resposta, que atendam a critérios de objetividade, que possam ser
previstas e, portanto, articuladas em uma pergunta, tal como nos testes de múltipla
escolha. Esse tipo de avaliação, comumente realizada sob a perspectiva somativa,
tem por objetivo distinguir o conhecimento objetivo e factual, e atende melhor as
expectativas de uma aprendizagem superficial.
Mas a avaliação pode ser “profunda”, no sentido de envolver procedimentos e
pressupostos que têm em mente outro nível de aprendizagem. Nesse caso, as ativi-
dades de avaliação podem solicitar, por exemplo, que os estudantes desenvolvam
compreensão conceitual e análise interpretativa, a fim de explorar diferentes pers-
pectivas sobre determinado contexto ou conjunto de dados. Esse tipo de experiên-
cia de avaliação encoraja os estudantes a explorar uma gama ampla de habilidades
cognitivas, por meio de atividades que envolvem a aprendizagem contextualizada e
situações autênticas. Isso ocorre em avaliações de natureza formativa, como o traba-
lho com estudo de caso, portfólio, mapas conceituais e resolução de problemas.
As pesquisas sobre as atitudes dos alunos em relação à aprendizagem e o debate
sobre suas implicações para o desenho de novas práticas pedagógicas vêm avançan-
do há décadas. Se, de um lado, observamos, entre os teóricos, o argumento de que
deveríamos transformar e avançar as práticas de ensino de forma a adaptá-las às
abordagens de aprendizagem dos alunos, por outro, há uma preocupação relaciona-
da à influência exercida pelas práticas avaliativas acerca de como os alunos decidem
por determinada abordagem de aprendizagem.
Segundo as pesquisas realizadas por Marton e Säljo (1997), a percepção dos
estudantes, quanto às práticas de avaliação dos professores, apresenta forte rela-
ção com a abordagem de aprendizagem que aqueles adotam quando se dedicam
a uma tarefa acadêmica. Os estudos de Biggs (1999) e Cowman (1998) sugerem
que as formas de avaliação exercidas pelos professores influenciam as abordagens

208 • Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009
de aprendizagem que os alunos desenvolvem na graduação. Biggs (1999) mostrou
que o formato das atividades de avaliação definidas pelos professores vão encora-
jar os estudantes a utilizar determinadas abordagens de aprendizagem. A pesquisa
realizada por Cowman (1998) revela, por exemplo, que as atitudes dos estudantes
em relação à aprendizagem estavam diretamente relacionadas às suas interpretações
sobre as atividades de avaliação. Isso sugere que as formas como os estudantes são
avaliados nos cursos de graduação podem exercer uma influência modeladora não
somente sobre seus desempenhos, mas sobre a formação de suas atitudes em relação
à aprendizagem (Struyven; Dochy; Janssens, 2005, p. 332).
Outras pesquisas apontam que as práticas pedagógicas dos professores univer-
sitários têm impacto sobre as crenças dos alunos a respeito da aprendizagem, e in-
fluenciam os resultados obtidos por eles (Northcote, 2003). Um estudo realizado por
Eklund-Myrskog (1998) indicou que, tal como observado em outros levantamentos,
as concepções de aprendizagem dos estudantes estão relacionadas aos contextos educa-
cionais a que são expostos, incluindo as práticas de avaliação. A pesquisa desenvolvida
por Entwistle e Tait (1990) assinalou que a abordagem profunda em relação à apren-
dizagem estaria relacionada à percepção da relevância das atividades acadêmicas. Em
complemento, haveria relação entre a abordagem de superfície e a percepção de que a
carga de trabalho solicitada pelos professores é muito pesada e pouco significativa.
O conjunto dessas pesquisas nos alerta sobre o impacto que exercem as práticas
pedagógicas dos professores sobre o desenvolvimento dos estudantes na graduação,
particularmente no que diz respeito a suas aprendizagens. E aqui destacamos o
papel exercido pelas decisões dos professores relacionadas às formas de avaliação
que utilizam com os alunos. Mas é interessante salientar que é a percepção dos
estudantes sobre os elementos do ambiente de aprendizagem que determina como
eles aprendem, e não necessariamente o contexto educacional em si (Struyven; Do-
chy; Janssens, 2005, p. 331). Isso parece sugerir a necessidade de os professores, na
educação superior, estarem atentos ao modo como os alunos percebem suas práticas
avaliativas. Nesse sentido, uma das questões a considerar, por exemplo, seria a im-
portância dos educandos terem clareza quanto às finalidades dos métodos usados,
bem como os critérios de avaliação praticados pelos professores.

AVALIAÇÃO E ESTILOS DE PENSAMENTO


Talvez acompanhando o clima de reforma educacional, a variedade de métodos
de avaliação utilizados na educação superior tem-se ampliado nos últimos anos.
Entre os métodos mais recentes destacamos o portfólio, e diversas formas de autoa-

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 209
valiação e avaliação entre pares. Tais métodos solicitam não somente outras práticas
dos professores, mas novas atitudes dos alunos em relação à aprendizagem e o exer-
cício de determinados estilos de pensamento.
Há pouco mais de uma década, Richard Sternberg (1997), em seu livro Thinking
Styles, apresenta interessante perspectiva para pensar a relação entre desenvolvimen-
to cognitivo e avaliação dos estudantes na educação superior. O conceito de estilo
de pensamento refere-se ao modo como um sujeito prefere usar suas habilidades
(Sternberg; Zhang, 2005). Não é, portanto, uma habilidade em si mesma.
Sternberg argumenta, a propósito das relações entre estilos de aprendizagem e
a educação, que o modo como os estudantes desenvolvem suas inteligências, seus
“estilos de pensamento”, seria influenciado pelas expectativas institucionais. Assim,
o sucesso de um estudante na universidade estaria relacionado à habilidade de se
“adaptar” ou “conformar” ao estilo predominante de pensamento institucional.
Nesse sentido, um bom desempenho na vida acadêmica refletiria, de forma signi-
ficativa, a capacidade de os estudantes se adaptarem às expectativas de “estilos de
pensamento”, evidenciadas no modo como os professores ensinam e como avaliam.
Os alunos perceberiam na avaliação uma mensagem não somente sobre o que deve-
riam aprender, mas como deveriam pensar.
Os argumentos apresentados por Sternberg (1997) fornecem uma perspectiva
com muitas questões a considerar. A relação entre avaliação e aprendizagem seria
tal que a natureza da aprendizagem, experimentada pelos estudantes, e seus estilos
de pensamento poderiam ser bastante influenciados pelas estratégias de avaliação
utilizadas pelos professores. Isso torna importante não somente o método escolhido
pelo professor, mas também suas expectativas – o que tem em mente quando utiliza
determinada forma de avaliação.
Desse modo, é significativa a recorrente preocupação dos estudantes no que diz
respeito, por exemplo, ao “jeito” como supostamente os professores “gostam” da
redação das respostas em uma prova escrita, ou da estrutura e do conteúdo de um
trabalho. Nesse cenário, haveria relação entre o sucesso nas avaliações e o conheci-
mento do “jeito” de demonstrar a aprendizagem preferido pelos professores, ou que
é destacado na cultura de um curso. Mas essa abordagem também pode nos ajudar
a pensar as razões do fracasso dos estudantes na graduação. O fracasso poderia re-
sultar não apenas da ausência de inteligência ou da capacidade para aprender, mas
da falta de compatibilidade entre os estilos de pensamento de determinados alunos
em relação àqueles destacados ou solicitados pelos professores – na forma como
avaliam, por exemplo.

210 • Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009
Diante da leitura apresentada por Sternberg (1997), nos parece necessário repen-
sar não somente as estratégias de avaliação utilizadas na educação superior, mas ou-
tras questões articuladas às escolhas dos professores, o modo como são transmitidas
aos estudantes, e as expectativas explicitadas, ou não, em suas práticas de avaliação.
Enfim, deveríamos avançar nas discussões sobre avaliação e formação de professores
na educação superior.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Exploramos neste artigo um conjunto de questões sobre avaliação e aprendizagem
na educação superior, destacando a importância das escolhas realizadas pelos profes-
sores. Tendo por base alguns estudos que conectam avaliação e aprendizagem, argu-
mentamos que as práticas de avaliação exercidas pelos professores apresentam diversas
implicações sobre as atitudes de aprendizagem mostradas pelos estudantes. Assim,
por exemplo, quando os professores optam por avaliar a aprendizagem dos alunos por
meio de provas escritas, ao final do bimestre, eles estabelecem algumas condições,
projetam expectativas e desenham um quadro a ser interpretado pelos estudantes. Tal
interpretação reflete-se no modo de agir dos estudantes em sala de aula – como dife-
renciam conteúdos do currículo e desenvolvem hábitos de estudo – e, de modo mais
amplo, na aprendizagem, que exerce papel considerável em suas formações.
As escolhas exercidas pelos professores podem ampliar ou limitar as oportunida-
des para que os estudantes demonstrem o que aprenderam. Além disso, as práticas
de avaliação podem ser mais ou menos restritivas em relação à possibilidade de
fornecer feedback ao aluno sobre seu desempenho durante o processo de ensino-
aprendizagem. Tais aspectos são fundamentais na atualidade, considerando a im-
portância que as práticas de avaliação formativa vêm conquistando.
De acordo com o método de avaliação que os professores decidem utilizar, en-
tram em cena determinadas expectativas, e são colocadas em ação estratégias pró-
prias para verificar os resultados da aprendizagem dos estudantes. Além disso, dife-
rentes métodos de avaliação são utilizados em momentos diferenciados do processo
de ensino-aprendizagem, de acordo com os propósitos investigativos do professor.
Assim, pode ser feita uma avaliação diagnóstica inicial, outra para acompanhar o
desenvolvimento cognitivo do aluno em determinado espaço de tempo, ou ainda ter
caráter somativo, realizada ao final do período de aprendizagem.
Neste texto, exploramos algumas possíveis relações entre as escolhas avaliativas
dos professores e a aprendizagem dos alunos. Seja qual for a prática avaliativa do
professor, e mesmo que sua escolha lhe pareça trivial, ela será um marco de referên-

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 211
cia para a abordagem de aprendizagem dos estudantes. Os esforços a serem empre-
endidos, a estratégia de estudo e os conteúdos a serem priorizados, serão decididos
com base em suas percepções sobre aquela escolha, o que faz com que a avaliação
exerça destacada influência sobre a aprendizagem dos estudantes – embora não seja
isso o desejado pelos professores.
Uma pergunta recorrente entre muitos docentes reside em qual a melhor forma de
avaliar os estudantes. Essa pergunta é complexa, e não se resume em considerar quais
métodos podem ser utilizados, segundo apenas suas características. Essa escolha pre-
cisa levar em conta tanto o tipo de aprendizagem que queremos adotar quanto as pos-
síveis respostas dos alunos a ela. Diversas pesquisas sugerem que, mesmo conhecendo
muito sobre as características e formas de aplicação de diversos métodos de avaliação
na educação superior, ainda não sabemos o suficiente a respeito de como conseguir, de
maneira sistemática, que os estudantes experimentem determinadas formas de apren-
dizagem. Há muitas perguntas ainda a fazer, e respostas a obter.
Existe uma última questão a destacar. É fundamental que os professores avan-
cem no estudo da avaliação e suas relações com a aprendizagem. Mas não se trata
apenas de aprofundar o domínio teórico sobre os diversos métodos hoje disponíveis
na literatura educacional. Tendo em perspectiva o horizonte das questões e pesqui-
sas apresentadas neste artigo, salientamos a importância dos educadores refletirem
sobre suas práticas avaliativas, considerando a profunda influência que estas exer-
cem sobre a aprendizagem dos alunos. As escolhas avaliativas dos professores, afinal,
são capazes de moldar os trajetos de aprendizagem dos estudantes, e, portanto, de
transformar a natureza de suas experiências educacionais na graduação. Esta é uma
tarefa complexa, sem dúvida, mas também fundamental, tendo em vista as trans-
formações desejadas na educação superior.

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Recebido em: outubro 2008


Aprovado para publicação em: maio 2009

Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 20, n. 43, maio/ago. 2009 • 213
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IMPLICAÇÕES DAS PRÁTICAS AVALIATIVAS NO ENSINO


SUPERIOR NA FORMAÇAO DOCENTE

EVALUATION PRACTICES IMPLICATIONS IN HIGHER


EDUCATION IN TEACHER EDUCATION

Lindalva Pessoni Santos1

Resumo: O objetivo deste artigo é apresentar uma revisão de literatura sobre


as concepções de avaliação correntes no ensino superior e as possíveis
implicações abordadas para a qualidade da formação dos alunos,
principalmente de licenciaturas. O interesse pela concepção de avaliação no
ensino superior é em virtude de considerá-la uma questão que interfere de
forma crucial no aspecto formativo dos alunos. Práticas pedagógicas e
avaliativas inovadoras já se encontram em curso no cenário do ensino
superior, no entanto, o que ainda prevalece são concepções e processos
conservadores. Uma das implicações constatada reside no fato de que,
geralmente, os futuros professores passam a repetir as mesmas práticas que
vivenciaram como alunos. A representação que levam dos seus cursos de
formação em relação à concepção de avaliação é outra marca forte e de
difícil desconstrução na vida profissional.

Palavras-chave: Ensino superior. Formação docente. Práticas pedagógicas.


Avaliação.

Abstract: This paper aims to present a review of literature on the current


concepts about evaluation in higher education and discusses its implications
for the quality of the future teachers’ education. The interest for this theme is
due to its importance to students’ education. Evaluative and innovative
pedagogical practices are presented in the scene of higher education,
however, the conservative concepts and processes are prevalent. One of the
implications of this study lies in the fact that future teachers repeat the same
practices they experienced as students. The representation they take from
their courses regarding the evaluation concept is another strong brand and
hard to deconstruct in their professional life.

Keywords: Higher education. Teacher education. Pedagogical practices.


Evaluation.

1
Mestre em Educação pela UFG. Especialista em Formação socioeconômica do Brasil. Especialista em
Linguagem e Matemática das Séries Iniciais. Especialista em Planejamento Educacional. Pedagoga. Professora
de Didática e Prática de Ensino UnU – Inhumas – UEG. E-mail: lindalpessoni@yahoo.com.br.

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Introdução

O ato de avaliar não foi inventado ou começou a ser praticado apenas com o
aparecimento da escola, pois essa é uma questão inerente ao ser humano que o acompanha
desde o início de seu percurso na terra. Diante de cada obstáculo, de cada decisão a ser
tomada faz-se uma avaliação, selecionam-se as medidas mais coerentes para solucionar os
problemas e encaminhar mudanças necessárias. Lima (1994) considera que a avaliação é o
contínuo realizar de escolhas do mais simples até os mais complexos julgamentos que
fazemos em nossas vidas. No cotidiano, a avaliação não é um momento estanque, isolado do
contexto, ela é uma mola propulsora que retroalimenta o fazer das pessoas constantemente,
vive-se e avalia-se ao mesmo tempo o que está vivendo. Avaliar é condição necessária para a
própria existência do ser humano que realiza escolhas, revê as ações empreendidas, elabora
outras com o objetivo de alcançar os propósitos planejados.
Quando voltamos nosso olhar para o universo escolar será que vamos nos deparar
com as mesmas finalidades do processo avaliativo que adotamos no nosso cotidiano? Que
princípios norteiam esse processo nas instituições educativas? A avaliação educacional
também é utilizada como um mecanismo para diagnosticar a situação, acompanhar e escolher
maneiras diversificadas para promover mudanças qualitativas na vida dos alunos em relação
as suas expectativas de aprendizagem?
Hoffmann (2001, p. 8) afirma que “a questão é saber qual o sentido da avaliação em
sua essência humana (de julgamento de valores, de uma ação refletida), tomando consciência
da finalidade dos processos avaliativos que, dependendo dos princípios em que se fundam,
são exercidos a favor ou contra o educando”.
Historicamente, a avaliação no cotidiano escolar tem produzido ao longo dos anos
muitos estigmas e prejuízos para inúmeros alunos do sistema de ensino – tanto público quanto
privado, da educação infantil à universidade. As concepções e práticas avaliativas adotadas
pela maioria dos educadores – em todos os níveis de ensino – têm produzido muitos
equívocos e, em grande parte, estão sendo exercidas mais contra do que a favor do educando.
Para Hoffmann (1993, 1998), a tentativa de mudar a concepção de avaliação tem
encontrado maior resistência entre os professores do ensino médio e do ensino superior, por
acreditarem que prática inovadora de avaliação só é possível no ensino fundamental. A autora
afirma que, nos encontros e seminários, constata-se o descrédito dos professores frente uma
possível mudança na feição classificatória da avaliação, além de haver uma retificação das
práticas existentes.

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Luckesi (1999) chama a atenção para o fato de que a aplicação de exames, provas
sistematizada pela escola moderna2 tem influenciado até os dias atuais concepções e práticas
avaliativas que discriminam, humilham e excluem inúmeras pessoas do direito de ter sucesso
na educação formal.
Desconstruir a ideia de avaliação como verificação de aprendizagem de conteúdos
trabalhados num determinado período é desconstruir a lógica de uma vida inteira de
submissão a esse ritual que acompanha basicamente toda a extensão da vida escolar.
Geralmente, a avaliação só é reconhecida se estiver expressa em forma de provas, testes,
exames, trabalhos escritos e for realizada em momentos estanques, separados da aula.
Conferir o que o aluno aprendeu – pode ser muito mais o que memorizou – passa ser mais
importante do que como aprendeu. Neste sentido, a avaliação não é usada como diagnóstico,
mas como um veredicto, uma sentença final dada a um processo que nem se quer tem
momento de réplica3. Assim, “a avaliação deixa de cumprir a sua função primordial:
identificar e analisar o que foi aprendido, o que ainda é preciso aprender, para que se organize
o trabalho com vistas à aquisição da aprendizagem” (BOAS, 2005, p. 163).
É preocupante constatar que a própria universidade, centro por excelência de
pesquisas, debates, questionamentos, persiste com concepções e práticas avaliativas
autoritárias e conservadoras. Não há, em seu interior, muitos debates sobre mudanças das
práticas avaliativas por considerar que o ensino neste nível não pode “se dar o luxo de
afrouxar” a forma de avaliar, ou seja, “ainda está presente a necessidade da nota. Parece ser
ela a garantia da seriedade e do rigor do trabalho” (BOAS, 2005, p. 165).
O pouco espaço destinado à discussão sobre avaliação no ensino superior é
constatado pelo pequeno número de títulos de livros, dissertações e teses sobre o assunto; se
comparado a outros níveis de ensino, a produção dessa temática é de certa forma tímida, como
aponta Chaves (2004, p. 2): “a reflexão teórica sobre as questões pedagógicas e mais

2
A escola moderna se sistematizou a partir das pedagogias dos jesuítas e de Comênio, além de refletir o projeto
burguês que no século XVI e XVII se afirmava como sistema econômico e político que em sua essência é
seletivo e excludente. A escola moderna, em que pesem as influências das pedagogias vinculadas às religiões
indicadas, foi sistematizada pelos intelectuais burgueses, mediante a pressão das camadas populares da
sociedade, especialmente, pelas reivindicações dos sindicalistas. Está ancorada no ideário liberal, destacando-se,
a laicidade, igualdade formal e a universalidade: na organização dos Sistemas Nacionais de Educação Pública
constituídos e/ou fiscalizados pelo Estado. A Pedagogia jesuítica advém de uma ordem religiosa criada pelo ex-
militar Inácio de Loyola, no século XVI, para combater o protestantismo. A ordem estabeleceu-se sob a rígida
disciplina e desenvolveu uma pedagogia extremante rigorosa com ênfase na repetição, memorização, estímulo a
competição entre os alunos e as torturantes formas de avaliar conhecidas como sabatinas – repetir durante aos
sábados as lições da semana. Já a Pedagogia Comeniana advém de João Amós Comênio, considerado o maior
educador e pedagogo do século XVII. Conhecido como o pai da Didática; elaborou inúmeros manuais
detalhando minuciosamente os procedimentos a ser seguidos pelo mestre para “ensinar tudo a todos”, além de
acreditar que o medo era um excelente fator de motivação para o estudo. (Ver ARANHA, 2006).
3
Ato ou efeito de replicar. Contestação, refutação (Minidicionário Aurélio, 1993, p. 474)

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especificamente sobre o processo de ensino-aprendizagem em cursos superiores, sua natureza


e especificidade não têm sido tônica das discussões na Universidade”. A autora afirma ainda
que “no que refere à avaliação, é possível constatar o recente interesse por parte dos
estudiosos, o que se expressa na produção e na carência de pesquisas sobre o assunto” (idem,
p. 2).
Hoffmann (1993), desde o início de seus estudos sobre avaliação, considera como
questão urgente e essencial, o repensar dessa prática na universidade. A preocupação da
autora é que a universidade é o lócus de formação dos professores que irão atuar nas escolas,
ou seja, “o modelo que se instala em cursos de formação é o que vem a ser seguido pelos
professores que exercem o magistério nas escolas e universidades” (idem, p. 138). Esta
questão também é abordada por Boas (2005) que expressa preocupação com o tratamento
dado à avaliação nos cursos de formação de profissionais da educação, pois “devido ao seu
caráter formativo, os alunos e futuros docentes costumam reproduzir as práticas dos seus ex-
mestres” (BOAS, 2005, p. 169).
Sem mudanças nas concepções e práticas pedagógicas e avaliativas no ensino
superior, o ciclo de equívocos e distorções provavelmente continuará a se repetir em todos os
outros níveis de ensino. É preciso intensificar, principalmente na universidade, a discussão
sobre as concepções de ensino, de aprendizagem e de avaliação, bem como se faz necessário
identificar e analisar as inovações já em curso promovidas por professores e instituições de
ensino superior.

Universidade, conhecimento, ensino, pesquisa e aprendizagem

A universidade nasceu há mais de oito séculos e atravessou dois grandes períodos da


história tradicional da humanidade: Idade Média, Idade Moderna e, hoje, na chamada Idade
Contemporânea, é uma instituição que detém muito prestígio. A universidade passou por
muitos formatos em virtude das mudanças sociais, políticas e econômicas ocorridas na
sociedade nesses períodos. De sua criação no século XII até a atualidade, várias
transformações agitaram o cenário universitário: disputa pelo seu controle por papas,
imperadores, corporações de mestres e corporações de estudantes, Estado, burguesia e sua luta
para conquistar a autonomia. De acordo com Chauí (2003, p. 5), “a legitimidade da
universidade moderna fundou-se na conquista da ideia de autonomia do saber em face da
religião e do Estado, portanto, na ideia de um conhecimento guiado por sua própria lógica”.

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A universidade percorreu um longo caminho até adquirir a forma atual, mas, apesar
de muitas mudanças, algumas características permanecem muito próximas do período de sua
criação, com fortes resquícios de um ensino tradicional4. A prática pedagógica centra
basicamente na concepção de que o ato de ensinar se restringe ao fato de o professor
transmitir o conhecimento para o aluno, sendo a avaliação o momento de conferir a
aprendizagem através de testes, provas e trabalhos em que os alunos são hierarquizados e
classificados pelas notas, consideradas produto final de um bimestre, semestre, ou ano de
estudo. Luckesi (1999, p. 18) afirma que “o exercício pedagógico é atravessado mais por uma
pedagogia do exame que por uma pedagogia do ensino/aprendizagem” e que “esses fatos não
se dão por acaso”. Tais práticas já estavam inscritas nas pedagogias dos séculos XVI e XVII –
no processo de emergência da sociedade burguesa – e exercem muita influência, ainda hoje,
no campo educativo. O autor descreve que herdamos, das normas de estudo da pedagogia
jesuítica, um ensino que prima a eficiência na oratória do professor com especial atenção ao
ritual de provas e exames; e da pedagogia Comeniana, herdamos o medo da reprovação – o
medo de reprovar nos exames finais do curso superior estimulava os alunos a estudar, pois a
instalação do medo das provas nos alunos era considerada um excelente estímulo para que
eles estudassem.
O ensino superior preserva práticas pedagógicas incompatíveis com a sua própria
natureza de ser – espaço privilegiado para o debate, confronto de vários pontos de vista,
desenvolvimento do pensamento crítico e contestador. Demo (2004, p. 6) diz que “aparece aí
um paradoxo dos mais gritantes: os profissionais da inovação não se inovam”. A oportunidade
de os alunos reconstruírem o conhecimento através da pesquisa, do debate, das produções
acadêmicas é substituída pela aula, ou melhor, pela exposição do professor que domina o
conteúdo e o repassa de forma magistral. O conhecimento não é reconstruído pelo aluno, mas
apenas é ouvido, memorizado e repetido nas provas. Perde-se aí a oportunidade de inovar.
Para Demo (2004, p. 6),

a universidade sempre teve em mãos as propostas mais altissonantes e


por vezes brilhantes de renovação da sociedade e do mundo, menos
para ela mesma. Ao contrário, resiste bravamente a qualquer mudança,
como se pudesse mudar sem se mudar.[...] Grande parte dos
professores não vai além de entupir os alunos da matéria curricular, da
maneira mais reprodutivista imaginável, a peso de memorização
forçada e controlada na prova. A universidade, que deveria ser a

4
“Entende-se usualmente por ensino tradicional a idéia que ensinar é só dar aula, transmitindo a matéria, sem
preocupar com a aquisição do conhecimento pelo aluno. A ênfase é na memorização, valorizando o que o
professor diz.” (CASTANHO, 2001, p. 80).

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entidade do saber por excelência, acha que sua excelência está nas
aulas.

O autor não condena a aula em si, mas, questiona sua forma, ou melhor, condena de
maneira veemente a redução do ensino na universidade ao mero instrucionismo, reprodutivo
que não ultrapassa a questão quantitativa de repasse de conteúdos. A concepção de ensino
nessa perspectiva considera que para dar aula no ensino superior basta ter um excelente
domínio do conteúdo a ser ministrado, conseguido através dos títulos, e instrumentos
rigorosos de avaliação para controlar a qualidade inerente a esse nível de ensino. Demo
(2004), Cunha (2005), Bordas (2006) criticam a valorização extremada dada à aula no ensino
superior em detrimento de outras formas, principalmente, a falta de associá-la à pesquisa.
Veiga et al. (2000, p. 175) defende a aula universitária como espaço possível de
inovação quando professores e alunos têm oportunidade de aliar o ensino, a pesquisa e a
extensão. Para a autora:
A aula é, então, dinamizada pela relação pedagógica, porque registra,
em situação concreta, a maneira de viver a relação como vínculo
libertador que proporciona o exercício da autonomia. É ainda durante
a aula que professores e alunos recriam o processo educativo: tomam
decisões quanto a concepção, execução, avaliação e revisão do
processo de ensinar, aprender e pesquisar, alicerçados pela pesquisa.

Para Demo (2004, p. 105), “pesquisar supõe rever o conhecimento existente, colocar
novas perguntas e dúvidas, abalar o que já está estabelecido, procurar novas fundações e
fundamentações”. Cunha (2005) aponta que na graduação o ensino parece ser descolado da
pesquisa, sendo considerado como campo quase exclusivo da pós-graduação. Uma das causas
levantadas por ela é que o ensino tradicional e a pesquisa são realizados com lógicas
diferentes, sendo o primeiro baseado em certezas e o segundo, na dúvida. Bordas (2006)
critica o lugar singular assumido pela pesquisa no meio universitário, expressa em produção
científica exigida pelas agências controladoras que financiam os seus projetos.
Os autores defendem que a relação ensino e pesquisa é a forma de conceber a aula
como momento de indagar, questionar, duvidar das certezas científicas, não para refutá-las,
mas, para reconstruí-las. O que eles propõem são aulas mais interativas, dialogadas,
instigantes, para que o aluno possa indagar, buscar, associar, comparar, relativizar, duvidar e
questionar a própria validade dos conteúdos trabalhados. O aluno deixa de ser um receptáculo
de informações e passa a ter oportunidade de reconstruir o conhecimento, num processo que
mobiliza o pensamento reflexivo, crítico e autônomo.

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A defesa é o aluno saber pensar com propriedade para apreender o sentido e


significado da vida para além da expectativa do mercado que simplesmente deseja pessoas
atomizadas para desenvolver atividades meramente técnicas. Aliás, o mercado incentiva e
muito a pesquisa, mas aquela que produz determinado conhecimento que possa ser
transformado em mercadoria rentável para o sistema econômico vigente: o capitalismo
monopolista. Segundo Coêlho (2006), este tem sido o cenário das pesquisas desenvolvidas
pela universidade, principalmente a partir dos anos de 1990, que tem se rendido a objetivos
imediatos do Estado, das empresas e dos grupos, deixando para um segundo plano o
desenvolvimento de valores essenciais da humanidade.
A educação não é um ato neutro, isolado do contexto geral da sociedade, pois reflete
os valores e princípios disseminados pela ordem dominante que de modo velado seleciona,
classifica e determina tanto na sociedade quanto na escola quem são os incluídos e os
excluídos do direito de usufruir dos bens materiais e simbólicos produzidos e acumulados
pela humanidade. Esse atrelamento entre ensino, pesquisa e mercado desconfigura a essência
da universidade pública, como uma instituição social que existe e trabalha em prol da
sociedade em geral, para atender os interesses privados de grupos. Para Chauí (2003), tomada
sob uma perspectiva operacional, a universidade deixa de ser uma instituição social e passa a
funcionar como uma organização social, ou seja, segue os princípios norteadores de uma
empresa particular: gestão, planejamento, previsão, controle, êxito, estratégias de eficiência e
eficácia para alcançar o objetivo particular que a define.
Cunha (2007), através de seus trabalhos, defende que quando a universidade alia
ensino e pesquisa, tendo como perspectiva primordial a renovação da prática pedagógica,
contribui para a qualidade do ensino, autonomia e inclusão do aluno, pois o interesse focado
no fazer pedagógico traz ganhos significativos para professores, alunos e para a universidade
que terá pessoas mais pensantes para contestar a própria ordem estabelecida que privilegia uns
em detrimento de outros. No entanto, reconhece a dificuldade e os desafios em efetivar uma
prática pedagógica inovadora frente à complexidade da sociedade atual que insiste em manter
uma visão ingênua e mecânica das relações entre educação e sociedade, fazendo crer que os
problemas da educação são inerentes as questões técnicas, metodológicas e psicológicas dos
alunos, negando os impasses gerados por esta sociedade hierarquizada e altamente seletiva.
Essa complexidade em que está envolto o ensino – e aqui de modo específico o ensino
superior – exige muito esforço por parte de todos para que ocorram mudanças de várias
ordens no intuito de se construir uma sociedade mais justa e humanizada. Castanho (2001)
enfatiza que para que isso ocorra precisamos de uma educação que estimule as pessoas a

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buscar soluções inovadoras comprometidas com a sociedade como um todo, tendo a


universidade um papel muito importante nesta busca.
Audy (2007) e Anastasiou (2003) também discutem o ensino na universidade e a sua
relação com a pesquisa. Avaliam as consequências de um ensino fragmentado: a
especialização sem limites das disciplinas, a mecanização do conhecimento, a
supervalorização da técnica, exposição linear do conteúdo pelo professor, a memorização dos
conteúdos pelo aluno como sinônimo de aprendizagem, a desvalorização de outras formas de
conhecer que não estejam vinculadas ao rigor estabelecido pela ciência. Audy (2007) defende
que para a construção do conhecimento e compreensão do mundo atual é necessário aliar o
pensamento complexo5 com o interdisciplinar6 através da integração ensino- pesquisa.

Nesse contexto, o ensino, desde a graduação, deve evoluir para um


processo em que o aluno atue como protagonista de seu processo de
aprendizagem, o que somente é viável se o processo de ensino-
aprendizagem tiver como base a pesquisa. Nesse sentido, o aluno
deverá ser capacitado a identificar os problemas no seu ambiente e
utilizar o método de pesquisa como a forma por meio da qual chegará
à solução dos problemas, lançando mão de conhecimentos oriundos de
diversas áreas do saber. Dessa maneira a pesquisa passa a ser a
maneira da qual o ensino acontece (AUDY, 2007, p. 35).

A compreensão do processo ensino-aprendizagem é fundamental na formação


docente, pois, sem clareza disso, o professor pode considerar que a ação de ensinar é explicar
o conteúdo numa exposição magistral com domínio total do assunto abordado e a ação de
aprender é acumular o conteúdo e reproduzi-lo quando solicitado. Anastasiou (2003) contesta
essa forma de ensinar e aprender e propõe outra concepção, até mesmo desloca os termos para
ensinagem e apreender, respectivamente. A autora denomina de unidade dialética processual
em que professor e aluno são coautores na compreensão e apreensão dos conteúdos, sendo
organizado um espaço de ação significativa de pensar o conhecimento como resultado de uma
ação conjunta. O movimento para a apreensão do conhecimento não segue passos estanques e
lineares, mas é resultado de um processo, desencadeado por ações docentes inovadoras que
estimulam e ajudam os alunos na construção do conhecimento. Para que essas mudanças
ocorram, é necessário que a formação do docente universitário passe por uma mudança de
paradigmas, uma reformulação de suas concepções e práticas.
5
-Critica ao conhecimento fragmentado, fechado, isolado, hiper-especializado. O pensamento complexo aspira de
certa forma ao conhecimento transdisciplinar sem pretensão de completude. Para aprofundar no assunto
consultar MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo: Porto Alegre, 2006.
6
Interação entre duas ou mais disciplinas, num esforço de comunicação e procura de pontos comuns entre elas
(SCHEIDER, 2001 apud AUDY, 2007)

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A formação do docente do ensino superior: uma questão a ser revisitada

Uma nova concepção de docência universitária que contraponha os ranços que estão
impregnados na concepção de ensinar, de aprender e de avaliar se faz urgente. A aula apenas
expositiva, centrada na simples transmissão de informação, como fonte de verdade, traz
conhecimentos soltos e fragmentados que acabam se sobrepondo uns aos outros. O ensino e a
aprendizagem se colocam em campos opostos não formando uma unidade dialética no
processo. Pimenta (2002, p. 210) afirma que “o desafio aí está: superar um modelo centrado
na fala do professor em que se toma o dizer do conteúdo como ato predominante do ensino e a
repetição do aluno como ato de aprendizagem”.
Essa mudança de paradigma exige um processo de reflexão para apreensão de novas
concepções sobre o saber científico, saber escolar, metodologia, processo de ensinar, processo
de aprender, entre outras. A trajetória escolar e pessoal do aluno, suas dificuldades, seus
interesses e sua experiência profissional deve fazer parte da atenção dos docentes
universitários. Trata-se de uma questão de compromisso ético-profissional, pois, ensinar
ultrapassa as questões cognitivas e se apóia também nos domínios afetivos. O professor deve
ser criativo e estimular seus alunos a extrapolar o previsível, a trilhar novos caminhos na
busca de superar os seu próprios limites, numa concepção de conhecimento que envolva
flexibilidade, movimento, desafios, incentivo a dúvida e valorização do erro como parte
integrante de um projeto coletivo de construção do saber por docentes e discentes. Castanho
(2001) propõe que o professor universitário desenvolva práticas criativas na sala de aula como
possibilidade de ir rompendo com a postura tradicional
A formação pedagógica do docente necessita ser cuidadosamente articulada com os
saberes e metodologias específicas de sua área num processo que seja permeado por uma
abordagem reflexiva que propicie competência de investigação, de questionamentos e de
percepção da complexidade do ato de ensino e do ato de aprendizagem. Alarcão (2007)
adverte que o professor deve escutar, conhecer e não subestimar a capacidade do aluno. Nessa
ótica, a formação docente acompanha toda a vida do professor que constantemente está
ensinando e aprendendo com as novas e velhas situações vividas com seus alunos. Nenhum
curso universitário abarca todos os saberes necessários à formação docente de qualidade, mas
é imprescindível uma releitura da aula universitária, pois parte da estrutura formativa se
consolida aí e pode se cristalizar para sempre.

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Isaia (2006), Veiga (2006), Pachane (2008) discutem a complexa formação do


professor universitário que envolve de forma intrínseca a dimensão pessoal, a profissional e a
institucional, sendo que esse processo só pode ser entendido como de natureza social que vai
se transformando no decorrer do tempo entre impasses, retrocessos e possibilidade de avanço
na constituição do professor universitário. É preciso redefinir a formação do docente do
ensino superior, uma formação que precisa ser reflexiva, problematizadora, permanente e que
busca articular o pessoal e o profissional, o pedagógico e o científico, bem como, propiciar
nos cursos de formação um processo avaliativo democrático e emancipador, capaz de dialogar
com a complexidade das situações do cotidiano. A preocupação dos autores é com a fratura
existente entre a formação específica e pedagógica nos cursos de formação docente, pois a
questão formativa do professor é um conceito ainda muito superficial e de pouca consistência
nos cursos de formação – mesmo que tenha sido tratado exaustivamente, não é isso que ocorre
ao longo da formação docente. Geralmente a ideia de formação pedagógica é restrita a
algumas disciplinas com carga horária reduzida sem uma articulação com as de “caráter
científico”.
A sobreposição dos conhecimentos ditos técnico-científicos sobre os pedagógicos
pode comprometer a qualidade do ensino superior no que tange a formação dos profissionais
da educação, pois confere um caráter apenas de explicador magistral de conteúdos prontos,
organizados e altamente qualificados. O que significa, então, ensinar na universidade? Que
conhecimentos são importantes? Que posição o professor deve assumir frente a seus alunos?
Anastasiou (2006) afirma que o sujeito deve estar num movimento contínuo de
interação e mudança dos conhecimentos e que esse processo articulado vise à construção e
possibilidade de cidadania. Para isso, vários obstáculos precisam ser superados na formação
do professor universitário na perspectiva de integrar os aspectos científicos e pedagógicos: a
revisão do currículo tradicional, a superação da visão fragmentada disciplinar por processos
de construção integrativa do conhecimento, a criação de um projeto coletivo norteador que
explicite a concepção de educação, de sociedade e de cidadão para que, consequentemente,
implícitos nos objetivos, nos conteúdos, na metodologia, surja uma exposição dialogada, em
que haja a participação do aluno. De acordo com a autora, a complexa formação do professor
universitário demanda a necessidade de concebê-la como um processo contínuo e não se
esgota com a aquisição de títulos, envolve esforços pessoais e institucionais na compreensão e
elaboração de uma proposta coerente que tenha como eixo central a questão formativa. O
compromisso do professor é ajudar os alunos a construírem uma compreensão mais ampla do

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mundo. Compreender o modo de construção da docência do ensino superior é um dos grandes


desafios na atualidade para pesquisadores e professores que atuam nesse nível de ensino.

Uma visão panorâmica das atuais práticas pedagógicas e avaliativas no ensino superior

A temática sobre a avaliação escolar é um assunto de certa forma exaustivamente


debatido nas últimas décadas por inúmeros estudiosos: Luckesi (1999), Hoffman (1991; 1993;
1998; 2001), Esteban (2000; 2001), Vasconcelos (1995; 1998), Perrenoud (1986; 1993;
1999), Hadji (1994), Lima (1994), dentre outros. Esses autores contestam a forma como a
avaliação é utilizada nas escolas e delineiam outros valores, concepções e sentidos para ela.
De modo geral, denunciam práticas avaliativas autoritárias, discriminatórias e excludentes e
sua ligação direta com o modelo de sociedade existente, ou seja, a estrutura pedagógica
excludente da escola é reflexo da estrutura social excludente. Luckesi (1999) afirma que para
romper com essa estrutura é preciso romper com o modelo de sociedade e com a pedagogia
que o traduz.
Esteban (2001, p. 99) considera como um desafio desvelar os mecanismos que
produzem o fracasso escolar como também procurar alternativas para a sua superação
Entende que a atuação docente no processo de avaliação – a forma como interpretam as
respostas dos alunos – é determinante do sucesso e fracasso dos alunos. Outro ponto discutido
é a dualidade entre o momento de ensinar e o momento de avaliar, concebidos como duas
instâncias distintas do processo educativo. Essa equivocada ideia dificulta os propósitos da
prática avaliativa na reconstrução da prática pedagógica e vice- versa, tornando práticas
estanques e desconectadas. Nesta perspectiva, a avaliação escolar deixa de ser diagnóstica e
passa a ser apenas classificatória, ou seja, “a prova” que teria a função de possibilitar uma
nova tomada de decisão sobre o processo avaliado, se encerra na nota. Além disso, também se
perdem momentos preciosos da aula para se proceder o processo avaliativo.
Diante do contexto de tantas distorções dos conceitos e de práticas avaliativas
conservadoras na escola, os estudiosos do assunto se desdobram para proporem novas
práticas, com o intuito de ressignificar não só a avaliação, mas todo o processo ensino-
aprendizagem. Para Esteban (2002), é importante repensar o processo de avaliação tendo
como suporte práticas pedagógicas democráticas.
A maioria das propostas se concentra na ressignificaçao das práticas aplicadas à
educação infantil e ao ensino fundamental, com pouca referência ao ensino médio e menos
ainda ao ensino superior. Segundo Chaves (2004), há um recente interesse dos estudiosos por

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esse assunto nesse nível de ensino. No entanto, parece não haver o mesmo interesse por
grande parte dos docentes que atuam no ensino superior em relação a mudanças nas práticas
avaliativas. A discussão encontra resistência praticamente em todos os cursos – nas áreas de
exatas, humanas, biológicas, nos bacharelados e nas licenciaturas (CHAVES, 2004;
MENDES, 2006).
Como pensar em mudanças de paradigmas, no tocante à avaliação, na educação
infantil, ensino fundamental e médio sem questionar os paradigmas de avaliação impregnados
no ensino superior, que é o lócus de formação dos docentes que irão atuar nesses níveis de
ensino? Como exigir mudanças nas práticas avaliativas desses professores, se eles foram
submetidos a práticas autoritárias e conservadoras a vida inteira?
Hoffmann (1991; 1993; 1998) alerta para o perigo da reprodução das práticas
avaliativas pelo professor inscritas em suas experiências como aluno que são marcas muito
mais profundas que qualquer influência teórica poderia produzir na formação do docente.
Ações autoritárias e discriminatórias se sobrepõem a qualquer discurso teórico modernizante
proferido por professores no ensino superior. Chaves (2004, p. 4) também afirma que

apesar de alunos e professores universitários em geral estarem


submetidos às mudanças no campo educacional, às avaliações interna
e externa, poucos se dispõem a parar para discutir, refletir e analisar as
implicações, por exemplo, da avaliação na constituição das relações
professor/aluno na universidade, preparando-se para enfrentar os
problemas que ela envolve e promove.

Outra percepção da autora ao aprofundar estudos sobre esta questão “é que o ensino
superior não está isento dos problemas mais gerais constatado nesse campo e que, tanto na
teoria quanto na prática, a avaliação nesse nível de ensino se reveste de rituais e atitudes
discriminatória” (CHAVES, 2004, p. 4). Como reverter essa questão em todos os níveis de
ensino se a própria universidade se exime de refletir sobre isso? O que temem os professores
do ensino superior quando o assunto é refletir e inovar suas práticas pedagógicas e
avaliativas? Sordi (2000, p. 234) afirma que “os docentes reagem mal quando querem indagar
sobre suas práticas avaliativas por estarem convictos da qualidade do trabalho que
desenvolvem e por considerar o ensino superior um nível de exigência inegociável”.
Apesar desses impasses, a universidade é um campo privilegiado para o debate, para
o confronto de pontos de vista antagônicos e ressignificaçao do saber. Sem mudanças
paradigmáticas na universidade como um todo, e aqui especificamente abordado nos cursos

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de licenciatura, é difícil vislumbrar mudanças significativas nas práticas pedagógicas e,


consequentemente, uma avaliação mais formativa em qualquer outro nível de ensino.

