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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL:

INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO


VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

Elder P. Maia Alves

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

ABSTRACT

Este trabalho foi urdido por dois fios analíticos


complementares. De um lado, explora as interfaces
que envolvem as empresas culturais privadas, as
empresas não culturais, os profissionais da cultura, os
bancos comerciais privados, as instituições estatais
e os consumidores. Os interesses de tais agentes
delineiam o teor do binômio investimento cultural
público versus leis de incentivo em determinados
países. O segundo fio é a condição que torna
possível esse binômio e que o informa, concerne
à consolidação do capitalismo cultural-digital nas
sociedades contemporâneas.

2
ELDER P. MAIA ALVES

SUMÁRIO

Introdução 4

A RELAÇÃO ENTRE OS INVESTIMENTOS CULTURAIS 9


PÚBLICOS E AS LEIS DE INCENTIVO FISCAL NOS
MERCADOS CULTURAIS BRASILEIROS

OS MERCADOS CULTURAIS NA EUROPA: 32


RELAÇÃO ENTRE INVESTIMENTOS CULTURAIS
PÚBLICOS E LEIS DE INCENTIVO FISCAL

OS MERCADOS CULTURAIS NOS ESTADOS UNIDOS: 40


A RELAÇÃO ENTRE INVESTIMENTO CULTURAL
PÚBLICO E LEIS DE INCENTIVO FISCAIS

INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO E LEIS DE 49


INCENTIVO NOS MERCADOS CULTURAIS DO MÉXICO

Referências bibliográficas 53

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

O objeto deste trabalho diz respeito às relações entre os investimentos culturais públicos e as leis de incenti-
vo (ou modalidades semelhantes) em países como Brasil, Estados Unidos, México e as nações do continente
europeu. O desafio aqui assumido é capturar uma figuração (ELIAS, 1993) bastante ampliada com um arco
sociológico que abarca muitos processos, mas que guarda uma regularidade bastante clara: nas últimas duas
décadas ocorreu uma expansão acentuada dos mercados globais de bens, serviços e atividades simbólico-
-culturais. Tal expansão só foi possível em consequência da elevação dos investimentos culturais públicos
(ou do aumento dos investimentos públicos em cultura) e do crescimento dos gastos familiares com cultura.

Em 2012, o comércio internacional de serviços (capitaneado pelos serviços culturais digitais e os diversos
serviços a eles associados – turismo, lazer, publicidade e comunicação) correspondeu a 20% de todo o
comércio planetário, saindo de US$ 2 trilhões em 2003 para US$ 4,7 trilhões em 2012, o dobro do Produto
Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2015, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Os serviços
culturais consistem na criação, na produção, na distribuição, no licenciamento e no consumo dos conteúdos
artístico-culturais por meio de dispositivos com acesso à rede mundial de computadores. A crise financeira
global de 2008/2009 produziu uma retração generalizada na demanda por bens e serviços, o que corres-
pondeu a uma redução de 22,5% do comércio global em 2009. No entanto, a redução do fluxo de bens e
serviços culturais foi bem menor, 13,5%. Esse recuo interrompeu uma espiral de crescimento que, entre 2002
e 2008, acumulou uma expansão de 98% no fluxo global de exportações de bens e serviços culturais, com
um crescimento médio anual de 14%.

Os dados arrolados autorizam sustentar que, reunidos em torno de esferas distintas e complementares, os
bens e serviços culturais dão vida ao que definimos como capitalismo cultural-digital. Resultado de uma
paulatina e regular aproximação entre o domínio estético-expressivo e o domínio econômico-comercial, o
capitalismo cultural ganhou pujança após o fim da Segunda Guerra Mundial, mas foi no decurso dos anos
1990 e 2000, com a expansão da rede mundial de computadores, que a sua face digital se consolidou, plas-
mando um amálgama indissociável entre arte, tecnologia, cultura, entretenimento e inovação. O capitalis-
mo cultural corresponde a uma configuração simbólico-material bastante ampliada e assimétrica; nos seus
contornos repousam diversos mercados culturais. No interior dos mercados culturais dos diversos países se
evidenciam com bastante clareza as especificidades das relações entre os investimentos culturais públicos e
as leis de incentivos à cultura.

Os mercados culturais são formados por seis agentes principais: 1) empresas culturais privadas – organiza-
ções de pequeno, médio e grande porte especializadas na criação, na produção, na distribuição e na comer-
cialização de conteúdos artístico-culturais: filmes, séries, telenovelas, músicas, livros, peças teatrais, esculturas,
games, artesanatos, pintura, espetáculos de dança, arquitetura, design, moda etc.; 2) empresas não culturais
– corporações que atuam nos mais diferentes setores econômicos e compram conteúdos artístico-culturais

4
ELDER P. MAIA ALVES

junto aos profissionais criativos e às empresas especializadas, por meio de recursos financeiros próprios, atra-
vés das leis de incentivo e/ou renúncia fiscal, doações ou modalidades homólogas; 3) profissionais criativos
e trabalhadores da cultura, artistas e criadores que atuam nas mais diferentes linguagens, práticas estéticas
e redes de criação, aprendizado e colaboração; a maior parte desse contingente trabalha com as grandes
corporações culturais (estúdios, produtoras, gravadoras, sites especializados, editoras, canais de televisão,
serviços de curadoria etc.); 4) bancos comerciais privados – organizações financeiras que emprestam re-
cursos financeiros às empresas culturais privadas; 5) instituições vinculadas às estruturas administrativas dos
estados nacionais – organizações que formulam e executam políticas culturais que cada vez mais destinam
recursos financeiros, técnicos e políticos à dinamização dos arranjos produtivos culturais, à incubação de
empresas culturais e ao empreendedorismo cultural; 6) consumidores – concerne ao consumo cultural das
famílias, à parcela do orçamento destinado à fruição dos bens, dos serviços e das atividades culturais-digitais,
cuja regularidade tem como principais variáveis a renda, a escolaridade e as experiências intersubjetivas de
consecução das sensibilidades e da construção social do gosto.

figura 1: principais agentes dos mercados culturais nacionais


figura 1: principais agentes dos mercados culturais nacionais

1 4
Empresas culturais privadas Bancos comerciais privados

a. Políticas culturais
6 5
Consumidores Instituições estatais
(famílias e indivíduos)
b. Políticas econômico-culturais

c. Bancos públicos ou similares

d. OSs, OSCIPs e similares


3 2
Profissionais trabalhadores Empresas não culturais
da cultura (públicas e privadas)
e. Leis de incentivo ou similares

Fonte: elaboração do autor

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

As relações entre os investimentos culturais públicos e as leis de incentivo à cultura em um dado país ocor-
rem a partir da trama que os agentes da figura 1 mantêm entre si. Diferentemente do que sustentam as
análises convencionais da ciência econômica, o Estado – por meio de diversas organizações e instituições
– é um agente central da estrutura dos mercados, um agente que atua e define parte dos contornos dos
mercados, assim como o fazem empresas, bancos, consumidores e profissionais/criadores. Os mercados
culturais são compostos de redes relacionais tecidas por agentes que esposam interesses variados (eco-
nômicos, estéticos, profissionais, políticos etc.), e não por entidades abstratas e opacas, como sugerem a
ciência econômica e as análises que lhes são tributárias, com suas referências ao mercado como se este
fosse um indivíduo dotado de humores, idiossincrasias e oscilações emocionais.

Os seis agentes reunidos na figura 1 praticam racionalidades distintas e não apenas uma racionalidade de tipo
econômico-empresarial, aquela que a ciência econômica clássica e neoclássica atribui a um suposto apetite
humano universal animado pela obtenção do lucro. Não acreditamos nesse postulado ontológico, mas, sim,
na construção de interesses e racionalidades econômicas que resultam na definição de modelos de negócio
e novos padrões de ação econômica, ambos derivados de aprendizados e competências socialmente incor-
poradas e manuseadas. Essa é claramente a prática das empresas culturais privadas, algumas delas, como as
empresas norte-americanas, conglomerados globais de cultura e entretenimento. A expansão das empresas
culturais especializadas em diversos países do mundo evidencia a adoção de novos modelos de negócio
e o aumento dos investimentos culturais públicos. Os demais agentes da figura 1 praticam racionalidades
e interesses diferentes das empresas culturais privadas. As organizações estatais, especialmente, formulam
políticas, projetos e ações que concorrem, direta e indiretamente, para a expansão dos mercados culturais. É
frágil, portanto, a ideia de que de um lado está o mercado (as empresas) e do outro o Estado com seus órgãos
de cobrança de impostos, instituições de fomento, agências de regulação etc. Para evitar tal armadilha, lan-
çamos mão do conceito de agentes estatais de mercado (AEM), categoria da qual temos feito uso sistemá-
tico e recorrente para compreender o capitalismo cultural-digital. Essa visada teórico-metodológica permite
escapar de noções simplistas, como a de intervenção público-estatal e a de externalidade. São construções
frequentemente utilizadas, mas inteiramente insuficientes para descrever e explicar os mercados culturais e,
por conseguinte, as relações entre investimentos culturais públicos e leis de incentivo.

As instituições governamentais diretamente ligadas aos estados nacionais estão no centro do capitalismo
cultural-digital. Nos últimos 15 anos, a competição entre as empresas culturais privadas, no âmbito dos
mercados nacionais e globais, acentuou-se bastante. Parcela do crescimento dessas corporações e o recru-
descimento da competição se devem em larga medida aos novos estímulos estatais, como empréstimos
subvencionados às empresas culturais privadas, juros subsidiados, regimes tributários específicos, apoio
técnico especializado, estímulos ao consumo e programas direcionados à profissionalização criativa e ao
empreendedorismo cultural. Pela primeira vez na história do capitalismo, de modo regular e inequívoco,

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ELDER P. MAIA ALVES

os mais poderosos estados nacionais do planeta têm escolhido os setores artísticos, culturais, de entreteni-
mento, comunicação e lazer como parte constitutiva de suas principais políticas econômicas e estratégias
de desenvolvimento.

O investimento cultural público diz respeito aos recursos financeiros, técnicos e operacionais envolvidos na
elaboração e execução das políticas culturais públicas. São, portanto, recursos que estão sujeitos aos sistemas
estatais e jurídicos de controle e obedecem ao processo decisório de instâncias políticas e organizações da
sociedade civil. Em geral, possuem dois grandes objetivos: 1) promover o acesso à cultura (principalmente
local e nacional), contribuindo para a realização dos direitos culturais; 2) financiar a competitividade, os pro-
cessos de inovação e expansão das pequenas, médias e grandes empresas culturais. Já os incentivos fiscais
são modalidades (na forma de créditos fiscais, renúncia fiscal ou doações) que o poder público instituiu para
que empresas (pessoas jurídicas) das mais diferentes atividades econômicas e indivíduos (pessoas físicas)
participem do apoio e do financiamento dos conteúdos e das atividades artístico-culturais.

As diversas modalidades, combinações e ramificações financeiras e jurídicas existentes no Brasil, no Méxi-


co, na Europa e nos Estados Unidos permitem sustentar que o investimento cultural público é composto de
duas grandes dimensões: 1) políticas culturais e 2) empréstimos financeiros realizados por bancos públicos
e/ou bancos nacionais de desenvolvimento. No que tange à primeira dimensão, podemos dividi-la em
dois eixos: 1. a) políticas culturais; 1. b) políticas econômico-culturais. Esta última corresponde à relevância
assumida pelas políticas que buscam dinamizar os arranjos e as cadeias produtivas de cultura, o apoio à
incubação, à aceleração das micro e pequenas empresas culturais, ao empreendedorismo cultural e à cons-
trução dos chamados distritos criativos. São ações, projetos e programas executados sob os auspícios de
uma nova gramática conceitual, política e institucional, que tem no conceito/tema de economia criativa o
seu centro irradiador. Os dois eixos (políticas culturais e políticas econômico-culturais) abarcam uma gran-
de diversidade de formatos de financiamento das políticas culturais públicas: a) recursos para as políticas
culturais locais, regionais e nacionais, previamente aprovadas e destinadas aos órgãos da administração
cultural pública (secretarias, ministérios, conselhos, departamentos, agências etc.); b) consecução de fun-
dos públicos descentralizados e setoriais (teatro, museus, artes visuais, patrimônio, audiovisual etc.), que
recebem recursos de outros setores governamentais (educação, comunicação e turismo); c) fundos públi-
cos e setoriais decorrentes dos impostos arrecadados junto às loterias; d) fundações governamentais e/ou
Organizações Sociais (OSs) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips), criadas, na
maioria dos casos, para gerir equipamentos culturais públicos (museus, teatros, centros culturais, galerias,
entre outros), que recebem recursos governamentais de empresas públicas (de diferentes setores econô-
micos) e também doações de pessoas físicas e jurídicas.

