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PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

E m decorrência da enorme aceitação de Yom


Tov Shel Rosh Hashaná 5659 – o primeiro
discurso publicado da série “Herança Chassídica”,
temos o prazer de apresentar uma tradução para o
inglês do discurso chassídico intitulado “Vayishlach
Yehoshua”. O discurso foi proferido pelo Rebe
de Lubavitch, Rabi Menachem M. Schneerson,
de abençoada memória, no encontro chassídico
de Shabat Parashat Shelach, 28 de Sivan de 5736
[1976], e mais tarde publicado em 5748 [1988].
No quinquagésimo aniversário de sua chegada aos
Estados Unidos, 28 de Sivan 5751 [1991], este
maamar foi reimpresso como parte de uma edição
especial para o aniversário. O Rebe, pessoalmente,
deu este folheto (junto com uma nota nova de
um dólar para ser distribuí­do para caridade) para
milhares de chassidim, homens, mulheres e crianças.

O discurso, baseado nas primeiras palavras da


Haftará, lida no Shabat Shelach, discorre sobre as
diferenças entre os espiões enviados por Moshé e
os enviados por Yehoshua, explorando o significado
espiritual de ambos e sua aplicação em nossa vida,
hoje em dia.

Em acréscimo à tradução do discurso e das


notas de rodapé anotadas pelo Rebe, outras notas
de rodapé foram acrescentadas para melhor
esclarecer o texto. Também, algumas das notas do
Rebe foram elucidadas. Além disso, muitas das
referências contidas nas notas de rodapé foram
citadas e explicadas. O texto hebraico do discurso
foi recomposto com as vogais para ampliar a
utilização deste volume.

Rabino Yossef Marcus traduziu o texto e deu-lhe


uma visão mais ampla. Agradecimentos especiais
para os Rabinos Yossef B. Friedman por sua
orientação editorial e Shmuel Marcus, que preparou
este volume para publicação.

Kehot Publication Society


11 de Shevat, 5761
Brooklyn, N.Y.
INTRODUÇÃO E SUMÁRIO

O HOMEM MÉDIO:
O Talmud (Berachot 61b) classifica as pessoas em três
grupos:
Tsadic — o justo, que é governado por sua boa inclinação;
Rashá — o perverso, que é governado por sua má incli-
nação e;
Beinoni — o intermediário ou mediano, que é governado
por ambas.

A maior parte das pessoas, sem dúvida, ter-se-ia


classificado na terceira categoria, especialmente se
elas não leram o Livro dos Beinonim, opus magnum
de Rabi Shneor Zalman de Liadi, conhecido por
Alter Rebe, fundador do Chassidismo Chabad-Lu-
bavitch. No primeiro capítulo do livro do beinoni,
conhecido normalmente como Tanya, o Alter Rebe
questiona a concepção comum do beinoni como
sendo alguém cujos atos são metade corretos e
metade ruins.

O Alter Rebe cita o caso do sábio talmúdico,


Rába, que se ofereceu como exemplo de um beinoni
(Berachot, ibid.). É possível que Rába, um homem
ao qual o Anjo da Morte foi incapaz de matar porque
sua “boca nunca cessava de estudar Torá” (Baba
Metsia 86a), pensava que seus atos eram metades
ruins? (Humildade não significa falta de senso de
seu verdadeiro nível).

Também, quando uma pessoa comete um pecado,


ela é denominada rashá até que se arrependa; se ela
se arrepende, ganha o status de um tsadic completo.
Então, quando ela tem chance de ser um beinoni?

O beinoni também não pode ser uma pessoa que


comete pequenos pecados, uma vez que o Talmud
atribui o status de rashá mesmo para alguém que
falha em repreender seu semelhante por seus maus
atos, ou mesmo para alguém que perde um minuto
que poderia ter sido utilizado para o estudo da Torá.

Então, quem é o beinoni?


O Alter Rebe começa nos relatando sobre o
tsadic. Explica que perfeição em atos não faz de
alguém um tsadic, que a diferença entre tsadic e
rashá não está no nível, mas na classe. O tsadic não
somente se comporta corretamente, ele é correto.
Ele não é tentado pelo mal. “Meu coração está oco
dentro de mim”, diz o salmista, significando que ele
se desfez de sua má inclinação (Baba Batra 17a).
Não é de se espantar que é dito que há poucos tsa-
dikim e, portanto, D’us os implantou em todas as
gerações (ver Yomá 38b).

Com a elevação do status do tsadic, o beinoni,


automaticamente, sobe de nível. Não há nada de
médio no comportamento do beinoni. Em compor-
tamento, ele é idêntico ao tsadic. É em seu coração
que ele é mediano, uma mistura equilibrada de tsa-
dic e rashá. Assim como o rashá, ele pode possuir
um desejo pelo mal, mas, como o tsadic, ele nunca
age neste sentido.

Halevai
Por causa de sua luta constante com o “outro
lado”, o beinoni fica frequentemente frustrado e
deprimido. Ele não consegue compreender por que,
no ápice de uma certa oração inspiradora, vêm para
ele pensamentos profanos. O Alter Rebe se refere
a estas frustrações no capítulo 27 do Tanya, livro
baseado nas sessões de aconselhamento dele para
seus chassidim:

“Sua depressão provém de um espírito arro-


gante, uma vez que ele não reconhece seu nível.
Por isto, seu coração dói, pelo fato de ele não
estar no nível de um tsadic, que certamente não
tem tais pensamentos sem sentido. Pois se ele
reconhecesse seu lugar, que ele está bastante
distante do nível de um tsadic e halevai (quem
dera), fosse um beinoni, e não um rashá, mesmo
por um instante durante todos seus dias, ele teria
percebido que esta é a natureza dos beinonim e
sua função, conquistar a má inclinação...

Portanto, não deixe o coração da pessoa so-


frer (...) mesmo que ela esteja nesta trilha, nesta
batalha, por todos os seus dias, pois, talvez para
isto ela foi criada...”.

Manjares
No Gênesis 27:4, Yitschac deseja abençoar seu
filho Essav e lhe pede “faça para mim manjares
como eu gosto”. De acordo com o Tikunei Zôhar,
estas também são as palavras da Shechiná, Presença

Divina, incumbindo Seus filhos, o povo judeu, a


cumprir sua missão Divina e, através disto, prover
a Shechiná com Suas “delícias”. Nota-se que man-
jares está escrito no plural, implicando dois tipos de
delícias. O Alter Rebe explica que estes se referem a
dois tipos de prazeres que D’us deriva de dois tipos
de serviços Divino neste mundo — o do tsadic e o
do beinoni.

“Assim como no alimento físico há dois


tipos de delícias — uma de alimentos doces
e a outra de alimentos picantes ou ácidos, que
tenham sido temperados e preparados até se
tornarem gostosos a ponto de revitalizar a alma
[assim também ocorre no serviço espiritual do
homem...].

A função do tsadic envolve doçura e luz,


enquanto que o beinoni luta contra a amargura
e a escuridão, transformando-as em delícias.”
Espionagem
O maamar presente explora a diferença entre
tsadikim e beinonim através da relação entre dois
contos bíblicos envolvendo espiões. Na primeira
história, os judeus estão para entrar em sua Terra
Prometida, mas sentem-se inseguros. Apesar da
natureza milagrosa de seu êxodo do Egito e da
passagem pelo Mar Vermelho, os judeus não estão
convencidos com a promessa de D’us de que con-
quistarão a terra — eles querem lutar uma batalha
convencional, incluindo o uso de espiões. Eles
exprimem sua vontade a Moshé, que conduz este
pedido a D’us.
D’us não fica satisfeito com esta falta de con-
fiança em Sua habilidade de lidar com os assuntos
de Seu universo, mas deixa a decisão para Moshé:
“mande para você’’, responde D’us, “de acordo
com sua decisão; Eu não lhe estou ordenando [a
mandar os espiões]” (Rashi). Moshé escolhe enviar
os espiões, que retornam dizendo que “não con-
seguiremos conquistá-la”. Os judeus acreditaram
nesta heresia e foram punidos por ela com mais 40
anos de caminhada pelo deserto, nos quais a gera-
ção do Êxodo falece, deixando somente seus filhos
entrarem na terra.

A segunda história de espiões ocorre antes de


os judeus, de fato, entrarem na terra. Moshé já ti-
nha falecido e Yehoshua, seu sucessor, envia dois
espiões para Jericó, a cidade de fronteira da terra,
que estão para herdar. Seu relatório: “as nações
estão tremendo!”. Os judeus conquistaram a terra
e permaneceram ali até serem expulsos por Nabu-
codonosor, séculos mais tarde.

Contrastes
Neste maamar, que é baseado num maamar do
Alter Rebe, o Rebe destaca duas diferenças básicas
entre os espiões de Moshé e os de Yehoshua.

1) D’us não ordenou a Moshé enviar espiões;


sua missão era, por assim dizer, opcional. A missão
dos espiões de Yehoshua, no entanto, foi ordenada
por D’us.1 

2) Moshé enviou seus espiões para examinar a


terra inteira, enquanto que os de Yehoshua se satis-
fizeram com uma visita a Jericó.2 
Para explicar estas diferenças, o maamar trans-
cende a manifestação física da história pela qual se
trata de uma ocorrência passada, e a transpõe para
os dias de hoje, extraindo dela uma ou duas lições:
levar-nos à manifestação eterna e espiritual, na qual
o homem “envia espiões” para avaliar e conquistar
“Canaã” — o corpo e “alma animal” — e transfor-
má-los em santidade, “a Terra de Israel”.

Jericó: Terra das Vestimentas


No plano espiritual, Jericó é o comportamento do
homem — seus pensamentos, fala e ação.3  Espiar e
conquistar Jericó significa ser um beinoni. O resto
da terra das sete nações é a psique humana, suas
emoções. Espiar e conquistar o resto da terra é ser
um tsadic.

Por isso, a missão de Moshé de espionar toda a


terra — examinar e santificar as emoções — não foi
ordenada por D’us, uma vez que não está ao alcan-
ce de toda pessoa cumpri-la. Somente Moshé, ou
aqueles que estão no mesmo nível espiritual que o
dele podem aspirar a isto. Por causa de sua missão,
D’us lhe diz: “de acordo com sua decisão’’, que,
em sua interpretação mística, significa: somente
você, ou pessoas como você, conseguem executar
isto.

A missão de Yehoshua, por outro lado, é um man-


damento não qualificado, aplicável a todas as
pessoas, uma vez que a conquista de Jericó — o
comportamento da pessoa — está ao alcance de
todo ser humano.

Seja um tsadic!
O Rebe não ficou totalmente satisfeito com a
explicação acima, uma vez que ela relega o signi-
ficado dos espiões de Moshé para tsadikim. Que
relevância ela tem para o beinoni?

Para responder, o Rebe refere-se à primeira sen-


tença do Tanya, uma cotação da mishná, tratado de
Nidá, final do capítulo 3:
[Antes de a alma descender à terra], ela é incum-
bida de um juramento: “seja um tsadic, e não um
rashá!”

De acordo com o Alter Rebe, a redundância do


juramento não é meramente um artifício enfático,
mas sugere uma mensagem de dois gumes: seja um
tsadic. No entanto, uma vez que a maior parte das
pessoas não tem potencial para se tornar tsadikim
— não seja um rashá, ou seja, ao menos seja um
beinoni.

Todavia, toda alma, até a do beinoni, é instruída a


ser um tsadic. Qual é o significado de uma instrução
que não pode ser executada?

Por isso, o Alter Rebe explica, que apesar de o


beinoni nunca alcançar o nível verdadeiro de um
tsadic, ele deve utilizar seu tempo para cultivar
uma consciência similar à do tsadic, ou seja, uma
repulsa por indulgências materiais, por um lado, e
a consciência do grande temor que se deve ter de
D’us, pelo outro:

“Apesar de saber que não vai alcançar este nível


verdadeiramente, somente na ilusão, mesmo assim,
ele deve fazer sua função de cumprir o juramento
a ele administrado: “seja um tsadic!” e D’us fará o
que é próprio aos Seus olhos. Mais ainda, o hábito
controla tudo e torna-se uma segunda natureza.

Quando ele se acostumar a abominar o mal, em


pequena escala, o mal se tornará abominável a seus
olhos. E quando começar a regozijar sua alma em
D’us, meditando na grandeza de D’us, então, o des-
pertar de baixo trará à tona um despertar de cima e
talvez, depois de tudo isto, um espírito de cima será
despejado sobre ele e merecerá que o nível da alma
de Ruach da raiz de algum tsadic impregne-se nele,
para que possa servir a D’us com verdadeira alegria
... Desta forma, o juramento que lhe foi conferido
para ser um tsadic será cumprido verdadeiramente.”

Esta, pois, é a relevância da missão dos espiões


de Moshé com o beinoni, já que também o beinoni
deve, em certo ponto, envolver-se no serviço seme-
lhante ao do tsadic.

Vestimentas
Agora o maamar inicia uma discussão, explican-
do porque o beinoni controla seus pensamentos,
mas não suas emoções.
Na terminologia cabalística e chassídica, a for-
ma de comportamento humano, pensamento, fala
e ação, são chamados de “vestimentas” da alma,
pois é através destas três vestimentas que a alma
se expressa. Assim como vestes em seu sentido
literal são acessórios adicionais à pessoa, e não a
própria pessoa, e portanto podem ser retiradas e
trocadas com pouco ou nenhum esforço — assim
as vestimentas da alma não são a alma em si, mas
sua plataforma para expressão e manifestação e,
portanto, podem ser mais facilmente controladas.
A consciência da alma, no entanto, o que ela ama
eteme, só pode ser trocada através de esforço tenaz
e assistência Divina.

A missão do homem médio é comportar-se; não


necessariamente mudar seu interior. Conquistar
Jericó e deixar o resto da terra para Moshé.

Prioridades
A ênfase no comportamento do beinoni não é
meramente resultado de sua desvantagem espiritu-
al. Não é uma rendição relutante à sua fragilidade
humana. Mais propriamente, o objetivo da vida do
homem está no aperfeiçoamento de suas “vesti-
mentas”, pois as vestimentas são mais importantes.

Muitas vezes, o que é percebido neste mundo


como secundário é, na realidade, mais elevado. O
que parece ser mundano e inconsequente é, às vezes,
mais sagrado e crucial. Por isso, em sua fonte, as
vestimentas do homem, tanto físicas, como espiri-
tuais, de fato, transcendem à própria pessoa. Fisi-
camente isto se reflete no fato de que roupas podem
dar à pessoa um prestígio, além de sua verdadeira
estatura. O sábio talmúdico, Rabi Yochanan,refe-
ria-se a suas roupas como “as que me honram”.

Espiritualmente, as vestes da alma Divina, isto


é, o cumprimento das mitsvot em pensamento, fala
e ação, elevam a alma acima de seu status natural.
Por outro lado, as vestimentas da alma animal, ou
seja, pensamento, fala e ação, sem nenhuma inten-
ção Divina — ou pior — degradam a alma animal,
além de sua inferioridade natural.

Conclusão
Portanto, o conselho do salmista é direto: “des-
vie-se do mal e faça o bem”. Este é o objetivo da
descida da alma das alturas celestiais para o mundo
da Kelipá e dos limites do corpo: elevar-se a um
nível do qual ela está inerentemente excluída. Isto
ocorre através do serviço das vestimentas, o cum-
primento de Torá e mitsvot na prática.

Mas não termina aí. Jericó é somente o “fecho”


da terra. Se alguém conquistar Jericó, o resto da
terra estará aberto perante ele, a terra das sete nações
— o serviço de transformar as sete emoções pode
ser alcançado. E, finalmente, na era messiânica, a
também transformação das três partes da mente, a
terra de Keini, Knizi e Kadmoni.

N. B. sobre a tradução para o inglês


Palavras inseridas pelo tradutor aparecem im-
pressas em letras menores [em colchetes]. As notas
de rodapé são de autoria do Rebe; as interpolações
do tradutor e notas de rodapé adicionais aparecem
impressas em letra menor [em colchetes]. Por
considerações estéticas, o tradutor também tomou
a liberdade de substituir alguns dos parênteses do
Rebe por hífens.
TRADUÇÃO E COMENTÁRIO

Com a ajuda dos Céus, Shabat Parashat Shelach,


28 de Sivan, Shabat Mevarechim Tamuz 5736.
Espiões
“E yehoshua enviou ... Dois homens, espiões...1

No Likutei Torá (no maamar deste título2 ) está


explicada a diferença entre os espiões enviados por
Yehoshua e os enviados por Moshé. Em relação
àqueles enviados por Moshé, está escrito3 : “mande
para você”. Nossos Sábios interpretam o sentido de
para você: “envie espiões de acordo com sua decisão;
Eu não o estou ordenando a enviá-los”. No entanto,
o envio de espiões por Yehoshua ocorreu (não
segundo sua decisão, mas) por decreto de D’us.”4 

Outra diferença: os espiões enviados por


Yehoshua foram somente para Jericó, “o fecho
da Terra de Israel”5 , através da qual observaram
toda a terra.6  Por outro lado, os espiões enviados
por Moshé, atravessaram toda a terra, “em seu
comprimento e largura”.7 
O Fecho da Terra
2. O ponto do assunto é que o mandamento de
conquistar a Terra (no sentido espiritual) é — assim
como em todos os mandamentos da Torá — um
conceito eterno para cada geração.8  Conquistar a
terra no sentido espiritual significa que cada judeu
deve “conquistar”9  todas as faculdades e elementos
de seu corpo e alma animal10 — “a Terra de Canaã”
— e torná-los receptáculos para a Divindade —
transformando-os, assim, em “Terra de Israel”.
A diferença entre Jericó e o resto da Terra,
conforme representados na alma do homem, é a
seguinte:11

Jericó representa as três “vestimentas” 12 da alma,


pensamento, fala e ação. (A ligação entre Jericó e
vestimentas é que Jericó conota rêach, aroma,13 e
“vestimentas” se relacionam a aroma, conforme
insinua a expressão do Zôhar 14 “no aroma de suas
vestimentas”15).

O resto da Terra — a terra das sete nações16 —


está representado nas sete emoções do homem.

Portanto, o mandamento (a Yehoshua) de enviar


espiões para irem (somente) para Jericó, uma vez
que o pensamento, fala e ação estão sob o controle
do homem. Por isso, há uma ordem para que cada
pessoa “espie” e “examine” seus pensamentos,
fala e ação, e deve assegurar-se de que eles são
totalmente dedicados a D’us. Porém, as emoções do
coração não estão no controle de qualquer pessoa,
uma vez que tsadikim (somente) têm o controle de
seus corações”.17
Portanto, em relação aos espiões enviados por
Moshé para observar toda a terra (para examinar
as emoções e assegurar que elas sejam totalmente
dedicadas a D’us), está escrito “mande para você,
de acordo
com sua decisão; Eu não o estou ordenando”. Pois o
serviço de conquistar (completamente) as emoções
pode ocorrer somente através da revelação do nível
de Moshé, e este tipo de serviço não é relevante para
todas as pessoas igualmente.

Tsadikim e Beinonim
3. A Torá é eterna e aplicável a todas as pessoas.
Disto decorre que o fato de a Torá contar-nos
(também) do envio dos espiões (de Moshé) para
observar a terra toda é uma lição eterna para cada
judeu, mesmo àquele que não está no nível de
Moshé.

Podemos compreender isto introduzindo um


conceito discutido no Tanya 18 referente a tsadikim
e beinonim. O serviço Divino dos beinonim envolve
(principalmente 19) as vestimentas da alma —
pensamento, fala e ação. Por isto, o grau de beinoni
pode ser alcançado por toda pessoa. Pois mesmo
quando o coração almeja e deseja algum prazer
material, a pessoa é capaz de reter20 e controlar
o impulso de seu coração, não lhe permitindo
expressar-se em ação, fala e pensamento (ou seja,
não pensar sobre seu desejo21 voluntariamente), a
ponto de ser capaz de desviar totalmente sua mente.

O serviço dos tsadikim, por outro lado, envolve


principalmente as emoções do coração (amor e
temor a D’us); e não é toda pessoa que tem o mérito
de alcançar este nível de serviço, pois o homem
não tem tanta escolha em assuntos governados pelo
coração.

Mesmo assim, um juramento é aplicado (a


cada judeu) exortando-o: Seja um tsadic!22 —
significando que cada pessoa deve empreender-se,
até certo grau, em envolver-se na forma de serviço
dos tsadikim, conforme explicado extensivamente
no Tanya.23
Seja um tsadic !
4. Pode ser dito que isto explica a validade eterna
para cada geração24 do mandamento de aniquilar
as sete nações25 e conquistar sua terra — apesar
do fato de que a conquista de sua terra representa
a transformação das sete emoções da alma animal
para a santidade, e isto só é relevante para tsadikim;
e não é toda pessoa que merece isto26 — uma
vez que cada judeu deve fazer tudo o que está ao
seu alcance para cumprir o juramento que lhe é
aplicado: Seja um tsadic! 27

Isto explica porque a história do envio dos espiões


(por Moshé) para espionar toda a terra está escrita
na Torá (Torá na conotação de horaá, instrução28)
— uma vez que cada judeu deve “espionar” e
examinar suas emoções e assegurar-se de que elas
estão totalmente voltadas
para D’us. Só que mesmo assim, em relação aos
espiões de Moshé, está escrito: “mande para você —
por sua própria decisão, Eu não o estou ordenando”,
já que o principal da ordem de “espionar” e
examinar-se se aplica ao pensamento, fala e ação
(a conquista de Jericó), sobre os quais toda pessoa
tem o controle, o que não ocorre com as emoções
do coração.

Vestimentas
5. A razão para isto — que pensamento, fala e ação
estão sob controle do homem, diferentemente das
emoções do coração — é porque29 pensamento,
fala e ação são vestimentas da alma. Por isso,
assim como as roupas do corpo — apesar de o
homem necessitá-las (com o propósito de modéstia,
uma vez que “eles, Adão e Eva, estavam com
vergonha”,30 e também com o intento de proteger-
se do frio e do calor), mesmo assim — ele pode
tirá-las; e certamente ele não necessita essas roupas
específicas (que está utilizando agora), podendo
trocá-las por outras.

Similarmente ocorre com as vestimentas da alma.


As vestimentas fala e ação podem ser “despidas”;
inclusive o pensamento, que está constantemente
ativo e não pode ser “despido”, pode ser trocado
por um pensamento diferente.31 Porém, o intelecto e
emoção do homem são a essência da própria alma32,
então, é necessário muito esforço — e até uma força
especial de Cima — para trocá-los.
Origens sublimes
6. Pode ser dito que isto (que pensamento, fala e
ação são vestimentas) é também uma das razões
pelas quais a experiência de pensamento, fala e
ação são mais relevantes do que as emoções. Em
outras palavras: o fato de que o assunto principal
exigido de cada pessoa é o serviço de controle do
pensamento, fala e ação, é — não somente porque
eles estão sob o domínio do homem, conforme
mencionado acima, mas também, — porque eles
são mais relevantes.

Isto será entendido antecipando-se um conceito


explicado em vá­rias fontes33 referente a vestimentas,
a saber, que a origem das vestimentas transcende a
origem da pessoa que as veste.

Esta superioridade primordial é aparente mesmo


no estado material das vestimentas. Por isso as
vestimentas “envolvem” a pessoa e conferem-lhe
uma beleza e esplendor adicional. Rabi Yochanan
chamava as suas vestes “as que me honram” 34 pois,
em sua origem, elas transcendem o ser humano.
Similarmente ocorre com as vestimentas da
alma — pensamento, fala e ação — cuja origem
transcende a alma.

Por conseguinte, através do pensamento, fala e


ação dos 613 mandamentos, que são as vestes da
alma Divina,35 a alma é elevada acima de seu nível
natural.36

(Este também é o significado de as mitsvot


serem vestimentas para a alma, significando que,
especificamente através delas, a alma pode desfrutar
do esplendor da Presença Divina, como explicado
extensivamente em várias fontes,37 inclusive no
maamar com o mesmo
título no Likutei Torá).38

De maneira oposta, através do pensamento, fala e


ação de assuntos mundanos, que não são realizados
com a finalidade dos Céus — ou seja, as vestimentas
da alma animal — esta alma sofre uma queda que
excede sua inferioridade natural.39

E, uma vez que a alma Divina está investida na


alma animal, a descida desta última causa também
uma descida na primeira; a alma animal faz descer
também a alma Divina (que está nela investida) ao
nível mais baixo dos baixos.40

Por esta razão, o principal serviço do homem


é “desviar-se do mal e fazer o bem” 41 na prática,
concretamente, em pensamento, fala e ação,42 pois
o propósito da descida da alma para baixo é que,
através de seu serviço em baixo, ela suba acima de
seu estado natural (seu estado pré-descida). Esta
elevação ocorre somente através do serviço das
vestimentas, pensamento, fala e ação, similar ao
efeito das vestimentas em seu sentido literal, que
acrescentam beleza e esplendor à pessoa que as
veste, etc.
Esta é a razão pela qual Jericó é considerada o
“fecho” da Terra de Israel, uma vez que através
do serviço de “desviar-se do mal e fazer o bem”
em pensamento, fala e ação (e mais ainda quando
a pessoa realiza o “envio de espiões para Jericó”,
para espiar e examinar o pensamento, fala e ação e
assegurar que eles estejam totalmente voltados para
D’us), a pessoa alcança43 o serviço de refinamento
e transformação das emoções, ou seja, a conquista
da terra das sete nações, e, mais ainda, “o Eterno,
teu D’us, expandirá tuas fronteiras”,44 referindo-se
à conquista das terras de Keini, Knizi e Kadmoni45
na Era Messiânica, que representam os três atributos
intelectuais,46 com a vinda do justo Mashiach,
literalmente em breve.
PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

T emos o prazer de apresentar uma


tradução para o inglês do discurso
chassídico intitulado Mayim Rabim 5738. O
discurso foi pronunciado pelo Rebe de Lubavitch,
Rabi Menachem M. Schneerson, de abençoada
memória, em Motsaei Shabat Noach 5738 (1977).

O discurso aqui apresentado pela primeira vez,


em inglês, é direcionado a quem se sente à vontade
com o materialismo, mas que está se empenhando
para ter acesso à espiritualidade. Baseado num
versículo do Cântico dos Cânticos, o discurso
inicia com uma declaração inequívoca: não importa
quanto uma pessoa está submersa em materialismo,
a chama da alma arde para sempre. Portanto, não há
razão para se desesperar ou perder as esperanças,
D’us nos livre, pois nada pode extinguir o amor
ardente da alma pelo Criador.

Em adição à tradução do discurso e das notas


do Rebe, foram acrescentadas notas para clarificar
melhor o texto. O texto hebraico do discurso foi
reimpresso com os sinais das vogais para ampliar
o uso deste volume.

Agradecimentos a Rabi Yossef B. Friedman,


Shmuel Marcus, Avraham Vaisfiche, Shmuel Rabin
e Dovid Olidort.

3 de Tamuz, 5761
Brooklyn, N.Y.
Kehot Publication Society
INTRODUÇÃO E SUMÁRIO

“Este é o erro dos homens de negócios que


pensam serem incapazes de adquirir o mesmo
crescimento espiritual através da oração como
os que passam seus dias na “tenda da Torá”.
O contrário é a verdade: sua oração é até mais
elevada, uma vez que luz em abundância é
produzida pela constante luta contra a escuridão...”

Rabi Shneor Zalman de Liadi (Torá Or, Noach, 9a)

Um dos maiores obstáculos para se viver uma


vida orientada espiritualmente é a responsabilidade
de obter sustento. De acordo com a Chassidut, foi
esta a razão que levou vários dos espiões (enviados
por Moshé para espionar a Terra de Israel) a rejeitar
a Terra que lhes foi prometida. Preferiam a vida no
deserto, envolvidos pelas nuvens de glória, pela
maná e pelo poço de Miriam, onde suas necessidades
materiais eram supridas e onde podiam passar todos
os seus dias estudando, rezando e meditando.
Não queriam entrar na “terra que consome
seus habitantes”1 com seus assuntos mundanos.
Permanecer num “céu espiritual”, no entanto,
não é uma opção para a maioria das pessoas.
Devemos “entrar na terra” e viver de acordo com
as suas regras. De fato, é através desta “entrada”
que o objetivo da Criação é alcançado: fazer do
mundo mundano um lugar para a Divindade. Este
objetivo não pode ser alcançado por aqueles que
passam seus dias isolados da existência material.

Todavia, a Torá aconselha a pessoa a permanecer


indiferente mesmo quando envolvida na procura
de seu sustento: “Quando você come do trabalho
de suas mãos”2, diz o salmista – deixe sua mente
e coração permanecerem livres para assuntos mais
elevados (uma conhecida história chassídica conta
sobre um chassid que envolveu-se exageradamente
em seu negócio de botas. O Rabi Shalom Dov-
Ber de Lubavitch (1860-1920) disse-lhe: “Pés nas
botas, tenho visto – mas cabeça nas botas...?”).

Na realidade, uma pessoa deve criar uma vestimenta


natural para receber e “vestir” as bênçãos Divinas,
mas estas não devem ser maiores do que o necessário.
De fato, uma vestimenta extragrande provavelmente
levará a pessoa a tropeçar, D’us nos livre.

Este, no entanto, não é o principal assunto do


maamar. Aqui, o Rebe se dirige à pessoa que está
perturbada por preocupações materiais, que está, de
fato, inundada por interesses mundanos. Será que
esta pessoa esta espiritualmente perdida ? Poderá
a sensibilidade Divina de sua alma sobreviver à
investida do “mundo real?”

Muitas Águas
O Rebe cita um versículo – também relatado
por Rabi Shneor Zalman de Liadi (1745-1812)
em seu maamar com o mesmo título – do Cântico
dos Cânticos do Rei Salomão: “Muitas águas não
conseguirão extinguir o amor e rios não poderão
removê-lo”.3

Em sua interpretação chassídica, este versículo


fala das “muitas águas”, que alude às preocupações
financeiras que “removem” a alma. Conta sobre
os “rios” correntes constantes dos pensamentos
mundanos que ameaçam extinguir o amor inerente
da alma por D’us.
Obviamente, o versículo não está falando de
alguém que alcançou clareza espiritual. Nem se
refere a quem mantém um envolvimento mental
saudável e necessário em assuntos mundanos.
Antes, o versículo trata de uma pessoa para a qual
preocupações mundanas são como um constante
rio corrente que não cessa.

Rabi Shmuel de Lubavitch – o Maharash (1834-


1882), em seu maamar deste mesmo título elabora
sobre este assunto. A cada bifurcação a pessoa fica
incerta se agir de uma forma ou de outra e vacila
incessantemente entre as opções. A mente está, desta
forma, ocupada com preocupações e não consegue
focalizar objetivos mais elevados (a opressão de
tais pensamentos se expressa no truísmo “não há
nada mais confortante do que o esclarecimento das
dúvidas”4).

Rabi Shmuel também evidencia o fenômeno de


pessoas que estão prontas a colocar sua vida em
perigo com o intuito de encontrar joias e diamantes.
Tal obsessão deve levar à ruína da alma. Mesmo
assim, diz o versículo, o amor a D’us, mesmo de
uma alma oprimida, não pode ser abafado. Ele está
imune às agressões à sua natureza.

Por quê? Por causa de sua raiz na essência de


D’us.

A Raiz da Alma
Quando Moshé pede a D’us para mostrar-lhe
“Sua glória”5, Ele diz “Te porei na fenda da rocha”6.
Esta rocha se refere “A Rocha”, a origem mais
primordial de toda a Criação.

A imagem de uma rocha, explica Rabi Shneor


Zalman, é usada para aludir ao sílex, que contém o
potencial para o fogo, mas não este propriamente
dito. Este nível é um passo acima do representado
pela brasa, que também contém fogo. Mas,
enquanto o fogo contido nas brasas pode ser
facilmente revelado meramente abanando-as, o
fogo da rocha pode ser somente eliciado através
do empenho em friccionar a rocha. Mais ainda,
se alguém colocar as brasas na água, seu fogo se
extinguirá.

O mesmo não ocorre no caso da rocha, pois esta


contém o potencial para o fogo, não o fogo em si7.

Então, quando D’us coloca Moshé dentro da


Rocha, significa que ele está recebendo uma vaga
revelação da realidade mais próxima da essência
Divina – o local onde toda a Criação existe em sua
forma mais sublime e indefinida8.

A alma também deriva deste local. Portanto,


mesmo quando é inundada com “muitas águas”,
sobrevive. De fato, mais do que sobrevive.

Ao Contrário
As “muitas águas” citadas no Cântico dos
Cânticos aparecem anteriormente na Torá, sob
forma das “muitas águas” que inundaram a
Terra nos tempos de Noach. Estas águas também
representam a inundação de pensamentos mundanos
que cercam “a arca”, o oásis da Torá e da oração do
dia a dia do ser humano.

No entanto, Rabi Shneor Zalman vê as águas


do Dilúvio como mais do que um instrumento de
punição para um mundo corrupto. Os quarenta dias
e noites das “águas de Noach”9, como são chamadas
pelo profeta Isaías, serviram para purificar o mundo,
assim como as quarenta seá10 de água que são
necessárias para fazer um micvê.

Desse modo, as águas do dilúvio trouxeram


Noach – tranquilidade para os mundos.

Então, qual é o certo? Será que as águas são


distrações mundanas ou agentes purificadores? A
resposta é: ambos. Pelos desafios e escuridão que
apresentam, dão à alma a oportunidade de descobrir
suas capacidades mais íntimas.

Por isto, as águas do dilúvio não somente deixam


de submergir “a arca” da oração e do estudo, mas
elevam-na11.

Pois enquanto a alma está no céu, existindo


num plano puramente espiritual, é como um anjo,
chamado de omêd (estático), que permanece no
mesmo nível. Somente através de sua descida para
dentro do corpo e para o mundo físico, ela pode
tornar-se mehalech, que ascende de um nível a
outro.
As “muitas águas”, que desafiam a alma, também
permitem ascender a um nível mais elevado do que
lhe é natural.

De fato, este é o verdadeiro propósito das


“muitas águas” – sua razão de ser.

Por isto não conseguem retirar o fogo da alma,


pois elas foram criadas para atingir o contrário,
impulsionar e elevar a alma.

Atualizando
Aqui o Rebe desperta uma questão baseada na
premissa de que a alma está enraizada na essência
de D’us, acima de qualquer manifestação d’Ele.

O Rebe prova esta afirmação citando um Midrash


singular:

Com quem D’us Se consultou [se criar ou não o


mundo]? – Com as almas dos justos12.

Em outras palavras, a alma do homem existia


antes da criação de qualquer realidade fora d’Ele,
que inclui as manifestações de Divindade mais
elevadas (D’us não é impelido a manifestar a
Si mesmo de forma alguma; portanto, qualquer
manifestação d’Ele é produto de Sua decisão de
criar tal manifestação). D’us, por assim dizer,
consultou-Se com as almas dos justos, que o Rebe
interpreta como sendo todas as almas, se deveria ou
não iniciar o processo da Criação que se iniciava
com a criação dos mundos mais elevados.

Então, a alma do homem não é uma criação;


é parte da essência de D’us. Se é assim, como se
pode dizer que a alma desce à Terra para poder,
eventualmente, alcançar um nível superior? Que
nível é mais elevado do que a essência de D’us?

Para responder, o Rebe cita um ensinamento


do Maguid de Mezritch que explica a afirmação
do Midrash: “Israel despertou no pensamento de
D’us”.13

O Maguid explica que assim como uma pessoa


pode visualizar a imagem de seu filho, mesmo
quando este não está presente, assim D’us visualizou
a alma do homem mesmo antes dela ter sido criada.

O Rebe explica este ensinamento do Maguid


significando que a existência de Israel no pensamento
de D’us se refere à visão de D’us da alma em seu
estado no plano terrestre.

De modo similar, Rabi Yossef Yitschac de


Lubavitch (1880-1950) explicou o Midrash, citado
sobre D’us “Se consultando com as almas dos
justos: D’us sentiu o “prazer” que Ele receberia do
serviço das almas em baixo e isto “impeliu-O” por
assim dizer a criar os mundos.

Então, quando se diz que a alma existe dentro da


essência de D’us, refere-se ao conhecimento Divino
de antemão de que a alma desceria ao mundo e
cumpriria o propósito da criação. E, apesar de não
haver dúvidas de que a alma terá sucesso em sua
missão, esta não atinge sua máxima perfeição até
alcançar seu objetivo de forma concreta.

Então, a elevação da alma que é alcançada através


de sua descida não se refere a uma elevação para
a uma manifestação de Divindade mais sublime,
mas à vantagem que ela adquire ao cumprir a missão
Divina de forma concreta.
TRADUÇÃO E COMENTÁRIO

Com a ajuda dos Céus, Motsaei Shabat


Parashat Noach
— no quarto do Rebe – 5738 (1977)

“Muitas águas não conseguem extinguir o


amor e rios não podem removê-lo”.1

Muitas águas, explicam nossos Mestres em


seus discursos, refere-se a todas as inquietações
financeiras e preocupações materiais que
atormentam os homens.2 Apesar de tudo, estes
não conseguem extinguir o amor a D’us latente
em toda alma judia.3

Mais ainda, rios não podem removê-lo:


mesmo quando estas preocupações materiais
estão aborrecendo demais até que “correm”
incessantemente, sem interrupção, como um
rio potente cujas águas escorrem com tremenda
força4, ainda assim não podem remover o amor
(nem extingui-lo).5
Trabalho Manual
2. Para explicar o termo [usado por nossos
Mestres] inquietações financeiras:

As Escrituras afirmam, “Quando comes do


trabalho de tuas mãos, [és louvável e tudo está
bem contigo]”6. Isto significa que o trabalho
para obter sustento deve envolver somente as
mãos da pessoa e não sua mente e coração.7
Certamente a pessoa deve trabalhar para
criar um receptáculo para a bênção Divina
de sustento (uma vez que o fluxo Divino de
energia é atraído para este mundo através da
“roupagem” da natureza8) como está escrito
“D’us o abençoará
(precisamente) em tudo o que você fizer”.9 De
fato (devido à enorme ocultação da natureza), às
vezes há necessidade de labutar arduamente para
obter renda.10 No entanto, o homem deve ocupar
somente suas habilidades mais externas em seu
trabalho (suas mãos e outros órgãos externos),
mas não suas faculdades mais íntimas e elevadas
(da mente e do coração).11 Realmente, estas
faculdades devem ser designadas somente para
servir ao Criador, que é a razão e o objetivo da
criação do homem.12

Na realidade, requer-se do homem utilizar


também seu intelecto em seu trabalho, uma vez que
o fluxo Divino de energia está oculto e obscuro nas
“roupagens” da natureza. Porém, ele deve utilizar
somente o necessário para seu trabalho, e não
como uma ferramenta para planejar e desenvolver
estratégias [para alcançar mais e mais riquezas].

Vestimentas
De fato, investir a mente e o coração no trabalho
é fútil, uma vez que “é a bênção de D’us que
enriquece”13, enquanto a ocupação da pessoa é
somente uma vestimenta para conter esta bênção –
não que a profissão cria concretamente a riqueza,
D’us nos livre. Então, dedicar-se excessivamente
às “vestimentas” de sua ocupação é similar a
vestir roupas em excesso, que “não traz benefício,
mas, ao contrário, causa maiores danos”.14

Isto, pois, é o que se pretende ao interpretar


muitas águas como inquietações financeiras:
apesar de a pessoa estar em nível espiritual tão
baixo que se torna subjugada a seus negócios
materiais e fica
inquieta por seu sustento (indicando que ela
ainda não internalizou o axioma de que “é a
bênção de D’us que enriquece”15), mesmo assim,
até preocupações como estas não conseguem
extinguir, D’us nos livre, o amor a D’us que existe
latente dentro de cada judeu.16

Ordem e Caos
3. A inovação de que “muitas águas não
conseguem extinguir o amor” pode ser entendida
considerando-se que estas “muitas águas”
(preocupações financeiras) têm sua origem no
mundo de Tohu17 que antecedeu ao mundo de
Tikun18. De fato, a razão pela qual são chamadas
de “muitas águas” tem (também) a ver com sua
raiz e fonte [Tohu] que são “muitas”.19 Portanto, a
inovação20 da asserção de que “muitas águas não
conseguem extinguir o amor e rios não podem
removê-lo” é que: apesar de “muitas águas” e
“rios” originarem-se do mundo de Tohu21, que
antecedeu ao de Tikun (de onde se originou a alma
Divina), mesmo assim, eles não têm força para
extinguir o amor da alma Divina, D’us nos livre.22

A Supremacia da Alma
A razão para isso é (conforme afirmado
anteriormente no versículo), “suas brasas são
brasas de fogo, a chama de D’us”23 – a alma Divina
e seu amor a D’us originaram-se da Essência da
Luz Infinita que é até mais elevada do que o mundo
de Tohu. Pois a origem do amor da alma Divina é
a “chama de D’us” na forma em que está ligada e
contida na “brasa” (brasas de “fogo”24) e, num plano
superior25, da forma como esta “chama” existe na
rocha26 (que está acima de Havaye27). Esta também
é a fonte da alma, como explicado no Likutei
Torá28 sobre o versículo “e o espírito retornará ao
Senhor que o concedeu”29, que “o Senhor” (que
e “concedeu” a alma) refere-se a este nível de rocha,
acima mencionado.