Seguir novos caminhos no contexto de ensino superior, talvez seja um


dos nossos maiores desafios, e como Morin indica, é neste nível de
ensino que temos uma “ultima” chance de restabelecer o diálogo entre
conhecimentos, entre diversos tipos de pensamento que assegurem os
diferentes pontos de vista, no intuito de superar o pensamento
reducionista, fragmentado e linear promovido na formação docente
(MAGALHAES7, 2009, p. 2)

O que significa implantar práticas pedagógicas e avaliativas inovadoras no ensino


superior? Quais os pressupostos que dão sustentação a essas mudanças? Quais as implicações
dessas mudanças para a formação dos docentes que irão atuar na formação de outros
docentes? A formação do docente que irá atuar no ensino universitário constitui a grande
chave para iniciar uma nova fase de entendimento da avaliação nos outros níveis de ensino?
A compreensão da construção da formação docente passa por diferentes
entendimentos e multiplicidades de questões e pressupostos: questões pessoais, profissionais e
políticas de investimentos. Veiga (2006) afirma que formar professores universitários implica
compreender a importância do papel da docência como uma prática social crítica e reflexiva.
Souza (2008) coloca que os professores inovadores têm repensado suas práticas e, a partir daí,
procuram construir maneiras diferentes8 de ensinar e aprender na universidade. Essa
perspectiva pode favorecer uma nova visão de avaliação.
O movimento de inovação é no sentido de romper com esta forma conservadora de
ensinar, aprender, pesquisar e avaliar. Pachane (2008) alerta os professores universitários para
a cultura da exclusão que vem marcando a história da universidade e que eles compreendam
seu papel como agentes desencadeadores de mudanças significativas nesse espaço marcado
por correlação de poder. A avaliação é um mecanismo sutilmente utilizado para diferenciar,
discriminar e selecionar as pessoas; de instrumento pedagógico passa para instrumento de
exclusão. “Nesta perspectiva, a avaliação, nega a diversidade, silencia os sujeitos, suas
vivências culturais, suas realidades e experiências, apoiando-se em propostas que fragmentam

7
Conheça na íntegra a proposta inovadora de formação docente implantada no Curso de Pedagogia da UFG pela
professora Solange M. O. Magalhães, “Da complexidade a complexidade da educação superior”, 2009.
8
Para maiores esclarecimentos consultar o texto da autora: Universidade processo de ensino- aprendizagem e
inovação. In Anais do 9° Encontro de pesquisa em educação da ANPED Centro Oeste. Educação tendências e
desafios de um campo em movimento, Brasília, 2008.

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o processo de ensinar e aprender” (OLIVEIRA9, 2008, p. 3). De processo subsidiário de


condução da prática docente para facilitar o crescimento do aluno, se torna uma estrutura
complexa de poder que hierarquiza de acordo com um modelo padrão que assume um caráter
punitivo, seletivo e excludente A autora entende que “é preciso desencadear uma nova cultura
de avaliação como parte integrante de uma prática mediadora e emancipatória, assumindo
uma dimensão muito mais ética do que técnica” (OLIVEIRA, 2008, p. 1).
Hoffman (1993, 1998, 2001) propõe uma avaliação mediadora10, dialógica em que o
conhecimento é reconstruído por alunos e professores num movimento de ação-reflexão-ação.
O professor deve estabelecer uma relação epistemológica com o aluno em relação a sua forma
de compreender o objeto do conhecimento, ou seja, a avaliação passa ser o suporte para essa
nova relação que se concretiza numa profunda reflexão do movimento do educando em
direção a apropriação do saber. A concepção é acompanhar o processo no sentido de
favorecer a apreensão do conhecimento pelo aluno, é oferecer oportunidade para que ele
busque novas explicações e novos entendimentos. A avaliação, nessa perspectiva, considera o
percurso do aluno na construção do conhecimento, bem como oferece subsídios ao professor
para redimensionar as atividades e os objetivos com o intuito de orientar o aluno a reencontrar
o caminho do conhecimento. Hoffmann (1993; 1998; 2001) e Boas (2000; 2005) demonstram
extrema preocupação com o tratamento dado nos cursos de formação docente à avaliação
educacional devido à superficialidade com que é abordado o assunto, bem como as
consequências disso para os alunos que serão futuros professores em qualquer nível de ensino.
Boas (2005), em pesquisa realizada de 1998 a 2000 no Distrito Federal, nos cursos
de formação de profissionais da educação (licenciaturas e especializações) constatou que o
tema avaliação é incluído na disciplina Didática Geral, sendo pouco ou ligeiramente
discutido, comprometendo a formação dos profissionais que irão atuar futuramente na
educação básica. Para contrapor esse quadro, nos cursos de formação, a autora propõe a
articulação da avaliação ao trabalho pedagógico, ou seja, a centralidade não está na aula, na
nota, mas no trabalho em conjunto desenvolvido por professores e alunos com vistas à
aprendizagem de ambos. Nessa perspectiva, a avaliação é parte integrante do processo em que
professores e alunos são protagonistas do trabalho pedagógico.

9
Conheça o processo avaliativo pelas vozes dos alunos no trabalho de pesquisa realizado pela autora com alunos
do Ensino Fundamental, Médio e Superior entre 2006 e 2007. OLIVEIRA, Ilda Amaral. Avaliação no Ensino
Superior: a contestação revelada em memoriais de alunos. Anais VII Redestrado. Bueno Aires, 2008.
10
Para conhecer as experiências de avaliação mediadora desenvolvida por Hoffmann no ensino superior,
consultar suas obras: Uma avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola a universidade, 1993.
Ver também: Pontos e contrapontos: do pensar ao agir em avaliação, 1998.

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Mendes (2005) considera que não tem sido nada fácil estruturar um processo
avaliativo diferenciado no ensino superior e que a proposta passa por uma disposição de
professores e alunos em discutir e definir diretrizes para a construção de uma nova proposta
pedagógica. A autora descreve que de modo geral a avaliação no ensino superior não acontece
diferente dos outros níveis de ensino: o professor explica o conteúdo, tira dúvidas, aplica
exercícios, dá prova e fecha esse ciclo com a nota. Afirma também que esse tipo da avaliação
não contribui para o desenvolvimento do aluno, pois apenas verifica o produto final da
aprendizagem. Para quebrar esse ciclo vicioso, a autora propõe a construção de uma avaliação
formativa11; começando pelo próprio questionamento da prática avaliativa tradicional que não
reflete sobre a concepção de educação que está por trás dos elementos como prova, nota e
reprovação.
Mendes (2006), em sua tese de doutorado12 – Formação de professores e avaliação
educacional: o que aprende os estudantes das licenciaturas durante sua formação –
investigou as concepções e práticas avaliativas impregnadas nos cursos de formação dos
profissionais da educação. A autora objetivou compreender os nexos entre o fazer cotidiano
do trabalho pedagógico, no que se refere à avaliação e o processo de formação dos
professores. Os resultados evidenciam que as práticas avaliativas nos cursos de licenciaturas
estão basicamente centradas na perspectiva técnica: provas, trabalhos, seminários. Não é dada
à maioria dos futuros professores oportunidade de discutir as múltiplas funções que pode
assumir a avaliação, como também são oferecidas poucas oportunidades de vivenciar durante
o curso, novas práticas de avaliação. Mendes (2006) acredita que se faz necessário criar uma
nova cultura para os cursos de formação de professores.
Para desenvolver uma avaliação formativa e emancipadora é preciso estar atento às
situações da sala de aula e isso exige atitude apreciativa do professor frente às atitudes dos
alunos durante a correção de atividades, elaboração e explicação de um conceito, organização
de trabalhos, apresentação de pesquisas, aplicação do conteúdo discutido, troca de pontos de
vistas, como “também através de verificações de caráter mais formal, tais como provas
escritas dissertativas, de questões objetivas ou práticas, ou também as menos formais, como
observação, entrevista, dentre varias situações” (MENDES, 2005, p. 181).

11
Segundo Perrenoud (1999, p. 103) “É formativa toda avaliação que ajuda o aluno a aprender e a se
desenvolver, ou melhor, que participa da regulação das aprendizagens e do desenvolvimento no sentido de um
projeto educativo”
12
A pesquisa foi realizada com 195 licenciados que estavam cursando o último ou penúltimo período de uma
instituição federal de ensino e 7 coordenadores.

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Ao professor cabe forjar um trabalho pedagógico diferenciado rompendo com a


concepção de avaliação hegemônica que valoriza o resultado em detrimento do processo. No
entanto, mudanças também necessitam de cuidadosa reflexão para que não sejam
transformadas num arremedo ou em precipitadas transformações que parecem ser novas, mas
reforçam velhos paradigmas de poder. Para que isso não aconteça, Sordi (2000)13 defende que
a criatividade do professor precisa ser incentivada, multiplicada e socializada para que as
experiências possam ser repensadas e aprimoradas de acordo com cada realidade.
Chaves (2004) considera que para construção de um proposta diferenciada de
avaliação na universidade é preciso outro modelo epistemológico-pedagógico que dê
sustentação para uma nova concepção de ensinar e aprender calcada numa visão progressista e
crítica de educação. O caminho é longo, alguns professores já deram alguns passos, mas é
preciso engrossar a fila daqueles que não se contentam mais com uma avaliação que
hierarquiza, classifica, seleciona e exclui.

Considerações finais

O presente trabalho objetivou apresentar uma revisão de literatura sobre as


concepções de avaliação correntes no ensino superior e as possíveis implicações para a
qualidade da formação dos alunos, principalmente, nos cursos de licenciaturas.
A avaliação escolar tem sido debatida, pesquisada e busca-se ampliar o sentido do
processo avaliativo, superar a ideia de que avaliar é examinar, testar, medir, classificar, punir,
excluir. No entanto, a real inovação, ou melhor, a ruptura com os processos autoritários e
conservadores de ensinar, de aprender e de avaliar nas escolas parece ainda distante,
principalmente, no ensino superior. Oliveira (2008, p. 15) afirma que:

Sem desconsiderar a potencialidade de transformação que o debate


sobre a avaliação traz para o cotidiano escolar, no momento em que
estamos, ainda há muito que fazer. Como modelo de transição,
anuncia novas possibilidades que conectam a avaliação ao processo de
democratização, como parte da dinâmica da emancipação social.
Assim, o processo avaliativo traz desafios que podemos enfrentar
vinculando esta discussão ao movimento real de ressignificação
curricular, aí incluído o trabalho docente.

Há uma forte sinalização que as mudanças poderão vir de uma reavaliação da


formação do docente que irá atuar no ensino superior. A busca da integração dos aspectos

13
Conheça as alternativas propositivas no campo da avaliação universitária sistematizada pela autora.

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científicos das disciplinas com os pedagógicos podem contribuir para fortalecer a formação
dos docentes. Mendes (2006, p. 148) aponta que cabe aos cursos de formação de professores
serem referência para a construção de uma escola crítica. Nessa perspectiva, cabe à
universidade promover aos licenciados condições de elaborarem uma nova concepção de
ensinar, aprender e avaliar. Portanto, a universidade deverá ser a primeira a levantar questão
sobre os equívocos atribuídos a avaliação; ela é uma instituição que tem em sua essência a
inquietude, a pesquisa, a contestação. Essa cultura que a avaliação serve para verificar a
aprendizagem, hierarquizar, selecionar, controlar, punir pertence a outro tempo que não mais
faz sentido na atualidade. Segundo Coêlho (2006, p. 54), a universidade é uma instituição que
cultiva o trabalho da razão e da formação humana e se “institui e se autojustifica à medida que
faz crítica de si mesma, da sociedade, da cultura, da existência humana, dos saberes, das
idéias, dos conceitos, das teorias, dos métodos, e da prática”.
Essa breve revisão de literatura sobre a avaliação no ensino superior permitiu
delinear uma visão panorâmica da situação circunscrita no ensino superior e perceber que os
professores tendem a repetir práticas oriundas dos seus cursos de formação. Também foi
possível perceber que existe um movimento por parte de pesquisadores e professores na busca
de novos caminhos – novas propostas na forma de ensinar, de aprender e avaliar. O que se
espera é que a universidade amplie o debate sobre suas práticas pedagógicas e avaliativas e
que dê a devida atenção às inovações que têm sido propostas por alguns pesquisadores e
professores do ensino superior.

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Texto recebido em 10/05/12.


Aprovado em 30/08/12.

88
Democratiz ar , v.II, n .1 , jan ./ abr . 2008 .

A Avaliação da Aprendizagem como Processo


Interativo: Um Desafio para o Educador

(*)
Jane Rangel Alves Barbosa

Introdução

A avaliação é a mediação entre o ensino do professor e as


aprendizagens do professor e as aprendizagens do aluno, é o fio da
comunicação entre formas de ensinar e formas de aprender. É
preciso considerar que os alunos aprendem diferentemente porque
têm histórias de vida diferentes, são sujeitos históricos, e isso
condiciona sua relação com o mundo e influencia sua forma de
aprender. Avaliar, então é também buscar informações sobre o
aluno (sua vida, sua comunidade, sua família, seus sonhos...) é
conhecer o sujeito e seu jeito de aprender.

Paulo Freire

A avaliação é uma tarefa didática necessária e permanente do trabalho docente, que deve
acompanhar passo a passo o processo de ensino e aprendizagem. Por meio dela, os resultados que
vão sendo obtidos no decorrer do trabalho conjunto do professor e dos alunos são comparados
com os objetivos propostos, a fim de constatar progressos, dificuldades e, também, reorientar o
trabalho docente. Assim, a avaliação é uma tarefa complexa que não se resume a realização de
provas e atribuições de notas.
A escola não pode estar desvinculada da vida, do mundo que a rodeia, mas tem de estar
em sintonia com a comunidade e com o tempo em que vivemos. Logo, a escola responsável não
ensina a memorizar, mas a refletir, fazer relações entre dados, informações e idéias, desafiar o
senso comum, aprender a pesquisar, saber trocar idéias, ou seja, aprender a aprender aprendendo.
Na nossa sociedade, reservamos às escolas o poder de conferir notas e certificados que,
atestam o conhecimento ou a capacidade do indivíduo, tornando assim imensa a responsabilidade
de quem avalia. A avaliação é comumente, acompanhada de dúvidas, incertezas e, muitas vezes,
de incoerências.
A avaliação é uma reflexão sobre o nível de qualidade do trabalho escolar tanto do
professor como dos alunos. Mas, para a grande maioria das pessoas que passaram por uma escola,

(*)
Doutora em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, professora da Universidade Castelo Branco e
do Instituto Superior de Educação da Zona Oeste – Isezo/Uezo/Faetec.

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há sempre a lembrança de sabatina, prova exame, verificação, avaliação. Isso se deve, sem
dúvida, a experiências negativas com relação à avaliação.
O professor entra na sala de aula e anuncia: – Hoje é dia de prova. Pode-se observar a
ansiedade em todos os alunos. Uns, têm um ar pensativo, outros tentam encontrar uma inspiração
e/ou refletem profundamente. Mas, o último pensamento de todos em relação à prova é a nota.
Assim, o termo avaliar tem sido constantemente associado a expressões como: fazer
prova, fazer exame, atribuir nota, repetir ou passar de ano. Esta associação, tão presente ainda em
nossas escolas, é resultante de uma concepção pedagógica ultrapassada, mas tradicionalmente
dominante. Nela, a educação é concebida como mera transmissão e memorização de informações
prontas e o aluno é visto como um ser passivo e receptivo. Em conseqüência, a avaliação se
restringe a medir a quantidade de informações retidas. Nessa abordagem, em que educar se
confunde com informar, a avaliação assume um caráter seletivo e competitivo.
No presente trabalho, entendemos a escola como local privilegiado para a construção de
conhecimento e valores, que possibilitem a compreensão da nossa sociedade e a organização da
ação educacional com vistas à equidade, à autonomia e, conseqüentemente, à inclusão dos
indivíduos na vida cidadã. Logo, faz-se necessário focalizar a avaliação da aprendizagem como
um processo contínuo de pesquisas que visa interpretar os conhecimentos, habilidades e atitudes
dos alunos, tendo em vista mudanças esperadas no comportamento, propostas nos objetivos, a fim
de que haja condições de decidir sobre alternativas do planejamento do trabalho do professor e da
escola como um todo.
Assim, a avaliação deve ser focalizada como um processo orientador e interativo que deve
ser “a reflexão transformada em ação”. Ação essa que nos impulsione a novas reflexões.

A construção de uma nova prática avaliativa

Todos nós educadores desejamos uma escola de qualidade, prazerosa e competente, que permita a
transformação da sociedade. Queremos uma escola que possibilite aos alunos uma vida cidadã
plena, dentro de uma sociedade humana, democrática, justa, ética e solidária, em consonância
com o nosso tempo e com a natureza do trabalho didático – pedagógico.
Dentro de uma concepção pedagógica contemporânea, a educação é concebida como a
vivência de experiências múltiplas e variadas, tendo em vista o desenvolvimento motor,
cognitivo, afetivo e social do aluno. Na sucessão de experiências vivenciadas, os conteúdos são
os instrumentos utilizados para ativar e mobilizar os esquemas mentais operatórios de
assimilação. Nesse contexto, o aluno é ativo, dinâmico e sujeito, que participa da construção de
seu próprio conhecimento.
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Dentro dessa visão, em que educar é formar e aprender é construir o. Próprio saber, a
avaliação assume dimensões mais abrangentes. Ela não se reduz apenas a realização de provas e
atribuições de notas. Sua conotação se amplia e se desloca, no sentido de verificar em que medida
os alunos estão alcançando os objetivos propostos nos projetos pedagógicos para o processo
ensino-aprendizagem.
Tais objetivos se traduzem em mudança de comportamentos motores, cognitivos, afetivos
e sociais. Se o ato de ensinar e aprender consiste em tentar realizar esses objetivos, o ato de
avaliar consiste em verificar se eles estão sendo realmente atingidos e em que grau se dá essa
consecução, para ajudar o aluno a avançar na aprendizagem e na construção de seu saber. Nessa
perspectiva, a avaliação assume um sentido orientador, cooperativo e interativo.
No pensar de Haydt, tal concepção é reafirmada:
A educação: não mudou apenas os métodos de ensino, que se tornaram ativos, mas
incluir também a concepção de avaliação. Antes, ela tinha um caráter seletivo, uma vez
que era vista apenas como uma forma de classificar e promover o aluno de uma série
pra outra ou de um grau para outro. Atualmente, a avaliação assume novas funções, pois
é um meio de diagnosticar e de verificar em que medida os objetivos propostos para o
processo ensino-aprendizagem estão sendo atingidos (Haydt, 1988, p.14).

Assim, a avaliação assume uma dimensão orientadora, cooperativa e interativa, onde os


resultados obtidos no decorrer do trabalho conjunto do professor e dos alunos são comparados
com os objetivos propostos, a fim de constatar progressos, dificuldades e, também reorientar o
trabalho docente e a construção dos projetos pedagógicos.
Como podemos observar, o conceito de avaliação da aprendizagem está ligado a uma
concepção pedagógica mais ampla, isto é, a uma visão de educação. Logo, o conceito de
avaliação depende, portanto, da postura político-filosófica adotada. Além disso, a forma de
encarar e realizar a avaliação reflete a atitude do professor em sua interação com os alunos/classe,
bem como suas relações com o aluno.
Por sua vez, um professor que deseja ser um profissional competente, responsável e
seguro de sua prática docente, que orienta as atividades de aprendizagem dos alunos colaborando
com eles na construção/reconstrução do conhecimento, tenderá a encarar a avaliação como um
processo orientador e interativo, como uma forma de diagnóstico dos avanços e dificuldades dos
alunos e como indicador para o replanejamento de seu trabalho docente.
Nessa perspectiva, a avaliação ajuda o aluno a progredir na aprendizagem, ajuda o
professor a aperfeiçoar sua prática pedagógica e a escola a reconstruir seu projeto pedagógico.
Avaliar não é reprovar, mas sim, compreender e promover, a cada momento, o
desenvolvimento pleno de quem vivência um processo de aprendizagem.

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No pensamento de Vasconcellos (1998), o processo de mudança da prática educacional


envolve três aspectos a serem observados pelos professores: a dificuldade de alterar a prática, o
papel da reflexão e a perspectiva de construção de uma práxis transformadora, destacando a
questão da participação do professor como sujeito.
Precisamos considerar, inicialmente, que a reflexão encontra-se no campo da
subjetividade, sendo que os obstáculos para a mudança estão tanto no campo subjetivo como no
objetivo. A reflexão não é um processo mecânico, automático e casuístico. A reflexão é, portanto,
uma mediação no processo de transformação, ou seja, ela pode agir através do sujeito, tendo por
função propiciar o despertar desse sujeito, além de um conhecimento da realidade, uma nova
intencionalidade e um novo plano de ação.
Para isto, o professor precisa articular duas dimensões: convencimento, que corresponde a
uma mobilização inicial, à gênese do resgate do professor como sujeito – reconstruir o sujeito
mediador e, intervenção que, guia para a prática que sequer transformadora, indica caminhos –
construir um caminho viável de mediação.
Para reconstrução da prática educacional, é preciso que o professor utilize o seu
compromisso, a sua reserva ética, para se engajar e buscar alternativas. Se o professor, não
acreditar e não assumir a conquista da condição de sujeito, não estará em condições de atuar
como autêntico educador. Por outro lado, se o professor não começar tentar, dar o melhor de si,
perde a paixão e o entusiasmo pela educação e pelo ensino.
É possível experimentar e viver o novo desde já, só que de forma incompleta, limitada. O
que está em questão não é necessariamente fazer um trabalho docente perfeito, o que é decisivo e
realmente transformador é fazer o melhor possível, pois através disso, o professor estará
contribuindo para a efetiva formação da cidadania de seus alunos.

Avaliação como facilitadora de aprendizagem

A avaliação deve ser a “reflexão transformada em ação”. Ação essa que nos impulsione as novas
reflexões. Reflexão permanente do educador sobre sua realidade e acompanhamento, passa a
passo, do educando na sua trajetória de construção do conhecimento. Um processo interativo,
através do qual educando e educadores aprendem sobre si mesmos e sobre a realidade escolar no
ato próprio da avaliação. Não se deseja uma avaliação autoritária que assuma a responsabilidade
pelo diagnóstico do desempenho do aluno e a partir daí, tomam-se decisões fora do alcance que a
própria avaliação oferece.
A avaliação deixa de ser um momento final do processo educativo para se transformar na
busca incessante de compreensão das dificuldades do educando e na dinamização de novas
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oportunidades de conhecimento. Na medida em que a ação avaliativa exerce uma função


dialogada e interativa, ela promove os seres morais e intelectualmente, tornando-se críticos e
participativos, inseridos no contato social e político. É necessário avaliarmos os alunos através da
observação diária de seu desempenho, individual e em grupo que nos leva a acreditar que a
avaliação é mais do que produção de conhecimento, é um ato político.
É importante destacar a confiança mútua entre educador e educando quanto às
possibilidades de reorganização da ação educativa e do saber, transformando o ato avaliativo em
um momento de reflexão, descoberta e troca de conhecimentos e aprendizagem.
Finalmente, os professores devem converter os métodos tradicionais de verificação de
erros e acertos em métodos investigativos, de interpretação das alternativas de soluções propostas
pelos alunos às diferentes situações de aprendizagem. O compromisso do educador com o
acompanhamento do processo de construção do conhecimento do educando numa postura crítica
que privilegie o entendimento e não memorização.
A avaliação é concebida como um elemento integrador entre a aprendizagem do aluno e a
atuação do professor no processo de construção do conhecimento e envolve múltiplos aspectos.
Esta deve ser entendida como um conjunto de atuações e ações e tem por função realimentar,
sustentar e adequar a intervenção pedagógica.
A verificação e o controle do rendimento escolar para efeito de avaliação é uma função
didática. A avaliação do ensino e da aprendizagem deve ser vista como um processo sistemático e
contínuo, no decurso do qual vão sendo obtidas informações, atribuindo-lhes valores.
Avaliar bem os nossos alunos tem sido “sempre” um dos maiores desafios para o trabalho
educacional, uma vez que pode representar para eles a abertura ou o fechamento de
possibilidades de estudar, aprender e se construir como cidadãos em processo de formação.
A avaliação da aprendizagem supõe sempre a existência de um referencial teórico, onde
estão implícitos os conceitos que temos de pessoa humana, de sociedade, de educação e
avaliação, mesmo que não tenhamos consciência deles. Os diversos autores que têm analisando a
avaliação afirmam que ela pode exercer duas funções: a classificatória e a diagnóstico.
A Avaliação classificatória hierarquiza, seleciona e classifica os alunos. A avaliação
classificatória reforça o lado cruel da escola, pois, é uma ferramenta para aprovação ou
reprovação. A nota ou o conceito atribuído ao aluno tem sido valorizado, numa relação direta, à
aprovação ou à reprovação, tornando-se fim, em si mesma, ficando, assim, distanciada da relação
com o processo ensino-aprendizagem. Dessa maneira, tudo é feito para melhorar a nota. Estas são
comumente utilizadas para reprimir e controlar a disciplina, revelando total ausência de reflexão
sobre o desenvolvimento da aprendizagem e o significado da avaliação.

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Este tipo de avaliação favorece a repetência e, conseqüentemente, a evasão escolar, não


garantindo a afetiva apreensão dos conhecimentos dos alunos aprovados, já que julga,classifica o
desempenho dos alunos nos aspectos cognitivos, mas de forma parcial e inadequada. Assim, a
avaliação classificatória discrimina e exclui, valorizando a submissão e a obediência
incondicional.
A Avaliação Diagnóstica é contínua e se dá no dia-a-dia da sala de aula, permitindo que o
professor faça intervenções privilegiando a aprendizagem dos alunos. Deste modo, é capaz de
perceber o que o aluno pode fazer sozinho, de forma independente, e com a ajuda de outros
colegas ou do professor.
A avaliação continuada da aprendizagem nos permite identificar as conquistas e os
problemas dos alunos, auxiliando a escola a exercer sua função básica, que é ensinar e aprender
promovendo o acesso ao conhecimento, transformando-se num recurso de diagnóstico para o
professor. Dessa maneira, a avaliação precisa adequar-se à natureza da aprendizagem, não pode
levar em conta somente o produto (resultado das tarefas), mas principalmente o processo (o que
ocorre no caminho).
A avaliação diagnóstica ajuda o aluno a crescer e a se desenvolver tanto cognitiva quanto
emocionalmente, auxilia a formação de um cidadão reflexivo, autônomo, crítico, capaz de viver e
conviver, participando e interagindo num mundo em permanente mudança e evolução.
No processo de ensino-aprendizagem, o professor desempenha um papel fundamental, que
é o de mediador da aprendizagem, ajudando os alunos no processo de construção do
conhecimento e de valores e a desenvolver suas habilidades e competências.

Considerações finais

Na avaliação inclusiva, democrática e amorosa não há exclusão, mas


sim”. Diagnóstico e construção. Não há submissão, mas sim liberdade.
Não há Medo, mas sim espontaneidade e busca. Não há chegada
definitiva, mas. Sim Travessia permanente em busca do melhor. Sempre!

Luckesi

A avaliação do processo de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos não pode ser pensada
em si mesma, deve ser realizada em sintonia com o Projeto Político-Pedagógico da Escola,
construído coletivamente, que norteia o planejamento e a metodologia da sala de aula.
Assim entendida, a avaliação da aprendizagem é processo orientador e interativo,
constituindo um desafio para o professor e também não sendo uma atividade solitária do
professor: ela tem que ser compartilhada com os alunos, pais, professores e gestor escolar.

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Daí podemos concluir que a avaliação é um processo contínuo, participativo, com função
diagnóstica e investigativa, cujas informações devem proporcionar o redimensionamento da ação
pedagógica e educativa, reorganizando as próximas ações de todos, no sentido de avançar no
entendimento do processo de aprendizagem.
Entretanto, para o professor avançar rumo ao sucesso de todos os alunos, é necessário
desconstruir preconceitos, estereótipos e mitos culturalmente enraizados na comunidade escolar
tais como Penna Firme (1996) destaca:
• Professor bom é aquele que reprova.
• Repetir é bom para o aluno pegar base.
• Esse menino não tem jeito para o estudo.
• As famílias pobres não dão valor ao estudo.

Uma escola que tem a preocupação com a aprendizagem de todos, que acredita nas
potencialidades dos alunos, conseqüentemente, trabalha para o sucesso, estimula a auto-estima e
não precisa preocupar-se com o binômio aprovação-reprovação, pois sabe que, no processo de
aprendizagem, o aluno sempre alcança progresso e deve prosseguir do ponto em que parou.
Admitir a idéia de começar tudo de novo é desconsiderar a natureza do processo.
Finalmente, no processo ensino-aprendizagem, na interação professor-aluno, pode
concluir que juntos, acertamos, assumimos riscos, alcançamos objetivos. A avaliação não pode
servir para selecionar e excluir o aluno desse processo, pois tal prática é uma violência ao direito
à educação. A avaliação deve sempre servir para redimensionar o planejamento do professor e
subsidiar o fazer pedagógico. Por conseguinte, voltada para a transformação, a avaliação é muito
mais do que a expressão de determinar conceitos para os alunos, ela expressa a postura do
educador responsável, ético-político, competente e comprometido com a construção do
conhecimento e do desenvolvimento de capacidades, habilidades, competências e atitudes numa
escola democrática e cidadã.

Referências

ALVES, R.A. Conversas com quem gosta de ensinar. São Paulo: Cortez, 1984.
DEMO, P. Avaliação Quantitativa. Campinas: Autores Associados, 1999.
DEMO, P. Professor do Futuro e Reconstrução do Conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2004.
HAYDT, R. C. C. Avaliação do Processo Ensino-Aprendizagem. São Paulo: Ática, 1988.
HOFFMANN, J. Avaliar para promover – as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2001.

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LUCKESI, C. C. Avaliação da aprendizagem escolar. S. Paulo: Cortez, 1999.


LUCKESI, C. C. Avaliação educacional escolar: para além do autoritarismo. São Paulo: ANDE,
Revista da Associação Nacional de Educação, nº. 10, 1986.
LUCKESI, C. C. Avaliação educacional: estudos e propósitos. São Paulo: Cortez, 1996.
MACHADO, N. J. Epistemologia e didática: as concepções de conhecimento e inteligência e a
prática docente. S.Paulo: Cortez, 2002.
MIZUKAMI, M da G.N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1990.
MORAIS, R. de. Sala de Aula – que espaço é este? Campinas: Papirus, 1996
MORRIN, E. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand, 1998.
PENNA FIRME, T. Mitos da avaliação. Convívio, nº. 1, fev., 1996.
ROMÂO, J.E. Avaliação dialógica: desafios e perspectiva. São Paulo: Cortez, 1999.
SACRISTÁN, J. G. GOMES. A. P. Compreender e transformar o ensino. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1990.
SOUZA, C. P de. Avaliação do rendimento escolar. Campinas: Papirus, 2001.
VASCONCELOS, C. dos S. Para onde vai o professor – resgate do professor como sujeito de
transformação. São Paulo: Libertad, 1997.
VASCONCELOS, C.dos S. Plano de ensino – Aprendizagem. Convívio, nº. 1, fev., 1996.
VIANNA, I. O. de A. Planejamento participativo na escola: um desafio ao educador. São Paulo:
EPU, 1986.

Resumo: Entendendo a escola como local privilegiado para a construção/constituição de


conhecimentos e valores, que possibilitem a compreensão da nossa sociedade e a organização da
ação educacional com vistas à eqüidade, à autonomia e à inclusão dos indivíduos na vida cidadã,
faz-se necessário focalizar a avaliação da aprendizagem como um processo. Avaliar o processo
de aprendizagem é uma tarefa que pode ser compreendida de maneiras diferentes. O objetivo é
refletir sobre a avaliação da aprendizagem como processo interativo, através do qual educandos e
educadores aprendem por si mesmos e sobre a realidade escolar no ato próprio da avaliação. A
avaliação deve ser a “reflexão transformada em ação”. Ação essa que nos impulsiona a novas
reflexões. Reflexão permanente do educador sobre sua realidade e acompanhamento sistemático e
contínuo do educando, na trajetória da construção do conhecimento.
Palavras-chave: Avaliação; aprendizagem; interação.
Abstract: The school can be understood as a privileged place where both knowledge and values
are built and established. This makes possible to comprehend our society and as well as the
organization of the educational action aiming at equality, autonomy, and, consequently, the
inclusion of people´s lives as citizens. It is necessary to treat learning evaluation as a process. To
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evaluate the learning process is a task that can be perceived in different ways. The aim is to think
deeply about the evaluation of the learning process as being interactive with students and
educators gaining knowledge on their own and, at the same time, gathering information about the
school reality during the evaluation action. The evaluation must be reflection transformed into
action . Action which drives us to new reflection. Permanent reflection from the part of the
educator on his reality and a sistematic continuous following of students during their knowledge
construction.
Key-words: Educational evaluation; learning; interaction.

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AVALIAÇÃO FORMATIVA NO ENSINO SUPERIOR:
Reflexões e alternativas possíveis

* Olenir Maria Mendes

Sem dúvida, a avaliação, tal como concebida e vivenciada na maioria das


instituições educacionais, mobiliza um poder que está diretamente relacionado
com a forma da organização escolar e suas relações com a sociedade em que se
encontra inserida. Por isso, um dos desafios que se coloca é compreender a
estrutura social capitalista em que vivemos e, a partir dela, a função social da
escola, como um dos entraves para que aconteçam as grandes transformações e,
especificamente as transformações das práticas avaliativas mais tradicionais.

A partir dessa premissa, tentaremos discutir alguns princípios norteadores


de práticas avaliativas processuais e formativas que visam a acompanhar o
desenvolvimento do aluno a partir de reflexões sobre a avaliação praticada no
ensino superior. Para tanto, procuramos construir um diálogo com colegas
professores e alunos com o intuito de refletir sobre as práticas avaliativas mais
comuns no cotidiano do trabalho acadêmico. Entretanto, não trazemos nenhuma
receita, apenas princípios, reflexões e propostas que poderão nortear o trabalho
em sala de aula e, muito especialmente, o processo de definição das diretrizes
para a construção de uma proposta pedagógica para o ensino superior.

O processo avaliativo não tem sido nada fácil para seus atores. Essa
constatação só vem reforçar a necessidade de refletirmos sobre o nosso fazer
pedagógico no ensino superior. A complexidade que o tema envolve serve de
justificativa e nos deixa um pouco aliviados, quando nos sentimos amarrados pelo
sistema educacional e insatisfeitos com a nossa prática em sala de aula. De
qualquer forma, essa complexidade permite-nos também questionar e refletir
sobre o que fazer. Então, poderíamos perguntar: Como se dá, passo a passo, a
nossa prática avaliativa? A partir dela, o que entendemos por avaliação?

De modo geral, responderíamos a essas perguntas da seguinte maneira:


apresentamos um conteúdo novo por meio da exposição, às vezes dialogada;
aplicamos exercícios para fixação; tiramos as dúvidas durante a correção dos
exercícios; logo em seguida avaliamos os alunos, geralmente através de provas e
testes; realizamos a correção contando os acertos obtidos; e depois desse
processo, reiniciamos uma nova unidade com um novo conteúdo. Durante todo
esse processo, dificilmente nos detemos nos erros, embora sejam eles que
possibilitam detectar as não aprendizagens e, muito menos paramos para pensar
sobre o que fazer para que as dificuldades sejam superadas. Essa prática é
comum tanto nos professores quanto nos alunos.
____________
* Texto extraído do livro VEIGA, Ilma Passos Alencastro; NAVES, Marisa Lomônaco de Paula
(Orgs.) Currículo e avaliação na educação superior. São Paulo: Junqueira & Marin, 2005. p.
175-197.
Às vezes, nossas práticas podem diversificar-se quanto à escolha dos
instrumentos a serem utilizados, mas geralmente o tratamento com os resultados
não costuma variar muito, ou seja, o nosso procedimento metodológico resume-se
em transmitir o conteúdo, marcar a data da “prova” (que pode ser trabalho,
seminário, exercício, pesquisa), aplicar a atividade avaliativa, corrigir, entregar o
resultado e depois, recomeçar mais uma vez o nosso trabalho acadêmico e
pedagógico. Apesar de definirmos essa prática rotineira como um procedimento
avaliativo, segundo Luckesi (1995), ela não é. O que fazemos é uma mera
verificação dos resultados obtidos por nossos alunos.

Segundo esse autor, a verificação da aprendizagem encerra-se com a


obtenção do dado ou informação que se busca, isto é, “vê-se” ou não a
aprendizagem ou o conhecimento adquirido pelo aluno. E... Pronto! A verificação
não implica que o sujeito retire dela conseqüências novas e significativas
(LUCKESI, 1995). Isso porque não aproveitamos os “erros” para rever nosso
trabalho, rediscutir o conteúdo dado e modificar a realidade verificada.

O ato de avaliar não se encerra na configuração do valor ou qualidade


atribuídos ao objeto em questão. Avaliar exige uma tomada de posição favorável
ou desfavorável ao objeto de avaliação, com uma conseqüente decisão de ação.
O ato de avaliar implica coleta, análise e síntese de dados que configuram o
objeto de avaliação, acrescido de uma atribuição de valor ou qualidade, que se
processa a partir da comparação da configuração do objeto avaliado. Segundo
Luckesi (1995), a avaliação direciona o objeto numa trilha dinâmica enquanto a
verificação o “congela”. Isso quer dizer que, para desenvolvermos o processo
avaliativo, necessariamente temos que verificar, mas posteriormente precisamos
tomar uma atitude no sentido de modificar a situação verificada, aí sim estaremos
avaliando.

A partir desses conceitos, podemos pensar: qual é a prática mais comum


no ensino superior? Avaliação ou verificação? Infelizmente, tanto na educação
básica quanto na educação superior, meramente verificamos a aprendizagem de
nossos alunos, verificamos os acertos obtidos e não dedicamos quase nenhuma
atenção aos erros. Desse modo, confirmamos um ensino centrado no professor, o
qual se baseia no desempenho de seus alunos em função dos objetivos pré-
estabelecidos. Esse ensino se baseia em padrões de aprendizagens desejáveis e
se prende na avaliação somativa.

Para construirmos a avaliação formativa o nosso trabalho não pode se


reduzir a uma verificação como produto final da aprendizagem, ela precisa
acontecer durante todo o processo de ensino-aprendizagem e não somente em
dias previamente estabelecidos. Não podemos acreditar que só avaliamos quando
acontece a verificação formal somativa, ou seja, quando escolhemos os
instrumentos (na maioria das vezes provas), os aplicamos e lhes atribuímos
pontos. Geralmente esses momentos estanques causam uma ruptura com o
processo de ensino e de aprendizagem e dificilmente favorecem o
desenvolvimento da avaliação formativa.
Avaliação Formativa é toda prática de avaliação contínua que pretenda
contribuir para melhorar as aprendizagens em curso, qualquer que seja o quadro e
qualquer que seja a extensão concreta da diferenciação do ensino. Levam-se em
consideração os propósitos estabelecidos por professores e alunos para garantir –
se a regulação das aprendizagens (PERRENOUD, 1999). Nessa perspectiva, não
basta mudar nossa prática avaliativa. Essa nova postura implicará,
necessariamente, mudanças na metodologia de trabalho e nas concepções (de
sociedade, de educação, de universidade, de conhecimento e de aprendizagem).
Mudar a forma de avaliar implica repensar todo o processo pedagógico, bem como
todo o processo de definição do currículo que definimos no ensino superior.
Admitindo isso, podemos partir para outro aspecto que é repensar nossas práticas
para que, a partir delas, possamos, de fato, avaliar e não meramente verificar a
aprendizagem de nossos alunos.

Poderíamos começar nos questionando sobre alguns fortes componentes


da prática avaliativa tradicional. Que concepção de educação está por trás dos
elementos como prova, nota e reprovação? Na prática tradicional esses elementos
são fundamentais, pois a preocupação restringe-se a contabilização dos
resultados obtidos pelos alunos. Entretanto, se entendermos avaliação como um
processo contínuo, no qual observamos constantemente nossos alunos,
acompanhando-os e ajudando-os em suas dificuldades, tanto a prova, quanto à
nota e a reprovação perdem sua importância, pois paramos de valorizar os
momentos estanques para avaliar todos os dias e por meio de diversos
instrumentos. Desse modo, a nota passa a ser conseqüência e não motivação
para o estudo. Quanto à reprovação, ela tende a desaparecer, pois cada resultado
ruim significa fazer de tudo para ajudar os alunos a superarem suas dificuldades.

As práticas avaliativas realizadas no interior das escolas, quando enfatizam


testes que aparentemente objetivam apenas medir, verificar e classificar a
aprendizagem dos alunos, reforçam uma ideologia sutil e complexa, de controle e
reprodução social. Ou seja, com aparência de avaliar igualmente todos os alunos,
o sistema educacional através da concepção de seus profissionais, oculta os reais
interesses da sociedade capitalista e contribui para manutenção e perpetuação de
um sistema autoritário, estratificado, hierárquico e extremamente desigual. Além
disso, ajusta os indivíduos aos seus lugares, pois ao serem submetidos a esse
tipo de avaliação, os alunos são treinados a aceitar o controle, os julgamentos, as
recompensas e as punições como naturais, assim como naturais são as divisões
da sociedade em que se encontram inseridos. Ao avaliar, o professor emite um
juízo de valor sobre o aluno fundamentado em suas concepções de vida, de
educação, de aluno e de sociedade. Isso precisa ficar muito claro para o professor
durante o processo de reflexão sobre sua prática avaliativa.

A partir da amplitude ou limitação da compreensão do seu fazer na


avaliação, o professor pode reforçar uma realidade social seletiva e excludente ou
se mobilizar para a construção de alternativas de avaliação que visam a uma
educação efetivamente democrática, que não seja apenas aberta a todos e
essencialmente reservada a uns poucos detentores da cultura dominante, mas de
fato democrática no sentido de oferecer condições concretas de inclusão àqueles
que se encontram excluídos. Afinal, não podemos mais aceitar o “mito”
(HOFFMANN, 1993) de que o bom professor é aquele que reprova todo mundo.
Essa idéia faz parte do processo de perversão da avaliação (VASCONCELLOS,
1995).

A prática avaliativa é uma das formas mais eficientes de instalar ou


controlar comportamentos, atitudes e crenças entre os estudantes, podendo ser
positiva ou destrutiva em suas possibilidades de desenvolvimento, pelo poder que
encerra e pela importância que tem como mecanismo de inclusão ou exclusão
social, através das marcas burocráticas e legais impregnadas na sua utilização.
Então, como mudar na prática?

Alguns autores, em oposição à concepção autoritária na qual a avaliação é


vista como um instrumento disciplinador, gerador de uma aprendizagem de
submissão, de dependência e de reprodução social, têm se dedicado a investigar,
discutir e propor a avaliação num enfoque crítico, dialético, diagnóstico e formativo
(FREITAS, 1995, VASCONCELLOS, 1995; LUCKESI, 1995; Romão, 1998 dentre
outros). Eles põem em questão as práticas de avaliação vigentes nos sistemas de
ensino e suas relações com concepções conservadoras de educação de caráter
puramente seletivo e classificatório. Para eles, a avaliação deve ser concebida
como ferramenta importante no acompanhamento da aprendizagem do aluno e
não mais como instrumento de controle no interior da sala de aula.