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

tabela 1: composição do investimento cultural público no âmbito dos principais mercados culturais
nacionais e globais
tabela 1: composição do investimento cultural público no âmbito dos principa is mercados culturais nacionais e globais

NATUREZA DIMENSÕES EIXOS FONTES DE FINANCIAMENTO


tabela 1: composição do investimento cultural público no âmbito dos principa is mercados culturais nacionais e globais

Políticas culturais (I)


Recuperação e preservação do
patrimônio (material e imaterial)
Promoção da diversidade cultural Orçamentos repassados aos órgãos
Valorização da identidade nacional, da administração cultural direta
regional e local
Fundos públicos setoriais, compos-
Manutenção dos equipamos tos de parcelas dos orçamentos de
culturais públicos ou semipúblicos outros setores governamentais
Estímulo e apoio à criação
de conteúdos Fundos públicos, constituídos com
recursos das loterias
Manutenção dos grupos, coletivos
e companhias artísticas Fundações públicas ou semipúblicas
Políticas culturais gerenciando recursos dos diferentes
níveis de governo
Políticas econômico-culturais (II)
Investimento Recursos estatais, doações
cultural público Incubação de micro e pequenas individuais e empresariais para as
empresas nas cadeias produtivas Organizações Sociais
e nos territórios criativos (OSs) e Organizações da
Crédito e estímulo ao Sociedade Civil de Interesse
consumo cultural Público (Oscips)

Estímulo à profissionalização
criativa e ao empreendedorismo
cultural
Apoio à criação de novos modelos
de negócio, capacitação empresarial

Crescimento das grandes


empresas e corporações Ativos dos bancos comerciais
Empréstimos às
culturais, expansão dos públicos e/ou dos bancos
empresas culturais
empregos culturais e das nacionais ou continentais de
privadas
atividades criativas desenvolvimento

Fonte: IBGE
Fonte: elaboração do autor

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ELDER P. MAIA ALVES

A RELAÇÃO ENTRE OS INVESTIMENTOS CULTURAIS


PÚBLICOS E AS LEIS DE INCENTIVO FISCAL NOS MER-
CADOS CULTURAIS BRASILEIROS
A figura 1 e a tabela 1 trazem os principais aspectos para se descrever as relações entre o investimento
cultural público e as leis de incentivo fiscal no Brasil. No que tange às políticas culturais (primeira dimen-
são do investimento cultural público), os orçamentos estatais destinados aos órgãos que as elaboram e
executam têm aumentado constantemente, assim como a sua institucionalidade. Em 2003, o sistema
federal de cultura – que abarca o Ministério da Cultura (MinC) e seus órgãos vinculados – dispunha de
um orçamento de R$ 260 milhões. Em 2013 esse mesmo orçamento alcançou a soma de R$ 2,35 bilhões,
um crescimento de cerca de 900%. Em 2003, a União respondia por apenas 10,8% de todos os recursos
públicos destinados à rubrica cultura, ficando os municípios com 54,2% e os estados com 35,0%. Dez
anos depois, em 2013, esses porcentuais se alteraram para 29,9%, 46,2% e 23,9%, respectivamente. Com
efeito, em 2013, dos R$ 7,87 bilhões do orçamento estatal destinado à cultura, a União respondeu por R$
2,35 bilhões, os municípios por R$ 3,64 bilhões e os estados por R$ 1,88 bilhão (SANTI, 2015). Embora a
média da execução orçamentária do sistema federal de cultura (capitaneado pelo MinC) seja uma das
mais baixas de toda a esfera federal, com execução real média de 60% do orçamento autorizado no início
de cada exercício, ainda assim o crescimento entre 2003 e 2013 foi bastante expressivo. De acordo com o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2014, das 27 unidades federativas, 21 mantinham
secretarias exclusivas para a cultura, sendo que 24 possuíam fundos estaduais exclusivos para o financia-
mento das ações culturais. Já no âmbito municipal, em 2006, apenas 4,3% dos municípios brasileiros (236)
possuíam secretarias exclusivas para a cultura. Em 2014 esse porcentual subiu para 20,4% (1.074 municí-
pios). Em 2006, apenas 5,1% dos municípios brasileiros (285) possuíam um fundo público exclusivo para a
cultura. Em 2014 esse número saltou para 19,9% (1.111).

Nos últimos cinco anos, foram as políticas econômico-culturais (no Brasil e no mundo) as que mais con-
quistaram espaços institucionais e legitimação política no âmbito dos orçamentos dos órgãos executivos da
administração cultural pública. Em 2014, do total dos 27 estados brasileiros (incluindo o Distrito Federal), 14
afirmaram desenvolver ações com o objetivo de integrar a cultura ao desenvolvimento local. Em 2006, essas
ações foram muito pouco citadas. Quanto aos municípios, 32,5% assinalaram realizar ações buscando essa
integração entre cultura e desenvolvimento local.

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

gráfico 1: 1:
gráfico porcentual de municípios
porcentual que desenvolveram
de municípios ações ou programas
que desenvolveram paraou
ações a produção cultural
programas localaautossustentável
para produção cul-
tural local autossustentável

A gestão desenvolve programa ou


ação para a produção cultura local 26,9
autossustentável

Articulação e estímulo ao fomernto


de empreendimentos criativos 13,8

Formação, capacitação, qualificação


ou educação para competências 13,3
criativas

Criação, produção, circulação ou


distribuição de bens e serviços 8,8
criativos

Atendimento e suporte técnico a


profissionais e a empreendimentos 8,7
criativos

Consumo ou uso de bens e serviços


criativos 8,3

Criação ou adequação de marcos


legais para setores criativos 3,2

Fonte:IBGE
Fonte: IBGE 0 5 10 15 20 25 30 %

No âmbito federal, vale destacar três programas que se inscrevem no eixo das políticas econômico-culturais:
Programa Rede Incubadoras Brasil Criativo, Programa de Cultura do Trabalhador (vale-cultura) e Programa
de Aceleração do Crescimento das Cidades Históricas (PAC Cidades Históricas). O primeiro programa
foi criado em 2012, no âmbito da antiga Secretaria de Economia Criativa do MinC, com objetivo de instalar
centros estaduais de apoio ao empreendedorismo criativo e à criação de empresas culturais, que, na maioria
dos casos, necessitam de assessoria jurídica, contábil, comercial e de marketing. Em parceria com os gover-
nos estaduais, as secretarias municipais e estaduais de cultura, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal,
as universidades públicas e o Sistema S, foram implementados 13 centros de incubação de empresas, centros
que oferecem cursos, formação continuada e balcões de crédito. Com recursos de R$ 40 milhões, até 2016
a Rede Brasil Criativo estava presente no Distrito Federal e em 12 estados (Acre, Bahia, Rio Grande do
Sul, Rio Grande do Norte, Ceará, Pará, Rio de Janeiro, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco e

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ELDER P. MAIA ALVES

Paraná). A consequência prática do programa tem sido a criação de competências empresariais e disposi-
ções empreendedoras, locais e regionais, capazes de desenhar novos modelos de negócios e materializar
a formalização dos microempreendedores individuais da cultura (MEI da cultura) e das micro e pequenas
empresas culturais, ou seja, ações direcionadas para o primeiro agente destacado na figura 1.

Já o Programa de Cultura do Trabalhador (vale-cultura) é uma política econômico-cultural destinada ao


financiamento do consumo cultural das famílias. Criado em 2013, o programa funciona por meio de um
cartão magnético pré-pago, no valor máximo de R$ 50,00, que os trabalhadores celetistas (regidos pela
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho) de empresas públicas e privadas têm direito mensalmente. O
recurso é cumulativo, não possui validade e pode ser utilizado pelo titular (trabalhador cadastrado) ou por
pessoas e familiares que portarem o cartão. O vale-cultura pode ser utilizado para a aquisição de 26 produ-
tos e serviços. Para que o trabalhador tenha direito ao vale, a empresa à qual está vinculado necessita aderir
ao programa, cadastrando-se no sistema do MinC. Ao realizar a adesão ao programa, as empresas devem
priorizar os trabalhadores que recebem até no máximo cinco salários mínimos. Em contrapartida, o governo
federal isenta as empresas dos encargos trabalhistas que incidem sobre o valor do benefício.

Para os trabalhadores que recebem até cinco salários, fica a cargo da empresa a opção de realizar o desconto de até
no máximo 10% do valor recebido. O trabalhador que ganha até um salário paga R$ 1,00. Acima de um e até dois
salários, o desconto é de R$ 2,00. Acima de dois e até três salários, R$ 3,00. Acima de três e até quatro salários, R$
4,00. Acima de quatro e até cinco salários, R$ 5,00. Acima de cinco salários, o desconto é compulsório e varia entre
20% e 90% do valor do benefício, ou seja, pode chegar a R$ 45,00. Três anos após a implementação do programa,
aproximadamente 485 mil trabalhadores passaram a fazer uso sistemático do vale, tendo sido cadastradas cerca de
1,3 mil empresas dos mais diversos segmentos econômicos. Essa extensão, de acordo com o MinC, alcançou 16%
da meta do programa – estabelecida no Plano Nacional de Cultura (PNC) –, que pretende abarcar 3 milhões de
trabalhadores até 2020. Em 2014 correspondia a 7,5% da soma total de trabalhadores celetistas que ganhavam até
cinco salários mínimos, ou seja, cerca de 40 milhões de trabalhadores. De acordo com o MinC, uma vez alcançados
3 milhões de cadastrados, o vale-cultura injetará por ano cerca de 2 bilhões de reais nas cadeias e elos econômico-
-culturais nos quais atuam as empresas culturais.

Pela primeira vez, o pêndulo do financiamento se deslocou em direção ao consumo. Não por acaso, o vale-cultura
logo se tornou interessante para as principais corporações de cultura, como as grandes editoras, livrarias (megas-
tores), redes de exibição de cinemas, produtoras e distribuidoras de audiovisual. As empresas culturais privadas
especializadas são chamadas de empresas beneficiárias e também necessitam se cadastrar junto ao sistema do
MinC, assinalando que aceitam o uso do vale nos seus estabelecimentos. Até o início de 2016, os mais de 480 mil
trabalhadores que utilizaram o vale consumiram cerca de R$ 265 milhões em bens, serviços e atividades culturais.
Desse montante, 65,7% foram utilizados em produtos de leitura, notadamente livros; logo em seguida figura a

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

compra de ingressos para cinemas, com 21,5% do total (MinC, 2016). Em grande medida, essa supremacia do uso
do vale-cultura para aquisição de livros se deve ao forte engajamento dos sindicatos empresariais vinculados ao
setor, como a Câmara Brasileira do Livro (CBL) e o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), que desde o
início do programa adotaram técnicas de marketing específicas, mobilizaram seus membros e principalmente an-
teviram uma grande oportunidade comercial. Com efeito, o vale-cultura faz estreitar as interfaces entre as empre-
sas culturais e o consumo cultural das famílias, respectivamente, os agentes 1 e 6 dos mercados culturais. Portanto,
mais do que um programa destinado à criação de um novo direito, é um programa de investimento.

Em 2016 foram publicados os principais resultados da última versão da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil
(2015). Alardeou-se que 44% dos brasileiros não leem e 30% nunca compraram um único livro. Pouco se enfa-
tizou, no entanto, a metodologia da pesquisa. A pergunta central do questionário que ela aplicou se referiu aos
últimos três meses. Em 2011 (penúltima edição da pesquisa) foram 50% aqueles que não haviam lido um livro
nos últimos três meses. Na Europa, por exemplo, a pergunta se refere aos últimos 12 meses. Mesmo diante da
dilatação do tempo, parece inverossímil que, segundo a União Europeia (UE), em 2013, 32% dos europeus não
tenham lido nem sequer um único livro nos 12 meses anteriores – isso no continente mais escolarizado do pla-
neta e com expressivos investimentos em educação. Ancorada na elevação dos gastos das famílias brasileiras
com cultura, as práticas de leitura e o consumo de livro têm apresentado índices constantes de crescimento.
Esse processo se revela, por exemplo, na robusta elevação dos títulos lançados, nos exemplares vendidos e no
crescimento contundente do faturamento das editoras. Em 2003, foram lançados no Brasil 35.590 novos títulos,
já em 2013 foram lançados 62.235 (crescimento de 75% em dez anos). Em 2003, foram vendidos 256 mil exem-
plares, ao passo que em 2013 foram 480 mil (crescimento de 87%). Por fim, em 2003, o faturamento total das
editoras brasileiras foi de R$ 2,36 bilhões, em 2013 esse faturamento saltou para R$ 5,36 bilhões (crescimento
de 125%). Mesmo descontada a inflação oficial acumulada no período (58,2%), o faturamento das editoras
brasileiras obteve uma elevação de 66,8% entre 2003 e 2013. Ainda na pesquisa divulgada em 2016, um aspec-
to decisivo passou praticamente incólume. Em 2011, 53% dos leitores entre 18 e 24 anos de idade leram pelo
menos um livro nos últimos três meses, já em 2016 esse porcentual subiu para 67%. Significa dizer que, na faixa
etária entre 18 e 24 anos, ocorreu um crescimento de 27% do total de leitores em apenas quatro anos.

O programa PAC Cidades Históricas tem efeitos práticos semelhantes aos dois primeiros mencionados, só
que desta feita para um grupo de empresas mais amplo, que abarca setores como os de restaurante, bares,
hospedagem, transporte e agências de viagens. Com o objetivo de estender as ações do PAC, criado em
2007, o Ministério do Planejamento autorizou que em 2013 fosse criada uma linha de financiamento exclusiva
para os sítios históricos supervisionados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan),
vinculado ao MinC. Sob a tutela do Iphan, o programa passou a contar com recursos regulares da Caixa Eco-
nômica Federal da ordem de R$ 1,6 bilhão, destinado à recuperação e à restauração de 425 edifícios e espaços
públicos espraiados por 44 cidades e 20 estados.