Alma Flutuante
4. Um ponto adicional:

Não somente que as “muitas águas” não são


capazes de extinguir o amor da alma por D’us
(D’us nos livre), ao contrário, elas agem como
um catalisador para intensificar o amor. Pois a
descida da alma para este mundo e sua submersão
sob as “muitas águas” da materialidade inflamam
a chama do amor, possibilitando que ela atinja
uma estatura espiritual mais elevada do que a que
desfrutava antes de sua descida.30

(Isto, de fato, é o propósito definitivo das


“muitas águas” – elevar a alma até mais alto e
intensificar seu amor. Portanto, elas nunca podem
realmente extinguir o amor da alma, uma vez que
o verdadeiro
propósito dessas mesmas águas é intensificar o
amor da alma.31)

O Poder do Retorno
Em termos do serviço Divino, o benefício
adquirido pela alma através de sua descida a este
mundo e sua submersão sob as “muitas águas”
da materialidade, mencionadas acima, é que,
através disto, ela adquire o potencial de teshuvá,
retorno32. Antes de sua descida ao corpo, as almas
são consideradas como tsadikim (justos) perfeitos.
Uma vez que elas descem em corpos, no entanto,
tornam-se baalei teshuvá, sobre os quais se diz
“no nível em que os baalê teshuvá se encontram,
tsadikim perfeitos não se encontram33. Mais ainda,
“tsadikim perfeitos não podem permanecer lá”34
– nem está em sua possibilidade35 permanecer no
nível dos baalê teshuvá36.

O Propósito da Descida da Alma


Isto explica porque é necessária a alma deixar
sua moradia celestial e descer, pois D’us deseja
que a alma experimente a forma
mais intensa do serviço Divino – a do baal teshuvá.
Teshuvá (no contexto da alma “retornando” à sua
raiz e fonte, mesmo quando não acompanhada de
pecado37) só é possível quando ela não se encontra
em seu lugar verdadeiro (sua raiz e fonte), pois só
então ela pode “retornar” à sua raiz e fonte. Esta
ideia está expressa no versículo “E o espírito (a
alma) retornará ao Senhor que o concedeu”38.

Conforme mencionado acima, baalei teshuvá


são mais elevados do que tsadikim (na realidade,
infinitamente mais elevados a ponto de que “no
nível onde os baalei teshuvá se encontram, tsadikim
perfeitos não conseguem permanecer”, conforme
citado). E, uma vez que antes de sua descida, a
alma está sob o aspecto de tsadikim, devemos
dizer que o benefício alcançado através da teshuvá
que lhe é introduzido em sua descida é que a alma
(não somente retorna à sua fonte original, o nível
de tsadikim, mas) ascende a um plano ainda mais
elevado do que estava originalmente39, a saber, ao
nível de “o Senhor que a concedeu”40.

A Fonte da Alma – A Essência de D’us


A Fonte da Alma – A Essência de D’us
5. Para compreender melhor a elevação adquirida
pela alma através de sua descida a este mundo
material, devemos primeiro analisar a “raiz”
verdadeira da alma.

A verdadeira fonte da alma é na Essência de D’us,


acima e além de qualquer manifestação Divina41.
Isto fica (também) evidente a partir da afirmação
de nossos Sábios “com quem D’us Se consultou
[se criar ou não o mundo]? Com as almas dos
tsadikim”42. O assunto da “consulta” não foi somente
em relação à criação de nosso mundo, mas também
sobre a existência das mais sublimes manifestações
de Divindade (uma vez que sua existência se deu
pela Vontade de D’us e não é compulsória, D’us nos
livre)43. Portanto, as almas que foram consultadas a
respeito desta decisão devem estar enraizadas acima
de qualquer manifestação Divina44, na própria
Essência de D’us. Mesmo assim, ainda é possível
dizer que através do aspecto de teshuvá (adquirido
durante sua descida), elas são elevadas a um nível
superior ao de sua fonte original.
Imagem de Pai e Filho
Isto pode ser compreendido ao examinar a
afirmação de nossos Sábios “ o povo de Israel
despertou no pensamento (Divino)”.45 Rabi Dov
Ber, o Maguid de Mezritch46, explica isto com
uma parábola.47 Um pai pode “ver” seu filho em
sua mente depois deste ter deixado sua presença
fisicamente e não estar mais em sua frente, uma vez
que a imagem do filho está gravada na mente do
pai. Há, porém, uma diferença fundamental entre
a forma como este conceito se aplica aos homens
e em relação à D’us, pois somente depois que um
homem tem, de fato, um filho, sua “imagem” pode
estar gravada em sua mente. O mesmo não ocorre
com D’us: a imagem de Israel já estava gravada
em Sua mente mesmo antes deles existirem.

Conforme disseram nossos Sábios, de abençoada


memória, “Israel despertou no pensamento (de
D’us)” – mesmo antes de sua criação, pois D’us
não está ligado às limitações de tempo; para Ele,
passado, presente e futuro são simultaneamente
um.48
Na Mente de D’us – Almas Criadas
Da explicação de Rabi Dov Ber, fica claro
que quando dizemos que as almas “tem sua raiz
na Essência de D’us” e que “D’us Se consultou
com as almas dos tsadikim (se criar ou não)”,
estamos nos referindo às almas não como existem
num plano totalmente celeste que antecede à sua
descida, mas sim, às almas como se tornaram uma
entidade criada (e desceram para este mundo). Só
que a imagem dessas almas (também) está gravada
na mente de D’us, uma vez que para Ele, passado,
presente e futuro são um.

Este também é o significado da afirmação “com


quem Se consultou? Com as almas dos tsadikim”:
D’us anteviu o prazer que Ele ia receber das almas
cumprindo seu serviço Divino embaixo.49

Potencial e Realidade
Agora podemos compreender como é possível a
alma elevar-se acima de seu nível original através
de sua descida, pois o fato de a
alma estar enraizada originalmente na Essência
de D’us (e Ele Se consultou com elas, etc.) é
meramente a forma de D’us antever que ela vai
eventualmente descer a este mundo e realizar seu
propósito. E, apesar de que inicialmente D’us sabe
com certeza absoluta que a alma vai cumprir seu
propósito, mesmo assim, antes de descer de fato a
este mundo, isto fica em estado potencial.

E o último intento Divino só se concretiza


quando a alma desce a este mundo e efetua sua
missão na prática.50

(Alude-se a isto também na afirmação “Com


quem D’us Se consultou? Com as almas dos
“tsadikim”. No estado de consulta – um estado
potencial anterior à Criação, onde D’us sabe
que cumprirão Suas intenções) – as almas são
consideradas “tsadikim”, pois ainda devem
revelar seu potencial latente. Mas, depois delas
descenderem para baixo – e efetuar o intento
Divino concretamente – são elevadas ao nível de
baalei teshuvá, pois passaram para a prática seu
imenso potencial.51)
Descida ao Ciclo Anual
6. Isto também está ligado com a ideia de “E Yaacov
foi para o seu caminho”52 (versículo associado
especificamente a Motsaei Shabat de Parashat
Noach53). Após o mês de Tishrei, a pessoa “vai
para o seu caminho”, desce da elevação espiritual
de Tishrei para o âmbito de ocupações pessoais e
assuntos mundanos. Ela pode estar tão inundada
com ocupações terrenas que estas dão a impressão
de serem tumultuosas como as “muitas águas”
citadas. No entanto, não só a pessoa tem força
para se sobrepor a essas pressões e conservar
sua integridade espiritual, mas ainda mais, esta
“descida” em si eleva-a a um nível superior ao
precedente, pois através desta ela se torna um
mehalech, um homem de movimento.54 Conforme
as Escrituras afirmam: “E Yaacov foi para o seu
caminho”55: através de sua descida para Charan,
ele se tornou um homem dinâmico e ativo.

Alegria – Emancipação Definitiva


Além disso, uma vez que a pessoa está
consciente da verdade – que o propósito da descida
(em seus assuntos pessoais, etc) é para levá-la a
uma elevação maior – seu receio pela viagem se
desfaz, sendo substituída por uma imensa alegria
e satisfação (conforme está escrito sobre a viagem
de Yaacov “E Yaacov levantou suas pernas...
motivado pela notícia das boas novas”56). E,
através da alegria, a pessoa serve a D’us com
total perfeição, além dos limites naturais de sua
personalidade (quer dizer, servir a D’us “com
todo seu poder”) – pois “a alegria quebra todas as
barreiras”.57

Bênção Final
Quando a pessoa serve a D’us com perfeição
completa e um coração satisfeito (nas três áreas
– estudo da Torá, oração e boas ações – que
correspondem aos três filhos de Noach58), ela
recebe a bênção Divina para tudo o que necessita
(nas três áreas: filhos, saúde e sustento59). Essa
bênção é completa, proporcionando-lhe muita
alegria e um coração satisfeito; bênção tanto em
assuntos espirituais como materiais, e, finalmente,
bênçãos espirituais e materiais simultaneamente.
INTRODUÇÃO
ESBOÇO HISTÓRICO

1. Chicago, Nissan 5690 (1930)

O sexto Rebe de Lubavitch, Rabi Yossef Yitschac


Schneersohn, de abençoada memória, tinha acabado
de terminar uma visita a Chicago de onze semanas,
durante sua estadia de dez meses nos Estados
Unidos. Tendo chegado a N. York em Elul de 5689
(1929), o itinerário de Rabi Yossef incluía visitas
para algumas grandes metrópoles como Philadelfia,
Milwaukee, Detroit, S. Louis e Boston.

A viagem de Rabi Yossef Yitschac tinha duas


metas. Primeiro ele queria conscientizar o público
sobre a terrível situação dos judeus russos na época.
Depois, queria incentivar e encorajar Yidishkait
(judaísmo) na América.1

O itinerário de Rabi Yossef Yitschac também


incluía uma visita a Washington, onde seria
recebido pelo presidente Herbert Hoover na Casa
Branca. Aqui, ele agradeceria ao presidente pela
liberdade de religião concedida pelos Estados
Unidos e pelo interesse do governo no bem estar
das comunidades judaicas no exterior.

Naqueles dias, Chicago abrigava um grande


número de Chassidim de Lubavitch. Os Chassidim
estabeleceram alguns shuls (sinagogas) de
Lubavitch, incluindo Anshei Lubavitch, Beit
Hacnesset Tsedec, Shaarei Tefilá Benei Reuven e
Shaarei Tefilá Nussach Ari.

Esses shuls alojaram os encontros públicos de


Rabi Yossef Yitschac, onde centenas e, às vezes,
milhares de pessoas fluíam para ouvir suas palavras
de Torá e de inspiração.

Durante sua estadia em Chicago, Rabi Yossef


Yitschac pronunciou onze discursos chassídicos.
O maamar aqui apresentado “Unidade na Criação”
foi o último discurso pronunciado em Chicago e
começa com as palavras Kol Hamaarich Beechad.
Foi pronunciado num “encontro de Chassidim,
Anshei Chabad, na cidade de Chicago, no Beit
Hacnesset Lubavitch, Motsaei Shabat Codesh,
Shemini, 28 de Nissan 5690 (1930).2

Na manhã seguinte, domingo, véspera de Rosh


Chodesh Iyar, Rabi Yossef Yitschac viajou para
Detroit. Numa carta datada daquele dia, em Detroit,
ele escreve:

“No dia de Shabat, eu estava introspectivo,


pensativo. Eu deveria pronunciar um discurso
chassídico, despedir-me e compartilhar algumas
palavras que deveriam ser lembradas. Depois,
eu deveria falar individualmente com algumas
pessoas. Esta seria uma tarefa e tanto”.

Próximo a Shabat, os Chassidim se juntaram


no shul de Lubavitch. Cheguei às nove horas
e pronunciei um discurso chassídico intitulado
Kol Hamaarich Beechad Maarichim Lo Yamav
Ushnotav. Levou meia hora ou quarenta minutos
e, graças a D’us, a multidão era grande e atenta...

Depois, falei por aproximadamente quinze


minutos, compartilhando algumas palavras sinceras.
Por sete minutos (olhei no relógio – em cada shul
havia um grande relógio afixado na parede),
falei sobre quão pequeno e baixo o ser humano
pode ser e como os ensinamentos da Chassidut
orientam a pessoa sobre a forma pela qual deve
erradicar de si todos os traços negativos e implantar,
invariavelmente, bons traços, bons atos, compaixão
e boa disposição.

Concluindo, instruí o seguinte: 1) Em cada shul


chassídico, a cada dia – dia de semana, Shabat e dias
festivos – devem ser recitados Salmos, conforme sua
divisão pelo dia do mês. Em seguida, deve-se recitar
o Kadish. Outros shuls também são encorajados a
adotar este costume. 2) Quem se considera parte da
comunidade chassídica, deve estudar uma porção
de Chumash com Rashi todo dia”.

Rabi Yossef Yitschac, então, descreveu como


ele se dirigiu a toda a multidão e, particularmente,
aos jovens, os casados e os prestes a se casar. Ele
os persuadiu a fortificar seu compromisso com a
Torá e mitsvot com as seguintes palavras:

“Quando alguém viaja, adquire um bilhete que


o levará à estação de seu destino, e não além.
Nós também temos estações! ‘Estação tefilin’,
‘estação cashrut’, ‘estação Shabat’, ‘estação pureza
familiar’”.

Para que estação vocês estão viajando? Vocês não


colocam tefilin, não cumprem Shabat, não comem
[comida] casher, não praticam pureza familiar!
Até onde esperam viajar desta forma? Vocês
devem saber onde estão e qual será o resultado
disto. Apelo para que formem organizações nas
quais se organizarão para manter certos princípios.
Convoco-os e, através de vocês, a toda a juventude
de Chicago – estabeleçam-se firmemente e tomem o
futuro de sua vida familiar em suas mãos, e ficarão
repletos de alegria”.

[Concluí com] uma bênção sincera para a


multidão...: “Passem bem e que nos encontremos
em boa saúde com Mashiach na Terra de Israel!”.

[Uma das pessoas respondeu:] “Tenha uma


viagem segura e com sucesso! Não estamos
nos separando de você. Sua visita aqui ficará
sempre viva e aconchegante pelo ar bom,
caloroso e fresco que você trouxe para Chicago!”.

Foi uma despedida calorosa – todo o shul e


a galeria estavam lotadas e a atmosfera estava
repleta de amizade, um amor doce e nobre.

Quando ia descendo da bima, de todos os lados


do shul e da galeria a multidão aclamava “Tenha
uma viagem segura e com sucesso!”.

A rua estava cheia; a polícia em formação


enquanto uma vasta multidão esperava na rua.
Estava bem iluminado e eu estava nos degraus da
sinagoga e podia ver a imensa multidão. Disse:
“Passem bem e tenham sucesso em tudo!”.

“Cheguei à minha residência às 10h30 min”.


Assim termina a história da partida de Rabi Yossef
Yitschac de Chicago, a conclusão de uma visita
verdadeiramente memorável e inspiradora. Suas
palavras ecoam agora por três quartos de um século,
tocando incontáveis vidas e atraindo muitos judeus
mais próximos de sua tradição – em Chicago e pelo
mundo afora”.
TRADUÇÃO E COMENTÁRIO

Nossos Rabinos ensinaram: Escute, ó Israel, o


Eterno é nosso D’us, o Eterno é um. Até aqui é
requerida concentração do coração. Estas são as
palavras de Rabi Meir. Rava disse que a lei segue
de acordo com Rabi Meir.

Sumchus disse: “Todo aquele que se prolonga


[na pronúncia da palavra] echad (um) [a fim de ter
intenção apropriada,] tem seus dias e anos prolon-
gados”.

Rav Acha bar Yaacov disse: Esta [letra de echad


que requere prolongamento] é a dalet. Rav Ashi
disse: contanto que não se corra na [pronúncia da
letra] chet.

(Berachot 13b)
Com a ajuda dos Céus,
Reunião de Chassidim, Anshei Chabad, na cidade de Chicago,
No Beit Hacnesset Lubavitch.
Motsaei Shabat Codesh Shemini, 28 de Nissan, 5690 (1930).

Todo aquele que se prolonga [na pronúncia da


palavra] echad (um)1 tem seus dias e anos prolon-
gados.

Rav Acha bar Yaacov disse: esta [letra de echad


que requere prolongamento] é a dalet. Rav Ashi
disse: contanto que não se corra na [pronúncia da
letra] chet (Berachot 13b).

A ideia básica de estender-se na pronúncia da


palavra echad necessita ser elucidada, assim como
a razão pela qual os anos e dias da pessoa serem
prolongados como resultado.

Eis que a palavra echad é composta por três le-


tras – alef, chet e dalet. Devemos protrair o dalet,
contanto que não aceleremos na pronúncia do chet.
Devemos esclarecer a ideia de estender-se no da-
let e a advertência de Rav Ashi de não passar por
cima da letra chet, de onde se compreende que o
prolongamento do dalet não deve ocorrer às custas
do encurtamento do chet.

A Beráita
O ensinamento de “todo aquele que se prolonga
em echad...”, é continuação da seguinte Beráita 2:

“Escute, ó Israel, Havaye3 (o Eterno) é nosso


D’us, Havaye é um”.4

“Até aqui [ou seja, até o final do primeiro ver-


sículo do Shemá] é requerida concentração do
coração. Estas são as palavras de Rabi Meir. Rava
disse que a lei segue de acordo com Rabi Meir”.5
Duas Concentrações
Há dois tipos de concentração: concentração da
mente e concentração do coração. Concentração
mental requer compreensão intelectual – empregar
a mente para entender e captar um conceito até que
o domine e o compreenda em todos seus detalhes.
Concentração do coração significa trazer o enten-
dimento claro do conceito do plano abstrato para o
prático, cultivando traços de caráter refinado.6

Inicialmente, a pessoa deve dirigir seus esforços


para descobrir qualquer traço de personalidade que
não seja bom – e, certamente, qualquer que seja
repugnante – e deve, então, erradicá-lo totalmente.
Qualquer coisa imprópria, seja em seu relaciona-
mento com seus semelhantes ou com D’us, deve
ser rejeitada por ela. Todas suas energias e esforços
devem estar focalizados em implantar em si traços
nobres e comportamento apropriado.

Este é, pois, o significado de “concentração do


coração”: direcionar seu coração, uma vez que “o
coração distribui para todos os órgãos”7, para trazer
à tona toda qualidade distinta.
Havaye e Elokim
Eis que o recitar de “Escute, ó Israel... um” é um
chamado para nossa percepção e compreensão do
Criador. As palavras “Escute, ó Israel!” significam
que o judeu deve perceber, compreender e aprender
que Havaye é Elokênu (nosso D’us): que Elokênu,
ou seja, nossa força e vitalidade, é Havaye8. O nome
Divino Elokim denota força, como pode
ser observado no versículo “Ele levou embora tam-
bém os poderosos [elei] da terra”9, denotando poder
e força. Além disso, a palavra Elokim e a palavra
hateva (a natureza) são numericamente equivalen-
tes10, pois a natureza de cada coisa é, também, sua
força11.

Nós declaramos Havaye Elokênu: a força e vi-


talidade do povo judeu é Havaye, uma força que
transcende a natureza. A natureza é limitada por
tempo e espaço. Aquilo que é delineado no espaço,
está delimitado por seus limites.12 Da mesma forma,
algo delineado no tempo está restrito aos limites
de passado, presente e futuro. Havaye, no entanto,
indica que Ele era, é e será simultaneamente, pois
Ele transcende o espaço e o tempo.13

Este é o significado das palavras Havaye Elokênu


– a natureza do povo judeu é de trazer para dentro
das limitações de tempo e espaço a luz14 [Divina]
e a revelação que transcendem tempo e espaço.15
Echad Versus Yachid
O entendimento e compreensão de que Havaye é
Elokênu – que nossa força e vitalidade é Havaye que
transcende tempo e espaço – é alcançado através
da meditação na Unidade de D’us.

O significado de echad é um, similar à definição


da palavra yachid, que significa, único. No entanto,
a diferença entre echad e yachid conota único em
essência enquanto que echad conota unidade que
é discernida a partir de criaturas particulares e da
vivificação [da Criação].16 Em outras palavras, ao
contemplar a Unidade de D’us chegamos a este
reconhecimento de que Havaye Elokênu – de que
nossa força e vitalidade é Havaye.17

Portanto, a recitação do Shemá Yisrael requer


concentração da mente. Então, por que Rabi Meir
diz “até aqui é requerida concentração do coração”?

Escuro Seguido de Luz


Para compreender a solução da questão mencio-
nada acima, devemos antes apresentar a elucidação
da palavra echad.
Consta no versículo “E foi noite e foi manhã,
dia um (yom echad)”18. Este “um dia” incorpora
especificamente uma noite e uma manhã. Pois as 24
horas do dia incluem 12 horas de noite e 12 horas de
dia, formando um dia completo, uma vez que, por
definição, um dia possui uma noite e uma manhã e
que a noite precede a manhã.19
Em outras palavras, para que haja manhã e luz20,
deve haver uma noite que a precede. Ao se esforçar
no trabalho da noite, alcança-se a luz da manhã21.

A razão para esta [ordem] é que D’us pensou


primeiro em criar o mundo através do Atributo de
Julgamento, porém, viu de antemão que o mundo
não teria capacidade de suportar, então Ele agre-
gou a este [ao Atributo de Julgamento] o Atributo
de Misericórdia22, conforme o dito “No início,
escuridão, e depois, luz”.23 Assim foi na criação
do mundo. No início estava escrito “No início
Elokim criou os Céus e a Terra”24, uma vez que a
criação e vivificação dos mundos de forma con-
creta ocorreram através do Nome Divino Elokim,
que é identificado com o Atributo de Julgamento
e com o tsimtsum25 [da Luz Divina] – ”No início,
escuridão”. Mais adiante está escrito: “No dia em
que Havaye Elokim fez a Terra e os Céus”26 – “e
depois, luz”. O estado de “e depois, luz” pode ser
alcançado somente através do estado precedente de
“no início, escuridão”.27

Havaye e Elokim = Sol e Escudo


Eis que está escrito “Pois Havaye Elokim é um
sol e um escudo”.28 Os dois nomes de Havaye e
Elokim que se referem a D’us como transcendente
e como está iminente na natureza, respectivamente,
são análogos ao sol e ao seu escudo.29 Pois quando
olhamos para o
sol, não vemos, de fato, o próprio sol. Vemos so-
mente seu escudo, o revestimento que encobre o
globo solar.

A Terra e as criaturas [que nela se encontram]


conseguem tolerar a luz e brilho solar somente de-
vido ao seu escudo oclusivo e revestimento. Este
[revestimento] capacita a luz de ser recebida e de
produzir seus efeitos, conforme está escrito “com
a doçura da produção do sol e com a doçura dos
frutos da lua”.30 Então, os efeitos provêm do pró-
prio sol que se oculta e se esconde em seu escudo
e revestimento para que sua luz possa ser tolerada
e que produza os resultados pretendidos.31

Havaye e Elokim na Criação


A metáfora (mencionada nas Escrituras) ajuda-
nos a compreender como este conceito se aplica no
campo espiritual aos dois Nomes Divinos de Elokim
e Havaye. Na verdade, a criação [do mundo] se
origina do Nome Havaye. É o Nome Havaye que
cria. Conforme está escrito: “Eles devem louvar o
Nome Havaye, pois Ele ordenou e eles foram cria-
dos”32 – a criação dos mundos e das criaturas em
sua totalidade provém do Nome Havaye.

Porém, se o Nome Havaye fosse o instrumento


pelo qual o mundo viesse a existir de forma concre-
ta, então, nossa presente forma de existência física,
não teria sido criada.33 Em vez disto, a existência de
todos os seres teria sido totalmente abnegada, assim
como a nulificação dos raios do sol no globo solar. A
Divindade, então, não teria sido sentida pelos seres
criados ou reconhecida como o é agora.34

O Propósito da Criação
Está escrito “Aquele que, em Sua bondade, reno-
va a cada dia, continuamente, a obra da Criação”.35
A obra da Criação é renovada devido a Seu
Atributo de Bondade e compaixão, uma vez que
“a natureza do benevolente é fazer o bem”.36 Pois
o Santo, abençoado Seja, desejou uma moradia
nos mundos inferiores”37, criar e trazer à existência
um universo físico que pareça ser uma entidade e
existência independente e, nesse mundo, criar um
homem com um corpo físico no qual Ele baixaria
uma alma Divina, imbuindo-a com força e vigor a
fim de se sobrepor à materialidade do corpo e do-
minar todos os desejos carnais do corpo, através do
poder do [estudo] da Torá e do “serviço do coração”
da oração.38

A Torá nos foi dada neste plano inferior, físi-


co e terrestre. Apesar de que os anjos queriam a
Torá para si mesmos, conforme está escrito: “Tu
que colocaste Tua Majestade acima dos Céus”39,
Moshé lhes contestou: “Será que vocês, [anjos,]
possuem má inclinação!?”.40 Então, a Torá foi
dada especificamente para o ser humano, que
possui um corpo físico com má inclinação, que o
tenta e o incita – com inúmeras maneiras de frau-
des – tentando instigá-lo e afastá-lo do caminho
correto. Porém, estudando Torá e a observando,
sua luz íntima ilumina a pessoa nos caminhos de
vida [verdadeira], vida eterna – conforme o dito
“vida eterna o Senhor plantou dentro de nós”.41

Isto significa que através da observância efetiva


de mitsvot práticas, a pessoa completa a intenção
Suprema [da Criação], a saber:
“Que o Santo, abençoado seja Ele, desejou um
lugar de moradia nos mundos inferiores”.42

E este é [o significado do versículo] “Pois Ha-


vaye Elokim é um sol e um escudo”: assim como
a oclusão do escudo solar e seu revestimento
capacitam o sol para ser tolerado pela terra e por
suas criaturas, permitindo-lhes de se beneficiar da
luz do sol, que é [uma manifestação de] a essên-
cia da luminosidade do sol,43 o mesmo é verdade
em relação aos dois Nomes Divinos de Havaye e
Elokim. A criação vem do Nome Havaye, mas a
concretização da Criação ocorre através do Nome
Elokim.44 Esse processo permite ao homem, por
meio de seu serviço Divino, trazer uma revelação
do Nome Havaye para este mundo físico. Da-
qui que “no início, escuridão” se refere o nosso
serviço Divino na natureza para transformar a
natureza num receptáculo para o que transcende
a natureza – que é o aspecto de “e depois, luz”.

* * *

D’us é Um: Tanto no Macrocosmo como no M i-


crocosmo
A unidade do Criador pode ser vista e discernida
em toda a Criação. Quando uma pessoa medita sobre
o mundo e sobre tudo o que foi criado, pode perce-
ber a Luz Divina e a vitalidade que os cria e vivifica.

Pois está escrito “Da minha carne, vejo Divinda-


de (Eloka)”.46 A pessoa sabe e sente que o compo-
nente crucial de seu ser é a luz e a vitalidade de sua
alma (e, ao engajar no serviço Divino, ela sente que
esta vitalidade é Divindade47) – pois, por si mesmo,
o corpo é insignificante. Prova disto, que quando
a alma parte, apesar do corpo poder estar perfeita-
mente intacto, os olhos não têm capacidade de ver
e nem a boca, de falar. Assim, o principal é a sua
vitalidade.

E, assim como é na pessoa, assim também, en-


tende-se, é a verdade em relação ao mundo como
um todo. O principal ingrediente é a Luz Divina e a
vitalidade que vivifica o mundo e a Criação. Assim
como está escrito em Avot Derabi Natan,48, que o
homem é um mundo em miniatura e o mundo, um
grande corpo. Assim como o componente crucial
no microcosmo é a luz e a vitalidade, o mesmo é
verdade em relação ao macrocosmo.

Este é o significado de Havaye echad (“Havaye


é um”: empiricamente,) podemos perceber e ver
concretamente a Unidade do abençoado Criador
em tudo na Criação, conforme explicado em outro
local extensivamente.49

O prolongamento na pronúncia de echad quer


dizer: prolongar a extensa meditação [no significado
implícito nas palavras] Havaye echad.

Apesar de este conhecimento decorrer de uma


intensa análise intelectual sobre a qual está escrito
“Será possível, investigando D’us, encontrá-Lo?”50,
no entanto, no entendimento51 da alma, todos os
judeus percebem isto [a Unidade].

Prolongando = Percebendo
Prolongando em echad requer contemplação
sobre a providência Divina específica sobre todos
os aspectos da Criação, “pois Ele, abençoado seja,
provê alimento e sustento para todos”.52
O versículo afirma “Os olhos de todos olham
para Ti com esperança e Tu lhes dá seu alimento no
momento apropriado”53 – “no tempo apropriado”
do alimento,54 conforme determinado pela Divina
providência. De fato, a pessoa vê claramente que
todas suas manobras em seus negócios, de nada
adiantam.55

Portanto, a função da pessoa é somente esperar


pela bondade de D’us. Isto requer somente que o
homem faça um canal [para a bondade Divina],56
e então, “a bênção de D’us trará riquezas”.57 Con-
sequentemente, a pessoa deve procurar tempo para
rezar com a comunidade e fixar tempo para o estudo
da Torá. Este é o significado de “[e Tu lhes dá seu
alimento] no momento apropriado”: [o homem
recebe seu sustento] no momento decidido pelo
Santo, abençoado seja Ele, não [necessariamente]
no momento em que ele quer.

Está escrito “Tu podes trabalhar seis dias na


semana e fazer todas as tuas tarefas”.58 É verdade,
o trabalho deve ser feito. Porém, ele é somente
um receptáculo para a bênção Suprema. E para
que a bênção repouse nesse receptáculo, além do
recipiente ter de estar limpo de fraudes, etc., seus
meios de ganhar sustento devem ser apropriados de
acordo com as diretrizes da Torá. Então, seu traba-
lho servirá como um meio adequado para receber
as bênçãos de D’us.

* * *

Reelaborando Sobre a Afirmação de Abertura


Portanto, prolongar em echad denota que se deve
focalizar na Unidade do Criador em cada coia que
a pessoa vê, tanto em termos da Divina providência
que se estende sobre si mesmo – como o Santo,
abençoado Seja, provê seu sustento e cuida dele,
etc. – como em termos da Divina providência que se
estende sobre a Comunidade de Israel, “uma única
ovelha entre setenta lobos, estando ela protegida”.59
Conforme o dito “não somente um se levantou
contra nós... e o Santo, abençoado Seja, salva-nos
de suas mãos”.60

Por isso, a pessoa deve fortificar-se em seu ser-


viço a D’us participando de orações comunitárias
e programando um tempo fixo para o estudo da
Torá.61

Por esta razão, Rav Acha bar Yaacov observou


que deve se prolongar no dalet de echad. O dalet
[cujo valor numérico é quatro] alude às quatro di-
reções62 do mundo. Cada indivíduo deve perceber
que a Torá e as mitsvot são eternas, aplicáveis a
todos os tempos e lugares.63

Uma pessoa não pode reivindicar que o ambiente


é responsável – que em alguns países é possível
observar mitsvot enquanto em outros, não é. D’us
nos livre dizer tal coisa!

Sobre o versículo “Pois Eu os espalhei como as


quatro direções dos céus”,64 comentam nossos Sá-
bios: “Assim como é impossível o mundo existir sem
suas quatro direções, assim é impossível o mundo
existir sem o povo judeu”.65 Pois “D’us guia os pas-
sos do homem”66 na direção que levará à realização
do intento Divino, que desejou uma moradia nos
mundos inferiores, através de nosso serviço em Torá
e mitsvot.67 Este é o significado de protrair echad
prolongando a pronúncia do dalet: isto indica que
este [serviço espiritual] se aplica igualmente a todos
os países68.

Reelaborando Sobre a Beraita Precedente


Este é [o significado de] o ensinamento de nos-
sos Sábios “Escute, ó Israel, Havaye é nosso D’us
(Elokênu), Havaye é um echad)”:

Escute, ó Israel – um judeu percebe que Havaye


Elokênu – que nossa força e vitalidade provêm do
nome Havaye que transcende a natureza,
a qual provém do nome Elokim.69 Este saber resulta
da compreensão70 da alma de que Havaye echad – a
Unidade de D’us.71

Rabi Meir observa “até aqui é requerida a con-


centração do coração”. Apesar de que este conhe-
cimento e reconhecimento da Unidade de D’us
[inicialmente] compromete [somente] a mente,
todavia, cada judeu tem a habilidade de incutir em
seu coração esta realização intelectual. Isto está em
harmonia com o ensinamento: “Um juramento é ad-
ministrado [à alma antes de descender]: seja justa”.72

A priori, como é possível fazer com que a alma


seja responsável pela boa conduta do corpo?73 Mas
a explicação deste ensinamento é que este juramen-
to implica em saciedade.74 A alma é saciada com
a força necessária para dominar o corpo e a alma
natural, para purificar e refiná-los e, assim, fazer
deles recipientes para a revelação da Luz Divina.

Então, Rabi Meir observa que “até aqui é re-


querida concentração de coração” – ou seja, este
aprendizado não deve permanecer relegado à mente,
mas deve ser levado à “concentração do coração”,
a fim de desenvolver traços de caráter, de fato,
refinados.75

Por isto, “Todo aquele que se prolonga em


echad”: cada indivíduo deve se prolongar em echad
[isto é, estender seu reconhecimento de] a Unidade
de D’us de acordo com sua capacidade. E o foco
deve ser no dalet. A pessoa deve saber que deve
empenhar-se no estudo da Torá e no serviço Divi-
no em qualquer lugar em que estiver. E todos são
obrigados no estudo da Torá,76 mesmo uma pessoa
que é muito ocupada e extremamente atarefada deve
programar tempo fixo para este estudo. Pessoas
simples, também; se não conseguem estudar por si
mesmas, devem frequentar aulas públicas.
Este é, pois, o significado da afirmação de
Rav Acha bar Yaacov “E esta é a dalet” – que o
prolongamento da palavra echad aplica-se prin-
cipalmente à letra dalet.77 Algumas pessoas se
enganam a este respeito e para justificar sua ne-
gligência, inventam racionalizações absurdas.78

E Rav Ashi disse “contanto que não se corra na


[pronúncia da letra] chet. O chet [cujo valor numé-
rico é oito] alude aos sete firmamentos79 e à Terra.
A pessoa deve levar a seu coração que a descida da
alma no corpo foi para cumprir o propósito [da Cria-
ção] de que “D’us desejou uma moradia nos mundos
inferiores”. Esta é a ideia dos sete firmamentos e
Terra: a descida da alma dos sete firmamentos para
a Terra, para se investir num corpo físico, se dá
em função da elevação80 subsequente que ocorre
quando o homem se empenha no estudo da Torá
e no cumprimento das mitsvot nesta Terra física.81

Sobre o versículo “Não estará o homem na Terra


por tempo limitado e não serão seus dias como os
de um trabalhador assalariado?”82 Rashi comenta
que assim como o assalariado – contratado por
ano – percebe
que seu tempo eventualmente se esgotará, simi-
larmente, cada pessoa deve se conscientizar que a
ela também foi dada uma cota de tempo, um certo
número de anos para viver neste mundo. Os dias e
anos de cada pessoa são medidos, conforme escrito
“Dias foram formados”.83

Também está escrito [“Portanto, observa os man-


damentos, os estatutos e as leis que Eu te ordeno]
hoje para cumpri-los”.84

O estudo da Torá – saber como agir – e a obser-


vância das mitsvot práticas são possíveis somente
neste mundo.85 E foi com este propósito que a alma
desceu [para este mundo].

Assim, “contanto que não corra no chet” significa


que a pessoa não deve esquecer a verdade pela qual
ela veio ao mundo.86 Se ela absorve-se genuinamente
[nesta verdade], então, automaticamente, prolongará
o dalet, ou seja, em qualquer lugar onde estiver, es-
tudará a Torá e cumprirá as mitsvot. E “Todo aquele
que se prolongar em echad” – significando, todo
aquele que se devota e se dedica a estender a Unidade
[de D’us] disseminando Divindade no mundo, “tem
seus dias e anos prolongados”. O Santo, abençoado
Seja, concede para a pessoa vida longa, com anos
bons e iluminados pela luz da Torá e do serviço
Divino, para que tenha sucesso em seu serviço
Divino – a fim de realizar o verdadeiro intento [da
Criação]: fazer uma moradia para D’us, neste mundo.

* * *

Que o Todo Poderoso nos conceda dentre todos de


Israel vida longa, [capacitando-nos] de disseminar
os ensinamentos da Torá e seu estudo e [atrair pes-
soas para que se tornem] envolvidas no “serviço do
coração” – oração, a fim de que mereçamos alcançar
o objetivo Divino, [fazendo-o] com abundância de
benefícios, material e espiritualmente.
PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

E stamos aqui apresentando Os Quatro Mundos,


carta escrita em 1937 pelo sexto Rebe do
movimento Chabad-Lubavitch, Rabi Yossef
Yitschac Schneersohn, de abençoada memória. A
carta aparece em Igrot Kodesh, vol. 4, p. 156-166.

Foi pedido a Rabi Yossef Yitschac expor o


significado dos mundos espirituais discutidos na
Cabalá e Chassidut. Sua resposta meditativa define
e quantifica sistematicamente os quatro principais
mundos de Atsilut, Beriá, Yetsirá e Assiyá, traçando
a progressão destes mundos desde sua origem
sublime e elevada até sua evolução final, em uma
realidade física.

Em suas anotações sobre a carta, que foram aqui


impressas como um suplemento, o genro e sucessor
de Rabi Yossef Yitschac, Rabi Menachem Mendel
Schneersohn, intitula esta carta “uma exposição
extensa sobre os quatro mundos de Atsilut, Beriá,
Yetsirá e Assiyá. A diferença entre filosofia e
Chassidut (de acordo com um aforismo de Rabi
Shalom Dov-Ber Schnersohn, cuja alma repousa
no Éden)”. Estas anotações foram impressas como
notas de rodapé do texto original.

A carta foi traduzida por Rabino Yossef Marcus


e comentada por Rabino Avraham D. Vaisfiche.
A introdução e resumo são de autoria do Rabino
Shmaryahu Brownstein. Rabino Shmuel Marcus
coordenou o projeto. Agradecimento especial aos
Rabinos Ari Sollish, David Olidort e Yossef B.
Friedman por sua orientação editorial.
19 de Kislev 5764
Kehot Publication Society
INTRODUÇÃO E RESUMO

Despertou-se na Vontade do Infinito, Abençoado


Seja Seu Nome, emanar, criar, formar e concretizar
seus mundos-conhecidos como [os mundos de]
Atsilut, Beriá, Yetsirá e Assiyá...
— Sháar Hahakdamot, drush Abiyá, início; Ets
Chayim 1:43.

O s escritos da Chassidut e Cabalá estão repletos


de menção dos mundos espirituais e etéreos.
De fato, a existência destes mundos é um dos
conceitos mais fundamentais na doutrina mística.
Porém, o que exatamente são “mundos espirituais”?

Em 1937, um certo M. A. Horowitz de Vilna,


Lituânia, perguntou para Rabi Yossef Yitschac
Schneersohn, o sexto Rebe de Chabad-Lubavitch,
duas questões sobre este mesmo assunto. A carta
aqui impressa é a resposta de Rabi Yossef Yitschac.

As Perguntas
Inicialmente, será que conseguimos conceber
estes mundos espirituais existindo em espaço físico
(algum lugar acima de nosso mundo), um acima
do outro? Se não, como são eles separados um do
outro? Em outras palavras, entendemos como um
objeto difere de outro em nosso mundo: objeto A
ocupa espaço A, enquanto objeto B ocupa espaço
B. De fato, o próprio fato de um objeto físico
ocupar um espaço definido, exclui a possibilidade
de outro objeto físico ocupar este mesmo espaço.
Desta maneira, dois objetos físicos diferem entre
si. Porém, de que forma duas entidades espirituais
diferem entre si?
Isto leva a uma segunda pergunta. A Chassidut
descreve a relação de D’us com o mundo de duas
maneiras: de forma imanente ou “interna” e de forma
transcendente ou “envolvente”. Como entender isto,
quando se fala de mundos espirituais? Em outras
palavras, como algo “permeia” ou “transcende”
uma entidade espiritual?
Rabi Yossef Yitschac só aborda a primeira
pergunta nesta carta e, depois, faz referência a um
discurso de Rabi Shneur Zalman de Liadi
no Likutei Torá1, onde o assunto é tratado mais
amplamente e onde a segunda questão é abordada.
A explicação nesta carta tem como intento ser uma
introdução para aquele discurso.

Os Tipos de Mundos
Rabi Yossef Yitschac inicia sua resposta primeiro
estabelecendo que o “mundo” espiritual, de fato,
existe, utilizando o Zôhar como texto de prova.
Mais ainda, o mundo espiritual é paralelo ao nosso
mundo físico em estrutura. Porém, diferem no fato
de um ser grosseiro e corpóreo e o outro, espiritual
e puro.

O mundo espiritual referido no Zôhar é, na


realidade, um conjunto infinito de mundos. Rabi
Yossef Yitschac classifica estes mundos em duas
classes, mundos revelados e mundos ocultos. Além
disso, categoriza-os em quatro mundos: Atsilut,
Beriá, Yetsirá e Assiyá.

A Natureza dos Mundos


O mundo de Atsilut contém todos os elementos
implícitos num “mundo espiritual” — as várias
câmaras Divinas, as dez sefirot e o sistema ordenado
de orot (luzes) e kelim (receptáculos). Todavia, não
é o que os cabalistas chamariam de entidade criada.
É, mais propriamente dito, a emanação de vários
elementos que existem em estado previamente
oculto, que emergem em Atsilut.

Portanto, o nome Atsilut é bastante apropriado


para este mundo, pois denota a)emanação, em
contraposição à criação; e b) proximidade ,
enfatizando sua relação próxima à sua fonte.

Beriá, inversamente, é o primeiro dos mundos


criados, isto é, não é meramente atribuído àquilo
que jaz sobre ele; uma revelação de elementos mais
elevados, mas é como uma nova criação. Apesar
de conter estrutura de mundo idêntica à de Atsilut
e receber sua energia de Atsilut, ainda contém
identidade suficiente para ser chamada de metsiut,
um ser “existente”.

Este caráter está refletido em seu nome:


Beriá significa tanto criação como revelação ,
significando que este é um mundo que pode
ser adequadamente chamado de “criação” e cuja
existência é bastante aparente.

Em Yetsirá, a criação que iniciou em Beriá é


ampliada. Aqui, o novo assunto criado (de Beriá)
ganha mais substância, mas identidade, mais
metsiut. Também desenvolve certa forma. Esta é a
razão pela qual é chamado de Yetsirá, denotando
ambos, metsiut e forma.