O processo de (re) significação da avaliação, em todas as suas dimensões,


depende do compromisso de seus agentes, sejam os órgãos institucionais, seja o
educador na sala de aula, através da visão de educação explicitada mais pela
ação concreta do que pelo discurso professado. Repensar as concepções, as
políticas ou mesmo as práticas avaliativas implementadas aponta para a
necessidade de se produzir um novo paradigma de avaliação em que:

• O professor compreenda os limites e as possibilidades da avaliação na


sociedade capitalista;

• Os aspectos formativos da avaliação sobreponham-se aos técnicos;

• O processo de avaliar seja compreendido como prática de investigação e


não de classificação, daí as práticas de apreciações devolutivas serem
constantes;

• O ato de avaliar esteja aliado ao desenvolvimento pleno do aluno em suas


múltiplas dimensões (humana, cognitiva, política, ética, etc.);

• A avaliação sirva à formação, à implementação de políticas públicas e, só


posteriormente à certificação, dentre outras.

A partir dessas observações, podemos pensar mais concretamente sobre


algumas ações ou mesmo alguns princípios que poderão orientar a nossa prática
de avaliação formativa. O primeiro passo é pensar sobre quais situações são
possíveis de serem avaliadas no cotidiano da sala de aula. A resposta está nos
momentos mais óbvios e previsíveis, ou seja, todas as situações podem ser
avaliadas, desde que estejamos atentos, registrando os fatos e tomando uma
atitude frente ao que está sendo verificado, essas são o que chamamos de
apreciações devolutivas.

Em linhas gerais, podemos avaliar quando os alunos solicitam a nossa


ajuda para resolver uma questão; durante a correção dos exercícios em sala de
aula; através de dificuldades detectadas em realizar as tarefas e/ ou pesquisas
extra sala de aula; através do uso de experiências, pelos próprios alunos, na
explicação de conceitos; através da forma de organização e apresentação dos
trabalhos dos alunos; através de exemplos de comportamentos e, depois,
observação de sua aplicação em situações posteriores; e também através de
verificações de caráter mais formal, tais como provas escritas dissertativas, de
questões objetivas ou práticas, ou também as menos formais, como observação,
entrevista, dentre várias outras situações.

É fundamental, na prática avaliativa formativa, a perspectiva daquele que


aprende, o aluno. Não podemos deixar escapar de nossas observações a
manifestação do aluno para que seja analisada permanentemente. Ter a
regulação como característica básica da avaliação formativa exige que tanto
professor quanto aluno participem de todo processo como sujeitos e, por isso
mesmo, o aluno também deve adquirir consciência de seus acertos e erros, propor
ações de superação e repensar sua forma de estudo junto com o professor. Desse
modo, professores e alunos devem registrar, desde o início, suas observações e
impressões no sentido de indicar ajustes ou propostas para que as dificuldades
detectadas sejam superadas. Instrumentos como observação e entrevista são
fundamentais e o diálogo como metodologia de trabalho é condição básica.

A partir daí podemos discutir algumas alternativas, indicadas por


Vasconcellos (1995), que poderão nos ajudar a realizar a avaliação formativa.
Segundo ele, esses são, na verdade, alguns princípios que poderão nortear a
nossa prática e não receitas de como avaliar de forma processual e formativa.

Primeiro princípio: é preciso abrir mão do uso autoritário


da avaliação

Quando a avaliação é considerada como mera verificação da aprendizagem


de nossos alunos, o que importa é usá-la como poder de controle, especialmente
daqueles alunos considerados mais “descomprometidos” os quais, sem o uso da
nota, geralmente não conseguimos manter sob nosso “controle”. Não podemos
continuar desviando o objetivo principal da avaliação. Para Vasconcellos (1995),
precisamos nos recusar a entrar no circuito da perversão da avaliação. Afinal, não
podemos avaliar para castigar o aluno, mas sim para saber se ele aprendeu ou
não o conteúdo dado.
Ao deixar clara essa função da avaliação, passamos a desejar e a nos
empenhar para que aconteça a transformação da prática que aí está, através de
uma nova prática, mesmo que, de início, ainda limitada.

Segundo princípio: é preciso alterar a metodologia de


trabalho em sala de aula

A avaliação não é o único problema que enfrentamos. Uma nova prática


avaliativa requer, necessariamente, novas práticas metodológicas. Isso significa
que não basta mudar a forma de avaliar se não mudarmos as formas de
organização de nossas aulas. A metodologia precisa ser diversificada,
problematizadora e ter como princípio o diálogo. Se o aluno não aprendeu de uma
forma, é preciso tentar outras formas até que ele aprenda. Para isso precisamos
ter coragem de atrasar o programa e atender às necessidades de nossos alunos.
Isso quer dizer que precisamos retomar, rever, re-enfocar, replanejar, alterar o
ritmo, buscar novas estratégias de abordagem (VASCONCELLOS, 1995). Temos
que partir de onde os alunos estão e não de onde deveriam estar. Dessa forma,
não importa tanto o que já foi dado e sim o que foi realmente assimilado. Esse
princípio representa uma significativa mudança metodológica. O conteúdo deve
ser mais significativo e a metodologia mais participativa, para que diminua a
necessidade de recorrer à nota como instrumento de coerção. Se conseguirmos
ser mais criativos e dar aulas mais interessantes, também os nossos alunos se
interessarão mais pelas aulas: “Não se pode conceber uma avaliação reflexiva,
crítica, emancipatória, num processo de ensino passivo, repetitivo, alienante”
(VASCONCELLOS, 1995, p. 55).

Além do mais, por mais óbvio que possa parecer, é preciso estudar para
aprender, para compreender o mundo, para usufruir o patrimônio acumulado pela
humanidade e transformar esse mundo, para participar ativamente,
conscientemente desse mundo, para sermos cidadãos e fazer de nossos alunos
profissionais comprometidos com a sociedade em que vivem. Infelizmente, assim
como na educação básica, os alunos do ensino superior também são incentivados
a estudar apenas para tirar nota e não para aprender, o que nem sempre é a
mesma coisa. Essa é uma forte perversão do processo ensino-aprendizagem
(VASCONCELLOS, 1995).

Uma prática metodológica que possa colaborar com uma sólida


aprendizagem precisa privilegiar a problematização, o debate, a exposição
interativa-dialogada, a pesquisa, a experimentação, o trabalho de grupo, a
construção de modelos, o estudo do meio, os seminários, os exercícios de
aplicação, as aulinhas dadas por alunos, dentre outras tantas práticas as mais
participativas e mais diversificadas possível. Precisamos lembrar que os alunos
não têm direito à dúvida. É ela que revela ao professor o percurso que o aluno
está fazendo na construção do conhecimento. É preciso incentivar e garantir a
prática de perguntar durante as aulas. Muitas vezes, mais importante que
responder é saber ou conseguir elaborar uma boa pergunta (VASCONCELLOS,
1995).
Terceiro princípio: redimensionar o uso da avaliação

Até que ponto usamos devidamente os instrumentos avaliativos ou mesmo,


até que ponto a forma como avaliamos tem contribuído para nos mostrar, com
clareza, o que aprendeu e o que não aprendeu o nosso aluno? Uma coisa é certa:
é essencial e urgente que diminuamos a ênfase na avaliação (VASCONCELLOS,
1995), O tempo todo a avaliação domina o cenário da sala de aula. È preciso
romper com a centralidade da avaliação. Assim como a escola de educação
básica, a Universidade tem se voltado totalmente para a avaliação. Criamos rituais
especiais para que essa avaliação aconteça, damos muito mais valor ao dia da
prova do que aos dias em que acontecem diferentes aprendizagens. Por que será
que advertimos para que nossos alunos estudem somente nas vésperas das
provas? Por que não os orientamos a estudar todos os dias? Pois bem, situações
como estas confirmam o quanto temos pervertido o papel da avaliação e mesmo o
papel da escola. Até parece que mais importante que conhecer, saber o máximo
possível é tirar uma nota x ou y. Essa prática precisa ser questionada dentro das
Universidades. Se quisermos avaliar e não apenas verificar conhecimentos
mecanicamente memorizados, temos que avaliar durante o processo de
aprendizagem, ou seja, sempre que for preciso e devemos avaliar para ajudar o
aluno, não apenas para atribuir-lhe uma nota.

Nesse sentido, não há como deixar de criticar a prova como instrumento


meramente verificativo. Apesar de ser muitíssimo utilizada nas práticas atuais, em
se tratando de avaliação processual, esse instrumento não cumpre um papel
significativo. Aplicar a prova, nos moldes tradicionais, provoca uma ruptura com o
processo de ensino -aprendizagem, além de favorecer a ênfase à nota, que acaba
servindo apenas para classificar o aluno e não para diagnosticar a realidade
avaliada.

Sabemos que não é fácil implementar as mudanças, especialmente se elas


vão mexer com as “mentalidades arraigadas em nós”. De qualquer modo, temos o
dever de começar, mesmo que seja aos poucos, paulatinamente. Podemos deixar
de fazer aquelas tão famosas semanas de provas; não precisamos mudar o ritual
só porque estamos avaliando; podemos avaliar em diferentes oportunidades; não
precisamos nos prender apenas em provas; mas se o fizermos podemos
diversificar os tipos de questões, contextualizá -las, colocar questões a mais como
opção de escolha; podemos dimensionar o tempo a ser gasto durante a prova,
para diminuir a ansiedade dos alunos. Além disso, temos obrigação de deixar
claro quais serão os critérios utilizados durante qualquer prática avaliativa,
especialmente se for atribuída alguma nota. Se avaliarmos no dia a dia, a
tendência é deixar de ser necessário marcar o conteúdo a ser cobrado na prova
para que os alunos não caiam no vício de estudar apenas o que cobramos em
avaliações quantitativas. Podemos ser criativos e diversificar a forma de avaliar:
fazendo avaliações em dupla ou em grupos, claro sem dispensar a individual;
fazendo avaliação com consulta; elaborando avaliações interdisciplinares;
deixando que os alunos elaborem questões ou propostas de trabalhos para
avaliações; eliminando uma das notas de um conjunto, para que o aluno fique
menos tenso. Não precisamos incentivar a competição, nem comparar alunos
entre si. E, ainda, para não sobrecarregar o professor, podemos fazer correções
por amostragem, autocorreão ou correção-mútua pelos alunos com a nossa
supervisão. Por fim, podemos introduzir novas práticas de reflexão sobre as
experiências de avaliação, ou seja, precisamos saber o que os alunos acham do
método avaliativo ou mesmo do instrumento utilizado. Talvez o problema esteja no
como avaliamos ou o que usamos para avaliar e não no aluno (VASCONCELLOS,
1995).

Quarto princípio: temos que redimensionar o conteúdo


da avaliação

Como escolhemos o que deve ser cobrado em uma avaliação? Será que o
que perguntamos em uma prova é realmente o que o aluno precisa saber? As
respostas para essas questões devem ser encontradas nos objetivos do ensino.
Freitas (1995) defende que a avaliação não pode estar desvinculada dos
objetivos. O que pretendemos com o conteúdo que passamos aos nossos
alunos? Tendo essa resposta, conseqüentemente teremos a resposta para as
duas primeiras perguntas. Para uma prática avaliativa transformadora temos,
necessariamente, que deixar de fazer avaliação de cunho meramente decorativo.

O enunciado prolixo de uma questão não pode ser mais importante do que
a própria capacidade de resolução de um problema. Para mudar, precisamos fugir
do uso de questionários que só enfatizam a memorização, podemos fazer a
avaliação sócio-afetiva, ou seja, observarmos as atitudes, os valores, os
interesses, os esforços dos alunos, a participação, o comportamento, o
relacionamento, a criatividade, a iniciativa, etc. Mas tudo isso sem vincular à nota,
afinal, como é possível medir e contar acertos sobre esses aspectos? Podemos
sim avaliar, no sentido de acompanhar o desenvolvimento sócio-afetivo de nossos
alunos e saber o quanto esse aspecto tem influenciado positiva ou negativamente
no desenvolvimento cognitivo dos mesmos. Quanto à nota de participação, se
usada, somente com critérios bem objetivos tais como, dar nota àqueles que
entregarem as atividades solicitadas, aos que fizerem todas as tarefas, aos que
estiverem presentes nas aulas, aos que trouxerem o material, enfim, somente
podemos avaliar quantitativamente os aspectos mais objetivos para não cairmos
na subjetividade, muitas vezes, discriminatória e preconceituosa (Vasconcellos,
1995).
Outra prática interessante para ser implementada com rigor e seriedade é a
auto-avaliação como parte da formação do educando. Isto não significa de forma
alguma, solicitar ao aluno que se atribua uma nota. A auto-avaliação significa criar
situações em que o aluno precise comparar sua atuação, refletir sobre ela e
avaliá-la a partir de critérios previamente discutidos e definidos pelo coletivo da
sala de aula.
Quinto princípio: é extremamente necessário alterar a
nossa postura diante dos resultados

Esse princípio deve ser considerado como um dos mais importantes para
que realmente ocorra uma mudança em nossa prática meramente verificativa. Se
não pararmos de agir com a intenção de apenas quantificar o que nossos alunos
sabem e depois publicarmos os resultados, de nada vai adiantar tentarmos
implementar qualquer um dos princípios anteriormente apresentados. Perceber as
necessidades/ dificuldades dos alunos e conseguir intervir na realidade para
ajudar na superação faz-se necessário. Aqui, o erro passa a ser muito importante
para o nosso trabalho. O erro revela que o aluno precisa de nossa ajuda. Através
de seu erro saberemos com ajudá-lo e o que, ou em que, ele precisa de nossa
ajuda. Se não pudermos fazer nada pelos alunos que não aprenderam, então qual
será o nosso papel? Será que somos capazes de ensinar apenas aos alunos que
não têm nenhuma dificuldade? Com certeza não.

Outra atitude em favor da avaliação é a urgente necessidade de


implementarmos os conselhos de turma durante todo o processo de ensino e de
aprendizagem. Um conselho representa uma forma coletiva de conhecer um aluno
e obter maiores informações sobre o mesmo, além de propiciar decisões
descentralizadas. Assim, estaremos dividindo tamanha responsabilidade para
aprovar ou reprovar um aluno, por exemplo, quando tomamos decisões coletivas
sobre o futuro de nossos alunos (VASCONCELLOS, 1995).

Sexto princípio: criar uma nova mentalidade junto aos


alunos, aos professores e à comunidade acadêmica

Dificilmente conseguiremos grandes mudanças se não trabalharmos na


conscientização da comunidade acadêmica como um todo.Essa é a forma de
ampliar o grupo de adesão às novas concepções de avaliação e
conseqüentemente de educação. Só muda quem adquire consciência e desejo de
mudança. Esse processo deve ser coletivo, precisamos construir critérios comuns
que embasem uma prática também comum dentro do ambiente universitário. Para
que isso ocorra, a universidade tem que se envolver em uma campanha em favor
de novas práticas avaliativas. As principais decisões de mudanças devem obter o
consenso da maioria que irá implementá-las, ou então corremos o risco de não vê-
las saírem do papel.

A partir dos princípios apresentados, podemos também propor o uso de


alguns instrumentos que poderão nos ajudar ao longo do processo de avaliação
formativa da aprendizagem de nossos alunos.
Painel Integrado

Essa atividade permite ao aluno, por meio da pesquisa, um conhecimento


mais aprofundado sobre um assunto e uma visão geral sobre temas correlatos.
Permite ao professor acompanhar o desenvolvimento do aluno e sua capacidade
de compreensão por meio do estudo individual, num primeiro momento, e coletivo
no segundo momento. A partir de uma questão a ser investigada, os alunos
podem ser motivados a pesquisar, individualmente em busca de respostas. Num
segundo momento juntam-se as pesquisas com temáticas comuns para que os
alunos complementem a pesquisa individual, fazendo, dessa forma, a integração
horizontal. Para que aconteça uma integração vertical, os alunos devem formar
novos grupos, compostos por alunos que pesquisaram temáticas diferentes e
nesse momento, cada membro do grupo apresenta o seu estudo ao outro,
permitindo a todos uma visão geral de todas as temáticas pesquisadas. Para
possibilitar a avaliação é importante que cada etapa seja registrada pelos alunos e
acompanhada pelo professor. Não podemos nos esquecer de registrar as
dificuldades dos alunos para que sejam trabalhadas. É recomendável que
aconteça um último momento em que haja um grande debate com o envolvimento
de todos os alunos e com a coordenação do professor, inclusive para tirar dúvidas
e preencher lacunas.

Prova escrita dissertativa

O objetivo dessa atividade é verificar o desenvolvimento das habilidades


intelectuais (raciocínio lógico, organização das idéias, clareza de expressão,
originalidade, capacidade de fazer relações entre fatos, idéias e coisas,
capacidade de aplicação de conhecimentos, etc.) dos alunos na assimilação dos
conteúdos, avaliar atitudes dos alunos (valores) e hábitos necessários ao trabalho
escolar. A prova escrita dissertativa corresponde a um conjunto de questões ou
temas, que exigem respostas com as palavras dos próprios alunos. As provas
devem ser bem elaboradas, devem ser claras e mencionar uma habilidade mental:
compare, relacione, sintetize, descreva, apresente argumentos contra ou a favor,
explique, etc. Apesar de ser um instrumento bastante utilizado, nem sempre
estamos conscientes sobre o que é possível avaliar através desse instrumento.
Entretanto, não podemos nos esquecer de que esse instrumento avaliativo não é
compatível com uma avaliação processual, porque é dado em um momento
estanque, rompendo com o processo de ensino e aprendizagem.

Existem algumas ações que podem amenizar os efeitos negativos que a


prova traz como instrumento avaliativo. Um bom exemplo talvez seja a prática de
uma professora do curso de odontologia, da Universidade Federal de Goiás, que
admite ainda manter práticas tradicionais por não conseguir romper totalmente e
por entender que também os alunos ainda não estão preparados para uma
postura diferente acerca do processo avaliativo. A professora aplica quatro provas
durante o bimestre. Em duas provas ela mantém os mesmos procedimentos
conhecidos por nós: sem consulta e individual. Nas outras duas, a partir da idéia
de que a avaliação serve também como recurso de aprendizagem, o aluno passa
por duas experiências diferentes: na primeira eles recebem a prova e podem
discutir com o colega em sala sobre as respostas, se houver dúvidas eles podem,
inclusive, questionar o colega. Na segunda experiência, o aluno recebe as
questões da prova e pode se dirigir à biblioteca, aos livros, aos computadores, à
Internet. Ele tem três horas para entregar a sua prova (CHAVES, 2003). O mais
importante dessa experiência é que os alunos têm oportunidade de aprender a
valorizar o conhecimento e não simplesmente a prova e sua nota. Ainda assim,
também ao utilizar este instrumento avaliativo, não podemos nos esquecer que
mais importante do que a metodologia ou a forma como aplicamos a prova é o
tratamento que é dado aos resultados proporcionados pelo instrumento. Fazer
algo para mudar a realidade detectada é que nos torna bons avaliadores.

Observação como instrumento de investigação

A observação visa a investigar, informalmente, as características individuais


e grupais dos alunos, tendo em vista identificar fatores que influenciam a
aprendizagem e o estudo das matérias e, na medida do possíve l, modificá-los.
Através da observação é possível desenvolver a capacidade de percepção dos
comportamentos manifestos ou não dos alunos. Entretanto, ela está sujeita à
subjetividade do professor e, portanto, a erros de percepção e a tendenciosidade.
Por essa razão não se deve tirar conclusões na base de ocorrências esporádicas
e de julgamentos apressados que estão por trás. Devem ser levados em conta os
condicionantes econômicos e sócio-culturais e as possibilidades de que sejam
modificados pela ação pedagógico-didática e pela própria reação dos alunos. A
observação não deve ser mera opinião, mas sim uma avaliação fundamentada em
várias situações e com critérios. A observação deve ser sistematizada através de
uma ficha. O registro pode ser feito através de uma apreciação que pode ser:
sempre, quase sempre, raramente; ou muito bom, satisfatório, insatisfatório
(LIBÂNEO, 1994). Apresentamos abaixo alguns itens que podem ser objeto de
observação tendo como base a proposta de Libâneo (1994):

• Quanto ao desenvolvimento intelectual:


1. Presta atenção nas aulas e no trabalho independente;
2. É persistente na realização das tarefas;
3. Tem facilidade de assimilação do conteúdo;
4. Demonstra atitude positiva em relação ao estudo;
5. Tem facilidade de expressão verbal;
6. Lê e escreve corretamente;
7. Tem pensamento criativo e independente.

• Quanto à organização de hábitos pessoais:


1. Apresenta seus materiais em ordem e em tempo hábil;
2. Apresenta as atividades acadêmicas no prazo solicitado;
3. Demonstra comportamento de estudo necessário às
atividades acadêmicas;
4. Dispõe dos instrumentos de apoio necessários ao
desenvolvimento do estudo, e outros.
Outros itens poderão ser construídos coletivamente pelos professores e
alunos da turma e/ ou do curso. Também aqui os registros são importantes, e
pensar alternativas que possam alterar os comportamentos apresentados como
inadequados ao trabalho acadêmico é que torna o instrumento realmente
avaliativo.

Diário reflexivo

Esse instrumento tem como objetivo registrar diariamente o conteúdo


estudado, através de conceitos básicos trabalhados em sala de aula, na
percepção do aluno. Ao final de um conteúdo trabalhado, o aluno é convidado a
escrever sobre o conceito básico da aula dada. O professor recolhe e faz
observações na aula seguinte a partir do que o aluno conseguiu registrar da aula.
Pode ser feito por amostragem para superar a falta de tempo que exige um
acompanhamento diário.

Auto-avaliação

Visa à autocrítica e à co-responsabilidade em relação ao desenvolvimento


intelectual do aluno. A auto-avaliação colabora para promover a socialização e o
amadurecimento do mesmo. Ela deve ser feita através de roteiros que avaliem
diferentes aspectos das atividades acadêmicas, constituindo-se em um importante
instrumento de formação do aluno.

Portfólio

Seu objetivo é encorajar a reflexão e o estabelecimento de objetivos. O


aluno tem a oportunidade de relatar suas experiências durante o processo de
aprendizagem e refletir sobre elas. O portfólio é uma coleção de itens que revela,
conforme o tempo passa, os diferentes aspectos do desenvolvimento do aluno.
Através do portfólio o aluno consegue perceber sua evolução acadêmica.

Trabalho monográfico
Por meio de um projeto de pesquisa e com a ajuda de um professor
orientador, o aluno vivencia o processo de produção de conhecimento, a partir da
problematização de uma dada realidade. Esse trabalho avaliativo é mais comum
nos cursos de graduação, especialmente para os alunos de iniciação científica.
Seminário

Esse instrumento tem sido muito utilizado no ensino superior, entretanto


com várias deturpações acerca de seu procedimento, especialmente em se
falando do papel do professor na realização do seminário. Na verdade, o
seminário deve acontecer a partir de um grupo de estudos em que se debate um
ou mais temas apresentados por um ou vários alunos, sob a direção do professor
responsável pela disciplina do curso. Seu objetivo é investigar um problema, sob
diferentes perspectivas, tendo em vista alcançar profundidade de compreensão.

Entrevista

A entrevista permite ampliar os dados que o professor já tem, tratar de um


problema específico detectado nas observações, esclarecer dúvidas quanto a
determinadas atitudes e hábitos dos alunos. Portanto, precisa ocorrer sempre que
o professor sentir necessidades de esclarecimentos.

Conselho de turma

Por fim, ousamos propor que a avaliação aconteça de forma coletiva. Que
haja momentos para que professores e alunos possam discutir os problemas de
aprendizagem e propor sugestões em conjunto para solucioná-las. E o mais
importante: que a decisão de reprovar um aluno passe pela avaliação de um
conselho criado especialmente para participar do processo de avaliação formativa
e que esse conselho se reúna durante todo o semestre letivo e não apenas ao
final. De qualquer modo, o conselho de turma deve ter um acompanhamento
criterioso de todos os alunos de uma turma e deve ser mais abrangente por contar
com a avaliação dos professores e alunos da turma.

Enfim, todas essas propostas precisam levar em conta que:

A qualidade da argumentação, a percepção aguçada e crítica no


exame dos dados, a capacidade de articulação de teoria e prática,
as habilidades de organização das respostas com logicidade,
clareza e coerência, os estilos de fala e escrita, o emprego
adequado de princípios e normas formam um conjunto de
aprendizagens ao qual se pode atribuir a distinção acadêmica. É a
totalidade da aprendizagem que precisa ser destacada. Quanto
mais o processo avançar na complexidade do conhecimento,
maior será a conquista, que não exclui os sujeitos e a diversidade,
mas é rigorosa. (ROMANOWSKY & WACHOWICZ, 2004, p. 127).
Considerações finais

Na verdade, tudo o que foi dito parte da idéia de que:

A Avaliação é um processo abrangente da existência humana,


que implica uma reflexão crítica sobre a prática, no sentido de
captar seus avanços, suas resistências, suas dificuldades e
possibilitar uma tomada de decisão sobre o que fazer para
superar os obstáculos. É a forma de acompanhar o
desenvolvimento dos educandos e ajudá-los em suas eventuais
dificuldades. (VASCONCELLOS, 1995, p. 43).

Então, as sugestões apresentadas podem não representar nada se não


conseguirmos mexer com nossas concepções e se não mudarmos a situação
avaliada. De qualquer modo, novas práticas avaliativas fazem-se necessárias,
mesmo que sejam pequenas, paulatinas e que aconteçam, inicialmente, apenas
no interior de uma sala de aula. Temos que começar de alguma forma, mas
precisamos atingir toda a universidade com o passar dos dias.

Mudar as concepções e as práticas avaliati vas não é deixar de avaliar, nem


afrouxar. Ao contrário, é ser mais exigente e avaliar muito mais. Além disso, não
podemos mais avaliar apenas o aluno, pois todo o sistema faz parte do processo,
inclusive o nosso trabalho como professores. Avaliar a aprendizagem de nossos
alunos, por mais complexo que possa parecer, é possível e necessário. Não
haverá transformação sem ações concretas, mesmo que pareçam pequenas. Vale
a pena começar. Afinal,

“O real não está na saída nem na chegada... Ele se dispõe para a


gente é no meio da travessia...” (Guimarães Rosa).
Referências bibliográficas

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complexidade e possibilidades. São Paulo: FEUSP. Tese de doutorado, 200.

FREITAS, L. C. (Org.). Crítica da organização do trabalho pedagógico e da


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HOFFMANN, J. Avaliação mediadora: uma prática em cons trução da pré-escola


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VASCONCELLOS, Celso dos S. Avaliação da aprendizagem: práticas de


mudança – por uma práxis transformadora. São Paulo : Libertad, 1998.

______. Avaliação: concepção dialética-libertadora do processo de avaliação


escolar. São Paulo: Libertad, 1995.
POR QUE FALAR AINDA
EM AVALIAÇÃO?
Chanceler
Dom Dadeus Grings
Reitor
Joaquim Clotet
Vice-Reitor
Evilázio Teixeira
Conselho Editorial
Ana Maria Lisboa de Mello
Elaine Turk Faria
Érico João Hammes
Gilberto Keller de Andrade
Helenita Rosa Franco
Jane Rita Caetano da Silveira
Jerônimo Carlos Santos Braga
Jorge Campos da Costa
Jorge Luis Nicolas Audy – Presidente
José Antônio Poli de Figueiredo
Jurandir Malerba
Lauro Kopper Filho
Luciano Klöckner
Maria Lúcia Tiellet Nunes
Marília Costa Morosini
Marlise Araújo dos Santos
Renato Tetelbom Stein
René Ernaini Gertz
Ruth Maria Chittó Gauer
EDIPUCRS
Jerônimo Carlos Santos Braga – Diretor
Jorge Campos da Costa – Editor-chefe
Marlene Correro Grillo
Rosana Maria Gessinger
(Organizadoras)

Ana Lúcia Souza de Freitas


Helena Sporleder Côrtes
João Batista Siqueira Harres
Márcia de Borba Campos
Valderez Marina do Rosário Lima

POR QUE FALAR AINDA


EM AVALIAÇÃO?

Porto Alegre, 2010


© EDIPUCRS, 2010

Capa Vinícius Xavier


Revisão de texto Fernanda Lisboa

Revisão final Gilberto Scarton e Marisa Magnus Smith

EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Vinícius Xavier

EDIPUCRS – Editora Universitária da PUCRS


Av. Ipiranga, 6681 – Prédio 33
Caixa Postal 1429 – CEP 90619-900
Porto Alegre – RS – Brasil
Fone/fax: (51) 3320 3711
e-mail: edipucrs@pucrs.br - www.pucrs.br/edipucrs

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

P832 Por que falar ainda em avaliação? [recurso eletrônico] /


organizadoras, Marlene Correro Grillo, Rosana Maria Ges-
singer ; Ana Lúcia Souza de Freitas ... [et al.]. – Porto Alegre :
EDIPUCRS, 2010.
130 p.

Publicação Eletrônica.
Modo de Acesso: <http://www.pucrs.br/orgaos/edipucrs/>
ISBN: 978-85-7430- 982-8 (on-line)

1. Educação. 2. Ensino Superior (Avaliação). 3. Ensino.


4. Aprendizagem. I. Grillo, Marlene Correro. II. Gessinger,
Rosana Maria. III. Freitas, Ana Lúcia Souza de.
CDD 378.16

Ficha Catalográfica elaborada pelo Setor de Tratamento da Informação da BC-PUCRS.

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas
gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação total ou parcial,
bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também
às características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos, do Código
Penal), com pena de prisão e multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998,
Lei dos direitos Autorais).
APRESENTAÇÃO

A publicação que ora apresentamos aos docentes da PUCRS procura expandir


os temas que têm sido objeto de estudos da Pró-Reitoria de Graduação – PRO-
GRAD, incluindo aqueles abordados nas diferentes edições do Programa de Ca-
pacitação Docente. Foi assim com as primeiras produções: Educação superior: vi-
vências e visões de futuro (2005); A gestão da aula universitária na PUCRS (2008);
Inovação curricular nos cursos de Graduação (2009); Capacitação docente: um
movimento que se faz compromisso (2010).
Esta obra, que leva o nome Por que falar ainda em avaliação?, não foge à
natureza das anteriores. O próprio título já encaminha múltiplas respostas, sina-
lizando que os estudos empreendidos, longe de esgotarem tema tão importante
e até mesmo polêmico, abrem perspectivas para novas reflexões, que possam
responder – talvez ainda que de modo provisório – às contínuas mudanças no
cenário em que se concretizam as atividades de ensino e de aprendizagem.
Nessa medida, os temas abordados são uma possibilidade de compartilhamen-
to de ideias que ensejam práticas avaliativas em consonância com os princípios de
gestão da aula universitária da PUCRS.
É exatamente aí que reside o desafio deste livro: a partir das reflexões aqui
apresentadas, fica a esperança de que avancemos na direção de tornar a avaliação
um processo mais aberto e coerente com as exigências dos novos tempos da for-
mação profissional e humana.

Solange Medina Ketzer


Pró-Reitora de Graduação da PUCRS
SUMÁRIO

Introdução............................................................................................... 09

Sobre os Autores..................................................................................... 11

1. Especificidades da avaliação que convém conhecer................... 15


Marlene Correro Grillo
Valderez Marina do Rosário Lima

2. Questões sobre avaliação da aprendizagem:


a voz dos professores ........................................................................... 23
Valderez Marina do Rosário Lima
Marlene Correro Grillo

3. Critérios de avaliação a serviço da aprendizagem....................... 35


Rosana Maria Gessinger
Marlene Correro Grillo
Ana Lúcia Souza de Freitas

4. Autoavaliação: por que e como realizá-la?.................................... 45


Marlene Correro Grillo
Ana Lúcia Souza de Freitas

5. Os desafios do planejamento e da prática de avaliação em


ambientes on-line................................................................................... 51
Márcia de Borba Campos

6. O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e


avaliar filmes em sala de aula ............................................................. 63
Helena Sporleder Côrtes

7. Diferentes formas de expressão da aprendizagem..................... 85


Valderez Marina do Rosário Lima
Marlene Correro Grillo
João Batista Siqueira Harres
8. Questões de prova e suas especificidades..................................... 95
Valderez Marina do Rosário Lima
Rosana Maria Gessinger
Marlene Correro Grillo

9. Contribuições para a elaboração de


questões de resposta livre.................................................................... 105
Marlene Correro Grillo
Rosana Maria Gessinger

10. Contribuições para a elaboração de questões objetivas ......... 111


Marlene Correro Grillo
Rosana Maria Gessinger
INTRODUÇÃO

Animou-nos à elaboração desta coletânea a boa acolhida que as publicações


da PROGRAD têm recebido da comunidade docente, bem como a expectativa,
manifesta por muitos docentes da PUCRS, de transformar as reflexões nelas ex-
pressas em referências pedagógicas para as áreas específicas de suas práticas,
utilizando-as em cursos de Graduação e de Pós-Graduação e ainda divulgando
sua acessibilidade por endereço eletrônico a todos os interessados pelo tema.
Os textos que constituem esta publicação não têm origem aleatória; pelo con-
trário, pretendem constituir um todo orgânico – ainda que se fundamentem em
questionamentos e dúvidas suscitadas na relação dialógica com docentes sobre
a problemática da avaliação em diferentes oportunidades. Essa unidade objetiva
ampliar fronteiras e criar novas relações; fortalecer a tensão entre teoria e prática;
e consolidar a articulação entre o cotidiano da sala de aula e as pulsões de distin-
tas naturezas que transcendem esse espaço.
Procuramos evitar o caráter prescritivo das fórmulas prontas, das soluções tor-
nadas anacrônicas pelos novos princípios da ciência de educar e formar. Tomadas
como certezas, especialmente pelo conforto aparente que conferem a docente e
discente, a rigidez da tradição pedagógica por vezes fere o caráter de provisorie-
dade das questões específicas e atuais de avaliação – circunstanciais por natureza
e concretizadas na prática e na experiência.
Pretendemos que a cautela em apresentar respostas conclusivas às questões
que a avaliação propõe impulsione o professor a realizar tanto novas reflexões
quanto implementar novas práticas, iluminadas pelos enfoques teóricos apresen-
tados. É, ainda, nossa preocupação, a compreensão pelos leitores da função diag-
nóstica da avaliação, cujas palavras de Luckesi1 (1996, p.180) ajudam a esclarecer:

1  LUCKESI, C. C. Avaliação da aprendizagem escolar. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1996.


Introdução

O ato de avaliar não se destina a um julgamento definitivo, pois não é um ato


seletivo. Ele se destina ao diagnóstico e, por isso mesmo, à inclusão; destina-
se à melhoria do ciclo de vida. Por isso, é um ato amoroso. (grifos nossos)

Esperamos que este conjunto de textos ajude a diminuir o estranhamento


dessas palavras e aumente a sua compreensão e a sua concretização nas práticas
avaliativas. Há um convite para seguirmos a caminhada, que só se tornará reali-
dade se nos integrarmos a esse movimento. Somos todos responsáveis e capazes
de realizá-la.

As Organizadoras

Porto Alegre, julho de 2010.

10
SOBRE OS AUTORES

Ana Lúcia Souza de Freitas


é Licenciada em Pedagogia, Supervisão Escolar pela FAPA. Mestre e Doutora em
Educação pela PUCRS. É Professora Adjunta da Faculdade de Educação, atua
como colaboradora do Programa de Pós- Graduação em Educação e como Asses-
sora Pedagógica da Pró-Reitoria de Graduação da PUCRS. Desenvolve pesquisas
no âmbito da educação popular e da formação de professores. Entre suas pro-
duções teóricas, destacam-se: a publicação de Pedagogia da conscientização: um
legado de Paulo Freire à formação de professores (EDIPUCRS, 2001); o prefácio
à Pedagogia dos sonhos possíveis (UNESP, 2001); a organização de Contra o des-
perdício da experiência: a pedagogia do conflito revisitada (Redes Editora, 2009)
e a coautoria no Dicionário Paulo Freire (Autêntica, 2008, 2010) e nos livros A
gestão da aula universitária na PUCRS (EDIPUCRS, 2008); Inovação curricular
nos cursos de graduação: uma experiência compartilhada (EDIPUCRS, 2009) e
Capacitação docente: um movimento que se faz compromisso (EDIPUCRS, 2010).
E-mail: ana.freitas@pucrs.br.

Helena Sporleder Côrtes


é Licenciada em Pedagogia, Especialista em Tecnologia Educacional, Mestre e
Doutora em Educação pela PUCRS. É Professora Titular da Faculdade de Educa-
ção da PUCRS e Coordenadora do Curso de Pedagogia Multimeios e Informática
Educativa. Atua como Assessora Pedagógica da Pró-Reitoria de Graduação, no
LAPREN (Laboratório de Aprendizagem), e como docente da PUCRS Virtual, em
cursos regulares de Especialização lato sensu. Desenvolve pesquisas no âmbito
da Educação e Comunicação. Participa do Grupo de Pesquisa CNPq/LINCOG
– Linguagem, Comunicação e Cognição, da PUCRS, de composição multidisci-
plinar. Entre suas produções teóricas, destacam-se capítulos nos livros Leitura:
significações plurais – educação e mídia: o visível, o ilusório, a imagem (EDIPU-
Sobre os Autores

CRS, 2003), Educação presencial e virtual: espaços complementares essenciais na


escola e na empresa (EDIPUCRS, 2006), Culturas juvenis: dinamizando a escola
(EDIPUCRS, 2009) e Capacitação docente: um movimento que se faz compromis-
so (EDIPUCRS, 2010). E-mail: helencor@pucrs.br.

João Batista Siqueira Harres 


é Licenciado em Física pela UFRGS, Mestre em Métodos e Técnicas de Ensino e
Doutor em Educação pela PUCRS. Realizou Pós-Doutorado na Faculdade de Ci-
ências da Educação da Universidade de Sevilha, na Espanha. É Professor Adjunto
da Faculdade de Física da PUCRS e Coordenador do Curso de Licenciatura em
Física. Atua no Mestrado em Educação em Ciências e Matemática e como Assessor
Pedagógico da Pró-Reitoria de Graduação da PUCRS. Desenvolve pesquisas em
uma perspectiva reflexiva e investigativa na formação e no desenvolvimento pro-
fissional de professores, e no ensino e aprendizagem de Física. Entre suas produ-
ções teóricas destacam-se a publicação, em coautoria, de Laboratórios de ensino:
inovação curricular na formação de professores de ciências (ESETEC/CNPq, 2005),
e de capítulos nos livros Filosofia e história da ciência no contexto da educação
em ciências: vivências e teorias (EDIPUCRS, 2007) e Capacitação docente: um mo-
vimento que se faz compromisso (EDIPUCRS, 2010). E-mail: joao.harres@pucrs.br.

Márcia de Borba Campos


é Bacharel em Informática pela PUCRS, Mestre em Ciência da Computação e Dou-
tora em Informática na Educação pela UFRGS. É Professora Adjunta da Faculdade
de Informática da PUCRS e de cursos de especialização lato sensu. Coordena os
Cursos de Extensão da Pró-Reitoria de Extensão da PUCRS. É líder do grupo de
pesquisa em Informática na Educação da Faculdade de Informática da PUCRS. De-
senvolve pesquisas nas linhas de formação de professores para uso pedagógico de
tecnologias, Informática na Educação Especial, Tecnologias Assistivas, Educação
a Distância e Educação Continuada. Entre suas produções teóricas destacam-se a
publicação, em coautoria, de Quem vem primeiro: a escolha tecnológica ou a pro-
posta pedagógica? Uma reflexão acerca das possibilidades da educação a distância
na sociedade da aprendizagem (HIFEN, 2007); Uma reflexão acerca das possibili-
dades da educação a distância: a experiência da PUCRS (Lisboa, 2007); Promoção
da cidadania da comunidade surda: o uso das TICs na apropriação de sua língua
materna (SEMISH, 2007), e de capítulos nos livros Leitura – significações plurais:

12
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

o visível, o ilusório, a imagem (EDIPUCRS, 2003), Educação superior: vivências e


visão de futuro (EDIPUCRS, 2005), Capacitação docente: um movimento que se
faz compromisso (EDIPUCRS, 2010). E-mail: marcia.campos@pucrs.br.

Marlene Correro Grillo


é Licenciada em Pedagogia pela PUCRS, Mestre em Métodos e Técnicas de Ensino
e Doutora em Educação pela PUCRS. É Professora Titular do Programa de Pós-
Graduação da Faculdade de Educação e Assessora Pedagógica da Pró-Reitoria de
Graduação. Desenvolve pesquisas na linha de Formação de Professores e Edu-
cação Continuada, estudando a prática pedagógica numa perspectiva reflexiva e
investigativa. Entre suas produções teóricas, destacam-se publicações, em coau-
toria: Avaliação, uma discussão em aberto (EDIPUCRS, 2000); A construção do
conhecimento e sua mediação metodológica (EDIPUCRS, 2000); Ser professor (EDI-
PUCRS, 2001); Educação superior: travessuras e atravessamentos (ULBRA, 2001);
Educação superior: vivências e visão de futuro (EDIPUCRS, 2005); A docência na
educação superior: sete olhares (Evangraf, 2006); A gestão da aula universitária
na PUCRS (EDIPUCRS, 2008); Inovação curricular nos cursos de graduação: uma
experiência compartilhada (EDIPUCRS, 2009) e Capacitação docente: um movi-
mento que se faz compromisso (EDIPUCRS, 2010). E-mail: mcgrillo@pucrs.br.

Rosana Maria Gessinger


é Licenciada em Matemática pela UFRGS, Mestre e Doutora em Educação pela
PUCRS. É Professora Adjunta da Faculdade de Educação e Assessora Pedagógica
da Pró-Reitoria de Graduação da PUCRS. Desenvolve pesquisas no âmbito da for-
mação de professores e da educação matemática. Entre suas produções teóricas
destacam-se publicações, em coautoria, de A gestão da aula universitária na PU-
CRS (EDIPUCRS, 2008); Inovação curricular nos cursos de graduação: uma expe-
riência compartilhada (EDIPUCRS, 2009) e Capacitação docente: um movimento
que se faz compromisso (EDIPUCRS, 2010), e de capítulos nos livros Pesquisa em
sala de aula: tendência da educação em novos tempos (EDIPUCRS, 2003) e Pro-
postas interativas na educação científica e tecnológica (EDIPUCRS, 2008). E-mail:
rosana.gessinger@pucrs.br.

Valderez Marina do Rosário Lima


é Licenciada em Ciências, Habilitação em Biologia pela PUCRS, Mestre e Doutora
em Educação pela PUCRS. É professora Adjunta da Faculdade de Educação e do

13
Sobre os Autores

Mestrado em Educação em Ciências e Matemática e Coordenadora de Ensino e


Desenvolvimento Acadêmico da Pró-Reitoria de Graduação da PUCRS. Desenvol-
ve pesquisas nas linhas de formação e educação continuada de professores de
Ciências e Matemática. Entre suas produções teóricas destacam-se a publicação,
em co-autoria, de Pesquisa em Sala de Aula: tendência da educação em novos
tempos (EDIPUCRS, 2003); A gestão da aula universitária na PUCRS (EDIPUCRS,
2008); Inovação Curricular nos Cursos de Graduação: uma experiência comparti-
lhada (EDIPUCRS, 2009) e Capacitação Docente: um movimento que se faz com-
promisso (EDIPUCRS, 2010), e de capítulos nos livros Sphaera: sobre ensino de
matemática e ciências (PREMIER, 2009) e Contribuições de um Museu Interativo à
Educação em Ciências e Matemática (EDIPUCRS, 2009).
E-mail: valderez.lima@pucrs.br.