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ELDER P. MAIA ALVES

O programa é caudatário da expansão do turismo cultural e dos interesses de extensas redes empresariais e
governamentais existentes nas principais cidades históricas brasileiras. No Brasil, sobretudo nos últimos dez anos,
ocorreu uma expansão generalizada dos eventos e atividades de cunho artístico-cultural no âmbito dos municí-
pios. Apenas no que diz respeito a festas, feiras, jornadas, salões e encontros literários, de 2013 a 2014 houve um
crescimento de 26%, saindo de 257 eventos, em 2013, para 320, em 2014. Assim como nos festivais de cinema e
música, a maioria desses eventos acontece nos médios e pequenos municípios e são organizados para reforçar
as estratégias simbólicas e econômicas que os municípios adotam com vistas a atrair um fluxo cada vez maior de
turistas e a dinamizar suas cadeias de serviços: bares, restaurantes, hotéis, pousadas, transporte etc. Vale ressaltar
ainda que muitos desses municípios, em parceria com as empresas patrocinadoras, recorrem à Lei Rouanet, que
também tem sido muito utilizada como fonte de financiamento para a consecução de tais eventos.

gráfico 2: porcentual de municípios com a existência de ações ou programas para a implementação


gráfico 2: porcentual de municípios com a existência de ações ou programas
do turismo cultural: 2006/2014
para a implementação do turismo cultural: 2006/2014 Fonte: IBGE

70

26,9
60 61

50

40 41,4

30

26,2 26,2
20 23,5

15,2 16,6
10

5,1
0
Desenvolve programa ou Formação de guias Calendário de festividades Divulgação de atrações
% ação de promoção do e roteiros e/ou evento
turismo cultural

Fonte: IBGE 2006 2014

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

Uma miríade de políticas econômico-culturais poderia ser aqui arrolada, como as ações executadas pelo Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial
(Inpi) e pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), além da atuação das em-
presas municipais públicas de audiovisual, como a Riofilme e a recém-criada SP Filmes. Essas organizações esta-
tais (ou com fortes vínculos estatais) atuam, direta ou indiretamente, como agentes estatais de mercado (AEM),
porquanto, como se viu, buscam dinamizar as cadeias de negócios e os elos econômicos nos quais atuam deter-
minadas empresas culturais e não culturais. Foi, no entanto, a segunda dimensão do investimento cultural público
(tabela 1) a que mais cresceu no Brasil. Por meio dos bancos públicos controlados pela União, as pequenas,
médias e grandes empresas de cultura obtêm empréstimos subsidiados com taxas de juros inferiores e redução
das garantias bancárias. Como demonstra a tabela 2, os principais bancos federais figuram nessa condição, mas a
atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) se torna aqui heurística.

tabela 2: investimento cultural público – segunda dimensão

NATUREZA INSTITUIÇÕES AÇÕES


tabela 1: composição do investimento cultural público no âmbito dos principa is mercados culturais nacionais e globais

BNDES Procult – Empréstimos para as empresas culturais em geral

BNDES Prodesign – Empresas da cadeia de criação do design

Empresas de criação de conteúdos audiovisuais nacionais


Empréstimos
financeiros às
empresas culturais
Fundo Setorial do Empresas de produção de conteúdos audiovisuais nacionais
privadas
Audiovial (FSA) – BNDES
e Banco Regional de
Desenvolvimento do
Empresas distribuidoras de conteúdos audiovisuais nacionais
Extremo Sul

Empresas exibidoras de conteúdos audiovisuais nacionais

Banco do Brasil
Caixa Econômica Federal Empréstimos para as empresas culturais em geral

Fonte: elaboração própria


Fonte: elaboração do autor

14
ELDER P. MAIA ALVES

A partir de 2006 o sistema BNDES passou a financiar, de maneira mais coordenada e direcionada, as empre-
sas culturais; notadamente as grandes corporações. Essa decisão marcou o início de uma progressiva mudança
financeira e institucional no âmbito do sistema BNDES. Paulatinamente, essa instituição deixou de ser apenas
uma empresa federal, que atuava junto à esfera simbólico-cultural para promover a sua marca, lançando mão
das leis federais de incentivo à cultura, como a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual, para se tornar o principal
agente público de financiamento das empresas de cultura. Essa mudança constitui um divisor de águas entre o
investimento cultural público e as leis de incentivo à cultura no Brasil. Em 2006, o banco criou o Departamento
de Economia da Cultura (Decult), hoje Departamento de Cultura, Entretenimento e Turismo. A partir de então,
o sistema BNDES passou a direcionar parte de suas ações para as empresas culturais privadas. Seu sistema é
formado por uma complexa e dinâmica rede financeira. Com efeito, o banco é uma das maiores instituições
financeiras do mundo, possuindo cerca de US$ 330 bilhões de ativos em 2010, superando, por exemplo, o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco de Desenvolvimento da Coreia. Entre 2007 e 2014, o de-
sembolso do BNDES foi da ordem de R$ 2.266,4 trilhões. Durante esse mesmo período, o desembolso para as
micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) saiu de 38% em 2007 para 48% em 2014. Mesmo em face desse
crescimento, entre 1995 e 2014, 62,6% do somatório geral do desembolso do banco foi para as grandes empresas,
ficando as micro com 15,3%, as pequenas com 8,5%, as médias com 7,9% e as médias/grandes com 5,7%.

A figura 2 opera como um guia para compreender os blocos de ações que o sistema BNDES desenvolve
junto às empresas culturais privadas. A primeira ação diz respeito ao Prodesign – Programa BNDES de Apoio
a Investimentos em Design, Moda e Fortalecimento de Marcas. Criado em 2010, ele foi renovado e ampliado
em 2013, recebendo a dotação orçamentária de R$ 1 bilhão. A segunda ação diz respeito ao Procult – Progra-
ma BNDES de Desenvolvimento da Economia da Cultura. Criado em 2006, ele passou a integrar as ações
financeiras destinadas às empresas culturais, que antes estavam pulverizadas no interior do sistema BNDES.
O Procult passou por três fases distintas. A primeira, entre 2006 e 2009, teve como ênfase as empresas de au-
diovisual, especialmente os grupos de produção e exibição, cujo nome oficial era Programa de Apoio à Cadeia
Produtiva do Audiovisual. Já a segunda fase, compreendendo o período de 2009 a 2013, ampliou as cadeias
produtivas que poderiam obter financiamento, incluindo a disponibilização de recursos para as empresas que
atuam nos setores editoriais, de jogos eletrônicos, fonográfico e de patrimônio histórico. Na terceira fase, que
se estende de 2013 a 2017, o novo Procult recebeu a dotação orçamentária de R$ 2 bilhões, cerca de 30% a mais
do que na versão anterior. O novo programa dispõe de recursos e faixas de financiamento para os projetos
considerados inovadores, especialmente aqueles apresentados pelas MPMEs, que também passaram a acessar
as taxas de juros de longo prazo (TJLP). Para as MPMEs culturais com projetos considerados inovadores, o
BNDES passou a dispensar a cobrança da taxa de remuneração básica e também a isentar essas empresas com
projetos inovadoras da cobrança da taxa de risco de crédito, o chamado spread de risco. Além disso, dilatou o
financiamento para as empresas desse perfil em até 90% do valor dos projetos. Para o caso das grandes empre-
sas, o banco financia até 60% do projeto aprovado.

15
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

figura 2: modalidades de participação financeira do BNDES no interior dos mercados culturais

SISTEMA BNDES

Prodesign Procult Gestor financeiro Programa Cinema Participação Patrocínio


do FSA Perto de você (FSA) acionária minoritária e incentivo

Empréstimo às Empréstimo às
empresas de Lei Rouanet
empresas de Cadastro e parcerias Empréstimo à cadeia Compra de ações
design e Lei do
cultura com outros bancos produtiva do audiovisual de empresas
Audiovisual

Produtos financeiros Juros específicos Juros específicos


convencionais – Frente 1

BNDES automático

Cartão BNDES

Finem*

Fonte: elaboração própria - * O BNDES Finem é o produto do BNDES voltado para financiamento de empreendimentos
Fonte: elaboração do autor. * O BNDES Finem é o produto do BNDES voltado para financiamento de empreendimentos

Com a consolidação das ações do Procult, do Prodesign e das demais ações no âmbito do sistema BNDES,
as leis de incentivo foram sendo deslocadas. A rigor, até 2006, a figura 2 restringia-se ao seu último bloco:
patrocínio e incentivo. Durante cerca de dez anos, entre 1995 e 2005, a ênfase do BNDES na esfera cultural
foi dada às atividades de patrocínio realizadas nas sedes da instituição ou por meio da atuação da marca em
festivais de música, literatura e audiovisual. Como empresa federal pública, o BNDES utilizou as leis federais
de incentivo para promover a sua marca institucional e corporativa. É preciso ficar claro que esse aspecto
permanece e até se fortaleceu. Em 2015, por exemplo, por meio do patrocínio, o BNDES ocupou a primeira
colocação junto à Lei Rouanet (R$ 56 milhões). No entanto, como busca demonstrar a figura 2, de maior
patrocinador, o BNDES se tornou o principal agente de crédito para as empresas culturais brasileiras e logo
assumiu a dianteira do investimento cultural público.

16
ELDER P. MAIA ALVES

tabela 3: desembolso do BNDES para as empresas de arte, cultura, entretenimento, informação e


comunicação 2004/2014:

ANO VALOR (em milhões de R$)

2004 65,1

2005 146,5

2006 133,5

2007 496,2

2008 621,8

2009 417,5

2010 720,6

2011 1.547,3

2012 2.118,6

2013 2.171,2

2014 1.849,6

Fonte: BNDES
Fonte: BNDES

Em 2010, o IBGE publicou uma revisão do Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2010),
que redefiniu os tipos de atuação da economia relacionados à cultura, incluindo as áreas de tecnologia da
informação e comunicação. Secundada nas referências das Nações Unidas (ONU), a nova classificação
passou a abrigar 74 atividades consideradas culturais, reunindo cerca de 400 mil empresas, 7,8% do total
existente no país (IBGE, 2010). A nova classificação condensa 74 atividades econômico-culturais, divididas
nos grupos cultural industrial, comercial cultural e serviço cultural. Entre 2007 e 2010, as empresas que par-
ticiparam das 74 atividades tipificadas como econômico-culturais cresceram 8,9%. De acordo com o IBGE,
amparado nessa nova classificação, as empresas pertencentes ao setor cultural obtiveram uma receita líquida
de R$ 374,8 bilhões e um custo total de R$ 329,1 bilhões. Esses valores são muito superiores ao que a Fede-
ração das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) considera ser o PIB da cultura (R$ 116 bilhões). A
entidade utiliza uma única variável (a massa salarial das empresas) para a realização do seu cálculo. Ocorre
que a massa salarial das empresas não é uma variável utilizada para a composição do cálculo do PIB, mas,
sim, o consumo das famílias, o consumo do governo, a balança de pagamento (aferida entre o total expor-
tado e o total importado) e o investimento realizado pelas empresas.

17
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

A tabela 3 evidencia o processo de elevação do desembolso do BNDES para as empresas do setor cultural
de acordo com o CNAE 2010. A partir de 2008, os desembolsos aumentaram consideravelmente, muito
em razão da criação, da consolidação e da expansão de programas como o Prodesign e o Procult. Esses dois
programas passaram a contar com alguns dos mais importantes produtos financeiros do BNDES. A institui-
ção dispõe de 23 produtos financeiros, presentes nas suas três frentes operacionais, mas paulatinamente três
assumiram maior relevância institucional e financeira: o BNDES Automático, o Cartão BNDES e o Finem
Direto. Em 2014, a soma desses três produtos representaram mais R$ 94,9 bilhões do desembolso total do
banco, o que correspondeu a mais de 50% do total realizado pela instituição. O primeiro produto, o BNDES
Automático, é destinado às grandes e médias empresas, e possui o limite de crédito de até R$ 20 milhões. O
Cartão BNDES foi instituído para as micro, pequenas e médias empresas, que, por meio dele, dispõem de
crédito pré-aprovado na quantia máxima de R$ 1 milhão. Por fim, o Finem Direto destina-se aos projetos de
investimento acima de R$ 20 milhões.

A partir de 2011, o Finem Direto passou a ser o produto financeiro mais utilizado pelas empresas culturais
no âmbito do Procult. Essa elevação pode ser constatada por meio dos empréstimos concedidos às em-
presas do mercado editorial, como as livrarias Saraiva e Cultura, que obtiveram, respectivamente, R$ 86
milhões e R$ 31,7 milhões. Em 2010, essas grandes organizações corresponderam a apenas 0,1% (265) do
total de empresas culturais, mas abrigaram 22% do total dos trabalhadores da cultura e 50% do total dos
salários e remunerações (IBGE, 2010). Até o biênio 2010/2011, o Procult BNDES havia realizado apenas
uma grande operação de crédito para o setor editorial, no valor de R$ 19,6 milhões; a partir de 2010 ocor-
reram nove operações, perfazendo o total de R$ 303 milhões. Já o Cartão BNDES passou a figurar como
o segundo produto financeiro mais utilizado pelas empresas culturais. Como destaca o próprio BNDES,
especialmente para o mercado cultural, o uso do cartão logrou crescimento em razão da sua celeridade.
Durante o interregno de 2007 a 2013, o Cartão BNDES realizou um desembolso total de R$ 214 milhões
para as empresas culturais, divididos em: patrimônio cultural (R$ 1,4 milhão); audiovisual (R$ 16 milhões);
editorial (R$ 83 milhões); indústria fonográfica (R$ 36 milhões), TV e rádio (R$ 30 milhões); e artes e
espetáculos (R$ 46 milhões).

18
ELDER P. MAIA ALVES

gráfico
gráfico 3:3: desembolso
desembolso do BNDES
do BNDES para asculturais
para as empresas empresas culturais
- empréstimos – empréstimos
do Procult doosProcult
de acordo com produtosde acordo
financeiros
com os produtos financeiros

180.000

160.000

140.000

120.000

100.000

80.000

60.000

40.000

20.000

0
2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

BNDES Automático Cartão BNDES Finem Direto

Fonte: BNDES

Os valores
Fonte: apresentados na tabela 3 não levam em conta os recursos do Fundo Setorial do Audiovisual
BNDES
(FSA), do qual o BNDES é o principal gestor financeiro, assim como os recursos do Programa Cinema
Perto de Você, que também tem o BNDES como principal gestor financeiro e, da mesma forma, dispõe de
recursos do FSA – o maior e mais relevante mecanismo de investimento cultural público no Brasil hoje. Tra-
ta-se de um fundo de investimento que concede recursos financeiros às empresas que atuam no mercado
de conteúdos audiovisuais brasileiros: núcleos de criação, produtoras, distribuidoras e grupos de exibição. O
FSA tem sido um dos principais responsáveis pelo processo recente de expansão do mercado de conteúdos
audiovisuais brasileiros.

No Brasil e no mundo, o mercado audiovisual é composto de seis grandes vetores: 1) TV aberta; 2) TV por as-
sinatura; 3) games (integrado por oito ecossistemas); 4) internet (dividida em web 2.0 e o vídeo sob demanda);
5) cinema de salas; 6) CDs, DVDs e blu-rays (vídeo doméstico). No interior de cada um desses vetores, atuam
os mesmos agentes destacados na figura 1 – empresas culturais privadas, empresas não culturais, profissionais
e trabalhadores da cultura, bancos comerciais privados, instituições estatais e consumidores.

19
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

figura 3: composição
figura do mercado
3: composição doaudiovisual:
mercado seis vetores seis vetores
audiovisual:

tabela 1: composição do investimento cultural público no âmbito dos principa is mercados culturais nacionais e globais

Vídeo doméstico Internet


(CDs, DVDs, blu-rays) (suportes variados) TV aberta

Games Cinemas
TV por assinatura (oito ecossistemas) Shoppings

Fonte: Fonte: elaboração


Elaboração do autor
própria

Em 2007, os seis vetores apresentados na figura 3, somados, adicionaram à economia brasileira a quantia
de R$ 8,7 bilhões. Em 2014 esse montante saltou para R$ 24,5 bilhões, um crescimento real (descontada a
inflação) de 134,8% em apenas oito anos. A maior parte dessa quantia, no entanto, é gerada pela receita das
empresas de conteúdos audiovisuais que atuam no Brasil e não propriamente pelos bens, serviços e ativida-
des audiovisuais que os incorporam. Dos seis vetores que integram o mercado de conteúdos audiovisuais
brasileiros, apenas na TV aberta a maioria do que é criado, produzido, distribuído e exibido tem origem na-
cional. Nos demais, o pêndulo se inclina muito mais para os conteúdos estrangeiros. Nos últimos cinco anos,
no entanto, os conteúdos audiovisuais brasileiros criados, produzidos, distribuídos, exibidos e consumidos na
TV por assinatura e nas salas de cinema cresceram significativamente.