Assiyá, o inferior dos mundos, contém estrutura


idêntica à dos mundos superiores, porém é o
inferior, uma vez que é nele que a criação entra
numa metsiut real. Daí o nome Assiyá, significando
ação ou realidade — a capacidade inferior, mais
tangível.

As definições e caracterizações de todos estes


mundos giram em torno de um termo — metsiut.

Atsilut é a ausência de metsiut ; Beriá é a


emergência inicial de metsiut; Yetsirá é onde esta
metsiut bruta toma forma, e Assiyá é onde esta
metsiut formada se torna concreta.
É, portanto, imperativo um entendimento bem
claro do que realmente é metsiut — assunto que
Rabi Yossef Yitschac esclarece aqui, detalhando
de forma notável.

O Propósito dos Mundos


Rabi Yossef Yitschac deixa claro que estes
quatro mundos representam uma descida gradual
e transição entre a unidade Divina absoluta e o
nosso mundo físico, que se sente como sendo
autossuficiente e uma existência independente.
Porém, qual é a necessidade de todos esses
mundos (especialmente por eles serem paralelos
um ao outro), por que não ir “direto ao ponto”,
por assim dizer, e criar um mundo físico?

Rabi Yossef Yitschac responde esta questão ao


explorar o propósito da criação. Conforme explicado
em Ets Chayim2, a descida gradual dos mundos é
necessária para que as criaturas conheçam D’us. Isto
não seria possível se o processo da criação fosse
sem regras, isto é, sem alguma sequência lógica. Por
isso, D’us utilizou um padrão para a “descida da Luz
Divina”, de causa e efeito, para desenvolver nosso
mundo de fase em fase. Para isso, usou os mesmos
princípios básicos de lógica e natureza que regem
nossas vidas, para que tenhamos um quadro de
referência, através do qual possamos apreendê-Lo.

Como Podemos Imaginar Estes Mundos?

Neste ponto, Rabi Yossef Yitschac explica que,


fundamentalmente, uma mente física não consegue
apreender o que é espiritualidade, por ser limitada
por sua própria limitação física. Porém, pode ter
uma “percepção indireta” de espiritualidade. A
mente pode saber que existem mundos espirituais,
que podem existir níveis e formas de existência além
de nossa compreensão, sem conhecer exatamente
que níveis são estes.

Este conceito, assim como o conceito de diferen-


ciação entre entidades espirituais, é elucidado por
meio de um exemplo das próprias forças íntimas da
alma da pessoa. A pessoa está ciente da existência
destas forças, que são diferentes entre si e, mais
ainda, pode “senti-las”. Também conhece suas
características ao observar seus efeitos perceptíveis
sobre ela. Muito similar às entidades espiritu-
ais mencionadas anteriormente, o conhecimento
destes poderes da alma é “indireto”.

De tudo isto, Rabi Yossef Yitschac prova que há


um “tempo e espaço” espirituais que se aplicam
às forças da alma, conforme é evidente do fato de
elas serem limitadas. (Mas não são absolutamente
similares ao tempo e espaço que conhecemos). Isto
é claramente entendido e sentido, apesar de que de
forma “indireta”. O mesmo é verdade com relação
aos reinos e mundos espirituais.

* * *

No final da carta, Rabi Yossef Yitschac recorre


ao discurso acima mencionado do Likutei Torá3.
O leitor fará bem em examinar o discurso para um
entendimento mais completo da carta presente. Eis
alguns pontos de destaque do discurso:

Rabi Shneor Zalman de Liadi explica que a


restrição do espaço físico torna-se irrelevante
quando se fala de entidades ou energias espirituais,
uma vez que várias energias diferentes podem
ocupar o mesmo espaço idêntico. Isto é verdade
mesmo para as “energias espirituais” do homem,
isto é, suas faculdades, sentidos, etc.— eles também
podem coexistir em um único espaço físico. O
coração da pessoa tem lugar para várias emoções
coexistentes, mesmo que sejam paradoxais e sua
mente pode apreender dois pontos de vista opostos.
Isto porque algo que não é físico, não ocupa espaço
físico; pode existir num espaço físico, mas não o
ocupa no sentido de excluir a existência de outra
energia semelhante neste mesmo espaço.

Para levar este conceito adiante: o fato de duas


ou mais energias existirem no mesmo espaço não
diminui, de forma alguma, a viabilidade de cada
elemento individualmente. Cada um retém seus
próprios parâmetros, suas próprias características —
tão distintas das outras energias que compartilham
aquele espaço físico. As diferentes emoções
experimentadas por alguém que sofre uma tragédia,
D’us nos livre — tristeza, desespero, dor, raiva,
perda — não estão individualmente comprometidas
pelo fato de coexistirem com as outras. Cada
emoção é potente como se só ela estivesse existindo
no coração.

Inversamente, a identidade de algo que é


tangivelmente físico, que ocupa espaço físico,
estaria comprometida se outro elemento “invadisse”
aquele mesmo espaço4; pois é desta forma que este
elemento é definido — absolutamente, em termos
físico e espacial. Uma vez que os elementos que
definem sua existência são violados, sua própria
existência é violada.

Porém, energias espirituais não são absolutamente


definidas nem limitadas por espaço físico; dessa
forma, elas não estão comprometidas por outra
energia compartilhando o mesmo espaço.

Tudo isto serve para responder a primeira questão


apresentada na carta: Será que podemos conceber
os mundos espirituais existindo um acima do outro
num sentido literal, espacial? E, se não, em que
diferem um do outro?5

Em relação à segunda pergunta, sobre o sentido


de imanência e transcendência no que diz respeito
aos seres espirituais:

Todos os níveis de espiritualidade — inclusive


os quatro mundos espirituais — existem aqui
e agora, em nosso mundo físico6. Somente que
estamos cegos em relação a eles em razão da
grossura de nosso caráter. Assim, é como se, de
fato, eles nos transcendessem, de maneira a ficar,
por assim dizer, “removidos” da nossa percepção
consciente. Alguém que é de natureza mais
refinada, espiritual, entretanto, pode ser capaz
de perceber conscientemente — “internalizar”
— estas realidades elevadas. Pode, por exemplo,
perceber ou sentir o mundo espiritual de Assiyá.
Todavia, os mundos de Atsilut, Beriá e Yetsirá ainda
permanecerão além de seu alcance, transcendentes.
Se a pessoa for de um nível ainda mais refinado,
espiritual, poderá até perceber o mundo de Yetsirá.
Mas os mundos mais elevados permanecerão fora
de seu alcance ou de sua apreensão. E assim por
diante. Esta é a forma como a ideia de imanência
e transcendência faz a sua função no entendimento
dos mundos espirituais mais elevados.
Porém, fundamentalmente há o nível
incompreensível da Verdade Absoluta que
“nenhuma mente consegue apreender em absoluto”
— a própria Essência de D’us.
TRADUÇÃO
E
COMENTÁRIO
Com a graça de D’us,
15 de Mar-Chesvan 5698 [20 de outubro de 1937]
Otwock [Polônia]

Paz e benção.

Respondendo a sua carta:

Fiquei satisfeito de ler suas coletâneas sobre meu


tio, Rabi Zalman Aharon, que sua alma repouse no
Éden. Me interessaria ler estórias que você tenha
escutado dele.

Em resposta à sua pergunta: Pode alguém conce-


ber o conceito de “mundos” existindo um acima do
outro em sentido literal, ou seja, espacialmente, e
dizer que existe uma quantidade sem fim de mundos
no espaço físico?
Conforme é trazido no Tanya1, não se deve
entender os mundos espirituais no sentido físico
de espaço. [Pois, caso fosse assim, no que eles se
distinguiriam?] E, como é possível concebê-los
em relação à Luz Infinita, Abençoado Seja, que
preenche e envolve todos os mundos [ou seja, qual
é a diferença entre eles2]?
Resposta:
Consta no Zôhar4: “O Santo, Abençoado Seja,
fez o mundo inferior similar ao mundo superior”.
Em outras palavras, este mundo inferior, físico, é
análogo ao superior, o mundo espiritual.

A Academia Celeste5 e sua ordem de estudo, as


“câmaras” dos
justos6, os anúncios de “abram caminho”7 e a forma
de receber as almas dos justos que chegam [deste
mundo]8, as ascensões de Moshé, nosso Mestre, às
Alturas9, a ascensão de Rabi Yishmael, o Sumo Sac-
erdote e sua pergunta10, a visita de Rabi Yehoshua
ben Levi ao Jardim do Éden11, a ascensão da alma
do Arizal12 e de nosso Mestre, o Baal Shem Tov13,
as visões de nossos antepassados, nossos santos
Mestres14 — todos estes atestaram que as ordens e
as disposições das coisas no Mundo Superior são
similares ao deste mundo.
Mas, ao dizer que “o mundo inferior é similar
ao superior” significa que este mundo é apenas
semelhante ao mundo superior e não idêntico a
ele. Pois o mundo superior é espiritual, enquanto
este mundo é material e físico. É apenas similar ao
mundo superior.

Em outras palavras, a diferença entre o mundo


superior e o inferior está somente no fato de o infe-
rior ser físico e corpóreo, enquanto o superior é es-
piritual, puro e cristalino [conforme será explicado].

Mundos
Está escrito: “E alamot (moças) sem núme-
ro” 15. Nossos Sábios, de abençoada memória,
disseram: “Não leia alamot (moças), e sim olamot
(mundos)”16. Estes mundos [espirituais] são sem
número, infinitos. Pois o finito é mensurável em
números enquanto o infinito, está além dos númer-
os. Orem, apesar de os mundos serem ilimitados
e sem número, são classificados em duas classes:
mundos revelados e mundos ocultos, não revela-
dos. Também são divididos em quatro categorias
distintas, chamadas de: Atsilut (Emanação), Beriá
(Criação), Yetsirá (Formação) e Assiyá (Ação).

Atsilut
O primeiro dos quatro mundos é
chamado de Atsilut. Apesar de ser um
mundo estruturado em câmaras, Carruagem17, dez
sefirot18, luzes e receptáculos19, intelecto e emoções,
luz da chochmá20 no receptáculo de chochmá e luz
de chessed21 no receptáculo de chessed, é chamado
de Atsilut por duas razões22:

1) O termo Atsilut deriva de Haatsalá — ema-


nação e Hafrashá — separação. Pois Atsilut não é
como algo renovado que vem à existência numa
criação ex-nihilo. É somente a revelação do que
estava oculto.

Como consta no Sêfer Yetsirá23: “Dez sefirot sem


má24, como a chama que está unida à brasa”25. Há
uma chama que existe na brasa e outra que existe
fora dela, sendo que a externa emana da interna. Isto
é Atsilut: emanação e separação, ou seja, é apenas
a revelação do oculto.

2) Atsilut [também] denota proximidade. Isto


significa que a emanação e separação de Atsilut
permanecem próximas ao Emanador, Abençoado
Seja. Em outras palavras, apesar de ser chamada
uma emanação e separação, não deve ser entendida
como uma emanação e separação total, conforme
imaginada pela mente humana. Mas, Atsilut per-
manece
próxima ao Emanador, Abençoado Seja. Por esta
razão, Atsilut é chamado de “domínio privado”26,
pois, em Atsilut, “Ele e suas emanações vivifica-
doras são Um, Ele e Suas causações27 são Um”28.

Beriá
O mundo de Beriá (Criação) é o segundo dos
quatro mundos. É chamado de Beriá por ser a
primeira entidade a existir após Atsilut e por ser
uma metsiut29. Apesar de ser um mundo espiritual
e “oculto” e, mais ainda, de nele brilhar a luz de
Atsilut, especialmente a luz de Biná de Atsilut —
enquanto no mundo de Atsilut em si ilumina a luz
de chochmá de Atsilut — razão pela qual o mundo
de Beriá é chamado de “mundo da compreensão”30,
mesmo assim, é chamado de mundo da criação, por
duas razões:

1) Uma diferença entre o mundo de Beriá e o de


Atsilut — apesar de haver vários aspectos nos quais
divergem — é que o mundo de Atsilut é chama-
do de “o nada [ayin] imperceptível”, enquanto o
mundo de Beriá é chamado de “a existência [yesh]
perceptível”. Isto porque Beriá é metsiut e uma
existência é chamada beriá (criação).

Conforme escreveu o Ramban31: “No idioma


sagrado não possuímos termo algum que expresse
criação ex-nihilo além de ‘bará’”.

Em outras palavras, a diferença entre Beriá e


Atsilut é que, apesar de todos os elementos de At-
silut — câmaras, dez sefirot, luzes e receptáculos,
etc. — existirem também no mundo de Beriá, no
entanto, em Atsilut existem meramente como a rev-
elação do oculto, não sendo uma nova entidade. Em
contraste, o mundo de Beriá é algo a partir do nada.

Uma vez que é uma metsiut, mesmo que muito


sutil, conforme
escreveu o Ramban “um elemento etéreo, que
não possui consistência” —, sua metsiut consiste
unicamente em sua capacidade de obter forma.
Todavia é uma metsiut e, portanto, chamado de
Beriá.

2) O termo beriá recai sobre algo que é revelado,


conforme a afirmação: “Se um espinho se alojou no
esôfago, não suspeitamos que ficou saliente para
fora”32. Similarmente chuts (fora) é traduzido pelo
Targum como bará33. Ou seja, quando algo é ma
metsiut aparente, reconhecível por fora, é chamado
de Beriá.

Yetsirá
O mundo de Yetsirá (Formação) é o terceiro dos
quatro mundos. Apesar de conter todos os elemen-
tos contidos nos mundos de Beriá e Atsilut, porém,
a metsiut no mundo de Yetsirá é mais perceptível
do que a do mundo de Beriá.
Pois a metsiut do mundo de Beriá consiste
no fato de ser a produção da criação ex-nihi-
lo, mas toda sua metsiut é sua capacidade de
adquirir forma. Mas ainda não e uma metsiut
completa. É somente a primeira “substância”.

Entretanto, o mundo de Yetsirá é uma metsiut


definida que possui plena forma. É chamado de
Yetsirá por duas razões: 1) É uma metsiut plena;
2) é formada de modo peculiar.

Assiyá
O mundo de Assiyá (Ação) é o quarto dos quatro
mundos. E, apesar de também este conter todos os
elementos contidos nos mundos de Yetsirá, Beriá e
Atsilut, contudo, é o inferior de todos. É, portanto,
chamado de Assiyá, que denota a faculdade mais
baixa: ação [ou realidade].

Diferenças
O ponto de tudo o que dissemos e explicamos
sobre a natureza dos quatro mundos, Atsilut, Beriá,
Yetsirá e Assiyá é que a estrutura de tudo o que
existe nos mundos — câmaras, dez sefirot, Carru-
agem, tempo e espaço — é idêntica em todos os
mundos. A diferença está na essência de sua natureza.
A natureza essencial de Atsilut — que é a
revelação do oculto, como o acender de uma
vela a partir de outra34 — não é a mesma que
a de Beriá, que é a criação de algo a partir do
nada e é um elemento etéreo e sem consistência.

Beriá, por sua vez, não é igual à natureza es-


sencial de Yetsirá, onde existe uma forma finita.
Todavia, em Yetsirá, a forma se sobrepõe à matéria
espiritual e, portanto, não é equivalente à nature-
za essencial de Assiyá [onde a matéria domina a
forma].

A pessoa que se concentra e exercita sua mente


para se aprofundar neste assunto, verá que cada
mundo se aproxima mais da existência espacial
caracterizada por seis dimensões. E, apesar de
mesmo o mundo de Assiyá ser totalmente espiritual
— conforme, se D’us quiser, será explicado — não
significa que ele não tenha comparação35... com
Atsilut, mas sim que está no domínio do mundo
inferior, que é uma existência e uma metsiut em
sua percepção própria.
Percebendo o Divino
Uma das razões pelas quais D’us criou o mundo
é, conforme explicado no Ets Chayim36, para que as
criaturas reconheçam Sua Grandeza37 e, desta forma,
possam merecer ser “uma carruagem”38 para Ele. Está
explicado na literatura chassídica que D’us emanou
o mundo de Atsilut para que as criaturas possuíssem
sabedoria e percepção. Pois, sem a emanação do mun-
do de Atsilut, as criaturas seriam incapazes de captar
Divindade. Ao emanar este mundo, D’us implantou
na natureza das criaturas a habilidade de apreender
Divindade39.

Dez Sefirot Ocultas


Apesar de o mundo de Atislut ser apenas como
a revelação do oculto, não significa que aquela
própria chama [interior] emerge da brasa e é
vista fora dela. Pois a chama interior permanece
dentro da brasa como a princípio; serve apenas
como uma fonte para a chama que emerge para
fora da brasa.

O equivalente a isto nas sefirot supremas: a


chama interior pode ser comparada às dez sefirot
que estão “ocultas em seu Emanador”40, enquanto
a chama externa pode ser comparada às dez sefirot
de Atsilut.

Apesar de as dez sefirot de Atsilut emanarem das


dez sefirot ocultas em seu Emanador, Abençoado
Seja, mesmo assim, isto não significa que as dez
sefirot ocultas deixam seu lugar no Emanador,
Abençoado Seja e se tornam as dez sefirot de
Atsilut; mas, as dez sefirot ocultas permanecem
ocultas e é a partir delas que emanam as dez sefirot
de Atsilut.

CHAMA PARA CHAMA


Isto explicará a metáfora de acender uma vela a
partir de outra. Quando alguém acende uma vela
de uma chama já existente, a emanação que ocorre
da chama acesa para a vela envolve somente o fogo
e a luz da vela, isto é, o aspecto espiritual da vela,
não seu corpo e materialidade.

Por exemplo, quando alguém acende uma vela


feita de banha bruta e grosseira a partir de uma
lamparina de azeite de oliva, o acendimento não
causa nenhuma falha no azeite de oliva. Mesmo
que o fogo emanou da lamparina de azeite de oliva,
todavia, seu acendimento se deu por meio de uma
vela de banha, que é bruta e grosseira em compara-
ção à substância refinada que é o azeite de oliva.

ORIGEM DOS PENSAMENTOS


Similarmente ocorre na faculdade do intelec-
to: uma ideia que surge para uma pessoa deve
ter, obrigatoriamente, uma origem. Antes de o
raciocínio ter sido concebido em sua mente, ele
não existia, conforme está escrito: “a sabedoria
emerge do nada”41. Esta é, de fato, a diferença
entre chochmá, a sabedoria inventiva e biná, que
é o poder do entendimento. Em biná, o raciocínio
existe mesmo antes de ser
compreendido e apreendido. Porém, em chochmá,
o raciocínio não existe até ser concebido.

Este é um dos motivos pelos quais uma nova


percepção emerge através de esforço mental. Ra-
ciocínios não surgem por si só; requerem esforço
interno. Quanto mais a pessoa empenhar sua mente
e exercitar seu intelecto, mais sua percepção e sabe-
doria aumentarão. A razão para tal é que o raciocínio
emerge da não-existência para a existência e, portan-
to, requer esforço.

Fogo de Pedra
A metáfora para este conceito é a extração de fogo
de uma pedra. Isto ocorre precisamente friccionando
a pedra com força. Em contraste, para acender uma
chama a partir de outra, basta aproximar. Isto porque
a chama acesa está em existência reveladamente.
Acender de uma existência para outra, requer so-
mente uma aproximação. Mas a chama de uma rocha
possui somente uma “existência oculta” [isto é, um
potencial de fogo] e, portanto, requer precisamente
uma fricção para trazê-la da não existência para a
existência.
Este é o significado de “a sabedoria emerge do
nada”. Apesar de o surgimento da sabedoria e do ra-
ciocínio originar-se da fonte da sabedoria42, a forma
como é revelada pode ser comparada a encontrar um
objeto perdido43; o local onde o objeto perdido foi
encontrado com certeza não é seu lugar verdadeiro e
original, mas o objeto deve ter vindo de outro lugar;
não estava neste mesmo local. Seu lugar de origem,
porém, não é conhecido, uma vez que a metsiut do
objeto emerge da não existência44; sua origem é ayin
(nada) e não-existência.

Existência Não-Existente
Então, apesar de o ponto do conceito obter
[eventualmente] o status de metsiut de um assun-
to intelectual, esta metsiut não é completa. Só se
chama metsiut em relação à não-metsiut. Por isso,
o ponto surge, brilha
e então, desaparece. É como um raio, numa tem-
pestade, que brilha por um instante e desaparece.
Pois, apesar de ser uma metsiut, sua metsiut con-
siste no fato de não ser não-metsiut. Mas não é uma
metsiut completa.

Falando de forma mais profunda: a metsiut de


chochmá consiste no fato de não ser não-metsiut.
Não é uma metsiut plena, isto é, ainda está longe
de ser metsiut. No entanto, está mais longe de
não-metsiut do que de metsiut. Pois, apesar de não
ter entrado no reino da metsiut, já se excluiu do
reino de não-metsiut.

Prova disto é que a essência de um conceito não


nos dá a compreensão do assunto de não-metsiut.
Ou seja, não é uma metáfora para não-metsiut. A
metáfora para não-metsiut é o “poder do intelecto”,
que é a origem do intelecto, mas não o intelecto em
si45. A essência de um conceito, no entanto, apesar
de não ser uma metáfora para não-metsiut, é uma
metáfora para o surgimento de uma metsiut que
ainda não se desenvolveu numa metsiut completa.
Atsilut
Esta também é uma metáfora para a metsiut de
Atsilut. Apesar de ser apenas uma revelação do
oculto — comparada a uma chama acesa a partir de
outra — mesmo assim, já não é a mesma não-met-
siut da qual se originou. É similar à chama revelada
que emerge da ocultação que, na prática, é extraída
através de fricção e não de aproximação. Isto indica
que a chama deriva de não-metsiut em comparação
com a chama revelada. Pois as dez sefirot de Atsilut
são a origem dos mundos que sim possuem metsiut.

No entanto, a metsiut de Atsilut não é uma


verdadeira metsiut, mas somente a ausência de
não-metsiut. Na transição de não-metsiut, torna-se
uma fonte para metsiut, mas ela mesma não possui
uma verdadeira metsiut. Por isso, a metsiut de At-
silut é chamada de reshimá, uma marca ou esboço.

Atsilut = Reshimá
Isto pode ser comparado à marca geral utilizada
em contemplação intelectual por quem se ocupa
com assuntos intelectuais. Antes de ele começar a
contemplar certo assunto ou ideia, faz um esboço
geral para
si que orienta e define sua contemplação do assunto.
Isto é similar às anotações feitas por um arquiteto
antes de começar a construir a estrutura.

Apesar de o intelectual fazer uma anotação geral


definindo e direcionando sua contemplação, porém,
sua anotação é diferente da do arquiteto. No caso do
arquiteto, ele vai somente concretizar o que estava
previamente em estado potencial. O esboço em si
será seguido minuciosamente. Em contraste, a ano-
tação do intelectual não é seguida de forma exata;
pois à medida que seu raciocínio se desenvolve, seu
conteúdo se modifica, como é evidente.

Entretanto, mesmo que a anotação original pode


não ser seguida minuciosamente, mas, o próprio
fato de ele fazer uma anotação que define a quali-
dade e direção da reflexão — mesmo que, depois,
ela se torne nula — dá forma à ideia e faz dela uma
ideia estruturada que é próxima à metsiut.

Pois, no campo intelectual, há raciocínios ex-


tremamente sublimes e fabulosos. Como as ideias
de um gênio que são inovações que contém muitís-
sima profundidade e elaboração. Mas estão longe da
metsiut, uma vez que ele não possui nenhum esboço
do assunto. Está somente revelando o fluxo de sua
sabedoria. Mesmo sendo pensamentos profundos,
estão longe da metsiut. Por isto, uma mesma ideia
pode conter contradições. Mas, quando faz um
esboço, mesmo se a ideia contradiz o esboço, seus
pensamentos estarão próximos à metsiut.

De forma similar, a metsiut de Atsilut é só um


esboço, mas não é, absolutamente, uma metsiut.
Por outro lado, não é uma não-metsiut. E, uma vez
que é um “esboço”, ela é a origem para os mundos.

Beriá = Gravar
No entanto, o mundo de Beriá, apesar de ser a
primeira fase de yesh [“existência”], que consiste
apenas de um elemento etéreo que pode receber
forma, todavia, é uma metsiut. O mundo de Beriá
não é somente a ausência de não-metsiut, nem um
mero esboço como o mundo de Atsilut. Beriá é
uma metsiut, apesar de ser um elemento etéreo,
que, todavia, tem a capacidade de receber forma.
Por isto, o mundo de Beriá é chamado de
“gravação”. Gravação é o contrário de marcação.
Diferentemente de uma gravação, uma marca é algo
não-substancial, passível de mudança.

Por outro lado, há uma vantagem na gravação no


fato de ser parte da substância na qual está gravado.
Não é algo adicional. Portanto, o que está sendo rev-
elado é o próprio objeto [“gravado”]. Assim, letras
que são gravadas numa pedra preciosa, apesar de
serem letras46, na prática, revelam a essência — a
própria pedra. Esse não é o caso de letras escritas
com tinta sobre o pergaminho, onde a revelação
ocorre através das letras que cobrem a essência —
o pergaminho. Mas, no caso da gravação, mesmo
a revelação consiste da própria pedra.

Esta é uma metáfora para a metsiut do mundo


de Beriá. Apesar de ser o primeiro yesh que pode
receber uma forma, mas não é um verdadeiro yesh
e metsiut. É somente a primeira “substância” cuja
revelação consiste da revelação da própria coisa.
Por mais que não possua a mesma metsiut de At-
silut, não cabe dizer que é uma metsiut revelada.
Somente que sua metsiut consiste do fato de ter
a capacidade de receber forma.

Yetsirá = Talhar
O mundo de Yetsirá, no entanto, chama-se “talha-
do”, que é uma forma definida que não se modifica.
Não somente que possui a capacidade de mudança,
sendo a revelação da própria essência que está se
manifestando, mas a metsiut já vem numa forma
que é “talhada” de certo modo, ou seja, de forma
limitada.

Assiyá
O mundo de Assiyá é, como seu nome sugere,
uma absoluta metsiut. Enquanto no mundo de Yet-
sirá, o principal é a forma, em Assiyá­, o principal
é a metsiut.

Então, o conceito destes quatro mundos — At-


silut, Beriá, Yetsirá e Assiyá — é que cada mundo
representa uma incrementação e materialização da
natureza de metsiut. No mundo de Atsilut, a nature-
za da metsiut é o fato de não ser mais não-metsiut;
no mundo de Beriá, a natureza da metsiut é ter
capacidade de ganhar forma; no mundo de
Yetsirá, a natureza da metsiut é que ganha forma;
e, no mundo de Assiyá, a natureza de metsiut é que
ingressa em metsiut [real].

Entretanto, assim como o mais elevado dos qua-


tro mundos, o mundo de Atsilut, é um “mundo”,
isto é, definido pela definição de “mundo”, assim
também, o inferior destes mundos, o mundo de
Assiyá, é também um estado espiritual e não possui
nenhuma matéria da metsiut do mundo físico47.

Percepção Direta e Indireta


Agora, se mesmo o quarto mundo, chamado de
Assiyá, é espiritual, em que sua espiritualidade
difere da do terceiro mundo, o mundo de Yetsirá?

E qual é a diferença entre o mundo de Yet-


sirá e o mundo de Beriá? E, uma vez que Atsilut
também é um mundo, quanto mais elevado ele
é, do que o mundo de Beriá? Em outras pala-
vras, se são todos espirituais, o que os diferencia?

O material e o espiritual são opostos. Portanto,


o intelecto humano que reside num cérebro físico,
é incapaz de apreender um assunto espiritual de
forma direta48, mas somente, de forma indireta48.

Percepção direta e indireta são duas formas de


entendimento e compreensão. Às vezes, a pessoa
entende e capta de forma direta e, às vezes, de for-
ma indireta.

Entendimento e percepção direta são usados em


assuntos que são do mundo físico, cuja verificação
é concreta, de forma prática. Entendimento e per-
cepção indireta são usados com assuntos que não
são físicos e cuja verificação é teórica e especula-
tiva, não prática.

Definições
O mundo espiritual possui espaço e tempo, as-
sim como o mundo material. Porém, a definição
[de tempo e espaço] difere entre eles. A definição
de tempo e espaço espirituais não é absolutamente
semelhante à de tempo e espaço físicos.

Um lugar físico é definido por definição espacial.


É caracterizado por ter seis dimensões. Todos os
filósofos concordam que acima da nona esfera49, que
é deste mundo material, não há nem espaço nem
vazio, mas somente, tempo e espaço espirituais.
Nossas mentes, intelecto humano — que reside
num cérebro físico, mesmo sendo da mais refinada
das substâncias materiais — não é capaz de captar o
significado de “acima do tempo e do espaço”. Nossa
percepção opera dentro dos parâmetros de tempo e es-
paço. O que está acima deles, não conseguimos captar.

Percepção Indireta
Agora, apesar de tempo e espaço espirituais esta-
rem acima de nosso conhecimento, contudo, temos
percepção clara de que a definição de espaço não
é limitada ao que é definido por seis dimensões.
Pode haver espaço que não se restringe aos con-
ceitos de espaço que apreendemos. O mesmo vale
para tempo; sua definição não é limitada por nossa
percepção.

Todos, de comum acordo, sabemos que possuí-


mos uma alma que seus poderes atuam em todas as
partes do corpo, em várias funções, como: prazer,
vontade, sabedoria, entendimento, compreensão,
amor, temor, orgulho, pensamento, meditação, fala
e ação.
Apesar de serem poderes espirituais, não físi-
cos, entretanto, são perceptíveis. Sua expressão
através de prazer, vontade, intelecto, emoções,
pensamento, meditação, fala e ação, não somente
atestam sua existência, mas também nos dão uma
noção de sua definição e de como diferem entre si.

O intelecto com todos seus elementos — criativ-


idade, entendimento e investigação — dão-nos uma
noção de sua natureza intrínseca e de sua distinção
da vontade e do prazer, assim como [sua diferença]
das emoções e da ação.

Assim como ocorre no campo do intelecto — que


sua função atesta sua natureza e existência e retrata
a forma de sua estrutura — assim é com todas as
faculdades da alma. No entanto, dividem-se em três
categorias gerais: faculdades transcendentes, fac-
uldade internas — entre as quais, algumas, serenas
[ou seja, o intelecto], outras fervorosas [ou seja, as
emoções] — e faculdades coadjuvantes50.

As Três Faculdades
As faculdades transcendentes são as que não
estão restritas a membros específicos do corpo hu-
mano. Elas são o prazer e a vontade que residem e
agem em todos os membros e faculdades do corpo
por igual.
As faculdades internas são as que se limitam
a certas partes do corpo humano. São intelecto e
emoções. O intelecto reside no cérebro (que está na
cabeça), enquanto as emoções residem no coração.
São de naturezas diferentes: o intelecto é tranquilo
enquanto as emoções são fervorosas.

As faculdades co-adjuvantes são apenas Os


Quatro Mundos. São: contemplação e pensamento,
fala e ação. Não possuem disposição independente
alguma — nem serena nem fervorosa. Por serem
faculdades coadjuvantes, alteram-se de acordo com
a natureza da faculdade que se reveste nelas. Quan-
do [esta faculdade] pensa ou reflete, está à serviço
das faculdades de prazer ou de vontade, intelecto ou
emoções; sua disposição se modificará assim como
uma roupa se ajusta às medidas de quem a veste.

Conforme mencionado, a atuação das faculdades


nos descrevem aquelas que as acionam. Portanto,
conhecemos a natureza da existência de cada fac-
uldade. Verdade, não conhecemos a natureza da
essência das faculdades, conhecemos a natureza
[externa] de sua existência. E, uma vez que conhe-
cemos a natureza da existência das faculdades,
somos obrigados a concluir que são finitas, pois se
fossem infinitas, não as conheceríamos, uma vez
que o finito não consegue captar o infinito.

Uma prova clara para isto é a seguinte: a natureza


da existência [externa das faculdades] conhecida
por nós indica a existência da essência [das fac-
uldades], que é finita, pois a essência da essência
não pode ser infinita se a existência externa é fini-
ta. Além do mais, o finito e o infinito não podem
coexistir em uma coisa só. Então, uma vez que a
existência externa é finita, sua essência também
deve ser finita.

Por isso, todas as faculdades são definidas por


definições finitas de tempo e espaço finitos. Apesar
de serem faculdades finitas que agem em órgãos
finitos e materiais, mesmo assim, são existências
espirituais, definidas/delimitadas por tempo e es-
paço espirituais.

E, apesar de serem distintas entre si — não só nas


três categorias supracitadas, transcendente, internas
e coadjuvantes, mas também cada uma das tran-
scendentes, internas e coadjuvantes são diferentes
entre si — mesmo assim, são existências espirituais.

Agora, mesmo que as faculdades são existên-


cias espirituais e nós somos seres materiais, nós
percebemos as faculdades e entendemos e capta-
mos a natureza de sua existência, isto é, não só as
compreendemos
intelectualmente, mas sentimo-las. Sentimos per-
ceptivelmente a diferença entre a definição de
espaço físico e espaço espiritual.

FILOSOFIA X CHASSIDUT
Após esta introdução, você deve estudar o es-
clarecimento do assunto nos dois primeiros capítu-
los da explicação sobre os versículos Sos Assis no
Likutei Torá, parashat Nitsavim.

Espero que, com a ajuda de D’us, você com-


preenda bem o assunto, pois há um pacto selado
para os chassidim e seus descendentes que, quando
estudam um conceito de Chassidut, sentem-no, pois
em seu sangue flui a lachluchit51 — transmitida
hereditariamente de pais para filhos — o que os
coloca na trilha da verdade.

No verão de 5668, meu pai, seja a memória do


justo lembrada para bênção, estava em Marienbad.
Um dos mais velhos dos “Iluministas” também es-
tava naquela cidade de passagem e veio visitar meu
pai. Perguntou-lhe sobre alguns assuntos profundos,
ao que meu pai respondeu com uma explicação que
segue a linha da doutrina chassídica.

O visitante ficou satisfeito com a resposta e


explicação, e disse: “Isto é Chassidut?! Parece um
conceito filosófico profundo! Qual, então, é a dif-
erença entre a lógica da filosofia e a da Chassidut?”

Meu pai respondeu: “Meu irmão, Rabi Zalman


Aharon, uma vez respondeu o seguinte para esta
questão: ‘Quando a pessoa estuda filosofia, no fi-
nal, ela tira o talit catan52 e o chapéu. E quando a
pessoa estuda Chassidut, no final, ela coloca gartel53
e kipá54’.

“Esta é a verdade. Tudo depende da introdução


e preparação para o estudo. O estudo da filoso-
fia, normalmente é empreendido num espírito
de cinismo derivado de um desejo de abnegar o
jugo dos Céus.
Mas, o estudo da Chassidut é empreendido
num espírito de fervor derivado da fé, aceitação
do jugo dos Céus e temor a D’us.

“Isto”, conclui meu pai, “é fruto da devoção dos


chassidim mais antigos pela Chassidut. Eles lega-
ram a seus filhos e netos alguma lachluchit espiri-
tual para que, conceitos chassídicos, impregnem-se
neles. Um axioma chassídico é bem absorvido por
eles e os coloca na trilha da verdade”.

E, em relação à viagem mencionada em sua carta:


se você tem possibilidade de organizar seu negócio
atual de forma segura e estável, de modo a cobrir
os custos da viagem e do tempo [necessário] —
até que, com a ajuda de D’us, você se organize de
maneira apropriada, então será muito apropriado
[realizar a viagem]. Que D’us o ajude em tudo o
que necessitar, material e espiritualmente.

Daquele que deseja seu bem-estar e o abençoa.

[Assinatura]
PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

É com muito prazer que apresentamos Vitória


das Luzes, discurso pronunciado pelo Rebe
de Lubavitch, Rebe Menachem M. Schneerson,
de abençoada memória, no Shabat de Chanucá de
5738 (1977).

O discurso que inicia com uma citação de Shabat


21b (onde são discutidos a história de Chanucá e
o procedimento para o acendimento da Menorá)
foi originalmente publicado em hebraico em 5747
(1986). Esta apresentação marca a primeira vez que
este discurso se torna acessível ao leitor de inglês.

***

Vitória das Luzes é nada mais do que uma ex-


posição do sentido mais profundo de Chanucá visto
sob as lentes do Chassidismo Chabad.

Aqui o Rebe explica que a batalha dos gregos


era espiritual, com o intento de erradicar a noção
de que Torá e mitsvot são sagradas, outorgadas
por D’us e Divinas. Os gregos helenistas queriam
secularizar o Judaísmo, transformá-lo de uma “fé”
suprarracional num sistema de filosofia e conduta
moral racional. Neste sentido, o Império grego não
está morto — ainda existem forças — tanto externas
quanto internas — que querem que esqueçamos que
o Judaísmo é Divino.

A vitória dos judeus sobre os gregos representa a


vitória do suprarracional sobre o racional, do Divino
sobre o secular. Portanto, eternizamos Chanucá, a
celebração da luz espiritual vencendo a escuridão
espiritual, acendendo chamas ardentes contra a
escuridão da noite.

***

O discurso foi traduzido e comentado por Rabi


Yossef Marcus. Comentários adicionais foram
feitos por Rabi Ari Sollish e Avraham D. Vaisfiche.
Agradecimentos especiais a Rabi Dovid Olidort e
Yossef B. Friedman por sua orientação editorial.
Chanucá 5766
Kehot Society Publications
INTRODUÇÃO E PERSPECTIVA

Mai Chanucá ? O que é Chanucá?...


Quando os gregos entraram no Santuário,
impurificaram todos os óleos que lá se en-
contravam. Quando a Casa de Realeza dos
Chasmonaítas venceu os gregos, procur-
aram e só conseguiram encontrar um pote
de óleo com o selo do Sumo Sacerdote ainda
intacto. O pote continha óleo suficiente para
acender a Menorá somente por um dia.
Porém ocorreu um milagre, e a Menorá per-
maneceu acesa oitos dias com esse óleo. No
ano seguinte, os Sábios estabeleceram estes
dias como dias festivos a serem celebrados
com louvor e agradecimento.
— Shabat 21b

O s gregos e judeus poderiam ter tido relações


bastante boas. Os gregos não se importavam
tanto com o fato de os judeus estarem estudando
Torá e cumprindo mitsvot. Eles viam a Torá como
uma obra de grande sabedoria. Viam as mitsvot,
pelo menos grande parte delas, como sensatas e
até significativas. Poderiam concordar com uma
lei que dizia honre a seus pais ou alimente o pobre.
Poderiam até entender nossos dias festivos que
comemoram nossos grandes momentos históricos.

Poderíamos todos ter sido bons amigos. Então,


qual era o problema? O problema era que nós
insistimos em cumprir aquelas leis sem lógica,
como a proibição de misturar lã com linho ou leis
de pureza ritual. O problema era que não víamos a
Torá somente como mais uma obra de sabedoria,
mas a enxergávamos como uma obra Divina, um
livro que contém a luz Divina que transcende tudo
o que conhecemos.1
A verdade é que os gregos poderiam ter aceitado
mesmo nosso compromisso com as leis suprarracio-
nais — se pelo menos este compromisso estivesse
enraizado em bases racionais. Os gregos não teri-
am ficado terrivelmente perturbados se um judeu
dissesse que, apesar dele não conseguir entender
a razão das leis da Vaca Vermelha2, ele as segue,
pois acredita que D’us não criaria leis sem senti-
do. Mesmo os gregos poderiam concordar que soa
razoável seguir as leis de D’us mesmo quando não
há razão alguma aparente.

Mas cumprir somente porque D’us disse, sem


procurar alguma justificação racional? Isto, não
conseguiam aceitar.3

De fato, viram esta “loucura” mesmo em nosso


cumprimento das mitsvot racionais — as leis civis
e de testemunho. Mesmo estas, o judeu cumpre não
somente devido à sua razão, mas, principalmente,
devido ao fato de serem a Vontade de D’us. O ju-
deu reconhece que todas as mitsvot, não apenas os
estatutos insondáveis, estão enraizadas na Vontade
Divina, que está acima da razão; com certeza, da
razão humana. D’us pode ter decretado que algumas
mitsvot se invistam em vestimentas “racionais”.
No entanto, mesmo depois disto, permanecem, em
essência, suprarracionais.

Mais ainda, diz o judeu, mesmo as razões que


a Torá dá para as mitsvot, estão acima da com-
preensão humana. Pois, como pode uma mente
finita apreender a sabedoria Divina Infinita?4

Então, enquanto o diálogo entre gregos e judeus


pode ter iniciado com uma certa base em comum,
em última instância, os gregos não conseguiam
entender os judeus. A conversa amigável chegou a
um fim abrupto e a mente grega retrocedeu frente
à submissão do judeu a algo acima de seu próprio
intelecto. Para os gregos, não poderia haver nada
superior à sua própria mente. Quem insistisse de
outra forma deveria ser educado.

Então, iniciaram-se as perseguições — e eventual-


mente intensificaram-se numa guerra aberta contra
o Judaísmo e, fundamentalmente, contra judeus5.
Mas, o tempo todo, o ponto central girava em
torno de uma guerra contra a santidade6.

Por que óleo?


Esta é a razão pela qual, quando os gregos entr-
aram no Templo, contaminaram todos os óleos que
lá estavam. Poderia-se esperar que saqueassem o
ouro e a prata do Templo, as pedras preciosas, con-
forme é o costume de guerreiros — no entanto, o
Talmud não menciona este tipo de saques. O que os
levou a impurificar o óleo com tanta determinação
e firmeza, até que foi apenas por milagre que um
pote tenha ficado intacto?

O óleo possuía uma função importante no Tem-


plo. Era utilizado em oferendas especiais e como
combustível para acender a Menorá. Sumo Sac-
erdotes e reis eram ungidos com ele. O que há de
especial no óleo?