14
1. ESPECIFICIDADES DA AVALIAÇÃO
QUE CONVÉM CONHECER
Marlene Correro Grillo
Valderez Marina do Rosário Lima

A abrangência da concepção de avaliação amplia-se permanentemente, assu-


mindo dimensões diversas na área da educação. Tratar deste tema implica revisitar
antigas questões que, com algumas modificações, permanecem contemporâneas
pelas interfaces estabelecidas com novos questionamentos. Isso dá à avaliação
caráter de atualidade e de dinamicidade, pois, no movimento de expansão de sua
abrangência, ela acolhe outras indagações e compõe novos quadros caleidoscó-
picos, constituindo terreno fértil para a continuidade ou o aprofundamento de
estudos.
Luckesi (1996, p.33) definiu a “(...) avaliação como um juízo de qualidade so-
bre dados relevantes para uma tomada de decisões”. Nesta definição, a tomada de
decisões marca a avaliação com a função precípua de diagnóstico, um momento
dialético de conhecimento do estágio em que se encontra a aprendizagem do
aluno em relação a novos conhecimentos, ao desenvolvimento da autonomia e
de competências.
Buscando explicitar o caráter diagnóstico, Remião (2007) explica que fazemos
julgamentos de qualidade para tomar decisões sobre nossos posicionamentos em
relação a fatos, pessoas e fenômenos avaliados. Mas o que caracteriza a avaliação
diagnóstica, em se tratando de educação, é a intenção prévia do professor de
providenciar ações reorientadoras da prática educativa. O julgamento de valor e
a tomada de decisão são os componentes mais relevantes da avaliação na prática
GRILLO, M. C.; LIMA, V. M. R.  —   Especificidades da avaliação que convém conhecer

escolar, pois eles podem se revestir de compreensão, parceria e acolhimento entre


avaliador e avaliados, dando continuidade ao processo de avaliação, ou podem
ser um elemento autoritário, quando a decisão se constituir no encerramento do
processo avaliativo. Em ambos os casos ocorreu avaliação.
É recorrente um equívoco conceitual na atual prática avaliativa: o julgamen-
to de valor, que deveria levar a uma nova tomada de decisão, passa a ter uma
função classificatória, tornando-se uma avaliação estática sobre o rendimento do
aluno. O ato de avaliar resulta em julgamento definitivo, caracterizando-se como
ato seletivo e finalista. Trabalha-se uma unidade de ensino, faz-se verificação,
atribuem-se conceitos ou notas e encerra-se aí o ato de avaliar. Esse deixa de ser
uma pausa para repensar a prática e retomá-la, em nada auxiliando para o avanço
e o crescimento da aprendizagem do aluno. Com a função diagnóstica, ao con-
trário, a avaliação fortalece o esforço para a retomada do estudo da forma mais
adequada e não se torna um ponto definitivo de chegada, uma vez que o objeto
da avaliação é dinâmico.
Outra peculiaridade da avaliação que a torna mais complexa é sua incidência
sobre diferentes sujeitos/objetos do processo educativo: professores, alunos, fami-
liares, administradores, Ministério da Educação, que se faz presente por meio de
avaliações nacionais de cursos e de instituições. A avaliação, ao envolver-se com
o processo educativo formal, tem compromisso com definições epistemológicas,
éticas, técnicas, metodológicas e interações grupais, que constituem referencial
pedagógico nem sempre conhecido, apesar do forte impacto desses elementos na
avaliação do ensino e da aprendizagem.
Confronta-se ainda com a questão da diversidade de avaliadores e avaliados
e suas respectivas especificidades, diferenças e subjetividades, com fortes signifi-
cados para a avaliação, o que torna esse processo mais complexo e multidimen-
sional.
As considerações apresentadas podem parecer detalhes secundários pelas
inter-relações que mantêm com concepções de avaliação, porém reforçam a ne-
cessidade de rigor quando se pretende estudar um recorte específico do extenso
e complexo conteúdo de avaliação, como no caso deste texto. À guisa de introdu-
ção, pretende-se sintetizar os princípios norteadores da avaliação, uma vez que
eles constituem o pano de fundo de qualquer estudo sobre ensino, aprendizagem
e sobre a própria avaliação.

16
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Princípios norteadores da avaliação

A avaliação da aprendizagem é uma das dimensões mais exigentes do com-


plexo processo educativo. Como exemplo, a título de provocação, pode-se apre-
sentar um questionamento que, apesar de simples e aparentemente ingênuo, dá
uma ideia do que já foi comentado anteriormente: Que tipo de avaliação estamos
praticando? Avaliação diagnóstica ou avaliação classificatória? Há todo um refe-
rencial também já mencionado que precisa ser explicitado e tornar-se familiar ao
docente, pois a prática pedagógica tem como fundamento um referencial teórico
que serve de pano de fundo de qualquer prática avaliativa. Deixa-se de responder
a essa questão para que os próprios leitores o façam e avaliem, desde o início da
leitura, as consequências de uma indefinição dessa natureza.
Acrescente-se ainda que formular juízos de valor como exigência da avaliação
é assumir compromisso político e ético (RIOS, 2008). Como compromisso políti-
co, a avaliação constitui um instrumento a serviço da aprendizagem, auxiliando
o educando no desenvolvimento da cidadania. Impõem-se para tanto atividades
sistemáticas com temas socioculturais e metodologias ativas que possibilitem a
formação de um cidadão responsável, autônomo e com iniciativas voltadas para
uma prática aberta para o contexto social. O compromisso ético ganha visibilidade
na vivência de uma avaliação fundada no princípio do respeito, da solidariedade
e do bem coletivo. Respeitar o aluno é evitar qualificações como bom ou mau es-
tudante, fazer comparações entre desempenhos, fazer comentários depreciativos,
pois os resultados das avaliações formais causam forte impacto na autoimagem e
na autoestima do estudante.
As informações que a avaliação fornece, e aqui se está tratando de uma
avaliação diagnóstica, têm forte impacto tanto para o professor como para o
aluno. É por meio dos resultados da avaliação que o aluno toma conhecimento
do estágio em que se encontra sua aprendizagem, do significado do esforço
realizado e do que deixou de realizar e das consequências que tais fatos acar-
retam.
Igualmente para o professor, a avaliação da aprendizagem é de reconhecida uti-
lidade, na medida em que permite a reflexão sobre a prática – o exame da coerência
entre os objetivos buscados, os procedimentos de ensino utilizados e os resultados
obtidos – e orienta a tomada de decisões pertinentes para a continuidade do ensino.

17
GRILLO, M. C.; LIMA, V. M. R.  —   Especificidades da avaliação que convém conhecer

Uma reflexão inicial remete para o entendimento da conjunção dos três gran-
des constituintes da ação pedagógica: ensino, aprendizagem e avaliação, o que
leva a considerá-los como uma totalidade. Nessa perspectiva, o ensino é consi-
derado como a organização de situações capazes de contribuir para a produção
do conhecimento pelo aluno; a aprendizagem, como um processo de construção
pelo aluno de significados próprios, mediante sínteses sobre o que ele vivencia
e o que busca conhecer; e avaliação, como um componente de diagnóstico e de
reorientação do ensino e da aprendizagem pela compreensão da prática docente
e da trajetória acadêmica do aluno.
Aprofundando a reflexão, vêm à tona concepções, crenças e conhecimentos
que traduzem modelos teóricos de homem e de sociedade, pois a prática pedagó-
gica não ocorre num vazio a-histórico; antes, responde a uma proposta político-
pedagógica de educação. Os conteúdos constituintes de uma matriz curricular e
apresentados num programa de ensino são selecionados a partir de um projeto
de homem concreto, coerente com o seu tempo, que responda às demandas da
sociedade. Os aspectos operacionais da avaliação, em consequência, exigem dos
avaliadores crença nas concepções propostas em referencial teórico para a ocor-
rência de uma avaliação a serviço da aprendizagem.
Nesse texto, tal referencial está sintetizado nos três princípios que seguem,
destacados por Grillo (2003).

A avaliação configura todo o cenário pedagógico e explicita a prática de-


senvolvida.
A avaliação traduz um referencial teórico-metodológico, resultado de posição
epistemológica assumida criticamente pelo docente, às vezes incorporada pelo
senso comum, outras por experiências anteriores, ou mesmo herdada por imita-
ção de um professor mais experiente. Independentemente do significado atribuí-
do à avaliação pelo professor, ela condiciona os processos de ensino e de apren-
dizagem e, reciprocamente, a concepção de ensino e de aprendizagem determina
a forma de avaliar. A famosa frase de Nóvoa (1997, p.30) “Dize-me como ensinas e
eu te direi quem és, e vice-versa” poderia aqui ser substituída por “Dize-me como
avalias e eu te direi como ensinas”.
O aluno tende a se ajustar à modalidade de avaliação do professor, a qual é
representativa da ação docente desenvolvida. Ele estudará apenas para a prova se

18
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

perceber ser essa a forma preferida pelo professor, uma perspectiva de produto,
ou procurará apropriar-se do conteúdo analisado e debatido a cada aula, assumin-
do uma atitude participativa se o professor valorizar o processo de aprendizagem
e buscar outras formas de avaliação além da prova. Mostra-se, assim, a força da
avaliação no contexto educacional, em qualquer nível de ensino, capaz de gerar
um currículo oculto que leva o aluno a se preparar conforme o professor ensina
e principalmente avalia.

A avaliação está presente em toda ação pedagógica.


A avaliação faz parte de toda ação pedagógica que, por sua vez, é realizada
sobre avaliações. Ao planejar sua aula, num processo proativo, o professor estabe-
lece um julgamento sobre o conteúdo a ser estudado e a forma de fazê-lo, sobre
o aluno, sobre o tempo disponível, e sobre os melhores procedimentos a partir de
critérios de tempo, economia, adequação, entre outros. Posteriormente, no desen-
volvimento das aulas, então numa fase interativa, estará avaliando concomitante-
mente à realização do ensino. Talvez faça alguns ajustes no planejado, se perceber
necessidade. Uma avaliação ainda ocorrerá na fase pós-ativa, quando o professor,
refletindo sobre a prática realizada, toma decisões, replaneja, modifica a forma de
trabalhar e reinicia um novo ciclo de planejamento, execução e avaliação. A ava-
liação é, pois, uma constante na ação educativa, entendida como base para a ação
do professor e como fonte de informações sobre a aprendizagem do aluno. Embo-
ra se reconheça na avaliação a necessidade de informar sobre o desempenho do
aluno, ela não se reduz a isso. Em qualquer momento do processo são necessárias
informações claras sobre aspectos relevantes do objeto da avaliação, de forma que
tais aspectos sejam compreendidos em suas causas. Esse esforço terá significado
se gerar um diagnóstico que possibilite a tomada de consciência do ponto em que
se encontra a aprendizagem do aluno e do que falta para chegar ao pretendido,
encaminhando a realização de intervenções mediadoras do professor.

Ensinar, aprender e avaliar formam um contínuo em interação perma-


nente.
Ensinar, aprender e avaliar são fenômenos distintos, mas pertencentes a uma
mesma atividade pedagógica, por isso a avaliação não pode ser tratada de forma
estranha ou esporádica; pelo contrário, deve ser entendida como uma atividade
rotineira e intrínseca à ação educativa.

19
GRILLO, M. C.; LIMA, V. M. R.  —   Especificidades da avaliação que convém conhecer

O professor aprende com as aprendizagens dos alunos: a forma como eles


compreendem ou não as explicações, a lógica dos seus acertos ou erros, o que
não ficou claro e o que é preciso melhorar ou reformular; os alunos aprendem
com os resultados da avaliação: compreendendo seus erros, buscando acertos,
assumindo-se como protagonistas da sua aprendizagem.
Para que tal ocorra, é necessário um clima de confiança entre professor
e alunos, fundada num acordo de trabalho em parceria entre aqueles que se
empenham em realmente aprender. A avaliação deixa de ser um instrumento
de controle e passa a ser um instrumento a serviço do aluno para diagnosti-
car e qualificar a aprendizagem, o que exige o entendimento de que ensinar,
aprender e avaliar são momentos interligados em constante dinamismo. Como
recurso a serviço da aprendizagem, a avaliação não exige interrupção do anda-
mento normal da aula. Qualquer atividade habitual de aprendizagem pode ser
avaliada: um estudo de texto, a análise de um filme, uma visita a um museu,
uma discussão de um tema, desde que essas atividades sejam sustentadas por
objetivos e critérios claros. Por que está sendo realizada tal tarefa e como será
avaliada são indagações que devem acompanhar a atividade. A avaliação é,
pois, imprescindível à aprendizagem, porque aponta para revisão de programas,
propõe novas indagações, mostra incompletudes e indica novos caminhos. Deve
estar presente ao longo do processo, não podendo reduzir-se a um momento
final de uma prática.
Os princípios aqui apresentados deixam clara a necessidade de coerência e
de consistência entre os três elementos que se destacam, quais sejam, ensino,
aprendizagem e avaliação. Mostram, portanto, que tanto o professor quanto o
aluno têm participação no processo avaliativo e são responsáveis pelo êxito
alcançado.

Referências

GRILLO, M. Por que falar ainda em avaliação. In: ENRICONE, D.; GRILLO, M.
(Org.). 2. ed. Avaliação: uma discussão em aberto. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.
LUCKESI, Cipriano C. Avaliação da aprendizagem escolar. 3. ed. São Paulo:
Cortez, 1996.

20
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

NÓVOA, A. Diz-me como ensinas, dir-te-ei quem és e vice-versa. In: FAZENDA, I.


(Org.). A pesquisa em educação e as transformações do conhecimento. São Paulo:
Papirus, 1997.
RIOS, Teresinha Azeredo. Compreender e ensinar. Por uma docência de melhor
qualidade. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
ROMÃO, José Eustáquio. Avaliação: exclusão ou inclusão. In: MELO, Marcos
Muniz (Org.). Avaliação na educação. Pinhais: Melo, 2007.

21
2. qUESTÕES SOBRE
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM:
a voz dos professores1
Valderez Marina do Rosário Lima
Marlene Correro Grillo

Apesar de muitos e rigorosos estudos sobre avaliação, persistem inquietações


sobre a prática avaliativa. Talvez seja oportuno questionar se tais inquietações se de-
vem menos aos estudos teóricos sobre o tema do que à sua prática, pois a avaliação
continua sendo ponto vulnerável, exigindo, consequentemente, maiores reflexões.
Abordar a questão da avaliação implica envolver-se com temas educativos con-
dicionados a aspectos institucionais, sociais, culturais, entre outros. Além disso,
incide sobre diferentes instâncias envolvidas no processo educativo, variáveis e
dinâmicas.
Trata-se, portanto, de um tema que propõe novos e constantes desafios, o
que faz concordar com Cardinet (1998, p.5), quando afirma: “(...) quanto mais se
penetra no domínio da avaliação, mais se põem em questão nossas certezas, ou
seja, cada interrogação colocada leva a outra. Cada árvore se enlaça em outra e a
floresta aparece como imensa”.
Sem pretender esgotar o assunto, o conjunto de questionamentos que segue,
recolhidos no constante diálogo com professores, busca minimizar as inquieta-

1
  Versão revisada e ampliada de GRILLO, M. C.; LIMA, V. M. do R. Dimensões conceituais e
operacionais da avaliação. In: LIMA, V. M. do R. (Org.). A gestão da aula universitária na PUCRS.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.
LIMA, V. M. R.; GRILLO, M. C.  —   Questões sobre avaliação da aprendizagem: a voz dos professores

ções e contribuir para a reflexão que se faz necessária quando o tema abordado
é avaliação da aprendizagem.

O que traduz melhor o resultado da avaliação da aprendizagem: notas ou


conceitos?
Notas e conceitos são formas de expressão de resultados da aprendizagem. No
entanto, uma letra ou um numeral, isoladamente, é apenas um símbolo conven-
cional que reduz a comunicação e não expressa claramente resultados complexos.
Mais importante do que a forma pela qual o resultado é expresso, conceito
ou nota, é o conteúdo que essa comunicação necessita veicular e o alcance dos
objetivos pretendidos, informando sobre a aprendizagem do aluno. É, pois, indi-
ferente a utilização de nota ou conceito, desde que comuniquem o seu significa-
do. Uma nota 6 ou um conceito C é apenas uma constatação e a avaliação não
se reduz a isso. Isoladamente, não explica ao aluno o que faltou nesses quatro
pontos relativamente ao 10 ou o que estaria incluído nas letras A e B, uma vez
que ele recebeu um C; nesses casos, ao ser omitida tal explicação, torna-se difícil
a reorientação pelo aluno, o qual, por não compreender a origem da nota que lhe
foi atribuída, exime-se de sua responsabilidade e passa a afirmar que o professor
lhe deu tal nota.
Há professores que até mesmo somam conceitos e chegam a uma média ar-
bitrária de letras, o que não é entendido pelo estudante. Não é diferente no caso
da soma de numerais. Qualquer expressão de resultado necessita ter um sentido
diagnóstico, indicar o que o aluno sabe e o que ele não sabe e assim possibilitar-
lhe a reorientação da aprendizagem. O significado do diagnóstico da avaliação
é semelhante ao diagnóstico realizado pelo médico, pelo engenheiro, pelo agrô-
nomo ou por outro profissional para informar resultados aos interessados e reco-
mendar procedimentos pertinentes à situação avaliada.
Pouco ou nada adiantaria dar continuidade ao ensino se nenhuma decisão
fosse tomada pelo professor, pelo aluno, ou por ambos, a partir da análise dos
resultados e preferentemente discutidos pelos dois. É um esforço no sentido de
tornar a avaliação uma atividade que necessita ser compreendida também pelo
aluno.
Há quem defenda a utilização de notas por entender que a autoestima do alu-
no fica mais comprometida se ele receber um conceito B do que uma nota 7,5 ou

24
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

8, pois o conceito parece marcar mais o aluno do que a nota e, quando esta é uti-
lizada, o aluno suporta melhor até mesmo as mais baixas. No entanto, em ambos
os casos, a descrição qualitativa do desempenho e a explicitação da relação com
critérios esperados podem ajudar na compreensão dos resultados.
Contudo, o mais importante, quando se trata desta questão, é evitarem-se
qualificações como aluno conceito A, aluno conceito C, ou ainda aluno nota
10, para que não constituam marcas definitivas na história da vida escolar dos
alunos como bons ou maus estudantes, acompanhadas de sentimentos de êxi-
to ou de fracasso; antes faça-se referência a tais situações, afirmando-se que o
aluno ainda não alcançou ou está em processo de, pois os resultados decor-
rentes das avaliações têm muito reconhecimento na academia, no ambiente
escolar, na sociedade e mesmo entre os alunos, influindo na autoestima e na
autoimagem.

Como conciliar a avaliação como processo com a avaliação como produto?


No momento de avaliação-produto, o professor não assume novos critérios
de avaliação?
A avaliação de processo e a avaliação de produto são instâncias distintas de
um mesmo processo e, portanto, devem coexistir. Ambas são coerentes entre si
em termos de objetivo geral – fornecer informações sobre a aprendizagem do
aluno e auxiliar na reorientação do processo –, mas diferenciam-se pelas funções
que desempenham na prática.
A função da avaliação de processo é fornecer ao aluno e, ao mesmo tempo ao
professor, evidências de como está sendo realizada a aprendizagem, o que precisa
ser feito para melhorá-la, onde se constatam lacunas, qual a lógica do aluno ao
emitir uma resposta. Objetiva, também, diagnosticar e orientar a tomada de deci-
sões durante a realização do ensino e da aprendizagem.
Essas evidências têm repercussões ainda sobre as condições de ensino: que
procedimentos estão sendo desenvolvidos pelo professor? São adaptados aos ob-
jetivos, aos conteúdos ou aos alunos? A avaliação de processo busca também
evidências que auxiliam na identificação de fragilidades em aprendizagens neces-
sárias à realização de novas aprendizagens, orienta na reorganização do ensino e
da aprendizagem, possibilita a reflexão sobre possíveis causas, sugerindo ainda
novas fontes de obtenção de dados para a avaliação.

25
LIMA, V. M. R.; GRILLO, M. C.  —   Questões sobre avaliação da aprendizagem: a voz dos professores

No entanto, dependendo da modalidade de organização curricular, num deter-


minado momento, exigências administrativas ou pedagógicas específicas do curso
ou da disciplina e a própria lógica do processo exigem que se identifique de forma
mais ampla o estágio em que se encontra a aprendizagem do aluno, e que se to-
mem decisões sobre a sua promoção a níveis mais avançados ou se informe sobre a
insuficiência de sua aprendizagem em relação aos objetivos propostos. Trata-se da
avaliação de produto, que tem uma função classificatória, objetiva o julgamento do
rendimento do aluno ao final de uma determinada etapa – unidade, semestre, ano
ou curso –, segundo o aproveitamento expresso em graus, notas ou conceitos. Iden-
tifica, numa avaliação geral, o grau em que os resultados foram ou não alcançados.
É aí que reside a diferença entre as duas modalidades da avaliação.
É um momento em que se reflete sobre o processo para um melhor conhe-
cimento de um resultado final, mas que nem por isso deixa de ter continuidade.
Há uma avaliação do produto sem que se invalide a função diagnóstica da ava-
liação. Também na avaliação de produto ocorre a identificação de sucessos e de
fragilidades na aprendizagem do aluno. De acordo com um sistema de promoção
preestabelecido, o professor se vê na contingência de emitir um conceito ou uma
nota final, mantendo coerência com os critérios que orientaram o ensino e a
aprendizagem ao longo do processo.
O que confunde o entendimento das duas modalidades de avaliação é que há
casos em que professores, mesmo dizendo-se favoráveis à avaliação de processo,
omitem a comunicação dos resultados ao aluno em tempo hábil, impedindo que
ele participe da reorientação de sua aprendizagem, restringindo-se ao conheci-
mento de um resultado final obtido pela média de várias provas. Outros limitam-
se à avaliação de produto e realizam uma única prova final, o que impede que o
aluno conheça sua situação ao longo do processo.
Há que se ter cuidado, ainda, para não se penalizar um aluno que, numa
primeira avaliação, apresentou deficiências, mas, posteriormente, mostrou ter-se
recuperado. Nesse sentido é que a avaliação é compreensiva. Se a aprendizagem
é cumulativa, igualmente deverá ser a avaliação. Cabe ao professor criar meca-
nismos em que o aluno possa revelar essa recuperação: atividades de avaliação
mais abrangentes, verificações cumulativas de conteúdos, atividades específicas
de recuperação são algumas recomendações sugeridas para ampliar o leque de
possibilidades de conhecimento do progresso do aluno.

26
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Entretanto, como a última decisão sobre as várias atividades que constituem as


notas ou conceitos é sempre do professor, é necessário que ele se empenhe na
expressão da aprendizagem do aluno de forma justa e responsável.

Qual ou quais são os mais recomendados tipos de instrumentos para ava-


liação da aprendizagem? Até que ponto é necessário diversificá-los? O que
é mais recomendado: trabalhos ou provas?
O reconhecimento da avaliação como processo contínuo e cumulativo e a con-
sequente recomendação de se utilizarem instrumentos variados para se ampliarem
as possibilidades de o aluno expressar sua aprendizagem não eliminam o questio-
namento frequente dos professores sobre o melhor tipo de prova para a avaliação.
No entanto, a prova é somente um entre os vários instrumentos disponíveis aos
docentes, os quais, ao conjugarem atividades diversificadas, têm condições de
realizar uma avaliação mais ampla e mais abrangente.
Entre os procedimentos recomendados destacam-se: apresentação oral ou
escrita de conclusões de seminários, relatórios de trabalhos de campo, relatos
de experiências, resenhas, fichamento de leituras, resumos, diários de aula e
muitas outras atividades que podem ser criadas pelo professor com tal obje-
tivo.
Em relação a provas, sejam objetivas ou dissertativas, de resposta breve ou
longa, elas apresentam características que as tornam mais recomendadas para uma
situação do que para outras. Embora não haja um tipo mais recomendado do que
outro, existem situações diferentes de aprendizagem que demandam, por sua vez,
diferentes instrumentos para avaliá-las. A quantidade e o tipo de questões que
constituem uma prova dependem dos objetivos e dos conteúdos; no entanto, é re-
comendável variar, pois cada uma exige uma modalidade diferente de raciocínio.
Uma prova pode constituir-se integralmente por um mesmo tipo de questões, ou
por mais de um tipo. O que define essa possibilidade é a natureza do objeto da
avaliação. Recomenda-se, neste particular, que se evite incluir questões de vários
tipos num mesmo conjunto de questões, pois cada vez que se inserem questões
de diferentes modalidades, é indispensável que elas sejam precedidas por uma
explicação da lógica que as orienta. O importante é que não se reduza o processo
avaliativo unicamente a provas, mas se oportunizem outras modalidades de ex-
pressão da aprendizagem dos alunos.

27
LIMA, V. M. R.; GRILLO, M. C.  —   Questões sobre avaliação da aprendizagem: a voz dos professores

No que se refere à preferência dos alunos por determinados instrumentos, pa-


rece não haver consenso. Alguns se manifestam favoráveis a trabalhos de caráter
monográfico em substituição à prova; outros dividem-se entre provas tradicionais
e provas que permitem consulta, as chamadas provas de livro aberto.
A despeito dessas considerações, o fundamental é que tanto a prova como
as outras modalidades de avaliação referidas anteriormente sejam consideradas
como uma decorrência natural do processo de aprendizagem.

Como considerar o domínio afetivo na avaliação do rendimento? Deve-se


atribuir nota a dimensões da área afetiva?
A atribuição de nota ou conceito a resultados de aprendizagem na área afetiva
é uma questão bastante controvertida e exige ser tratada com cautela. Sabe-se que
todas as aprendizagens, sejam de natureza cognitiva, afetiva ou social, necessitam
ser avaliadas pelo professor, e seus resultados comunicados aos alunos através de
expressões adequadas. Entretanto nem todas essas aprendizagens são passíveis de
tradução em nota ou conceito.
Há determinadas aprendizagens mais visíveis e concretas que permitem a iden-
tificação de aspectos considerados relevantes e a explicitação de critérios de de-
sempenho esperado do aluno, como, por exemplo, propriedade de linguagem,
explicação de um conceito, resolução de um problema matemático, realização
de uma experiência em laboratório. A dificuldade surge quando se trata da área
afetiva ou social.
Entretanto, há uma forte inclinação entre os professores para atribuírem nota
a comprometimento, interesse ou participação em aula. Argumentam que a con-
sideração desses aspectos é um fator motivacional que não pode ser desprezado.
Porém, isso pode caracterizar uma avaliação determinada pela impressão que o
aluno causa ao professor, mascarando os verdadeiros resultados. O aluno tem sua
nota aumentada por ser assíduo, pontual ou interessado.
No que diz respeito à assiduidade, por exemplo, o aluno tem amparo legal que
lhe dá direito a um percentual de faltas. Se a ausência do aluno acarretar prejuízo
à sua aprendizagem, ele compreenderá a importância de sua presença na aula.
No caso da participação, é mais prudente que ela seja considerada como condi-
ção favorável à aprendizagem ou como um indicador de empenho e de interesse,
porque os alunos nem sempre participam da mesma maneira. Há aqueles que

28
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

falam muito, embora nem sempre tragam contribuições relevantes; outros, mais
tímidos, contribuem menos e talvez estejam bastante presentes sem, no entanto,
evidenciarem-no abertamente.
Um objetivo de aprendizagem pode, ainda, estar classificado ao mesmo tempo
nas áreas afetiva e cognitiva, por conta da especificidade do curso ou da disci-
plina formadora de profissionais que exigem competências específicas, como En-
fermagem, Psicologia, Medicina, Serviço Social, bem como estágios e disciplinas
teórico-práticas. Apresentam-se como exemplos situações em que o aluno precisa
desempenhar-se adequadamente num trabalho comunitário, numa relação espe-
cífica com os alunos, no atendimento a pacientes, numa atividade de estágio,
entre outras. Nesse raciocínio, a atribuição de notas à participação, ao respeito ao
outro, à solidariedade, ao saber escutar terá sentido, já que essas dimensões, nes-
sas situações, são objeto da aprendizagem. Os alunos, nesses casos, deverão ser
informados que tais aprendizagens atitudinais fazem parte do conteúdo específico
e, como tal, são passíveis de avaliação. Na ausência de um sistema de avaliação
que considere separadamente as duas dimensões, cabe ao professor, em enten-
dimento com os alunos, estabelecer critérios que permitam avaliar as dimensões
cognitiva e afetiva, constituindo uma nota única.
Tal procedimento, no entanto, não exclui a utilização de aconselhamentos
orais ou escritos, recomendações que, numa linguagem coloquial, podem auxiliar
o aluno a melhor entender o significado da nota a que fez jus.

Como envolver todos os alunos quando apenas um grupo é responsável pela


apresentação de um trabalho? O que avaliar nessas ocasiões?
A participação de todos os alunos, numa determinada data, quando apenas um
grupo é responsável pela apresentação de um trabalho, exige definição clara pelo
professor sobre o objetivo da atividade. O foco da avaliação deve estar voltado tanto
para a aprendizagem do grande grupo quanto para a dos alunos apresentadores, cha-
mados geralmente de professores do dia. O tipo de tarefa proposta para o pequeno
grupo será também estendida em oportunidades subsequentes aos outros grupos da
aula. É uma experiência que todos, sucessivamente, realizarão. Por conseguinte, é
indispensável que todos sejam orientados a ouvir os colegas apresentadores e a res-
peitá-los, que participem, se comprometam com a aula e, o que é o mais importante,
atribuam significado ao trabalho apresentado. Essa é uma importante aprendizagem
que se realiza concomitantemente à aprendizagem do conteúdo específico.

29
LIMA, V. M. R.; GRILLO, M. C.  —   Questões sobre avaliação da aprendizagem: a voz dos professores

Não é raro que, nessas oportunidades, após a apresentação do trabalho, o gru-


po responsável se considere descomprometido, se aliene das demais atividades,
considerando ter realizado “sua parte”, o que prejudica aprendizagens posteriores.
Uma experiência que se tem mostrado efetiva nessas situações é a proposição
pelo professor de uma tarefa sucinta a partir de cada apresentação dos professores
do dia, sobre o conteúdo desenvolvido, a qual deve ser entregue por escrito ao
professor sempre na aula subsequente. Por que se recomenda que a tarefa seja
sucinta? É pensando no professor que toda semana terá a leitura da produção dos
alunos, por isso não deve ser uma atividade exaustiva. Sugere-se uma atividade
que, para ser realizada, exija a presença e a participação dos alunos. O grupo
apresentador poderá ficar dispensado desse trabalho apenas no dia de sua apre-
sentação.
Como sugestão de tarefa, podem ser solicitados ao grande grupo:
• a descrição resumida do conteúdo desenvolvido;
• o relacionamento desse conteúdo com algum aspecto já estudado ou com
algum aspecto prático, ou outro qualquer, de acordo com a especificidade
da disciplina;
• a apreciação sobre os trabalhos do grupo em termos de aproveitamento
do tempo disponível, segurança no conteúdo ou na utilização de recursos
tecnológicos.

O processo se torna mais completo se a resposta dos alunos for entregue em


duas vias, uma para o professor e outra para os apresentadores, professores do
dia, na aula subsequente à apresentação. Essa é uma atividade que possibilita
o desenvolvimento do espírito crítico, da autoria, da responsabilidade, da co-
laboração, avalia a aprendizagem dos colegas e envolve a aula num processo
de avaliação contínua e formativa, preparando a apresentação dos próximos
professores do dia.

É bastante frequente a realização de seminários e outros tipos de trabalho


em grupo, que são usados pelos professores como instrumentos de avalia-
ção. Como devem ser feitas a avaliação e a atribuição de graus?
Os seminários são procedimentos didáticos de grande utilidade pela ampla
gama de aprendizagens cognitivas, afetivas, sociais que podem proporcionar. Ne-

30
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

cessitam ser bem planejados pelo professor para evitar que se tornem aula exposi-
tiva ministrada pelos alunos, quando um grupo responsável pelo seminário expõe
aos demais colegas o conteúdo de um texto ou de um capítulo de livro didático.
É muito difícil que tal atividade não leve à apatia e ao desinteresse dos demais
colegas, que reservam então esse tempo para atualizar cadernos ou outras tarefas
atrasadas, isso se permanecerem em aula. Embora seja comum atribuir-se a um
grupo de alunos a responsabilidade da organização de um seminário, o professor
pode, ele mesmo, organizar toda a dinâmica, propondo questões, orientando
estudos e pesquisas que possam levar além do que está sendo estudado no am-
biente da aula.
Entretanto, há sempre um conteúdo cognitivo a ser estudado num seminário,
constituindo o pano de fundo da atividade, a partir da qual se desenvolvem outras
dimensões de aprendizagens, como a afetiva e a social. E isso ocorre num espaço
de trabalho cooperativo que exige cumprimento de tarefas com responsabilidade
e participação de cada um e de todos. É neste momento que aflora a dificuldade
do professor: o que avaliar, como avaliar, a que atribuir nota ou conceito?
Alguns docentes ensaiam a atribuição da mesma nota a todos os participantes
de um mesmo grupo, já que trabalharam juntos. Mas diante do questionamento
se todos trabalharam igualmente, a possibilidade de nota única não se sustenta e
não responde ao docente de forma satisfatória. Outros professores preferem não
atribuir nota, mas entendem que, se o trabalho “não valer nota”, os alunos não se
comprometem, havendo desinteresse e mesmo evasão da sala de aula.
A solução mais recomendada nesses casos é que, após a conclusão do semi-
nário, seja proposta alguma atividade como uma produção textual, a resposta a
uma questão integradora, a elaboração de afirmações sobre o conteúdo estudado,
a formulação de novas questões que o estudo sugira, entre várias outras ativida-
des que efetivamente necessitem da presença qualitativa do aluno para serem
realizadas. Se os alunos forem previamente comunicados, certamente não haverá
desinteresse nem ausências.
O professor poderá complementar a solicitação, estimulando a responsabilida-
de ao propor a cada aluno ou grupo uma ficha de autoavaliação para ser realizada
junto aos colegas de trabalho sobre:
• participação nas atividades preparatórias e nas discussões;
• contribuição com textos complementares;

31
LIMA, V. M. R.; GRILLO, M. C.  —   Questões sobre avaliação da aprendizagem: a voz dos professores

• atendimento a aspectos estabelecidos pelo e no grupo como preparação


de leituras, realização de tarefas, apresentação de questionamentos, de
análise e de síntese, ou outras atividades adequadas aos objetivos e às
características do trabalho.

Outra sugestão ainda é o professor propor aos alunos o estabelecimento de


relação de causa e efeito entre o resultado obtido no seminário, que já teria sido
avaliado, e a efetiva participação do aluno. A esta atividade não se atribuiria nota;
seria uma oportunidade de o aluno aprender a refletir sobre sua própria prática,
através de um exercício de metacognição.

Como promover, na prática, a recuperação do aluno?


A recuperação do aluno consiste num conjunto de ações didáticas propostas
pelo professor com o intuito de reorientar a trajetória de aprendizagem do aluno,
suprir lacunas em conhecimentos, referenciando-se nos objetivos e nas especifici-
dades de determinada disciplina ou curso. Segundo Firme (1996), é um compro-
misso bastante sério cujo objetivo maior é alcançar com sucesso a aprendizagem.
Professor e aluno estão mutuamente implicados na tarefa de recuperação: o
professor revendo continuamente o que e como ensinar, e o aluno, dando mos-
tras do que e como aprendeu. Este aprende de forma ativa e demonstra sua
aprendizagem auxiliado pela ação mediadora do professor que propõe situações
desafiadoras: preleções, demonstrações, questionamentos, exercícios teórico-prá-
ticos, orientações de estudo individuais ou em grupo, provas e muitas outras
modalidades.
Cabe perguntar para que são propostas tais atividades aos alunos durante o se-
mestre. A resposta é imediata: para que se obtenham informações precisas sobre
a aprendizagem e, a partir daí, sejam tomadas decisões e realizadas ações media-
doras – atividades de recuperação – ainda durante o processo de aprendizagem.
Vale lembrar que toda aprendizagem é processual e a recuperação não tem um
tempo fixo; varia na medida em que o aluno revela ausência de determinados co-
nhecimentos. Por isso, quanto mais cedo iniciarem-se atividades de recuperação,
maiores serão as possibilidades de sucesso do aluno e do professor. É preciso ser
proativo neste particular, evitando-se que o aluno continue o percurso de apren-
dizagem necessitando de conhecimento ou competências. Que não se espere o
final do período letivo para se tomarem providências quando, então, há escassas

32
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

possibilidades de se realizarem ações que auxiliam na reorientação da trajetória


e na construção do conhecimento do aluno e, também, da prática docente. A re-
cuperação precisa ser concomitante à aprendizagem. Se o professor esperar pelo
resultado da prova tradicional para obter o diagnóstico, estará permitindo que
aumente a defasagem entre o que o aluno sabe e o que precisa saber.
Poderão alguns professores objetar que a extensão do conteúdo a ser ensinado
e a premência de tempo não permitem a inserção de atividades de recuperação.
Convém, no entanto, analisar se as provas realizadas em períodos esporádicos, de
acordo com um cronograma, dão inteira conta da função diagnóstica da avaliação.
Pouco adianta o professor cumprir um programa, “vencer os conteúdos”, como é
frequente se ouvir, se há um grande número de reprovações.
Além das provas, o professor pode se utilizar de outros mecanismos para obter
um diagnóstico, sem onerar de forma demasiada o seu tempo livre. É um inves-
timento que vale a pena, pois reduz futuros problemas. Pequenas e frequentes
tarefas bem elaboradas, claras, de rápida correção, ao final de umas poucas aulas,
realizadas individualmente ou em grupos, corrigidas pelo professor ou pelos pró-
prios alunos, podem servir para que o docente identifique o progresso na apren-
dizagem. O aluno tem possibilidade de recuperar o conteúdo em que apresentava
deficiências e, por consequência, a nota, o que é positivo, pois tem implicações
diretas no seu interesse em novos estudos, bem como na promoção e até mesmo
em sua permanência no curso.

Considerações finais

As respostas às questões dos professores não dirimem todas as suas dúvidas


e as preocupações que surgem nas situações práticas. Esta afirmação, entretanto,
antes de ser uma constatação desanimadora, reitera a aceitação da insuficiência
do conhecimento exclusivamente teórico para orientar a ação docente, pois a
instabilidade e o singular estão presentes nos acontecimentos que se sucedem no
cotidiano da aula.
Tais questões podem ser paulatinamente respondidas pela ampliação do co-
nhecimento originado na reflexão do professor sobre a prática apoiada na teoria
que a sustenta, o que nos leva a valorizar a teoria nascida da prática real e iden-

33
LIMA, V. M. R.; GRILLO, M. C.  —   Questões sobre avaliação da aprendizagem: a voz dos professores

tificada na experiência concreta. Trata-se de um conhecimento prático que não


ocorre de imediato; demanda tempo para a realização de experiências docentes
em diálogo com a reflexão e com estudos continuados.

Referências

CARDINET, J. Evaluation scolaire et pratique. Bruxelas: De Boeck, 1986.


FIRME, T. P.Mitos na avaliação: Diz-se que... BOLETIM AEC-RS, Porto Alegre, v.
XVI, n. 59, p.5-36, maio, 1996.

34
3. cRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO A
SERVIÇO DA APRENDIZAGEM
Rosana Maria Gessinger
Marlene Correro Grillo
Ana Lúcia Souza de Freitas

Ação reguladora da avaliação

Um processo avaliativo que considere a necessária relação entre ensino, apren-


dizagem e avaliação apresenta-se, de imediato, como instrumento de orientação
ou de reorientação dos processos de ensinar e de aprender. A exigência primeira
para a ocorrência de uma avaliação dessa natureza é a clareza dos objetivos pe-
dagógicos, das atividades propostas pelo professor e das aprendizagens que se
pretende realizar. Igualmente os critérios precisam estar explícitos de maneira
compreensível e suficiente para que se torne visível a coerência entre as situações
de ensino, de aprendizagem e de avaliação.
Dessa forma, o processo avaliativo se torna transparente e entendido por todos
os que dele participam, firmando-se a serviço do ensino e da aprendizagem como
instrumento de regulação de ambos, a eles integrado, recolhendo informações e
visando à orientação, ao mesmo tempo, da prática docente e da aprendizagem do
aluno. A avaliação, nessa perspectiva, assume a dimensão formativa, assistindo a
aprendizagem que se realiza (HADJI, 1992).
O dicionário Novo Aurélio Século XXI (FERREIRA, 1999, p.582) define
critério como “aquilo que serve de base para comparação, julgamento ou
apreciação”, ou, ainda, “modos de apreciar coisas ou pessoas”. Os critérios
GESSINGER, R. M. et al.  —   Critérios de avaliação a serviço da aprendizagem

avaliativos, coerentes com essa definição, representam o que é julgado essen-


cial numa determinada área de conhecimento e tornam claras as referências
utilizadas para a avaliação. Traduzem um julgamento relativo a uma forma de
entender determinado aspecto da realidade e podem variar de acordo com a
natureza das áreas de conhecimento, com os objetivos, com os conteúdos e a
lógica interna de cada disciplina, com a modalidade de avaliação e, mesmo,
com a concepção de avaliação de cada professor. Servem de base para a ava-
liação de trabalhos, provas, testes, relatórios, constituindo fontes mais seguras
de informações sobre o ponto em que está a aprendizagem avaliada e o que
falta para chegar ao desejado.
Da mesma forma que as situações de ensino, de aprendizagem e os procedi-
mentos de avaliação, os critérios são dinâmicos. Há sempre a possibilidade de va-
riações em razão dos alunos, dos professores e de vivências do cotidiano trazidas
para a aula, as quais tornam o ensino e a aprendizagem mais significativos para
o aluno. Os critérios são também circunstanciais, pois dependem do momento,
dos objetivos, das características da disciplina e da turma, entre outros. Para cada
situação avaliada exige-se coerência de critérios.
Entretanto, vários fatores restritivos relacionados a critérios podem comprome-
ter a ação reguladora da avaliação: um deles é o desconhecimento pelo aluno dos
critérios a partir dos quais são avaliadas as aprendizagens; ou os alunos ignoram
tais critérios, ou a informação fornecida pelo professor sobre eles é insuficiente,
ou mesmo, a apropriação da informação não ocorre da mesma forma entre os
alunos em razão de diferenças socioculturais, de concepções prévias e de suas
representações sobre os conhecimentos; há situações mais extremas ainda em
que tanto o professor como os alunos não têm claros tais critérios. Neste sentido,
questionamentos como: que aspectos devem ser considerados na proposta de tra-
balho? o que é imprescindível que esteja presente? que elementos concretos são
esperados na resposta do aluno? servem de balizadores na formulação de critérios
(BARBOSA; ALAIZ, 2010).
A simples verbalização de critérios pelo professor ou mesmo pelo aluno não
significa que eles sejam compreendidos. É necessário que tais critérios estejam
explícitos para alunos e professor, podendo até ser solicitado aos alunos que os
aperfeiçoem, incluindo aspectos não considerados inicialmente. O aluno, assim, é
instigado a assumir a corresponsabilidade no processo avaliativo ao contribuir no

36
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

estabelecimento de novos critérios. O professor pode ainda apresentar aos alunos


trabalhos de semestres anteriores para exemplificar o atendimento ou não dos cri-
térios estabelecidos. A atividade torna-se mais compreensível quando o professor,
ao acompanhar a sua realização, mostra ao aluno aspectos que já foram atendidos
e os que precisam, ainda, ser buscados.
Outro fator restritivo refere-se à ocorrência de contradições entre as propos-
tas de aprendizagem e os critérios, com repercussões diretas na avaliação: os
alunos são informados sobre os critérios, mas as tarefas solicitadas não corres-
pondem aos objetivos ou às aprendizagens esperadas. Pode servir como exem-
plo a proposição de uma atividade que solicita reprodução de conteúdos de
aprendizagem já estudados, e o professor pretende avaliar desempenhos mais
complexos, como análises e sínteses que não foram indicadas na proposta. Nes-
sas condições, os docentes utilizam outros critérios que não coincidem com os
explicitados, anulando-se a possibilidade de o aluno compreender a avaliação
realizada, comprometendo-se o valor diagnóstico e a possibilidade de autor-
regulação da aprendizagem. É insuficiente o professor apresentar aos alunos
os objetivos e os critérios, se não houver coerência entre os demais elementos
definidores da sua prática pedagógica, ou seja, os conteúdos e as atividades, e
isso de forma clara, para si e para os alunos.
Embora possa haver diferenças entre os critérios estabelecidos pelos profes-
sores, respeitadas tais diferenças, é fundamental que, na sua essência, eles sejam
reconhecidos da forma mais consensual possível entre os docentes de uma mes-
ma disciplina, curso ou área, e que os alunos tenham pleno conhecimento dos
mesmos, para que a avaliação se apresente sem reservas nem arbitrariedades, seja
transparente e justa e, assim, cumpra suas finalidades.
A título de ilustração, a seguir é apresentada uma questão de resposta livre
trazida por uma colega em um curso de capacitação docente para promover a
discussão. A ausência de uma proposta clara encaminhando a questão gerou difi-
culdade à professora na avaliação, uma vez que, do modo como estava formulada
a questão, a professora precisaria aceitar qualquer reflexão realizada pelo aluno,
comprometendo a função diagnóstica da avaliação.