20
ELDER P. MAIA ALVES

gráfico
gráfico 4: 4:valor
valor adicionado
adicionado pelopelo
setor setor
audiovisual (R$ bilhões (R$
audiovisual correntes)
bilhões correntes)
28

24
24,5
20 22,2
19,6
16
16,3
12 13,1
11,5
8 8,7 9,9

0
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Fonte: Ancine
Fonte: Ancine

Em 2010, foram produzidos 74 longas-metragens nacionais, em 2015, 125. Em 2009, o market share (fatia de
mercado) dos filmes brasileiros foi de 14,3% do público total, em 2014 foi de 19% e nas primeiras semanas de
2016 alcançou o porcentual de 27,4%. No intervalo entre 2013 e 2015, foram produzidas 2.867 horas de conteúdos
nacionais, 306 longas-metragens, 433 séries e telefilmes, que contaram com a participação de 713 empresas. Em
2009, 61,9% do total de títulos brasileiros foram distribuídos por empresas estrangeiras, notadamente os grandes
conglomerados norte-americanos. Em 2015, 85,4% de todos os títulos nacionais foram distribuídos por empresas
brasileiras, como a Paris Filmes e a Downtown. Aliados à elevação dos gastos culturais das famílias, esses resul-
tados só foram alcançados em razão da consolidação do FSA. Até 2010, a matriz de financiamento dos con-
teúdos audiovisuais brasileiros (notadamente dos longas-metragens nacionais) estava ancorada na sistemática
de financiamento das leis de incentivo à cultura, especialmente as leis federais, como a Lei Rouanet e a Lei do
Audiovisual. A partir de 2011, o FSA alterou esse processo: não só passou a disponibilizar muito mais recursos
financeiros, como também começou a financiar todas as empresas que integram os elos do audiovisual (criação,
produção, distribuição e exibição), além de adotar uma sistemática comercial nova, que exige a devolução dos
recursos investidos. Entre 2011 e 2014, do total de longas-metragens brasileiros que obtiveram mais de 1 milhão
de espectadores (cerca de 63,5 milhões), o FSA participou de 67,7% do total.

O FSA foi criado em 2006 e regulamentado em 2007 como uma modalidade do Fundo Nacional de Cultu-
ra (FNC). Ele tem na Agência Nacional de Cinema (Ancine) seu principal coordenador e órgão executivo.
No entanto, foi a partir das alterações introduzidas pela Lei 12.485, de setembro de 2011, que o FSA se
tornou a principal matriz de financiamento das empresas que atuam na criação, na produção, na distribuição
e na exibição dos conteúdos audiovisuais brasileiros. A Lei 12.485 (nova lei da TV por assinatura) trouxe três
grandes mudanças. A primeira determinou que os canais que operam na TV por assinatura devem exibir por

21
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

semana no mínimo três horas e meia de conteúdo nacional, sendo que metade desse período deve ser produzi-
da por produtoras independentes, sem vínculo jurídico com os canais e as empacotadoras. A segunda mudan-
ça diz respeito à permissão para que as grandes operadoras de telefonia possam atuar na TV por assinatura, na
forma de empacotadoras e distribuidoras. Essa era uma antiga reivindicação das operadoras e concessionárias
de telefonia. Parte desse interesse deriva da oportunidade de negócio vislumbrada, pois desde 2006 a base de
assinantes da TV paga apresentava índices vertiginosos de crescimento. Em 2010, o Brasil possuía pouco mais
de 9,7 milhões de assinantes da TV paga, em 2015 eram mais de 19,1 milhões, um crescimento de quase 100%
em apenas quatro anos. A terceira mudança concerne à instituição de uma nova tributação, a Condecine Teles,
cuja cobrança passou a incidir também sobre as operadoras de telefonia que, por meio dos pacotes de telefone
fixo e móvel, com acesso à internet, passaram a distribuir conteúdos audiovisuais.

A Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) foi criada ainda em
2001, por ocasião da criação da Ancine, na forma de duas modalidades – Condecine Títulos e Condecine Re-
messa. Embora relevantes, os recursos decorrentes desses impostos não alteraram a matriz de financiamento dos
conteúdos audiovisuais nacionais. Com a criação da Condecine Teles, esse aspecto se modificou inteiramente.
Com a redação da Lei 12.485, todos os recursos oriundos da Condecine Teles deveriam ser carreados para o FSA.
Juntas, as antigas modalidades da Condecine arrecadaram R$ 69,6 milhões em 2012. No mesmo ano, somente a
Condecine Teles arrecadou R$ 655,6 milhões. Por isso, logo após a vigência da Lei 12.485, os recursos direcionados
para o FSA cresceram substancialmente. Em 2010, por exemplo, o orçamento do FSA foi de R$ 63,4 milhões. No
ano seguinte (meses após a lei entrar em vigor), o orçamento do fundo saltou para R$ 216,3 milhões. Em 2012, ele
mais do que dobrou, chegando a R$ 562 milhões. E em 2013 alcançou a cifra de R$ 989 milhões.

tabela4:4:
tabela Condecine
Codecine – valores
– valores arrecadados
arrecadados entre 2010 e 2015
entre 2010/2015

Modalidades 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Condecine
38.192.285,94 42.467.544,89 64.576.514,68 84.156.782,29 74.862.190,50 (*)
Títulos

Condecine
1.462.516,82 1.231.283,24 5.088.092,11 10.949.724,98 7.386.676,12 (*)
Remessa

Condecine
655.667.562,69 711.561.365,32 702.263.960,36 1,1 bilhão
Teles

TOTAL 39.654.802,76 43.698.828,13 725.332.169,48 806.667.872,59 784.512.826,98 1,1 bilhão

Fonte: Ancine (*) valores não divulgados


Fonte: BNDES

22
ELDER P. MAIA ALVES

O FSA comporta três grandes programas no âmbito dos quais existem diversas linhas de ação: o Programa
de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema Brasileiro (Prodecine); o Programa de Apoio ao Desenvolvimento
do Audiovisual Brasileiro (Prodav); e o Programa Cinema Perto de Você. O Prodecine abriga três linhas. A
primeira é a linha A – produção de obras de longas-metragens, destinada à exibição nas salas de cinema e
celebrada exclusivamente por meio de operações financeiras da modalidade de investimento. Significa dizer
que o FSA tem participação direta nos resultados comerciais dos projetos aprovados. Entre 2008 e 2014, essa
linha disponibilizou R$ 231 milhões, obtendo a recuperação de 42% do investimento nos projetos. Já a linha C,
ainda no âmbito do Prodecine, mediante fluxo contínuo, concede recursos para a compra dos direitos de dis-
tribuição dos conteúdos nacionais (especialmente longas-metragens de ficção) por parte das empresas distri-
buidoras nacionais. Desde 2008, essa linha já disponibilizou R$ 218 milhões. O Prodav, por sua vez, tem como
principal desiderato a produção de obras audiovisuais destinadas à televisão (também chamado de linha B).
Está assentado na concessão de recursos, por meio de fluxo contínuo, na forma exclusiva de investimento,
de obras seriadas de ficção, telefilmes, documentários e animação. Entre 2009 e 2014, a linha disponibilizou o
montante de R$ 297 milhões, obtendo 15,5% do retorno do investimento nos projetos já analisados.

Além das linhas de ação descritas, o sistema operacional e financeiro do FSA comporta dois programas: o
Programa Brasil de Todas as Telas e o Programa Cinema Perto de Você. O primeiro tem destinado recur-
sos para o financiamento da criação dos conteúdos audiovisuais nas mais diferentes regiões do país, logra
atender principalmente às demandas de produção e veiculação de conteúdos nacionais vicejadas pela Lei
12.485, por meio da qual os canais nacionais e estrangeiros necessitam exibir semanalmente no mínimo três
horas e trinta minutos de conteúdos nacionais. Com esse objetivo, foram destinados recursos para a criação
dos núcleos criativos regionais (três editais) e para os editais direcionados à produção de conteúdos para
preencher a grade de programação das televisões públicas (TVs do poder judiciário, do poder legislativo,
comunitárias, universitárias, entre outras), além dos editais dedicados à criação dos laboratórios regionais de
desenvolvimento. Somados, esses editais já perfizeram mais de R$ 70 milhões.

O Programa Cinema Perto de Você, com recursos do FSA gerenciados pelo BNDES, disponibiliza recursos
com taxas de juros bastante reduzidas para os grupos exibidores que instalam salas nas cidades com baixa
densidade de cinemas e nas periferias das grandes metrópoles brasileiras, cuja quantidade de salas de exi-
bição (e demais equipamentos culturais) é bastante reduzida. O programa também empresta recursos vi-
sando a modernização e digitalização das salas de cinema. Por meio do Regime Especial de Tributação para
Desenvolvimento da Atividade de Exibição Cinematográfica (Recine), o programa desonera os grupos exi-
bidores dos impostos federais (IPI, PIS/Pasep, PIS-Importação e Cofins-Importação) que incidem sobre a
importação dos equipamentos necessários à instalação das novas salas digitais. Aliado às novas demandas
de tecnologia e de conteúdo, o Programa Cinema Perto de Você tem sido um dos principais responsáveis
pelo recente processo de expansão do parque exibidor brasileiro. Em 2006, o país comportava cerca de

23
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

1.300 salas; dez anos depois, no início de 2016, temos mais de 3.100 salas, crescimento de 140%. Desse total,
cerca de 90% das salas estão concentradas nos shopping centers, situados principalmente nos dois maiores
centros urbanos brasileiros – Rio de Janeiro e São Paulo. Até o início de 2016, o Programa Cinema Perto de
Você financiou aproximadamente 350 novas salas, cerca de 20% do total das salas construídas entre 2006 e
2016, todas erguidas em municípios com baixa densidade de salas e nas periferias das grandes metrópoles,
nas quais a maioria dos cinemas está concentrada nos bairros de classe média e média alta e nas zonas cen-
trais, ou seja, locais dotados de melhores infraestrutura urbana e acessibilidade.

figuradas
figura 4: organização interna 4: organização
ações do interna
FSA das ações do FSA

L.A
L.C L.B

FSA
Cinema
L.D Brasil P. Você
de T/T
Fonte: elaboração do autor

Fonte: elaboração própria


O FSA é um dos maiores fundos públicos de investimento cultural do mundo. Ele injeta recursos nos
principais elos econômico-culturais do mercado de conteúdos audiovisuais brasileiros, aproximando tele-
visão, cinema, internet e telefonia. Mais uma vez, agentes estatais de mercado (AEM) específicos, como
o BNDES e a Ancine, tencionam dinamizar e subsidiar as empresas culturais. Como sugere a figura 5,
há uma circularidade financeira e tributária no FSA, percorrendo um circuito que parte da arrecadação da
Condecine Teles junto às empresas do audiovisual (principalmente as operadoras de telefonia móvel que
distribuem conteúdos); passa pelo FSA e por seu principal órgão executivo, a Ancine, que elabora as ações
(por meio de editais e/ou fluxo contínuo) e fiscaliza as exigências comerciais; e chega, por fim, ao BNDES e
ao BRDE (cadastrado pelo BNDES como agente financeiro do FSA), que, por sua vez, repassam na forma
de investimento recursos financeiros às empresas, que também recolhem a Condecine. O circuito delineado

24
ELDER P. MAIA ALVES

na figura 5 atesta que os recursos do FSA – assim como os desembolsos do BNDES e as ações das políticas
econômico-culturais destacadas – têm muitos impactos e efeitos multiplicadores nas cadeias econômico-
-culturais. A rigor, são recursos para empresas que vicejam novas empresas.

figura 5: dinâmica de arrecadação e repasse financeiro do FSA


figura 5: dinâmica de arrecadação e repasse financeiro do FSA

Empresas do audiovisual

Condecine Teles
Lei nº 12.485
e demais Condecines

FSA Ancine

BNDES / BRDE

Produtoras Distribuidoras Exibidoras

Fonte:
Fonte: elaboração
elaboração própria
do autor

O gráfico 5 expõe nos limites do audiovisual a tendência de crescimento do investimento cultural público
(por meio do FSA) e de diminuição das leis de incentivo. A partir de 2007, o declínio da Lei Rouanet e da
Lei do Audiovisual é significativo, ao passo que emerge com força o FSA. A rota de crescimento do fundo
e o arrefecimento das supracitadas leis se acentuaram a partir de 2011. Em 2012, ocorreu um problema no
repasse operacional dos recursos financeiros daquele ano e a maior parte só foi liberada no início de 2013.
Mesmo em face desse aspecto, o FSA já correspondeu a 1/3 do total dos recursos disponibilizados pelas leis
de incentivo em 2012. No ano seguinte, o investimento do FSA, cerca de R$ 143 milhões, superou com folga
a soma dos recursos disponibilizados pelas leis federais de incentivo para o setor audiovisual.

25
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

gráfi co5 :5fontes


gráfico : fontes de financiamento
de financiamento – leise de
– leis de incentivo incentivo
investimento e investimento direto
direto

73,4
68,4
64,4

59,3
57,0
52,3 54,3 55,6
46,5 47,7 47,9 51,4
46,2
43,0
40,1 41,9
40,7 37,8
34,9 35,1 36,7
37,7 31,1
35,3 28,8
32,5 29,2
27,1 25,1 26,8
28,8
23,3 25,3
19,0 18,9
11,3 20,4
15,1
13,8 13,7
11,3 8,5
9,1 7,8
5,1
4,5
2,8
2,5 2,5

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

FSA Art. 1º Art. 1ºA Art. 3º Art. 3º A Lei Rouanet

Fonte: Filme B.