Os cabalistas destacam o fato de que o óleo


nega-se a se misturar com outros líquidos. Óleo
sempre sobe ao topo. É um líquido que incorpora
transcendência, santidade. Em termos cabalísticos,
o óleo é a incorporação dos aspectos da alma que
se relacionam com D’us de forma que transcende o
intelecto. Óleo é o amor intuitivo e compromisso da
alma com D’us que não são limitados pelos limites
da razão e racionalidade.

Era o aspecto de “óleo” do judeu, seu compro-


misso suprarracional com D’us, que os gregos não
conseguiam suportar. Claro, estude Torá! Cumpra
uma mitsvá! Porém, faça-o como um ser humano
racional, seguindo um código de conduta lógico.
Por que encarar este ato como suprarracional, Di-
vino, um ato que é maior do que você?

Então eles foram atrás do óleo. Cada inimigo


persegue a fonte de vitalidade de seu oponente —
os poços, os estoques de alimento. Os gregos foram
atrás do óleo, pois nele reside o segredo do judeu.
Os gregos de hoje
Estas batalhas antigas ainda estão sendo tra-
vadas hoje. Em todas as gerações há Hamans e
gregos. Só que os gregos contemporâneos não são
sempre intrusos de fora. Estão frequentemente
vivos e bem dentro de nossas mentes, travando
uma batalha persistente contra nossa sensibili-
dade Divina.

Como se enfrenta este inimigo? Como um Ma-


cabeu, com autossacrifício. Matitiahu e seus filhos
eram fracos e poucos. Porém, colocaram de lado
a preocupação com sua própria sobrevivência e
travaram uma batalha contra os fortes e muitos.
Através disto, inspiraram seus companheiros judeus
a arriscar suas vidas pelo Judaísmo e, finalmente,
venceram a guerra.

O mesmo ocorre na batalha versus o grego espir-


itual. Em bons tempos, quando a luz da Divindade
brilha radiante, um serviço Divino baseado no
intelecto pode funcionar. Porém, a mente racional
é incapaz de negar e conquistar o inimigo grego
que envolve nosso mundo em tempos de escuridão
espiritual. Quando o óleo da alma foi contami-
nado, a única resposta e armar-se daquela força
interna que nos permite permanecer firmes frente a
qualquer inimigo que ameaça nosso ser espiritual.
Esta resistência provém de um lugar que transcende
completamente a mente humana. É a mesma re-
sistência que leva o judeu a entregar sua vida em
vez de se ajoelhar a um deus falso. Não necessita
de explicação racional — simplesmente não pode
ser de outra forma.

Para trazer luz à escuridão, o judeu deve encon-


trar aquele pote de óleo, o núcleo mais profundo da
alma — a Yechidá7 — que permanece intacta das
mãos dos inimigos. O pote que não pode ser tocado,
pois está totalmente unido com sua origem Divina.

O que ocorre quando a Yechidá é despertada? O


inimigo não consegue competir. Ele está fora de sua
liga; está submisso. Mais ainda, ele é transformado.
Quando o judeu desperta sua essência Divina, en-
tão, mesmo sua alma animal, seu ego egocêntrico,
passa por uma metamorfose. De repente, ele está
desejando fazer uma mitsvá.
Diferenças da Menorá
Agora podemos compreender as diferenças entre
a Menorá de Chanucá, que acendemos para comem-
orar o milagre que ocorreu, e a Menorá do Templo.
A Menorá do Templo possuía sete braços, enquanto
a de Chanucá possui oito. A Menorá do Templo era
acesa de dia, enquanto a Menorá de Chanucá é acesa
após o pôr do sol. E, enquanto a Menorá do Templo
era acesa dentro do Templo, a Menorá de Chanucá
deve ser acesa fora.8

Por que estas distinções?


Porque acender a Menorá de Chanucá é o assunto
de iluminar a escuridão do exílio espiritual acessan-
do a essência infinita. Por esta razão, acendemo-la
depois do sol já ter se posto — para iluminar o
escuro. E por isto seu local de acendimento é fora,
em “domínio público”9, onde a escuridão está mais
presente.

Esta também é a razão pela qual há oito dias e


velas, pois oito é o número do infinito, o número
que segue e transcende o limite da Criação, rep-
resentado por sete, o número da Criação, que foi
completada em sete dias. Pois somente explorando
nosso potencial infinito é que podemos iluminar
fora, mesmo depois que o sol radiante da claridade
espiritual desapareceu.

Esta luz infinita possui o poder de, primeira-


mente, subjugar e, em ultima instância, transformar
a escuridão. O inimigo não somente recua, mas
passa para nosso lado. Por conseguinte, temos
duas possíveis leituras da lei Talmúdica10 nas quais
se menciona que o tempo para o acendimento da
Menorá se estende até que os “pés dos tarmudai
cessem do mercado”.
Quem são os tarmudai? São catadores de lenha,
pela explicação literal. Porém, os cabalistas e me-
stres chassídicos entendem tarmudai como sendo
os “rebeldes”, os que se revoltam contra a bondade
Divina. O Talmud está insinuando que a Menorá
deve estar acesa até o pé — o aspecto inferior de
tarmudai — cessar, até que a voz mais tenazmente
cínica, finalmente, fique silenciosa.

Aqui, também, os mestres chassídicos percebem


um significado mais profundo na palavra aramaica
para cessar, kalia, que pode significar tanto destru-
ição como desejo, ânsia. A luz da Menorá possui o
poder de destruir e subjugar o tarmudai, mas, em
última instância, tem sucesso em transformá-lo para
que o próprio tarmudai, o local frio e aparentemente
sem esperança, anseie por Divindade.

Mensagem eterna
Então, esta é a mensagem das luzes de Chanucá
para nós, hoje em dia: o sol já se pôs faz tempo.
Estamos vivendo em tempos de profunda escuridão
espiritual. Todavia, as luzes de Chanucá nos con-
tam que esta escuridão possui um propósito. Não é
uma situação natural. É uma aberração que existe
para despertar nossa essência infinita, que possui o
poder de transformar a escuridão em luz. E a escu-
ridão será transformada através de nossos esforços
cumulativos, mesmo através de uma mitsvá, que,
segundo escreve Maimônides, tem o poder de in-
verter a escala, trazendo redenção para o mundo,
anunciando a era de Mashiach.

Se isto é verdade sobre qualquer mitsvá, com


certeza é verdade em relação à mitsvá de Chanucá.
Pois as oito velas de Chanucá são uma prévia dos
tempos de Mashiach, sendo ele mesmo um dos Oito
Príncipes11, de um tempo onde a harpa do Templo
terá oito cordas, uma a mais do que as sete [cordas]
das harpas do Primeiro e Segundo Templos. Pois
naquele tempo, que seja em breve, a infinitude da
realidade Divina será revelada.
TRADUÇÃO
E
COMENTÁRIO
Com a ajuda dos Céus.

Motsaei Shabat, Parashat Mikêts, Shabat Chanucá, 5738 (1977)

Os Sábios ensinaram:1 A mitsvá da vela de


Chanucá... Beit Shamai2 dizem que no primeiro
dia deve-se acender oito [velas], e a partir daí
deve-se diminuir progressivamente. Beit Hilel3
dizem que no primeiro dia deve-se acender uma
[vela], e a partir daí adicionar progressivamente... A
lógica de Beit Shamai é que [o acendimento deve]
corresponder aos bois oferecidos em Sucot [que
decrescem progressivamente]4. A lógica de Beit
Hilel é que a pessoa deve ascender [e aumentar]
em assuntos espirituais...5

A questão apontada pelo Alter Rebe6 é bem


conhecida7: que ligação há entre as velas de Chanucá
e os bois oferecidos em Sucot?

[A questão se torna] especialmente [eloquente]


em vista da afirmação8 do Tsemach Tsedec9, de que
a objeção de Beit Hilel
[em relação à visão de Beit Shamai] está baseada
no princípio de que “deve-se ascender em assuntos
espirituais”10.

Várias fontes11 explicam que a relação entre


Chanucá e Sucot é por serem, os dois, festividades
com oito dias de duração — o número oito indica
um nível que está acima da hishtalshelut12. No
entanto, isto em si requer esclarecimento, pois, que
ligação Sucot e Chanucá possuem com o nível de
acima da hishtalshelut, que os leva a durar oito dias?

DIFERENTEMENTE DO BEIT HAMICDASH


Outra pergunta: os Sábios instituíram as velas
de Chanucá por causa do milagre que ocorreu
com as velas do Beit HaMicdash13. Então, por que
Chanucá possui oito velas (e dias), quando no Beit
HaMicdash havia sete14 velas?15
Um outro ponto requer explicação: as velas de
Chanucá estão sendo comparadas (não com a festa
de Sucot em geral, mas,) especificamente, com os
bois de Sucot16. Porém, a priori, [esta comparação
parece forçada, pois] as velas de Chanucá estão
ligadas com a Menorá [do Templo] (uma vez que
comemoram o milagre ocorrido com as velas
da Menorá),17 enquanto os bois de Sucot eram
oferecidos (assim como todas as oferendas) no
altar [do Templo]. Eis que a Menorá e o Altar
são dois utensílios diferentes 18 (especialmente
conforme explicado na Cabalá e na Chassidut19), e
velas e oferendas são serviços diferentes — tanto
que “a tua (as velas) é maior do que a deles (as
oferendas)...” e nunca se anularão.20 [Então, qual
é a relação entre as velas de Chanucá e os bois de
Sucot?]
POR QUE PÔR DO SOL?

Também devemos compreender por que “a


mitsvá (da vela de Chanucá) é a partir do pôr do
sol”21. A questão aqui é bem conhecida:22 as velas
do Beit HaMicdash eram acesas a partir de plag
haminchá23, uma hora e um quarto antes do pôr do
sol24. Se as velas de Chanucá [foram estabelecidas]
por causa do milagre que ocorreu com as velas do
Beit HaMicdash (conforme citado anteriormente) (e
especialmente uma vez que “tudo o que os Sábios
estabeleceram, estabeleceram similar aos padrões
da Torá25”), teria sido apropriado que seu horário
de acendimento fosse o mesmo do que o das velas
do Beit HaMicdash. Então, por que “sua mitsvá” é
especificamente “a partir do pôr do sol”?
2.

O ponto da explicação26 é que a função das velas


de Chanucá é iluminar a escuridão.

O milagre de Chanucá ocorreu depois que os


gregos entraram no Santuário e impurificaram todos
os óleos que lá estavam.27 Em outras palavras, a
escuridão esmagadora (dos gregos)28 era tanta que
não só entraram no Santuário e o impurificaram,
mas também impurificaram todos os óleos que lá
estavam.29

ÓLEO SAGRADO
Óleo corresponde ao nível de kodesh, “sagrado”,
(conforme escrito30 óleo de ungimento sagrado)31.
“Sagrado é uma palavra per si”32 (similar ao óleo
que flutua33 acima de todos os líquidos e não se
mescla com eles).34

Segue, que a impurificação dos óleos do


Santuário pelos
gregos é (neste aspecto) mais lamentável do que
o fato deles terem impurificado o Santuário35 —
apesar de que a santidade do Santuário figura em
alta graduação nos dez níveis de santidade.36

Evidência disto também é o fato de que mesmo


depois que “Teus filhos vieram e purificaram Teu
Templo” 37, necessitavam precisamente de um
milagre para acender a Menorá — iniciando com
o milagre38 de que “encontraram um pote de óleo
puro selado com o selo do Sumo Sacerdote”.39 Este
[milagre] foi [uma expressão] da Luz Infinita40, que
transcende hishtalshelut.41 Na presença de tal luz,
mesmo a escuridão não escurece.42 Ao contrário, esta
luz ilumina a escuridão até que mesmo a escuridão
brilha43 — e44 Havaye45 (com o acréscimo de “e”46)
iluminará minha escuridão.47
Esta é a razão pela qual a mitsvá da vela de
Chanucá é [cumprida], especificamente, após o pôr
do sol, uma vez que a função das velas de Chanucá
é iluminar a escuridão.48

Esta também é a razão pela qual as velas de


Chanucá são precisamente oito (assim como “os
dias de Chanucá são oito”49) — pois o número
oito indica (conforme citado no cap. 1) o nível que
está além da hishtalshelut, e é devido a este nível,
propriamente dito, que é possível iluminar até a
escuridão.50
3.

A explicação do assunto, no que se refere ao


serviço do homem51, pode ser compreendida através
da introdução das ideias explicadas nos discursos
de meu sogro, o Rebe:52

O fato dos gregos impurificarem os óleos do


Santuário foi porque toda sua guerra era espiritual.
Não queriam ferir os corpos de Israel53; seu principal
desejo era “causá-los [ao povo de Israel] esquecer
Tua Torá e tirá-los dos estatutos de Tua Vontade”.54

TUA TORÁ
Mesmo nesta batalha (contra Torá e mitsvot),
sua principal luta era contra a espiritualidade (e
Divindade)55 de Torá e mitsvot.56

Portanto, “causá-los esquecer Tua Torá”


(especialmente “Tua Torá”). Mesmo os gregos não
se incomodavam (tanto) se os judeus estudassem
Torá. Mas queriam que a Torá fosse estudada por
seu lado intelectual — “Pois é sua sabedoria e
entendimento aos olhos das nações”57. Sua principal
batalha era procurar fazê-los
esquecer Tua Torá; fazer Israel esquecer, D’us não
o permita, que a Torá é a Torá de Hashem.58

OS ESTATUTOS
De forma similar ocorreu em relação às mitsvot: a
luta dos gregos era contra a Divindade das mitsvot,
contra o fato de que mitsvot são a Vontade Divina.

Por conseguinte, “tirá-los dos estatutos de


Tua Vontade” (precisamente “estatutos” e
especificamente “Tua Vontade” ) possui duas
interpretações:

Mesmo os gregos concordavam com as mitsvot


de testemunho e judiciais, uma vez que são mitsvot
racionais59. Toda sua luta foi contra o tipo de mitsvot
chamado de estatutos, uma vez que são cumpridos
somente por serem Vontade Divina.60

Uma segunda explicação (mais profunda) é


que seu desejo de “tirá-los dos estatutos de Tua
Vontade” incluía todas as mitsvot, mesmo as de
testemunho e judiciais [conforme será explicado
no próximo capítulo].61
4.
Podemos entender este [último ponto] baseando-
se no conceito conhecido62 de que mesmo as mitsvot
de testemunho e judiciais devem ser cumpridas
(principalmente) por serem a Vontade Divina, assim
como o tipo de mitsvot chamado de estatutos.63

CUMPRINDO MITSVOT
Este conceito (de que mesmo mitsvot que
possuem razão devem ser cumpridas por serem a
Vontade Divina) refere-se não somente à pessoa que
as cumpre — que seu cumprimento de mitsvot deve
ser como o serviço de um servo64, o que só é possível
quando cumpre as mitsvot (não por causa da razão
ou lógica, mas) devido ao mandamento do Senhor.65
Mas, refere-se, também, às próprias mitsvot. Todas
as mitsvot (mesmo estas para as quais há uma razão)
são Vontade Divina — vontade que transcende a
razão.66 Só que D’us instituiu que o desejo por tais
mitsvot se invista, também, na razão.67

RAZÕES PARA AS MITSVOT


Mais ainda, mesmo as razões para as mitsvot
(em sua forma verdadeira) transcendem a lógica
humana, pois a forma verdadeira das razões é
como elas existem na sabedoria Divina. E uma
vez que a sabedoria de D’us [assim como D’us
Mesmo] é também infinita (especialmente que
“Ele e Sua sabedoria são Um”68), é impossível
ao intelecto finito de seres criados apreender as
verdadeiras razões para as mitsvot.69
Conforme explicado em Iguéret HaCodesh:

“As razões para as mitsvot não foram reveladas


e estão além da lógica e entendimento. E mesmo
nas poucas vezes70 onde uma razão aparentemente
inteligível tenha sido revelada e explicada para nós,
esta razão em si, que é compreendida por nós, não
é a razão principal e completa...71

Este assunto (de que a razão que compreendemos


não é a principal) é compreendido pela mente
humana. Mesmo a lógica humana entende claramente
que intelecto finito é incapaz de captar a sabedoria
infinita de D’us. Ao contrário, o fato de que, em
alguns casos, algumas razões inteligíveis nos foram
reveladas e explicadas, é um fenômeno incrível. É
somente bondade Divina que possibilita com que
mesmo o intelecto humano tenha alguma apreensão
[da razão da mitsvá].

Todavia, mesmo depois que uma razão inteligível


tenha nos sido revelada e explicada através da
bondade Divina, é conhecido que esta razão se
refere somente à mitsvá em geral, e não a seus
detalhes.72
MITSVOT DE TESTEMUNHO E JUDICIAIS

De tudo o que foi citado, segue que as mitsvot


de testemunho e as judiciais são também (como)
os estatutos em relação a nós (uma vez que mesmo
a razão para as mitsvot que derivam da sabedoria
Divina transcende a lógica de seres criados).

Mais ainda, são “Tua Vontade” (Vontade Divina


que transcende até a sabedoria Divina).

Então, quando se diz que os gregos queriam “tirá-


los dos estatutos de Tua Vontade” está se referindo
também a [seu desejo de afastá-los das] mitsvot de
testemunho e judiciais.73 Pois os gregos procuraram,
D’us não o permita, arrancar de Israel o sentimento
Divino em mitsvot, a ideia de que todas as mitsvot
são sabedoria Divina que transcende a lógica humana
(“tirá-los dos estatutos de”), e queriam, D’us não
o permita, arrancar deles o sentimento de que as
mitsvot são a Vontade Divina (“Tua Vontade”).74
5.

OPERAÇÃO: CONTAMINANDO ÓLEO


Agora podemos entender a linguagem do
Talmud, “Quando os gregos entraram no Santuário,
contaminaram todos os óleos que lá estavam”.75

A implicação é que, ao entrar no Santuário,


empenharam-se e se esforçaram para contaminar os
óleos (a fim de, D’us não o permita, vencer Israel).76

[Em termos cabalísticos:] O Santuário corresponde


a biná, enquanto óleo corresponde a chochmá, que
transcende a lógica de biná77 (conforme mencionado
no cap. 2, de que óleo é o nível de “santidade”78).

Por esta razão, eles contaminaram todos os óleos


que estavam no “santuário de biná” a fim de, D’us
não o permita, levar adiante seu plano de “causar
com que esqueçam Tua Torá e tirá-los dos estatutos
de Tua Vontade” — para levar Israel a estudar Torá
e cumprir mitsvot somente por razões racionais.79
6.

Para vencer esta guerra, um serviço [Divino]


racional não seria suficiente.80 Mesmo um serviço
suprarracional que está ligado com racionalidade
(um serviço que se origina do nível de makif de
Chayá81, o “makif próximo”82) não seria suficiente.
Pois os gregos também contaminaram “todos
os óleos do Santuário”, significando, mesmo os
assuntos sagrados que transcendem o racional, mas
que estão ligados a este [foram contaminados].

Vencer a guerra requer precisamente o serviço


de autossacrifício, que é permanecer firme contra
todos os obstáculos e barreiras, [evocar] uma força
inerente que transcende completamente o intelecto.
Isto é similar ao autossacrifício pela santificação do
Nome de Hashem, que não deriva de nenhuma lógica
intelectual, mas somente do fato de que não pode
ser, absolutamente, de outra forma83. Esta sensação
provém da ligação da essência da alma, o nível
da alma chamado de Yechidá84 — e a natureza de
uma ligação essencial é que não pode, absolutamente,
ser de outra forma, D’us não o permita.85

O nível de Yechidá não é suscetível a mancha ou


impureza, D’us não o permita. (Similar a um pote
de óleo encontrado com o selo do Sumo Sacerdote
ainda intacto86, uma vez que os “de fora” são
incapazes de alcançar lá.87) Portanto, é precisamente
através do serviço de autossacrifício, que deriva da
Yechidá, que a guerra pode ser vencida.88

Assim ocorreu na guerra contra os gregos


propriamente dita, a nível físico. Através do
autossacrifício de Matitiáhu e seus filhos, que,
apesar de serem fracos e poucos, se levantaram
com autossacrifício para guerrear contra os fortes
e muitos, e através disto inspiraram e despertaram
as pessoas de sua geração a entregar suas vidas para
santificar o Nome de D’us e a abster-se de violar
a religião de alguma forma — foi através deste
[autossacrifício] que eles venceram a guerra.89
7.
Vitória numa guerra que é alcançada através do
serviço de autossacrifício é uma vitória completa.
Isto porque, em primeiro lugar, o serviço de
autossacrifício — uma vez que deriva da essência
da alma 90 — permeia todas as faculdades da
alma até chegar à faculdade da ação.91 Em tudo o
que a pessoa se empenha [no serviço de atos de
autossacrifício], fica evidente que está sendo feito
por um “judeu de autossacrifício”.

Isto é similar ao que está escrito sobre Avraham:


“Ékev [“por causa de” ou “o calcanhar de”92]
Avraham escutou a Minha voz”93. Através de
seu autossacrifício ele fez com que mesmo seu
calcanhar escutou (ou seja, internalizou) a ordem
Divina94.

REALMENTE SOZINHO
Mais ainda, [autossacrifício alcança uma vitória
completa porque] não pode haver nenhum oponente
ao nível de Yechidá. Pode haver oposição ao
serviço Divino racional e mesmo ao serviço Divino
suprarracional que está ligado à racionalidade.
Porém, quando a pessoa desperta e revela seu nível
de Yechidá, não pode haver oposição95.

Além disso, a revelação da Yechidá da alma afeta


também a alma animal; a própria materialidade
da alma animal é transformada de um extremo ao
outro.96
LUZES DE CHANUCÁ
Agora podemos compreender por que as velas
de Chanucá são diferentes das velas do Beit
HaMicdash — tanto em número como em seu
horário de acendimento.

Pois Chanucá representa o serviço de


autossacrifício que deriva do nível de Yechidá, que
transcende a estrutura (humana) de hishtalshelut.97
Portanto, são oito velas [em Chanucá], uma vez que
o número oito é ligado à dimensão que transcende
hishtalshelut (conforme mencionado acima, cap. 1).

DUAS HARPAS
Isto é similar à diferença entre a harpa do Beit
HaMicdash, que possuía sete cordas, e a harpa da Época
de Mashiach98, que terá oito cordas99. Mesmo que o
Beit HaMicdash é o lugar mais sagrado do mundo, e
especialmente [é elevada] a harpa do Beit HaMicdash
que incorpora o conceito de atrair o Nome Divino
Havaye — pois kinor (harpa) contém as letras chaf e
vav (o número equivalente ao Nome Havaye) e ner100
[nun e resh] (a alma do homem é uma vela Divina101)102
— porém, é somente a perfeição do sêder hishtalshelut.
Por isso, possuía sete cordas.

Nos dias de Mashiach, em contraste, quando


haverá uma revelação do nível que transcende
hishtalshelut (ou seja, do Nome Havaye supremo103),
a harpa terá oito cordas.104

HORÁRIO DE ACENDIMENTO
Esta é também a razão pela qual as velas de
Chanucá são diferentes das velas do Beit HaMicdash
em relação a seu horário de acendimento, razão pela
qual a mitsvá do acendimento das velas de Chanucá
inicia quando o sol se põe. Pois é especificamente
através da revelação (do nível de Yechidá) que
transcende a hishtalshelut (da pessoa), que se pode
iluminar até a escuridão. Não somente que, na
presença desta luz, a escuridão não oculta, mas a
própria escuridão é transformada em luz.105

Esta também é a razão pela qual o horário de


acendimento das velas de Chanucá se estende “até
que cesse o pé do mercado... até que os pés dos
tarmudai cessem (kalya)”106.

[Num sentido espiritual,] Tarmudai se refere


àqueles que se rebelam contra o Reinado Celestial
(tarmud é formado pelas mesmas letras [hebraicas]
de moredet [que significa “rebelde”])107. Estes
tarmudai permanecem “no mercado”108 — em
terreno de “domínio público” 109 e “picos de
separação”110.

E as velas de Chanucá causam “os pés dos


tarmudai de serem ‘kalya’”, que pode ser explicado
de duas formas:

a) a luz da vela de Chanucá mechalê [destrói]


e anula os pés dos tarmudai111; b) a luz da vela de
Chanucá causa um kilaion [anseio por Divindade]
mesmo nos pés dos tarmudai; tanto que, até os
rebeldes alcançarão o nível de kelot hanéfesh, uma
ânsia extasiada da alma [por Divindade].112
8.
Baseando-se em tudo o que foi mencionado,
podemos entender a comparação das velas de
Chanucá com Sucot e com os bois de Sucot.

UM E SETE
O conceito de Sucot (e dos bois de Sucot) é a
revelação dos makifim113 — assim como a própria
Sucá que envolve a pessoa114. E no oitavo [dia] de
Sucot, os makifim são atraídos e são absorvidos
também internamente, o que é similar ao serviço de
autossacrifício (de Chanucá) que afeta (conforme
citado115) e permeia todas as faculdades da alma.

Por isto, ambos (Sucot e Chanucá) consistem


de oito dias, pois o número oito é composto de um
e sete, significando que o “Um” (que transcende
hishtalshelut ) é atraído para dentro dos sete
(hishtalshelut).116

TRANSFORMAÇÃO
E assim como as velas de Chanucá afetam os
pés dos tarmudai de duas formas — no início os
destrói e os anula, e depois causa com que sejam
transformados em santidade117 — uma patente
similar ocorre com a oferenda dos 70 bois de Sucot,
que correspondem às 70 nações do mundo118: no
começo, as oferendas causam com que as nações se
enfraqueçam progressivamente119, e depois causam
com que, até elas, auxiliem Israel.
Conforme dizem nossos Sábios:

Se as nações do mundo soubessem o quão


benéfico lhes é o Beit HaMicdash, o teriam
cercado com kastryiot120 para protegê-lo...121

Depois de levar as nações à experiência de


“transformação”, tornam-se um veículo para um
aumento em proteção (até) em assuntos de santidade
— a proteção do Beit HaMicdash.122

TRANSFORMAÇÃO FUTURA
Isto é similar ao que ocorrerá no Futuro 123:
[Primeiro] Eu, então, transformarei as nações... para
servi-Lo numa só união124, e então levantar-se-ão
estrangeiros e pastorearão os teus rebanhos.125 É
similar às oferendas dos 70 bois que correspondem
[e transformam] as 70 nações. Tanto que, através e
por causa das nações, é adicionada uma oferenda
para o povo judeu (no oitavo dia de Sucot) no Beit
HaMicdash.126
9.

O assunto de [acender a vela de Chanucá]


“desde que o sol se põe” refere-se, especialmente,
à escuridão do Exílio127, especialmente à escuridão
dobrada e redobrada dos tempos “da Vinda do
Mashiach”.128

Então, este é o ensinamento da vela de Chanucá


para cada pessoa, em particular, durante os tempos
de Exílio:

O propósito da escuridão do Exílio é para


despertar o serviço de autossacrifício, através do
qual a escuridão é refinada e transformada em luz.
E através do serviço coletivo de cada membro
particular do povo de Israel juntos, ou pelo menos
sua maioria (uma vez que a maioria de uma entidade
é considerada sua totalidade129), e mesmo através
de uma mitsvá de um judeu, seja em ação, fala
ou pensamento, “ele inclina a escala para o lado
favorável para si e para o mundo todo e causa para
si e para eles salvação”.130
10.

CHANUCÁ E MASHIACH
[Se qualquer mitsvá pode trazer salvação para o
mundo,] certamente um acréscimo no cumprimento
da mitsvá da vela de Chanucá poderia [trazer
salvação]:

Pois esta mitsvá é especialmente ligada com


a salvação, a redenção que ocorrerá através de
Mashiach, uma vez que Mashiach, assim como
Eliahu, “Arauto da Redenção”131, são dos Oito
Príncipes,132 conceito idêntico ao das oito velas de
Chanucá133.

Há outro aspecto sobre a relação especial entre as


velas de Chanucá e a futura redenção. Assim como as
velas de Chanucá nunca cessarão,134 assim também a
futura redenção será um redenção eterna, após a qual
não há possibilidade de haver Exílio135. De forma
similar, o terceiro Beit HaMicdash é um Templo
eterno136, que nunca cessará. [Tudo isso acontecerá]
com a vinda de nosso justo Mashiach, que venha e
nos redima e nos lidere orgulhosamente para nossa
Terra — que seja muito em breve.
PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

T emos o prazer de apresentar “O Caminho para


Autoabnegação”, discurso pronunciado pelo
Rebe de Lubavitch, Rabi Menachem M. Schneer-
son, de abençoada memória, na véspera do jejum de
Dez de Tevet 5738 (1977), como parte da aclamada
Série do Patrimônio Chassídico.

Naquela ocasião, o Rebe estava se recuperando


de um ataque cardíaco que sofreu na noite de Shem-
iní Atséret e pronunciava periodicamente discursos
de seu escritório na Sede Mundial de Lubavitch,
através de um sistema especial de transmissão
simultânea, para a sinagoga principal. Este foi o
último desses discursos exclusivos, pois, subse-
quentemente, ele voltou à sua rotina quotidiana.

Iniciando com as palavras Yehudá Atá, o dis-


curso examina as bênçãos com as quais Yaacov
abençoou seu quarto filho, Yehudá, em compara-
ção com as bênçãos dadas aos seus três primeiros
filhos Reuven, Shimon e Levi. Os filhos de Yaacov
incorporam formas distintas de serviço Divino,
que correspondem às seções distintas das orações
do Shemá e da Amidá. Usando essas diferenças, o
discurso se estende derivando lições sobre a ligação
da alma judia individual com D’us.

O Rabino Shmuel Simpson traduziu o discurso


e o Rabino Avraham D. Vaisfiche proveu os co-
mentários. Agradecimentos especiais para o Rabino
Yossef B. Friedman e Dovid Olidort por sua orien-
tação editorial, e para o Rabino Mendel Laine, por
coordenar o projeto.

Kehot Society Publications


12-13 de Tamuz, 5769
Brooklyn, New York
INTRODUÇÃO E PERSPECTIVA

M ais frequentemente do que não, consider-


amos-nos autossuficientes, sem necessi-
tarmos de nos conectar com algo superior a nós
mesmos. Mesmo sem intencionar conscientemente
adotar esta atitude individualista, nossa rotina diária
de satisfazer nossas necessidades materiais, inevi-
tavelmente, fomenta esta forma de pensar. A triste
realidade é que, na maioria das vezes, escolhemos
nos preocupar com os aspectos mundanos da vida
e de autossatisfação.

Porém, quando olhamos mais profundamente


para dentro de nós mesmos, podemos encontrar um
desejo de nos conectar com uma realidade superior,
um desejo de transcender nossas limitações físicas e
nos ligar a D’us. Quando este sentimento é desper-
tado, nosso ser completo é envolvido por um senti-
mento de submissão, como se nada mais existisse
além de D’us. E este é o desejo de ser envolvido por
D’us, de “abranger-se” totalmente em Divindade,
assim como uma criança sente, num abraço caloroso
dos pais. Esta ânsia está arraigada na estrutura da
alma judia e é impossível extingui-la; permanece
sempre uma parte essencial de nosso ser.

No entanto, não é fácil atingir esta experiência


sublime, uma vez que requer um regimento rigoroso
e sistemático de preparação. Isto envolve, inevi-
tavelmente, o domínio de certos níveis inferiores
de serviço Divino.

Felizmente, todo dia temos uma oportunidade


de progredir em nossa conexão com D’us durante
nossas rezas. A Oração Matinal é comparada a uma
escada1 através da qual a pessoa ascende em seu
relacionamento com D’us. Cada seção da liturgia
se constitui num outro degrau da escada do serviço
Divino, sendo a seção final, a Amidá, o nível supe-
rior, o zênite do serviço Divino.

Neste discurso, o Rebe discorre sobre este nível


profundo de submissão a D’us e elabora sobre as
três formas de serviço Divino que o precedem e
levam à sua revelação.
* * *
O discurso inicia com Yaacov abençoando seu
quarto filho: “Yehudá, seus irmãos se submeterão a
você”. Cada um dos filhos de Yaacov simboliza uma
forma diferente de serviço Divino. A Chassidut ex-
plica que nomes não são designados arbitrariamente,
mas sim, o nome expressa a natureza e o caráter do
objeto ao qual é designado2. Sendo assim, os nomes
de cada uma das doze tribos descreve o serviço Di-
vino que cada tribo representa.

Os serviços Divinos simbolizados pelos filhos


de Yaacov constam de várias categorias. Os três
primeiros filhos, Reuven, Shimon e Levi, todos
representam serviços Divinos baseados na razão
e entendimento. Yehudá, o quarto filho, constitui
um nível superior: o serviço Divino que transcende
razão e entendimento. Este último nível só pode ser
alcançado implementando-se os níveis de serviço
Divino representados pelos três primeiros filhos. E
sobre o versículo que abre o discurso é explicado
que, ao dominar o serviço Divino representado pe-
los três primeiros irmãos, pode-se alcançar o serviço
Divino superior, associado a Yehudá.
Reuven
O primeiro nível de serviço Divino é o represen-
tado por Reuven. O nome Reuven é derivado da
palavra ra’á, ver, significando que o serviço Divino
de Reuven é o de visão, contrário à audição.

Assim como há visão física, há também visão


intelectual, também referida como “os olhos do
intelecto”. Este é um nível de cognição alcançado
através de intensa contemplação. Neste estado, a
pessoa não entende Divindade meramente num
nível analítico, mas visualiza Divindade com os
“olhos” da mente.

Quando alguém testemunha um acontecimento,


não há quantidade de argumentos que possam con-
vencê-lo de que o fato não ocorreu, uma vez que
ele o viu com seus próprios olhos. Inversamente,
quando alguém escuta sobre um acontecimento, não
está tão certo do assunto e ainda pode ser conven-
cido de forma diferente.

Similarmente, esta profunda contemplação eleva


a pessoa a um estado superior de certeza e convicção
em relação à realidade da Divindade, assim como
a pessoa está certa da veracidade de um evento que
testemunhou pessoalmente.

Visão denota proximidade, o que é muito ligado


a amor, pois amamos àquilo a que nos sentimos
próximos. Portanto, visão representa um relacio-
namento amoroso e íntimo com D’us, relaciona-
mento que flui de uma sensação de proximidade.
Este sentimento de proximidade é alimentado
durante a oração, ao recitar os Versículos de Lou-
vor (Pessukei Dezimrá) que constantemente ref-
erem-se aos atos maravilhosos de D’us – fazendo
com que nos sintamos próximos a Ele. Portanto,
na seção seguinte das rezas, recitamos o Shemá,
onde dizemos: “E amarás ao Eterno, teu D’us”.
Este é o serviço Divino simbolizado por Reuven:
“vendo” Divindade e o amor a D’us que isto evoca.

Shimon
O nome Shimon é derivado da palavra shamá,
ouvir. Em hebraico, a palavra shemiá é sinônima
de compreensão e entendimento.
Compreensão intelectual assemelha-se à audição,
no sentido de que ambas indicam distância do ob-
jeto ou acontecimento escutado ou compreendido.
Ouvir sobre o acontecimento significa que a pessoa
não estava presente e não o testemunhou, mas sim,
que os detalhes do acontecimento foram contados
por outra pessoa. De forma similar, no processo da
compreensão intelectual, as faculdades da pessoa
analisam certa informação e se esforçam para criar
uma aproximação mental àquilo que foi descrito,
sem experimentar diretamente o próprio objeto ou
acontecimento.

Esta distância, inerente da compreensão de


Divindade, leva à emoção de temor. É análogo
a alguém que cumpre as mitsvot devido à plena
aceitação do jugo dos Céus. Tal pessoa pode sen-
tir-se demais “temerosa” de se aproximar de D’us
através da meditação íntima, e prefere ficar “a certa
distância”, cumprindo mitsvot meramente em sua
forma prática.

Portanto, Shimon denota serviço Divino através


do “escutar” e entender Divindade, sendo evocados,
portanto, o medo e o temor — em contradição a
Reuven, que denota a “visão” da Divindade.

Na oração, isto corresponde à segunda seção do


Shemá, que inicia “E será se vocês obedecerem
diligentemente...” (shamoa tishme’ú em hebraico
é similar a Shimon).
Levi
O nome Levi é derivado da palavra yilavê, tor-
nar-se ligado, simbolizando a ligação com D’us
estabelecida através do estudo da Torá.

O nome de Levi é derivado da palavra yilavê na


afirmação de Léa “Agora meu marido ficará liga-
do a mim”3, e corresponde àquilo que é recitado
após o Shemá: “Verdade e certo... é esta coisa para
nós por toda a eternidade”. O termo “Esta coisa”
refere- ao assunto discutido no início do Shemá
– “e estas palavras que Eu te ordeno hoje” – a
saber, a Torá4. E é através da Torá que o judeu se
torna ligado a D’us (o “marido” do povo judeu)5.

A Torá é a manifestação da Sabedoria Divi-


na e é, portanto, referida como Chochmato shel
Hakadosh Baruch Hu, “a Sabedoria de D’us”.6 At-
ravés do estudo da Torá, a mente, tanto apreende
a Sabedoria Divina, como é envolvida por esta,
criando uma união única entre o homem e D’us.

Apesar de Reuven, Shimon e Levi representarem


formas importantes de serviço Divino, são meras
preparações e introduções para o nível de Yehudá.

Estes três níveis representam serviços Divinos


que estão dentro do reino da razão e entendimen-
to, que são alcançados utilizando-se do intelecto e
emoção no serviço a D’us. Desta forma, a pessoa
permanece uma entidade separada, um ser indepen-
dente, que usa seu intelecto para reconhecer, através
de uma profunda contemplação, a grandeza de D’us
e a insignificância o homem. Mais ainda, mesmo
quando experimentando amor e temor a D’us neste
nível, a pessoa ainda é referida como um yesh mi
sheohev, “uma entidade autoconsciente que ama”7.

Yehudá
Em ocasião do nascimento de Yehudá, sua mãe,
Léa, disse “Desta vez agradecerei [odê] D’us [pois
Ele me permitiu ter mais filhos do que minha parte
natural em relação ao número total dos filhos de
meu marido]”, e, portanto, ela o chamou de Judá
[Yehudá]8. A Chassidut9 explica que ao agradecer
e reconhecer D’us, a pessoa concretiza submissão
total e autonulificação para D’us. Isto ocorre se
elevando acima do próprio ego e reconhecendo
que não há verdadeira existência além de D’us. É,
principalmente, exemplificado na oração – durante
a Amidá e Alênu – quando a pessoa fica de pé e se
curva com a submissão de um servo perante seu
amo.

Isto é similar a Léa agradecendo D’us especifi-


camente no nascimento de seu quarto filho, pois,
para revelar este nível de autotranscendência, a
pessoa deve, antes, realizar o serviço Divino dos
três primeiros níveis. Somente após experimentar
Divindade com o intelecto e emoções, a pessoa pode
prosseguir estas faculdades limitadas e alcançar
total nulificação para D’us.

A necessidade de Yehudá ser precedido pelos


primeiros três níveis de serviço Divino é somente
para que este nível alcance um estado revelado,
uma vez que de forma íntima e oculta, ele está,
constantemente, lá. A alma é, portanto, comparada
a uma chama que anseia por separar-se do pavio e
unir-se à sua fonte.

Porém, às vezes, este desejo natural da alma


pode ser oculto, como resultado de indulgência nos
prazeres mundanos. A fim de revelar a submissão
essencial a D’us inerente na alma, é necessário,
primeiro, aplicar os serviços Divinos de Reuven,
Shimon e Levi. Isto descasca as camadas do mun-
do que oculta a alma. Somente então o potencial
da pessoa de submissão a D’us, simbolizado por
Yehudá, pode ser revelado de seu estado latente.

Resultado
Yaacov concluiu sua bênção para Yehudá: “Sua
mão estará sobre a nuca de seus inimigos”. Ao
revelar o nível representado por Yehudá, a pessoa
consegue dominar tanto o inimigo físico como o
espiritual. E isto pode ocorrer mesmo enquanto o
povo judeu se encontra no exílio, através do estu-
do da Torá e do cumprimento das mitsvot. A luz
espiritual decorrente disto levará o povo judeu a
triunfar sobre seus inimigos, ter sucesso em dissipar
a escuridão do exílio, e trazer a redenção, através
do justo Mashiach.
Com a ajuda dos Céus.

Segunda-feira à noite, Parashat Vaiechi, 10 de Tevet, que será


transformado em alegria — discurso pronunciado no quarto do
Rebe — 5738

— transcrição —

YEHUDÁ, TEUS IRMÃOS TE RECON-


HECERÃO1. Rabi Shneor Zalman de Liadi explica
no Torá Or, no início desta porção2, que Yehudá
— que foi assim chamado, pois [Léa disse]: “De-
sta vez agradecerei [odê] D’us”3 — simboliza o
agradecimento e reconhecimento a D’us encontrado
em todas as almas judias. Este reconhecimento é
revelado através de teus irmãos [Reuven, Shimon
e Levi, que nasceram antes dele]4. Este, então, é o
significado do versículo “teus irmãos se submeterão
a ti”: “teus irmãos” [Reuven, Shimon e Levi] levam
e conduzem o “reconhecimento” simbolizado por
Yehudá (a um estado revelado).

Rabi Shneor Zalman explica que Reuven e Shi-


mon correspondem aos dois primeiros capítulos do
Shemá, e Levi corresponde à bênção de Emét veiat-
siv (que é recitada após o Shemá). É através destes
todos que chegamos à Amidá, que corresponde ao
reconhecimento e autoanulação de Yehudá5.

2.