37
GESSINGER, R. M. et al.  —   Critérios de avaliação a serviço da aprendizagem

A partir dos textos trabalhados em aula sobre avaliação e do texto abai-


xo, faça uma reflexão sobre a função da avaliação.
“Para que serve a nota na escola? Óbvio – responderão muitos – a nota
serve para indicar o quanto o aluno aprendeu! Desta forma, promoverá
aqueles que estiverem preparados para exercer sua profissão e reterá os que
não estiverem aptos. (...) esta obviedade, porém, é contestada diariamente
pela prática escolar em que os alunos aprovados demonstram, a seguir, que
não aprenderam o que sua nota faz pressupor” (Vasconcellos, 2000).

Uma análise da questão permitiu constatar que a dificuldade estava no enun-


ciado, que não permitia o estabelecimento de critérios para a correção, exigindo
a reformulação da proposta, conforme segue.

Realize uma análise crítica do conteúdo do texto abaixo, assumindo


uma posição favorável ou contrária às ideias apresentadas. Fundamente
sua resposta em conceitos estudados sobre a prática avaliativa. Organize
sua resposta sob a forma de argumentação. A natureza da posição assu-
mida não compromete a avaliação, desde que haja correção conceitual e
coerência na argumentação.
“Para que serve a nota na escola? Óbvio – responderão muitos – a nota
serve para indicar o quanto o aluno aprendeu! Desta forma, promoverá
aqueles que estiverem preparados para exercer sua profissão e reterá os que
não estiverem aptos. (...) esta obviedade, porém, é contestada diariamente
pela prática escolar em que os alunos aprovados demonstram, a seguir, que
não aprenderam o que sua nota faz pressupor” (Vasconcellos, 2000).
Sua resposta será avaliada tomando como referência os seguintes cri-
térios:
• posicionamento crítico;
• fundamentação em conteúdos estudados;
• correção conceitual;
• coerência na argumentação.

38
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Critérios de realização e de resultados

Embora nem sempre exista concordância plena a respeito da nomenclatura uti-


lizada para definir critérios, às vezes nominados como dimensões, outras como in-
dicadores, é apresentada, neste texto, a tipologia de Nunziati (1990), que classifica
os critérios em dois grupos: critérios de realização e critérios de resultado, o que
pode tornar mais clara a sua utilização. Esta categorização é apresentada apenas
para fins didáticos, uma vez que há situações de aprendizagens que demandam,
pelas suas especificidades, a utilização simultânea de ambas as classificações.
a) Os critérios de realização apresentam uma relação direta com o processo
de aprendizagem e tornam explícitas as condições de aceitabilidade dessa apren-
dizagem. Indicam as ações concretas que se espera dos alunos para alcançarem
objetivos relacionados a atividades como trabalhos realizados em aula, estudos de
texto, produções textuais, estudos de casos, soluções de problema, entre outros.
Os critérios incluídos nessa categoria são específicos, detalhados e estabelecidos
pelo professor para avaliar atividades de uma ou de algumas aulas, sendo, por
isso, de alcance mais próximo e imediato. É frequente o professor inserir um novo
material relacionado à área, como um filme, uma pesquisa ou um assunto mo-
mentâneo que mobiliza a comunidade e é do interesse dos alunos, para explorá-
lo didaticamente, numa exemplificação da relação teoria e prática. Os alunos,
conhecendo os critérios, podem tomá-los como referência para realizar o trabalho
proposto e melhor entender a avaliação.
Como exemplo, são apresentados alguns critérios de realização:
Clareza – expressão de fatos ou de ideias de forma simples e inteligível;
Concisão – apresentação do essencial, sem omissões nem redundâncias;
Organização – atendimento a um plano definido, com ordenação de informa-
ções, fatos, datas, etc.
Para ilustrar, é apresentado a seguir um exemplo de questão.

A partir da leitura de um texto, é proposta a seguinte tarefa:


Selecione uma ou mais ideias apresentadas no texto e desenvolva-a(as)
numa produção baseada em sua própria experiência e nas ideias do autor.

39
GESSINGER, R. M. et al.  —   Critérios de avaliação a serviço da aprendizagem

Sua resposta pode ser organizada numa perspectiva de aceitação ou de


refutação das ideias do autor e deve evidenciar o relacionamento dessas
mesmas ideias com sua experiência pessoal, utilizando, para isso, argu-
mentos consistentes e claros.
Critérios de avaliação:
• atendimento à proposição;
• conhecimento do conteúdo;
• consistência na argumentação;
• clareza e organização das ideias.

O estabelecimento de critérios contribui para a atribuição de grau, conceito ou


mesmo de um parecer descritivo, reduzindo a subjetividade e facilitando a com-
preensão da avaliação por parte do aluno.
b) Os critérios de resultado, diferentemente dos critérios de realização, rela-
cionam-se a produtos alcançados e indicam as condições de aceitabilidade de
desempenhos esperados do aluno em tarefas mais abrangentes, conclusivas e a
mais longo prazo. Por esta razão, costumam ser apresentados em planos de cursos
e de unidades. Nessas oportunidades, interessam mais os produtos obtidos do que
os processos. Esses critérios são os grandes balizadores de situações de ensino, de
aprendizagem e de avaliação mais complexas, e são constituídos por sequências
de critérios de realização. Por isso, cabe destacar que ambos os tipos de critérios
precisam manter coerência entre si.
Exemplos de critérios de resultado são citados a seguir:
Autonomia – expressão clara na defesa de ideias, opiniões ou posicionamen-
tos;
Autoria – busca de caminhos orientadores de suas próprias experiências, dan-
do-lhes significados à luz de estudos e reflexões;
Criticidade – exame minucioso de situações, com apresentação de questiona-
mentos, de análises e de sínteses;
Pensamento divergente – apresentação de mais de uma hipótese ou de vá-
rias soluções para uma mesma situação;
Completude – presença dos elementos essenciais esperados.

40
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Há aprendizagens ainda que, pelas suas especificidades, são avaliadas utilizan-


do-se critérios de realização e de resultado simultaneamente, como é o caso de
avaliação de monografias, de trabalhos de conclusão de curso ou de relatórios,
bem como outras previstas pelo professor, conforme apresentam-se alguns exem-
plos:
• relevância do tema ou do trabalho para a área específica;
• clareza e correção de linguagem;
• precisão na apresentação e na fundamentação de informações, fatos, con-
ceitos, causas, etc;
• organização do trabalho atendendo a uma proposta definida;
• expressão clara de ideias, sem omissão do que deve ser referido, nem
redundâncias;
• emprego adequado de terminologia específica em estreita relação com o
tema;
• expressão clara de pontos de vista, contrapondo-os a ideias divergentes;
• exame minucioso de situações, apresentação de questionamentos, de aná-
lises e de sínteses;
• pertinência e uso adequado de bibliografia;
• explicação da metodologia e propriedade de análise;
• atendimento a normas técnicas.

A explicitação de tais critérios é tanto mais útil quanto melhor indicar o que
deve ser executado pelos alunos enquanto o trabalho está sendo realizado (di-
mensão formativa) e as características que tal trabalho deve apresentar como
resultado dessa aprendizagem (dimensão somativa).

A interação das várias dimensões da aprendizagem

A aprendizagem do aluno resulta da convergência de uma série de fatores


complexos, como conhecimentos, atitudes, habilidades, relações interpessoais,
entre outros, o que pode levar os professores a atribuírem notas aos alunos, consi-
derando comprometimento, interesse, participação, frequência. Isso, porém, pode

41
GESSINGER, R. M. et al.  —   Critérios de avaliação a serviço da aprendizagem

caracterizar uma avaliação baseada em ilações, em simpatias, determinada mais


pela impressão que o aluno causa ao docente, o que pode falsear os verdadeiros
resultados da aprendizagem e impedir o atendimento mais preciso às constatações
obtidas (GRILLO, 2003).
Sabe-se, ainda, que a prática educativa oportuniza atividades diversas ao longo
do processo de ensino, como seminários, oficinas, trabalhos em grupo, situações
em que interagem dimensões afetivas e sociais, presentes em toda aprendizagem.
Entretanto, essas dimensões têm constituído problema para os professores na hora
da atribuição de grau à aprendizagem do aluno, porque atribuir grau a testes, pro-
vas ou produções de textos, desde que os critérios estejam claros, não é a tarefa
mais difícil. A questão toma corpo quando se pretende avaliar a área social ou
afetiva. Como traduzir em nota ou conceito uma evidência de cooperação ou de
responsabilidade? Ao apresentarmos como exemplo o detalhamento desses dois
critérios, cabem algumas considerações.
Cooperação, como um critério de avaliação pode ser entendido como contri-
buição efetiva do aluno nas discussões grupais, através de evidências de estudos
teóricos ou contribuições pessoais.
Responsabilidade, por sua vez, pode indicar atendimento a aspectos estabele-
cidos pelo grupo e no grupo, como preparação de leituras, realização de tarefas,
planejamento e apresentação de trabalhos.
Como todas as aprendizagens têm um componente afetivo e social, estes de-
vem ser buscados pelo professor e pelo aluno e são condições favoráveis à ocor-
rência da aprendizagem, o que não significa nem a obrigatoriedade de atribuição
de graus separados a cada um desses componentes, nem a possibilidade de au-
mento ou redução de grau.
Entretanto, outros casos existem em que se faz necessária, em atendimento às
especificidades das disciplinas, ou mesmo ao sistema de avaliação da instituição, a
expressão do resultado da avaliação de aprendizagens que reúnem várias dimen-
sões, através de uma nota ou conceito. É o caso da avaliação de competências, de
disciplinas teórico-práticas, ou de atividades práticas, como laboratórios, estágios
ou atividades semelhantes, que intencionalmente articulam outras dimensões com
objetivos de aprendizagem.
Isoladamente, uma letra ou um numeral é apenas um símbolo convencional
que reduz a comunicação e não expressa claramente resultados complexos. Há

42
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

sempre uma perda de informação quando se precisa passar das constatações ad-
vindas da avaliação para categorias mais concisas e comunicáveis como notas ou
graus, e que, em parte, não cabem nessas comunicações (GIMENO SACRISTÁN;
PÉREZ GÓMEZ, 1998). Há, então, um empobrecimento inevitável da informação
sobre todo o desempenho do aluno, especialmente se ele faz parte de uma turma
numerosa. Por exemplo, ao comunicar ao aluno um grau cinco sem explicitar
quais critérios foram atendidos ou desatendidos, o professor dificulta a reorienta-
ção pelo próprio aluno, o qual, por não compreender a origem da nota que lhe
foi atribuída, exime-se de sua responsabilidade e passa a afirmar que o professor
“lhe deu” tal grau.
Aconselhamentos, pareceres, recomendações realizadas oralmente ou obser-
vações escritas nos trabalhos dos alunos, numa linguagem simples e informal,
podem resolver em parte este problema, desde que se minimize a ideia contabi-
lista de avaliação, segundo a qual esta sempre deve ser concluída com uma nota.
Antes de ser produto, a avaliação é predominantemente processo e como tal ne-
cessita ser considerada não só pelo professor. O aluno também precisa entender
a necessidade da sua participação, do seu comprometimento, do valor de leituras
constantes e do comparecimento às aulas para a sua formação, mesmo que isso
não valha nota, para usar palavras que estamos acostumados a ouvir.
Cabe chamar a atenção sobre os alunos que recebemos atualmente. Diferenças
marcantes entre eles sempre existiram, talvez hoje mais acentuadas em razão das
condições socioeconômicas que todos conhecemos. Entretanto, essas diferenças
não devem constituir-se como fator de exclusão. Isso exige compreensão e sen-
sibilidade do professor para buscar alternativas pedagógicas que contemplem as
singularidades, contribuindo para a redução das desigualdades na aprendizagem
dos alunos, por meio de ações como monitorias ou de outras a serem criadas para
que eles possam apropriar-se do conhecimento.

Referências

BARBOSA, J.; ALAIZ, V. Explicitação de Critérios – exigência fundamental de uma


avaliação a serviço da aprendizagem. Disponível em: <http://www.dgidc.min-edu.
pt/secundario/ Documents/explicitacao_criterios.pdf>. Acesso em: 02 março 2010.

43
GESSINGER, R. M. et al.  —   Critérios de avaliação a serviço da aprendizagem

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da


língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
GIMENO SACRISTÁN, J.; PÉREZ GÓMEZ, A. I. Compreender e transformar o
ensino. 4. ed. Porto Alegre: ARTMED, 1998.
GRILLO, Marlene. Por que ainda falar em avaliação. In: ENRICONE, Délcia;
GRILLO, Marlene (Org.). Avaliação: uma discussão em aberto. 2. ed. rev. ampl.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.
HADJI, C. L’évaluation des actions educatives. Paris: PUF, 1992.
NUNZIATI, G. Pour construire un dispositif d’évaluation formatrice. Cahiers
Pedagogiques, n. 280, p.47-64, 1990.

44
4. AUTOAVALIAÇÃO:
por que e como realizá-la?
Marlene Correro Grillo
Ana Lúcia Souza de Freitas

O interesse por uma prática avaliativa que auxilie os alunos a aprender expli-
ca o empenho de muitos educadores em revisar procedimentos didáticos, com
ênfase na avaliação. Buscando-se, ainda, uma proposta que auxilie na formação
de um aluno autônomo e protagonista de sua aprendizagem, reconhecemos a
avaliação formativa como ponto de partida. Trata-se de uma prática contínua,
realizada durante os processos de ensinar e de aprender, objetivando a melhoria
da aprendizagem enquanto ela se realiza. Tendo como foco específico o proces-
so e não apenas os seus produtos, configura-se como orientação permanente da
aprendizagem, tanto para o professor como para o aluno, que assumem, solidaria-
mente, compromissos recíprocos. Esta modalidade avaliativa transcende a lógica
classificatória da avaliação de resultados, que reduz a avaliação à atribuição de
uma nota ou conceito ao final de determinado espaço de tempo.
O trabalho pedagógico deixa de ser exclusividade do professor e passa a ser par-
tilhado com o aluno, que vai, aos poucos, consolidando a autoconfiança ao perceber-
se capaz de tomar decisões sobre a aprendizagem da qual ele é o autor. Levando-se
em conta que a reelaboração das ideias só pode ser realizada pelo próprio aluno, e
que o conhecimento não se dá por acumulação e sim por reconstrução dos saberes
adquiridos, a avaliação formativa evolui necessariamente para a autoavaliação. Esta
se insere na proposta de avaliação formativa e pressupõe uma relação baseada na
reciprocidade e na partilha; portanto, não se reduz a um instrumento e nem se realiza
GRILLO, M. C.; FREITAS, A. L. S.  —   Autoavaliação: por que e como realizá-la?

em um único momento: é processual. Professor e aluno, ao mesmo tempo, ensinam


e aprendem a operacionalizar uma proposta pedagógica nova, adotando uma meto-
dologia de ensino, de aprendizagem e de avaliação diferenciada.
Nessa medida, a autoavaliação apresenta-se como uma possibilidade de o aluno
reorientar sua aprendizagem, sob acompanhamento do seu professor, o qual ana-
lisa, corrige, sugere, discute os resultados que estão sendo alcançados. Entretanto,
considera-se que ela só terá uma verdadeira dimensão formativa ao tornar-se um
procedimento de reflexão sistemático, com a mediação frequente do professor, a
partir de diagnósticos e intervenções que fortaleçam a autoestima do aluno e esti-
mulem seu desejo de aprender. É provável até que muitas aprendizagens ocorram
sem que se realize tal reflexão, mas é inegável que as mais substantivas são as que
apresentam um maior grau de consciência. Portanto, a avaliação formativa tem na
autoavaliação um procedimento indissociável da metacognição.
A metacognição consiste numa atitude reflexiva pela qual o aluno toma cons-
ciência dos próprios processos mentais. Segundo Hadji (2007, p.29), “ela marca a
passagem de uma regulação puramente espontânea e imediata das suas atividades
a uma regulação consciente e refletida”. É constituída por habilidades tais como
prestar atenção, esforçar-se para atribuir significado e refletir, compreender e saber
explicar a lógica de seu pensamento, perceber as causas de suas dificuldades para
realizar determinada aprendizagem. Essas habilidades diferem em cada aluno, o
que torna a aprendizagem um processo singular. Alguns alunos, por exemplo, pri-
vilegiam o ouvir e conseguem registrar pontos importantes da aula mentalmente;
outros precisam fazer registros por escrito, organizando esquemas. Há, ainda, os
que necessitam ler, sublinhar frases e destacar palavras-chave. Tais procedimentos
auxiliam o estudante a organizar uma forma útil de aprender o conteúdo e, ao
mesmo tempo, a tomar consciência do processo pelo qual ele aprende.
As estratégias implicadas na metacognição auxiliam o aluno a compreender o
processo de autoavaliação que realiza. Esta é constituída pela análise crítica do
próprio trabalho, que favorece a compreensão das dificuldades encontradas e dos
avanços realizados, a comparação entre os resultados obtidos e os esperados, e
a seleção de novas estratégias para a continuidade do processo. Tais práticas não
prescindem do empenho do professor em promover a participação consciente
e comprometida do aluno, sustentada por um clima favorável de reciprocidade
e de confiança. A autoavaliação repercute de forma direta na prática educativa,

46
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

tornando mais exigente a mediação pedagógica1. Além de intervenções sistemá-


ticas, exige-se do professor a utilização de procedimentos diferentes dos que re-
aliza no dia a dia, como o registro de observações e a revisão mais frequente de
tarefas, com questionamentos e/ou sugestões de complementação das atividades
discentes. A participação dialógica do aluno, por seu turno, auxilia o professor
a confirmar ou mesmo reformular orientações que ele entende necessárias para
ajustes ou avanços das aprendizagens, por melhor compreender a lógica do aluno
na realização da atividade.
Ainda que os docentes reconheçam a importância da metacognição e da au-
toavaliação, persistem dificuldades quanto à sua operacionalização. Entre elas
se reconhece a resistência, de docentes e alunos, para romper com a estrutura
estabilizada e até certo ponto confortável que o sistema tradicional de avaliação
proporciona; a exigência de avaliações periódicas das estratégias metacognitivas
e de comunicação dos respectivos resultados em tempo hábil; a dificuldade em
conciliar o elevado número de alunos por turma e as demandas do permanente
acompanhamento dos trabalhos dos alunos.
Acrescentem-se ainda, às dificuldades acima, as especificidades dos sistemas
de avaliação definidos pelas diferentes Instituições, que nem sempre favorecem
o alinhamento a modalidades alternativas ou inovadoras de avaliar. Entretanto,
muitas Instituições viabilizam espaços para o professor propor trabalhos, provas
e outras atividades, a serem orientadas, reorientadas, discutidas com os alunos,
aproximando-se do processo metacognitivo descrito, e que constituem parte do
grau final (o G12, no caso da PUCRS, devendo estar explícito no plano da disci-
plina). Nessa perspectiva, o aluno passa a compreender melhor a origem do grau
obtido e o significado de sua participação.
Algumas intervenções podem ser elencadas como possibilidades de promover
a autoavaliação, cabendo a cada professor ajustá-las à sua realidade, tendo em
vista o caráter dinâmico e circunstancial que a caracteriza:

1
  Mediação pedagógica: competência do professor para auxiliar o aluno a relacionar o já conhecido
ao novo, para tornar os saberes significativos, por meio de revisões, reorganizações de conteúdos e
apresentação de exemplos.
2
  De acordo com o Art. 68 do Estatuto e Regimento Geral da PUCRS, “o grau G1 é expressão da
aprendizagem obtida por meio de instrumentos e procedimentos como um conjunto de verificações,
exercícios, trabalhos teórico-práticos, projetos e/ou atividades, relatórios, de acordo com as
peculiaridades da disciplina”.

47
GRILLO, M. C.; FREITAS, A. L. S.  —   Autoavaliação: por que e como realizá-la?

• Oportunizar momentos em aula para refletir conjuntamente sobre os resul-


tados de determinada tarefa, analisando as fragilidades apresentadas pelos
alunos e propondo a participação destes no planejamento de estratégias
que visem à superação das dificuldades encontradas. A partir da reflexão
realizada, é possível, ainda, solicitar que os alunos refaçam a tarefa in-
dividualmente ou em pequenos grupos, expressando os conhecimentos
reconstruídos.
• Prever, nas tarefas escritas, um espaço para que o aluno possa avaliar o
seu desempenho na atividade, destacando dificuldades e facilidades en-
contradas, suas possíveis causas, bem como as alternativas que podem ser
construídas para a superação de obstáculos.
• Construir, em parceria com o aluno, ações para superar dificuldades.
• Desafiar o aluno a compreender melhor seu pensamento, através de ques-
tionamentos como “O que fizeste?”, “Por que fizeste desta maneira?”, “O
que pensaste para resolver a questão?”, “Por que pensaste assim?”, “Por
que optaste por tal caminho?”, entre outros. O questionamento sistemático
por parte do professor – oral, individual ou coletivamente – pode con-
tribuir para que o aluno incorpore em sua prática o hábito de formular
questões a si mesmo. Pode ser realizado por escrito, através de registros
nos materiais produzidos pelos alunos, substituindo observações como
“confuso”, “não atende ao solicitado”, “rever”, entre outras, por questões
como “o que te levou a resolver a questão desta maneira?”, “por que a
tua solução não contempla o que foi solicitado na questão?”, o que pode
contribuir para o desenvolvimento da atitude reflexiva, imprescindível à
metacognição.

O não entendimento do real significado da autoavaliação pode levar a equí-


vocos com relação a sua utilização. Algumas vezes o professor transfere ao aluno
a responsabilidade de se atribuir uma nota ou conceito, a qual irá compor o grau
final de uma disciplina, sem que tenha sido observado o processo de metacog-
nição, reduzindo o processo à avaliação de produto, sem a consideração prévia
do caminho percorrido pelo aluno, nem da lógica que sustenta suas ideias, o que
contribuiria para reorientar a aprendizagem. Outro equívoco é a proposição de
autocorreção de estudos independentes realizados pelo aluno e de atribuição por
ele de notas e conceitos, ao comparar seus trabalhos com resultados apresentados

48
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

pelo professor. A divisão da responsabilidade pela atribuição de nota ou conceito


entre professor e aluno constitui, também, equívoco, se não resultar em orienta-
ções compartilhadas para análise, correção ou complementação pelo aluno da
trajetória de sua aprendizagem (ANASTASIOU, 2003).
Nesses casos, não ocorreu a gestão do processo pelo aluno com a mediação
do professor, nem a utilização de estratégias metacognitivas. Houve apenas a atri-
buição de um grau a um resultado. Com isso, perde-se um dos aspectos mais ricos
da autoavaliação, que é o desenvolvimento do autoconhecimento e da autocrítica,
apoiado na mediação do professor.
A complexidade do processo de autoavaliação, vinculado à necessidade de
estratégias metacognitivas, exige cautela por parte do professor na sua opera-
cionalização. Trata-se de uma proposta que demanda algum tempo, mas merece
ser empreendida; pode mesmo ser iniciada gradualmente, como uma meta a ser
alcançada, quando se pretende qualificar o ensino e a aprendizagem, contribuin-
do para o desenvolvimento da autonomia do aluno, dentro das possibilidades de
cada contexto.

Referências

ANASTASIOU, L. das G.; ALVES, L. P. (Org.). Processos de ensinagem na


universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville:
UNIVILLE, 2003.
HADJI, C. Avaliação da Aprendizagem. Revista Aprendizagem, Pinhais, v. 1, n. 1,
p.25-31, jul./ago. 2007.

49
5. OS DESAFIOS DO PLANEJAMENTO
E DA PRÁTICA DE AVALIAÇÃO EM
AMBIENTES ON-LINE
Márcia de Borba Campos

Uma vez que se pode observar um maior uso de ambientes virtuais de ensino
e de aprendizagem como suporte às aulas presenciais ou como sala de aula vir-
tual para disciplinas semipresenciais ou a distância, vale discutir sobre questões
relacionadas ao uso de ambientes on-line para que se possa planejar para avaliar
e, com o resultado da avaliação, melhor planejar o processo de ensino e de apren-
dizagem mediante o uso de tecnologias de informação e comunicação.
Existem variados modelos de educação a distância e, consequentemente, de
cursos e de aulas: há cursos a distância que direcionam os encontros presenciais
para atividades avaliativas, outros para aulas de recuperação ou estudo em grupo;
há os que são totalmente assíncronos e outros que combinam atividades síncro-
nas e assíncronas; alguns são baseados na aprendizagem colaborativa, outros no
ensino individualizado; há cursos direcionados para poucos e outros para muitos
alunos; alguns utilizam material impresso e outros uma variedade de mídias digi-
tais; alguns funcionam baseados exclusivamente na internet, outros em satélites e
videoaulas; etc. Portanto, essa variedade faz com que princípios de planejamento
e de avaliação se diferenciem para além do uso dos recursos tecnológicos, mas se
aproximem da educação presencial enquanto reflexo do fazer pedagógico e das
concepções de aprendizagem.
CAMPOS, M. B.  —   Os desafios do planejamento e da prática de avaliação em ambientes on-line

A complexidade da avaliação

O uso que fazemos das tecnologias de informação e comunicação revela nossa


aula, nosso fazer pedagógico e, portanto, não deveria contrariar nosso entendi-
mento do que é ensinar, aprender e avaliar. Entretanto, a dimensão e a variedade
que a educação on-line pode alcançar em termos de quantidade de alunos e de
estilos de aprendizagem, muitas vezes constituem obstáculos a uma avaliação
mais formativa, qualitativa e interativa, e até mesmo ao fazer docente.
Avaliar resultados referentes ao processo do aprendizado e à satisfação do alu-
no em contexto on-line pode se tornar um problema quando a avaliação se fixa
em técnicas tradicionais constantes da avaliação clássica, que são facilmente trans-
portadas para ambientes virtuais. Desta forma, vindo ao encontro dessa redução
da concepção de avaliação a aspectos estatísticos, não é raro encontrar trabalhos
científicos que centralizam as discussões sobre avaliação da aprendizagem on-line
na apresentação de ferramentas de geração automática de relatórios de acesso.
Nesse contexto, descrevem as funções de tutores no processo de avaliação, moni-
torando a aprendizagem dos alunos, lendo e categorizando as mensagens, acom-
panhando os acessos ao ambiente, elaborando o registro dos dados semanais ou
mensais e representando esse processo de ensino e de aprendizagem a partir de
gráficos, tabelas, etc.
Não se questionam as facilidades para acompanhamento e monitoramento das
ações dos alunos trazidas pelo uso de recursos computacionais e o importante
papel administrativo e organizacional dos tutores. Mas se a avaliação faz parte da
ação pedagógica, possibilitando reflexão sobre a prática e a orientação sobre a
tomada de decisões, em um processo contínuo, cumulativo e de compreensão da
trajetória do aluno na construção de seu conhecimento, o professor não pode se
afastar desse processo. Ainda, como o planejamento de ensino e a avaliação são
ações construídas no cotidiano, resultantes do diálogo entre a teoria e a prática e
da interação com os alunos e seus saberes, ao professor cabe ajudá-los a refletir
sobre o que já sabem e sobre como um conhecimento pode se relacionar a outro,
devendo ser parte presente e constante dessa relação.
Concordando com PMBCS (2009), acredita-se que o trabalho em equipe, en-
volvendo trocas de experiências, saberes diferenciados no que se refere ao uso de
mídias digitais, pode romper fronteiras, ultrapassando certos significados tomados

52
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

como verdadeiros e estáveis. Desta forma, uma vez que o professor não pode se
fazer representar, devem ser organizadas estratégias de elaboração e atualização
do ambiente on-line, bem como de acompanhamento e avaliação das aprendi-
zagens que não se limitem à geração de relatórios numéricos sem o registro das
particularidades do percurso cognitivo dos alunos em formação.
Não se deseja a eliminação dos aspectos quantitativos. Nunes e Vilarinho
(2006) também entendem que quantidade e qualidade não são excludentes, mas,
sim, complementares. Em ambientes on-line, as informações quantitativas podem
trazer subsídios aos professores, não somente no sentido de que um aluno não
acessou um determinado conteúdo, mas que determinado fórum não foi acessa-
do, ou que tal atividade não foi realizada pela maioria dos alunos, por exemplo.
Essas informações devem ser consideradas pelo professor como subsídios que
indicam a necessidade de retomadas ao planejamento do ensino e do ambiente
virtual de ensino e de aprendizagem (AVEA) utilizado. Ainda, relatórios de acesso
permitem a elaboração de estratégias para que sejam resgatados alunos que não
estão participando das atividades a distância. Assim, aliados a outras estratégias
qualitativas, os dados quantitativos também podem auxiliar a minimizar/evitar a
evasão de alunos.

Avaliação em movimento

O processo de avaliação é carregado de aspectos ideológicos presentes nas


concepções educacionais, independentemente da modalidade de ensino ser pre-
sencial ou a distância; mas dependente do modelo de EAD adotado. Polak (2009)
destaca que a estrutura conceitual da avaliação em educação a distância não se
modifica, mas são alteradas circunstâncias como o momento (quando avaliar), as
funções (por que e para que avaliar), os conteúdos (o que avaliar), os procedi-
mentos e ferramentas (como avaliar) e os agentes (quem irá avaliar).
A complexidade da avaliação requer momentos e modos variados de coleta,
análise e síntese das informações, do processo de ensino e de aprendizagem. Se
no ensino presencial o professor privilegia, por exemplo, a aplicação de provas
de múltipla escolha, ou restringe o resultado final da avaliação à média de várias
provas, ou ainda somente divulga os resultados da avaliação no período final, no

53
CAMPOS, M. B.  —   Os desafios do planejamento e da prática de avaliação em ambientes on-line

AVEA muito possivelmente essa postura será potencializada. Também, se, no pre-
sencial, o professor pouco considera os resultados da avaliação como estratégia
para rever seus métodos e materiais, ou se a correção detalhada não chega até o
aluno, no ensino a distância dificilmente serão consideradas a qualidade das parti-
cipações e as formas de realização de avaliação, que demandam diálogo contínuo
com os alunos em formação e com o próprio plano de ensino, no exercício de ir e
vir do planejamento para a ação. A questão que permanece é que o planejamento
pode potencializar diferentes formas de ensinar e aprender e que a avaliação deve
trazer indicativos tanto para o professor quanto para os alunos.
Grillo e Lima (2008) alteram a frase de Nóvoa “Diz-me como ensinas e dir-te-
ei quem és e vice-versa” para “Diz-me como avalias e eu te direi como ensinas”.
Seguindo essa corrente, a mesma frase poderia ser substituída por “Diz-me como
avalias e eu te direi como será teu ambiente virtual, e vice-versa”. Justifica-se essa
reescrita a partir de alguns princípios de avaliação também descritos por Grillo e
Lima (idem):
• A avaliação configura todo o cenário pedagógico e explicita a prática de-
senvolvida: se a avaliação se procede de forma pontual, numa perspectiva
de produto, e não de processo, o aluno participará somente das atividades
que “valem nota” e dos questionários apresentados ao final de cada unida-
de temática e ocorrerão muitos silêncios virtuais nos espaços interativos.
Se a avaliação se procede como processo, haverá o estabelecimento de
uma rede social, com diferentes formas de avaliação além de provas e
questionários, e também o diálogo como fonte para a avaliação.
• A avaliação está presente em toda a ação pedagógica: quando o profes-
sor planeja o ambiente virtual de uma disciplina, ele disponibiliza mate-
riais, define recursos de comunicação e planeja atividades. Num processo
proativo, faz um julgamento de como espera que as aulas transcorram e
prepara o ambiente virtual. Contudo, como o planejamento e a avaliação
são práticas construídas no cotidiano, deve-se aplicar o planejamento com
plasticidade. Duarte (2007) observa que a atuação do professor deve ser
flexível para permitir a adaptação às necessidades dos alunos em todo o
processo de ensino e de aprendizagem. Então, se o professor não altera
sua prática e tampouco o ambiente virtual que apoia suas aulas, a avalia-
ção dificilmente fará parte de toda ação docente.

54
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

O uso das tecnologias de informação e comunicação pode interferir no modo


como o professor ministra e prepara sua aula, em como se comunica com a turma
e avalia o processo de aprendizagem dos alunos. Concordando com Barilli (2006),
centrar o uso do AVEA, que possui variados recursos de interação, para simples-
mente aplicar testes “valendo nota” ao final de cada unidade de aprendizagem
parece ser uma contradição.
A avaliação em movimento significa que esta pode ser uma prática diagnóstica,
somativa e formativa, permitindo articulação entre o real e o possível, entre os
objetivos previstos e os alcançados, e que deve considerar o contexto atual, que
é multidisciplinar, hipertextual e multimidiático. Portanto, os recursos disponíveis
em ambientes de ensino e de aprendizagem virtuais podem, pelo menos tecnica-
mente, auxiliar nesse processo.

Planejar para avaliar, avaliar para melhor planejar

Luis e Santiago (2010) destacam que a prática da avaliação da aprendizagem


construída no processo formativo constituiu-se numa referência teórico-prática,
caracterizando-se como inerente ao ensino, como análise da prática escolar. Nesse
cenário, cabe citar PMBCS (2009, p.21) no que se refere à relação entre a teoria
e a prática.

(...) Quando optamos por explorar um texto em vez de uma aula expositiva,
fazemos essa escolha baseados em um planejamento e em uma avaliação.
Não são escolhas aleatórias, mas feitas com base em uma concepção de
aprendizagem, do entendimento do que seja conhecimento, (...), ou seja,
baseamo-nos na teoria, mas não em qualquer teoria.

Penna Firme (2010) destaca que a questão crucial da avaliação é descobrir o


que é preciso fazer para criar e desenvolver avaliações que sejam realmente uti-
lizadas para reduzir incertezas, melhorar a efetividade e tomar decisões relevan-
tes. Portanto, deve ser viável na sua realização e em seus propósitos, reforçando
potencialidades e sucessos, em vez de somente registrar dificuldades e fracassos.
O uso de ambientes virtuais pode auxiliar na organização das aulas, ao repre-
sentar um fluxo organizado/ordenado de ideias, de saberes, de tarefas, predeter-

55
CAMPOS, M. B.  —   Os desafios do planejamento e da prática de avaliação em ambientes on-line

minando o que será ensinado e aprendido. Mas, ao transpor o plano de ensino


para o AVEA, não se deve engessar as aulas porque as ações de ensinar, de apren-
der e de avaliar, dependentes da interação entre professor, aluno e conhecimento,
não são todas previsíveis. Da mesma forma, quando se utiliza um ambiente virtual
para apoiar o planejamento de diferentes atividades, a formação de redes de co-
laboração e cooperação, de integração e interação, enfim, de uma rede social de
aprendentes, ultrapassa-se a mera transposição do uso do giz e do quadro-negro
para uma apresentação interativa, participativa e multilateral, que pode atender às
singularidades dos alunos e do grupo.
Sabedores de que, quando se planeja bem, se avalia melhor; e quando se
avalia com qualidade é porque houve um planejamento das ações didáticas vi-
sando ampliar as aprendizagens, como organizar o espaço virtual de um curso?
O professor deve revisitar o plano de ensino, adequando o ambiente virtual para
possibilitar a dinamicidade do processo de ensino, de aprendizagem e de avalia-
ção. É componente desse movimento a presencialidade virtual, que também se
estende aos alunos.
A presencialidade virtual do professor e dos alunos é fator importante para a
construção do contexto da aprendizagem e se traduz na qualidade e na intensi-
dade das interações estabelecidas no cenário coletivo do ambiente virtual. Dessa
forma, a presencialidade não decorre simplesmente do estar conectado ao am-
biente: está condicionada ao efetivo envolvimento com as atividades propostas.
A visibilidade do professor está relacionada com o tipo de mensagem enviada,
com o efeito que traduz no contexto virtual e com a contribuição para reduzir o
isolamento e a evasão dos alunos. Deve, então, acompanhar as ações dos alunos,
sendo um agente ativo na leitura e na análise das discussões, possibilitando feed-
back ao longo do curso. Desta forma, para além de uma sequência ordenada de
conteúdos, o professor modela o curso também por meio da sua presença, de seu
comportamento e de sua participação, do retorno dado aos alunos, criando opor-
tunidades de aprendizagem e revendo suas estratégias de ensino e de avaliação,
sempre que necessário.
A visibilidade do aluno também está relacionada às respostas, às produções
e à sua participação no ambiente virtual. Envolve habilidades, comportamentos,
elaboração e aceitação de críticas, atendimento aos prazos preestabelecidos para
a realização das atividades, respeito à coletividade, dentre outros, que gradativa-

56
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

mente vão contribuindo para a consolidação de sua autonomia. A aprendizagem,


percebida como própria do sujeito, implica valorizar o papel da interação com
o meio social, pois a construção e reconstrução do conhecimento dependem da
presença e da interação com o outro.
A escolha das ferramentas e a dinamicidade das atividades fazem com que se
retome a frase “Diz-me como avalias e eu te direi como será teu ambiente virtual,
e vice-versa”. Se o plano de ensino é estanque e engessa a prática pedagógica, se
as aulas são centradas na fala do professor, e a avaliação é baseada em provas e
testes de múltipla escolha, possivelmente as unidades temáticas no ambiente vir-
tual estarão baseadas, por exemplo, em textos e videoaulas, farão pouco uso de
recursos de comunicação e maior uso de questionários, muitos corrigidos automa-
ticamente e divulgados imediatamente pelo ambiente. Essas ações não deveriam
se sustentar nos ambientes virtuais devido à riqueza das ferramentas de comuni-
cação e das muitas possibilidades de diálogos em rede.
Se a avaliação se processa de forma ininterrupta, permitindo uma regulação
contínua durante o processo, o ambiente virtual muito provavelmente fará uso de
diferentes espaços de interação e integração. Poderão ser utilizados fóruns, glos-
sários, diários, blogs, editores de textos colaborativos, atividades de autoavaliação
e portfólios, por exemplo, com feedback constante do professor, mostrando a
dinamicidade do processo de ensino, aprendizagem e avaliação.
Nessa concepção de avaliação, se reconhece a dificuldade do professor de
responder a todas as mensagens, de comentar todos os trabalhos, de fornecer
feedback em tempo hábil. Na prática, quando há muitos alunos, se sabe que o
retorno individual torna-se trabalhoso. Nesse sentido, conforme PMBCS (2009) e
Pilotto (2005), individualizar não se constitui em atender, ou enviar uma mensa-
gem a cada aluno isoladamente; mas sim “pela multiplicidade de possibilidades da
intervenção docente considerando os múltiplos ritmos de aprendizagem. É justa-
mente essa multiplicidade das capacidades de aprender que representa a riqueza
potencial do feedback” (PMBCS, 2009, p.116). Nos ambientes virtuais, os fóruns de
discussão permitem essa ação de comunicação entre as aprendizagens e o ensino,
podendo se constituir como um processo de retroalimentação onde as questões
são apresentadas e discutidas com todos os alunos.
A autoavaliação é outro instrumento importante para o aluno avaliar seu desem-
penho baseado nos objetivos e indicadores de aprendizagem da disciplina, e não

57
CAMPOS, M. B.  —   Os desafios do planejamento e da prática de avaliação em ambientes on-line

deve ser entendida como atribuição de uma nota ou conceito. Nunes e Vilarinho
(2006) consideram-na como elemento-chave para alunos e professores conscienti-
zarem-se de suas dificuldades e conquistas. Muitos ambientes virtuais possuem o
recurso de diário, que são individuais, que poderiam ser utilizados para a elabora-
ção e o acompanhamento da autoavaliação pelos alunos e professor, por exemplo.
Os ambientes virtuais, em sua maioria, disponibilizam recursos e serviços que
permitem coletar informações sobre as necessidades e características dos alunos,
sobre o processo de aprendizagem dos mesmos como um todo, e também indi-
vidualmente. Cabe aos professores propor diferentes atividades de avaliação com
criatividade, inovando nos procedimentos de acordo com a turma, os objetivos pe-
dagógicos, os prazos, a finalidade daquela avaliação. Para tanto, as atividades pro-
postas devem estar bem definidas, claras e completas no que se referem, também,
aos recursos on-line que irão apoiá-las. Por exemplo, se uma discussão deve ocorrer
num determinado fórum, esse precisa ter sido criado com antecedência, bem como
as regras de participação. Se um trabalho deve ser entregue até dia tal, deve ser
criada uma sala de entrega com essa restrição, por exemplo. Ainda, buscando essa
clara apresentação, deve-se determinar se os alunos podem entregar trabalhos além
do prazo definido, se há alguma limitação no que refere ao tamanho e formato do
arquivo, se é para ser feito individualmente ou em grupos, se há decréscimo na
nota, etc. Portanto, além de definir se é para citar, exemplificar, descrever, discutir,
analisar, etc., devem-se explicitar os critérios e procedimentos avaliativos.
Moore (2007) explica as expectativas de alunos de educação a distância a
partir do que eles dizem esperar em termos de avaliação e feedback das tarefas
propostas (p.150):
• avaliação justa e objetiva;
• respeito ao trabalho desenvolvido;
• explicação e justificativa da nota dada;
• indicação clara de como podem melhorar em termos de respostas especí-
ficas às perguntas e em geral;
• incentivo e renovação da confiança a respeito de sua capacidade e progresso;
• críticas e conselhos construtivos;
• oportunidade para responder, se desejado;
• resposta na ocasião certa (isto é, antes da próxima tarefa a ser entregue).

58
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Satisfazer a esses critérios requer tempo e dedicação por parte do professor.


Portanto, o planejamento do tipo, variedade e quantidade de atividades no am-
biente virtual deve estar de acordo com a proposta de avaliação.