Fonte: Filme B

Residual no setor audiovisual, a Lei Rouanet, no entanto, tem registrado nos últimos anos um contundente
crescimento financeiro. Em 2003, por meio da renúncia fiscal, a lei captou R$ 430 milhões; em 2006 saltou
para R$ 760 milhões (crescimento próximo a 80% em apenas três anos); em 2010 alcançou a marca de R$
1,160 bilhão. A espiral de crescimento se manteve: em 2014 captou o montante de R$ 1,320 bilhão, em 2015
registrou uma queda, passando para R$ 1,113 bilhão (mesmo diante desse crescimento, as leis federais de
incentivo corresponderam a apenas 0,7% do total das renúncias fiscais na esfera federal no ano de 2015).
O principal responsável pela expansão dos recursos foi a incorporação de novos segmentos ao escopo da
Lei Rouanet, como o design, a moda e os games. Além das leis federais, o Brasil possui 18 leis estaduais de
incentivo fiscal à cultura e 32 leis municipais.

26
ELDER P. MAIA ALVES

tabela 5: dez maiorestabela


patrocinadores
5: 10 maiores–patrocinadores
Lei Rouanet -(2015)
Lei Rouanet (2015)

VALOR
POSIÇÃO EMPRESA
(em milhões de R$)

1º BNDES 56,0

2º Banco do Brasil 31,9

3º Banco Bradesco 26,6

4º Banco Itaú 25,4

5º Cielo S/A 22,1

6º CBMM 17,3

7º Banco Berj 15,4

8º Rede Card AS 15,2

9º Correios 14,3

10º Caixa Seguradora 11,9

Fonte: MinC

A gestão e a promoção das marcas corporativas por meio das ações culturais – seja utilizando os mecanis-
Fonte: MinC
mos da renúncia fiscal, seja lançando mão de políticas culturais próprias – mantêm um lugar de destaque nas
estratégias de fixação da marca, fortalecimento da imagem institucional, agregação de valor à marca e rela-
cionamento com o público-alvo. Esse aspecto fez com que muitos pesquisadores e gestores, notadamente
durante a década de 1990 e início dos anos 2000, definissem o mercado cultural apenas como um eixo de
interseção entre as empresas patrocinadoras (especialmente seus departamentos de comunicação e marke-
ting) e os produtores culturais com suas empresas proponentes, esquecendo-se das organizações estatais,
dos bancos comerciais, do consumo das famílias e principalmente das corporações culturais propriamente
ditas. Como assinalamos no início (figura 1), as leis de incentivo constituem apenas um dos vetores que
gravitam em torno das instituições estatais.

27
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

gráfico 6: quais os motivos que levam a empresa a investir em cultura


(100 maiores patrocinadores – empresas não culturais)
gráfico 6: quais os motivos que levam a empresa a investir em cultura
(cem maiores patrocinadores – empresas não culturais)

1% 6% 8% Associção a projetos
8% Benefício fiscal

10% Fixação da marca

Fortalecimento da imagem institucional


11%
Participação/apoio ao desenvolvimernto
da cultura nacional
9% Participação/apoio ao desenvolvimento
da cultural local

Público-alvo
7%
Retorno/divulgação em mídia espontânea

10% Responsabilidade social

10% Relacionamento com funcionários


e colaboradores em geral
Nenhum motivo em particular
9%
11%
Outros
Fonte: Guia de empresas patrocinadoras

Fonte: MinC
Nos últimos dez anos, com o recrudescimento dos orçamentos estatais (sobretudo no âmbito federal) di-
recionados à cultura (notadamente por meio dos fundos de cultura), com o advento das políticas econô-
mico-culturais, a consolidação do FSA e principalmente com a expansão do desembolso do BNDES para
as empresas culturais especializadas, deslocou-se o pêndulo do poder das empresas e corporações não
culturais (públicas e privadas) para as corporações culturais propriamente ditas. Essa assertiva não sugere
que as leis de incentivo desapareceram, antes, o contrário. Como mencionado, a Lei Rouanet experimentou
um crescimento eloquente dos recursos captados, mas foi o investimento cultural público que se fortaleceu
sobremaneira em suas distintas dimensão e eixos complementares. Embora os recursos captados pela Lei
Rouanet tenham crescido substancialmente nos últimos dez anos, as leis de incentivo à cultura (federais,
estaduais e municipais) já possuíram maior relevância no interior dos mercados culturais brasileiros e, por
conseguinte, na estruturação do capitalismo cultural existente no Brasil. As leis constituíram muito mais um
fator de oportunidade profissional por parte de diversos produtores culturais, empresas de marketing e redes
diversificadas de prestadores de serviços e profissionais criativos, e muito menos um mecanismo de investi-
mento direto, destinado à dinamização de cadeias econômico-culturais nacionais, como a do audiovisual, a
do editorial e a do patrimônio histórico-artístico.

28
ELDER P. MAIA ALVES

Se a Lei Rouanet cresceu, o investimento cultural público cresceu ainda mais. Por sua vez, a expansão do in-
vestimento cultural público só foi possível em decorrência da elevação dos gastos culturais das famílias. Esse
fator foi determinante. Foi o aspecto que mais impactou nas estratégias das empresas culturais e na am-
pliação dos seus negócios. Tanto os agentes estatais de mercado (MinC, Sebrae, Iphan, Ancine e BNDES)
quanto as empresas propriamente ditas anteviram novas oportunidades em face da elevação da demanda
e da expansão das práticas de consumo simbólico-cultural. Em razão do aumento do estoque de empregos
formais e da elevação da renda entre 2004 e 2013, o gasto médio das famílias brasileiras com cultura passou
de 3,0% do orçamento familiar em 2003, para 5,0% em 2010 (IBGE). Dado que o consumo das famílias
representou 60,7% do Produto Interno Bruto em 2010, o consumo das famílias brasileiras com cultura foi da
ordem de R$ 116 bilhões. Somente esse montante já é superior ao PIB da cultura aferido pela Firjan. Como
assinalado antes, segundo a entidade, o PIB da cultura no Brasil foi de R$ 111,9 bilhões em 2010, e de R$ 126,1
bilhões em 2013. No entanto, na composição do cálculo do PIB da cultura realizado pela Firjan não figuram
variáveis imprescindíveis como o consumo das famílias e o consumo do governo.

Há ainda outro aspecto relevante. De acordo com o IBGE, se considerarmos os gastos com telefonia, o or-
çamento das famílias brasileiras com cultura passa para 8,6% do total de gastos familiares, o que resultaria em
2010 na quantia de R$ 197,2 bilhões. O uso da telefonia se justificaria por diversos aspectos, mas apenas dois
já são suficientes para sustentar a alteração do cálculo dos gastos familiares com os bens e serviços culturais:
1) uma parcela significativa do consumo dos conteúdos audiovisuais tem sido realizada por meio dos pacotes
de telefonia móvel comercializados pelas principais operadoras de telefonia; 2) os clientes das companhias que
fornecem os serviços via streaming, como Netflix, Deezer e Spotify, acessam os conteúdos por meio dos dispo-
sitivos móveis, notadamente os smartphones. Além desses aspectos, a expansão da internet, a elevação da sua
velocidade e a frequência do seu uso para o consumo de conteúdos culturais alteram o dispêndio familiar com
os novos serviços culturais-digitais. De acordo com pesquisa realizada pela Secretaria de Comunicação Social
da Presidência da República, em 2014, 26% dos brasileiros acessavam a internet durante os sete dias da semana,
no ano seguinte esse porcentual subiu para 37%, um crescimento de mais de 30% em apenas um ano. Dos bra-
sileiros que acessaram a internet, em 2015, 67% afirmaram que o fazem em busca de diversão e entretenimento.
Desse total, 66% afirmaram que, além do computador, utilizam o celular para acessar cotidianamente a internet.

Certamente a redução do consumo das famílias em 2014, 2015 e 2016, evidenciada no gráfico 6, tem impli-
cado ou implicará também a redução do consumo cultural. Por exemplo, em 2015 a TV por assinatura experi-
mentou um recuo de 500 mil assinantes. É certo, todavia, que uma parcela desse contingente migrou para os
serviços culturais via streaming, capitaneados por empresas como a norte-americana Netflix (estima-se que a
empresa já possua entre 4 e 5 milhões de assinantes no Brasil). Por ora, no entanto, a frequência de algumas
práticas de consumo cultural, como ir ao cinema, tem mantido uma rota consistente de crescimento. Em 2014
foram 157,2 milhões de ingressos vendidos para as salas de exibição no Brasil; já em 2015 foram 172 milhões

29
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

(crescimento de 9%). Esse foi um dos poucos serviços no item de consumo das famílias que registrou cres-
cimento na economia brasileira em 2015. Em 2016, até a semana 33 (que vai do dia 7 de janeiro ao dia 24 de
agosto), já tinham sido vendidos 130,8 milhões de ingressos, 12 milhões a mais que no mesmo período do ano
anterior, crescimento de 10,5% em relação a 2015. Ora, mesmo em face da acentuada redução do consumo
das famílias brasileiras, e de uma das mais severas recessões da recente história econômica do país, o consumo
de filmes
gráfico nas salas
7: consumo dasde cinema
famílias tem apresentado um crescimento constante e regular.
no Brasil

gráfico 7: consumo das famílias no Brasil


6,4 6,5
6,2
5,3
4,7
4,4 4,5
3,9
3,5 3,5

1,3

2003 2015
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
-0.5

Fonte: IBGE/Folha de S.Paulo.

-4,0
tabela 6: público e renda – salas de cinema Brasil
tabelaFonte: IBGE/Folha
6: público de S.Paulo
e renda – salas de cinema no Brasil

2015 x 2016 – SEMANA 1 A 33


tabela 1: composição do investimento cultural público no âmbito dos principa is mercados culturais nacionais e globais

ANO PÚBLICO VARIAÇÃO (%) RENDA (R$) VARIAÇÃO (%)

2015 118,8 milhões 1,589 bilhão

2016 130,8 milhões 10,5% 1,827 bilhão 15%

Fonte: Ancine

Fonte: Ancine

30
ELDER P. MAIA ALVES

Diante dos dados arrolados, é possível sustentar a seguinte assertiva: nos últimos dez anos, os investi-
mentos culturais públicos superaram bastante a renúncia fiscal promovida pelas leis de incentivo à cultura.
Mesmo com o substancial crescimento da captação da Lei Rouanet e considerando-se ainda toda a le-
gislação de incentivo estadual e municipal, o investimento cultural público é superior. Se tomarmos como
norte o ano de 2014 (ano de maior captação da Lei Rouanet), podemos urdir a tabela 7. Embora corra-
mos o risco de superestimar os valores das leis de incentivo fiscal, podemos equiparar o somatório de toda
a legislação estadual e municipal a 50% do valor captado pela Lei Rouanet em 2014. Mesmo projetando
que apenas 2/3 dos valores orçamentários destinado à cultura (nos três níveis administrativos) foram de
fato executados, ainda assim temos uma superioridade dos investimentos culturais públicos. Também não
estão presentes no cálculo desse investimento os valores investidos pelas empresas de audiovisual mu-
nicipal, como a Riofilme e a SP Filmes. Do mesmo modo, só foram computados no investimento cultural
público os recursos de fato executados.

tabela 7: comparação leis de incentivo x investimento cultural público (2014)


tabela 7: comparação: leis de incentivo x investimento cultural público (2014)

INVESTIMENTO
LEI DE INCENTIVO VALOR (R$) VALOR (R$)
CULTURAL PÚBLICO

Lei Rouanet 1,320 Vale-Cultura 240

Leis estaduais e municipais 660 Desembolso do BNDES 1,849

Lei do Audiovisual 155 PAC Cidades Históricas 544

FSA 412

Orçamentos executados
4,752
(união, estados e municípios)

TOTAL 2,135 bilhões TOTAL 7,797 bilhões

Fonte: elaboração do autor


Fonte: elaboração própria

31
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

OS MERCADOS CULTURAIS NA EUROPA:


RELAÇÃO ENTRE INVESTIMENTOS CULTURAIS
PÚBLICOS E LEIS DE INCENTIVO FISCAL
Assim como no Brasil, o investimento cultural público na Europa é superior às leis de incentivo. Não
obstante, o processo de financiamento do investimento é bem mais complexo. Isso porque o mercado
cultural europeu é bastante multifacetado, assimétrico e heterogêneo. Há pelo menos quatro diferenças
fundamentais: 1) a atuação da União Europeia (UE) como bloco de unificação que elabora políticas e
destina recursos para a cultura por meio dos fundos públicos, com os quais contribuem todos os 26
estados-membros; 2) a existência de uma governança descentralizada dos recursos públicos destinados
à cultura; 3) os elevados gastos familiares com bens, serviços e atividades culturais; 4) a relevância eco-
nômica que a exportação de bens e serviços culturais tem assumido para o continente. O volume dos
orçamentos estatais destinados à cultura varia bastante, não ultrapassando na maioria dos casos 1% do PIB
dos estados-membros. A tabela 7 demonstra que, a partir do critério per capita (divisão entre a soma total
da população e o orçamento), não ocorreu variação significativa dos orçamentos públicos destinados à
cultura. No entanto, como assinala o gráfico 6, em decorrência da crise fiscal e financeira de 2008/2009,
em muitos países houve uma redução dos porcentuais orçamentários no escopo do somatório geral do
Produto Interno Bruto (PIB) dos estados-membros.