O assunto é (conforme explicado no Torá Or,


ibid.) que Reuven
foi chamado assim, pois [Léa disse:] “D’us viu
[ra’á] minhas aflições”6, e Shimon “Pois D’us ou-
viu [shamá] que eu fui desprezada”7. Em termos de
serviço Divino (em cada indivíduo do povo de Israel),
o aspecto de Reuven simboliza a pessoa que serve a
D’us, não meramente no nível de entender Divin-
dade, mas no de “ver” Divindade. Sua convicção da
realidade da Divindade é com a maior das certezas,
assim como alguém que vê algo, e, portanto, não
possui dúvida alguma sobre isso, uma vez que ele
mesmo viu.8 De forma similar é no serviço Divino
da pessoa, sua contemplação de Divindade [espe-
cialmente no assunto de Providência Divina] é sob
forma (de “enxergar”) que o assunto se torna claro
para ela como se o tivesse, de fato, visto. Perceber a
D’us de tal forma resulta em amor a D’us9, conforme
está escrito (em relação a chamar o nomea Reuven),
“pois D’us viu [ra’á]... e agora meu marido me ama-
rá”6. Isto é expresso no primeiro capítulo do Shemá,
onde está escrito “E amarás ao Eterno, teu D’us”10.

O aspecto de Shimon (assim chamado, pois Léa


disse: “Pois D’us ouviu” [shamá]) simboliza uma
pessoa cujo serviço Divino está meramente no nível
de “ouvir” e “entender”11, não no de “ver”. Uma vez
que ela está ainda distante da Divindade [similar a
uma pessoa que escuta sobre algo, mas ela mesma
não viu], então seu serviço Divino está sob a forma
de temor12. Isto
está expresso no segundo capítulo do Shemá, [que
inicia] “Se você der ouvidos aos Meus mandamen-
tos... cuidem-se para não serem induzidos por seu
coração”13. Uma vez que a pessoa percebe Divin-
dade sob a forma de “ouvir” (“Se você der ouvidos
aos Meus mandamentos”), então seu serviço a D’us
deve ser o de temor (“cuidem-se para não serem
induzidos por seu coração...”).

O aspecto de Levi — assim chamado pois [Léa


disse:] “Agora meu marido ficará ligado a mim”14
— corresponde àquilo que é recitado depois do
Shemá: “Verdade e certo... é esta coisa para nós”.
“Esta coisa” se refere à Torá, pois é através da Torá
que “meu marido ficará ligado a mim” (conforme
será explicado a seguir)15.

3.

Estes três aspectos (de Reuven, Shimon e Levi)


representam os três pilares sobre os quais o mundo
se sustenta16 [assim como o homem, que é referido
como um “mundo em miniatura”17]: Torá, avodá18
e atos de bondade.
Reuven, que denota o serviço a D’us com amor,
representa o pilar de atos de bondade. Pois alguém
que ama a D’us também ama o povo judeu [pois
o amor a D’us e o amor ao povo judeu são uma só
coisa]19. Então ele serve a D’us com bondade, pois
o amor é a causa e o aspecto íntimo da bondade20
— um movimento de cima para baixo21.

Shimon, que denota o serviço a D’us com temor,


representa o pilar de avodá, oração — “o vetor da
esquerda”22 — [em particular, corresponde
ao segundo capítulo do Shemá, conforme explicado
anteriormente23], correspondendo a uma elevação
de baixo para cima24.

Levi, assim chamado porque “Agora meu marido


ficará ligado a mim”, representa o pilar da Torá, pois
é através da Torá que o povo judeu e D’us se tornam
um25. Portanto, “Agora meu marido ficará ligado a
mim”: através da Torá, a pessoa fica “ligada” com
“meu marido”, D’us, a um ponto de o povo judeu
e D’us tornarem-se um26. De acordo com isso,
“Verdade e certo... é a coisa”, que se refere à Torá27,
corresponde a Levi, que denota o pilar da Torá.

4.

Este, então, é o significado do versículo “Yehudá,


teus irmãos te reconhecerão”: as formas de serviço
Divino de (teus irmãos) Reuven, Shimon e Levi —
correspondentes aos dois primeiros capítulos do
Shemá e “Verdade e certo...” — são uma introdução
e preparação para a forma
de serviço Divino de Yehudá28 — o serviço da
Amidá —, que é de reconhecimento e autoanulação
para D’us, assim como “um servo perante seu
amo”29. A autoanulação da oração da Amidá é total,
até maior do que [aquela representada por] o Shemá.
Isto fica evidente das diferenças entre a Amidá e o
Shemá em relação às leis (de interrupções, etc.)30.

Este conceito — de alcançar o nível de Yehudá (o


quarto filho), ao implementar primeiro os serviços
Divinos de Reuven, Shimon e Levi — é similar ao
que é conhecido31 em relação às “três coroas [da
Torá, do sacerdócio e do reinado, que correspondem
aos três pilares de Torá, avodá e atos de bondade32]
e a coroa do bom nome, que se sobrepõe sobre todas
elas”33: para se alcançar a “coroa do bom nome”
deve-se, primeiro, alcançar as três primeiras coroas
— que “se sobrepõe sobre todas elas” 34.

Eis que a necessidade do nível de Yehudá ser


precedido pelos serviços Divinos representados
por Reuven, Shimon e Levi é apenas para que o
reconhecimento do nível de Yehudá entre num es-
tado revelado. Mas, de forma oculta e íntima, este
reconhecimento é constante. Conforme explicado
no Torá Or35, a letra yud da palavra Yehudá denota
constância, conforme no versículo “Assim [costu-
mava] Jó fazer todos os dias”36. Isto indica que o
reconhecimento dentro de cada judeu é constante.
Aquilo que está escrito “Desta vez agradecerei
a D’us” (implicando que o reconhecimento é su-
jeito a mudanças) — só se aplica a sua revelação,
devido ao ocultamento causado pelo corpo e pela
alma animal (e, especialmente, como resultado do
exílio). Porém, a alma Divina que se encontra dentro
de cada judeu, [que é sua verdadeira essência,] é
“sempre fiel a Ele”37, e seu agradecimento a D’us
é constante e não é, D’us não o permita, sujeito a
mudanças.

O prefácio das formas de serviço Divino de Re-


uven, Shimon e Levi, só são necessários a fim de
despertar38 e revelar o reconhecimento inato que
se encontra no coração [de todo judeu], a ponto de
ser revelado de seu estado latente e afetar, de forma
concreta, o pensamento, a fala e a ação.

6.

O versículo de abertura continua: “Sua mão es-


tará sobre a nuca de seus inimigos”. Pois ao revelar
o reconhecimento do nível de Yehudá, “Sua mão”
é colocada “sobre a nuca de seus inimigos”, em
sentido espiritual (conforme explicado no Torá
Or39), assim como em sentido literal — pois “um
versículo não foge de seu sentido literal”40.

Os versículos que se seguem afirmam: “Um fil-


hote de leão [e] um leão adulto é Yehudá... O cetro
não se afastará de Yehudá”41. Pode ser dito que isto
indica que a concretização de “Sua mão estará sobre
a nuca de seus inimigos” pode ocorrer ainda antes
da redenção final42.
Pois os versículos “Um filhote de leão [e] um
leão adulto é Yehudá... O cetro não se afastará de
Yehudá” referem-se a David e Shlomo, de cuja
descendência virá o Mashiach43, sobre o qual está
escrito: “E um cetro erguer-se-á em Israel”44.

[Naquela época, “Meu servo David reinará


sobre eles45 e David, Meu servo, os liderará para
sempre”46, conforme escrito na Haftará do Shabat
passado47, do qual são abençoados todos os dias da
semana seguinte48.]

Porém, mesmo antes da vinda de Mashiach,


no final do exílio49, “Sua mão estará sobre a nuca
de seus inimigos”, e temor e medo recairão sobre
todos os inimigos do povo judeu [uma vez que
todo o povo judeu é referido como Yehudá]50. Pois
é através da revelação do reconhecimento que se
encontra dentro das almas do povo judeu em geral,
a ponto de afetar concretamente o pensamento, a
fala e a ação da pessoa “Seguindo Meus estatutos
e observando Minhas mitsvot”51, que então “Seus
inimigos cairão diante de vocês”52.
7.

Agora podemos explicar a relação entre Yehudá,


“teus irmãos te reconhecerão, sua mão estará sobre
a nuca de seus inimigos” e “Yaacov viveu na terra
do Egito”53.

Mesmo enquanto o povo judeu está no exílio (e


todos os exílios são referidos como “Egito”54), pode
“viver”, através do estudo da Torá — a “Torá de
vida”55 — e do cumprimento de suas mitsvot, sobre
as quais está escrito “Você deve viver com elas”56.
[Desta forma Rabi Shneor Zalman
explicou para seu neto, Rabi Menachem Mendel,
o Tsemach Tsedec, o versículo “Yaacov viveu na
terra do Egito”57: que ao enviar de antemão Yehudá
para dar instruções sobre Goshen, quer dizer, “para
preparar uma casa de estudos”58, foi possível “viv-
er” mesmo no Egito.]

Em consequência, (“Yehudá, teus irmãos se


submeterão a ti”) Sua mão estará sobre a nuca de
seus inimigos59 — conforme dizem nossos Sábios,
“Quando a voz de Yaacov ecoa nas casas de oração
e de estudo, as mãos de Essav não dominam”60.
Mais ainda, as próprias nações do mundo ajudam
o povo judeu em todas as necessidades materiais,
para que tenham possibilidade de estudar Torá e
cumprir mitsvot com prosperidade sob forma de
progressão contínua e de luz sempre crescente
[Shabat 21b]. Esta luz dissipa a escuridão do exílio
e leva à redenção através de nosso justo Mashiach,
que venha, nos redima e nos leve erguidos para
nossa terra, brevemente em nossos dias.
PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

E stamos orgulhosos de apresentar A Jornada da


Alma, primeiro discurso de Rabi Shneur Zal-
man de Liadi a ser publicado na aclamada série do
Patrimônio Chassídico. O discurso, que inicia com
as palavras Vayoshet hamelech leEster, foi impresso
originalmente em hebraico, na antologia de discur-
sos de Rabi Shneur Zalman, Torá Or. Aparece aqui,
em inglês, pela primeira vez.

Os discursos do Torá Or são bem conhecidos


por sua habilidade única de explorar o coração e a
psique do homem e, de lá, prover direção para seu
serviço Divino. Assim como o Tsemach Tsedec,
neto de Rabi Shneur Zalman, escreve: “Em [estes
discursos,] aqueles que procuram D’us e a Torá
da Verdade, encontrarão tranquilidade para suas
almas”1.

A oferta [obra] presente, A Jornada da Alma,


não é exceção. Esboça a luta da alma Divina contra
os elementos materialistas do homem e ilumina o
caminho mais garantido para a pessoa seguir rumo
à satisfação espiritual.

A Jornada da Alma é também um discurso rel-


acionado com Purim. Transcorre no contexto do
pedido da Rainha Ester para o Rei Achashverosh
de salvar seu povo da conspiração cruel de Ha-
man, que, conforme explica Rabi Shneur Zalman,
é uma alusão ao pedido da alma de aproximar-se
de D’us, livre das más influências que amedrontam
sua sanidade.

Rabino Ari Sollish traduziu o discurso e adicio-


nou notas e comentários extensos para esclarecer
os conceitos obscuros referidos no texto. O texto
hebraico foi reimpresso com vogais hebraicas e
dividido em capítulos para facilitar o uso deste
volume.

Agradecimentos especiais para Heichal Men-


achem, cuja publicação deste discurso na série de
Chassidut Mevoeret, auxiliou em sua tradução e
comentário. Também agradecemos aos Rabinos
Yossef B. Friedman, Avraham D. Vaisfiche e Dovid
Olidort por sua assistência e editorial.

Kehot Society Publications


14 de Adar I, 5763
Brooklyn, New York
INTRODUÇÃO E PERSPECTIVA

R abi Menachem Mendel de Lubavitch, o


Tsemach Tsedec, escreve: O amor expres-
so em “além de Ti, nada desejo”1, significa
que a pessoa não deve desejar nada além de
D’us, nem mesmo “céus” ou “terra”, ou seja,
Gan Éden superior ou Gan Éden inferior, pois
estes foram criados através de um mero yud...2
O amor deve ser direcionado somente a Ele, à
Seu próprio Ser e Essência. Isto era, de fato,
escutado de meu mestre e professor, Rabi
Shneur Zalman, quando estava em estado de
dvekut [êxtase espiritual] e exclamava:

Não quero nada absolutamente! Não quero


Teu Gan Éden, não quero Teu Olam Habá...
Não quero nada além de Ti mesmo!
Hayom Yom, 18 de Kislev
O Tsemach Tsedec usa a expressão “era
escutado” para indicar que esta não era uma
afirmação isolada. Rabi Shneur Zalman, de
fato, costumava dizê-la muito frequentemente.
Kuntres Purim Catan 5752

Perito famoso nas dimensões místicas e cabalísti-


cas da Torá, assim como de seus aspectos “revela-
dos”, Rabi Shneur Zalman de Liadi3 compreendia
bem os vários mundos que existem acima do nosso.
Existem os “mundos” de Atsilut, Beriyá, Yetsirá, as
“câmaras” dos anjos, os níveis infinitos do Paraí-
so (Gan Éden). No entanto, meditar sobre estes
níveis elevados e, por conseguinte, “experimentar”
consciência espiritual, não satisfazia Rabi Shneur
Zalman. Pois, perceber estas visões supremas, é,
meramente, apreender um vislumbre de espiritual-
idade; Rabi Shneur Zalman queria somente D’us,
ele mesmo4.
Portanto não é surpresa que grande parte de sua
filosofia e meditação, refletem este sentimento. De
fato, em vários de seus ensinamentos, Rabi Shneur
Zalman explica que, apesar da procura por espiritu-
alidade ser um exemplo nobre e compensador, mas
fundamentalmente, D’us deve ser o foco de nossos
esforços5. O maamar aqui apresentado, intitulado
“A Jornada da Alma”, é um desses exemplos onde
esta ideia é desenvolvida.

Contexto Histórico
Este discurso que inicia com o versículo “Vay-
oshet hamelech leEster” da Meguilat Ester (o Livro
de Ester), foi proferido por Rabi Shneur Zalman em
Purim de 5560 (1800), na cidade de Liozna, e foi
transcrito, pouco depois, por seu irmão Rabi Yehuda
Leib. Em 5597 (1837), o Tsemach Tsedec publicou
este maamar, junto com centenas de outros discur-
sos de Rabi Shneur Zalman, sob o título “Torá Or”6.

Para compreender melhor as circunstâncias deste


discurso, é necessário examinar o contexto históri-
co no qual ele foi pronunciado – momento que foi
muito importante para Rabi Shneur Zalman.
Aproximadamente um ano e meio antes, no dia
posterior a Sucot 5559 (1798), Rabi Shneur Zalman
foi preso e levado a Petersburgo, onde ficou aprisio-
nado na fortaleza de Petre-Paulo, sob acusação de
alta traição. Cinquenta e três dias depois, no dia 19
de Kislev, depois de passar por intensa investigação,
Rabi Shneur Zalman foi considerado inocente de
todas as acusações e foi libertado. Daquele momento
em diante, suas atividades como líder do movimento
Chabad relativamente novo, ganharam novo vigor,
e houve uma mudança marcante na Chassidut que
ele falava. Enquanto os maamarim do passado eram
relativamente breves, com relativamente poucas ex-
plicações de conceitos difíceis, os discursos pós-Pe-
tersburgo eram muito mais extensos, com muito mais
explicações7.

Assim que, iniciou-se uma nova era na dissem-


inação dos ensinamentos chassídicos – clima no
qual o presente discurso foi ensinado.

Esboço Geral
Assim como muitos discursos relacionados com
os dias festivos, A Jornada da Alma contém dois
elementos: possui um tema festivo, com o propósito
de explorar a dimensão mais profunda de Purim e,
no entanto, contém também lições e pensamentos
profundos, que são de benefício eterno para nosso
serviço espiritual.

Antes de explicar o significado espiritual de Pu-


rim, o discurso examina um tópico mais amplo – a
perigosa jornada da alma em sua busca por D’us
e espiritualidade: desde seu aprisionamento inicial
no corpo físico e narcisista e a rotina diária da vida
material, sua luta armada contra estes elementos
negativos e a conquista final destes, e, finalmente,
sua união completa com D’us. Este discurso faz isto,
ao descrever extensivamente a condição espiritual
do povo judeu em três períodos distintos: Exílio,
Shabat e Dias Festivos e da Era Messiânica.

Exílio ou galut, no qual nos encontramos at-


ualmente, é caracterizado pelo ocultamento da
Divindade. É um período no qual a “face” Divina
está oculta da Criação, quando não conseguimos
perceber a força Divina que dirige nossas vidas e
anima constantemente toda a existência. Tempo
em que, aparentemente, estamos sem nenhuma
direção espiritual e, em vez disto, estamos simples-
mente sendo levados pela corrente da sociedade.

Porém, em meio à escuridão do exílio, uma


janela se abre para nós; janela que dá de frente
ao brilhante esplendor da Divindade e permitia
aos raios calorosos da espiritualidade irradiar em
nossos corações. Esta “janela” é o Shabat e os
dias festivos quando D’us quebra o ocultamento e
manifesta Seu esplendor sobre nós, elevando-nos
para fora da zona de nossas batalhas materiais
diárias, injetando em nós um novo vigor e entu-
siasmo em nosso serviço Divino, dando-nos uma
“visão” espiritual.

Contudo, o maamar diz que virá um tempo quan-


do o brilho do Shabat e dias festivos vai parecer
muito fraco e tênue. Pois, quando chegar Mashiach,
a Essência de D’us – e não só Seu brilho – será
revelada na Criação, para “toda a carne” presenciar.
Isto será no tempo final, auge de todo nosso esforço
durante o exílio, a realização universal do que Rabi
Shneur Zalman desejava tão frequentemente: que
D’us, Ele mesmo, finalmente, Se manifeste.

Isto descreve a interação de D’us com a Criação


num nível macrocósmico. Os mesmos três estágios
existem também num plano microcósmico, na jor-
nada espiritual pessoal de uma alma no exílio.

Inicialmente, a alma da pessoa pode estar per-


dida no tumulto da vida física, como que presa em
meio à luta diária, para sobreviver num ambiente
totalmente materialista, não encontrando voz para
expressar seus desejos espirituais. Portanto, um
“exílio” pessoal.

No entanto, há momentos, quando a alma se lib-


erta de seu invólucro terrestre e começa a expressar
sua ânsia e amor intrínsecos para com D’us. Isto
pode ser feito de duas maneiras distintas. Uma, é
meditando sobre a grandeza de D’us, como Ele cria
e mantém o mundo, o que desperta a alma num amor
e desejo ardente por Divindade, de experimentar o
esplendor Divino. A outra, é alcançada ao se meditar
sobre a Essência de D’us que está totalmente além
da Criação. Isto exalta a alma com uma paixão e
desejo, não por Divindade, mas por D’us, Ele mes-
mo – “Não quero nada além de Ti mesmo”.

Tudo isto é apresentado por Rabi Shneur Zalman


no contexto de Purim, no decorrer da explicação
de vários versículos e tópicos da Meguilá, demon-
strando, fundamentalmente, como, num sentido
mais profundo, a festa de Purim incorpora o ideal
messiânico – quando a alma está completamente
ligada com D’us e Ele está manifesto de forma
absoluta.

Centro do Duelo
O discurso inicia comentando algumas diferenças
de texto entre dois episódios similares relatados na
Meguilá. As Escrituras nos contam duas vezes que
o Rei Achashverosh estendeu seu cetro de ouro para
a Rainha Ester. A primeira referência se encontra no
quinto capítulo onde, assim que Ester ficou sabendo
da conspiração de Haman de destruir o povo judeu,
D’us nos livre, decidiu aventurar se no palácio,
sem ter sido convidada, e encontrar-se com o rei.
Conta-se que naquele momento, “Quando o rei viu
a Rainha Ester em pé, no pátio, encontrou favor
ao seus olhos. O rei estendeu para Ester o cetro de
ouro que estava em sua mão, e Ester se aproximou
e tocou na ponta do cetro”8.

A segunda referência aparece no capítulo oito,


depois da trama de Haman ser exposta por Ester e
ele ter sido executado. Lá consta no texto: “Ester
falou novamente perante o rei e se lançou aos pés,
chorou e lhe implorou para que revogasse o mau
decreto de Haman, o agaguita, e sua conspiração
que empreendeu contra os judeus. O rei estendeu
o cetro de ouro para Ester, e Ester se levantou e
permaneceu em pé perante o rei”9.

O maamar, então, comenta que na primeira


fonte, o versículo enfatiza o fato do cetro de ouro
estar na mão do rei, e que Ester somente tocou
na ponta do cetro – dois pontos que são omitidos
na segunda referência.

Mais ainda, a relevância desta estória para nosso


serviço espiritual em nossos dias atuais, é questio-
nada.
A partir deste ponto, o maamar tira a estória de
Ester de seu sentido básico e literal, e prossegue
desenvolvendo e expondo as mensagens mais sub-
limes contidas na Meguilá.

Simbolismo Sutil
Ester é um símbolo do ocultamento Divino
durante a galut. Isto é verdade tanto em escala
geral, como a nível pessoal: a Divindade não está
insolentemente manifesta na Criação, nem nossas
almas encontram um escape consistente para seus
anseios espirituais. Esta situação está em contraste
marcante à Era Messiânica, quando a Divindade
será revelada e brilhará por toda a existência.

Porém, há épocas, mesmo durante nosso exílio


presente, onde nos é dado um gosto de espiritu-
alidade e dos Tempos Vindouros. No Shabat e
nos dias festivos, D’us “levanta a obstrução”, por
assim dizer, e permitia a Seu brilho irradiar sobre
a Criação, elevando-nos acima do domínio da ma-
terialidade, e injetando em nosso serviço Divino,
amor e entusiasmo adicionais.
Fumaça Ascendente
Este “processo de elevação” está indicado no
seguinte versículo do Cântico dos Cânticos do Rei
Salomão10: “Quem é esta que vem subindo do deser-
to como colunas fumaça, perfumado com mirra e
olíbano, com todos os pós dos mercadores?”
Inicialmente, nossas almas se encontram no “deser-
to” improdutivo da materialidade, local desprovido
de qualquer traço aparente de Divindade. No entanto,
no Shabat e nos dias festivos, a Divindade está mani-
festa na Criação, possibilitando-nos a “acender” deste
“deserto”. Quando a alma é ativada, durante esses
períodos especiais, é capaz de derrotar e “queimar”
(destruir) os elementos negativos com os quais esteve
envolvida previamente, independentemente de quão
insolentes ou sutis tenham sido estes elementos. Este
procedimento de “queima” produz “fumaça espiritu-
al”, assim como quando o fogo consome um elemento
que lhe é oposto – umidade – produz fumaça física.

D’us Versus Divindade


O discurso diz ainda, que, independentemente
do nível ao qual alma é inspirada a amar D’us no
Shabat e nos dias festivos, e, sem levar em conta
de quão elevada a alma ascende em sua jornada
espiritual, ela permanece ainda pálida em relação
à mudança cataclísmica impressionante que ocor-
rerá na Era Messiânica. Pois então, não somente a
Divindade estará manifesta na Criação, mas D’us,
Ele mesmo, estará revelado para “toda a carne
presenciar”.

Qual é a diferença entre “Divindade” e “D’us,


Ele mesmo”?

“Divindade” refere-se à “luz” espiritual, di-


versas efusões de Divindade que são essenciais
no processo de, constantemente, criar e manter
toda a existência. Portanto, apesar de representar
níveis extremamente elevados, são, por sua própria
definição, não D’us, mas sim, ferramentas, através
das quais, nossa realidade veio a existir.

Por outro lado, “D’us” está totalmente além da


Criação. Mais ainda, Ele está além de qualquer
“rótulo” ou descrição – mesmo da definição de
“além da Criação” – pois a pessoa só pode definir
aquilo que está nos parâmetros de compreensão
D’us, que criou este parâmetro, com certeza não
está “contido” ou “limitado” por este.

E quando Mashiach chegar, D’us, Ele mesmo – o


D’us que está absolutamente destituído da Criação
– estará manifesto neste mundo.

Momento Messiânico
Como isto será possível?

No passado, a Divindade tinha tido possibili-


dade de Se revelar quando os elementos impuros e
negativos tinham sido subjugados. Todavia, nunca
estes próprios elementos tinham sido totalmente
transformados em bem. Nos tempos de Mashiach,
“a própria escuridão vai se transformar em luz”
– sendo assim, D’us poderá estar manifesto na
Criação.

Segundo esta linha de pensamento, podemos com-


preender a diferença entre a “ponta” do cetro e o cetro
“inteiro”. A “ponta” se refere às emanações Divinas
relacionadas com a Criação e que podem ser exper-
imentadas, ocasionalmente, em nossas condições
presentes. O cetro “inteiro” se refere a D’us, Ele
mesmo, que estará manifesto na Era Messiânica.

Transformação de Purim
O maamar, então, explica a razão pela qual, entre
todas as outras festividades, somente Purim não será
abolido quando chegar Mashiach11. A luz Divina que
brilha nos dias festivos é somente uma irradiação
suave comparada à grande manifestação de D’us na
Era Messiânica, e será totalmente encoberta por seu
grande esplendor. No entanto, Purim, é do mesmo
calibre daqueles tempos impressionantes, pois ele
também é caracterizado pela “transformação da
escuridão em luz”, representado pela mudança total
do coração do Rei Achashverosh.

Halachá e Humildade
O mesmo é verdade relação à halachá (lei ju-
daica). Halachá é a Vontade e Sabedoria de D’us,
investida em assuntos físicos e mundanos. Quando
a pessoa decifra a halachá, está, essencialmente,
pegando uma situação que parece não ter ligação
espiritual e transformando-a num veículo para ex-
pressar a Vontade e Sabedoria Divina – um outro
exemplo
de “transformar a escuridão em luz”. Por conse-
guinte, o Talmud afirma: “A lei judaica não será
abolida nos Tempos Vindouros”12.

Por que, então, não vemos D’us a cada vez que


nos ocupamos com o estudo da halachá?

São nossos pecados e arrogaância que criam um


“muro” e barreira que nos impede de perceber o
poder de nosso estudo de Torá. Quando derrubamos
estes muros, quebrando o espírito de grandeza de
nosso coração, e desenvolvendo, verdadeiramente,
um sentimento de humildade, então podemos sentir
D’us.

A Atitude de Ester
O discurso conclui explicando a diferença entre
as duas vezes que Ester apareceu perante o rei, à
luz do acima mencionado. Inicialmente Ester per-
maneceu no pátio real, ansiando por ver o rei, que
simboliza a aproximação espiritual primitiva da
alma, quando ainda está ligada com negatividade.
Então, a alma pode tocar somente a “ponta” do
cetro, recebendo a inspiração Divina que é con-
cedida no Shabat e nos dias festivos. No entanto,
eventualmente, Ester chega à residência do rei
propriamente dita. Lá, ela “chorou e implorou para
ele revogar a mar [intenção] de Haman” – repre-
sentando o choro da alma para livrar-se da arro-
gância, que impede a revelação Divina. Quando ela
realiza isto – transformando a “escuridão’ do ego
na “luz” da sensibilidade espiritual – então, “Ester
se levantou e permaneceu em pé perante o rei”,
a alma pode verdadeiramente receber seu desejo
único: “Não quero nada além de Ti mesmo!”

* * *

No mesmo ano em que este maamar foi pronun-


ciado, Rabi Shneur Zalman proferiu outro discurso
intitulada “Kol Hamoadim Betelim”, que explica
muitos dos conceitos aqui apresentados em grande
profundidade, mas num estilo cabalístico mais
esotérico13.

Em 5586 ou 5587 (1826 ou 1827), Rabi Dov


Ber14, filho de Rabi Shneur Zalman, ensinou o
maamar “Vayoshet Hamelech LeEster”15, adiciona-
do alguns conceito e, em geral, dando explicações
muito extensas, conforme era seu estilo16. De fato,
muitas das notas explicativas de rodapé e co-
mentários encontradas na apresentação presente do
maamar são baseadas no discurso de Rabi Dov Ber.

Em Or HaTorá do Tsemach Tsedec17, o dis-


curso está impresso com observações adicionais
entremeadas no decorrer do texto, e é seguido por
várias páginas adicionais de comentários que expli-
cam vários dos conceitos encontrados no maamar,
em termos místicos18.

E em Pelach HaRimon, do grande chassid e cab-


alista Rabi Hilel de Paritsh19, aparece um discurso
com o mesmo título, escutado do Tsemach Tsedec
em 5616 (1856), que possui muita semelhança ao
discurso de Rabi Shneur Zalman, e contém co-
mentários e explicações adicionais de Rabi Hilel20.
Obviamente, estudando detalhadamente estas
fontes revela ser o caminho mais garantido para a
compreensão plena do discurso. Porém, uma vez
que esta é uma tarefa bastante desencorajadora,
buscamos entre as várias referências e seleciona-
mos as explicações e comentários que, acreditamos
aumentar a compreensão do leitor dos conceitos
encontrados no maamar, e os apresentamos aqui
nos comentários e nas notas explicativas. Isto, em
acréscimo ao comentário extensivo e explanação
dos conceitos básicos (e não tão básicos) chassídi-
cos e cabalísticos, selecionados da basta abundân-
cia dos ensinamentos chassídicos dos últimos dois
séculos e meio – realização que se tornou a marca
característica da Série do Patrimônio Chassídico.
Acreditamos que o leitor encontrará nesta atual
apresentação um acréscimo valioso à esta série
formidável, e ainda, mais um passo adiante na dis-
seminação da Chassidut.
TRADUÇÃO
E
COMENTÁRIO
“O REI ESTENDEU O CETRO DE OURO
PARA ESTER, E ESTER SE LEVANTOU E
PERMANECEU EM PÉ PERANTE O REI...”1
 
Encontramos algumas discrepâncias entre nosso
versículo e um similar encontrado num capítulo
anterior, previamente, na Meguilá. Lá está dito que
“o rei estendeu [para Ester] o cetro de ouro que
estava em suas mãos”2. No entanto, aqui, este ponto
está omisso. Também, antes, está escrito que Ester
“tocou a ponta do cetro”3, enquanto que, de nosso
versículo, parece que ele lhe deu o cetro inteiro.4
Mais ainda, qual é a mensagem eterna contida
nesta história?5
  
2.

Ester Mística – Ocultação


[Para compreender tudo isso, devemos primeiro
explicar o significado da palavra Ester:]

Durante a galut (exílio), o povo judeu é chamado


de “Ester”6 no sentido de ocultação [da Divindade],
conforme encontramos no versículo “E Eu ocultarei
Minha face inteiramente “haster, astir”, naquele
dia”.7
A “face” de D’us – que se refere à presença
Divina, conforme está escrito
“Que D’us faça Sua presença (“face”) resplandecer
sobre ti”8 – está agora, durante o exílio, oculta,
conforme está sugerido nas palavras bayom há’hu
(“naquele dia”). (Yom há’hu – “aquele dia” – se
refere ao esplendor Divino (yom) que não está
visível e manifesto, enquanto yom hazé – “este dia”
– [indica esplender Divino que está manifesto].)9

Mais especificamente, essa ocultação existe na


alma de cada judeu em particular.10

Quando a “centelha de Divindade”, que é a


alma, está encoberta e investida no pensamento,
fala e ação físicos, [grosseiros] a irradiação Divina
não tem possibilidade de residir e se manifestar
na pessoa.11 Consequentemente, ela não estará
preenchida com o desejo ardente de apegar-se
a D’us, com um coração amplo, faltando-lhe o
tipo de amor que possui um alcance firme e fixo
em sua mente e coração. Em vez disso, seu amor
para D’us será “envolvente por cima” (makif,)
[significando um tipo de amor que existe somente
num nível subconsciente].12 Este tipo de amor
é chamado de “Ester” ou oculto (ahavá messuteret),
similar a ocultação registrado na expressão “bayom
hahu”.13

[Na Cabalá,] este “amor oculto” a D’us é


chamado de nekudá be’heichala, “um ponto em
meio à expansão”,14 pois, no íntimo do coração
de toda alma judia, sem exceção, com certeza está
oculto este amor por D’us.15 No entanto, o quanto
a pessoa revela o âmago desse amor, depende de
cada um em particular.16

A Revolução Messiãnica 
[Tudo isso descreve a conjuntura vigente durante o
exílio.] No entanto, nos dias messiânicos, o ser humano
vai se tornar mais refinado17 e, consequentemente, “A
glória do Senhor será revelada e juntos, toda a carne
verá [que a “boca do Senhor falou]”.18 “E naquele dia
será dito: Veja, este é nosso D’us no qual depositamos
nossa esperança [de que Ele vai nos salvar].”19
Naqueles tempos, o esplendor Divino vai se
revelar de tal forma, que será apreendido firme e
fixamente, mesmo na mente e intelecto humano,
“e toda carne verá” isso com visão física tangível.
Então, “nosso D’us” estará para nós sob o aspecto
de zé, revelado e manifesto, pois zé (manifestação)
é aquilo “pelo qual esperamos”20 – em oposição a
hu [que indica ocultação].

3.

Dias Sagrados... Tempo de Transcendência


Nossos Sábios disseram que, na Era Messiânica,
todos os dias festivos serão abolidos, fora Purim21,
conforme o versículo afirma: “E estes dias de Pu-
rim jamais passarão de entre os judeus, e nem sua
memória se extinguirá de seus descendentes”.22
De forma similar, nossos Sábios mantêm que a
Halachá, Lei Judaica, não será abolida nos Tempos
Futuros.23

O significado disso é que: nos Shabatot e dias


festivos [ocorre uma grande mudança na Criação,
na qual] todos os mundos – e as centelhas de Di-
vindade neles contidas – transcendem seu patamar
habitual e são elevados a um estado “superior”.24
Cada alma judia, sendo uma “centelha de Divin-
dade”, também sente esta “elevação” causada pela
intensificação da irradiação Divina que se manifesta
nesses momentos. Portanto, nesses dias especiais,
são injetadas na alma luz, alegria e êxtase espiritual
extra, inflamando a alma a apegar-se a D’us com
maior paixão do que o habitual.25

Paixão de Pessach
Durante a festa de Pessach, em particular, o
esplender do amor Supremo, que emana do amor –
bondade (chessed) Divino, brilha no íntimo de cada
alma. Consequentemente, cada alma–centelha ju-
dia, é elevada a um nível de sensibilidade espiritual
onde é despertada num tremendo amor e paixão por
D’us, e a um compromisso de erradicar totalmente
qualquer obstáculo que possa comprometer este
amor, isto é, paixões materiais que, por definição,
opõem-se e contradizem o amor por D’us.26 O pro-
cesso de quebrar os desejos materiais é chamado
de “le’achfaya lesitra achará” – forçar os desejos
negativos a se submeterem à conduta espiritual.27
Destruindo a Oposição
A ideia de que as paixões mundanas impedem
o amor a D’us e, portanto, devem ser destruídas, é
demonstrada no versículo “Aquele que golpeou os
egípcios através de seus primogênitos, pois Sua be-
nevolência (chasdo) dura para sempre (leolam)”.28
Ou seja, a fim de o esplendor do amor supremo
(chessed) iluminar o mundo (olam), Ele destruiu
os primogênitos do Egito, aqueles elementos que
contradizem o amor a D’us.29

[De modo similar, em cada Shabat e dia festivo,


há uma manifestação do esplendor Divino que leva
o povo judeu a se elevar do domínio da materiali-
dade e ascender a alturas espirituais.30]
4.

Uma Alegoria Inspiradora


[Encontramos uma alusão a esta elevação do
povo judeu no Shabat e nos dias festivos em outro
versículo.] Está escrito: “Quem é esta que vem
subindo do deserto como uma coluna de fumaça,
perfumada com mirra e olíbano, com todos os pós
dos mercadores?”31

Alegoricamente, podemos expor o versículo


como segue:

Partida Desolada
“Quem é esta (zot) que vem subindo do deserto
(midbar)” — “Zot” se refere à nação judia,32 que
“sobe do deserto” da materialidade no Shabat e
dias festivos. “Deserto” se refere àqueles elementos
materiais que são contrários à Divindade, elementos
semelhantes a um lugar estéril e desabitado [es-
piritualmente]. “Deserto” ou “midbar” é também
etimologicamente ligado à palavra “dibur”, fala,
que, neste contexto, refere-se à tagarelice inútil. No
Shabat e nos dias festivos, a alma se eleva acima
desses assuntos.33
Fumaça e Fogo
“Como uma coluna de fumaça” — Quando esta
transformação espiritual ocorre é “como uma coluna de
fumaça”. A fumaça é produzida quando o fogo consome
um elemento que diverge de sua natureza. Por exemplo,
quando queima-se madeira ou um pavio, é a umidade
destes, consumida pela chama, que causa a fumaça.34
Quanto mais umidade contida num certo objeto, mais
fumaça resultará de sua queima.
De forma similar, no Shabat e dias festivos, quan-
do o esplendor Divino está manifesto, “queima” e
“consome”, por assim dizer, aqueles elementos que
se opõem à Divindade, “le’achfaia le’sitra achara”,
desta forma, produzindo “fumaça” espiritual.

D’us nos Detalhes


“Perfumada” — “Perfume” é denominado “fuma-
ça escassa”, assim como “a fumaça do incenso”.35
Devido à sua natureza delgada, a Torá se refere ao
incenso, não como uma fumaça, mas como uma
nuvem, conforme está escrito “para que a nuvem do
incenso cubra...”.36 A razão pela qual a queima do
incenso produz uma fumaça relativamente escassa,
é por não estar queimando e consumindo algo que é
realmente seu oposto, pois no incenso há elementos
que são apenas um pouco resistentes a chama.

Mesmo assim, deve haver nesse ponto a ideia


de “perfume” – queimar e consumir [mesmo o
mais sutil dos traços negativos] de [dentro] de cada
indivíduo, de acordo com o nível da pessoa e da
grandeza de sua alma, conforme ela vai progredindo
espiritualmente.37
Retrospectiva
“Com mirra” — Isto é similar ao versículo da Me-
guilá “chegando o prazo de cada moça vir ao Rei
Achashverosh [depois de... seis meses no óleo de
mirra...]”.38

Cada alma-centelha judia é como uma “moça”


perante D’us, que anseia por “vir perante o Rei”,
ascender e perceber o esplendor Divino, cada alma
de acordo com seu nível particular.

“Seis meses no óleo de mirra”. Óleo representa


chochmá, sabedoria.39
Mirra é etimologicamente ligada à palavra merirut,
amargura.40 Então, [a Meguilá está dizendo que,]
depois de a pessoa ter se elevado de seu deserto
espiritual, e ter triturado e separado os elementos
negativos, possibilitando assim que sejam consumi-
dos e queimados como “fumaça” e “incenso”, então,
poderá verdadeiramente compreender e apreciar
quão “amargos” esses elementos realmente são.41

Perspectiva Feliz
“E olíbano” — Depois de a pessoa ter passado
por essa transformação espiritual e reconhecer a
amargura do passado, poderá, então, regozijar-se
no júbilo da êxtase espiritual42: “Israel se rejubilará
em seu Criador”.43

Isso está indicado na continuação do versículo


da Meguilá: “E seis meses nos perfumes...”44

Perfume nos apresenta um paradoxo interessante.


Apesar de seu aroma ser intangível e indiscernível
ao olho, no entanto, quando se infiltra no corpo, dá
para a pessoa prazer e satisfação.
O mesmo é verdade no que se refere a alegria
espiritual da pessoa. Apesar desse prazer originar-se
de um reino que está acima de nossa compreensão,
nível que para nós é “oculto” e indiscernível (alma
deitcássia),45 no entanto, inflama o coração da pes-
soa com paixão Divina e alegria de regozijar-se no
esplendor Divino.
 
Essência Espiritual
“Com todos os pós dos mercadores” — Isto se ref-
ere aos vários tipos diferentes de paixões espirituais
que podem ser despertadas na alma, pois o grau da
paixão depende do nível espiritual individual. Essa
é a mesma ideia de “cosméticos femininos” [men-
cionados na conclusão do versículo da Meguilá]:
com todos esses cosméticos [quer dizer, as várias
paixões Divinas experimentadas por cada alma],
a “moça” (alma) vem perante o Rei” (D’us).46
5.
Eis que todas as formas de elevação e aproxi-
mação do povo judeu
para D’us, abençoado Seja, no Shabat e nos dias
festivos, e toda ascensão, de nível em nível, até a
mais elevada das alturas – são denominadas “toque
na ponta do cetro”.

Simbolismo do Cetro
Explicando: 

O “cetro de ouro” simboliza a transmissão da


luz Divina que verifica toda a Criação, dos mundos
mais elevados até os mais baixos, conforme está
escrito “o cetro de ouro, então poderá viver.”47 Por-
tanto, é impossível que a alma se eleve, aprecie e
receba sua vitalidade de todo o “cetro”, pois a “luz”
espiritual se revelará como demais intensa. Em vez
disso, a alma só consegue receber uma emanação
da “ponta do cetro”, sendo que o próprio cetro fica
na mão do Rei.