Considerações finais

A Educação a Distância é a modalidade educacional na qual a mediação di-


dático-pedagógica nos processos de ensino e de aprendizagem ocorre com a
utilização de meios e tecnologias da informação e comunicação, com estudantes
e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos
(Decreto nº 5.622/05). Devendo ser concebida no contexto mais amplo de Edu-
cação, requer elementos fundamentais também exigidos na educação presencial,
tais como: concepção pedagógica, metodologia, conteúdo, infraestrutura física,
tecnológica e de pessoal, entre outros, pautados pela construção da autonomia,
pela inclusão social e pelo respeito à diversidade.
Os diferentes modelos de EAD ditam regras no que se refere ao número de
alunos por curso, à equipe de apoio, à formação docente para uso das tecnolo-
gias, à inclusão digital dos alunos, que afetam, consequentemente, a decisão pela
quantidade, variedade e tipos de procedimentos avaliativos. Assim sendo, deve-se
estruturar uma metodologia de avaliação do fazer pedagógico e da aprendizagem
dos alunos, de acordo com o modelo de EAD adotado.
No que se refere também à modalidade presencial, o uso das tecnologias não
deveria alterar a percepção de professores e de alunos sobre o processo de ensi-
nar, de aprender e de avaliar. Entretanto, o que se observa em cursos de forma-
ção docente é um certo encantamento pelas possibilidades de uso dos variados
recursos de ambientes virtuais, e não pelas diferentes possibilidades de uso de
cada recurso. O resultado é que o ambiente fica parecendo um simples mostruário
de recursos on-line, e não efetivamente um ambiente de interação onde tanto o
professor quanto seus alunos podem perceber suas trajetórias de aprendizagem.
Dize-me como avalias e eu te direi como será teu ambiente virtual.
Dize-me como é teu ambiente virtual e eu te direi como avalias.

59
CAMPOS, M. B.  —   Os desafios do planejamento e da prática de avaliação em ambientes on-line

Referências

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de opção. In: SILVA, Marcos; SANTOS, Edméa. (Org.). Avaliação da aprendizagem
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e interlocução no processo ensino-aprendizagem. In: SCHOLZE, Lia et al. (Org.).
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Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007, p.171-183.
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SILVA, Marcos; SANTOS, Edméa. (Org.). Avaliação da aprendizagem em educação
online. São Paulo: Loyola, 2006, p.171-181.
GRILLO, Marlene Correro; LIMA, Valderez Marina do Rosário. Dimensões
conceituais e operacionais da avaliação. In: GRILLO, Marlene et al. (Org.). A
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olhar sobre a prática profissional de professores e suas experiências formativas. In:
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Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Fundação Cesgranrio, 1993. Disponível em
<http://www.anped.org.br/reunioes/24/T0885589165170.doc>. Acesso em: 03 mar.
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MOORE, Michael G. Educação a distância: uma visão integrada. São Paulo:
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NUNES, Lina Cardoso; VILARINHO, Lúcia Regina Goulart. Avaliação da
aprendizagem no ensino online: em busca de novas práticas. In: SILVA, Marcos;
SANTOS, Edméa. (Org.). Avaliação da aprendizagem em educação online. São
Paulo: Loyola, 2006, p.109-121.
PENNA FIRME, Thereza. Os Avanços da Avaliação no Século XXI. Disponível em
<http://www.cenpec.org.br/modules/editor/arquivos/c8a0633f-4d01-eae6.pdf>.
Acesso em: 03 mar. 2010.
PILOTTO, Fernando G. Ensino, avaliação e educação a distância. In: OLIVEIRA,
Celmar Corrêa de; PILOTTO, Fernando Gonçalves. Educação a distância em
processo. Porto Alegre: C. C. O / F. G. P/ Evangraf, 2005, p.85-94.

60
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

PMBCS, Província Marista Brasil Centro-Sul; SANDI, Flávio Antônio; CHIQUITO,


Ricardo Santos. Projeto Marista para Planejamento e Avaliação. 1. ed. São Paulo:
FTD, 2009. (Coleção currículo em movimento; v. 5)
POLAK, Ymiracy Nascimento de Souza. A avaliação do aprendiz em EAD. In:
LITTO, Fredric Michael; FORMIGA, Manuel Marcos Maciel. Educação a distância:
o estado da arte. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2009, p.153-160.

61
6. O USO PEDAGÓGICO DO CINEMA:
estratégias para explorar e avaliar filmes
em sala de aula
Helena Sporleder Côrtes

Cada canal de comunicação codifica a realidade de ma-


neira diferente e influi de forma surpreendente no conteúdo da
mensagem comunicada. Um meio não é somente um envelope
que contém uma carta: é, em si mesmo, uma importantíssima
parte da mensagem.

(CARPENTER, E. Los nuevos lenguagens en el aula sin


muros. Barcelona: Laia, 1974)

O ‘fantasma’ da avaliação da aprendizagem costuma rondar o planejamento de


ensino dos professores, desde que se passou a perceber a importância da edu-
cação escolar – para ‘bem ensinar’ é preciso avaliar o que o aluno efetivamente
’aprendeu’... Como não há receitas prontas que se apliquem à vida real que pro-
fessores e alunos vivem na sala de aula, garantindo o sucesso do ensino e, por via
de consequência, da aprendizagem, a questão cresce de importância, constituindo
um permanente foco de debate na área educacional.
Como avaliar o desempenho do aluno, portanto, é matéria básica de preocu-
pação na escola, qualquer que seja o nível ou modalidade de ensino, em todas as
áreas do conhecimento. Quando pensamos em avaliação escolar, no entanto, ge-
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

ralmente selecionamos os conteúdos de ensino a serem avaliados – especialmente


os conteúdos conceituais (COLL, 1998), isto é “o que se deve saber” – a partir de
uma lista variada de materiais que tenham sido objeto de estudo e reflexão anterior:
livros, apostilas, pesquisas, textos retirados da internet ou reprografados, anotações
de aula, enfim, materiais “escritos”. Mesmo os chamados conteúdos procedimen-
tais (idem), que envolvem modos de operar em relação a algo, ou seja, “como se
deve fazer”, e que também habitam o cotidiano da sala de aula, são, via de regra,
igualmente orientados por materiais gráficos/escritos que antecedem ou sucedem a
proposta de ensino dos procedimentos e/ou operações correspondentes.
Assim, apesar da gama de recursos e instrumentos audiovisuais disponíveis
hoje para apoio ao ensino, na web, na TV, no cinema, no vídeo, a observação
parece indicar que raramente os professores os utilizam, mesmo quando a inten-
ção seja o trabalho com os conteúdos atitudinais, que sinalizam “como se deve
ser” (ibidem), e que envolvem a construção de valores e atitudes. E essa, talvez,
constitua a área de maior complexidade, na tarefa da educação escolar, desde
que, já há muito tempo, Bloom et al. (1974) a chamaram de ‘domínio afetivo’ do
comportamento humano...
Dessa forma, o uso didático das tecnologias audiovisuais contemporâneas vem
sendo também desconsiderado sob a perspectiva de que tais elementos devam,
por conta de integrarem o processo de ensino, integrar igualmente sua proposta
de avaliação da aprendizagem. Como se a leitura da imagem não necessitasse ser
avaliada, tal como se avalia a leitura da palavra escrita, costumamos avaliar nossos
alunos em termos de sua competência de compreensão de um texto, mas negli-
genciamos a avaliação de sua competência de compreensão de uma pintura, de
um programa de TV ou de um filme...
Ainda que reconheçamos a força da tradição cultural de base oral e escrita
que caracteriza há séculos a educação escolar ocidental, a riqueza audiovisual do
mundo de hoje exige cada vez mais enfaticamente da escola a ampliação de seus
padrões conceituais: se é fato que a base sobre a qual se organizam os currículos
escolares se define a partir da habilidade de ler e escrever na língua pátria, junta-
mente com a capacidade de lidar com os números e cálculos matemáticos, tam-
bém é verdade que o acesso a outras linguagens e formas de expressão favorece
ao aluno as condições de desenvolvimento de uma maior abertura perceptual e,
por via de consequência, de uma formação culturalmente mais qualificada.

64
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Segundo sugere Machado (2006), o propósito da utilização de filmes, programas


de TV ou outros produtos culturais no ensino – músicas, peças teatrais, pinturas, es-
culturas – é, não só sensibilizar, tematizar e discutir questões associadas ao currículo
escolar, mas ampliar os horizontes dos alunos, colocando-os em sintonia com essas
outras linguagens e formas de expressão. Desse modo, os estudantes podem per-
ceber a complexidade das manifestações artísticas, na produção cultural humana,
compreendendo igualmente suas múltiplas possibilidades de expressão e leitura.
A possibilidade de encaminhamento da leitura de imagens, particularmente, é
reveladora deste potencial, pois

(...) as imagens são mediadoras de valores culturais e contêm metáforas nascidas


da necessidade social de construir significados. Reconhecer essas metáforas e
seu valor em diferentes culturas, assim como estabelecer as possibilidades de
produzir outras, é uma das finalidades da educação para a compreensão da
cultura visual (HERNANDEZ, 2000, p.133).

Se, como destacam Penharbel e Alves (2009), as imagens invadem intensa-


mente o cotidiano de todos os alunos, sob diferentes formas, às vezes estranhas
e ousadas, despertando-lhes o olhar e os sentidos, causando-lhes inquietações e
levando-os à busca do desconhecido, é necessário

promover a capacidade de compreensão do aluno, para que ele, diante deste


universo de imagens, possa saber cada vez mais, sentir, ver, olhar, aguçar a
percepção, ter vontade de descobrir, de falar com o outro sobre o que viu;
saber fazer associações com o que está vendo e vivendo; enfim, encontrar
na leitura da imagem um elemento revitalizador de sua aprendizagem.
(PENHARBEL; ALVES, 2009, p.794).

Trabalhar o cinema na sala de aula, explorando com o aluno, este outro uni-
verso de conhecimento e emoções que pode expandir sua capacidade de perce-
ber e compreender o mundo em que vive, implica, portanto, a necessidade de
avaliar se esta percepção se desenvolveu e encaminhou a compreensão preten-
dida, o que demanda o estabelecimento de um plano de ação pedagógica capaz
de sustentar a exploração didática e a correspondente avaliação das atividades de
aprendizagem decorrentes da ‘leitura’ do filme assistido.
Todavia, tanto quanto um texto não é um amontoado de frases ou palavras
desconectadas, pois que tem uma estrutura formal que lhe garante sentido, uma

65
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

imagem (estática ou em movimento) igualmente é estruturada com base nos ele-


mentos que a compõem (a cor, a luz, por exemplo), e nos princípios que a fun-
damentam (o movimento, o equilíbrio, o ritmo, entre outros), o que permite que,
tal como o texto, a imagem também possa ser ‘lida’.
Assim, como ensina Pillar (1999), a leitura depende do que está em frente e
atrás dos nossos olhos, pois, no ato de ler, entrelaçam-se as informações do ob-
jeto (suas características de forma, cor, localização), com as informações do leitor
(seu conhecimento prévio do objeto, sua capacidade de imaginação, suas infe-
rências). Em outras palavras, ler corretamente e interpretar adequadamente são
atividades que mantêm relação direta com a qualidade do objeto de leitura e com
as competências do sujeito leitor.
Na medida em que o exercício frequente do contato com filmes diversos (em
especial, aqueles que não seriam ‘escolhidos’ voluntariamente) pode desenvol-
ver nos alunos novas/mais amplas competências críticas e reflexivas, igualmente
ampliando-lhes o background cultural, a escola deve estimular o seu uso, uma vez
que desse modo estará expandindo os horizontes da leitura do mundo que lhe
cabe ajudar a construir junto aos estudantes. Assim, há que incorporar o cinema/o
vídeo/a televisão ao trabalho docente, mas, para tanto, há que necessariamente
compreender a ‘gramática’ da linguagem audiovisual para poder dela fazer uso
pedagógico, num processo de ‘alfabetização imagética’ que permita explorá-la a
contento, nesse sentido.
Por conta disso (e pensando também na necessidade de abarcar como re-
cursos educativos todas as tecnologias hoje disponíveis), Sampaio e Leite (2000)
defendem a necessidade de uma ‘alfabetização tecnológica’ do professor con-
temporâneo, a fim de que esteja preparado para lidar com os novos recursos de
comunicação e informação em seu cotidiano profissional:

Assim como, durante séculos, a alfabetização tem sido fator de socialização,


inserção no mundo e interpretação deste, hoje, torna-se cada vez mais importante
uma alfabetização audiovisual (Demartini, 1993), uma educação para a mídia
(Belloni, 1991), enfim, uma alfabetização tecnológica para interpretação e ação
crítica junto às novas tecnologias e formas de comunicação. (SAMPAIO; LEITE,
2000, p.14).

Este novo e necessário processo de alfabetização, segundo as autoras, refe-


re-se, não só à capacidade de os professores lidarem com as novas tecnologias

66
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

e interpretarem adequadamente sua linguagem, como distinguirem ‘como’,


‘quando’ e ‘por que’ são importantes e devem ser usadas. Estar ‘tecnologica-
mente alfabetizado’, portanto, envolve “o domínio contínuo e crescente das
tecnologias que estão na escola e na sociedade, mediante o relacionamento
crítico com elas” (idem, p.75), o que significa que o professor deve apro-
ximar-se das várias mídias, conhecê-las em suas características e modos de
funcionamento, para ter, assim, condições de inseri-las criticamente no fazer
pedagógico.
Entre as mídias audiovisuais contemporâneas, o cinema é um velho conhe-
cido de alunos e professores: ‘novas’, hoje em dia, seriam consideradas as pos-
sibilidades de acesso e reprodução aos materiais fílmicos, já que, por um lado,
a programação das emissoras de TV (em especial, a cabo e/ou satélite, que
geralmente os transmitem até sem interrupção), a profusão de locadoras de
DVDs e as cômodas salas de cinema que se localizam nos sempre movimenta-
dos shopping centers têm ampliado decisivamente o contato do público com o
cinema. Por outro lado, o barateamento e a democratização dos aparelhos de
produção, gravação e edição desses materiais (e sua interface cada vez mais
‘amigável’) vêm trazendo maior facilidade a seu uso e operação – câmeras,
gravadores e DVD players, softwares específicos ‘baixados’ da internet, quase
todos esses recursos estão presentes na maioria das residências e das escolas
urbanas.
Filmes, nesse sentido, são parte da experiência de quase todo mundo, porém,
abrir o ambiente escolar para o uso de materiais provenientes de outras áreas de
produção cultural envolve algumas dificuldades, sendo, talvez, a primeira delas
justamente a exigência de o professor familiarizar-se com o modo de operação
das linguagens envolvidas, para poder explorar didaticamente estes produtos: é
necessário não só conhecer suas características intrínsecas – o conteúdo específico
do filme, vídeo ou programa de TV selecionado – mas compreender seu modo de
produção e operação, a fim de melhor estabelecer suas condições de funciona-
mento como recurso educativo/de ensino.
Mas a complexidade inerente à forma de expressão audiovisual deve ser con-
siderada, se o que se pretende é empreender uma análise do conteúdo e/ou da
estrutura de materiais dessa natureza. Narrativas visuais, no cinema ou na TV,
propõem uma interface diferenciada, em relação às narrativas literárias:

67
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

O que se capta, em primeiro lugar, é o contexto demonstrativo, em vez de um


contexto verbal: percebe-se pela vestimenta, caracterização e comportamento
dos personagens, pelo lugar onde estão, por seus gestos e expressões faciais,
se se trata de um drama ou comédia, em que época se desenvolve o enredo,
enfim, de que modo o espectador está sendo convidado a fruir aquele conjunto
de significados visuais componentes de uma trama. Cada cena comporta
um peso visual e auditivo, este dado pela trilha sonora, que se comunica
imediatamente, sem necessidade de palavras. A imagem tem, portanto, seus
próprios códigos de interação com o espectador, diversos daqueles que a
palavra escrita estabelece com seu leitor. (PELLEGRINI, 2003, p.15-16).

Nessa perspectiva, a autora destaca a necessidade de entendimento das pro-


fundas transformações que se fizeram sentir nos modos de produção e repro-
dução cultural, desde a invenção da fotografia e do cinema, trazendo alterações
decisivas sobre os modos de olhar e perceber o mundo, a ponto de influenciarem
também o próprio texto literário – no texto ficcional, por exemplo, as noções
de tempo, espaço, personagens e narrador, elementos que estruturam a forma
narrativa, hoje estariam reorganizadas dentro de novos parâmetros rítmicos e esti-
lísticos, ‘incorporando’, de certo modo, algumas das características da linguagem
audiovisual: certas narrativas contemporâneas parecem descrever apenas uma se-
quência de ‘tomadas’, enumerando caoticamente “fragmentos de objetos, vestígios
de paisagens, traços de corpos e rostos humanos: flashes, takes, shots; trata-se de
um estilo imagético, digamos assim, visceralmente ligado à linguagem cinemato-
gráfica e televisiva” (idem, p.29).
Narrativas audiovisuais geralmente se impõem sobre as literárias, no gosto dos
jovens e adolescentes, pois as características da linguagem midiática têm potencial
mobilizador mais expressivo, até porque são produzidas para operar de forma
muito peculiar, e é exatamente nesse seu modus operandi que reside a força da
linguagem audiovisual, já que ela “seduz, mais que convence; aciona mecanismos
mentais e emocionais, muito mais que racionais e lógicos; seu apelo primário é
dirigido à emotividade, não à razão” (CÔRTES, 2003, p.63).
Fazendo ‘sentir’, mais (ou antes) do que ‘entender’, a linguagem imagética
pode ampliar também as condições de mobilização para aprender. Sob essa ótica,
Ferrés (1998, p.16) destaca o fato de que a linguagem televisiva (ou cinemato-
gráfica) “é dirigida a determinados esquemas mentais, capacidades cognitivas,
estruturas perceptivas e sensibilidades previamente existentes no indivíduo”, mas,

68
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

ao mesmo tempo, tem o poder de potencializar e modificar tais esquemas, capaci-


dades, estruturas e sensibilidades, o que revela sua força para formar/transformar
eventualmente a percepção dos valores imbricados nas narrativas audiovisuais.
Considerando, assim, o amplo acervo do material cinematográfico existente,
o fácil acesso hoje disponível aos instrumentos de reprodução dos filmes e o
expressivo potencial mobilizador da linguagem audiovisual, o professor passa a
contar com um recurso didático ímpar, e pode incorporar o cinema à lista dos
seus materiais de ensino. Independente de sua área de atuação, em especial no
Ensino Superior, o docente tem à mão um poderoso aliado, desde que se dispo-
nha a selecionar adequadamente o material a utilizar e explorar: o critério essen-
cial da escolha deste ou daquele filme é pautado pelas finalidades pedagógicas
que balizam a organização de seu plano de ensino – “o quê” usar depende, assim,
essencialmente, de “para quê” será usado...
Filmes que discutem questões diretamente relacionadas aos conteúdos concei-
tuais da disciplina ou área de estudo, e/ou que descrevem operações envolvidas
entre as competências procedimentais necessárias, e/ou, ainda, que envolvem va-
lores definidos como desejáveis, em termos atitudinais, devem ser os selecionados,
independente do gênero a que pertençam ou da época de sua produção. Assim,
documentários científicos ou jornalísticos, filmes antigos ou blockbusters, curtas ou
longas metragens, produções nacionais ou estrangeiras, todos têm seu lugar garan-
tido, se o princípio da adequação aos objetivos de ensino for obedecido.
Ampliando o raio de visão dos alunos e colocando-os em sintonia com a pro-
dução cinematográfica, é possível sensibilizar, apresentar, tematizar, argumentar
e discutir questões previstas nos projetos curriculares de praticamente todos os
cursos, pois que ‘a matéria do cinema é a vida’, em todas as suas manifestações –
dificilmente alguém poderia afirmar não usar o cinema como recurso pela inexis-
tência de um filme apropriado para o seu campo de conhecimento... Vale lembrar,
aqui, talvez antes de tudo, que os conteúdos do ensino, em todas as áreas, não
são apenas os conceitos e princípios científicos que as sustentam, mas também (e
principalmente!) os valores que dão sentido à ação humana... Por isso,

trabalhar com o cinema em sala de aula é ajudar a escola a reencontrar a


cultura ao mesmo tempo cotidiana e elevada, pois o cinema é o campo no qual
a estética, o lazer, a ideologia e os valores sociais mais amplos são sintetizados
numa mesma obra de arte. Assim, dos mais comerciais e descomprometidos,

69
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

aos mais sofisticados e ‘difíceis’, os filmes têm sempre algum possibilidade


para o trabalho escolar (NAPOLITANO, 2003, p 12).

Sob esse prisma, se é fato que ‘não há texto sem contexto’, a contextualiza-
ção da proposta é o primeiro passo a empreender: a mensagem fílmica aborda
um determinado conteúdo que é fonte de informação (e formação), mas, dada a
linguagem específica dos materiais audiovisuais, tal conteúdo se expõe/propõe à
recepção e discussão sempre de maneira socialmente situada. A relação entre o
texto cinematográfico e suas condições de existência e uso acontece numa situ-
ação comunicativa que é definida por diferentes contextos, como explica Casetti
(In CHAGAS, s/d, p.2), quais sejam:

o texto comunicativo (constituído por uma série de discursos); o contexto


circunstancial de um texto (constituído por sua colocação espaço-temporal); o
contexto existencial de um texto (constituído por horizontes, saberes e práticas
sociais); o contexto institucional de um texto (âmbito institucional); o contexto
transtextual (os referentes textuais); e o contexto de ação (atores, estados
psicológicos e ações).

A natureza plural do texto é composta de discursos que constituem a situação


comunicativa, e o contexto também comunica. Assim, o texto fílmico e os vários
contextos apontados se entrecruzam, numa rede de saberes que pode enrique-
cer, não apenas a experiência de fruição da obra (a construção individual de
significados e o seu compartilhamento), mas também sua exploração didática
(a discussão/reflexão coletiva capaz de reconstruir o sentido da experiência de
aprendizagem vivenciada). Usado na instituição escolar, o filme vai ser mediado
por todos estes fatores contextuais, ressalta ainda o autor; por isso, um filme pro-
duzido para o cinema comercial e consumido como recurso didático, tal como um
mesmo objeto que mudasse de pele, pode transformar uma produção comercial
exitosa num documento de reflexão crítica, pois, já ressaltava Jacquinot (1999, In
CHAGAS, s/d), é o dispositivo de uso pedagógico que lhe confere valor formativo.
Há materiais audiovisuais especificamente concebidos para a função de ensinar, e
há os que não foram produzidos para esse fim, integrantes do chamado ‘circuito
comercial’, geralmente, os mais utilizados/utilizáveis, quando se pretende ampliar
o grau de intimidade do estudante com outras formas de expressão da cultura – e,
nestes casos, volta-se a ressaltar que as finalidades educacionais são as definidoras
da escolha do material a utilizar.

70
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Isso posto, cresce de relevância a necessidade de discutir a articulação do


inegável potencial motivador representado pela linguagem cinematográfica, às
condições de avaliação da aprendizagem que ela pode encaminhar, nas diferentes
disciplinas e situações em que for utilizada, em especial, na Educação Superior.
Talvez, para tanto, em primeiro lugar, devamos delinear didaticamente o fio
condutor do uso de recurso de ensino tão atraente, a partir da premissa de que o
ato de avaliar é uma atividade complexa. Luckesi (1996) já o definia, grosso modo,
como o indicativo da atribuição de um determinado valor ou qualidade a um ob-
jeto, com vistas à tomada de uma posição a seu favor ou contra ele, o que conduz
a uma decisão: manter o objeto como está ou atuar sobre ele. Por isso,

a avaliação, diferentemente da verificação, envolve um ato que ultrapassa a


obtenção da configuração do objeto, exigindo decisão do que fazer ante ou
com ele. A verificação é uma ação que ‘congela’ o objeto; a avaliação, por sua
vez, direciona o objeto numa trilha dinâmica de ação. (LUCKESI, 1996, p.93).

A utilização do cinema como recurso em sala de aula deve, sob essa perspec-
tiva, ser ‘avaliada’ e, não, apenas ‘verificada’, em termos da presença maciça dos
alunos ou das suas superficiais indicações de ‘gostei’ ou ‘não gostei’ da atividade.
Para efetivamente avaliar a (provável) aprendizagem decorrente de uma situação
de uso do cinema no ensino, é preciso planejar cuidadosamente as estratégias de
ação pedagógica que, em seu conjunto, deverão encaminhá-la, sendo o filme ‘um’
dos recursos selecionados para tanto. Assistir a um filme, então, será ‘uma’ entre
as variadas e desafiadoras atividades que o professor deve definir para organizar
seu trabalho docente, sempre buscando

criar situações-problema que estimulem a mobilização dos saberes trabalhados


e que, por sua crescente complexidade, exijam a interlocução do aluno com os
colegas, com a realidade, com demais professores e especialistas, com outras
fontes. (DE SORDI, 2001, p.179).

Definidas essas questões, o professor se depara com a operacionalização do


trabalho, o que demanda organizá-lo na perspectiva de toda atividade pedagó-
gica, isto é, pressupondo um planejamento criterioso dos passos a serem empre-
endidos. A busca do aproveitamento adequado e competente de um filme como
recurso de ensino envolve – depois da observação de alguns cuidados sob o

71
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

aspecto prático, como o exame e a testagem dos equipamentos e a organização


prévia das condições de infraestrutura da sala de projeção – a preparação do ‘cli-
ma favorável’ para a exibição da obra, de modo que se estimule a curiosidade em
conhecer e/ou o interesse em participar.
Nesse sentido, é importante responder a perguntas essenciais à identificação e
contextualização da obra, buscando situá-la no tempo/espaço de sua produção,
além de articulá-la à proposta pedagógica da disciplina/área de estudo: qual o
título (original e ‘traduzido’) do filme selecionado? É um documentário? Um filme
de ficção? Qual o seu país de origem? Qual o ano de sua produção? Quem é o
diretor? Quem é o roteirista? Quem são os produtores? Quais são os principais
atores? O filme participou de algum festival da área? Recebeu alguma indicação
ou prêmio? Está (ou esteve) em cartaz, atualmente (recentemente)? Por que vamos
assisti-lo? Em que medida ele se relaciona com nossos estudos? Estas perguntas
podem ser respondidas pela leitura prévia da ficha técnica do filme escolhido
(obtida na própria embalagem do DVD) e/ou em múltiplos sites e blogs de cine-
ma (os quais, inclusive, apresentam sugestões e comentários críticos que muitas
vezes ampliam as possibilidades de identificação, contextualização e exploração
da obra). É fundamental que se registre, no entanto, que tais informações são
de caráter geral – o professor não pode pré-interpretar ou pré-julgar o filme, ao
fornecê-las, sob pena de esvaziar de sentido a atividade proposta.
O passo metodológico seguinte, talvez o mais importante, é promover a exi-
bição, encaminhando, então, a ‘leitura’ posterior. Aqui, o professor pode, como
propõe Morán (2000), determinar diferentes atribuições aos alunos, quando da
projeção do filme (aqueles que anotarão as cenas mais marcantes, ou as imagens
mais significativas, ou o papel da música e dos efeitos especiais, ou a caracteri-
zação física e/ou psicológica dos personagens), definindo-as no sentido estreito
de sua relação com os objetivos educativos previstos – e, aí, isso terá que ser
proposto e esclarecido antes do desenvolvimento da atividade, e avaliado nesta
perspectiva, durante e depois da exibição.
O autor sugere também que o uso didático do vídeo (ou, no caso, do cinema
com essa finalidade) pode ter funções diferentes, dentre as quais destacamos al-
gumas de maior relevância para os propósitos desta reflexão.
Assim, um filme pode ser exibido com vistas à sensibilização dos alunos para
o estudo de determinado tema – ancorados na força mobilizadora da emoção

72
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

que a linguagem audiovisual utiliza, filmes ‘tocam’ as pessoas, sensibilizando-as


e abrindo-lhes novas perspectivas de percepção e ação sobre as questões huma-
nas. Valores relevantes (honestidade, honra, integridade, responsabilidade, etc.) e
atitudes positivas correlatas (generosidade, solidariedade, respeito, por exemplo),
são claramente percebidos por serem abordados através de uma narrativa comple-
ta, uma história que é técnica e artisticamente concebida com a intenção precípua
de atingir nossa sensibilidade.

Os filmes se realizam em nosso coração e em nossa mente, menos como


histórias abstratas e mais como verdadeiros mundos imaginários, construídos a
partir de linguagens e técnicas que não são meros acessórios comunicativos, e
sim, a verdadeira estrutura comunicativa e estética de um filme, determinando,
muitas vezes, o sentido da história filmada. (NAPOLITANO, 2003, p.7).

Tal como realça Machado (2006), a Sétima Arte é capaz de ensinar muitas li-
ções ‘no escurinho do cinema’ (ou da sala de projeção, na escola), pela força das
imagens e pela multiplicidade de recursos técnicos de que se utiliza – o roteiro,
a cenografia, a música, a interpretação dos atores, os efeitos sonoros e visuais, os
figurinos, a direção de arte são apenas alguns dos tópicos organizados para dar
vida e argumentos que consolidam a proposta de uma obra cinematográfica.
Um filme com potencial expressivo para atingir diretamente a sensibilidade
dos alunos em relação a certos valores/atitudes ou temas relevantes para estudo
pode revelar, talvez, como sugere Morán (2000), o uso mais importante do cine-
ma como recurso de ensino: despertando a curiosidade e a motivação, facilita o
desejo de aprofundar as questões levantadas, abala possíveis resistências e pre-
conceitos construídos a partir do senso comum e estimula a vontade de aprender.
Outra função capital para a escolha de um filme no ensino é a da ilustração
dos conteúdos em desenvolvimento – ajudando a compor cenários desconhecidos
dos alunos, o cinema é um manancial inestimável de contextualização do tempo
e do espaço, no passado, no presente ou no futuro. O trabalho com os fatos e
personagens que compuseram a história da humanidade, ou a indicação da loca-
lização contextualizada de povos e países distantes, serve não só ao óbvio ensino
de História e Geografia, como permite a inserção de outros e variados elementos
passíveis de exploração por inúmeras disciplinas curriculares, na medida em que
contextualiza, ilustra e ‘dá vida’ ao conteúdo de ensino – sempre tendo em vista a
necessidade de reconhecer (e, portanto, advertir) que o filme é uma obra autoral,

73
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

sempre baseada na visão parcial de seus realizadores. Daí porque seja importante
lembrar que o professor deve chamar a atenção para o fato de que “Todo passo,
no processo de análise de materiais audiovisuais, envolve transladar. E cada trans-
lado implica decisões e escolhas. Existirão sempre alternativas viáveis às escolhas
concretas feitas” (ROSE, 2002, p.343). Assim, o que é deixado de fora pode ser
tão importante quanto o que foi incluído na obra – e essa, provavelmente, seja
uma das características que confere tanta força mobilizadora à discussão reflexiva
deste tipo de material.
Apresentando o registro da realidade em detalhes preciosos (como nos docu-
mentários), ou (re)construindo essa realidade pela ficção, o cinema é uma mídia
ímpar para a ilustração do mundo já vivido pelos homens e para as possibilidades
de antever sua vida, numa articulação permanente entre o ‘fato’ e o ‘ficto’, capaz
de (re)dimensionar a percepção dos alunos e enriquecer o trabalho pedagógico
em todas as áreas do conhecimento.
A terceira função a destacar, aqui, como sugestão para o uso didático do
cinema, é a sua possibilidade de ser proposto como recurso de fixação e/ou
integração do conteúdo de ensino, isto é, para formar ou fixar conceitos em es-
tudo, e/ou para integrá-los sob uma perspectiva mais ampla a questões com que
mantenham algum tipo de relação. Nesse caso, quando aborda adequadamente
alguns dos conteúdos conceituais específicos da disciplina, o filme pode orientar
sua percepção e interpretação na direção desejada: os elementos e modo de ope-
ração próprios da linguagem audiovisual colaboram decisivamente para que cer-
tos conceitos sejam mais compreensíveis, facilitando sua articulação com outros
contextos e situações. A busca de uma abordagem interdisciplinar, tão cara aos
educadores contemporâneos, pode ser estimulada pelo uso criterioso de materiais
fílmicos que a encaminhem – o mediador competente incentivará que os vários
conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais, possivelmente imbricados na
obra selecionada, constituam os ‘fios’ necessários à tessitura de uma compreensão
consistente e plural, desenvolvendo a postura crítica dos estudantes. É justamente
na rede de saberes articulados que o caracteriza, “que o cinema, como instru-
mento e objeto da ação pedagógica, pode atuar na construção da experiência da
significação” (CHAGAS, s/d).
Se associado ao uso do vídeo no ensino (hoje, seu suporte mais comum),
muitas outras funções podem ser atribuídas ao filme com recurso pedagógico.

74
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

As indicadas servem apenas de referência inicial para a exploração didática do


cinema em termos mais generalizados, isto é, pensando-se em abarcar indiscrimi-
nadamente os múltiplos campos de conhecimento que circulam na área da forma-
ção acadêmica. Assim, outras funções, como as de ‘simulação’ ou de ‘produção’
(MORÁN, 2000) estariam relacionadas especificamente ao uso do vídeo e teriam
maior vez e melhor voz, por exemplo, em aulas que envolvessem experimentos
de Física ou Química, ou na preparação profissional de cineastas e jornalistas.
O que é fundamental para o encaminhamento dos procedimentos de avaliação
a serem selecionados, quando do uso do cinema sob o aspecto didático, é que o
professor esteja consciente dos fins educativos a perseguir, podendo, a partir daí,
levantar alternativas que, mesclando estas diferentes funções – ou, quem sabe,
criando outras, diferentes – sejam capazes de responder às necessidades de seu
projeto de ensino. Seja para informar, motivar, ilustrar, sensibilizar, fixar ou refor-
çar conteúdos, facilitar a compreensão ou aplicar os conteúdos trabalhados sob
uma nova perspectiva de expressão, o filme é um recurso que pode ser didatica-
mente aproveitado e, por isso, sua utilização em sala de aula precisa ser avaliada.
A avaliação da aprendizagem, como já se indicou, é processo complexo que
se desdobra em variadas estratégias de ação, conforme as características e espe-
cificidades correspondentes à área e/ou disciplina em que se desenvolve, e tem
como ‘pedra de toque’ a consciência de que o encaminhamento das finalidades
educacionais pretendidas deve ser avaliado ao longo do processo de ensino, tanto
quanto se vai avaliar o produto final que deve ser alcançado.
Sob esse enfoque, Zabala (1998) sugere uma estratégia de avaliação que seja
inicial/reguladora, desdobrando-a processualmente até uma final/integradora (o
autor usa esses termos, ao invés dos já convencionais ‘avaliação diagnóstica’,
‘avaliação formativa’ e ‘avaliação somativa’, por entender que explicam melhor as
características de adaptação e adequação inerentes ao processo de acompanha-
mento do progresso do ensino, respondendo melhor ao por que avaliar?).
Assim, ao abordar o que avaliar, quando propõe a avaliação de fatos, con-
ceitos, procedimentos e atitudes, o autor indica que os conteúdos conceituais
podem ser mais bem avaliados quando se oportuniza também a expressão verbal,
e não apenas a escrita (tal como se percebe que, ao falar, as pessoas necessitam
do gestual, das mãos, para se explicarem melhor, ‘falar sobre’ algo permite maior
organização e compreensão da mensagem). Por isso, a exibição de um filme, com

75
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

qualquer das funções que se tenha previamente definido, pode ser mais bem
aproveitada se encaminhar um debate ou discussão posterior.
Para tanto, um bom roteiro de questionamentos, estruturado de modo a fazer
emergir os conceitos envolvidos, pode fazer a diferença, na boa exploração di-
dática de materiais fílmicos. Respondidas, primeiro, pelo professor, várias dessas
questões podem integrar um questionário a ser entregue aos alunos, preparando
o debate coletivo. Dentre as sugestões que Mandarino (2002) e Morán (2000)
apontam para o uso do vídeo em sala de aula, alguns tópicos podem ser reconfi-
gurados para o uso do cinema com este propósito, independentemente da função
priorizada:

• quanto ao formato: em que se baseia o interesse pelo filme? No tema abor-


dado? Na forma como foi tratado esse tema? O filme tem apelo suficiente
para criar expectativas, despertar o interesse do espectador?
• quanto à mensagem: o tema é apropriado à linguagem audiovisual? O que
a possibilidade de visualização acrescenta ao enfoque de estudo deste
conteúdo? O tratamento dado ao conteúdo é atualizado? A organização da
narrativa audiovisual está ao alcance do nível de compreensão dos alunos?
A abordagem do tema está em consonância com o projeto educativo da
disciplina/da instituição? Há outros enfoques, tendências, abordagens que
devem complementar/aprofundar ou discutir/criticar a proposta apresen-
tada pelo filme? O conteúdo do filme permite uma articulação interdisci-
plinar? As informações associadas ao conteúdo de ensino são suficientes
(ou insuficientes), simples (ou complexas), adequadas (ou inadequadas),
precisas (ou vagas), aprofundadas (ou superficiais)?
• quanto à linguagem: a narrativa prioriza as imagens ou a linguagem verbal?
A obra utiliza adequadamente os recursos da linguagem audiovisual? Uti-
liza efeitos especiais para reforçar a proposta? Os elementos da linguagem
audiovisual (imagens, efeitos sonoros e visuais, música incidental, diálo-
gos, tomadas de cena) são dosados e se complementam de forma eficaz?
Os diálogos utilizam linguagem coloquial, formal, científica, regional? A
estética das imagens atrai e é compreensível (ou é de difícil interpretação)?

Há ainda outros e muitos pontos a considerar, porém, como uma peça au-
diovisual é “um somatório de diversos elementos que devem funcionar de forma

76
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

integrada” (MANDARINO, 2002, p.5), ou, dito de outro modo, o significado de um


filme é o seu todo, “amálgama desse conjunto de pequenas partes, em que cada
uma não é suficiente para explicá-lo, porém todas são necessárias, e cada uma
só tem significação plena em relação a todas as outras” (ALMEIDA, 2001, p.29), a
pluralidade de questões passíveis de exploração didática, no uso do cinema, está
diretamente relacionada às condições de articulação crítica entre este todo e as
partes que o compõem – quanto maior a familiaridade do professor com o cine-
ma como ‘artefato cultural’, como campo de produção (e reprodução) da cultura,
maiores as possibilidades de reconhecimento do seu valor pedagógico.
No que respeita especificamente à avaliação dos conteúdos procedimentais,
novamente Zabala (1998) esclarece que os procedimentos só podem ser avaliados
enquanto um saber fazer e, por isso, é necessária uma avaliação sistemática em
situações naturais ou artificialmente criadas – talvez poucas sejam as situações em
que um filme comercial possa ser um ‘passo a passo’ para a realização de deter-
minada operação procedimental, mas, de qualquer modo, sempre é possível fazer
analogias com outras concepções, métodos, técnicas e resultados que já foram
desenvolvidos e/ou obtidos em determinadas áreas do campo da ciência e da
tecnologia, caso uma peça audiovisual dessa natureza esteja disponível para o uso
em sala de aula. Mais uma vez, um roteiro objetivo do que deva ser observado, e
uma discussão posterior que articule estes procedimentos aos definidos pelo pro-
jeto curricular, podem auxiliar o encaminhamento da compreensão dos conteúdos
procedimentais em questão.
É fundamental lembrar, aqui, talvez por óbvia, a consideração de que a avalia-
ção do uso de materiais audiovisuais estará sempre associada ao uso de materiais
complementares, já que a variedade de recursos de ensino é um dos pontos de
referência essencial de uma prática docente qualificada – como ressalta também
Mandarino (2002, p.3), o filme “deve ser complementado pela apresentação dos
conceitos/conteúdos na forma textual. O texto pode ser mais linear, detalhado
e acrescido de exercícios de fixação e aplicação”, o que significa que sob essa
perspectiva também será avaliado, num processo de enriquecimento mútuo. Com
base na mesma autora, destaque-se que o filme “tem a capacidade de aproximar
o conhecimento científico do cotidiano, fazendo com que algumas concepções
do senso comum passem a se fundamentar nas ciências” (idem) e, nesse sentido,
pesquisas adicionais em materiais escritos – livros, revistas científicas, pesquisas
publicadas – realizados a partir de conceitos ou procedimentos apresentados por

77
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

um filme vêm reforçar a construção do conhecimento, se a mediação do professor


encaminhar os procedimentos de avaliação adequados.
Por fim, quanto à avaliação dos conteúdos atitudinais a serem trabalhados com
o uso de filmes como recurso de ensino, vale enfatizar, em primeiro lugar, que
estes implicam basicamente a observação, pelo professor, das atitudes dos alunos
em diferentes situações, dentro e fora da sala de aula, o que confere extraordinária
complexidade a essa questão. Zabala (1998) levanta a possibilidade de as pessoas
menosprezarem a percepção da formação de atitudes enquanto um ‘conteúdo’,
pelo fato de não poderem ser quantificadas: não é possível traduzir em números
a extensão do interesse por algo ou o respeito conferido a determinado valor.
Utilizando a metáfora do médico, que não possui instrumentos para medir dor,
enjoo ou estresse, mas que, nem por isso, deixa de diagnosticar e medicar, o autor
destaca o papel formador do currículo escolar, no sentido do trabalho com valo-
res e atitudes. Mesmo dispondo das condições de observação direta e constante
do comportamento dos alunos para ‘diagnosticar’ o nível de internalização dos
valores que se dispõe a desenvolver, o professor necessita selecionar atividades
de ensino que lhe permitam ampliar o espectro desta observação, no intuito de
corrigir possíveis distorções, ‘prescrevendo’ as orientações correspondentes. E,
como a avaliação é um processo cumulativo e compreensivo, variar tais ativida-
des, criando situações diversificadas que permitam a emergência das opiniões e
dos posicionamentos dos alunos face aos temas polêmicos que inevitavelmente
perpassam o cotidiano da escola, numa abordagem transversal que afeta todas as
áreas e disciplinas, passa a ser uma iniciativa necessária às finalidades formadoras
de uma instituição que se denomina ‘educativa’.
Entre as múltiplas situações de ensino que podem ser organizadas com essa
finalidade, talvez o cinema seja o recurso mais efetivo e eficaz, no trabalho com
conteúdos atitudinais: se o filme, em si mesmo, ancorado nos critérios que o
selecionaram, tem na sua configuração técnica e artística o poder de mobilizar
emocionalmente, sensibilizando o aluno – e o ‘acolhimento’ ou ‘recepção’ é, para
Bloom et al. (1974), o primeiro passo para a internalização de um valor – as ativi-
dades de ensino relacionadas à exibição deste filme têm que estar voltadas para a
reflexão individual e a discussão coletiva dos valores enfocados pela obra.
Novamente, questões tais como as apontadas por Morán (2000) e Mandarino
(2002) podem servir de base para um roteiro preliminar de discussão: quais as

78
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

preocupações e práticas sociais que podem ser identificadas no filme? Há relação


com a vida cotidiana? As práticas sociais apresentadas são do conhecimento dos
alunos e devem ser exploradas? De que forma? As práticas sociais são enfocadas
de modo preconceituoso? Como são apresentadas as relações interpessoais (de
parentesco, profissionais, de amizade, de amor, de afeto, etc.)? Como são tratadas
as questões que envolvem atitudes e valores sociais? Qual a ideologia subjacente
ao programa? Que mensagens não são questionadas? Quais os pressupostos ou
hipóteses aceitos de antemão, sem discussão? Quais os valores afirmados/negados
pelo filme? Como são apresentados o trabalho, a justiça, o amor, o mundo? Como
cada aluno julga esses valores? Em que medida é possível concordar com o sis-
tema de valores envolvido e/ou exposto na narrativa? Na esteira dessa proposta,
vale referir que, em especial, no trabalho com alunos adolescentes e jovens, o
professor precisa levar em conta

algumas características dessa faixa etária escolar: aumento da interdependência


grupal, maior interesse pelo sexo oposto, redefinições identitárias,
questionamento do sentido existencial e social da vida e do mundo, primeiras
exigências da vida civil (elementos que variam de intensidade conforme o
grupo socioeconômico em questão). Estas características gerais, aliadas a
maior capacidade de abstração, culminando em raciocínio operatório formal,
podem permitir ao professor uma abordagem mais aprofundada e um maior
adensamento das discussões possibilitadas pelos filmes. Além disso, a própria
seleção dos filmes pode ser feita com maior ousadia. Certos temas e problemas
de ordem existencial, psicológica, sociológica e ética podem e devem ser
abordados, pois os alunos desta fase geralmente oscilam entre o tédio mortal
perante a vida e a busca de excitação e posicionamento radicais perante as
coisas e pessoas do mundo. Normalmente, o cinema mais direcionado ao
público adulto tem maior capacidade de perturbar o espectador adolescente, e
não é exagero afirmar que, em alguns casos, é particularmente responsável por
um processo de formação de personalidade e valores morais e ideológicos.
Mais um motivo para a escola trabalhar seriamente com esse tipo de fonte.
(NAPOLITANO, 2003, p.27)

Enfim, trabalhar com filmes em sala de aula pode ser extremamente gratifican-
te, pois, se bem planejado e encaminhado, esse trabalho invariavelmente tende a
superar as expectativas dos professores, em relação aos resultados alcançados. Fil-
mes exibidos por inteiro, quando o tempo disponibilizado pelos períodos de aula

79
CÔRTES, H. S.  —   O uso pedagógico do cinema: estratégias para explorar e avaliar filmes em sala de aula

for o adequado para permitir a exploração imediata (o que se revela mais fácil nas
grades curriculares dos cursos de formação superior), “são projetados com início,
meio e fim, e a construção de seu sentido depende da construção individual que
o espectador faz antes, durante e depois de suas projeções” (CARVALHO, 2007,
p.50-51). Por isso, se o professor necessita planejar cuidadosamente a exibição
e as atividades de exploração didática deste material, baseando-se nos objetivos
traçados, a avaliação dessa estratégia de ação deve ser igualmente criteriosa, pois

a avaliação é a guardiã dos objetivos. Os objetivos estão, em parte, diluídos,


ocultos; mas a avaliação é sistemática (mesmo quando informal) e age em
estreita relação com eles. No cotidiano das escolas, os objetivos estão expressos
nas práticas de avaliação. (FREITAS, 2002, p.58).