32
ELDER P. MAIA ALVES

tabela 8:tabela
evolução dos dos
8: evolução orçamentosper
orçamentos percapita paraa cultura
capita para a cultura
estados-membros selecionados (2000/2011 em €)
estados-membros selecionados (2000/2011 em €)

PAÍS 2000 2005 2009 2011

Áustria 225 250 274 273

Bulgária 16 18 29

Croácia 77 72

República Checa 97 105

Dinamarca 290 352 293 300

Estônia 80 140 193 187

Finlândia 175 168 177

Alemanha 100 97 112 117

Grécia 38 32 45

Hungria 36 56

Irlanda 43 50 43

Itália 101 112 134 117

Letônia 32 27 61 51

Malta 42 55 44

Holanda 246 298 331 338

Polônia 18 29 48 52

Portugal 60 76 76 69

Romênia 50 41

Espanha 78 120 153 149

Suécia 234 220 239 278

Fonte: União Europeia


Fonte: União Européia

33
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

De acordo com a organização político-administrativa de cada estado-membro, os orçamentos são geren-


ciados por diferentes órgãos e instituições dos poderes executivos ou a eles ligados (conselhos, fundações,
departamentos, agências etc.), possuindo maior ou menor grau de centralização. Em linhas gerais, os três
temas que mais se destacam são: proteção e promoção do patrimônio cultural, apoio à criatividade e à cul-
tura nacional e desenvolvimento das indústrias criativas. Em quase todos os estados-membros há ações di-
recionadas à qualificação dos equipamentos culturais (notadamente teatros, museus, bibliotecas e arquivos)
e em muitos países existem também fundações públicas que concedem bolsas aos artistas.

gráfico
gráfico 8:8:financiamento
financiamento
públicopúblico paratraduzido
para a cultura a cultura traduzido do
em porcentagem emPIBporcentagem
(2005-2011) do PIB (2005-2011)

1,8

1,6

1,4

1,2

0,8

0,6

0,4

0,2
0
a
tri
da

al

lia

ria

ia

ia

nia

ina a
ca

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Áu
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Itá

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M

lg

pa

Su

m
Po
em
Irl

Le

Es
r

Hu
nl

Bu
Po

Es
Fi
Al

2011 2005

Fonte: União Europeia

Fonte: União Européia

34
ELDER P. MAIA ALVES

Além de ter como fonte de financiamento a arrecadação tributária convencional, as políticas culturais eu-
ropeias dispõem dos recursos financeiros advindos das loterias. A partir de 2000, um alentado número de
estados-membros instituiu os fundos lotéricos como fontes específicas para a cultura. Parcelas significativas
das receitas das loterias estatais passaram a ser destinadas à cultura. Desse modo, foram criadas agências
públicas e/ou órgãos correlatos para gerenciar, controlar e aplicar os recursos oriundos dos jogos lotéricos.
Os países a seguir dispõem hoje de fundos de cultura decorrentes das receitas das loterias estatais: Bélgica,
Dinamarca, Bulgária, Estônia, Finlândia, Alemanha, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Holanda, Polônia, Eslová-
quia, Suécia e Reino Unido. Em 2000, 35,15% de todo o orçamento estatal italiano destinado à cultura teve
como fonte as loterias; no mesmo ano, elas representaram 37,62% do orçamento público do Reino Unido
para a área cultural; em 2002, 18,51% do orçamento estatal da Dinamarca para a cultura teve como origem
as loterias; em 2005, 54,59% de todo o orçamento cultural da Finlândia derivou das fontes lotéricas.

A maioria dos recursos que compõem o gráfico 8 é destinado à materialização da cultura como um direito, figurando
assim no que poderíamos chamar de política cultural clássica ou convencional. Não obstante, as políticas econômi-
co-culturais começaram a ocupar um espaço cada vez maior nos orçamentos dos estados-membros. Os aspectos
econômicos inscritos nas esferas culturais ampliadas têm mobilizado mais diretamente os governos de países como
Alemanha, Áustria, França, Espanha, Dinamarca e Reino Unido. Este último tornou-se paradigmático a tal respeito.
Durante os governos da ex-primeira-ministra Margareth Thatcher (1979-1990), as políticas artístico-culturais no Reino
Unido sofreram uma forte inflexão. O Arts Council (ACGB), principal órgão público de elaboração e execução das
políticas para cultura e arte, criado em 1946, teve seu orçamento esvaziado. Nos anos que se seguiram à chegada do
partido conservador ao poder, o financiamento cultural direto, muitas vezes considerado desnecessário, foi bastante
reduzido, substituído pela participação das empresas e corporações na forma de créditos fiscais, incentivos fiscais e va-
riadas formas de apoio privado (patrocínios, prêmios e auxílios), culminando na criação da Associação para o Patrocínio
Empresarial das Artes, uma entidade corporativa que esvaziou bastante o poder do Arts Council.

Com a assunção do partido trabalhista ao poder, em 1997, liderado pelo ex-primeiro-ministro Tony Blair, o Estado
voltou a atuar diretamente na esfera artístico-cultural. Dessa vez, não mais como um financiador das atividades
e conteúdos, o que poderia reforçar, por exemplo, a posição do Arts Council, mas agora como coordenador e
artífice direto de uma das mais impactantes políticas econômico-culturais: o programa para o desenvolvimento
das indústrias criativas, elaborado pelo Creative Industries Task Force, instalado logo no início do governo Blair e
vinculado ao Department for Culture, Media and Sports (DCMS). De acordo com o governo Blair, o programa
tinha como meta renovar a combalida economia britânica, que passava por um forte processo de desindustriali-
zação desde a década anterior, conferindo-lhe mais inovação, criatividade e dinamismo. Para tanto, o DCMS foi
ampliado e incorporou novas competências, funções e recursos financeiros. Isso levou, entre outros aspectos, ao
mapeamento dos setores criativos e à “nova” definição conceitual das indústrias criativas, elementos que, juntos,
engendraram o chamado modelo DCMS inglês, disseminado e copiado por muitos governos mundo afora.

35
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

Junto com o programa australiano, o programa do Reino Unido deu início a um dos aspectos mais candentes
das políticas econômico-culturais e, como corolário, das políticas de desenvolvimento cultural: a dissemina-
ção de uma nova gramática conceitual, institucional e política, que tem como núcleo as noções de indústrias
criativas e economia criativa. Diferente de conceitos como indústria cultural, cultura de massa e materialismo
cultural, confeccionados pelas ciências sociais e humanas, essa nova gramática conceitual e temática supra-
citada teve como origem as interfaces entre os interesses econômicos dos governos nacionais, os interesses
técnicos das escolas globais de negócio (notadamente norte-americanas e europeias) e os interesses políticos
de organismos transnacionais do sistema ONU, que em conjunto a disseminaram e a legitimaram.

gráfico
gráfico 9:9:porcentual
porcentual docom
do PIB PIB com
lazer lazerentre
e cultura e cultura entre países
países selecionados selecionados (2006)
(2006)

1
0
nha
ia

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ica dia

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D
bl

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Pa

bl

Re

Fonte: União Europeia Despesa familiar Despesas do governo


Fonte: União Européia
Como demonstra o gráfico 9, antes dos impactos da crise fiscal e financeira, os gastos familiares com os
bens e serviços culturais eram bastante acentuados na Europa. Em 2004, na França, por exemplo, o consu-
mo cultural das famílias alcançou o montante de € 42 bilhões, aproximadamente 5,4% do total do consumo
familiar, o que representou 63% do PIB da cultura. Assim como no Brasil e demais países, a dinâmica dos
investimentos culturais é em grande medida determinada pelo gasto com cultura feito pelas famílias. Em
média, esses dispêndios costumam ultrapassar 60% do PIB da cultura nos principais mercados culturais do
mundo, como Estados Unidos, Europa, Brasil, México, Índia, China e Japão.

36
ELDER P. MAIA ALVES

gráfico
gráfico10:
10:consumo cultural
consumo cultural e das
e das famílias
famílias (Quantas
(Quantas vezes nosvezes
últimosnos últimos
12 meses 12 meses você...?)
você?)

Assistiu a um programa cultural na 72%


TV ou ouviu pelo rádio 78%

Leu um livro 68%


71%

Foi ao cinema
52%
51%
Visitou um monumento 52%
(palácios, castelos, igrejas, jardins etc.) 54%

Visitou um museu ou galeria


37%
41%
35%
Foi a um concerto
37%

Visitou uma biblioteca pública


31%
35%

Foi ao teatro 28%


32%
Assistiu a uma apresentação 18%
de dança ou ópera 18%

EB79.2 abril e maio de 2013

EB67.1 fevereiro e março de 2007

* EU 27

Fonte: União Européia

Fonte: União Europeia

O gráfico 10 evidencia com bastante clareza a redução do consumo cultural das famílias europeias entre
2007 e 2013. Talvez tenha sido em razão desse recuo (ao menos de um consumo cultural mais tradicional) que
a União Europeia tenha passado sistematicamente a formular e executar políticas econômico-culturais. Entre
os anos de 2007 e 2014, ela coordenou projetos de pesquisa acerca da chamada economia criativa e divulgou
relatórios de prospecção de negócios, sempre buscando identificar as principais cadeias de valor econômico-
-culturais do continente e tendo em vista subsidiar as tomadas de decisão dos estados-membros, assim como
colaborar diretamente para a construção de programas locais. Nesse ínterim, a União Europeia coordenou

37
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

um grande processo de mobilização técnica e política com o propósito de sensibilizar empresas, instituições
financeiras, governos, agências de pesquisa, institutos de tecnologia, comunidades de artistas e criadores para
a relevância econômica da cultura. Tal processo culminou na formulação do programa Europa Criativa 2014-
2020. O programa abriga dois grandes objetivos: 1) garantir a salvaguarda e a promoção da diversidade cultu-
ral e linguística europeia; 2) reforçar a competitividade dos setores culturais e criativos, com vistas a promover
um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo. Os cinco objetivos específicos do programa se vinculam
diretamente ao segundo objetivo principal, deixando patente o perfil de um programa econômico-cultural.
Com efeito, as ações e metas do programa se aliam a essa dimensão, estabelecendo ações de promoção da
competitividade das empresas culturais, apoio financeiro e técnico às micro e pequenas empresas e linhas
de créditos para núcleos criativos e tecnológicos. Com dotação orçamentária de € 1,4 bilhão (cerca de R$
5 bilhões), originária dos fundos públicos abastecidos pelos estados-membros, o programa Europa Criativa
reforça a atuação da União Europeia como um específico Agente Estatal de Mercado (AEM).

Dos 28 estados-membros da União Europeia (incluindo o Reino Unido), cerca de 20 mantêm programas
de estímulo às produções culturais locais, especialmente nos setores de televisão, cinema e games. São
subsídios na forma de créditos fiscais, descontos em impostos e empréstimos financeiros para as empresas
que atuam nesses segmentos e integram cadeias econômico-culturais específicas. Não se trata de renúncia
fiscal, mas, sim, de subsídios que impulsionam a criação e a produção, cujos efeitos multiplicadores se tradu-
zem em novos negócios, investimentos e futuros tributos. A rigor, são investimentos culturais públicos que,
em países como Alemanha, Inglaterra, França e Espanha, estão vinculados à dinamização de outros mer-
cados, como o turismo e a inovação tecnológica. Como assinalou Martel (2012), essa é uma regularidade
global, que tem se acentuado bastante nos últimos 15 anos, pois os países buscam, cada vez mais, dinamizar
seus mercados culturais, desencadeando ferozes mecanismos de competição pela participação no comércio
global de bens e serviços culturais-digitais, assim como intensificar a concorrência pelo domínio e controle
das propriedades intelectuais. Em 2004, a América do Norte e a Europa foram responsáveis pela exportação
de 69% de todos os bens culturais comercializados no planeta. Em 2013, esse porcentual caiu para 49%. Por
outro lado, o sul e o leste asiático passaram de 26% em 2004 para 45,5% em 2013. A América Latina, por sua
vez, foi responsável por apenas 1,2% do total de bens culturais exportados em 2013. No que concerne aos
serviços culturais digitais (distribuídos e consumidos por meio dos suportes digitais e da rede mundial de
computadores), entre 2003 e 2013, os Estados Unidos lideraram o fluxo de exportação de serviços culturais
digitais, alcançando em 2013 a soma de US$ 68,6 bilhões, valor bem superior àquele alcançado pelo segundo
colocado, o Reino Unido, com US$ 13,8 bilhões.

Os incentivos fiscais à cultura (na forma de renúncia fiscal) estão presentes em 25 dos estados-membros
que compõem a União Europeia. São bastante praticados pelas empresas, e os indivíduos durante as déca-
das de 1980 e 1990 foram recorrentemente estimulados pelos governos nacionais. A legislação europeia é

38
ELDER P. MAIA ALVES

muito heterogênea; taxas, procedimentos, limites e demais aspectos obedecem aos regimes fiscais e jurídi-
cos de cada país. Na grande maioria dos estados-membros não existe uma lei nacional que regule as práticas
de patrocínio, doação e incentivo específicas para a cultura, seja por parte das companhias ou dos indivíduos.
Há, antes, procedimentos jurídicos e contábeis que regulam as atividades de doação, patrocínio e apoio
para as atividades de um modo geral, educação, esportes, artes, meio ambiente etc. Em alguns países, há o
impedimento para que o patrocínio seja deduzido pela empresa, pois se entende que a empresa obteve um
benefício direto, que foi a promoção da sua marca corporativa.

Como não existe uma legislação unificada específica nos limites de cada país, há sempre a dificuldade de
mensuração, organização e divulgação dos dados, mas a União Europeia estima que, em países como Ho-
landa e Irlanda, os recursos da renúncia fiscal (também chamado de apoio indireto) equivalem aos recur-
sos diretos (realizados pelas organizações estatais), correspondendo à metade de todos os recursos. Assim
como nos Estados Unidos, na maioria dos países europeus as doações individuais são muito frequentes e
disseminadas. Os valores doados podem ser deduzidos dos impostos devidos pela pessoa física, cujas taxas
de dedução variam de acordo com os países, principalmente quando se trata de doações em dinheiro, uma
vez que também há a possibilidade da doação de imóveis e outras propriedades. Na maioria dos estados-
-membros não existe uma classificação definida das atividades que figuram como artístico-culturais, assim
como não existe um consenso sobre as instituições que podem receber as doações. Em 2000, a Itália apro-
vou uma lei nacional unificada, que permite aos doadores individuais a dedução de 100% do valor doado
às instituições públicas e privadas reconhecidas como culturais. Nos cinco anos seguintes, o montante das
doações individuais em dinheiro cresceu cerca de 70%. Por outro lado, assim como a Lei Rouanet, a lei italia-
na concentrou a maior parcela das doações e as destinações dos recursos em apenas duas regiões do país.