Na alma, esta “emanação” se expressa como


um amor intenso e ardente por D’us, similar a uma
chama crepitante para cima, e, portanto, chamada de
“ouro superior”, o “ouro da oferenda para o alto.”48
Dois Caminhos Para Amar D’us
Esse amor ardente é despertado num nível menor,
quando seu fervor é decorrente da meditação so-
bre a grandeza infinita de D’us, como Ele, tanto
“preenche” os mundos (memalê col almin) como
“transcendê-lo (sovev col almin),49
A Divindade que é chamada a ponta do cetro.50

Porém, a medida mais intensa de paixão Divina é


despertada quando seu fervor é decorrente da medi-
tação sobre a Própria “Essência” de D’us (Atsmut),
o topo do cetro. A “Essência” de D’us refere-se
a afirmação – “nenhuma mente pode apreende-
Lo, absolutamente”.51 Termos como “grandeza”,
“imanência” e “transcendência”, podem apenas ser
usados quando discutimos a emanação da energia
Divina que vitaliza a Criação. [No entanto, Atsmut,
que está totalmente acima da Criação, não pode ser
assim definida52]

Essência e Emanação
Essa ideia pode ser expressa no versículo “[D’us
(Havaya53) é grande e muito louvado,] e Sua grandeza
está além de qualquer investigação”.54 Isso
significa que, só é possível “investigar” e meditar
sobre a grandeza de Havaya, que é transmitida para a
Criação.55 No entanto, a “Essência” de D’us, não pode
ser investigada e considerada “grande”, pois “tudo
perante Ele é como nada”,56 e para Ele é como se os
mundos não existissem, absolutamente.57

Imutabilidade de D’us
Assim, as Escrituras afirmam: “Eu, D’us, não
mudei”.58 E conforme dizem nossos Sábios, “Tu
és o mesmo antes da criação dos mundos, Tu és o
mesmo após a criação destes”59 – de forma igual,
sem mudança, pois D’us nem “prende” nem “tran-
scende” aos mundos, Sua “Essência” está além do
âmbito de mundos.60
Será Que a “Grandeza” É Grande?
Também está escrito “Grande é o Senhor e muito
louvado, na cidade de Elokim...”61 Nossos Sábios
explicam:62 “Quando Ele é proclamado como sendo
“grande”? Quando Ele se encontra ‘na cidade de
Elokeinu’” [ou seja, quando se fala sobre a ema-
nação da energia Divina que flui na Criação].63 No
entanto, quando refere-se a D’us, Ele mesmo, não
se pode usar o termo “grande”, pois toda a Criação,
desde os mundos mais elevados até os mais baixos,
são como nada perante D’us.

O “Sentar” Supremo
Então, Sua “grandeza” é, na verdade, Sua
humildade64, pois Ele [descende e] se investe no
aspecto de “grandeza” para que Seu Reinado seja
o Reinado sobre todos os mundos65, conforme o
versículo afirma “o Senhor senta como Rei le’olam
(do mundo)”.66

Esse também é o significado do versículo “Con-


tudo, Tu és o Santo, entronizado sobre os louvores
de Israel”:67 que só pode haver “louvores de Israel”
uma vez que D’us tem uma atitude humilde e Se
rebaixa para ser “entronado” como Rei da?
Criação.68 Na verdade, Tu és Kadosh, totalmente e
transcendente à Criação.69

6.

Manifestação de Mashiach
Todavia, quando Mashiach chegar, o [verda-
deiro] esplendor de D’us se manifestará de forma
brilhante e impressionante, ou seja, a Essência de
D’us fluirá do nível onde “Eu, D’us, não
mudei” – “passado, presente e futuro existindo
simultaneamente”70 – toda pessoa perceberá, com
o intelecto físico, que D’us estará “revelado”,
conforme mencionado anteriormente.71

Em Nosso Mundo ...


Mais tarde, esta manifestação ocorrerá,
especificamente, em nosso mundo físico, inferior,
pois, conforme nossos Sábios explicam, o versículo
“Será perguntado de Yaacov e de Israel ‘Como
está agindo D”us’ ”,72 é a pergunta que os anjos
ministeriais perguntarão aos tsadikim (justos);73 e
em vez dos anjos perguntarem “Onde é o lugar de
Sua Glória?”74, afirmarão “Sua glória preenche o
mundo todo”.75

A Coroa
Esta é a explicação do versículo “Uma mulher de
excelência é a coroa de seu marido”.76 A irradiação
Divina que se manifesta agora para o povo judeu é
denominada “seu marido”.77
Porém, quando chegar Mashiach, o povo judeu
estará num patamar espiritual infinitamente mais
elevado [do que “seu marido”, irradiação Divina,
pois então, verão a Essência do Próprio D’us].78

Estabilidade
Por isso, está escrito “A jovem de Israel caiu,
não mais se levantará”.79 Significa que o mundo
estará aqui embaixo tão completamente permeado
por Divindade, que não será necessário que Israel
se “erga” e “se levante” [a fim de experimentar
espiritualidade.]80

7.

Transformação
A razão pela qual será possível haver manifes-
tação tão potente em nosso mundo inferior na Era
Messiânica é porque, então, diferentemente das
redenções prévias, onde o mal foi apenas subjugado
e quebrado, “le’achfaia le’sitra achara”, a própria
escuridão será transformada em luz.81

Em relação às redenções passadas, as Escrituras


usam frases como “Aquele que golpeou os egípcios
através de seus primogênitos”
e “E matou poderosos reis”,82 afirmações que in-
dicam que o mal foi subjugado e destruído. Em
contraste, falando da futura redenção, o versículo
diz: “Pois então, transformarei as nações para fala-
rem uma língua pura [para que todos eles possam
invocar o Nome do Eterno, para servi-Lo com
união]”,83 “E muitas nações irão [e dirão ‘vinde
e ascenderemos à montanha do Eterno... Ele nos
ensinará de Seus caminhos e seguiremos por Suas
sendas”,84 pois naqueles tempos, a escuridão se
transformará em luz.]

Mudança do Coração de Achashverosh


Agora podemos compreender a razão pela qual,
entre todos os dias festivos judaicos, somente Purim
permanecerá na Era Messiânica, pois o milafre de
Purim incorporou uma transformação similar, a do
coração do Rei Achashverosh: a própria boca que
deu a Haman a autoridade de decretar a destruição do
povo judeu, D’us não o permita, dizendo “A nação
é sua, [Haman,] para fazer conforme lhe agrade”85,
concedeu, eventualmente, a Ester e a Mordechai,
o poder de “expedir decretos referentes aos judeus
conforme lhes agrade”.86 Este é o assunto de “a
escuridão sendo transformada em luz”, conforme
será nos tempos de Mashiach, quando “a glória do
Senhor será revelada”, especificamente, no mundo
mais baixo e mais escuro.87

8.
Lançando Luz Sobre a Halachá
Esta também é a razão pela qual nossos Sábios
disseram que a halachá, lei judaica, nunca será
abolida, [pois também incorpora a “transformação
da escuridão em luz”.]

Explicando sobre o versículo “Fuja, meu amado, e


seja como uma gazela”,88 nossos Sábios comentam:
“Assim como uma gazela vira sua cabeça para trás
[mesmo quando está fugindo, assim também, o povo
de Israel diz para D’us: ‘Mestre do Universo, se
causamos com que Tu tenhas removido Tua presença
de entre nós, que seja Tua Vontade que Sejas como
uma gazela que foge e, no entanto, vira sua cabeça
para o lugar do qual partiu].”89
A Cabeça
Para compreender isso, podemos fazer uma
analogia. O crânio humano contém seu cérebro,
intelecto e entendimento. Quando vira sua cabeça
para trás, então seu cérebro e mente, nela contidas,
a acompanham.

’Lei ‘Física
O mesmo é verdade num sentido espiritual: D’us
“virou Sua cabeça para trás”, por assim dizer, e colo-
cou Sua vontade e sabedoria “atrás”, naquelas coisas
que são consideradas chitsoniyut (externas) – isto
é, em assuntos físicos e materiais.90 Por exemplo,
o Seder Kodashim91 trata do [sacrifício] de animais
e o Seder Nezikin lida com assuntos monetários.
Temos que, a vontade e sabedoria Divina mais
profunda está investida em leis “físicas” da Torá.
Mais ainda, Seus atributos emocionais ou midot são
atraídos automaticamente para a halachá, conforme
está escrito “Retirou Sua mão direita para trás...”92
Decifrando o Divino
Então, “Eles [o bem e o mal] são separados at-
ravés de chochmá, sabedoria”.93 O termo “separar”
aplica-se à mistura de dois itens parecidos que po-
dem ser, ordinariamente, indistinguíveis. [Em nosso
contexto isso significa que a ‘sabedoria” da Torá
distingue entre aquilo que é halachá e o que não é,
algo não sempre fácil de ser discernido.]

A Linha Delicada
Assim, por exemplo, um agente que “troca uma
vaca por um burro” num contrato de negócios,94 ou
um açougueiro que está cortando um animal em
partes, destripando seu interior para seu sustento,
não estão envolvidos com a vontade e sabedoria
Divina. Mas, alguém que está envolvido nesses
mesmos atos, com o propósito de discernir as ram-
ificações haláchicas intrínsecas nesses – examinar
as partes do animal para determinar se é casher ou
não, determinar quem é inocente e quem é o culpado
numa discussão sobre um bezerro recém nascido e
nas leis de pureza ritual, determinar o que é puro
e o que é impuro – está, dessa forma, tocando a
vontade e sabedoria Divina.
Similarmente, os Sábios da Mishná e do Talmud
e os primeiros e últimos Poskim,95 esclareceram
e revelaram a vontade e sabedoria Divina, e, por-
tanto, “separaram” o mal do bem. Através de seu
estudo de Torá, distinguiram o que não é permit-
ido do permitido e, [em assuntos da lei civil,] o
culpado do inocente.

Um Teste de Caráter
De forma similar, em relação à mitsvot práti-
cas que estão interligadas com o bom caráter da
pessoa:96 Há um princípio geral de que alguém
que está ocupado com uma mitsvá, está isento da
obrigação de cumprir outras mitsvot.97
Por isso, alguém que encontrou um artigo perdido e
está agora cumprindo a mitsvá de cuidar dele, “es-
tendendo-o e chacoalhando-o”,98 não tem obrigação
de dar caridade naquele momento,99 pois, ao tomar
conta da propriedade de outrem, seja ele rico ou
pobre, está cumprindo uma mitsvá. [pois mesmo
um artigo perdido de um rico, isenta o responsável
de dar caridade a um pobre que está em sua frente.]
Porém, se a pessoa está cuidando de seus pertences
particulares, não está cumprindo uma mitsvá, e mes-
mo que não seja rica como o proprietário da perda,
será obrigada a cumprir outras mitsvot [inclusive
a de dar caridade].

Da mesma forma, aquele que dá caridade, está


cumprindo uma mitsvá, mas, se está gastando din-
heiro para seus assuntos pessoais [mesmo que ele
é pobre e necessitado] não está cumprindo uma
mitsvá. [Esta é a linha sutil que a halachá delineia.]

A Linha de Fundo
Então, quando alguém faz uma mitsvá com um
objeto material, está, de fato, transformando a
escuridão em luz, causando com que a irradiação
Divina, a manifestação de Sua vontade, brilhe
especificamente na escuridão da materialidade.100

9.

Um “Espaço” Para D’us


Esse é o significado do versículo “veja, Ele (zé)
está de pé atrás do nosso muro, [olhando através
das janelas, fitando através das fendas]”101:
Deterioração Visual

Apesar da sabedoria e vontade Divina estar


manifesta em assuntos de Torá, no aspecto de zé,
todavia, ela “está de pé atrás do nosso muro”, ou
seja, não conseguimos perceber a irradiação Divina
de Torá e mitsvot. Essa falta de percepção deriva
de nossos pecados que atuam como um muro que
impede a irradiação de brilhar.102
A Solução – Humildade
A solução para esse problema é encontrada nas
palavras “olhando através das janelas, fitando at-
ravés das fendas”. Janelas e fendas são criadas fa-
zendo-se buracos na parede – diferem somente em
tamanho. De forma similar, quando o coração de
uma pessoa tem sensibilidade espiritual equivalente
a uma “pedra” dura e fria,103 a pessoa deve “talhar”
um espaço dentro dele, conforme dizem nossos
Sábios “Abram-Me uma abertura de uma agulha [e
Eu lhes abrirei o mais espaçoso dos aposentos]”.104
A pessoa deve quebrar o espírito de grandeza que
cobre o coração, para fazer “um espírito quebrado,
um coração quebrado,”105 pois o “muro” e a barreira
que separam entre a pessoa e D’us são, na realidade,
o ego da pessoa, o centro em si mesmo, que faz com
que dê mais importância a assuntos pessoais do que
aos espirituais.106
10.

Agora podemos retornar à história de Ester.

A Abordagem de Ester...
Quando o Rei Achashveroch, inicialmente, viu
a rainha, ela estava “em pé no pátio”.107 Metafori-
camente falando, isso se refere à postura espiritual
inicial da alma na forma como “se levanta do
deserto” da negatividade, pois mesmo quando a
alma se encontra no “pátio interno”108 do Rei, este
é ainda considerado “um deserto” comparado à
própria residência do Rei,109 pois a presença do Rei
é muito mais constante em sua residência do que
no pátio: [Eis que a alma permanece no “pátio”,
nessa terra espiritualmente desértica, ansiando por
sua ascensão, para ficar junto ao Rei.]110
Então, ocorre uma manifestação do esplendor
Divino por sobre a alma, que a capacita a ascender e
se aproximar do Rei com paixão intensa, conforme
está escrito “E Ester se aproximou”.111

Mas, mesmo depois de a alma ter ascendido a


alturas espirituais e “se aproximado” da Divindade,
ela ainda é considerada apenas tocando “a ponta
do cetro”.112

E Chegou
Porém, depois, quando ela estava, de fato, no
palácio de residência do rei, “Ester falou novamente
perante o rei e se lhe lançou aos pés, chorou e lhe
implorou para que revogasse o mau decreto de Ha-
man, o Agaguita e sua conspiração que empreendeu
contra os judeus”.113 Em relação a alma, o choro tem
como objetivo despertar a grande piedade de D’us
sobre a centelha de Divindade que está aprisionada
e investida na arrogância do ego da pessoa114 – “o
mau decreto de Haman ... que empreendeu contra
os judeus”, pois é de Haman que vem estes pensa-
mentos [narcisistas]”.115
Então, a escuridão se transforma em luz.116

Por essa razão “o Rei estendeu o cetro de ouro


para Ester” em sua totalidade,117 pois, quando a es-
curidão é transformada em luz, a Essência de D’us
pode estar manifesta precisamente neste mundo.118
Perfeição Suprema
Em seguida, “Ester levantou e ficou em pé per-
ante o Rei”: a alma não está mais no processo de
“ascensão do deserto”, pois alcançou seu grau su-
premo de espiritualidade.119 Agora, está apta a per-
manecer, proeminente, “perante o Rei”, conforme
está escrito “uma mulher de excelência é a coroa
de seu marido”.120

(Para121 melhor compreender o conceaito de “o


Rei estendeu ...”, ver o que está escrito [no Likutei
Torá,] na Porção de Reê sobre o versículo “Quando
você ouvir a voz ...” [23b] e o que está escrito no
Micdash Melech, parte 1, Porção Vayechi (228 b).
O maamar citado, intitulado “Quando você ouvir
...” também explica as ideias de “pátio interno”
(chatser hap’nimit) e de “residência” (bayit). Para
análise mais extensiva de bayit, ver Torá Or, Porção
Bereshit, maamar intitulado “Os Céus são Meu
trono... Qual é a casa (bayit) [que você poderia
construir para Mim]...” [1c]. Ver também [Torá Or],
Porção Vayeshev na Haftará de Chanucá, sobre o
versículo “Você cuidará de meu pátio”, para uma
explicação alternativa.)
PREFÁCIO DA EDIÇÃO INGLESA

T emos o prazer de apresentar O Servo Sim-


ples, discurso pronunciado por Rabi Shalom
DovBer Schneersohn, quinto Rebe de Lubavitch,
como parte da aclamada Série do Patrimônio
Chassídico. Pronunciado no Shabat da Porção
Matot-Mass’ei, 5666 (1906), o discurso inicia com
o versículo (Número 32:1), Os filhos de Reuven e
Gad possuíam muito gado e viram a área de Ya’az-
er... eis que era um lugar para gado... [então pedi-
ram a Moshé:] “Permita que esta terra seja dada a
seus servos como herança”.

O discurso presente é parte do tratado leg-


endário clássico conhecido pelos chassidim como
Hemshech Samech-Vav. Esta série de sessenta e um
discursos, pronunciados desde o início de 5666 até
o inverno de 5668 (1905-1907), foi revolucionária
em sua riqueza e profundidade de assuntos. Esta é
a primeira tradução para o inglês de um discurso
desta série histórica.

* * *
O discurso elabora sobre três tipos de personali-
dades com formas diferentes de aproximação ao
serviço Divino. 1) O filho de D’us — cujo com-
promisso com D’us não requer serviço algum de
sua parte, nem meditação ou introspecção, mas lhe
é natural. 2) O servo fiel a D’us — que, apesar
de permanecer uma entidade distinta, com cer-
ta auto-consciência e identidade, é motivado por
sua apreciação e amor por D’us e, portanto, ob-
tém grande prazer e alegria de cumprir a vonta-
de de D’us. 3) O servo simples de D’us — que é
guiado por sua aceitação do jugo dos Céus, não é
motivado por um amor irresistível por D’us e não
tem prazer no trabalho que faz. No entanto, faz seu
trabalho com persistência, por não possuir outra
identidade além da de ser um servo de D’us.

O sétimo Rebe de Lubavitch, Rabi Menachem


Mendel Schneerson, caracterizou o serviço Divi-
no do judeu de hoje como a de um servo simples.1
Não possuímos o senso de apego gozado pelo “fil-
ho de D’us”, nem a sofisticação espiritual do ser-
vo fiel. Todavia, é precisamente por isto que nosso
serviço se torna um reflexo da essência de D’us,
uma vez que não há outra identidade presente que
obstrui o caminho. Portanto, nosso serviço Divino
durante estes tempos de escuridão espiritual, al-
cança e evoca a essência de D’us, que está além de
qualquer limitação.

* * *

O discurso foi traduzido para o inglês e comen-


tado pelo Rabino Yossef Marcus. Comentários
adicionais foram providos pelo Rabino Avraham
D. Vaisfiche. Agradecimentos especiais para Ra-
bino Yossef B. Friedman e Rabino Dovid Olidort
por sua orientação editorial e para Rabino Mendel
Laine que coordenou o projeto.

Kehot Society Publications


24 de Tevet, 5768
INTRODUÇÃO E PERSPECTIVA

R abi Chanina ben Dossa veio estudar


Torá sob a tutela de Rabi Yochanan ben
Zacai, quando o filho deste último ficou do-
ente. Rabi Yochanan disse para Rabi Cha-
nina: “Chanina, meu filho, reze por miseri-
córdia para [meu filho], para que ele viva”.
Rabi Chanina colocou sua cabeça entre seus
joelhos e orou, e seu filho viveu.
Disse Rabi Yochanan ben Zacai: “Tivesse o
filho de Zacai colocado sua cabeça entre seus
joelhos o dia todo, não se teria tido miseri-
córdia para com ele”. Sua esposa perguntou:
“Será que Chanina é maior do que você?” Ao
que ele respondeu: “Não, mas ele é como um
servo do rei (que entra na presença do rei a
qualquer hora, sem permissão especial), en-
quanto eu sou como um ministro do rei (que
só se encontra com o rei com hora marcada,
quando a ocasião justifica)”.
— Berachot 34b; Rashi, ad loc.

Fui criado para servir meu Mestre.


— Kidushin 82b.
H á uma famosa questão sobre quem construirá
o Terceiro Templo. Algumas fontes indicam
que será construído por D’us mesmo1 — e então,
será eterno — enquanto outras indicam, que será
construído pelo homem.2

O Rebe de Lubavitch, Rabi Menachem M. Schne-


ersohn explica3 que ambas são verdadeiras: a re-
denção futura e, portanto, a construção do Tercei-
ro Templo, virá em consequência de nosso serviço
Divino durante a época do Exílio. No entanto, ain-
da podemos dizer que é D’us que está construindo
o Templo, uma vez que nosso serviço nestes tem-
pos de Exílio é de um tipo que pode ser atribuído
a D’us. Podemos dizer, como se fosse, que D’us
Mesmo está fazendo o trabalho.

Durante as épocas dos dois Primeiros Templos, a


consciência Divina era predominante (mais duran-
te o período do Primeiro Templo). Consequente-
mente, o compromisso para com D’us, naqueles
tempos, era motivado por esta consciência, que ge-
rava amor por Ele e um desejo ardente por seguir
a Torá.
No entanto, este serviço Divino é, fundamental-
mente, voltado para si, motivado pelo desejo da
pessoa por aquilo que ela sente que é certo e bom
para si. Por esta razão, os dois Primeiros Templos
não foram edificações eternas — pois existiram
em base do serviço Divino que era motivado pelo
intelecto e emoções do homem finito.

Todavia, nestes dias de Exílio, a consciência Divina


está quase inexistente. Não temos um amor arden-
te por D’us ou o sentimento de temor de estar em
Sua presença. Não possuímos um desejo ardente
de cumprir as mitsvot como ocorria nos dias do
Templo. Ainda assim, seguimos a Torá, em todo
caso.

Naturalmente, encaramos esta situação difícil


como uma desvantagem, o que, com certeza, o é
num certo nível. Mas, na realidade, há uma vanta-
gem em nossa situação:

Quando um judeu cumpre uma mitsvá hoje em


dia, não está cumprindo por alguma motivação
voltada para si. Ele não vê como a mitsvá é a me-
lhor coisa para ele. Não sente a imensa força da
mitsvá e a doçura e beleza de se unir a D’us através
de Seus mandamentos. Cumpre a mitsvá devido
a uma sensação de dever: Cabalat ol, aceitação do
jugo Divino. Suas mitsvot — os blocos de constru-
ção da futura redenção e da construção do Templo
— são, todavia, feitas pelo homem, mas não são
limitadas por suas limitações, uma vez que não são
motivadas por seu intelecto limitado. São motiva-
das pela vontade do D’us infinito, e por tanto, se-
meiam as sementes da construção do Templo, que
será eterno.
Três Tipos de Almas
O servo simples de D’us é o principal assunto do
discurso presente, intitulado, U’Miknê Rav, ensi-
nado pelo quinto Rebe de Lubavitch, Rabi Shalom
DovBer Schneersohn em 5666 (1906).  4 O discur-
so é uma parte de uma série de três discursos nos
quais o Rebe elabora sobre os três tipos de almas
(mas, principalmente, sobre o servo simples):

1) O filho de D ‘us, 2) o servo fiel a D’us, e 3) o ser-


vo simples de D’us.
Filho de D’us: O compromisso do “filho de D’us”
com D’us é motivado por sua unicidade com D’us
— aquilo que D’us quer, ele quer, uma vez que ele
é como uma extensão de D’us.5 Seu compromisso
não requer esforço de sua parte, nem meditação ou
introspecção — vem naturalmente.
O Servo Fiel: O compromisso do “servo fiel” é
motivado por seu amor e apreciação por D’us. De-
vido a seu amor, ele obtém grande prazer e alegria
de cumprir a vontade de D’us. Sua desvantagem
vis-à-vis ao filho de D’us é que ele não é uma uni-
dade com D’us — permanece uma entidade dis-
tinta, com certa identidade e auto-consciência.
Percebe a realidade Divina, mas não de forma a
enxergá-la, de fato, como uma realidade empírica.
Portanto, permanece a certa distância entre ele e
D’us. Mas esta também é sua vantagem, uma vez
que seu compromisso é motivado por seus pró-
prios esforços — sua meditação sobre a nature-
za sublime de D’us — diferentemente do filho de
D’us, cujo compromisso é motivado por sua união
inata com D’us, pela qual não pode ganhar crédito.
O Servo Simples: O compromisso de “servo sim-
ples” é dirigido por sua aceitação do jugo dos Céus.
Ele não é motivado por um amor irresistível por
D’us, como o servo leal. Diferentemente deste, ele
não tem prazer no serviço que faz. Não sente recom-
pensa espiritual por seu trabalho. Sua apatia torna
seu serviço muito difícil, uma vez que seu instinto e
desejo natural é o de não executá-los absolutamente.
Todavia, executa-o, persistentemente, porque não
possui outra identidade, além da de ser o servo de
D’us.6

Nosso serviço Divino, hoje em dia, é similar ao do


servo simples. Não possuímos a sensação de união
e ligação gozada pelo “filho de D’us”, nem a sofis-
ticação espiritual do servo fiel. No entanto, é pre-
cisamente por causa disto, que nosso trabalho se
torna um reflexo da essência de D’us, uma vez que
não há outra identidade presente que se transpõe
no caminho.

Vemos isto na analogia do servo simples feita pelo


Rebe num discurso posterior7: o serviço do servo
simples, que não possui metas no que está fazendo,
para o qual, um tipo de trabalho não difere de ou-
tro, num certo sentido, está mais próximo de seu
mestre. É como se o próprio dono o tenha feito,
uma vez que a identidade toda do servo simples
é a de ser um servo de seu mestre. (Assim como
o produto do trabalho de seus animais é atribuído
ao dono, o serviço do servo simples é, também,
atribuído ao dono). Portanto, o mestre usufrui de
maior orgulho e prazer deste, do que o faz no ser-
viço de seu servo fiel. Pois o serviço do servo fiel,
não é um reflexo absoluto da vontade do dono, já
que o servo fiel e sofisticado mescla sua própria
personalidade no quadro — ele compreende e se
regozija do que está fazendo, e vem com suas pró-
prias ideias de como executar a obra. O envolvi-
mento intelectual e emocional do servo fiel distan-
cia sua obra do seu patrão, enquanto que o serviço
“seco”, não adornado, do servo simples, pode ser
considerado a obra do próprio mestre.

De forma similar, nosso serviço Divino durante


os tempos de escuridão espiritual, quando não es-
tamos inspirados a executar nosso serviço, assim
como o servo simples, alcança e evoca a essência
de D’us, que está além de qualquer limitação.
Yaacov e Israel
Todo sábado à noite, quando termina o Shabat,
muitos judeus entoam um canto tradicional com o
seguinte refrão:

“Al tirá avdi Yaacov” (não tenha medo, Meu servo,


Jacob).
À medida em que a atmosfera paradisíaca do Sha-
bat se retira e o judeu dá de frente com o prospec-
to amedrontador de retornar ao mundo “real”, ele
escuta uma declaração confortadora de D’us: Não
tenha medo, Meu servo, Jacob. Esta declaração dá
ao judeu a força de retornar para a atmosfera mun-
dana da semana, santificar o dia a dia, e fazê-lo
com alegria.

O povo judeu possui dois nomes: Yaacov e Israel.


Cada nome incorpora uma dimensão diferente da
alma judia. Yaacov é nosso nome quando batalha-
mos com a tensão entre nossas aspirações Divinas,
por um lado, e com nossos impulsos materialis-
tas auto direcionados, por outro. Yaacov é nosso
nome, quando lutamos para nos conservar focali-
zados em nosso verdadeiro propósito de vida, en-
quanto confrontados com um mundo que oculta
qualquer indício deste propósito. Yaacov é o nome
que transmite a escaramuça original de Yaacov
com Essav, inicialmente no nascimento e, mais
tarde, quando comprou os direitos da primogeni-
tura e “roubou” as bênçãos. No último caso, Yaa-
cov foi forçado a usar as vestimentas de Essav (a
fim de enganar seu pai). O “judeu Yaacov” deve,
de forma similar, “usar as vestimentas de Essav”
ao entrar no terreno do mundano.

Todavia, o judeu possui outro nome e outra perso-


nalidade. Israel é seu nome quando ele é um gover-
nante, um sar sobre o mundo material. A fachada
de materialidade que obscurece o Divino de Yaa-
cov, é transparente para Israel. Israel não conhece
luta. Ele com D’us, sua vontade e a de D’us, são
uma. Não há dissonância.

Algumas almas, as dos justos e santos, são Israel o


tempo todo. Outras, têm seus momentos. A maior
parte de nós vacila entre os dois, sendo que, Ya-
acov e Israel fazem turnos dentro de nossa cons-
ciência. Há aqueles aspectos da vontade Divina
que são óbvios para nós, não os questionamos nem
encontramos dificuldades em segui-los. Observa-
mo-los naturalmente, sem esforço. Em relação a
outros destes aspectos, divergimos terminadamen-
te, e temos que superar nossas inclinações naturais
para ajustar-nos àquilo que, lá no fundo, sabemos
ser o certo.
Israel é o filho de D’us; Yaacov é o servo de D’us.
Um filho é um derivado de seus pais, cortado do
mesmo tecido. O filho de D’us é a alma que pensa
e sente como D’us. O servo de D’us possui outro
tipo de relacionamento. Ele não é um com D’us.
Possui inclinações e pensamentos que diferem do
imperativo Divino. Mas escolhe negar todos estes
e se subjugar para D’us. Deve forçar-se a ir contra
suas inclinações, lutar contra seu desejo, e ajustar-
se à vontade de seu Mestre.8
E é este serviço que é mais precioso para D’us. É
o serviço através do qual a Redenção Final, final-
mente, vai se realizar.
* * *
Cabe aqui uma palavra referente à noção de servi-
dão. Poderia parecer apropriado que uma criatura
finita, cujo intelecto e capacidade são infinitési-
mos em comparação ao de seu Criador, conside-
rasse natural submeter-se a este Criador, pois o
Criador é a origem de tudo o que existe e de toda a
bondade e pede esta submissão.

Mas a realidade é que muitos empacam com a su-


gestão de ser um servo de D’us. A própria pala-
vra faz com que muitos ouvidos contemporâneos
ericem-se com desconfiança. Especialmente em
culturas democráticas, como nos Estados Unidos,
onde os valores de liberdade e autodeterminação,
independência e igualdade, reinam supremos, a
ideia de subjugar a si mesmo perante D’us soa, no
mínimo, estranho.
O Rebe de Lubavitch, Rabi Menachem M. Schne-
erson, numa ocasião, referiu-se a este fenômeno,
numa carta de Rosh Hashaná para o público:

Cada lugar possui suas vantagens e dificulda-


des específicas. Hoje, alguns círculos são do-
minados pela busca de auto-suficiência, não
apenas em assuntos materiais, mas também
em ideologia. Eles mantêm uma forte aversão
com relação a se submeter à ordem estabeleci-
da ou a aceitar as coisas sem compreendê-las
em sua totalidade, e coisas similares. Isto po-
deria parecer ser um impedimento ao concei-
to de cabalat ol [aceitação da soberania dos
Céus].

Isto é especialmente verdade naqueles países


que são (relativamente) recentes e que foram
construídos sobre e através das bases da auto-
-iniciativa, onde este espírito caracteriza toda
a atitude do estilo de vida particular e social.
É ainda mais difícil se ajustarem às imposi-
ções de cabalat ol.
O Rebe, no entanto, chama a atenção para o fato de
que, independentemente do que dita nossas ten-
dências culturais, a Torá não muda, e temos o po-
tencial de superar nossa aversão natural ao conceito
de “servir” D’us:

Apesar do mencionado, temos a regra de que


D’us não exige de uma pessoa mais do que
ela pode suportar. Então, uma vez que cabalat
ol é pertinente em todos os tempos e lugares,
por conseguinte, mesmo em nossos tempos,
e nos países mencionados acima, é possível e
necessário chegar à cabalat ol completa.

Mais ainda, o fato de não vir para nós de forma


fácil, pode ser visto como uma vantagem:

A verdade é que nossa época possui uma


vantagem. Quando uma pessoa que não vive
sempre sob o lema de autoconfiança e inde-
pendência, aceita a soberania dos Céus, sua
aceitação é tênue, pois não seria estranho
para ela arrepender-se de sua aceitação e mu-
dar sua posição. Em contraposição, quando
alguém que não está acostumado a se subme-
ter, e que é independente em suas crenças, ob-
tém a convicção de que deve reconhecer uma
autoridade superior, sua resolução é mais pro-
funda e completa, e ele encontra força para se
transformar completamente e para sempre.9
TRADUÇÃO
E
COMENTÁRIO
Com a ajuda dos Céus, Shabat Parashat Matot
Massei, 5666

Os Filhos de Reuven e de Gad Possuíam Muito


Gado. E Viram a Terra de Ya’azer. E Eis que Era
um Lugar para Gado. [Então, Pediram a Moshé:]
“Permita que Esta Terra Seja Dada para Seus
Servos Como Herança.” 1
Moshé lhes respondeu com palavras de advertên-
cia. No final, disse-lhes: Se vocês forem para a
luta, diante do Eterno, e a terra conquistada dian-
te do Eterno, então, esta terra será de vocês como
propriedade permanente. 2

Devemos compreender a razão pela qual eles es-


colheram, especificamente, a terra que estava do
outro lado do Jordão. Mais ainda, por que, herdar
esta terra, depende, especificamente, da conquista
da terra, conforme Moshé estipulou com eles: “Se
vocês forem para a luta diante do Eterno, e a terra for
conquistada, diante do Eterno”, só então “esta ter-
ra será de vocês como propriedade permanente.”?
Yaacov e Israel
Para compreender isto, devemos primeiro apre-
sentar o conceito de Yaacov e Israel explicado
num discurso prévio. 3 Yaacov representa a di-
mensão de Yaacov Meu servo, 4, significando que
o serviço Divino, associado ao nome “Yaacov” é
feito no contexto da luz contraída 5 Elokim, 6 e é
especificamente através deste serviço que o servo
Divino chega à revelação do Nome Havaya. 7 Seu
principal serviço é no trabalho de refinamento,
refinar e corrigir a alma animal 8 e tudo o que está
a ela associado, etc. Consequentemente, seu tra-
balho exige esforço e labuta — tanto na tentativa
de apreender a luz Divina, uma vez que é uma luz
contraída, que está escondida e oculta, como em
decorrência dos impedimentos e obstruções que
se originam da alma animal, que esconde e ocul-
ta a luz de sua alma Divina. Estamos nos referin-
do, especialmente, ao esforço e trabalho duro para
corrigir e refinar a alma animal e tudo o que está
associado a ela. Tudo isto, com um esforço árduo
e intenso.

Em contraste, a dimensão de Israel é onde o servi-


ço da pessoa ocorre na essência do Nome Havaya,
que não é absolutamente obscurecido pelo Nome
Elokim. Consequentemente, não lida com nenhum
trabalho difícil ou esforço, absolutamente. De for-
ma similar, não requer o esforço e a labuta para
corrigir e refinar a alma animal, uma vez que a
alma animal não esconde ou oculta a Divindade da
pessoa. Seu principal serviço não
é o de refinamento, mas sim, atrair a revelação Di-
vina, etc.

O acima mencionado implica que o nível de Israel


é muito mais elevado do que o de Yaacov. Mas a
verdade é que há uma grande vantagem no nível
de Yaacov, Meu servo sobre o nível de Israel.
O Filho
Explicando: Israel é a dimensão de “filho” en-
quanto Yaacov é chamado de “servo”, conforme
explicado num discurso prévio (Veshavta). Pode-
mos entender a dimensão de filho no relaciona-
mento do homem com D’us, utilizando a metáfora
do relacionamento humano de um filho em rela-
ção a seu pai. O filho possui, de forma natural,
um amor por seu pai e é atraído para ele com um
amor muito grande e potente. Deseja muito aquilo
que seu pai deseja — a vontade do pai é também a
vontade do filho e aquilo que contradiz a vontade
do pai, também contradiz a vontade do filho, de
forma absoluta.

Mais ainda, a lógica do filho impõe que aquilo que


o pai quer, é correto. Em geral, a lógica do filho
combina com a do pai — aquilo que dita a lógica
do pai, assim dita a do filho, e ele age de acordo
com o desejo do pai em todos os detalhes e serve-o
efetivamente, um serviço completo, com todo seu
coração e alma.

Todavia, tudo isto é somente porque o filho deri-


va do pai que o gerou e é considerado de sua es-
sência, conforme a afirmação “um filho é a perna
de seu pai”. 9 Portanto, é atraído para seu pai com
amor e desejo, constantemente, uma vez que todas
as coisas são atraídas para sua fonte. Esta é a razão
pela qual a inclinação e as características do filho
se ajustam às do pai, uma vez que “ele foi pego
dele” 10, etc.
Serviço Alegre
Por isto, aquilo com que seu pai lhe ordenar a se
ocupar ou a fazer,
não lhe será incômodo nem um fardo, absoluta-
mente. Ao contrário, servirá e fará a vontade de
seu pai com prazer e alegria, ainda mais do que
quando concretiza suas próprias necessidades,
conforme está afirmado no Zôhar “como um filho
que se esforça por seu pai e mãe [que ele ama],
mais do que por si mesmo, etc.” 11

Similarmente, as almas de Israel são chamadas de


“filhos”, conforme consta no versículo “Vocês são
filhos para o Eterno, teu D’us”, 12 e “Meu filho,
Meu primogênito, Israel”, 13 e versículos similares.
Este título é verdadeiro devido à sua origem nas
Alturas, uma vez que elas derivam da dimensão
íntima da essência do Ein Sof, 14 na Sabedoria da
Mente suprema, conforme na expressão “a sabe-
doria é a mente”. 15 Vemos este conceito também
na expressão: “Pois Você é nosso pai”, 16 literal-
mente.
Por isto, mesmo o serviço Divino como recitar o
Shemá e a oração, e cumprir Torá e Mitsvot o dia
todo, não é, absolutamente, um fardo para tal alma.
É como uma inclinação natural de sua alma Divina
andar no caminho de D’us, sem se desviar para a
direita ou para a esquerda, sem sentir um jugo ou
um fardo absolutamente. E tudo o que é a vonta-
de Divina, é também sua vontade — ela realmente
o deseja do íntimo de sua alma. Inversamente, sua
alma despreza, literalmente, aquilo que é contrário
à vontade Divina. Pois sua vontade é, literalmente,
como a vontade Divina.
Percepção Divina
O mesmo ocorre em sua percepção da Divinda-
de. Assim como a lógica do filho reflete a do pai,
conforme explicamos anteriormente, assim ocorre
com estas almas, e que são chamadas de “filhos”
— seu caráter e percepção refletem aquilo que está
Acima: Assim como Acima, no mundo de Atsi-
lut 17, há Chochmá e Biná 18, quer dizer, o conhe-
cimento
e a percepção da luz infinita que brilha em Atsilut,
da mesma forma, a Chochmá e Biná dessas almas,
conhecem e percebem, literalmente, a luz infinita,
abençoada Seja.

De fato, tudo o que ele entende é somente a bon-


dade da Divindade, não percebe nada diferente,
ou seja, que sua mente não dita, absolutamente,
nada diferente, D’us não o permita. Mas sim, en-
tende os conceitos Divinos e a bondade da Divin-
dade, literalmente, pela lógica imperativa. Isto é
verdade, mesmo a nível de percepção que ocorre
no “conhecimento supremo”, nível de “a verdade
de Havaya”, 19 o verdadeiro nível da verdadeira
percepção suprema, conforme explicado num dis-
curso prévio (Veshavtá) 20 — conhece e percebe o
conceito, literalmente, uma vez que sua chochmá
e biná são exatamente paralelas à chochmá e biná
supremas. (Estão num nível totalmente separado
em comparação com a chochmá e biná de outras
almas, etc. 21) E o conceito assenta bem nele. (O
conceito assenta muito bem nele, em sua mente. 22)
E tudo isto porque a alma é realmente parte de
D’us, das Alturas 23, razão pela qual entende estes
assuntos em sua forma verdadeira, como realmen-
te são.
Inspirado Perpetuamente
E, assim como um filho é naturalmente atraído
para seu pai, com um grande amor e serviço com-
pleto, para cumprir sua vontade com alegria, assim
ocorre com estas almas: são naturalmente atraídas
com uma paixão
de grande amor, como uma centelha que é atraí-
da para sua fonte; e com alegria em seu serviço,
colocando sua mente e coração na oração, Torá
e mitsvot, celebrando a oportunidade de cumprir
uma mitsvá e proporcionar prazer para seu Pai nos
Céus.

Esta também é a razão pela qual a força do fluxo


Divino é atraída nas almas de Israel para desper-
tar nelas o amor Divino e o desejo de escapar do
recipiente [o corpo] que as confina, etc. Também
por isto a pessoa fica inspirada, de repente, a cada
manhã, a servir D’us, sem nenhum preparo prévio,
absolutamente, conforme explicado num discurso
prévio (Vayigash Elav). Tudo isto, porque as al-
mas de Israel derivam da essência do Infinito e,
portanto, a luz é constantemente atraída para elas,
para inspirá-las, etc.
O Servo
Há, no entanto, outro nível ao qual é referida a di-
mensão de “servo”. Esta dimensão também existe
nas almas de Israel e se origina de seus corpos,
conforme consta no versículo Pois os filhos de Is-
rael são servos para Mim. 24
Esta dimensão é similar ao trabalho de um servo
para seu patrão. Servidão consiste em aceitar um
jugo. Em outras palavras, o servo não tem vontade
alguma de trabalhar e só o faz devido ao jugo pesa-
do que lhe é sobreposto, por medo do patrão, que o
força a realizar tarefas difíceis e muito opressivas,
mesmo estando muito em desacordo com sua for-
ça e vontade, etc. O trabalho pesa tanto sobre ele,
a ponto de ficar com alma e fôlego curto 25; mesmo
à noite, não consegue relaxar em seu sono, devido
a este jugo. Pesa sobre ele um jugo de ferro que o
força ao trabalho, despertá-lo do pouco sono que
tem, para ir trabalhar. Não lhe permitem recuperar
seu espírito, absolutamente.

Contudo, o servo aceita este trabalho devido ao


jugo de seu dono, mesmo que contra sua vonta-
de. Carregar este jugo e carga, este grande fardo
de trabalho difícil, torna-se uma segunda natureza
para ele, assim
como o boi se torna acostumado ao jugo e o burro,
à carga. 27 E esta submissão é adquirida pelo servo,
realmente como segunda natureza.

Tudo isto porque, ao se submeter como servo (en-


tregar-se como um servo 22), torna-se nulificado
no íntimo de sua essência, como se não fosse um
ser independente, absolutamente, e que todo o seu
propósito no mundo seja somente trabalhar e ser-
vir seu dono. É considerado como propriedade e,
literalmente, aquisição de seu mestre. 28 Por isto,
aceita sobre si todos os tipos de tarefas, das mais
difíceis e extenuantes, e nem sequer questiona.
Pois assim deve ser (em iídiche [se diz]: assim é
exatamente como deve ser).

Este é todo o seu ser e objetivo — somente o traba-


lho e o serviço. Por isto, carregar o jugo e a carga
lhe é, literalmente, como uma segunda natureza.