Práticas de avaliação consistentes, portanto, estreitamente vinculadas às finalida-


des educativas, devem ser diversificadas, abrindo-se espaço para o uso articulado
de múltiplos recursos de ensino que possam encaminhá-las. A ‘leitura’ e discussão
decorrentes da exibição de um filme podem ser reconfiguradas numa produção
textual escrita e/ou num seminário integrador planejados em torno da mesma temá-
tica, e mesmo a famigerada ‘prova’ (objetiva ou dissertativa), não só pode ser um
instrumento de análise crítica dos conteúdos desenvolvidos, como pode buscar ins-
piração nas narrativas audiovisuais que fizeram parte do estudo desses conteúdos.
Cinema e educação se articulam na origem do processo comunicativo que os
engendra, e filmes são grandes ‘parceiros’ do ensino. Para Carmo (2003, p.25),
“Educar pelo cinema ou utilizar o cinema no processo escolar é ensinar a ver di-
ferente (...) Aprender a ver cinema é realizar esse rito de passagem do espectador
passivo para o espectador crítico”. Assim, embora os filmes possam ser muito
diferentes em suas propostas – já que, como ressalta Napolitano (2003), além de
integrantes do complexo da comunicação e da cultura de massa, fazem parte da
indústria do lazer, podendo ainda constituir obra de arte coletiva e exemplo de
sofisticação técnica –, todos representam uma oportunidade educacional, pois

podem incentivar os espectadores a estabelecerem relações com recortes da


realidade que os levam a inserir um pouco de ficção em suas vivências ou
a perceber outras possibilidades de percepção de uma mesma realidade. As
imagens e os sons dos filmes tornam-se vivências reais dos espectadores no
momento em que os filmes são assistidos. (CARVALHO, 2007, p.53).

80
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Sob esse enfoque, o cinema, hoje, talvez seja uma mídia insubstituível, con-
centrando em si mesmo a riqueza da linguagem audiovisual no auge de suas
possibilidades como arte e técnica de lidar com as imagens. Também por causa
disso, é necessário

ensinar a morfologia das imagens (como elas se estruturam e como podem ser
transformadas); desvendar a sintaxe das imagens (como elas se relacionam e
podem mudar de sentido); ensinar a gramática da narrativa audiovisual (como
ela fabrica o mais poderoso discurso da história da humanidade): estes são os
desafios. (GERBASE, 1998, p.45)

Vivemos num tempo que é definido por nossa intimidade com as tecnologias e
num mundo que é percebido e editado pelas imagens midiáticas. Essa é a realidade
a partir da qual os agentes educacionais têm que organizar sua ação formativa: assim,
se esse é um mundo dominado pela mídia, “um mundo ‘midiatizado’, a educação tem
que ser, mais do que nunca, o espaço da ‘mediação’, isto é, da articulação reflexiva e
crítica entre esse mundo e as finalidades educativas”. (CÔRTES, 2009, p.52).
Também Carvalho (2007, p.53) enfatiza que “levar o cinema para dentro da
sala de aula significa retirar alguns ‘muros’ que separam as instituições de ensino
superior do mundo que as cerca”. Se a projeção de filmes pode estimular a refle-
xão crítica e o debate sobre os grandes temas contemporâneos que atravessam a
formação acadêmica, discutindo os eventos históricos, políticos, sociais, econômi-
cos e culturais, e fazê-lo de modo a qualificar a formação humana que ambiciona-
mos desenvolver através de nossa atuação, há que construir as condições de uma
mediação pedagógica à altura deste desafio.

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83
7. DIFERENTES FORMAS DE
EXPRESSÃO DA APRENDIZAGEM
Valderez Marina do Rosário Lima
Marlene Correro Grillo
João Batista Siqueira Harres

Muito se tem escrito e estudado sobre a avaliação da aprendizagem sem, no


entanto, contribuir suficientemente para a redução de equívocos conceituais ou
operacionais presentes na prática avaliativa. Um equívoco bastante recorrente é a
redução da concepção de avaliação a provas ou descrições estatísticas, característi-
cas de uma avaliação quantitativa, ou seja, a modalidade de avaliação cujo resultado
é expresso predominantemente pela média dos resultados obtidos pelos alunos
nas provas. Neste sentido, tal modalidade atende a uma tradição que deixa de lado
outros procedimentos ou recursos com iguais ou melhores possibilidades de se
obterem informações sobre a aprendizagem dos alunos. A utilização de diferentes
procedimentos que não apenas as provas, além de melhor atender às singularidades
dos alunos, pode fornecer outros tipos de informações, ampliando o quadro repre-
sentativo do desempenho dos alunos, e pode, ainda, suprir eventuais limitações de
modalidades avaliativas empregadas. Um único tipo de procedimento de avaliação
ou mesmo vários podem cobrir apenas parcialmente os complexos fenômenos que
caracterizam a avaliação. Para que os procedimentos, incluídas aí as provas, possi-
bilitem outras formas de expressão da aprendizagem, o professor pode valer-se de
atividades didáticas familiares aos alunos, desenvolvidas no cotidiano da aula.
Nessas situações, recomenda-se que tais atividades tenham uma apresentação
clara e que sejam atrativas para o aluno. Clareza diz respeito ao que é apresen-
LIMA, V. M. R. et al.  —   Diferentes formas de expressão da aprendizagem

tado; atratividade, ao aspecto emocional do modo como o professor propõe a


tarefa. Clareza não é nada sem a precisão do conteúdo, e presume-se que os pro-
fessores o dominem adequadamente (LOWMAN, 2004). As tarefas com uma jus-
tificativa clara, coerente com os objetivos da disciplina e os dos próprios alunos,
e ainda familiares a eles (tendo-se o cuidado de não ser uma mera reprodução
de um trabalho já vivenciado em aula), serão facilmente acolhidas e, aos poucos,
ajustar-se-ão aos desejos dos alunos.
Mesmo sendo utilizados procedimentos conhecidos, os alunos precisam ser
informados pelo professor sobre a ocorrência da atividade avaliativa e sobre os
critérios1 levados em consideração para a atribuição de um valor que se tornará
um componente da nota final. Tal informação é necessária para evitar a “prova
surpresa”, que distorce a finalidade da avaliação.
Dessa forma, a atividade avaliativa é entendida pelo aluno como um momento
intrínseco ao processo de aprendizagem e não algo externo a ela, muitas vezes
acompanhado de ansiedade e de componente aversivos.
As avaliações em aula promovem o envolvimento dos estudantes e fornecem
informações atualizadas ao professor sobre o que eles já sabem do conteúdo e o
que estão aprendendo. Angelo e Cross (1993) recomendam que os professores
interessados em promover diferentes modalidades de avaliação sejam criativos e
inovadores: “adapte, não adote!” Tais professores se tornarão melhores mestres se
prestarem atenção ao comportamento dos alunos, pois, segundo os autores citados,
esse procedimento oferece formas de olhar para dentro da mente dos estudantes.
Numa situação específica, o professor utiliza procedimentos rotineiros – mas
não desinteressantes – numa perspectiva de avaliação formativa, com a finali-
dade precípua de orientar os processos de ensino e de aprendizagem. Significa
dizer que podem ser identificadas modificações no desempenho do aluno nos
aspectos tanto cognitivos quanto procedimentais e atitudinais. Tais procedimen-
tos diferem entre si pela adequação às tarefas propostas, não havendo entre elas
hierarquia de valor. Cabe ao professor selecionar, entre uma gama de procedi-
mentos disponíveis, aqueles que melhor se ajustam à turma de alunos, aos obje-
tivos, à natureza da tarefa e à finalidade da avaliação. Entre tais procedimentos,
são apresentados neste texto, de forma resumida, produção escrita, exposição

1
  Maiores esclarecimentos sobre o tema são encontrados no texto “Critérios de avaliação a serviço
da aprendizagem” na presente publicação.

86
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

oral, problematização, estudo de caso, mapa conceitual, portfólio e diário de


aula. Deixa de ser citada a prova individual por ser este tema bastante aprofun-
dado nos capítulos que seguem.

Procedimentos rotineiros, mas interessantes

A produção escrita em aulas universitárias associa-se, de modo geral, a even-


tos pontuais como redação de trabalho de conclusão, ou de tarefas específicas
da área de conhecimento. No entanto, as opções de produção escrita não se es-
gotam aí e devem ser incentivadas, pois favorecem a organização das ideias dos
alunos em distintos momentos do processo de aprendizagem e fortalecem os ar-
gumentos por eles construídos, num movimento favorecedor da apropriação dos
conhecimentos. Dada a importância desta atividade, Lowman (2004) recomenda
a inclusão de produção textual na rotina das aulas e classifica as tarefas escri-
tas em informais e formais. As primeiras oportunizam ao aluno a sistematização
das aprendizagens realizadas sobre os temas trabalhados em aula. Em vez de o
professor apresentar um material pronto, impresso, ele pode solicitar, mediante
orientações claras, que os alunos escrevam um texto sobre o que aprenderam a
respeito do assunto abordado. Uma forma de avaliação dessa atividade é solicitar,
ao final da aula, que os alunos escrevam, em dois ou três minutos, uma breve
observação sobre um tópico da aula que mais interessou, ou o que eles gostariam
de aprofundar, ou, ainda, o que já era conhecido sobre o tema; etc. É o conhecido
ensaio relâmpago. Em turmas mais iniciadas, pode-se ainda solicitar que apresen-
tem argumentos justificando as respostas à solicitação do professor.
Redações breves efetuadas em aula podem ser lidas aos colegas para promo-
ver comentários – orais ou escritos – ou, ainda, entregues ao professor para que,
após a análise, este indique os pontos que precisam de aprofundamento. Outras
modalidades de produção escrita informal são a organização de ideias sobre um
texto lido, o fichamento de leituras realizadas com a finalidade de complementar
estudos em aula, a criação de situações-problema e/ou um texto explicativo sobre
a melhor forma de resolvê-las.
Entre as tarefas escritas formais encontram-se relatos de visitas efetuadas, por
exemplo, a fábricas, museus, empresas jornalísticas, escolas. Relatórios e projetos

87
LIMA, V. M. R. et al.  —   Diferentes formas de expressão da aprendizagem

de pesquisa desenvolvidos na disciplina, resumos de seminários, relatórios de


experiências científicas e, também, resumos gerados pela busca de informações
sobre assuntos que o professor considere importantes auxiliam os alunos a reco-
nhecerem a utilidade da produção escrita, exercitando a curiosidade intelectual.
Independentemente do caráter da atividade, seu sucesso reside na clareza que
professor e alunos têm sobre os propósitos de sua realização, sobre os critérios de
avaliação e sobre o entendimento do texto produzido como um objeto de estudo,
auxiliar e provisório. É imprescindível, ainda, na produção escrita, que o aluno
perceba o para que está escrevendo. Os critérios serão definidos pelo professor
em colaboração com os alunos, considerados os objetivos das atividades.
Embora o ideal seja a produção individual, reconhece-se a dificuldade de o
professor fazer a leitura do material e devolvê-lo ao aluno ainda em tempo hábil
de voltar ao tema. Por isso, para que a exiguidade de tempo não impeça a realiza-
ção da tarefa, sugere-se que sejam efetuadas em aula redações breves, até mesmo
em duplas, que podem ser lidas aos colegas e por eles criticadas.
Alguns professores recomendam que se reserve um tempo da aula para que os
alunos, em pequenos grupos, se familiarizem com critérios de avaliação, aplican-
do-os a uma mostra de trabalhos. Pode parecer perda de tempo, mas esta ativida-
de tem um retorno produtivo, contribuindo para que o aluno atribua significado
e credibilidade à avaliação (MADIGAN; BROSAMER, 1991).
A exposição oral, entendida como uma comunicação pública de saberes es-
pecíficos de uma área de conhecimento, é reconhecidamente uma competência
indispensável para que o sujeito participe de forma plena da vida social. Neste
sentido, seu exercício durante a formação universitária é importante e desejável.
Trata-se de uma competência que mobiliza saberes de ordem conceitual, pro-
cedimental e atitudinal. Dentre os saberes de natureza conceitual, encontram-se
fatos, conceitos e princípios afetos à temática estudada. A busca de informações
em diferentes fontes, selecionando-as conforme o propósito da tarefa, a gestão do
conteúdo informativo, a estruturação adequada e coerente do tema a ser comu-
nicado são saberes procedimentais acionados na atividade de exposição oral. A
autocrítica, a aceitação da crítica, o respeito à opinião dos colegas, o saber ouvir
e a tomada de posição sustentada por argumentos são algumas aprendizagens
de caráter atitudinal envolvidas em tarefas de comunicação oral (SCHNEUWLY;
DOLZ, 2004).

88
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Apresentação em seminários, divulgação de resultado de pesquisa de campo


e comentários ou síntese de leitura realizada ou de filme assistido são, ao mesmo
tempo, estratégias para os estudantes exercitarem a oralidade e oportunidade para
os professores obterem informações sobre as aprendizagens. A exposição oral
quando utilizada com a finalidade avaliativa requer que o professor organize uma
ficha individual, contendo os critérios essenciais, na qual ele registrará o desem-
penho de cada aluno. Esta ficha, ainda segundo Madigan e Brosamer (1991), será
mais bem aceita se for elaborada em acordo com a classe, o que familiariza os
alunos com os critérios que, mais tarde, serão aplicados às suas tarefas, evitando
ao mesmo tempo a subjetividade do julgamento.
A problematização e o estudo de caso2 são procedimentos didáticos bastan-
te utilizados pelos docentes para promoção da aprendizagem. Embora com deno-
minações distintas, tanto um como outro tratam de situações problemáticas que
mobilizam o estudante a utilizar seus conhecimentos em novas situações. Para
que tal ocorra, é necessário que se considerem algumas condições: em primeiro
lugar, a situação proposta necessita ser verossímil, apresentando dados relevantes
e riqueza de informações que de fato auxiliem a encontrar soluções adequadas.
Em segundo lugar, uma parte dos conceitos envolvidos precisa estar em estudo
ou já ter sido teoricamente estudada no momento da proposição, pois é lançando
mão da teoria que o aluno encontrará soluções para o desafio proposto (WAS-
SERMANN, 1994). Em terceiro lugar, as diferentes possibilidades de resolução dos
problemas devem ser amplamente discutidas, tornando-se, para aqueles que apre-
sentaram dificuldades, uma oportunidade de perceberem os pontos frágeis – ou
inadequados – de seu raciocínio.
A problematização está, em geral, associada à área das ciências exatas, en-
quanto o estudo de caso identifica-se mais com as ciências humanas. No entanto,
eles possuem a mesma essência, já que em ambos os casos o ponto de partida é
uma situação real – ou muito próxima do real – cuja solução exige do aluno mais
do que a memorização de conceitos ou descrição de acontecimentos. Tal ativi-
dade exige amplo exame da situação, intercâmbio de experiências, inclusão de
dados interdisciplinares, mesmo que as situações sejam exploradas em áreas es-
pecíficas. Na problematização, o problema não é formulado a priori, mas emerge

2
  Maior aprofundamento desses temas encontra-se em LIMA, V. (Org.) A gestão da aula universitária
na PUCRS. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.

89
LIMA, V. M. R. et al.  —   Diferentes formas de expressão da aprendizagem

da realidade estudada, baseada em trabalhos de campo, leituras de textos, jornais,


revistas, relatos de pesquisas. A situação problemática não é proposta ao aluno,
porém, ao conhecer a realidade, ele vai observá-la, questioná-la, confrontá-la com
a teoria e criar possíveis alternativas de solução. Assim, o saber acadêmico, objeto
do estudo, ganha significado pela possibilidade do relacionamento da teoria com
a situação prática (FREITAS; GESSINGER; LIMA, 2008).
No estudo de caso, a situação problemática é apresentada sob forma de nar-
rativa, diálogo, descrições, filmes, ou outras. Uma das características do proce-
dimento é a possibilidade de os participantes realizarem variadas análises com
diferentes perspectivas e experiências particulares, sem a obrigatoriedade de che-
garem a uma única e convergente solução.
Abstraindo pequenas variações na operacionalização, observa-se que a proble-
matização e o estudo de caso possuem semelhanças. Ambos requerem a formu-
lação de questões instigantes e desafiadoras. É preciso que os questionamentos
levem o aluno a refletir profundamente sobre o problema apresentado. Questões
bem elaboradas, segundo Wassermann (1994, p.80), são as que convidam “em
lugar de exigir; são claras e inequívocas; não são abstratas demais e nem, tam-
pouco, sugestivas demais; evitam a escolha entre o sim e o não, bem como o uso
excessivo do porquê”. Ambos, ainda, estimulam a participação grupal, o respeito
de pontos de vista divergentes e a aceitação do consenso, bem como a produção
de ideias criativas. As características desses dois procedimentos exigem do aluno
pesquisas, análises e uma avaliação precisa do trabalho. Por isso, a crítica e a
qualidade do relacionamento grupal podem comprometer a autoestima do aluno.
É importante, então, que o professor, antes de fazer a crítica, expresse o reco-
nhecimento da dedicação do aluno à tarefa, o que o predispõe à aceitação das
considerações a serem feitas e contribui para que a maioria da classe se beneficie
também com mais essa modalidade de avaliação. Ao fazer a apreciação da tarefa,
sugere-se que o professor inicie destacando os aspectos positivos para, posterior-
mente, comentar as fragilidades.
Os mapas conceituais são representações gráficas de conjuntos de conceitos
organizados sob a forma de diagramas e têm como especificidades tornar eviden-
tes os significados atribuídos a conceitos e esclarecer as relações existentes entre
os mesmos, em determinada área de conhecimento, de um curso, de uma discipli-
na, de um artigo, de uma palestra, entre outras. Os mapas são sempre elaborações

90
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

pessoais que constituem outra possibilidade de o aluno expressar suas aprendiza-


gens sobre determinado tema ou assunto. Por serem uma representação pessoal,
não existe um único mapa conceitual considerado correto, podendo mesmo haver
diferenças entre mapas sobre um mesmo conteúdo.
Na avaliação da aprendizagem, eles têm sua utilização reconhecida. Há que
se ter presente que, ao analisá-los, o professor realiza uma avaliação qualitativa,
identificando as aprendizagens significativas e as dificuldades mostradas pelo alu-
no, o que ajuda o professor a melhor compreender a forma como ele organiza
suas ideias. Em vez de atribuir uma nota ou conceito ao mapa do aluno, ele
analisará evidências de aprendizagem significativa, utilizando as informações que
o mapa oferece, no sentido de reorientar a aprendizagem, por meio de um pare-
cer. Portanto, não se pode pretender avaliá-los com a mesma precisão dos testes
objetivos, pois uma mesma solicitação do professor pode desencadear respostas
diferenciadas mas cabíveis ou mesmo incorretas, e aí tem ainda mais sentido o
parecer.
Outras estratégias de ensino e aprendizagem utilizando mapas conceituais po-
dem, também, ser utilizadas para avaliação da aprendizagem do aluno, tais como:
• explicitar relações entre conceitos apresentados em mapas;
• analisar e justificar diferenças e/ou semelhanças entre mapas elaborados
sobre uma mesma fonte de conhecimento;
• desdobrar conceitos inclusivos sucessivamente em conceitos mais especí-
ficos.

Essas são algumas sugestões apresentadas como exemplo, podendo ser utili-
zadas ou adaptadas, dependendo das especificidades de cada situação de apren-
dizagem. Em cada caso, o professor deverá tornar claros, aos alunos, os critérios
de avaliação.
O portfólio é um instrumento que possibilita ao aluno expressar as aprendi-
zagens realizadas durante um determinado período de tempo. Trata-se de uma
seleção feita pelo aluno de materiais significativos e que representam a sua traje-
tória na construção de conhecimentos. Pode incluir ensaios, relatórios, resenhas,
fichamentos de textos, gráficos, gravuras, mapas, fotografias, recortes, entre ou-
tros, e pode ser construído em meio eletrônico, utilizando-se, no caso específico
do Moodle, os recursos “Diário” ou “Blog”, entre outros.

91
LIMA, V. M. R. et al.  —   Diferentes formas de expressão da aprendizagem

Ao selecionar os materiais relevantes que farão parte de seu portfólio, o aluno


é levado a refletir sobre as aprendizagens realizadas ao longo do período conside-
rado, bem como sobre os avanços e as dificuldades percebidas. Assim, a reflexão
necessária para sua construção contribui não só para o desenvolvimento da auto-
nomia do aluno, mas também para que ele tome consciência das aprendizagens
realizadas, refletindo sobre seus processos mentais e desenvolvendo a capacidade
de se autoavaliar, numa atividade de metacognição. Cabe destacar a importância
de que o professor acompanhe o percurso de elaboração do portfólio, fazendo as
intervenções que julgar convenientes para qualificar o processo.
O diário de aula constitui outro instrumento que, além de permitir a expres-
são das aprendizagens realizadas pelos alunos ao longo de um período, contribui
para desenvolver a capacidade de autoavaliação, na perspectiva formativa. Trata-
se do registro da aula realizado pelo aluno, no qual ele acrescenta às anotações
usuais acerca dos conteúdos desenvolvidos, suas reflexões pessoais através de
comentários, questionamentos, impressões, emoções, superando assim o registro
copiado em favor de um registro refletido.
A entrega do diário ao professor ao longo do semestre, e não apenas ao final,
permite acompanhar a evolução da aprendizagem do aluno e perceber a sua vi-
são acerca da aula, o que possibilita rever a ação pedagógica, fazendo os ajustes
necessários para qualificá-la. A devolução ao aluno com as anotações feitas pelo
professor, por sua vez, permite rever a trajetória e buscar novos caminhos.
A avaliação do Diário de Aula e do Portfólio tem especificidades que a
diferencia da avaliação dos demais procedimentos didáticos. Trata-se de uma
avalição qualitativa que tem, em sua origem, como objetivo maior a reflexão
do aluno sobre sua aprendizagem, aproximando-se da metacognição3. A análise
periódica do Diário de Aula e do Portfólio pelo professor é acompanhada de
comentários escritos, alimentando o diálogo com o aluno. É por meio desse
diálogo que o professor aponta o que é relevante no material analisado, o que
poderia ser aprofundado e encaminha a continuidade da produção do aluno.
Em ambos os casos, a avaliação é expressa por parecer descritivo e pode con-
tribuir para a avaliação global da aprendizagem do aluno, a partir do consenso
entre o professor e o grupo.

3
  Maiores esclarecimentos sobre o tema são encontrados no texto “Autoavaliação: por que e como
realizá-la?” na presente publicação.

92
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Os trabalhos coletivos são outro aspecto a explorar quando se pensa em


formas de expressão da aprendizagem. Quando bem encaminhados, contribuem
para a formação do estudante por permitirem que ele vivencie situações de traba-
lho em equipe, aprenda a partilhar tarefas e negociar consensos, desenvolvendo,
ainda, o senso de comprometimento e responsabilidade. As atividades em gru-
po não prescindem da coordenação do professor na orientação da tarefa e no
acompanhamento durante as etapas de desenvolvimento. A avaliação deste tipo
de atividade requer o estabelecimento prévio de critérios, sendo de fundamental
importância que os alunos estejam suficientemente esclarecidos sobre suas atri-
buições na atividade.
Uma dúvida comum quando se propõe trabalho em grupo diz respeito às
aprendizagens efetuadas e ao grau de envolvimento de cada integrante do grupo.
Dentre as estratégias que auxiliam o professor a compreender melhor esses pon-
tos, destaca-se a solicitação de uma breve manifestação individual do aluno ou
produção escrita, se a tarefa de aprendizagem termina naquele mesmo período
de aula. Outra possibilidade seria a reserva de algumas aulas para a organização
da atividade mais extensa a ser realizada em classe, dedicando momentos, em
diferentes etapas do processo, para o grupo expor oralmente os avanços realiza-
dos até ali. Para compreender a aprendizagem de cada componente do grupo,
é adequado solicitar relatórios individuais, ou realizar um teste individual sobre
o tema estudado, o que mostra o reconhecimento das provas individuais como
instrumento necessário para determinadas situações.

Algumas recomendações

As alternativas aqui apresentadas permitem evidenciar a aprendizagem de con-


teúdos conceituais, procedimentais e atitudinais realizada pelo aluno, compreender
a sua trajetória na construção do conhecimento e orientá-lo nessa caminhada. Tais
atividades podem conduzir à atribuição de grau, desde que não seja a primeira vez
que os estudantes entrem em contato com tarefas dessa natureza e que – vale sem-
pre repetir – o professor e os alunos tenham claros os critérios de avaliação.
Por fim, cabe ressaltar que, para fazer uso dos exemplos citados, o professor
precisa identificar qual é o objeto da avaliação e reconhecer que esta definição

93
LIMA, V. M. R. et al.  —   Diferentes formas de expressão da aprendizagem

não ocorre no momento da elaboração do instrumento, mas na ocasião em que


é delineado o planejamento de ensino. O professor deve se perguntar quais são
os conteúdos – conceituais, procedimentais ou atitudinais – importantes a serem
avaliados.
A resposta a essa pergunta dá o rumo da ação docente e, por decorrência,
da seleção e da organização dos instrumentos de coleta de informações sobre a
aprendizagem. É no momento de selecionar os conteúdos representativos de uma
área de conhecimento que o professor identifica os tópicos essenciais a serem
aprendidos pelos alunos, e esta análise direciona a escolha dos instrumentos mais
adequados.

Referências

ANGELO, T. A.; CROSS, K. P.Classroom assessment techniques: a handbook for


college teachers. 2. ed. San Francisco: Jossey-Bass, 1993.
FREITAS, A. L. S. de; GESSINGER, R. M.; LIMA, V. M. do R. Problematização. In:
LIMA, V. M. do R. (Org.). A gestão da aula universitária na PUCRS. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2008.
LOWMAN, J. Dominando as técnicas de ensino. São Paulo: Atlas, 2004.
MADIGAN, R; BROSAMER, J. Improving the writing skills of students in
introductory psychology. Teaching of Psychology, n. 17, p.27-30, 1990.
SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado
de Letras, 2004.
WASSERMANN, S. El estudio de casos como método de enseñanza. Buenos Aires:
Amorrortu, l994.

94
8. QUESTÕES DE PROVA E SUAS
ESPECIFICIDADES
Valderez Marina do Rosário Lima
Rosana Maria Gessinger
Marlene Correro Grillo

A avaliação da aprendizagem é uma das dimensões mais exigentes do com-


plexo processo educativo, pois as informações que ela fornece têm fortes reper-
cussões tanto para o aluno quanto para o professor. É por meio dos resultados
da avaliação que o aluno toma conhecimento do estágio em que se encontra sua
aprendizagem, do significado do esforço realizado ou do que deixou de realizar,
e das consequências que tais fatos acarretam. Igualmente para o professor, a ava-
liação da aprendizagem é de reconhecida utilidade na medida em que permite a
reflexão sobre a prática docente – o exame da coerência entre os objetivos busca-
dos, os procedimentos de ensino utilizados e os resultados obtidos – e orienta a
tomada de decisões pertinentes para a continuidade do ensino.
O entendimento atual de avaliação da aprendizagem reconhece-a como um
processo contínuo e cumulativo e, em razão dessas características, recomenda
com veemência a diversificação de procedimentos para avaliar a aprendizagem
do aluno, não limitando o processo avaliativo apenas a provas. Entretanto, a ação
didática cotidiana mostra ser a prova um instrumento bastante usado, quando não
o único, e, por isso, devem ser observados cuidados especiais na elaboração de
questões, pelo alto valor que lhes é atribuído. Resulta daí este texto.
A elaboração de questões confiáveis exige apoio em conhecimentos teórico-
pedagógicos e em princípios técnicos. A improvisação e a superficialidade que
LIMA, V. M. R. et al.  —   Questões de prova e suas especificidades

muitas vezes subjazem a tais questões podem ser responsáveis pela falta de inte-
resse do aluno, levando-o a responder sem empenho e sem criatividade, utilizan-
do-se de respostas padrão, já conhecidas, repetidas em aula ou encontradas nos
livros didáticos.
O tema deste texto é bastante antigo; as primeiras publicações sobre o assunto,
traduzidas ou de autoria de especialistas nacionais, datam por volta da década de
70 (GRONLUND, 1974; MEDEIROS, 1981; VIANNA, 1978; SILVA; VEIGA NETO,
1977) e continuam válidas até o momento. O que mudou ao longo do tempo foi
o tratamento dos resultados fornecidos por esses estudos, que passam a ser con-
siderados numa perspectiva compreensiva da aprendizagem do aluno, com uma
função predominantemente diagnóstica e formativa, e não classificatória e finalis-
ta, herança de uma racionalidade técnica há muito superada. É nessa ótica que se
espera sejam utilizadas as informações aqui apresentadas.
Como toda prática intencional, a prática educativa exige avaliação de resul-
tados. Somente com o diagnóstico do que de fato foi obtido, professor e aluno
podem orientar-se na organização ou reorganização das respectivas atribuições
que lhes cabem nesse processo. Esse conhecimento pressupõe instrumentos váli-
dos, que identifiquem o objetivo desejado, e precisos, que forneçam informações
fidedignas (MEDEIROS, 1981).
A prova é apenas uma das várias possibilidades de que dispõe o professor para
avaliar a aprendizagem do aluno e, ao mesmo tempo, a própria ação pedagógica, e é
constituída, mais comumente, por dois tipos de questões: dissertativas, também deno-
minadas de discursivas ou de resposta livre, e questões objetivas. As primeiras solicitam
ao aluno a organização e a expressão das próprias ideias, diferenciando-se das segun-
das, as objetivas, que solicitam a identificação da resposta correta a partir da análise
de alternativas plausíveis apresentadas; são as questões de associação, de asserção e
razão, de escolha múltipla e de resposta alternativa ou de completamento e de redação
de uma única resposta curta (uma data, um nome, um acontecimento, um local).
Ambos os tipos – de resposta livre ou objetiva – têm características específicas
que os tornam mais recomendáveis para avaliar determinados objetivos de aprendi-
zagem do que outros. Ao mesmo tempo apresentam vantagens e desvantagens em
relação às situações que se pretende avaliar. Vários autores, como Vianna (1978)
e Medeiros (1981), elaboram uma comparação entre esses dois tipos, em relação a
aspectos diferenciados, o que pode auxiliar o professor a tomar decisões na orga-

96
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

nização do instrumento de avaliação mais adequado. Em relação ao julgamento, as


questões objetivas são mais rápidas e precisas, enquanto as de resposta livre são
mais demoradas, por exigirem a verificação da presença dos critérios estabelecidos
e correndo ainda o risco de influências advindas da subjetividade do examinador.
No que se refere a habilidades solicitadas, as questões objetivas são mais reco-
mendadas para avaliar memorização, conhecimento, compreensão; já as disserta-
tivas são recomendadas para avaliação de habilidades cognitivas mais complexas,
como análise, síntese, julgamento, originalidade, criatividade, entre outras. A ne-
cessidade de maior ou menor amostragem de conteúdo é outro fator determinante
na escolha do tipo de questão. O uso de um grande número de itens objetivos
resulta numa abrangência maior que torna mais representativa a amostragem ob-
tida. O uso reduzido de itens de resposta livre resulta numa cobertura limitada de
conteúdo. Nesse caso, é aumentada a exigência de competência do professor para
elaborar questões que integrem conteúdos e habilidades cognitivas ao mesmo
tempo: são as questões complexas.
Essas considerações mostram que não há um tipo de questão superior a outro.
Existem, sim, diferentes situações de aprendizagem que demandam por sua vez
diferentes instrumentos para avaliá-las. Desde que mantida a coerência com os
objetivos, o professor tem liberdade para decidir sobre o tipo de questão mais
adequado; podem ser, em alguns casos, combinadas questões dissertativas e ob-
jetivas, embora não seja a diversificação de tipos que qualifica uma prova, e sim a
clareza e a precisão do que é proposto e sua adequação aos objetivos. Em princí-
pio, segundo Medeiros (1981), o melhor tipo de prova é a que melhor atende aos
propósitos em vista e permite colher informações mais confiáveis.
Praticamente, há unanimidade entre os autores quanto a reconhecerem ser
desnecessário variar o tipo de questões objetivas numa mesma prova, a menos
que as características dos objetivos ou dos conteúdos o exijam, pois assim se
evita a dispersão do aluno com formas diferentes de respostas. Convém ainda
ter cuidado para não se transformar a prova num mostruário de tipos de ques-
tões, pois cada um deles exige uma modalidade diferente de raciocínio, o que
pode acrescentar uma dificuldade externa à avaliação que se está realizando.
Uma importante recomendação diz respeito à extensão: que não se torne o
momento da avaliação uma prova de resistência física; há que se pensar no tempo
razoável de que dispõe o aluno para realizar a tarefa.

97
LIMA, V. M. R. et al.  —   Questões de prova e suas especificidades

Quadro de referência e níveis de complexidade de


questões

Objetivos claros, observáveis e precisos devem originar instruções igualmente


claras ao aluno. Este, então, terá condições de realizar uma tarefa, sabendo o que
lhe está sendo solicitado e não adivinhando o que o professor pretende com tal
proposição. Orientações como identifique, compare, justifique exigem respostas
de níveis de complexidade diferentes e determinam também diferentes tipos de
raciocínio. É fundamental definir o que avaliar e não apenas como avaliar, tendo-
se preocupação tanto com a validade dos conteúdos selecionados quanto com as
variáveis cognitivas a considerar (SMITH; HUERGA, s/d).
Uma das mais conhecidas sistematizações dessas variáveis cognitivas é a ta-
xionomia de objetivos educacionais, mais conhecida por taxionomia de Bloom
(BLOOM, 1982). Antes de ser um enquadramento prescritivo, pseudotecnicista,
uma taxionomia de objetivos constitui um quadro teórico de referência que orien-
ta o professor na identificação de níveis de complexidade das atividades, tanto de
aprendizagem como de avaliação propostas aos alunos. Serve, ao mesmo tempo,
para orientá-lo na elaboração de questões que avaliem o conhecimento do aluno
e a habilidade cognitiva.
Resumidas por Smith e Huerga (s/d), são apresentadas a seguir as categorias:
Conhecimento, Compreensão, Aplicação, Análise, Síntese e Avaliação, as quais
atendem ao princípio de complexidade crescente.
A categoria Conhecimento trata do armazenamento e da memorização de in-
formações que o aluno mais necessita evocar. Se o professor deseja avaliar noções
específicas, fatos, datas, eventos, fenômenos, regras, fórmulas, ou seja, avaliar a
capacidade de o aluno reter o material estudado, recomenda-se a elaboração de
questões curtas que proponham atividades como listar, definir, identificar, exem-
plificar, nomear, enumerar, entre outras.
Como exemplo, são apresentadas as seguintes raízes ou radicais, que podem
orientar a elaboração de questões de resposta livre ou objetivas.
1. A sentença que melhor define o termo... é
2. Qual o método mais empregado para... ?
3. O efeito do fenômeno... é

98
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

4. Quais as principais características de...?


5. O critério mais empregado para... é
6. Qual o melhor exemplo para o princípio...?
(Vianna, 1978)

A categoria Compreensão representa o primeiro estágio de entendimento, o


que significa que o aluno sabe o que está sendo comunicado e é capaz de fazer
uso desse material, sem necessariamente relacioná-lo com outro ou com uma
nova situação. Nesta categoria são recomendadas atividades de aprendizagem e
de avaliação como interpretação ou representação de gráficos, explicação de es-
quemas, tradução de comunicações, classificação de elementos, resumos, explica-
ções. São exemplos de raízes da categoria compreensão, segundo Vianna (1978):
1. O significado da sentença (ou gráfico ou figura) abaixo apresentada é
2. Uma forma de expressar diferentemente a fórmula (ou equação ou gráfico) é
3. Analisados os dados quantitativos apresentados no quadro abaixo, qual a
extrapolação possível de realizar-se?
4. Qual a teoria que está implícita na seguinte afirmação...?

A categoria Aplicação apresenta um nível mais alto de abstração do que as ca-


tegorias anteriores, pois ela utiliza o conhecimento em situações diferentes das já
conhecidas. Como exemplos de avaliação desta categoria, podem ser apresentadas
questões como: identificar princípios, efeitos, teorias, leis aplicáveis a determinadas
situações, fenômenos, problemas; exemplificar princípios relacionados a situações
específicas; resolver situações-problema aplicando determinada fórmula, teoria, ou
determinados princípios; relacionar princípios a acontecimentos, fatos, experimen-
tos. São exemplos de raízes da categoria aplicação, segundo Vianna (1978):
1. Qual o princípio científico aplicável à seguinte situação...?
2. Qual das afirmações abaixo exemplifica o princípio da...?
3. Que efeito será provocado se no seguinte sistema modificarmos os ele-
mentos...?
4. O procedimento experimental mais aconselhável para a pesquisa da se-
guinte situação é
5. Qual a definição aplicável para...?

99
LIMA, V. M. R. et al.  —   Questões de prova e suas especificidades

A categoria Análise focaliza o desdobramento de um todo em suas partes consti-


tutivas, a percepção de suas inter-relações e os modos de sua organização. As habili-
dades envolvidas na análise encontram-se em nível mais avançado do que as impli-
cadas na compreensão e na aplicação. O conteúdo da questão deve ser apresentado
de forma diferenciada, caso contrário será uma questão que evoca uma situação já
conhecida. São exemplos da categoria de análise questões como: identificar hipóteses
formuladas numa determinada experiência; analisar o erro lógico de um argumento;
compreender inter-relações e ideias num texto; analisar pontos de vista, tendências,
estilos, intenções. São exemplos de raízes da categoria análise, segundo Vianna (1978):
1. No texto apresentado, que parte é a conclusão?
2. Quais os elementos no texto que apoiam (ou contradizem) a conclusão de que...?
3. Quais os elementos da seguinte comunicação... que podem ser considera-
dos como factuais?
4. Qual a hipótese formulada na seguinte experiência?
5. O erro lógico do seguinte argumento... é
6. O pressuposto não declarado da seguinte afirmação... é

A categoria Síntese exige a produção de uma comunicação nova, não percebida


claramente, a partir da combinação de elementos e partes já conhecidas. Em geral,
novas experiências ou materiais são combinados com outros já aprendidos, exigindo
do aluno um trabalho de integração dos conhecimentos. Esta é a categoria em que
se proporcionam ao aluno as maiores oportunidades de desenvolver a criatividade.
Nesta categoria o aluno é solicitado a formular hipóteses explicativas de fenômenos,
extrair conclusões de experimentos, relatar uma experiência pessoal, propor meios
para examinarem-se hipóteses, formular teoria aplicável a uma situação específica,
escrever ensaios. São exemplos de raízes da categoria síntese, segundo Vianna (1978):
1. Qual a hipótese a formular para explicar o seguinte fenômeno...?
2. A fórmula matemática (ou generalização verbal) que melhor englobaria o
seguinte conjunto de dados é
3. Um experimento (ou uma pesquisa) proporcionou os seguintes resulta-
dos... Qual a conclusão a extrair desses resultados?

A categoria Avaliação é a mais complexa por exigir a combinação de diversas


categorias anteriores para que os alunos possam julgar o valor de ideias, teorias,

100
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

dados, fenômenos. Nesta categoria deve ser proposto ao aluno apreciar, julgar,
concluir, recomendar, tomando-se como referência critérios claros que sustentem
a resposta elaborada. Esses critérios podem ser determinados pelo aluno (o que
já pode ser objeto da avaliação); ou pelo professor. São exemplos de questões da
categoria Avaliação: julgar um trabalho, aplicando determinados critérios; avaliar
criticamente argumentos, crenças, ideias sobre determinados temas. São exemplos
de raízes da categoria avaliação, segundo Vianna (1978):
1. Qual dos procedimentos abaixo é aceitável para... (determinado fim) e,
ao mesmo tempo, está de acordo com o seguinte critério (o maior, o mais
barato, o mais preciso, etc.)?
2. Qual das afirmações apresentadas nas várias alternativas está de acordo
com o seguinte critério...?

Cabe chamar a atenção de que a simples utilização da raiz não garante que
o item se classifique no nível cognitivo indicado, pois este é assegurado pela si-
tuação de aprendizagem proposta e não pela formulação verbal. Muitas vezes, o
nível cognitivo complexo que a formulação parece solicitar é a simples repetição
de uma atividade várias vezes realizada em aula.
As raízes apresentadas como exemplos podem ser utilizadas para questões
de respostas curtas, ampliadas para questões mais extensas, ou em questões ob-
jetivas de escolha múltipla, neste caso, seguidos de quatro ou cinco alternativas.
Tais exemplos podem, ainda, ser utilizados como pergunta ou como afirmação
incompleta.
Com o intuito de conferir praticidade às considerações iniciais, são sintetiza-
das, a seguir, recomendações gerais para orientar o professor nas decisões ao
elaborar uma prova.

Recomendações gerais para a elaboração de


questões que constituem uma prova

1. Identifique as habilidades cognitivas a serem avaliadas em consonância


com os objetivos estabelecidos: evocação, interpretação, aplicação, análi-
se, originalidade, avaliação, julgamento de valor, etc.

101
LIMA, V. M. R. et al.  —   Questões de prova e suas especificidades

2. Examine as características dos diferentes tipos de questão e sua adequação


aos objetivos, aos propósitos da avaliação que vai ser realizada e ao tempo
disponível. Solicite respostas que demonstrem os resultados esperados.
3. Tenha em vista uma amostragem adequada de resultados de aprendiza-
gem. Dependendo das características do que se pretende avaliar, é pre-
ferível mais questões de resposta curta a um número restrito de questões
extensas.
4. Elabore questões sobre material significativo. Evite questões tendenciosas,
que exijam esperteza do aluno, pois este não é o objetivo da avaliação.
5. Elabore questões cujas respostas revelem produção do aluno, e não repro-
dução do conteúdo de livros ou textos.
6. Evite questões optativas, a menos que se pretenda avaliar interesses indivi-
duais ou a criatividade do aluno. A inclusão de questões opcionais dá ori-
gem a várias combinações, o que dificulta a ação diagnóstica da avaliação.
7. Realize atividades similares às da prova durante o desenvolvimento das
aulas, para que a avaliação não seja uma atividade externa aos processos
de ensino e de aprendizagem.