É preciso assinalar ainda que os incentivos à cultura, ancorados na renúncia fiscal (utilizados por indivídu-
os ou empresas), correspondem a uma modalidade da atuação privada não especializada, embora com
recursos públicos. A outra modalidade diz respeito ao financiamento direto (com capital próprio) que
as grandes corporações nacionais e globais mantêm junto à cultura e às artes. Por meio de fundações
próprias (ou organizações semelhantes) diversas corporações (empresas não culturais) possuem os seus
próprios museus, centros culturais, teatros, galerias, entre outros. Todavia, esse aspecto é bastante distinto
do incentivo às atividades artístico-culturais mediante renúncia fiscal, assim como é bastante diferente
do investimento cultural público, que se destina às empresas culturais privadas especializadas e/ou às
cadeias econômico-culturais das quais fazem parte empresas de segmentos diversos como alimentação,
hospedagem, transporte, tecnologia etc. Em alguns mercados culturais, como é frequente nos Estados
Unidos e em alguns países europeus, as fundações corporativas que mantêm equipamentos culturais
próprios recebem doações individuais e também de outras empresas, ensejando as deduções fiscais dos
respectivos impostos.

39
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

OS MERCADOS CULTURAIS NOS ESTADOS UNIDOS:


A RELAÇÃO ENTRE INVESTIMENTO CULTURAL
PÚBLICO E LEIS DE INCENTIVO FISCAIS
Nos Estados Unidos, os recursos derivados das doações privadas, mediante a dedução fiscal, superam bas-
tante o investimento cultural público. No entanto, muito mais que no Brasil e na Europa, lá as relações entre
o incentivo à cultura (individual e corporativo) e o investimento cultural público estão intrinsecamente liga-
dos, constituindo um labirinto sinuoso composto de redes de comitês federais, estaduais e locais; diferentes
camadas financeiras; práticas de cogestão e partilha de custos; redes empresariais; conglomerados de entre-
tenimento; fundos privados etc. Tudo lastreado numa forte e disseminada tradição filantrópica e caritativa.
Em conjunto, esses aspectos tornam os mercados culturais norte-americanos os maiores e mais complexos
do mundo, acomodando o maior contingente de consumidores internos e as maiores corporações culturais
e de entretenimento do planeta.

É possível asseverar que os mercados culturais norte-americanos são atravessados por duas grandes aveni-
das paralelas, complementares e assimétricas; ambas se cruzam e se atravessam em determinados pontos,
apresentando aspectos do investimento cultural público e das leis de incentivo. A primeira avenida, por assim
dizer, concerne a um pungente sistema integrado de criação, produção, distribuição e consumo ampliado de
conteúdos artísticos, culturais e de entretenimento, cuja gênese remonta aos primeiros anos do século XX.
Nesse sistema, o audiovisual assume a maior centralidade, conforma um complexo que hoje integra conglo-
merados transnacionais de cinema, rádio, televisão aberta, televisão por assinatura, games, internet, música e
publicidade. São muitos elos, cadeias de valor, linguagens, práticas de consumo, monopólios e oligopólios. Nos
Estados Unidos, em 2007, somente o cinema arrecadou nas bilheterias mais de US$ 10 bilhões, acomodando
um contingente de trabalhadores de mais de 2 milhões de profissionais, que atuam em diferentes atividades e
centenas de empresas, as quais em conjunto geraram cerca de US$ 15 bilhões em impostos federais e estaduais
(MPAA, 2010).

Dos 51 estados federados que compõem o território norte-americano, 30 mantêm políticas de estímulo à
produção local de conteúdos culturais, de entretenimento e mídia. Esses estímulos se dividem em quatro
modalidades fiscais: 1) créditos de impostos reembolsáveis; 2) créditos fiscais transferíveis; 3) concessão de
descontos em equipamentos, serviços e produtos; 4) múltiplas combinações de créditos fiscais. Essas são
políticas econômico-culturais que remontam à década de 1950, quando o cinema e a televisão se tornaram
indústrias da cultura, do entretenimento e da comunicação fundamentais à economia industrial norte-ame-
ricana. Quando nos anos 1960 os Estados Unidos passaram a liderar a expansão das sociedades pós-indus-
triais (BELL, 1973), o termo indústria se tornou inapropriado, pois os conteúdos audiovisuais são conjugação
de processos industriais, tecnológicos, de serviços e de comércio.

40
ELDER P. MAIA ALVES

Em que pese a relevância interna dos mercados culturais e de entretenimento, as principais ações exis-
tentes por parte dos grandes conglomerados privados, do governo central e dos profissionais criativos
são direcionadas para o exterior. Nesse ponto, o investimento cultural público fica mais definido, embora
seja de natureza mais política do que econômica, como acontece no Brasil e na Europa. Em 1937, a pri-
meira versão do filme Branca de Neve, do estúdio Disney, obteve uma bilheteria final de US$ 8,5 milhões.
Nas décadas de 1940 e 1950, os filmes norte-americanos criados, produzidos e distribuídos pelos princi-
pais estúdios de Hollywood grassaram por todo o mundo, granjeando elevadas taxas de lucro. Ainda no
início do século XX, o governo federal aprovou uma legislação que passou a permitir que companhias
concorrentes dentro do território norte-americano pudessem se associar em projetos e atividades co-
muns fora do país. Essa medida legal facultou que os grandes estúdios cinematográficos se reunissem
num cartel específico chamado Motion Picture Association of America (MPAA), responsável pelas
principais estratégias políticas e comerciais do cinema norte-americano fora dos Estados Unidos. Como
corolário, desde a década de 1950, o Departamento de Estado, por meio da sua Secretaria de Comércio
Exterior, pressiona seus principais parceiros comerciais e aliados militares a permitir, sem restrições, o in-
gresso dos filmes e conteúdos audiovisuais norte-americanos nos seus respectivos mercados. Essa pres-
são se fez sentir especialmente durante as principais rodadas de negociação no âmbito da Organização
Mundial do Comércio (OMC), notadamente por ocasião da revisão e atualização dos grandes acordos
de livre comércio, como o Nafta (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio) e o Gatt (Acordo Geral
de Tarifas e Comércio).

A atuação da Secretaria de Comércio do Departamento de Estado ocorre em duas frentes. A primeira se


dedica a fazer com que os governos nacionais reconheçam e adotem as leis norte-americanas de proprie-
dade intelectual. A segunda consiste em dissuadir os parceiros comerciais (como o Brasil e os membros da
União Europeia) de adotar políticas de fomento e desenvolvimento dos cinemas nacionais e locais, como o
FSA, que, entre outros aspectos, reduziu drasticamente a participação das companhias norte-americanas no
negócio da distribuição dos próprios filmes brasileiros. Este último aspecto é comum nas negociações dos
acordos multilaterais de comércio, uma vez que a OMC (órgão em que as principais potências econômico-
-culturais exercem bastante poder) impõe restrições para determinadas práticas de subsídios, apoio e sub-
venções (como a redução de impostos) aos produtos locais e nacionais. Nos últimos dez anos, a atuação
da Secretaria de Comércio do Departamento de Estado se intensificou ainda mais, porquanto o pêndulo
da relação entre consumo nacional e internacional se inverteu. No final do século XX, 60% de todo o fatu-
ramento dos filmes norte-americanos advinha do consumo interno; dez anos mais tarde esse porcentual se
inverteu. Em 2007, a quantia global de ingressos vendidos para os filmes norte-americanos totalizou US$
26,7 bilhões; desse montante US$ 17,1 bilhões vieram de ingressos vendidos no exterior, o que representou
63% do total (MPAA, 2007).

41
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

No período entre 2004 e 2008, a venda de ingressos para os filmes norte-americanos cresceu 17% em todo
o mundo, alcançando 105 países. Fora dos Estados Unidos, os principais contingentes de consumidores são:
China (US$ 2,7 bilhões); Japão (US$ 2,4 bilhões); Reino Unido (US$ 1,7 bilhão); Alemanha (US$ 1,6 bilhão);
Espanha (US$ 1,5 bilhão); Itália (US$ 1,4 bilhão); França (US$ 1,3 bilhão); e Austrália (US$ 1,2 bilhão). Entre
os anos de 2008 e 2013, dos 20 filmes mais vistos no globo, todos foram produzidos ou coproduzidos pelas
corporações audiovisuais norte-americanas. Conforme a Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio
e Desenvolvimento (UNCTAD), em 2013 cerca 80% de todos os filmes consumidos no globo foram produ-
zidos por seis grandes conglomerados norte-americanos: Warner Bros, Fox, Universal, Disney, Paramount/
Sony e Columbia. Segundo Stigler, essas companhias forjam os oligopólios de franja, que, também como
salienta Martel, consistem no controle do processo de financiamento (atuando de maneira semelhante a um
banco). Elas delegam as etapas de criação, produção, distribuição e licenciamento a um conjunto de outras
empresas (micro, pequenas e médias), que ficam sob sua coordenação e seu domínio direto ou indireto.

Se os conglomerados audiovisuais norte-americanos exercem os oligopólios de franja, instituídos e conso-


lidados com o apoio do Estado, um mecanismo semelhante está sendo urdido nas interfaces mais recentes
entre cultura, tecnologia e comunicação. De acordo com Martel, opera-se atualmente uma das maiores
transformações já vistas no domínio econômico-cultural: a passagem definitiva do consumo de bens e pro-
dutos culturais para a era dos serviços culturais digitais. Essa transformação tem como alguns dos seus prin-
cipais artífices as quatro maiores empresas de tecnologia do globo, todas norte-americanas: Google, Apple,
Facebook e Amazon (Gafa). Embora aparentemente sejam apenas companhias de tecnologia, o Gafa está
se tornando o maior controlador, distribuidor e comercializador de imensas quantidades de conteúdo de
cultura e entretenimento. Conforme Martel, o grupo realiza uma intensa defesa dos seus interesses corpo-
rativos junto ao governo norte-americano e atua como financiador de partidos políticos e organizações da
sociedade civil em diversos lugares do globo.

Em 2015, existiam 3,2 bilhões de pessoas com acesso à internet, sendo que desse total 1,4 bilhão possuía
smartphones com acesso móvel à rede. Em 2013, por meio do iTunes, sua loja digital de venda e assinatura
de música, a Apple já controlava 25% de todas as músicas digitais compradas nos Estados Unidos. Além da
venda de livros digitais por meio do seu leitor Kindle, a Amazon tem se destacado com a sua Amazon Prime
Instant Video, plataforma global por assinatura que utiliza a tecnologia streaming e o modelo de negócio
on demand. A companhia também oferece a Amazon Cloud Player, plataforma que permite a compra e o
armazenamento digital de música. Cada vez mais, o Gafa busca atuar junto aos serviços culturais digitais,
como a Apple Music e o Google Play, tencionando se aproximar de plataformas globais já consagradas como
Pandora, Deezer, Spotify, na música, e Netflix, no cinema. Estima-se que muito em breve existirão serviços
(provavelmente oferecidos pelo Gafa) de assinatura para livros, games e outros. Também o Gafa realiza uma
espécie de monopólio de franja, controlando diversas outras empresas de distribuição de conteúdos culturais

42
ELDER P. MAIA ALVES

de entretenimento, como o YouTube (maior plataforma audiovisual do planeta), controlado pelo Google, e
o WhatsApp, controlado pelo Facebook. Em 2013, apenas o Google e a Apple, juntos, possuíam US$ 200
bilhões em ativos financeiros, o suficiente, segundo Vogelstein, para comprar mais da metade de Hollywood.

Os mercados culturais norte-americanos são os mais digitalizados do globo, tendo mais de 50% dos conte-
údos musicais consumidos através de plataformas digitais. Os serviços de acesso aos conteúdos de games,
séries e filmes também se encontram bastante digitalizados, abrigando modelos de negócios com acen-
tuadas taxas de inovação tecnológica. O grau de digitalização dos mercados culturais nacionais (musical,
audiovisual, de game e outros) decorre das interfaces entre as empresas culturais, as empresas de tecnolo-
gia, as políticas estatais de expansão dos serviços de internet e os gastos orçamentários das famílias com os
serviços culturais-digitais. Nos Estados Unidos, no Reino Unido, na Alemanha e no Japão, por exemplo, as
sinergias internas entre esses agentes contribuem para o domínio das exportações desses serviços e para
a conquista de novos contingentes de consumidores, que se materializa tanto por meio do consumo dos
conteúdos quanto pelo uso das tecnologias patenteadas. Não é por acaso que as principais companhias de
tecnologia e de internet do planeta, que integram o Gafa (todas com sede nos Estados Unidos), se inte-
ressem pelo controle, pela distribuição e pela comercialização de conteúdos culturais na forma de serviços
digitais de assinatura. O sucesso da Netflix, com seus 80 milhões de assinantes (meados de 2016), 42% deles
fora dos Estados Unidos, e o seu faturamento global de US$ 5,5 bilhões (2014), atesta a centralidade do
capitalismo cultural-digital. Embora não pareça, o Estado, por meio das agências federais norte-americanas,
está na gênese de todo esse processo, pois, como sustenta Mazzucato, implementou ecossistemas de apoio
à inovação tecnológica que, entre outros aspectos, estão por trás de criações como o iPhone, da Apple.

gráfigráfico
co 11: 11: receita anual
receita anual da Netfl
da Netflix ix 2002-2014
2002-2014 (em milhões) (em milhões)

6,000
5.504,66
5,000
4.374,56
4,000
3.609,3
3.204,6
Receita

3,000
2.162,6
2,000 1.670,3
996,7 1.205,3 1.364,7
1,000 682,2
270,4 500,6
150,8
0
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Fonte:
Fonte: União
União Européia
Europeia

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

A segunda grande avenida que atravessa os mercados culturais dos Estados Unidos concerne às diversas
interfaces entre o incentivo à cultura e a renúncia fiscal. Não existe no país uma lei federal de incentivo à
cultura, tampouco existe um órgão nacional centralizado que formule e execute políticas culturais. O fi-
nanciamento desse tipo de política nos Estados Unidos constitui uma espécie de mosaico, assentado num
complexo sistema de cogestão dos recursos advindos das instituições federais, estaduais e municipais (con-
selhos gestores) e dos recursos originários das doações. Do ponto de vista financeiro, as políticas culturais
norte-americanas são executadas a partir de uma cesta composta de diferentes recursos.