Com certeza, com um jugo tão duro como este tal


servo não tem nenhuma alegria e prazer pessoal
em seu trabalho. Mesmo assim, o fato de a von-
tade de seu mestre ser realizada como resultado
de todo o transtorno de seu trabalho — é toda sua
vitalidade e existência. Pois é para isto que ele foi
criado e formado, e ele não possui nada indepen-
dente disto. Pois não possui espaço, existência e
essência per si, absolutamente, uma vez que está
“perfurado” 29 e sua alma, corpo e todas suas pos-
ses são adquiridos por seu patrão, até que, mes-
mo aquilo que ele adquiriu, encontrou ou ganhou,
tudo pertence a seu dono, como conhecido. 30
O Servo Contente
Há, no entanto, um tipo de servo que serve pre-
cisamente, por amor, prazer e alegria. Ele fica
contente e tem prazer de seu serviço devido a seu
grande amor e sua ligação, de coração e alma, para
com seu dono.
Sua ligação e amor não se despertam por ele ser
derivado de seu patrão, de sua essência — como
no caso do filho — nem por ele ganhar benefício
dele, ou seja, ganhar por estar ligado ao seu mes-
tre, ao revelar seu amor, etc., mas sim, devido ao
fato de o servo ter uma estatura nobre, que, portan-
to, sabe e reconhece a grandeza e nobreza de seu
mestre.

Portanto, liga-se a seu mestre com amor e muita


afeição, pelo patrão per si — não devido ao be-
nefício que ganha dele, quer dizer, pelo patrão ser
bom para ele. E isto é o que motiva seu serviço,
que o leva a servi-lo e lhe dar assistência, tudo fei-
to na forma de cabalat ol 31 (não como alguém que
serve seu amado, conforme será explicado 32. Tudo
isto devido à grandeza do mestre, pois o servo a
reconhece, o que o leva a se ligar a ele com amor e
muita afeição. Por isto, subjuga a si e ao seu corpo
para servi-lo em serviços que têm relação com a
honra, sustento, [organização de sua] mesa, e ges-
tão dos assuntos da casa do patrão.
O Mestre é Recíproco
O mestre também conta e confia nele e entrega-
lhe tudo. Todos os seus bens — utensílios de ouro
e de prata, e toda a riqueza de sua casa — entrega
na mão de seu servo, assim como Eliezer, servo de
Avraham, o Velho da casa de Avraham, que admi-
nistrava todas as suas posses, etc. 33, e como Yossef
que tinha sucesso na casa de seu dono. 34 Pois há
uma bênção abundante de um servo como este na
casa de seu mestre, em medida dobrada e redobrada.
Servindo com Amor
Este tipo de servo não serve como se fosse um jugo
ou fardo, absolutamente, mas sim, por um grande
amor. Ele deseja a grandeza, riqueza e sucesso de
seu mestre e seu bem-estar, que ele tenha prazer e
deleite.
Portanto, empenha-se pessoalmente, com to-
das as suas possibilidades, tanto em servi-lo em
suas necessidades físicas, alimentícias, de ves-
tuário e de bebidas, como em providenciar-lhe
uma mesa com todo tipo de iguarias, que lhe
preparou, e limpar e embelezar suas roupas.

Preparando Manjares
(O significado disto na analogia 35: A prepara-
ção dos manjares é uma metáfora para o traba-
lho espiritual de refinamento, tanto o refinamen-
to das facetas da alma animal, como a correção
e refinamento de todas as coisas materiais com
as quais o servo de D’us se ocupa e das quais
recebe vitalidade. O refinamento do supra-cita-
do ocorre ao ocupar-se com elas somente com o
intento dos Céus, não se vulgarizando, D’us não
o permita, por algum capricho. Não as desejará
com a ânsia e vontade do coração, mas sua in-
tenção será somente com o intento dos Céus, etc.
O primeiro tipo de servo 36 fará tudo isto por te-
mor e medo de D’us, conforme será explicado. No
entanto, o segundo tipo de servo 37, cumprirá tudo
por amor e apego a D’us, ou seja, para dar pra-
zer e deleite nas Alturas, conforme expli-
cado no Tanya, cap. 27 e final do cap. 33. 38
E mb e l e z a n d o a s V e s t i m e n t a s
Pode ser dito que embelezar as roupas do patrão
é uma metáfora para o cumprimento de mits-
vot. Pois é através das mitsvot que belas ves-
timentas são criadas, a saber, a “vestimenta”
Divina de malchut [reinado], 39 para que haja re-
velação Divina também nos mundos de By’á. 40
Mais ainda, o cumprimento de mitsvot leva
a revelação a se estender para o local apro-
priado, ou seja, para as almas de Israel. 41

Vestimentas Negras
Estas vestimentas estão em oposição às “vestimentas
negras”, conforme explicado no Likutei Torá, Shir
Hashirim, na primeira explanação de Yonati, cap.
3. 42 (Pode ser dito que isto se refere aos “pecadores
de Israel, que estão repletos de mitsvot” 43 que estão
vestidos com suas roupas sujas, 44 conforme explica-
do no Torá Or, discurso intitulado Osri Laguefen. 45
E é destas mitsvot que forças externas ao reino da
santidade obtém seu sustento, conforme explicado
num discurso anterior (Hashamayim Messaprim).

Alternativamente, o assunto de “vestimentas ne-


gras” é o de que “de Avraham saiu [Yishmael]” 46
conforme explicado num discurso prévio (Ur’item
Oto), significando que as forças externas podem
derivar sua existência do amor e temor a D’us,
D’us não o permita, conforme explicado no Liku-
tei Torá, na primeira explanação de Veyadata. 47)
No entanto, através de mitsvot [executa-
das por uma pessoa direita], lindas vestimen-
tas são criadas, conforme mencionado acima.
Lavagem de Mitsvot
Também pode ser dito que o assunto de limpar
as roupas do mestre é uma metáfora para Ele la-
vou suas vestes com vinho, 48 significando que as
vestimentas criadas por atos de mitsvot requerem
lavagem, uma vez que estas mitsvot podem estar
na mesma categoria do que as dos pecadores de
Israel [acima mencionados], conforme explicado
no Torá Or, discurso intitulado Osri Laguefen. 45

Explicamos num discurso prévio (Ur’item) que,


uma vez que as mitsvot estão investidas em obje-
tos físicos que são compostos de bem e mal, reque-
rem cuidados mesmo depois [que o objeto físico]
tenha sido elevado, etc. De forma similar, pode ser
dito que requerem lavagem por terem estado num
lugar onde há mistura de bem e mal (especialmen-
te a centelha que já tenha sido refinada, etc. 49).

Ver Likutei Torá, Shir Hashirim, discurso intitu-


lado Shinaich keeder, cap. 4, sobre [o rebanho]
ascendendo do banho, 50 que se refere às vesti-
mentas das ações das mitsvot, que requerem la-
vagem nas águas de chochmá (o nível de yichu-
da ilaá 51, etc.). Ver também Torá Or, discurso
intitulado Becaf Hei Bekislêv, início 52, sobre o
refinamento dos atributos de amor e temor atra-
vés de chochmá. Ver também o que foi expli-
cado em outro local sobre o ritual de abluir as
mãos, etc. (discurso intitulado Gan Naul, 5640 53).
A “lavagem” é alcançada através da alegria da
mitsvá, a alegria pelo fato de que as mitsvot são
luz infinita, etc. De acordo com o que escrevemos,
deve-se dizer que esta alegria deriva do fato de ele
estar cumprindo a vontade de D’us e dando prazer
a seu Criador. Este é o significado íntimo de lim-
par as roupas [do mestre].
Embelezando os Artigos Preciosos
[O servo que ama também] prepara a estética dos
artigos preciosos do patrão.
(Isto se refere aos recipientes usados nas ações das
mitsvot físicas, onde os artigos físicos se tornam
receptáculos para a Divindade, e são receptáculos
muito preciosos, uma vez que foram feitos através
do refinamento, etc.

Também pode ser dito que estes se referem às le-


tras que formam as palavras da oração, que são
letras que foram refinadas, conforme explicado
em outro local 54 sobre a diferença entre uma pe-
dra e um tijolo: uma pedra é formada por [D’us
nos Céus], portanto, corresponde às letras das pa-
lavras da Torá [uma vez que a Torá também vem
dos Céus]. Estas são chamadas de letras de Ma. 55
Em contraste, um tijolo é formado pelas mãos do
homem e, portanto, correspondem às letras das pa-
lavras da oração, que são denominadas letras de
Ban. 56 Quando as letras emergem das profundezas
do coração na oração, tornam-se pedras preciosas
e brilhantes, conforme na afirmação: “Matat 57 en-
laça coroas para seu Mestre
das orações de Israel” 58, coroa feita de pedras pre-
ciosas, etc.)
Vinho Bom
[O servo que ama também] serve para seu mes-
tre um bom vinho em recipientes caros. (“Vinho
bom” se refere à dimensão íntima da Torá, con-
forme conhecido sobre “o vinho da Torá”, etc. 59
“Vinho bom em recipientes caros” refere-se a ter
intenção no cumprimento das mitsvot. Intenção no
cumprimento das mitsvot pertence ao âmbito de
revelações do Sêder Hishtalshelut, 60 e, falando de
modo geral, ao âmbito de luzes que têm relação
com Sêder Hishtalshelut. Em geral, este é o servi-
ço Divino dos tsadikim [e não parece relacionar-
se ao serviço do servo que está sendo discutido
no momento]. Mas, na verdade, há uma vontade
Divina pelas revelações do Sêder Hishtalshelut, a
saber, que as luzes se invistam nos recipientes. E
quando se obtém luzes adicionais, isto desenca-
deia prazer nas Alturas, etc. Este, então, é o serviço
do servo através da intenção no cumprimento das
mitsvot — focaliza somente no prazer provocado
nas Alturas através da transmissão e do acréscimo
de luzes que são, desta forma, atraídas para o Sê
der Hishtalshelut, etc. Sua intenção não é para si
mesmo, para seu próprio benefício, para que a luz
e a revelação sejam atraídas para sua alma (que,
em geral, é o significado do serviço com o intento
das mitsvot). Mas sim, sua única intenção é causar
prazer [nas Alturas]).

E faz tudo isto para que o mestre sinta prazer e


deleite da qualidade de seu trabalho em todos estes
assuntos e similares.
Um Homem de Sucesso
É óbvio que este servo precioso serve com agili-
dade, alegria, e grande prazer, em tudo o que faz
para agradar o seu patrão. Obtém prazer e alegria
de seu trabalho, e este não lhe é, absolutamente,
um peso, devido à
intensidade de sua ligação íntima, com grande
amor, das profundezas de sua alma, [por seu mes-
tre]. Por esta razão, dedica-se a seu trabalho pelo
bem do mestre, com todo seu coração e alma.

Isto também o motiva a se empenhar, com toda a


capacidade de seu intelecto e emoções, na direção
do patrimônio de seu mestre e em seu serviço em
casa e nos campos, para produzir lucro e acréscimo
de bênçãos. Chega a ponto de, graças ao sucesso
produzido por este servo precioso — que coloca-
se de lado e focaliza somente o aumento de bênção
e sucesso no patrimônio do dono, sendo esta de
fato, toda a sua ambição, superando mesmo a am-
bição do próprio patrão — o patrão enriquecer e se
engrandecer com todo tipo de riqueza preciosa e
elevação adicional, totalmente além da habilidade
do mestre [de obter o mesmo, se fosse] somente
através de seus próprios esforços e sorte.
(Yossef, por exemplo, era um homem de suces-
so 61, e seu patrão foi muito abençoado através de
seu trabalho. De forma similar, está dito sobre o
Mashiach: Eis que meu servo yaskil 62 — yaskil
significa “terá sucesso” — até que “se elevará
muito” conforme será explicado num outro dis-
curso. 63)
Os Servos Divinos
Esta metáfora sobre os dois servos pode ser enten-
dida no contexto do serviço Divino: Os filhos de
Israel são chamados de “servos” devido a seus cor-
pos, que devem aceitar o ol malchut Shamayim 64
em função de seu serviço Divino. Portanto, refe-
rimo-nos a D’us [em orações] como: “Nosso Pai,
nosso Rei 65. De forma similar, D’us é denominado
“o Rei de Israel e seu Redentor...” 66

Este cabalat ol faz paralelo com o cabalat ol do


servo simples, cujo principal serviço é sob forma
de um grande jugo, sofrer o peso de todo
tipo de trabalhos difíceis, mesmo que muito contra
sua vontade.

Entretanto, torna-se como uma segunda natureza


para ele, devido ao jugo de servidão que aceitou
sobre si, decorrente de seu medo e temor do pa-
trão. Toda a razão de sua existência se torna exe-
cutar o serviço para seu patrão, não possui existên-
cia individual, absolutamente.
Oved Elokim
O mesmo ocorre com qualquer cabalat ol malchut
Shamayim que deriva do temor a D’us. Cabe ser
chamada de oved Elokim, um “servo de Elokim”,
precisamente a pessoa [que possui tal cabalat ol].
Pois Elokim [é o Nome Divino que] denota gover-
no e domínio, 67, e o oved Elokim aceita sobre si
o jugo do domínio e soberania, devido ao medo e
temor Divinos de sua alma. Isto o leva a subjugar
todo seu corpo físico para que seja, literalmente,
como um boi para com seu jugo. Significa que for-
ça a si e à sua força física a fazer o contrário de sua
natureza e desejo material, a saber, andar com o
jugo da Torá e mitsvot o dia todo.
temor Divinos de sua alma. Isto o leva a subjugar
todo seu corpo físico para que seja, literalmente,
como um boi para com seu jugo. Significa que for-
ça a si e à sua força física a fazer o contrário de sua
natureza e desejo material, a saber, andar com o
jugo da Torá e mitsvot o dia todo.

E apesar disto ser contra sua natureza — uma vez


que ele não deseja o jugo da Torá nem qualquer
outro jugo, mas sim estar completamente livre —
mesmo assim, aceita sobre si o jugo da Torá e das
mitsvot, aceita empenhar-se nelas o dia todo. Não
por encontrar nelas algum benefício para si mes-
mo, nem por ser bom para ele, por perceber a luz
[Divina] que está contida nelas, nem com a inten-
ção de causar satisfação nas Alturas, uma vez que
estas considerações estão totalmente além dele.
Mas, ele é conduzido somente devido ao cabalat ol
malchut Shamayim. Isto o força a cumprir aquilo
que é a vontade e o desejo de D’us, e ele não pode
estar livre para ficar parado, pois o jugo do dono,
o Mestre de Tudo, não lhe permite ficar ocioso de
qualquer função que seja, e o obriga a fazer aquilo
que é a vontade Divina.
Dia e Noite
Assim como, com um servo físico, uma servidão
verdadeira significa que ele nunca está à toa —
está sempre servindo seu patrão e fazendo algo
que tem relação com seu dono — o mesmo ocor-
re no âmbito espiritual: o ol malchut Shamayim
que está sobre ele, não lhe permite andar ocioso,
mas força-o a fazer seu serviço constantemente. E
apesar de ser um jugo, pois não deseja isto de ver-
dade, mas o ol malchut Shamayim que está sobre
ele, força-o a fazê-lo e faz com que sinta que não
dá para ser de outra forma, D’us não o permita.

Também à noite, não descansa no sono, mas sim,


desperta-se de seu sono e se ocupa com o estudo da
Torá, ou com cânticos e louvores para D’us, reci-
tando Salmos e similares. E mesmo enquanto está
dormindo, o ol malchut Shamayim está sobre ele, le-
vando-o a se certificar de que seu sono seja de forma
apropriada, e que deite de acordo com a lei judaica,
para que não crie obstáculo, D’us não o permita. 68
Também desperta-se no tempo certo, tan-
to no que se refere à proteção e precau-
ção efetiva, ou a fim de executar seu serviço.
Subjugando Desejos
De forma similar, subjuga a si mesmo no que se
refere a todos os prazeres físicos e conquista a
ânsia de seus desejos, mesmo que é muito con-
tra sua natureza, abdicar de algo pelo qual dei-
xou sua alma ser levada. Apesar disto, anula sua
vontade e natureza, forçando-se a se refrear de
fazer aquilo que é contrário à vontade Divina.

(O próprio ato de subjugar seu desejo, não lhe


é tão difícil, uma vez que o cabalat ol o auxilia.
Pois o leva a temer fazer, D’us não o permita,
qualquer coisa que seja contra a vontade Divi-
na, especialmente porque sua aceitação da servi-
dão é de tal forma que ele não é mais uma en-
tidade per si, absolutamente. Portanto, não lhe é
difícil nulificar seu desejo e se colocar de lado).
Também se esforçará para enfraquecer o poder
do mal que está em seu coração, ao labutar duro
com sua mente e coração na oração, para anular
qualquer desejo estranho. (Devemos dizer que ele
não alcança isto despertando, efetivamente, amor
e temor por D’us [pois isto o enquadraria na cate-
goria do servo que serve por amor], mas sim, ao
contemplar conceitos Divinos, para que o temor a
D’us recaia sobre ele. Devemos também dizer, que
esta contemplação, não é uma verdadeira contem-
plação das profundezas da mente).

Também se empenha em conter seus desejos, mes-


mo em pensamento e fala devido ao ol malchut
Shamayim que aceitou sobre si, que o impede de
se envolver com o mal — pelo menos, na ação
prática. E força-o a se envolver no serviço Divino
no âmbito de “fazer o bem”, 69 isto é, na oração,
em Torá e mitsvot e tsedacá.
Ausência de Individualidade
Ele o faz mesmo que o serviço pesa sobre si (isto
é, o serviço geral) e que sua respiração é curta 25
devido a seu esforço, uma vez que não tem prazer
e satisfação em seu trabalho. Pois faz tudo à força
e coerção e está sempre em estado de nulificação
de sua vontade e auto-compressão, negando-se a
qualquer expressão de si mesmo. Não encontra
valor algum para si, já que não possui nenhuma
estatura elevada de algum tipo de revelação de luz.
Tudo o que possui é o ato prático — e mesmo este,
é experimentado num estado de auto-coerção,
conforme mencionado.

A ideia geral fundamental de seu trabalho é a de


que age em honra de seu dono. E mesmo se execu-
ta tudo de forma apropriada, [não se orgulha disto,
pois,] afinal, requer-se dele que o faça assim, devi-
do à sua servidão e, para um servo fiel 70, não cabe
se auto-celebrar.

Mais ainda, tudo o que ele possui pertence a seu


patrão, conforme citado em outro local, 71 com o
exemplo do servo que elabora um recipiente
muito lindo e o louvor e as honras vão para o pa-
trão. O servo não recebe nenhum crédito por ele,
absolutamente, conforme será explicado. 72
Tudo para o Dono
De forma similar, no serviço Divino, o servo de
D’us não ganha nada de seu serviço íntegro, 73
uma vez que não o faz em benefício próprio, e sim
para dar satisfação a seu dono. 74 No entanto, co-
loca muito esforço em seu trabalho, colocando-se
como um boi em relação a seu jugo, inclina seu
ombro para suportar 75 o jugo de Torá e mitsvot,
mesmo contra sua vontade, pois colocou sobre si o
ol malchut Shamayim como um jugo de ferro para
o serviço Divino. Torna-se para ele, literalmente,
como uma segunda natureza, uma vez que foi ad-
quirido e “perfurado” 29 para seu dono com toda
a essência de seu ser, e não possui identidade ou
existência própria, em absoluto.

Portanto, tal servo não “possui” nada além da


execução da função que lhe foi incumbida. Não
sente alegria ou prazer algum em seu trabalho. Ao
contrário, sente-se sempre baixo e desprezível aos
seus próprios olhos, faltando-lhe totalmente qual-
quer senso de individualidade, mesmo que cumpre
direito sua tarefa em tudo o que lhe é incumbido,
de acordo com a vontade do patrão. Isto porque,
ele é chamado de servo de seu dono, não tendo
nada para si mesmo. Mesmo a recompensa que re-
ceber e lucro que ganhar, tudo vai para seu dono.

Este é o significado de “Não sejam como servos


que servem [o mestre] com o intento de receber re-
compensa”. 76 Pelo contrário, ele não recebe nada
para si, tudo vai para seu mestre.

É em relação a este servo que David diz “Alegra a


alma de Teu servo”. 77 Pois tal servo requer que o
dono o anime, uma vez que ele não tem alegria e
prazer algum em seu trabalho e esforço. Por isto,
David disse “Alegra a alma de Teu servo” (será
explicado o significado desta alegria
num discurso posterior 78) — “pois a Ti, meu Se-
nhor, ergo minha alma”. Pois é um ato de autossa-
crifício aceitar sobre si tal jugo, abdicar totalmente
de sua própria vida, nulificar todos os seus desejos
e sua tendência natural, para entregar-se completa-
mente ao trabalho. Isto é, realmente, como alguém
que “ergue sua alma” e se entrega inteiramente para
ser “perfurado” como um escravo para sempre.
Servindo com um Jugo
Este tipo de servo é chamado de oved Elokim,
“aquele que serve D’us” com um jugo pesado, sig-
nificando que seu trabalho todo vai além de sua
tendência natural e de seus hábitos.

Por exemplo, no que se refere ao esforço no estu-


do da Torá, 79 vamos dizer que uma pessoa aceitou
sobre si ler e rever um capítulo. Se esta quantidade
de estudo não superar aquilo a que ela está acostu-
mada e àquilo que sua tendência dita — uma vez
que ela ama, por natureza, estudar constantemen-
te — seu estudo não é considerado “servir com
um jugo”, absolutamente. [É considerado “estar
servindo com um jugo”] somente se estuda mais
do que seu hábito e tendência natural, labutando
e com grande esforço, até chegar, realmente, à
exaustão de sua alma. 80 [Nossos sábios, homile-
ticamente, interpretam o versículo] “Um homem
que morrer numa tenda”, significando, “na tenda 81
da Torá”, — ele se “mata” pela Torá. 82 Isto é cha-
mado de “empenho no estudo da Torá” (e este é o
significado de “jugo da Torá.” 83).

Por conseguinte, sobre o versículo “E vocês volta-


rão [e discernirão] entre aquele que serve Elokim e
aquele que não O serve” 84, nossos Sábios explicam
que “alguém que revisa seu estudo cem vezes, não
pode ser comparado com alguém que o revisa cento
e uma vezes”. 85 Pois, com uma vez que vai além
de seu hábito e tendência natural, ele ganha o título
de “alguém que serve Elokim” com o jugo da Torá.
Em contraste, quando ele estuda cem vezes, mesmo
que revisa seu estudo com dureza e muito
esforço, não é chamado de alguém que serve D’us.
Devido ao fato dele ter um desejo natural de ser
diligente e de revisar seus estudos até cem vezes,
pois esta é a sua natureza e hábito. Mas, com aquela
revisão na qual ele supera sua tendência natural, e
que vai muito contra sua vontade, sendo-lhe muito
difícil, ele é chamado de “oved Elokim” com um
jugo completo.
Tsedacá
O mesmo ocorre em relação às outras mitsvot,
como com a mitsvá de tsedacá (caridade), age
contra sua natureza e vontade. Pode ser que seja
pão duro e avarento, uma vez que, por natureza,
seu dinheiro lhe é mais precioso do que seu corpo.
Gasta para as necessidades de seu lar com grande
miséria, não mais do que o necessário para aten-
der às suas necessidades. Mas, quando se trata da
mitsvá de tsedacá, sustentar os pobres, é capaz de
distribuir dinheiro de forma que excede muito sua
tendência natural.

Isto devido ao ol malchut Shamayim que tem so-


bre si [pelo qual] é chamado de oved Elokim, já
que suprime sua natureza e a energia de seus es-
forços pelo qual se entregou, e dá para o pobre. E
sua motivação para fazê-lo é somente a de cum-
prir a vontade de D’us, uma vez que ele está com
medo de se revoltar contra seu Mestre e o temor
a D’us está sobre si. Mas alguém que distribui
dinheiro somente de acordo com sua natureza e
com a generosidade de seu coração, e não mais,
não é denominado “alguém que serve D’us” com
jugo, suprimindo sua natureza e hábito.
Suprimindo Emoções Negativas
Assim ocorre com todas as emoções. A pessoa se
restringe e se segura, dominando sua natureza ne-
gativa e difícil. Faz isto contra sua vontade, so-
mente devido a seu cabalat ol malchut Shamayim,
como alguém que controla seu espírito para não
irromper numa raiva explosiva. Não se vinga ou
guarda rancor de seu companheiro, nem pensaria
negativamente de outra pessoa ou considera fazer-
lhe algo prejudicial, D’us não o permita. Não fala
mal de outros, não faz fofoca, nem se ocupa com
frivolidade vã. Mesmo que isto contradiz sua pró-
pria natureza, que é a de
ser gozador e fofoqueiro. Faz isto devido ao ol
malchut Shamayim que está sobre si como um
jugo pesado, levando-o a renunciar e a suprimir
seus desejos naturais.

O mesmo ocorre com todos os seus desejos, como


desejo de comer, desejo por prazer carnal, por
aquisição de riqueza e honra, pela vitória — apesar
de não haver proibição contra estas coisas [quando
feitas de acordo com a lei judaica], o overd Elokim
se restringirá e controlará seu espírito, negando de
si tudo isto de uma maneira que excede sua força e
natureza. Mesmo que sua natureza seja a de perse-
guir a honra, riqueza e glória, satisfazendo com pou-
co, e aceitará tudo o que lhe for feito, mesmo que,
contra sua vontade, como ouvir que o envergonham
e o ofendem 86 e não responder. E comporta-se, de
forma similar, com todas as tendências naturais.

Faz tudo isto com grande esforço e [com a sensa-


ção de ter] um jugo muito grande, motivado apenas
pelo ol malchut Shamayim que tem sobre si. Seu
principal empenho e trabalho é o de fazer aquilo
que é contra sua natureza, mesmo o de refrear-se
de falar pequenos comentários. Também, refreia-
se de entreter-se com pensamentos estranhos. 87

De forma similar, refreia-se de se comportar de


forma frívola. Se, por natureza, ele é brincalhão e
leve, forçar-se-á a ficar sério. Falará muito pouco,
cuidando de sua boca e língua. Não andará de for-
ma espalhafatosa e alvoroçada, com postura ereta
e espírito de grandeza, fazendo comentários ousa-
dos. E sim, com submissão, simplicidade e grande
humildade, mesmo que, por natureza, tenha um
espírito de grandeza e um coração ambicioso.

E, apesar de que sua natureza em todos estes as-


suntos, não se transformou, absolutamente, ele su-
prime seu coração, contém seu espírito, e controla
sua inclinação, contra sua vontade, o que é cha-
mado de “reprimir a sitra achra”. 88 Há um grande
prazer disto, nas Alturas. Conforme
escrito no Tanya, cap. 27, que há dois tipos de pra-
zeres perante Ele, nas Alturas, sendo o segundo,
quando a sitra achra é reprimida quando ainda se
encontra com toda sua força e vigor, erguendo-se
como uma águia, e, de lá, D’us a faz descer. Isto
ocorre através da repressão da sitra achra aqui em
baixo, com relação a todas as forças naturais do
servo, conforme mencionado. Então, a sitra achra
é reprimida [nas Alturas], levando a um gran-
de prazer nas Alturas. Isto ocorre, especialmente
quando o servo faz tudo isto por causa do ol mal-
chut Shamayim que tem sobre si, conforme expli-
cado acima, e então, é chamado de um verdadeiro
oved Elokim.
Oved Elokim
A palavra oved, neste contexto, pode ser [homile-
ticamente] interpretada como “corrigir”, como em
“orot avudim” — peles de animais processadas e
tratadas. 89 Portanto, o oved Elokim “corrige” o
Nome Elokim — que equivale numericamente 90
à palavra hebraica hateva, “a natureza” 91 — ao re-
primir sua natureza física 92
que provém de kelipat noga, 93, que, então, se in-
sere no Nome Elokim da santidade. Isto ocorre,
tanto através da repressão de sua natureza em as-
suntos referentes a “afastar-se do mal” 69, [como
em assuntos de “fazer o bem”. 69 “Afastar-se do
mal”] inclui todos os pormenores citados acima
como desejos, prazeres, falar mal e fofocar sobre
outros, e similares. E, através do autodomínio e
do controle de seus desejos, sua natureza física,
que deriva de kelipat noga, é subjugada e, portan-
to, sua energia é acrescida ao terreno da santidade.

De forma similar com relação a “fazer o bem”,


como ao se ocupar do estudo da Torá de forma for-
çada [acima de sua natureza], e também na mitsvá
de tsedacá, conforme mencionado, a kelipat noga
é subjugada e se insere na santidade.
Mitsvot por Hábito
Em contraste, a pessoa que não serve D’us com ca-
balat ol malchut Shamayim, preservando sua alma,
contra sua natureza, conforme citado, mesmo que
cumpre mitsvot, estuda Torá e reza todos os dias,
[não é considerada oved Elokim, pois sua obser-
vância] é superficial, somente por hábito. Não de-
dica a si e as suas faculdades naturais [para D’us],
em absoluto. Este tipo de serviço está descrito no
versículo “Pois este povo se aproxima de Mim...
Honra-Me com sua boca e lábios, proferindo ora-
ção, mas seu coração está afastado de Mim”. 94 Isto
se refere àqueles que servem “de boca para fora”,
levados somente pelo hábito, uma vez que foram
assim acostumados desde a sua juventude. E o ver-
sículo continua “seu temor por Mim é considerado
apenas como um mandamento decorado” por hábi-
to e segunda natureza, literalmente. Fazem somente
aquilo que seus pais os acostumaram desde a in-
fância, sem possuir nenhum elemento de serviço
a D’us com ol malchut Shamayim por iniciativa
própria, de fazer precisamente o que vai contra sua
natureza, mesmo que isto requer agir contra a pró-
pria vontade. Tal serviço não é considerado oved
Elokim, absolutamente.
Este é o significado do versículo “E vocês volta-
rão e discernirão entre o justo e o perverso [entre
aquele que serve Elokim e aquele que não O ser-
ve]”. 84 Com certeza há uma diferença óbvia entre
o justo e o perverso, que é claramente visível em
suas ações em direções contrárias — de bem para
mal. Exatamente desta forma, diz o versículo, con-
siderem e vejam a diferença claramente visível en-
tre o oved Elokim — que serve D’us de forma que
vá além de sua própria natureza, literalmente, com
ol malchut Shamayim — e aquele que não O serve
com jugo, absolutamente, conforme mencionado.
Isto é verdade, apesar de suas ações no serviço Di-
vino como na oração, Torá e mitsvot, serem real-
mente idênticas. Todavia, na verdade, a diferença
entre eles é, efetivamente, como a diferença entre
o justo e o perverso. Pois, apesar daquele “que não
O serve” não ser, D’us não o permita, um perver-
so, mesmo assim, seu coração não possui ol mal-
chut Shamayim, em absoluto.

A pessoa só consegue enxergar aquilo que é vi-


sível aos seus olhos 95, não mais do que as ações
visíveis externamente. Mas D’us vê o que está no
coração 95. Ele vê se a pessoa possui ol malchut
Shamayim em seu coração, que motiva seu ser-
viço, e se ela subjuga totalmente sua natureza por
causa do ol malchut Shamayim que tem sobre si,
sendo esta pessoa um verdadeiro oved Elokim.
Inversamente, D’us vê se a pessoa não possui ol
malchut Shamayim em seu coração e não subjuga,
absolutamente, sua natureza, conforme menciona-
do. E [pode ser] mesmo uma pessoa que é estudio-
sa, por natureza, e que não possui “sangue-quen-
te” e similares, conforme citado no Tanya, cap. 15,
todavia, não subjuga sua natureza, absolutamen-
te, não possui ol malchut Shamayim. É, portanto,
chamada de “alguém que não O serve”. Mas um
oved Elokim, aceita sobre si ol malchut Shamayim
devido ao temor e medo de D’us e, precisamente
devido ao ol malchut Shamayim que tem sobre si,
ele faz o que faz, tanto no campo de “afastar-se do
mal” como no de “fazer o bem”.
Yossef e as Tribos
De acordo com o mencionado, podemos compre-
ender o versículo “Os filhos de Reuven e de Gad
possuíam muito gado”. Explicando: Há
uma diferença bem conhecida entre Yossef e to-
das as outras tribos. 96 As outras tribos eram pasto-
res, 97, ou seja, escolheram para si um tipo de tra-
balho que não os perturbasse e que lhes permitisse
ser uma “carruagem” 98 para a Divindade, mesmo
quando ocupados com assuntos mundanos. Por
outro lado, Yossef estava envolvido em negócios,
conforme nossos sábios comentaram sobre o ver-
sículo “E ele [Yossef] veio para casa [fazer seu
trabalho]” — “para verificar os registros da con-
tabilidade”. 99 E, depois, tornou-se rei do Egito,
o que o deixou extremamente ocupado. Porém, já
que era uma alma de Atsilut, que é separada, em
nível, de Beriyá, Yetsirá e Assiyá não teve absolu-
tamente nenhum impedimento em seu serviço Di-
vino. E mesmo enquanto estava imerso nos afaze-
res mundanos, permanecia, simultaneamente, uma
carruagem para a Divindade, conforme explicado
anteriormente (final de Usfartem Lachem).

Inversamente, as outras tribos, por terem suas al-


mas enraizadas na carruagem inferior de Beriyá,
Yetsirá e Assiyá 100, não tinham capacidade de ser
uma “carruagem” ao mesmo tempo em que esta-
vam imersos no mundo.
Reuven e Gad
Esta é a razão pela qual os filhos de Reuven e os
de Gad escolherem ser precisamente pastores,
uma vez que estavam enraizados na carruagem in-
ferior e estavam no nível de “servos”. Por isto “os
filhos de Reuven e de Gad possuíam muito gado”,
significando que sua ocupação era, precisamente,
cuidar do gado.

Também é por esta razão que escolheram a terra


do outro lado do Jordão [pois era espiritualmen-
te apropriada para seu serviço Divino], conforme
será explicado:
Érets Yisrael
[A Terra de Israel é chamada de] érets, o que de-
nota ratsô, desejo, conforme no ensinamento “Por
que ela é chamada de érets? Porque
correu [para fazer a vontade de seu Mestre]”, 101 re-
ferindo-se ao desejo expresso no versículo “Quem
tenho eu no céu? E além de Ti, nada desejo [na
terra]” 102. Esta ânsia decorre da conscientização,
entendimento e sentimento da elevação e grande-
za da Luz Infinita. Este desejo ocorre nas almas
que estão no nível de oved Havaya 103, o nível do
“servo fiel” e do “filho”, conforme explicado (no
discurso intitulado Titen Emet). 104
Reuven e Gad: Almas de BY’Á
Mas as almas de BY’Á, que são os “servos sim-
ples”, estão no nível de oved Elokim, uma vez que
seu serviço é o de refinar a alma animal (que é
também o assunto de “muito gado”, o nível de “al-
mas de germe de animais” 105 — e seu trabalho é o
de corrigir e refinar a alma animal). Por esta razão,
escolheram a terra do outro lado do Jordão, [uma
vez que é, espiritualmente, mais adequada para o
oved Elokim, conforme será agora explicado.]
Graus de Santidade
O Midrash Rabá, Porção Nassô, cap. 7[:8], enu-
mera os dez níveis de santidade da Terra de Israel,
terras. [Ao comparar os vários níveis, o Midrash
diz que, o que era antigamente] a Terra de Ca-
naã, é mais sagrada do que a terra do outro lado
do Jordão. Significando que, apesar desta última
ser também considerada parte da Terra de Israel
se comparada com as outras terras, mesmo assim,
[aquilo que era antigamente] a Terra de Canaã, é
mais sagrada. 106

Explicando: a Terra de Canaã está no nível de de-


sejo, expresso em “Quem tenho eu no céu?” 102 —
sendo este o desejo do nível de oved Havaya, (isto
é, o serviço da alma 107). Todavia, o outro lado do
Jordão, é o serviço de oved Elokim.
A Missão de Moshé
Porém, o serviço de Moshé era o de atrair o nível
de daat 108 até nas almas de germe de animal, con-
forme escrito “E Eu darei grama [em teu campo
para teus animais]”. 109 Disse para eles: “Se vo-
cês forem para a luta” — contra a alma animal,
de forma que, através desta batalha, atinjam o ní-
vel de um desejo ardente, equivalente ao nível de
“com toda a sua possibilidade” 110, que é evocado
pela oposição. 111 [então “esta terra será para vocês
como propriedade permanente”.] 112
O Versículo
Então, “se vocês forem para a luta, diante de Ha-
vaya (Eterno) e a terra for conquistada”, que sig-
nifica que vocês vão persistir e alcançar o nível
de ratson 113, até chegar ao nível de “diante de Ha-
vaya”, similar ao conceito de ande perante Mim, 114
para “a dimensão íntima.” 115

— (Pode-se dizer que este é o nível de revelação do


Nome Havaya através do Nome Elokim, ou seja,
através do serviço Divino no nível de Elokim, o
Nome Havaya é revelado, conforme explicado no
discurso acima mencionado, Titen Emet) —
Então, “esta terra será para vocês como proprieda-
de permanente”, ou seja, vocês herdarão também
esta terra que fica do outro lado do Jordão, o que é
uma alusão ao benefício adicional que é adquirido
através do refinamento da alma animal, quando,
também esta terra, apesar de não ser tão sagrada
[como a Terra de Canaã], será uma herança para
vocês, através do serviço de elevação da alma ani-
mal.
INTRODUÇÃO E PERSPECTIVA
“E acreditaram em D’us e em Moshé, Seu servo.”
(Êxodo 14:31)
“Quem acredita em Moshé acredita em D’us...”
(Mechilta sobre o versículo)

L iderança é uma palavra muito usada em nosso


vocabulário. Porém, o que é exatamente
liderança? Que qualidades únicas a Torá atribui a
um líder judaico?

O Zôhar descreve Moshé, o típico líder judeu,


como sendo o Ra’aya Mehemna, o “pastor fiel” de
Israel. O povo judeu é o rebanho, por assim dizer,
que D’us confiou aos cuidados especiais de Moshé.
De fato, o Midrash relata (Shemot Rabá 2:2):

“Quando Moshé estava cuidando do


rebanho de Yitro no deserto, um pequeno
carneiro escapou. Ele correu atrás dele
até alcançar um lugar de sombra. Então,
apareceu uma poça de água e o carneiro
parou para beber. Quando Moshé se
aproximou do carneirinho, exclamou: “Eu
não sabia que você fugiu por causa da
sede; você deve estar exausto!” Então
ele o colocou em seus ombros e voltou
para o rebanho. Por conseguinte, D’us
disse: “Já que você foi piedoso em cuidar
do rebanho de um mortal, você vai liderar
Meu rebanho, o povo de Israel”.

Porém, o termo Ra’aya Mehemna tem outra


conotação, uma que talvez se encaixa melhor com
a função vital de um líder judeu: “Pastor da Fé”.
Em outras palavras, Moshé — e todo líder judeu —
tem como função conferir fé em D’us a seu povo.
Definição de Fé
Há várias formas de fé. A inferior é uma fé
abstrata, flutuante; uma forma de fé leve. Um ladrão
que pede para que D’us lhe dê sucesso em seu crime
demonstra um certo senso de fé. No entanto, se ele
tivesse seguido sua “fé” à sua conclusão lógica,
teria percebido que está envolvido em um ato muito
sem-“fé”. Da mesma forma, em menor proporção,
alguém que pede a D’us que lhe dê sucesso em
seus negócios e depois utiliza práticas moralmente
questionáveis nestes mesmos negócios, também
demonstra uma fé “superficial”. Esta fé é leve, pois
não significa nada para a pessoa. Não a impele a
alterar seu comportamento de alguma forma.
Fé verdadeira, então, é definida por suas
consequências. Não é meramente um sentimento,
mas um ímpeto por algo real, tangível.

Fé verdadeira chacoalha a pessoa à parte mais


profunda de seu ser e exige ação: “Se é nisto
que você acredita, então deve agir em prol disto!
Não importa as dificuldades que enfrente, deve
permanecer fiel à sua fé!

Fé verdadeira transforma uma pessoa.

De onde esta fé deve fluir? Tanto de dentro como


de fora. De dentro, pois o segredo deste poder de fé
de mudar uma pessoa está no fato de ele ser parte
da própria estrutura da essência. De fora, pois é
Moshé — e todo líder judaico subsequente — que
capacita cada um de nós a explora nossa fé mais
profunda e essencial.

Moshé, como “Pastor da Fé” confere a habilidade


de acessar a própria fé essencial em seu povo, pois
Moshé ativa a essência, o núcleo de cada pessoa.
* * *

O discurso presente, “Alimentando a Fé”, foi


dito pelo Rebe de Lubavitch, Rabi Menachem M.
Schneerson, de abençoada memória, no Shabat
Tetsavê, 10 de Adar I (1981). Onze anos depois,
em 5752 (1992), o texto hebraico do discurso foi
preparado para ser publicado. O Rebe editou o
manuscrito e apresentou o discurso pessoalmente
para milhares de seus chassidim em Purim Catan
(14 de Adar I) daquele ano.

O discurso é baseado no versículo que inicia


a Porção Semanal de Tetsavê: “E você [Moshé]
ordenará ao povo de Israel, e levarão para você
azeite puro de oliva, triturado para a luminária para
manter acesa uma chama constante.”1

Depois de colocar algumas questões sobre as


nuances do versículo, o discurso entra numa ampla
discussão explorando tópicos como os vários níveis
da alma, o significado da fé e a explicação mais
profunda da festividade de Purim.
Porém, talvez o mais comovente é a análise
da função de Moshé e dos líderes judaicos
subsequentes. Pois este foi o último discurso que
o Rebe legou aos seus chassidim.
Perspectiva
A mística nos conta que nossa alma é composta
de diferentes níveis, ou camadas. De fato, somente
parte da alma descende das Alturas para operar
conscientemente dentro dos corpos. A outra parte
— a dimensão subconsciente da alma — permanece
transcendente.
Apesar de que a alma subconsciente também
se encontra no corpo, no entanto, permanece
“acima” da pessoa. Seu efeito no homem não pode
ser percebido conscientemente, diferentemente
do intelecto da alma, por exemplo, que opera
claramente dentro da pessoa. A alma subconsciente
geralmente não influencia as ações do dia-a-dia da
alma consciente ou sua percepção da realidade.