Embora tenha sido apresentado um elenco de recomendações, considerando


as singularidades dos objetivos, dos conteúdos e dos alunos, a decisão última
caberá sempre ao professor.

Referências

BLOOM, Benjamin S. Taxionomia de objetivos educacionais 1. Domínio cognitivo.


8. ed. Porto Alegre: Globo, 1982.
GRONLUND, Norman E. A elaboração de testes de aproveitamento escolar. 3. ed.
São Paulo: EPU, 1974.
MEDEIROS, E. B. Provas objetivas: técnicas de construção. 6. ed. Rio de Janeiro:
Fundação Getúlio Vargas, 1981.
SILVA, Tomaz Tadeu da; VEIGA NETO, Alfredo José da. Tecnologia dos testes
objetivos. Criciúma: Fundação Educacional de Criciúma, 1977.

102
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

SMITH, Marisa; HUERGA, Susana. Orientações para o processo de elaboração das


provas dos concursos vestibulares da PUCRS. Porto Alegre: Setor de Ingresso da
Pró-Reitoria de Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul.

VIANNA, H. M. Testes em Educação. São Paulo: IBRASA, 1978.

103
9. CONTRIBUIÇÕES PARA A
ELABORAÇÃO DE QUESTÕES DE
RESPOSTA LIVRE
Marlene Correro Grillo
Rosana Maria Gessinger

Questões de resposta livre, também conhecidas como questões discursivas ou


dissertativas, são questões em que o aluno é solicitado a organizar a resposta, a
exprimir as próprias ideias e a escolher a maneira de abordar um determinado
assunto, apresentando informações e priorizando alguns aspectos em detrimento
de outros. Têm como principal objetivo encorajar habilidades de expressão escrita
do aluno e são recomendadas principalmente para avaliar habilidades de análise,
de síntese e de crítica. Entretanto, não asseguram por si só o exercício dessas ha-
bilidades, porque a resposta do aluno depende muito da forma como é proposta a
tarefa. Perguntas como quem, quando, onde, embora solicitem a elaboração pelo
aluno, não caracterizam uma questão de resposta livre, porque ele não tem outra
forma de responder a não ser citando um nome, uma data e um local. Não há nes-
ses casos a mínima possibilidade de se esperar uma resposta diferente e criativa.
Apesar do termo resposta livre, a liberdade do aluno tem limites, por isso em
alguns casos são usadas as questões de resposta curta ou breve e, em outras, as
conhecidas dissertações. Nesse sentido, cabe ao professor definir o objetivo e es-
colher a forma mais adequada de avaliar a aprendizagem, considerando a tarefa
e o tempo necessário para a realização, pois o fator tempo é uma variável impor-
tante na redação da resposta.
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões de resposta livre

Expressões como comente, qual sua opinião, escreva o que sabe, discuta são
vagas e genéricas; não fornecem orientação segura e podem originar tanto uma
longa dissertação quanto uma resposta breve que demanda poucas linhas, levan-
do a um julgamento fundamentado em subjetividades, pela falta de clareza sobre
o que exatamente está sendo questionado e pelo desconhecimento dos critérios.
Poderiam ser melhoradas se fossem desdobradas em perguntas diretas como: des-
creva cinco características do processo...; posicione-se favorável ou contrariamente
a tal fato, justificando seu posicionamento; apresente pelo menos duas limitações
de uma determinada situação, indicando duas medidas possíveis de solucioná-
las.
Quando o aluno é solicitado a aplicar o que aprendeu em situações novas,
a assumir posição favorável ou contrária a algum fato e argumentar, a formular
conclusões, a organizar ideias elaborando uma produção pessoal, a estabelecer
relações de causa e efeito, a resposta será consequentemente mais elaborada.
São questões complexas que desencadeiam atividades que vão além da simples
memorização e evocação, desde que a resposta não seja definições, descrições,
situações encontradas em livros didáticos, em apostilas ou já examinadas em aula.
São válidas, ainda, questões que demandam consulta bibliográfica. Questões des-
se tipo são adequadas para avaliar habilidades como análise, síntese, avaliação,
elaboração de pesquisa bibliográfica, e são recomendadas em casos em que o
aluno necessitará empregar esta competência em situações futuras.
A formulação da questão discursiva exige sempre clareza para que o aluno
compreenda o que está sendo solicitado e tenha condições de organizar seu co-
nhecimento numa modalidade de produção pessoal. A dificuldade, se é que ela
existe, não deve estar na compreensão da questão, e sim na sua resolução, em-
bora seja comum ouvir professores afirmarem que o entendimento da questão faz
parte da avaliação; tal afirmação reitera a responsabilidade do professor ao propor
questões claras e sem ambiguidades. Nem sempre é fácil para o aluno interpretar
a instrução do item, se esse apresentar problemas de elaboração.
A definição dos critérios de avaliação é outro fator que influi fortemente na
compreensão da questão, devendo ser conhecidos pelo aluno e estar a serviço da
aprendizagem. Devido à importância do estabelecimento de critérios ao formular-
se questões de resposta livre, recomenda-se a leitura do texto “Critérios de avalia-
ção a serviço da aprendizagem”, que integra a presente publicação.

106
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Exemplos de questões de resposta livre

Utilizando expressões claras, centradas no comportamento que se deseja ava-


liar, é possível elaborar diferentes questões de resposta livre, como as apresenta-
das a seguir.
Enumerar – A questão exige apenas recordação. É uma forma bem simples de
item de resposta livre.
Exemplo: Enumere três obras de José Lins do Rego.
Organizar – O item possui maior grau de complexidade que o anterior, pois
pede a lembrança de fatos segundo determinado critério (cronológico, importân-
cia, etc.).
Exemplo: Organize, em ordem cronológica, cinco fatos da Segunda Guerra
Mundial.
Neste exemplo, a omissão das palavras em ordem cronológica autorizaria o
aluno a organizar cinco fatos a partir de qualquer critério, e o professor deveria
aceitar qualquer resposta.
Selecionar – A questão propõe avaliação crítica, mas de natureza simples,
segundo um critério preestabelecido, que pode ser o mais divulgado, o mais re-
conhecido, o mais recente etc. A questão será fácil ou difícil segundo o critério
adotado.
Exemplo: Indique quatro cientistas modernos que contribuíram para o desen-
volvimento das explorações espaciais.
Descrever – A questão solicita as características de um objeto, processo ou fe-
nômeno. Geralmente é uma questão de resposta limitada.
Exemplo: Descreva as etapas do processo de enfermagem.
Discutir – O item requer mais do que uma simples descrição. Pressupõe que
o aluno desenvolva ideias, apresente argumentos a favor e/ou contra o que está
sendo apresentado, e estabeleça relacionamento entre fatos e ideias. A questão
permite resposta ampla e exige estruturação cuidadosa. Sua correção é sempre
difícil, dada a possibilidade de diferentes abordagens do problema e, consequen-
temente, uma variedade de respostas. Cabe observar que no exemplo a seguir os
critérios já estão explícitos.

107
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões de resposta livre

Exemplo: Discuta as vantagens e desvantagens da utilização de itens disserta-


tivos para avaliar a aprendizagem, no que se refere à amostragem de conteúdo, à
atribuição de grau, à elaboração e correção da prova.
Definir – A proposição solicita que o aluno distinga diferentes categorias a que o
objeto, fato, processo, fenômeno, etc. estão associados. As questões de definição às
vezes são mais difíceis do que as discussões. A deficiência do item está em o aluno,
frequentemente, repetir definições de livros ou apostilas. A questão ficaria mais bem
elaborada se o professor solicitasse uma definição pessoal.
Exemplo: Elabore uma definição pessoal de aquecimento global.
Exemplificar – A questão tanto pode solicitar uma evocação como uma elabo-
ração própria. Cabe ao professor elaborar a questão de tal forma que a resposta
do aluno corresponda ao objetivo pretendido.
Exemplos: Apresente três fenômenos decorrentes do aquecimento global.
Descreva um fato que exemplifique um comportamento ético.
Explicar – A ênfase da questão recai na relação de causa e efeito. É, geralmen-
te, uma questão difícil para alunos com poucos pré-requisitos.
Exemplo: Por que, atualmente, o número de casos de gravidez na adolescência
no Brasil é maior do que há dez anos?
Comparar – O item pode ser apresentado de diferentes modos, sem o empre-
go do termo comparar, estruturando-se em torno de semelhanças e diferenças,
vantagens e desvantagens de uma ideia. Exige mais trabalho de planejamento e
de organização de ideias. A resposta é geralmente ampla.
Exemplo: Estabeleça duas principais vantagens e duas desvantagens da globa-
lização, tomando como referência a interatividade e a identidade nacional.
Sintetizar – A questão propõe que o aluno apresente de modo breve os pontos
essenciais de determinado assunto, ou organize uma produção nova e original
específica.
Exemplo: Organize um plano de recomendações para a elaboração de uma
prova de seleção.
Dependendo do conteúdo, podem ainda ser explicitados aspectos que devem
estar presentes no plano solicitado.
Interpretar – O item exige uma resposta ampla, e a influência da memória
mecânica é praticamente nula. Pretende-se que o aluno seja capaz de perceber o

108
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

significado de uma palavra, de um texto, de ideias principais, de compreender as


intenções do autor.
Exemplo: A partir dos dados do gráfico X, elabore duas afirmações sobre a re-
lação entre o nível de escolaridade e a empregabilidade.
Criticar – A questão solicita processos mentais complexos. O item deve fazer
com que o aluno demonstre a correção e a adequação de uma ideia e também
apresente sugestões para o aprimoramento ou razões para o abandono dessa ideia.
Exemplo: Posicione-se criticamente sobre...
Pode-se ainda acrescentar que o aluno justifique seu posicionamento com ar-
gumentos baseados nos estudos realizados sobre determinado assunto ou em suas
experiências anteriores, ou profissionais, etc. Outra recomendação útil é informar,
na proposição, que a natureza do posicionamento não interferirá na avaliação,
desde que haja coerência na argumentação, respeito a determinados princípios,
etc.

Recomendações práticas para elaboração e


correção de questões de resposta livre

1. Planeje cuidadosamente a questão: examine a clareza da proposta, a es-


pecificação da linha de abordagem, a possibilidade de realização da tarefa
no tempo estabelecido. Examine também suas próprias disponibilidades
de tempo para que o período de correção não represente uma sobrecarga,
comprometendo a qualidade da avaliação.
2. Proponha questões que avaliem aspectos importantes, empregando uma
linguagem direta e precisa. A redação defeituosa do item desorienta o
aluno e estimula a digressão; a ausência de ambiguidades facilita, ao
mesmo tempo, a organização da resposta do aluno e a correção pelo
professor.
3. Formule itens independentes entre si para evitar que o aluno, ao errar uma
questão, já tenha comprometido o acerto de outra. É comum encontrarem-
se provas que reúnem várias questões avaliando o mesmo conteúdo em
detrimento de outros.

109
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões de resposta livre

4. Apresente questões que demandam competências e habilidades já apro-


priadas pelo aluno em atividades de aprendizagem anteriores. Evite incluir
fatores estranhos ao momento de avaliação.
5. Corrija de uma única vez a mesma questão de cada aluno; os critérios fica-
rão mais evidentes ao professor e a correção será mais rápida.
6. Avalie as respostas dos alunos em consonância com o objetivo pretendido.
Fluência verbal, aparência da prova, ou mesmo erros de português são
aspectos externos à avaliação do conteúdo, a menos que a prova seja de
Língua Portuguesa ou de Literatura. Não se descontam erros de português
– como de acentuação, grafia, concordância ou pontuação – em provas
de outra disciplina. Os erros devem ser assinalados para que o aluno os
identifique; o professor deve tentar ajudá-lo, redigindo corretamente e exi-
gindo o mesmo ao aluno, mas a verificação do domínio da língua é atribui-
ção do professor de Língua Portuguesa. Entretanto, textos incompletos ou
truncados podem ser penalizados se entre os critérios de avaliação forem
consideradas a clareza e a coerência da comunicação.
7. Certifique-se sobre o significado preciso da ação que está sendo solicitada
ao aluno. Citar, por exemplo, não é o mesmo que explicar ou descrever.
O aluno não é obrigado a responder além do que consta na instrução, e o
professor não pode exigir além do que solicitou.
8. Entregue os resultados em tempo hábil, enquanto o aluno ainda tem tem-
po e possibilidade para reorientar sua atividade e aprender o que demons-
trou não haver aprendido. Passado muito tempo, outras aprendizagens
deixam de ocorrer, e a lacuna que se estabelece aumenta a possibilidade
de insucesso do aluno.

Essas recomendações confirmam que a propalada facilidade na preparação e


mesmo no uso das questões de resposta livre é ilusória. Esse tipo de questão exige
precisão de significado e clareza de critérios, sendo recomendado para avaliar o
desenvolvimento da habilidade de expressão, de argumentação e de tomada de
posição do aluno frente a questões polêmicas ou divergentes.

110
10. CONTRIBUIÇÕES PARA A
ELABORAÇÃO DE QUESTÕES
OBJETIVAS
Marlene Correro Grillo
Rosana Maria Gessinger

As questões objetivas são organizadas sob diferentes modalidades, podendo


ser, para fins didáticos, reunidas em dois grupos:
• questões que exigem a redação do aluno – questões de resposta curta
(redação de um nome, de uma data, de um acontecimento), e questões de
lacuna (completamento de uma ou mais sentenças de onde são suprimidas
palavras-chave);
• questões em que o aluno identifica a resposta correta – nesse grupo en-
contram-se as questões de associação, de asserção e razão, de escolha
múltipla e de resposta alternativa (MEDEIROS, 1981).
Os itens objetivos têm ampla aplicabilidade, tanto no que se refere à avaliação
de conteúdos como à de habilidades cognitivas. Não basta elaborar corretamente
instrumentos de avaliação; é fundamental saber o que se vai avaliar e por quê.
Nesse sentido, é indispensável um quadro teórico de referência, conforme já
foi indicado anteriormente, que torne claros os diferentes níveis de complexidade
das variáveis cognitivas e das habilidades presentes nas experiências de aprendi-
zagem e de avaliação.
A seguir são apresentadas diferentes modalidades de questões objetivas.
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

Questão de lacunas

A questão de lacunas consiste em sentenças de onde são suprimidas palavras


significativas, formando-se então lacunas; cabe ao aluno completar o sentido da
frase, preenchendo os espaços. Para que a questão seja realmente objetiva, cada
lacuna só deve permitir uma única expressão que complete corretamente o sen-
tido da frase (conceito, data, acontecimento, local, classe gramatical, etc.); mas,
em alguns casos, o aluno apresenta uma resposta razoável (o que não deveria
ser possível), porque a sentença permite mais de uma expressão, e o professor
necessita considerar o acerto.
Alerta-se ainda para outras recomendações úteis: que as lacunas correspon-
dam a elementos importantes e não sejam tão numerosas a ponto de o aluno não
compreender o significado da sentença. Evitem-se, ainda, frases estereotipadas,
retiradas de textos ou apostilas.
Exemplo:
INSTRUÇÃO: Para responder a questão X, complete a lacuna com a expressão
que torna a sentença correta.
Questão X: O tecido responsável pela condução de água e sais minerais do
solo para as folhas é o ..............................

Questão de associação

A questão de associação consiste em dois agrupamentos de informações, ge-


ralmente apresentados em duas colunas, que funcionam respectivamente como
enunciados e respostas. Os elementos de cada grupo ou coluna devem apresentar
homogeneidade entre si e ser plausíveis para toda uma série de elementos (con-
ceitos e símbolos ou figuras, autores e obras, acontecimentos e causas). O número
de enunciados de um grupo ou de uma coluna pode ou não ser igual ao número
de respostas da outra coluna. Quando não houver igualdade, deve-se chamar a
atenção do aluno para o fato de que um mesmo elemento de uma coluna pode
ser repetido na outra ou mesmo não ser utilizado, conforme o caso.

112
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Exemplo:
Questão X: Relacione os compositores (Coluna A) com as obras (Coluna B),
numerando os parênteses. Alguns elementos da coluna A poderão ser repetidos
ou não constar na coluna B.

Coluna A Coluna B
1. Verdi ( ) La Traviata
2. Donizetti ( ) Carmem
3. Rossini ( ) Othelo
4. Puccini ( ) Guarani
5. Bizet ( ) Lo Schiavo
6. Carlos Gomes

Questão de asserção e razão

A questão de asserção e razão é uma questão bastante complexa pelo seu


formato e exige familiaridade com as habilidades cognitivas solicitadas. Signi-
fica dizer que a aprendizagem prévia de análise de relações é indispensável
para que o aluno tenha possibilidade de resolver esse tipo de questão com
sucesso.
É constituída por duas afirmações, podendo a segunda ser ou não uma justi-
ficativa da primeira. As afirmações necessitam ser absolutamente verdadeiras ou
falsas para que se possa apresentar ao aluno uma proposição indiscutível. Cada
dupla de afirmações relacionáveis constitui uma questão a ser resolvida com base
num código de respostas, que apresenta as possíveis relações entre ambas. Numa
prova, tal código é utilizado para o conjunto de questões de asserção e razão, não
havendo necessidade de repeti-lo para cada uma das questões.

RESUMO DO CÓDIGO DE RESPOSTAS


alternativa 1ª asserção 2ª asserção
a verdadeira verdadeira a 2ª é uma justificativa correta da 1ª
b verdadeira verdadeira a 2ª não é uma justificativa da 1ª
c verdadeira falsa
d falsa verdadeira
e falsa falsa

Exemplo:
INSTRUÇÃO PARA AS QUESTÕES 1, 2 e 3

113
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

De acordo com a chave abaixo, assinale


a) se as duas asserções forem verdadeiras, e a segunda for uma justificativa da
primeira.
b) se as duas asserções forem verdadeiras, e a segunda não for uma justifica-
tiva da primeira.
c) se a primeira asserção for verdadeira, e a segunda, falsa.
d) se a primeira asserção for falsa, e a segunda, verdadeira.
e) se tanto a primeira como a segunda asserção forem falsas.

Questão 1
( ) Joaquim Nabuco empenhou-se na campanha abolicionista,
PORQUE
era tribuno privilegiado e sagaz jornalista.

Questão 2
( ) A Revolução da Chibata foi uma rebelião de populares e da escola Militar
do Rio de Janeiro,
PORQUE
Osvaldo Cruz conseguiu que o presidente Rodrigues Alves decretasse a vaci-
nação obrigatória contra a febre amarela e a varíola.
Adaptado do Concurso Vestibular Verão 2007/PUCRS

Questão 3
( ) O uso do ácido acetilsalicílico é contraindicado no tratamento da dengue
PORQUE
ele pode ocasionar a dengue hemorrágica em indivíduo já infectado anterior-
mente.
Cada um dos tipos de questão já apresentados – de associação, de lacunas e
de asserção e razão – pode tanto constituir uma prova inteira como ser adaptado
à modalidade de escolha múltipla, a partir de reorganizações diversas dos ele-
mentos que os constituem (palavras, frases, símbolos, mapas, gráficos, etc.). Ao
professor compete decidir sobre a forma de item que melhor se ajuste à natureza
do objeto da avaliação num determinado momento.

114
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Questão de escolha múltipla

O item de escolha múltipla consiste num enunciado (suporte, caput ou raiz)


que apresenta uma situação problema, e em várias alternativas (4 ou 5) que
fornecem soluções possíveis para o problema. Deve-se ter o cuidado de não se
incluírem alternativas absurdas, que o aluno descarta de imediato, mesmo não
conhecendo o conteúdo a ser avaliado.
Escolha múltipla com uma única resposta: o enunciado pode ser uma pergunta
ou uma afirmação incompleta. Nesse caso, as alternativas incluem apenas uma
única resposta correta e várias incorretas, mas plausíveis.
Exemplo de escolha múltipla com pergunta:
1. Com 8 frutas diferentes, qual o número de saladas que podem ser feitas
contendo exatamente 3 dessas frutas?
a)  24
b)  54
c)  56
d)  112
Adaptado do Concurso Vestibular Verão 2007 PUCRS

Exemplo de escolha múltipla com afirmação incompleta:


2. Com 8 frutas diferentes, o número de saladas que podem ser feitas contendo
exatamente 3 dessas frutas é
a)  24
b)  54
c)  56
d)  112
Adaptado do Concurso Vestibular Verão 2007 PUCRS

Escolha múltipla com mais de uma afirmativa correta: o item de escolha múl-
tipla pode apresentar, ainda, várias alternativas corretas e incorretas, que o aluno
deverá reconhecer como verdadeiras e/ou falsas e assinalar numa chave de res-
postas fornecida pelo professor. Nesse caso, deve-se fazer preceder a questão de

115
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

uma instrução específica para alertar o aluno de que foi modificada a lógica da
prova. O número de alternativas numa mesma prova deve ser sempre o mesmo,
geralmente quatro ou cinco. Essa modalidade de questão reúne um conjunto de
afirmativas verdadeiras e falsas a serem identificadas pelo aluno. Convém que, na
instrução, seja destacado o assunto de que tratam as afirmativas para melhor en-
caminhar o raciocínio do aluno. Vale dizer que só devem ser incluídas afirmativas
pertencentes ao mesmo conteúdo, o que dá um sentido de problema. É indispen-
sável cuidado na elaboração da chave de correção correspondente, incluindo só
combinações possíveis.

Exemplo 1:
INSTRUÇÃO: Responder à questão X, considerando as afirmativas a seguir,
que tratam dos sujeitos que atuam no espaço agrário brasileiro.
I – Posseiro é o agricultor que ocupa terras abandonadas; legalmente pode
valer-se de usucapião para reclamar a posse definitiva das terras após ocupá-las
por certo tempo, dependendo dos casos estabelecidos em lei.
II – Gato é o especulador de terras que se apropria de grandes áreas, falsifican-
do títulos de propriedade rural.
III – Grileiro é o empresário que arregimenta trabalhadores que vivem na sua
localidade para levá-los a outras regiões do país com promessas que costumam
não ser cumpridas, podendo, inclusive, gerar trabalho escravo.
IV – Meeiro é o trabalhador, geralmente desprovido de terras, que oferece sua
mão de obra e seus equipamentos em troca de uma parte da produção, conforme
firmado com o proprietário da terra a ser trabalhada.

Questão X – Estão corretas as afirmativas


a) I e II.
b) I e IV.
c) II e III.
d) III e IV.
Adaptado do Concurso Vestibular Verão 2009 PUCRS

Comentário: A questão seguinte, o exemplo 2, é apresentada para mostrar um


descuido frequente na elaboração da chave de respostas. Uma alternativa está

116
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

incluída em outra mais abrangente, como é o caso das alternativas C) e A), e D) e


E). Impõe-se aqui delimitar as alternativas com o advérbio APENAS:

Exemplo 2:
INSTRUÇÃO: Responder à questão X com base nas afirmativas referentes à
organização demográfica do Brasil.
I. O Brasil está entre os dez países com maior desigualdade social do mundo.
II. A taxa de fecundidade do Brasil está em torno de 4,3 filhos por mulher, e a
taxa de fertilidade está diminuindo.
III. Os dados referentes ao IDH possibilitam localizar o Brasil no grupo de
países situados na faixa de 0,8 a 1,0.
IV. Desde a década de 1950, a população absoluta do Brasil está diminuindo,
graças às políticas governamentais de controle da natalidade.
Questão X. Estão corretas APENAS as afirmativas:
a) I e II.
b) I e III.
c) I, II e IV.
d) II, III e IV.
e) III e IV.
Adaptado do Concurso Vestibular Inverno 2008 PUCRS

Escolha múltipla adaptada de questão de lacunas: diferencia-se da questão de


lacunas, mencionada anteriormente, pela apresentação de quatro ou cinco alterna-
tivas dentre as quais deve ser identificada a que completa corretamente as lacunas.

Exemplo:
INSTRUÇÃO PARA A QUESTÃO X: Assinale a alternativa que completa corre-
tamente as lacunas.
Questão X: Se ninguém ________ a respeito, como ____________ tomar uma
decisão?
a)  se manifestar – se poderá
b)  se manifestar – poder-se-á
c)  manifestar-se – poder-se-á
d)  manifestar-se – se poderá

117
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

Escolha múltipla adaptada de questão de associação: diferencia-se da questão


de associação mencionada anteriormente pela apresentação de quatro ou cinco
alternativas com numerações que indicam possíveis relações entre as colunas,
dentre as quais uma deve ser identificada como a correta. No exemplo a seguir,
a coluna 1 só contém conflitos sociais de uma mesma época, e a coluna 2, as
respectivas características. Assim, o material das duas colunas é homogêneo e
plausível.

Exemplo:
INSTRUÇÃO: Relacione os conflitos sociais que eclodiram na Primeira Repúbli-
ca, apresentados na coluna 1, com as respectivas características, apresentadas na
coluna 2, numerando os parênteses.

Coluna 1 – Conflitos sociais Coluna 2 – Características


1. Revolta da Armada ( ) Levante dos marinheiros contra castigos
2. Guerra de Canudos físicos e baixos soldos.

3. Revolta da Vacina ( ) Levante contra o autoritarismo da polícia


sanitária e o despejo da população pobre dos
4. Revolta da Chibata
cortiços do centro do Rio de Janeiro.
( ) Levante da Marinha contra o autoritaris-
mo de Floriano Peixoto e contra a forte presen-
ça do exército no governo.
( ) Luta dos camponeses pobres do sertão
da Bahia, liderados por Antônio Conselheiro,
contra o autoritarismo republicano e contra os
interesses dos grandes proprietários de terra.

QUESTÃO X – A numeração correta, de cima para baixo, é


a)  1, 3, 2, 4.
b)  1, 2, 4, 3.
c)  2, 3, 1, 4.
d)  4, 3, 1, 2.
Adaptado do Concurso Vestibular Verão 2007 PUCRS

118
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Orientações gerais para elaboração de questões de escolha múltipla


1. Use uma pergunta direta ou uma afirmação incompleta como raiz da ques-
tão, conforme julgar mais apropriado.
2. Apresente no suporte da questão um único problema claramente formula-
do ou uma pergunta direta.
3. Utilize uma linguagem direta, clara e simples na construção da questão;
evite informações desnecessárias; limite o enunciado às informações dire-
tamente relacionadas ao problema.
4. Procure incluir no enunciado o número suficiente de palavras para torná-
lo preciso.
5. Transfira para a raiz da questão as palavras ou expressões que se repetem
em todas as alternativas.
6. Prefira redigir questões na forma afirmativa. No entanto, caso seja neces-
sário elaborar uma questão na forma negativa, destaque a palavra NÃO.
Esta é recomendada quando se deseja solicitar uma única resposta que
não satisfaz a determinados requisitos, como, por exemplo: NÃO pertence
à mesma regra de acentuação, a um mesmo grupamento de categoria gra-
matical, de autores de uma mesma escola literária, etc.
7. Certifique-se de que cada questão possui apenas uma resposta correta.
8. Redija as alternativas de modo que elas se tornem gramaticalmente con-
sistentes com a raiz.
9. Verifique se todas as alternativas são plausíveis, não absurdas e atrativas para
os alunos que desconhecem o assunto ou não possuem a habilidade testada.
10. Verifique se a raiz da questão e a alternativa correta não contêm palavras
comuns ou associadas que sirvam de pista.
11. Evite as expressões “nenhuma das alternativas” ou “todas as alternativas”. No
caso de “nenhuma das alternativas”, se o aluno identifica pelo menos uma
como correta, já elimina essa alternativa. No caso de “todas as alternativas”, se
o aluno identifica pelo menos uma incorreta, igualmente elimina tal alternativa.
12. Sempre que possível, apresente alternativas em alguma ordem lógica e
sistemática (numérica, alfabética, cronológica, etc.).
13. Faça com que as alternativas sejam independentes e se excluam mutuamente.

119
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

14. Certifique-se de que cada questão é independente das demais.


15. Evite sinais estranhos à questão (a alternativa correta não deve ser mais
precisa ou elaborada, nem mais longa que as demais).
16. Varie aleatoriamente a posição da alternativa correta.
17. No caso de haver uma prova com questões de diferentes tipos, é necessá-
rio apresentar uma instrução especial antecedendo cada tipo de questão.
18. Rejeite o procedimento de correção em que um ou mais erros anulam
um acerto. Esta lógica é injusta, pois são desconsiderados pelo professor
tantos acertos quantos erros cometidos. Tal prática compromete também a
função diagnóstica e a função formativa da avaliação, pois o grau atribuído
não corresponde à aprendizagem do aluno.
19. Elabore alternativas que apresentem paralelismo gramatical, ou seja, todas
devem ter forma gramatical idêntica, iniciando por verbo, substantivo etc.
(Adaptado de VIANNA, 1978)

Exemplos de questões mal formuladas de escolha múltipla


Para facilitar a compreensão das recomendações, são apresentados a seguir
exemplos de questões mal formuladas, adaptadas de provas.

Evite enunciados vagos, sem um problema completo e definido, o que


transforma a questão num conjunto de afirmações soltas, cada uma poden-
do ser julgada como falsa ou verdadeira.

Exemplo 1: No planejamento das questões objetivas, uma tabela de especificações


a)  fornece uma amostragem mais equilibrada do conteúdo.
b)  indica como um teste será usado para melhorar a aprendizagem.
c)  coloca os objetivos instrucionais em ordem de sua importância.
d)  especifica o método de avaliação a ser usado no teste.

Comentário:
O enunciado está incompleto, pois falta o verbo, que tornaria claros o proble-
ma e o objetivo da questão. A questão 1 poderia ser melhorada com a inclusão do
verbo na raiz, o qual definiria o problema, como segue:

120
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Uma tabela de especificação possibilita


a)  uma amostragem mais equilibrada do conteúdo.
b)  o conhecimento dos procedimentos de avaliação utilizados.
c)  a indicação da utilidade da questão.
d)  a identificação da importância dos objetivos pretendidos.

Exemplo 2: Assinale a alternativa correta.


a) Itens dissertativos oferecem reduzida amostragem de conteúdo.
b) Itens objetivos avaliam a criatividade do aluno.
c) A construção de itens do tipo falso-verdadeiro desaconselha a utilização
de termos absolutos.
d) A organização lógica da resposta é exigência de um item de resposta livre.

Comentário:
A questão não apresenta um problema nem uma afirmação incompleta. A
rigor, não constitui uma questão de escolha múltipla pela ausência de problema,
mas um conjunto de afirmações do tipo Verdadeiro-Falso.

Utilize uma linguagem direta, clara e simples na construção do item;


evite explicações desnecessárias; limite o enunciado às informações direta-
mente relacionadas ao problema.

Exemplo: A prática educativa exige a utilização de instrumentos válidos e


precisos, que forneçam informações merecedoras de confiança. A prova é apenas
uma das várias possibilidades de que dispõe o professor para avaliar a aprendi-
zagem e, ao mesmo tempo, a própria docência, e é constituída por questões de
diferentes tipos. Aquelas que solicitam ao aluno a organização e expressão das
próprias ideias são denominadas questões de
a)  resposta livre.
b)  associação.
c)  lacunas.
d)  asserção e razão.

121
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

Comentário:
Embora em alguns casos se aceite uma breve contextualização do tema ao se
propor um problema, a questão acima apresenta dados desnecessários para ser
respondida. Poderia ser apresentada como segue:
Questões que solicitam ao aluno a organização e expressão das próprias ideias
são denominadas questões de
a)  resposta livre.
b)  associação.
c)  lacunas.
d)  asserção e razão.

Verifique se a raiz do item e a alternativa correta não contêm palavras


comuns ou associadas que sirvam de pista.

Exemplo 1: Qual dessas publicações melhor possibilita localizar artigos de


pesquisa em educação?
a) Informativo de Pesquisa Educacional.
b) Revista de Medidas Educacionais.
c) Revista de Aconselhamento Pedagógico.
d) Periódico de Psicologia.

Exemplo 2: A Pedagogia do Conflito tem como ideia básica


a)  o desvelamento crítico dos conflitos sociais.
b)  o fortalecimento do individualismo entre os educadores.
c)  a valorização do controle e da ordem.
d)  a conservação da escola como uma comunidade organizada.

Comentário:
As expressões Pesquisa Educacional e Conflitos, apresentadas respectivamente
nas raízes das questões 1 e 2, têm similaridade com as alternativas “a” das duas
questões, o que pode dar pistas ao aluno.

122
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Evite sinais estranhos ao item (a alternativa correta não deve ser mais
precisa, nem mais longa ou mais elaborada).

Exemplo: Provas objetivas utilizadas na avaliação são vantajosas porque


a)  oferecem maior amostragem de conteúdo, demandando menos tempo
para correção.
b)  possibilitam ao aluno organizar sua própria resposta.
c)  demonstram a habilidade de síntese do aluno.
d)  têm possibilidade de variação de critérios.

Comentário:
A alternativa correta, mais detalhada, destaca-se das demais pela extensão,
fornecendo pista ao aluno e induzindo-o à resposta correta. A alternativa “a” de-
veria conter apenas uma afirmação: “oferecem maior amostragem de conteúdo”
ou “demandam menos tempo para correção”.

Redija as alternativas de modo que elas sejam gramaticalmente coeren-


tes com a raiz e formalmente paralelas.

Exemplo 1: O conhecimento do aluno sobre informações fatuais pode ser mais


bem avaliado com um
a)  questão de resposta curta.
b)  item de associação.
c)  item de escolha múltipla.
d)  item de dissertação.

Comentário:
Não há concordância gramatical entre a raiz e a alternativa “a”; a raiz termina
com o artigo indefinido “um”, e a alternativa “a” inicia com um substantivo femi-
nino. Tal problema pode ser solucionado colocando-se o artigo diante de cada
alternativa, como segue:
O conhecimento do aluno sobre informações fatuais pode ser mais bem ava-
liado com

123
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

a)  uma questão de resposta curta.


b)  um item de associação.
c)  um item de escolha múltipla.
d)  um item de dissertação.

Exemplo 2: Por que os termos negativos devem ser evitados no enunciado de


um item de escolha múltipla?
a) Eles podem passar desapercebidos pelos alunos.
b) Pela tendência de se construir uma alternativa mais longa.
c) A elaboração das alternativas é mais difícil.
d) Dificultam a avaliação.

Comentário:
Falta paralelismo gramatical entre as alternativas. A questão se ajustaria melhor
se a raiz fosse transformada em afirmação incompleta e se as alternativas seguis-
sem a convenção do paralelismo gramatical, conforme segue:
Os termos negativos devem ser evitados no enunciado de um item de escolha
múltipla porque
a)  podem passar desapercebidos pelo aluno.
b)  exigem a construção de uma alternativa mais longa.
c)  tornam a redação das alternativas mais difícil.
d)  dificultam a avaliação pelo professor.

Apresente na raiz um único problema.

Exemplo: Há indicação incorreta do número de sílabas ou separação silábica


incorreta em
a)  credenciem (4) de-sobs-tru-iu
b)  pinheirais (3) em-la-me-iam
c)  secretarias (5) im-pe-trou
d)  petróleo (4) ci-sa-tlân-ti-co

124
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Comentário:
A questão propõe mais de um problema: número de sílabas e separação silá-
bica. Poderia ser desdobrada em duas questões, pois, da forma como está apre-
sentada, acrescenta uma dificuldade desnecessária: exigência de dois acertos por
alternativa em conteúdos diferentes.

Transfira para a raiz do item as palavras ou expressões que se repetem


em todas as alternativas.

Exemplo: Quando o indivíduo age de acordo com uma filosofia de vida que
desenvolveu, atingiu, segundo Bloom,
a)  a categoria denominada acolhimento.
b)  a categoria denominada resposta.
c)  a categoria denominada valorização.
d)  a categoria denominada caracterização.

Comentário:
A expressão a categoria denominada, repetida em todas as alternativas, deve
ser levada para a raiz:
Quando o indivíduo age de acordo com uma filosofia de vida que desenvol-
veu, atingiu, segundo Bloom, a categoria denominada
a)  acolhimento.
b)  resposta.
c)  valorização.
d)  caracterização.

Verifique se todas as alternativas são plausíveis, não absurdas e atrativas


para os alunos que desconhecem o assunto.

Exemplo: Qual dos políticos listados a seguir chegou à Presidência da República?


a)  Galvão Bueno.
b)  José Serra.
c) Itamar Franco.
d) Antonio Carlos Magalhães.

125
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

Comentário:
Todos os nomes listados devem pertencer a uma mesma categoria, mantendo
homogeneidade entre si. No presente caso, todos deveriam ser políticos. A alter-
nativa “a” é absurda.

Sempre que possível, apresente as alternativas em alguma ordem lógica


e sistemática (numérica, alfabética, cronológica, etc.).

Exemplo: Que porcentagem de 300 o número 12 representa?


a)  0,4%.
b)  3,6%.
c)  4,0%.
d)  2,5%.

Comentário:
A colocação desordenada de alternativas numéricas ou alfabéticas pode acres-
centar uma dificuldade que independe da dificuldade da questão, como por exem-
plo, erro do aluno na transcrição para a folha de respostas. Assim, as alternativas
deveriam ser apresentadas como segue:
a)  0,4%.
b)  2,5%.
c)  3,6%.
d)  4,0%.

Verifique se as alternativas são independentes e se excluem mutuamente.

Exemplo: Aproximadamente, que porcentagem de alunos do Colégio X obteve


aprovação no último vestibular?
a)  menos de 20%.
b)  menos de 40%.
c)  mais de 40%.
d)  mais de 60%.

126
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Comentário:
A alternativa “b” inclui a “a” e a alternativa “d” inclui a “c”. Menos de 20% é
também menos de 40%. Mais de 60% é também mais de 40%.

Certifique-se de que cada item contenha apenas uma resposta correta, a


menos que ele seja do tipo de resposta múltipla.

Exemplo: Gilberto Gil é conhecido como


a)  ministro da Cultura.
b)  cantor baiano.
c)  governador baiano.
d)  ministro das Cidades.

Comentário:
Há mais de uma alternativa correta. Se houver necessidade, pode-se usar a
forma de escolha múltipla com mais de uma resposta, conforme já foi explicado.

Questões de resposta alternativa

A questão de resposta alternativa consiste num enunciado declarativo que o


estudante deve julgar como pertencente a uma de duas categorias: verdadeiro/
falso; correto/incorreto; sim/não; fato/opinião. Consequentemente, só pode ser
formulada em relação a pontos indiscutivelmente certos ou errados. Para atingir o
padrão de verdade/falsidade absoluta, tem que ser tão precisa no seu enunciado
que não admita situações de exceção ou de relatividade como nem sempre, às
vezes, raramente.
Esse tipo de questão é recomendado para testes rápidos ao final de uma aula,
de um seminário, de uma discussão, pois um número extenso de questões pode
ser respondido em um tempo relativamente curto e possibilita a abrangência dos
conteúdos estudados. Embora possa avaliar níveis complexos de pensamento,
seu uso é mais restrito à recordação ou à recuperação de um fato ou de uma
informação; explicações e inferências dificilmente podem ser reduzidas apenas a
uma afirmação.

127
GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

Convém chamar a atenção sobre a limitação desses itens: a possibilidade de


acerto por acaso, pois há 50% de probabilidade de o aluno acertar, ao escolher
entre duas alternativas, o que se faz acompanhar de baixo valor diagnóstico. Ao
assinalar que a questão é falsa, não se tem segurança se o aluno conhece a res-
posta verdadeira. Esta limitação pode ser minimizada com a utilização de outras
modalidades deste tipo de questão: verdadeiro-falso com justificativa e verdadei-
ro-falso modificado.

• Orientações para elaboração


Qualquer modalidade de resposta alternativa obedece às mesmas orientações
para elaboração, que são apresentadas a seguir:
1. Inclua em cada enunciado somente uma ideia central.
2. Redija o enunciado de forma inequívoca.
3. Mantenha curtos os enunciados e utilize uma linguagem simples.
4. Use raramente enunciados negativos e evite duplas negações.
5. Referencie a fonte quando se tratar de enunciados de opinião.
6. Evite indícios estranhos para a resposta como:
–  utilização de termos absolutos (ex.: sempre, nunca) e qualificadores
(ex.: melhor, pior);
–  redação mais extensa para a resposta correta;
–  desequilíbrio no número de respostas verdadeiras ou falsas.

Exemplos:
Assinale V ou F conforme julgar a afirmativa verdadeira ou falsa.
1. (V)  (F) Questões objetivas oferecem maior amostragem do conteúdo a
ser avaliado do que questões de resposta livre.
2. (V)  (F) Questões objetivas possibilitam ao aluno expressar as próprias
ideias.
3. (V)  (F) De acordo com o Projeto Pedagógico Institucional da PUCRS, a
avaliação orienta a tomada de decisões, tendo como funções o diagnóstico
e a mediação.

128
POR QUE FALAR AINDA EM AVALIAÇÃO?

Questões de verdadeiro-falso com justificativa

Consistem numa afirmação que o aluno deve julgar verdadeira ou falsa e,


posteriormente, justificar sua resposta. É indispensável que o professor esclareça
a necessidade da justificativa, sem o que a modalidade da questão se torna igual
à anterior.
Exemplo:
(V)  (F) Questões de dissertação possibilitam avaliar a capacidade de organi-
zar e expressar suas ideias por escrito.
Justifique sua resposta:_______________________________________

Questões de verdadeiro-falso modificado

Consistem numa afirmação que o aluno deve julgar verdadeira ou falsa. Caso a
julgue verdadeira, ele deverá somente assinalar Verdadeira (V). Caso a julgue fal-
sa, ele deve marcar F no espaço correspondente e escrever dentro dos parênteses
as expressões que, substituindo as sublinhadas, tornem a afirmação verdadeira.
Exemplos:
Assinale V se a afirmativa for verdadeira, e F se for falsa. Se for falsa, preencha
a lacuna entre parênteses com as palavras que, substituindo as palavras sublinha-
das, tornam verdadeiras as afirmações. (As questões 1, 2 e 3 já estão respondidas
nos exemplos para mostrar como deve ser a resposta do aluno).
(V)  (F) (...............................) Questões dissertativas possibilitam avaliar a cria-
tividade do aluno.
Comentário: Como a questão é verdadeira, o aluno apenas assinala V e deixa
vazia a lacuna entre parênteses.
(V)  (F) (questões dissertativas) Nas questões objetivas, o aluno tem oportuni-
dade de organizar sua própria resposta.
(V)  (F) (questões objetivas) Habilidade de leitura do aluno e acerto casual
influem nas respostas a questões dissertativas.

Comentário: Como as questões 2 e 3 são falsas, o aluno assinala F e substitui


as expressões sublinhadas por outras que tornem verdadeira a afirmação.

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GRILLO, M. C.; GESSINGER, R. M.  —   Contribuições para a elaboração de questões objetivas

Considerações finais

O material aqui apresentado não esgota todas as variedades possíveis de itens


de avaliação, objetivos ou dissertativos. Cada professor pode criar novas modali-
dades em consonância com as especificidades das disciplinas, mantendo a relação
necessária entre ensino, aprendizagem e avaliação, tendo o cuidado de considerar
o instrumento como apenas uma possibilidade, entre muitas, de obtenção de da-
dos para a avaliação da aprendizagem.

Referências

MEDEIROS, Ethel B. Provas objetivas: técnicas de construção. 6. ed. Rio de Janeiro:


Fundação Getúlio Vargas, 1981.
VIANNA, Heraldo Marelim. Testes em Educação. 3. ed. São Paulo: IBRASA, 1978.

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