A percepção e consciência do Divino da alma


subconsciente é celestial. Sua realidade é Divindade;
qualquer outra coisa é teórica. Divindade é algo que
ela vivenciou, não algo que tenha ouvido e vindo
a compreender.

A realidade da alma consciente é o exato oposto:


a percepção terrestre é realidade, e Divindade é
teórica.

(A alma consciente, através do estudo e meditação


sobre Divindade, pode desenvolver uma consciência
Divina e amor. Mas é uma consciência tênue — é
um amor contingente cuja intensidade atinge
somente o grau de sua origem, que é a compreensão
intelectual. É um “amor criado” — oposto ao amor
inato e orgânico e à conexão da alma subconsciente.)

Porém a alma subconsciente sim se comunica


com a pessoa e se faz notar de algumas formas.
O fato de a pessoa saber da existência de D’us
com uma consciência inata (não uma consciência
intelectual) é porque o mazal 2 “vê” D’us. Além
disso, o mazal influencia a pessoa de varias outras
maneiras, porém sempre subconscientemente.

Os companheiros do profeta Daniel estremeceram


quando Daniel teve uma visão. “Apesar de eles não
terem visto a visão”, diz o Talmud 3, seu mazal a
viu” e fez com que estremecessem. Quando flashes
de inspiração e criatividade injustificados entram
na pessoa, esta está recebendo um comunicado do
mazal 4.

A Essência
O mazal é a inferior das duas dimensões da alma
subconsciente. Transcende, no entanto, permanece
“próxima”. Apesar de seu lugar ser “fora” da pessoa
consciente, mas ainda se relaciona com ela e a
informa, mesmo que somente subconscientemente.5

A dimensão superior é a essência da alma.

Há certas situações que demonstram


particularmente a presença da essência da alma.

Quando um judeu ignorante e pecador é ameaçado


de morte se recusar a ajoelhar-se para uma imagem
— e escolhe a morte —, seu ato não é inspirado
por sua alma consciente. Sua alma consciente —
seu intelecto e suas emoções — está tão afastada
de qualquer sensibilidade espiritual que poderia se
pensar dele como totalmente desligado de sua fonte.

Seu ato altruísta é ditado por uma voz diferente,


a voz da essência da alma.

Assim como o amor entre pai e filho, a essência


da alma ama D’us e não consegue ser separada
d’Ele. No entanto, assim como o amor de um pai
pode permanecer latente e deixar de impregnar
inteiramente a relação pai-filho, o espírito da
essência da alma pode permanecer dormente e
deixar de impregnar a pessoa consciente em sua
totalidade.

Então, o comportamento e a consciência da


pessoa podem não estar de acordo com a visão e o
desejo da essência da alma. Mas a essência da alma,
através da qual está unida a D’us de forma inata,
não vai embora. Emergirá quando a ligação da alma
com D’us for ameaçada. Assim como a azeitona,
cujo óleo é produzido quando é triturada, a essência
da alma se expressa em tempos de perseguições
esmagadoras.
Porém, sua ascensão não muda necessariamente a
pessoa consciente. Nosso judeu pecador permanece
um pecador. Não se transforma de repente num
santo. Ainda pensa e age em todos os assuntos —
salvo o de seu martírio — como sempre fez.

Isto porque a essência age sobre a pessoa,


impondo sua vontade e percepção sobre a alma
consciente. A essência é um ser transcendente
e, consequentemente, seu efeito é, também,
transcendente.
Criança Chorando
Há outra forma através da qual a essência da alma
se destaca; através de um tipo de trituração que
pode ocorrer mesmo em tempos de prosperidade
e liberdade.

Quando Rabi Shalom DovBer, quinto Rebe


de Lubavitch, era uma criança, seu professor lhe
ensinou o versículo que trata da revelação de D’us
para Avraham.6 O jovem Shalom DovBer voltou
para casa em lágrimas: “Por que D’us não Se revela
para mim?”
Este futuro líder espiritual estava expressando
mais do que ingenuidade infantil. Ele estava
expressando a frustração natural da alma face ao
ocultamento Divino.

Mesmo para Rabi Shimon Bar Yochai, cuja


estatura rendeu-lhe imunidade à devastação
espiritual e ocultamento Divino introduzido pela
destruição do Templo, a dor do exílio é aguda.7

Enquanto mesmo um canto remoto de realidade


está isento de revelação Divina, é óbvio que a
Essência Divina não está revelada, pois quando a
Essência está revelada, não há ocultamento em lugar
algum. (Ver a seguir, cap. 9.)

Assim, mesmo a revelação sentida por Rabi


Shimon Bar Yochai estava carente — e isto
esmagou-o, despedaçou-o até o núcleo. Estava
quebrado por causa da falta da revelação da
Essência Divina.

Quando o gigante espiritual, Rabi Shneor Zalman


de Liadi, dirige-se para D’us e exclama: “Não
o quero o Seu Gan Éden! Não quero o Seu Mundo
Vindouro! Quero somente ao Senhor Mesmo!” 8 —
está expressando o desejo inato da essência da alma
por revelação Divina. E revelação da Essência. A
essência da alma não se sacia com atmosfera Divina.

Este pode parecer um sentimento reservado


à mística sagrada, além do alcance do homem
comum. Mas o fato de que estas histórias nos foram
contadas implica que o anseio que elas expressam
é tangível; pois mesmo a pessoa comum possui
a essência da alma — e é a essência da alma que
chora pelo exílio.
Confinada pela Transcendência
Estas duas expressões da essência da alma são,
de fato, expressões de duas dimensões diferentes
de essência.

A essência da alma, falando de forma geral,


é o aspecto da alma que transcende as facetas
particulares da alma. O que é uma pessoa? É sua
mente, coração — talvez ação? Nenhuma das
citadas. Uma pessoa pode ser definida somente
por sua essência, o núcleo abstrato da alma —
indivisível, além de definição e caracterização.

No entanto, ironicamente, isto per si é uma


caracterização e, portanto, limitação — a essência
está confinada na transcendência e abstração.

A verdadeira essência da alma é o fato de


ela derivar da Essência Divina. Assim como a
Essência Divina não é limitada, de forma alguma,
a verdadeira essência da alma, também, não é
limitada — nem mesmo pela transcendência. É
este nível da alma que pode falar e influenciar as
faculdades conscientes.

Quando o judeu em Shushan, Córdoba ou


Moscou colocou D’us acima de sua própria vida,
estava experimentando a manifestação da essência
transcendente da alma. Portanto, a natureza
transcendente da manifestação: o judeu não é afetado
internamente. A essência influencia suas ações, mas
é como se uma força estranha tivesse entrado nele.
Ele mesmo — a forma como pensa conscientemente
e mesmo a forma como se comporta em todos os
assuntos que não estão relacionados à ameaça a seu
Judaísmo — permanecem como antes da
revelação da essência.

Então temos o fenômeno do judeu que estava


pronto a dar sua vida pela Torá, na Rússia comunista,
que então muda para os Estados Unidos, e seu
prévio autossacrifício não está mais (tão) aparente.

Pois a essência transcendente da alma, por


sua própria natureza, é incapaz de imanência e
internalização. E é esta essência transcendente que
se desperta nas perseguições.

Somente a verdadeira essência que é


verdadeiramente infinita e tem capacidade de
“transcender a transcendência” encontra expressão
em imanência e consciência.

A aparição da alma devido ao segundo tipo


de esmagamento — não por perseguição física
ou religiosa, mas uma quebra espiritual face ao
ocultamento Divino — é o surgimento da verdadeira
essência. Pois a quebra espiritual ocorre somente
quando a alma consciente está imbuída com a
natureza da essência da alma. A pessoa consciente
está pensando e sentindo como a essência da alma
sentiria. Somente a verdadeira essência é capaz de
imbuir a alma consciente desta forma.
Pastor da Fé
Além das condições de “trituração” que leva
a essência da alma a emergir, em cada geração
há um Moshé, um pastor espiritual cuja função é
revelar a essência das almas de seu rebanho. Moshé
não precisava criar nada novo em seu povo, devia
meramente revelar e concretizar aquilo que já estava
latente dentro deles e fazer com que influenciasse seu
comportamento.

Uma vez que o povo recebe esta revelação


através de Moshé, deve, através de seu próprio
esforço, alinhar a visão da essência da alma com
sua consciência.

É esta tarefa que traz à tona a verdadeira essência


da alma, que possui a habilidade de transcender a
transcendência e ser internalizada.

A alma consciente, então, torna-se uma chama


constante, ner tamid, imune a altos e baixos de
“dia” e de “noite”. Desse modo, mereceremos a
era na qual a Divindade será óbvia mesmo sob
a perspectiva consciente e terrestre, quando “o
conhecimento de D’us preencherá a Terra assim
como as águas cobrem o mar...9

NOTAS EDITORIAIS
O texto hebraico original contém 63 notas de
rodapé — algumas, citações de fontes; outras,
explanações bastante amplas e detalhadas de ideias
discutidas no texto e suas ramificações. Estas foram
totalmente traduzidas e, em vários casos, mais
esclarecidas. As notas hebraicas originais aparecem
no fim do texto.

Para esclarecer e explicar melhor o texto para o


leitor foram adicionadas várias notas de rodapé novas.
As observações e os esclarecimentos acrescentados
no texto original estão entre colchetes. Os colchetes
encontrados no texto hebraico original se encontram
aqui entre parênteses.
TRADUÇÃO E COMENTÁRIO

Com a ajuda dos Céus, Shabat Parashat Tetsavê,


10 de Adar Rishon, 5741 (1981)

“E você [Moshé] ordenará ao povo de Israel, e


levarão para você azeite puro de oliva, triturado
para a luminária,1 para manter acesa uma chama
constante”.2

As anomalias deste versículo são bem conhecidas.3


Em todos os mandamentos da Torá, D’us diz a
Moshé Ordene ao povo de Israel, ou alguma frase
similar. Neste verso, a Torá diz E você ordenará ao
povo de Israel.4

Mais ainda, esta anomalia não se refere somente


ao estilo linguístico do versículo. Mas também a seu
significado e conteúdo. A expressão e você ordenará
implica que Moshé é o comandante.5 Isto deve ser
entendido, pois Moshé é somente o mensageiro que
transmite a ordem de D’us para Israel. Então, por
que o versículo diz e você ordenará?

Também requerem explicação as palavras e


trarão para você — que [o povo de Israel] devem
trazer o azeite para Moshé (“para você”).6 Uma vez
que era Aharon que acendia as velas,7 por que era
necessário trazer o azeite para Moshé?8

As palavras azeite... triturado para a luminária


também requerem explanação, já que a expressão
azeite... para iluminar parece ser mais apropriada?9
Devemos também compreender a razão pela
qual, no versiculo10 a seguir [as velas são citadas
como sendo preparadas por Aharon] da noite até a
manhã, enquanto aqui, a expressão é para manter
acesa uma chama constante.11
2.

Meu sogro, o Rebe12 (em seu famoso discurso


intitulado Vekibel Hayehudim,13 que foi dito em
Purim Catan 5687 [1927]14), explica que [a palavra
hebraica para] “ordem” (tetsavê) denota ligação e
união.15 Então, E você ordenará o povo de Israel
significa que Moshé liga e une o povo de Israel
com a Luz16 Infinita.17

E através de Moshé influenciando Israel (unindo-


os com a Luz Infinita), Moshé é enaltecido e ocorre
uma elevação e acréscimo nele.

(Pois Moshé e Israel podem ser comparados à


cabeça e perna, como no versículo18 seiscentos mil
pés é a nação na qual estou dentro.19 Todo Israel
são os pés de Moshé e Moshé é a sua cabeça. E
assim como os
pés da pessoa levam a cabeça a um lugar que, a
cabeça, por si só, não consegue alcançar, assim
ocorre com Moshé e Israel; através de Israel (os pés
de Moshé) há um acréscimo na grandeza de Moshé.

Esta ideia está expressa nas palavras seiscentos


mil pés é a nação na qual estou dentro. [Isto pode
ser interpretado homileticamente significando que]
através dos pés da nação, a revelação de “Eu” é
atraída para dentro de Moshé.20)
Trazendo Óleo
Este, então, é o significado de E você ordenará o
povo de Israel e levarão para você azeite de oliva...
Através de Moshé unindo e ligando o povo de
Israel com a Luz Infinita, o povo de Israel “trazem
azeite de oliva”21 para Moshé (e eles trarão para
você), significando que eles causam um acréscimo
e aumento de luz em Moshé.22
3.

Para esclarecer o mencionado,23 o Rebe primeiro


explica no discurso24 que Moshé é chamado de
“Pastor Fiel”.25 Este termo significa duas coisas: a)
Moshé é o pastor fiel de Israel, e b)Moshé alimenta
e sustenta Israel no assunto da fé [um “Pastor da
Fé”].26

A fé existente em Israel por sua própria natureza


— ou seja, que os judeus são “crentes filhos de
crentes”27 — pode permanecer separada de seu ser
consciente.28 Que Moshé os alimenta e sustenta no
assunto da fé significa que ele os leva a sentir sua
fé de forma consciente.29

Este é o significado da afirmação31 do Zôhar:30


“A fé superior será alimentada e sustentada por
você (Moshé)”. Que Moshé alimenta e sustenta a
fé significa que leva as pessoas a experimentá-la
conscientemente.
A Extensão de Moshé
O Rebe continua o discurso dizendo que a
capacidade de Moshé como “Pastor da Fé” se aplica
também à extensão de Moshé em cada geração”.32
Os líderes judaicos em cada geração fortificam
a fé do povo judeu (de sua geração), de forma que
experienciem sua fé conscientemente.

Um exemplo de tal líder foi Mordechai 33, a


“extensão de Moshé” de sua geração, conforme
nossos sábios, de abençoada memória, afirmaram:34
“Mordechai em sua geração era como Moshé, na
dele”.35 Mesmo durante o período da perseguição
de Haman, quando o estudo de Torá e cumprimento
das mitsvot requeriam autossacrifício, Mordechai
promoveu reuniões públicas para fortalecer a fé do
povo judeu em D’us e reforçá-los no estudo da Torá
e no cumprimento das mitsvot.36
Triturado para a Luminária
Depois de se estender sobre o assunto de
que Moshé e suas extensões, em cada geração,
fortalecem a fé de Israel, o Rebe explica 37 o
palavreado preciso da frase azeite... triturado para
a luminária (“para a luminária”, em vez de “para
iluminar”).38 Explica que, durante o exílio, cada
um está quebrado e triturado (catit) e, portanto,
alcançamos a luminária (a essência) da qual a luz
é derivada.39
Devemos compreender a ligação entre esta
interpretação de triturado para a luminária com os
comentários anteriores do discurso de que Moshé (e
sua extensão em cada geração) alimenta e sustenta
a fé, levando-a a ser sentida conscientemente.40
4.

A interpretação do versículo E você ordenará41


aparece (no discurso42) em continuação ao conceito
discutido no início do discurso. A saber, o significado
do versículo E os judeus aceitaram o que haviam
começado a observar,43 é que eles aceitaram [na
época de Achashverosh] o que haviam iniciado nos
tempos de Matan Torá, a outorga da Torá.44

Em outras palavras, em Matan Torá havia apenas


um início (começaram a observar) e nos dias
de Achashverosh (durante o período do decreto
de Haman) houve uma aceitação — e os judeus
aceitaram.45

(Esta interpretação é similar à interpretação


de nossos sábios, de abençoada memória,46 do
versículo Os judeus estabeleceram e aceitaram47 —
estabeleceram o que já haviam aceitado. Quando
em Matan Torá disseram “faremos” antes de
“ouviremos”,48 houve apenas uma aceitação. Nos
dias de Achashverosh,49 no entanto, estabeleceram
o que haviam aceitado.50)
Fato Admirável
O Rebe salienta no discurso que isto parece
ser algo admirável:51 pois em Matan Torá o povo
judeu estava no nível mais elevado possível e teve
revelação Divina do tipo mais elevado.52

(Somando-se ao fato de que mesmo antes de


Matan Torá houve revelações extremamente
elevadas — a revelação durante o êxodo do Egito
e especialmente durante a Abertura do Mar53 — a
revelação durante Matan Torá foi ainda maior.54)

Em contraste, durante os dias de Achashverosh,


o povo judeu estava no mais baixo dos níveis. Além
do ocultamento habitual que prevalece durante
qualquer período de exílio —

(Pois cada exílio é similar ao exílio egípcio;55


e assim como está escrito sobre este [o exílio
egípcio] “E não escutaram Moshé devido ao espírito
“curto” (partido) e trabalho árduo”,56 assim ocorre,
similarmente, em cada exílio — há vários desafios
para o cumprimento de Torá e mitsvot.57)
— naquela época (durante o decreto de Haman),
o ocultamento era ainda maior.58
No entanto, nos tempos de Matan Torá, quando
o povo judeu estava no nível mais alto possível,
havia apenas um início (começaram a observar),
enquanto durante o decreto de Haman, quando
estavam no mais baixo dos níveis, precisamente então
aceitaram o que haviam iniciado em Matan Torá.59
Autossacrifício
O Rebe explica que [este “fato admirável”,
dizendo que] durante o tempo de perseguição,
seu cumprimento de Torá e mitsvot exigia
autossacrifício.

(Além do fato de que demonstraram autossacrifício


em não negar [sua religião], D’us nos livre —
(conforme explicado em Torá Or , 60 que se
tivessem escolhido trocar sua fé, não seriam
prejudicados, uma vez que o decreto recaía somente
sobre judeus — no entanto, um pensamento externo
[ou seja, herege] nunca passou por sua mente, D’us
nos livre),

— demonstraram autossacrifício também para


cumprir Torá e mitsvot,61 até o ponto de promover
reuniões públicas para estudar a Torá com
autossacrifício.62)
E o despertar de seu autossacrifício foi causado
por Mordechai, o Judeu, o Moshé de sua geração.

Esta, então, é [a explicação de] e os judeus


aceitaram o que haviam começado a observar —
que em Matan Torá houve somente um começo e,
nos tempos do decreto de Haman houve a aceitação:
em consequência de seu verdadeiro autossacrifício
por Torá e mitsvot, ascenderam (neste assunto) a
um grau mais elevado do que o nível que estavam
durante Matan Torá. Por isso, precisamente então,
ocorreu a aceitação — e os judeus aceitaram.63
Alcançando a Luminária
Pode ser dito, aparentemente, que a interpretação
de triturado para a luminária — que através de
catit (quebrado e triturado) alcançamos a luminária
— é uma explicação do fato de que precisamente
durante a época de perseguição, alcançaram um
nível extremamente elevado de autossacrifício.64

Pois autossacrifício deriva da essência da alma,


que transcende revelação — a luminária (da qual a
luz é derivada). E pelo fato de eles estarem, então,
num estado de catit (quebrados e triturados), foi
revelada a essência da alma, a luminária.65

Porém, da sequência de ideias deste discurso,


onde a interpretação de triturado para a luminária
segue o assunto de Pastor da Fé, parece que o
conceito de triturado para a luminária também tem
relação ao fato de que Moshé alimenta e sustenta a
fé, levando-a a ser sentida conscientemente.66
5.

Isto pode ser explicado baseando-se no seguinte


conceito conhecido.67 Os judeus acreditam em
Divindade com uma simples fé, não necessitando
de provas, por duas razões:

Primeiro, porque “seu mazal a vê”.68 A [parte


da] alma que está nas Alturas vê Divindade (com
uma visão suprarracional), e isto leva [a parte da]
alma que está investida no corpo a acreditar em
Divindade.69

Outra explicação é pelo fato de que esta fé


origina-se da essência da alma (que transcende
o nível de “seu mazal a vê”).70 Pois a ligação da
essência da alma com Divindade é uma ligação inata
(que não depende de nenhuma causa, nem mesmo
da visão suprarracional).71
Pode-se dizer que uma das diferenças entre estas
duas explicações (ou dois níveis) é que a fé da [parte
da] alma que está ligada ao corpo que se origina da
visão da [parte da] alma que está ligada aos Céus, é
uma fé abstrata.72 Pois [a parte] da alma ligada aos
Céus transcende manifestação. Seu efeito sobre a
alma investida no corpo, é, portanto, abstrato.

Para internalizar a fé (pela [parte da] alma ligada


ao corpo) requere-se a revelação da ligação inata da
essência da alma [com Divindade]. Pois a essência
da alma é a essência da [parte da] alma ligada ao
corpo. Por isto, a fé da [parte da] alma ligada ao
corpo, quando inspirada pela essência da alma, é
sentida conscientemente.73
Quem Revela a Luminária
Baseado no que foi mencionado, podemos
explicar a ligação entre os conceitos citados no
discurso, onde o conceito de (triturado) para a
luminária segue a explicação do assunto de Pastor
da Fé:

Moshé alimenta e sustenta a fé, causando com


que seja sentida conscientemente, ao revelar a
essência da alma (que transcende [o nível de] “seu
mazal vê”) — a luminária (maior) que está acima
da luz (or).

[Porém,] a frase triturada para a luminária — que


o discurso interpreta que significa que alcança-se
a luminária através da “trituração” do exílio —
indica que a principal revelação da essência da
alma (luminária) ocorre através da experiência do
autossacrifício (que ocorre, principalmente durante
o exílio), conforme será explicado.74
6.

O conceito será explicado a seguir. O fato de a


fé do judeu ser tal que ele está pronto a sacrificar
sua vida por ela, origina-se (principalmente) da fé
inspirada pela essência da alma.

Pois a fé inspirada por sua visão (“seu mazal


vê”) — apesar de sua grande intensidade (conforme
conhecido de que a convicção inspirada pela visão é
extremamente potente75) — não o levará a sacrificar
sua vida por ela. Pois tal fé é baseada numa razão
(isto é, o fato de que ele vê) e não está ligada com
a essência de seu ser.

O fato de a fé do judeu ser tal, que ele está


pronto a sacrificar sua vida por ela, é pelo fato de
sua fé em Divindade ser sua essência. É, portanto,
absolutamente impossível ele negar [a existência
de D’us], D’us nos livre.76
Função do Pastor
Agora podemos esclarecer a afirmação do
discurso de que o conceito de Moshé ser um Pastor
de Fé (que alimenta e sustenta a fé de Israel) se
e aplica aos pastores de Israel em cada geração
(“a extensão de Moshé em cada geração”) — que
fortalecem a fé de Israel para que permaneçam
firmes, com autossacrifício, no cumprimento de
Torá e mitsvot.77

Parece que o alimentar e sustentar da fé por Moshé


(conforme explicado em várias fontes78 e inclusive
neste mesmo discurso79) consiste em conferir o
conhecimento (daat) de D’us a Israel, o que leva sua
fé a ser sentida conscientemente.80 [Em contraste,] o
fortalecimento da fé causado
pelos pastores de Israel de cada geração (conforme
explicado neste discurso81) consiste em causar com
que sua fé seja de autossacrifício.82 [Isto parece ser
inconsistente.]

Porém, baseando-se no conceito mencionado


[de que autossacrifício é inspirado pela essência
da alma], podemos dizer que a principal função do
Pastor da Fé é alimentar e sustentar a própria fé, de
tal forma que a fé não seja inspirada somente por
revelação (isto é, o fato de que a alma nas Alturas
vê Divindade), mas pela essência da alma.83

O fato de Moshé levar a fé a ser interiorizada (em


daat e entendimento) é resultado de ele alimentar e
sustentar a própria fé (atraindo e revelando a fé que
se origina na essência da alma). Conforme citamos
anteriormente (cap. 5) que interiorizar a fé (levá-la
à daat) ocorre através da revelação da ligação inata
da essência da alma [com Divindade].

Agora, a fé das gerações das quais foi exigido


autossacrifício concreto foi fortalecida pelos
pastores de Israel (“as extensões de Moshé”)
para que fosse uma fé que ditasse autossacrifício.
Podemos dizer que nestes líderes, o assunto de
Pastor da Fé (neste aspecto84) se manifestou de
forma superior do que no próprio Moshé.

Pois a extração e revelação da fé da essência da


alma (através de Moshé e suas extensões em cada
geração) manifesta-se, principalmente, através do
autossacrifício de forma concreta.85
7.

É bem conhecido que demonstração de


autossacrifício de forma concreta por Torá e mitsvot
por todos de Israel ocorreu durante [a história de]
Purim (durante o período do decreto de Haman).

O autossacrifício de Chanucá (durante o período


da perseguição Sírio-Grega) foi demonstrada
(principalmente) por Matityahu e seus filhos,
enquanto que, o autossacrifício que ocorreu durante
o período do decreto de Haman foi exposto por
todos de Israel.

De acordo com isto, podemos explicar a


afirmação do Midrash34 — citado no discurso86 —
de que Mordechai em sua geração era equivalente
a Moshé em sua geração. Apesar de que a extensão
de Moshé existe em cada geração, mesmo assim, o
Midrash afirma (especificamente) que Mordechai
em sua geração era equivalente a Moshé em sua
geração.
Moshé e Mordechai
Pode ser dito que uma das virtudes de Mordechai,
o judeu, era que (mesmo de forma revelada87) era o
Pastor da Fé de todo Israel em sua geração. [Desta
forma, Mordechai é] similar a Moshé, o Pastor de
Israel que conferiu daat para todo Israel de sua
geração, conforme é evidente também do fato de
que a geração de Moshé (todos de sua geração) é
chamada uma “geração com daat”.88

[A diferença é que, com Moshé, a revelação deste


conceito (de ele ser o Pastor da Fé de todo Israel)
ocorreu através dele conferir daat para todas as
pessoas de sua geração, enquanto com Mordechai,
este conceito foi revelado através dele revelar a
capacidade de autossacrifício em todas as pessoas
de sua geração.89]

Pode ser dito, que ao citar a afirmação do Midrash


de que Mordechai em sua geração equivalia a
Moshé em sua geração, o Rebe decretou
sobre si mesmo90, de que é o Pastor da Fé (de forma
revelada) de todas as pessoas de sua geração.91
8.

Agora podemos explicar a ligação (e ordem) dos


conceitos (no discurso92) ao esclarecer o versículo
E você ordenará...

Primeiro o Rebe interpreta E você ordenará


significando que Moshé conecta e liga o povo
de Israel (com a Luz Infinita) alimentando e
sustentando sua fé.93

Depois explica que os pastores de Israel de


cada geração (as extensões de Moshé) também
fortalecem a fé de Israel como Mordechai (o Moshé
de sua geração), que fortaleceu a fé de Israel para
permanecer firmes no estudo da Torá e cumprimento
das mitsvot.94

Depois, interpreta triturado para a luminária (do


versículo E você ordenará, que, aparentemente,
se refere ao próprio Moshé) significando que o
fato de Moshé revelar a luminária de Israel (a
essência da alma) ocorre, principalmente, através
de suas “extensões” durante os tempos de exílio
(“triturado”), que despertaram em Israel seu
potencial de autossacrifício, que leva à principal
revelação da essência da alma, luminária.95
Uma Questão
De acordo com o mencionado, o conceito de
triturado para a luminária está ligado com E você
ordenará o povo de Israel — com o fato que Moshé
e sua extensão em cada geração conectam e ligam
Israel com a Luz Infinita.

No entanto, o versículo, triturado para a luminária,


segue: e levarão para você azeite puro de oliva. E
o conceito de e levarão para você (isto é, Israel
levando azeite para Moshé) é que Israel acrescenta
luz em Moshé (conforme citado anteriormente no
discurso, cap. 2). Isto requer esclarecimento.96
9.

O versículo E os judeus aceitaram o que haviam


começado a observar97 fala (no sentido literal do
versículo) sobre o período que seguiu o milagre de
Purim.98

Agora, o Rebe escreve no discurso que as


palavras E os judeus aceitaram o que haviam
começado a observar significam que nos tempos
de Achashverosh, aceitaram o que haviam iniciado
em Matan Torá. Esta interpretação pode ser aplicada
ao sentido literal do versículo [também], que é E
[os judeus] aceitaram refere-se ao período que se
seguiu ao milagre.99

Consequentemente, o assunto de que nos dias de


Achashverosh aceitaram o que haviam começado
em Matan Torá , contém dois conceitos: a) a
aceitação através do autossacrifício sob perseguição
(conforme afirmado explicitamente neste discurso),
e b) sua aceitação durante o período que se seguiu
ao milagre de Purim, que é mais elevada do que sua
aceitação sob perseguição (conforme será explicado
a seguir).
De forma similar,100 pode ser dito que o conceito
triturado para a luminária — isto é, que alcança-se a
luminária através da experiência de [ser] “triturado”
durante o exílio — possui dois conceitos:

Primeiro, refere-se a quando Israel está num


estado de “triturado” devido aos decretos contra a
observância de Torá e mitsvot (como
estavam quando este discurso foi pronunciado101),
através dos quais alcançaram a luminária, por seu
autossacrifício.102

Segundo, triturados para a luminária significa


que mesmo quando o povo de Israel está num
estado de prosperidade, física e espiritual, porém
se encontra no exílio103 —

[que é similar a sua condição após o milagre de


Purim, quando Para os judeus havia luz e alegria,
contentamento e honra104 tanto no sentido literal
como no espiritual105 [além disto, mesmo a casa
de Haman foi dada para Ester,106 o que significa
que ocorreu então até a experiência sublime de
“transformação”107], no entanto, “somos ainda servos
de Achashverosh”108] estão quebrados e triturados
(catit) pelo fato de estarem no exílio. E através
de seu sentimento de “triturados” por estarem no
exílio,109 Israel alcança a luminária.
A Quebra do Exílio
O conceito é o seguinte: Israel está quebrado
pelo fato de estar no exílio (mesmo quando desfruta
prosperidade física e espiritual) pois o verdadeiro
desejo de cada judeu é a revelação Divina.110 Tanto
que esta (revelação Divina) toca-lhe até a essência
de seu ser.
Consequentemente, o fato de que durante o exílio
a revelação Divina não está presente como estava
durante a época do Templo (especialmente quando
o judeu considera a afirmação talmúdica111 “Todo
aquele que não presencia a reconstrução do Templo
em seus dias, é como se tivesse sido destruído em seus
dias”112) — isto em si deixa-o totalmente “triturado”.
Revelação Deficiente
Mesmo se estiver num nível extremamente
elevado, no qual a revelação Divina está aparente
para ele de forma comparável à revelação da época
do Templo,113 mesmo assim, a falta desta revelação
no mundo em geral indica que a revelação que
ele está experimentando, também é limitada.114

Pois quando a revelação da Luz Infinita brilha,


esta alcança todos os lugares. Se há algum lugar
(mesmo um canto remoto do mundo) onde a
revelação Divina não irradia, é porque a revelação
(mesmo no local onde ela sim irradia) é limitada.

(Esta ideia está expressa numa afirmação citada


num discurso115 do Alter Rebe,116 em nome do
Tikunim,117 que diz que se houvesse mesmo um
só Tsadic que voltasse numa teshuvá118 completa,
Mashiach teria
chegado em sua geração, pois teshuvá completa
atrai a revelação da Luz Infinita, e esta revelação
alcança todos os lugares.)

O fato de a revelação da Essência, a Luz Infinita


não estar aparente para ele, leva-o a ficar quebrado
e triturado — “catit”.

(Isto é similar ao assunto de que cholê —


palavra hebraica para uma pessoa doente — tem
o valor numérico equivalente a quarenta e nove.119
Significa que mesmo quando a pessoa alcançou os
Quarenta e Nove Portões de Biná, mas lhe falta o
Quinquagésimo Portão, está doente.120)

Similarmente, há uma afirmação conhecida do


Tsemach Tsedec,121 que escreveu122 que “podia se
escutar nosso mestre e professor (o Alter Rebe)
dizendo ‘Não quero absolutamente nada! Não quero
Seu Gan Éden, não quero Seu Mundo Vindouro —
não quero nada além do Senhor mesmo’”.123
E pelo fato de que esta afirmação foi escutada
do Alter Rebe (uma vez que a explicação de “podia
se escutar” é que ele não dizia isto somente em
ocasiões especiais, porém repetia-o constantemente)
— e especialmente depois que o Tsemach Tsedec
publicou isto — foi dado o potencial para cada
judeu particular ser alguém, cujo principal desejo
é a revelação da Essência.

Tanto que, na falta desta revelação — e certamente


no período do exílio, quando mesmo a revelação
(revelação de luz124) que irradiava nos tempos do
Templo está ausente — o judeu está num estado
de “triturado”, e pede três vezes por dia (ou mais)
“Permita nossos olhos ver como Você retorna para
Tsion com piedade”125 — referindo-se a um tempo
quando haverá revelação Divina, até a revelação
da Essência.

Este, então, é o significado de triturado para a


luminária. O sentimento de estar “triturado” por
se estar no exílio leva a pessoa à luminária. Pois
o desejo de todo judeu pela revelação Divina —
desejo de tal intensidade que afeta a essência de sua
existência (que é a razão pela qual ele está quebrado
e triturado (“catit”) pela ausência da revelação
Divina durante o exílio) — é uma expressão da
essência de sua alma, a luminária da alma, cuja
ligação com Divindade é inata.126
10.

Pode ser dito que a dimensão da luminária da


alma que se revela através do sentimento de estar
“triturado” por causa do exílio é mais elevada do
que a dimensão da luminária da alma que é revelada
através do autossacrifício.127

O conceito é o seguinte: uma das razões de que


em Matan Torá houve só o início (“começaram a
observar”) e de que nos dias de Achashverosh houve
uma aceitação (“e os judeus aceitaram”)128 é porque
quando disseram “faremos” antes de “ouviremos”
em Matan Torá, fizeram-no porque “D’us suspendeu
a montanha sobre eles como um tonel”129 — uma
revelação das Alturas.130 Em constraste, nos dias
de Achashverosh, sua aceitação [de D’us e se Sua
Torá] foi por sua própria vontade [na ausência da
revelação Divina].

Pode ser dito que a fé de Israel que deriva da


visão Divina da alma celestial (fé baseada numa
razão)131 é similar ao fato de terem precedido
“faremos” a “ouviremos” (em Matan Torá) por
causa de uma revelação das Alturas.132 Nos dias de
Achashverosh, em contraste, a aceitação veio por
iniciativa própria, pois, então, experimentaram a
revelação da ligação com Divindade que deriva da
essência da alma, uma ligação inata que se origina
da essência da sua existência.
Duas Dinâmicas
Mais especificamente, deve ser dito que mesmo
na revelação da essência da alma, existe (o paralelo)
destas duas dinâmicas:

Em relação à revelação da essência da alma


através da experiência
do autossacrifício,133 pode ser dito que em relação
às faculdades conscientes,134 a revelação da alma
é como uma presença adicional [estranha]. Como,
de fato, observamos, existiram muitas pessoas
que, quando viviam num lugar onde a observância
de Torá e mitsvot era proibida, demonstraram
autossacrifício de forma concreta por muitos anos.
No entanto, quando, posteriormente migraram para
países onde Torá e mitsvot podem ser cumpridas
sem limitações, o autossacrifício que possuíam
anteriormente não está (tão) aparente.

Isto porque a razão que os levou a permanecer


com autossacrifício por muitos anos é que
experimentaram a revelação da essência da alma
que transcende as faculdades conscientes, e,
[portanto,] não ocorreu uma mudança nas próprias
faculdades conscientes.135

(O fato de a essência da alma ser (também) a


essência das faculdades conscientes (conforme
citado no cap. 5) significa que a essência da alma
é sua essência, mas isto não se relaciona com a
natureza das próprias faculdades conscientes, com
seu caráter.136)
Em contraste, quando a essência da alma é
revelada por causa da quebra [dor] por estar no
exílio, suas faculdades conscientes (o caráter
de suas faculdades conscientes) estão como que
unidas137 com a essência.138
Agora, a razão que a essência da alma e o caráter
das faculdades são (como) duas coisas [separadas]
é porque mesmo a essência da alma é caracterizada
por uma certa categoria, e sua categoria transcende
o caráter das faculdades.139

Porém, sob perspectiva da essência da alma


conforme está enraizada na Essência [Divina], a
simplicidade da alma, abstração indefinida140 e o
caráter de suas faculdades, são todos um.141

Então, pode ser dito que o aspecto da luminária


da alma, que se revela através do autossacrifício,
é a essência da alma conforme caracterizada [e
limitada] pela realidade da abstração indefinida,
que transcende o caráter das faculdades.
Em contraste, a dimensão da luminária da alma que
é revelada através do sentimento de “triturado” por
estar no exílio, é a revelação da essência da alma
conforme está enraizada na Essência [Divina].142
11.

O mencionado pode ser ligado com a interpretação


do discurso143 sobre o versículo E você ordenará ao
povo de Israel e levarão para você azeite puro de
oliva... — que depois de Moshé ligar e conectar o
povo de Israel [com a Luz Infinita], então Israel
leva para Moshé “azeite de oliva...”, significando
que, através de seu serviço Divino, Israel acrescenta
revelação de luz no nível de Moshé.

Uma das explicações disto, relacionada com o


serviço Divino da pessoa é como segue: Que Moshé
“liga e conecta” o povo de Israel significa que ele
alimenta e sustenta sua fé de forma que sua fé não
é somente derivada das revelações da alma (isto é,
do fato que a [parte da] alma ligada às Alturas “vê”
Divindade), mas também é derivada da essência
da alma.

(Pode ser dito que este é o significado do


versículo E você ordenará (Tetsavê) ao povo de
Israel. Esta expressão implica que Moshé é Metsavê
(liga e une) o povo de Israel um com o outro,144 uma
vez que, sob a perspectiva da essência da alma, são
todos uma só entidade.145)

E através do serviço de Israel (depois de ter


recebido a revelação da essência da alma através de
Moshé) de alinhar suas faculdades conscientes (o
caráter de suas faculdades) com a essência da alma
— a essência da alma que foi atraída e revelada neles
por Moshé (“e levarão para você”) é enaltecida.
Pois, através deste processo, a verdadeira raiz da
alma, conforme está enraizada na Essência [Divina]
revela-se na alma.146

(Observe-se que, através disto, a unidade do


povo judeu também é enaltecida. Quando derivada
da revelação da essência da alma dentre deles, sua
unidade é como algo adicional à sua existência.
Consequentemente, esta união é adquirida
[somente] quando fazem suas almas como
“principal” e seus corpos, “secundários”.147

Mas através da revelação da essência da alma,


tal qual está enraizada na Essência [Divina]
— processo pelo qual o caráter das faculdades
conscientes também se tornam uma entidade só
com a essência — a unidade de Israel ocorre em
todos os seus assuntos, inclusive os relacionados
com o corpo.148)
Chama constante
De acordo com o acima mencionado, podemos
entender a afirmação do discurso149 que, através de
Israel enaltecer na estatura de Moshé (através de seu
serviço), haverá uma chama constante.150

Pareceria que a constância (isto é, igualdade


e regularidade) da chama da alma (“uma chama
Divina,151 a alma da pessoa”152) é devido à revelação
da essência da alma, que é atraída através de
Moshé (e você ordenará), uma vez que a essência
da alma não é suscetível a mudanças. Porém, o
discurso diz que o conceito de chama constante é
adquirido através de Israel enaltecer a estatura de
Moshé — e eles levarão para você.153 [Isto requer
esclarecimento.]
Noite e Dia
Pode ser dito que na revelação da essência da alma
de forma “de cima para baixo” através de e você
ordenará,154 há uma diferença entre noite e dia.155
A principal revelação [da essência da alma] ocorre
na presença dos ocultamentos (noite), condição que
desperta e revela o potencial de autossacrifício. E
conforme explicado anteriormente, (cap. 10) em
relação àqueles que agiram com autossacrifício
durante tempos de perseguição (noite), quando,
posteriormente, vieram a um lugar onde podiam se
ocupar de Torá e mitsvot confortavelmente (dia),
seu prévio autossacrifício não era mais detectado
neles.156

A verdadeira chama constante (que não é


suscetível a mudanças) ocorre através do serviço de
Israel — quando mesmo as faculdades conscientes
tornam-se uma só entidade com a essência da alma
— e levarão para você.

De acordo com o mencionado, podemos


explicar que triturado para a luminária aparece em
continuação a e eles levarão para você...,157 pois
triturado para a luminária inclui a ideia de que Israel
está quebrado e triturado (catit) por causa do exílio.
Este [sentimento] resulta do serviço de Israel em
assegurar que mesmo suas faculdades conscientes
estejam alinhadas com a essência da alma. E a
luminária da alma que se revela através deste
processo é a essência da alma da forma que está
enraizada na Essência [Divina]. Consequentemente,
triturado para a luminária aparece em continuação
a e eles levarão para você...158
12.

Agora, o significado (literal) de E você ordenará


ao povo de Israel e levarão para você... é que Moshé
ordenará ao povo de Israel para levarem para você...
Isto leva também à compreensão do significado
íntimo do versículo: Moshé conecta e liga o povo
de Israel de tal forma que lhes confere também o
potencial de realizar e levarão para você...159

De forma similar, em relação ao Moshé de nossa


geração, meu santo sogro, o Rebe, líder de nossa
geração: seus esforços em despertar e revelar a
fé da essência da alma em cada judeu particular
era tal que, posteriormente, eles deveriam servir a
D’us com suas próprias faculdades, até se tornarem
chamas constantes , que não são suscetíveis a
mudanças mesmo no que diz respeito às faculdades
conscientes.160

Através disto, mereceremos literalmente a


verdadeira e completa redenção, o tempo quando
a revelação Divina ocorrerá, mesmo por parte
dos níveis inferiores, quando o levar do azeite e
o acendimento das velas (e levarão para você...
para manter acesa uma chama constante) ocorrerá
mesmo no sentido físico, no Terceiro Templo
Sagrado, com a verdadeira e completa redenção,
através de nosso justo Mashiach — literalmente
em breve.

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