A partir de 1870, foram criados nos Estados Unidos diversos museus, orquestras e bibliotecas locais, equi-
pamentos públicos que passaram a ter grande penetração no território norte-americano, embora tivessem
ainda pouca visitação e fossem muito mais acolhidos pelas elites culturais e econômicas locais. No decurso
da década de 1930, no bojo de uma série de reformas, esses equipamentos, especialmente os museus, pas-
saram a se vincular às práticas educacionais de formação artística e a um interesse coletivo mais ampliado.
Nessa mesma década, ocorre uma grande expansão dos museus: de 167 unidades em 1930 para 387 em 1938
(DIMAGGIO, 1991). O financiamento dessa rede nacional de museus era partilhado entre as prefeituras
e os curadores corporativos, as empresas. As primeiras forneciam o imóvel, arcavam com a manutenção e
financiavam os custos dos projetos de educação artística, já os segundos ampliavam os acervos e arcavam
com os salários dos profissionais, como diretores e especialistas. Esse foi o lastro inicial que originou uma
rede nacional de museus e equipamentos culturais públicos.

Desde o início do século XX, os museus tornaram-se objeto de robustas doações, mas as quantias recru-
desceram bastante a partir da década de 1920, quando se abriu a possibilidade legal de dedução dos valores
doados. Embora largamente praticadas desde meados do século XIX, a filantropia e as doações caritativas
– para educação, religião, saúde, artes, entre outras – só foram regulamentadas e disciplinadas nas primeiras
décadas do século XX, primeiro para as pessoas físicas, em 1917, depois para as corporações, em 1935. A
partir de então, os indivíduos e as empresas doadoras puderam deduzir o valor doado dos impostos federais
e estaduais devidos, variando de acordo com as alíquotas e limites específicos. Por conseguinte, as doações
para os museus saíram de US$ 15 milhões em 1910 para US$ 58 milhões em 1930.

Em 1965, o governo federal criou a National Endowment for the Arts (NEA), agência pública ligada à esfera
da administração federal, mas com independência política e orçamentária. Mais importante do que a cen-
tralidade política e a coordenação exercida pela NEA foi a indução que a nova agência imprimiu. Muito em
razão de sua existência, no decorrer das décadas de 1960 e 1970, foram criadas diversas agências estaduais
e locais com o propósito de receber e gerenciar recursos repassados pela instituição federal, na forma de
convênios e parcerias. Nos 20 primeiros anos de existência, a agência teve o seu orçamento expandido, acu-
mulando reconhecimento e bastante prestígio junto à comunidade de artistas, segmentos da sociedade civil,

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ELDER P. MAIA ALVES

imprensa e empresas. Nos anos seguintes, os recursos da NEA foram sistematicamente reduzidos, perfazen-
do em 1997 a soma de US$ 98 milhões, ao passo que as agências estaduais e municipais administraram US$
305 milhões e US$ 700 milhões, respectivamente. Somados em 1997, os orçamentos das agências governa-
mentais para as artes nem mesmo se aproximam da exuberante soma de US$ 10 bilhões decorrentes das
doações (individuais e empresariais) destinadas ao segmento tipificado como arte, cultura e humanidades.
O volume financeiro das doações individuais e empresariais para as instituições caritativas e filantrópicas só
tem crescido nos Estados Unidos. Figuram nessa lista aproximadamente 2 milhões de organizações das mais
distintas áreas, acomodando cerca de 10 milhões de trabalhadores. Do volume total de doações, que em
2015 chegou a US$ 373,2 bilhões, em média 70% têm sido realizado por indivíduos, que lançam mão do valor
doado para descontar dos impostos devidos. A proeminência das doações individuais decorre da organiza-
ção do sistema tributário norte-americano, que concentra a maior parcela dos tributos nas pessoas físicas, e
não jurídicas, como ocorre por exemplo no Brasil.

tabela 9: participação do segmento arte no sistema de doações dos EUA


tabela 9: participação do segmento arte no sistema de doações dos Estados Unidos

DOAÇÕES PARA
TOTAL DE DOAÇÕES PARTICIPAÇÃO
ANO ARTE, CULTURA
EM BILHÕES (US$) NO TOTAL
E HUMANIDADES

1997 270 10,1 4,8%

2006 350 12,5 3,5%

2015 373 18,6 5%

Fonte: Giving USA


Fonte: Giving USA

A tabela 9 fornece um pequeno retrato da dinâmica recente dos recursos advindos da totalidade das do-
ações caritativas e filantrópicas, especialmente daquelas feitas ao segmento artes, cultura e humanidades.
Como se pode constatar, em 2015, as doações para esse último segmento foram 55 vezes superior à Lei
Rouanet, por exemplo. É preciso sublinhar que tanto as doações individuais quanto as corporativas são des-
tinadas a instituições específicas: museus, galerias, centros de cultura, bibliotecas, orquestras, teatros, televi-
sões públicas e rádios comunitárias; na maioria dos casos elas estão situadas próximo ao local de residência

45
O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

dos doadores ou, de algum modo, já fizeram parte das suas trajetórias. Diante desse aspecto, seguindo a
sugestão de Tao Wu, inscrita na tabela 10, é possível identificar com precisão o sistema de autogestão das
instituições artístico-culturais e a composição da cesta de financiamento.

tabela 10:tabela
composição médiamédia
10: composição da receita de 155
da receita museus
de 155 públicos
museus públicosnos
nos Estados
EUA (1989)Unidos (1989)

VALOR
NATUREZA DA RECEITA % DO TOTAL
(em milhões de US$)

Receita operacional (receita própria) 122,4 14

Auxílio doado (receita doada) 235,0 27

Valor das doações de arte 77,3 8,9

Total de auxílio federal 95,7 11

Total de auxílio estadual e local 168,7 19,3

Receita de doações 173,0 19,8

TOTAL 872,1 100

Fonte: Don Fonte:


Fullerton,
DonapudFullerton,
Tao Wu apud Tao Wu

A tabela 10 exige tratamento um pouco mais detalhado. Embora os dados se refiram a 1989, o financiamen-
to artístico-cultural nos Estados Unidos continua obedecendo a essa composição e, principalmente, man-
tendo uma espécie de sistema de partilha. Ou seja, embora os valores financeiros decorrentes das doações
tenham se elevado bastante, como atesta a tabela, os porcentuais se mantiveram relativamente os mesmos.
Como assinala Tao Wu, 1/3 da soma do auxílio doado com o valor das doações de arte foi descontado pelos
doadores/contribuintes (individuais e corporativos). Significa dizer que, do total de US$ 312,3 dessas duas
rubricas, US$ 104,1 milhões foram de incentivos fiscais. Do mesmo modo, também 1/3 dos US$ 173 milhões
da rubrica receita de doações foi decorrente de doações dedutíveis dos impostos. Somadas, essas rubricas
de renúncia fiscal perfazem 18,6% da receita dos 155 museus. De acordo com Wu, outro mecanismo de
incentivo fiscal presente na tabela 10 diz respeito a não tributação das receitas operacionais líquidas, arreca-
dadas pelos museus na forma de venda de ingressos, taxas de estacionamento, venda de produtos nas lojas,

46
ELDER P. MAIA ALVES

comercialização de alimentos nos restaurantes e também aluguel de espaços para eventos realizados nas
dependências dos museus. O auxílio federal corresponde aos recursos repassados pelo NEA, já os auxílios
estaduais e municipais concernem aos valores distribuídos por meio das agências estaduais e municipais.

tabela 11:tabela
composição das receitas
11: composição do Museu
das receitas Metropolitano
do Museu Metropolitanode
de Arte, Nova
Arte, Nova York
York (1989)
(1989)

MONTANTE % DA RECEITA
NATUREZA DA RECEITA
(em milhões de US$) TOTAL

Ingressos 9,5 12,7

Associados 10,5 14,0

Cidade de Nova York 9,9 13,2


(manutenção e segurança)

Cidade de Nova York (serviços públicos) 5,5 7,3

Doações 10,8 14,4

Receitas líquidas de atividades auxiliares 6,2 8,3

Doações e verbas 12,0 16,0

Apoio para exposições locais 6,7 8,9

Outros 3,9 5,2

TOTAL 75 100

Fonte: Museu Metropolitano de Arte, apud Tao Wu

Fonte: Museu Metropolitano de Arte, apud Tao Wu.

A tabela 11 busca esquadrinhar as distintas fontes de receita que compõem a cesta de recursos do Museu
Metropolitano de Arte, de Nova York. Cerca de 1/3 das rubricas relativas às doações e contribuições de
associados é dedutível; a rigor, trata-se de renúncias fiscais concedidas principalmente às pessoas físicas. Tao
Wo sustenta que quanto maiores as alíquotas de dedução tanto maiores as doações para as instituições cari-

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

tativas e organizações artístico-culturais, principalmente os museus. Outra modalidade de subsídio indireto,


na forma de renúncia fiscal, diz respeito à isenção dos impostos prediais. Como são organizações caritati-
vas públicas, os museus estão dispensados dos impostos prediais, mesmo ocupando as áreas urbanas mais
valorizadas de muitas das metrópoles norte-americanas. Mulcahy não deixa dúvidas quanto à centralidade
das doações (e à sua contrapartida tributária correspondente) para o financiamento das políticas culturais
norte-americanas:

O subsídio público indireto proporcionado pelas doações filantrópicas apoiadas em deduções


fiscais é o elemento central na sustentação dos oito mil museus, das duas mil comissões de
preservação local, dos 351 canais de TV pública, das 584 estações de rádio, dos sete mil teatros
comunitários, das 1,8 mil orquestras sinfônicas, entre outros componentes da infraestrutura cul-
tural da nação (MULCAHY, apud DURAND, 2013, p. 106).

As tabelas 10 e 11 concorrem para sedimentar outro aspecto deveras relevante: as doações financeiras rea-
lizadas pelos indivíduos para os museus (mais tarde deduzidas de parte dos impostos devidos) são converti-
das em investimentos, materializados na qualificação dos espaços, em novas instalações, na criação de novos
serviços (lazer, entretenimento, parques infantis, entre outros), e também na aquisição de obras e diversifi-
cação dos acervos. A cada cinco anos aumenta em 10% o número de museus no mundo (LIPOVETSKY,
2015), que cada vez mais têm se convertido em centros de cultura, entretenimento e lazer, compostos de ba-
res, restaurantes, cafés, livrarias, lojas e casas de show. Os museus estão no centro dos atravessamentos entre
diversos fluxos simbólicos e econômicos globais, que inscrevem as cidades e os seus equipamentos culturais
e artísticos na espiral do consumo da experiência e da fruição simbólica, conjugando investimentos corpora-
tivos, estatais e técnicos que têm definido as metrópoles globais como grandes mercadorias estéticas.

De acordo com a Organização Mundial do Turismo (OMT), o turismo cultural é a modalidade que
mais cresce no mundo. Na lista dos dez museus com maior fluxo de visitante ao redor do globo, os
Estados Unidos figuram com dois, o Museu de Arte Metropolitana, de Nova York, e a Galeria Nacio-
nal de Arte, localizada em Washington D.C., além de diversos outros que figuram no elenco dos 50
mais visitados mundialmente. Os museus que aparecem no gráfico 12 mantêm sofisticados sites e
guias virtuais de visitação, que delineiam experiências novas de consumo, desencadeando interesses
artísticos e a construção de modelos de negócios que ancoram arte, tecnologia, entretenimento e
turismo. Como se pode constatar, no caso dos Estados Unidos, a renúncia fiscal que se exprime por
meio principalmente das doações individuais é parte do investimento cultural público, que, no caso
dos principais museus, potencializa e municia diversas cadeias de valor econômico-culturais, variados
usos e extensos interesses no âmbito do capitalismo cultural-digital.

48
ELDER P. MAIA ALVES

gráfico
gráfico 12: museus
12: museus maisvisitados
mais visitados nono
mundo (milhões
mundo de visitantes,
(milhões 2012)
de visitantes, 2012)

Louvre 9,72
Museus de Arte Metropolitana 6,12
Museu Britânico 5,58

Tate Modern 5,30

Galeria Nacional 5,16

Museus do Vaticano 5,06

Museu do Palácio Nacional 4,36

Galeria Nacional de Arte 4,20

Centre Pompidou 3,80


Musée d’Orsay 3,60

Museus dos Estados Unidos

Fonte: União Europeia


Fonte: União Européia

INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO E LEIS DE


INCENTIVO NOS MERCADOS CULTURAIS DO MÉXICO
Superado apenas pelo Brasil, o mercado cultural mexicano é o segundo mais importante da América Latina.
Nele se combinam diferentes políticas culturais, políticas econômico-culturais, leis de incentivo e um fluxo
crescente de consumo cultural, digital e tecnológico por parte das famílias. Salta aos olhos, desde a década
de 1970, a densidade institucional das políticas para as culturas populares e tradicionais, que teve na criação
do Departamento de Arte Popular e na instituição do Fundo Nacional para o Fomento do Artesanato os
seus dois principais instrumentos administrativos e financeiros. Antes, em 1954, o governo federal já havia
criado o Instituto Nacional de Belas Artes. Embora não exista um ministério da cultura ou um órgão nacional
executivo centralizado, o Conselho Nacional para a Cultura e as Artes exerce uma função de coordenação
parcial junto às municipalidades e instituições estaduais. A extensa rede de equipamentos culturais (museus,
centros de artesanato, sítios históricos e bibliotecas) financiados pelo Estado confere às políticas culturais
mexicanas uma estreita vinculação com o turismo étnico-cultural, cujo fluxo tem se intensificado nos últimos
dez anos e se aninha a eventos de grande envergadura, como a Feira Internacional do Livro de Guadalajara.

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

Assim como nos países explorados, as políticas econômico-culturais têm assumido centralidade no México.
Maior evento literário de língua hispânica e uma das maiores feiras editoriais de todo o mundo, a Feira Interna-
cional do Livro de Guadalajara exprime bem o teor desse perfil de política. Ali se plasmam os interesses dos prin-
cipais agentes do mercado editorial ibero-americano: 1) empresas – extensas redes empresariais do segmento
livro, compostas de executivos, escritórios de agentes literários, editores, empresas de design gráfico, empresas
de tecnologia etc.; 2) profissionais criativos – escritores, críticos literários, roteiristas, jornalistas especializados, en-
tre outros; 3) empresas não culturais que, mediante os incentivos fiscais locais e nacionais, patrocinam o evento;
também são financiadoras as grandes corporações e conglomerados globais que prescindem dos incentivos
fiscais, como Coca-Cola, IBM, Telefônica, Kinder e Santander; 4) os diferentes estratos de consumidores, cujo
perfil heterogêneo pressiona os primeiros agentes a incorporar em seus projetos editoriais variados conteúdos
e gêneros, como histórias em quadrinhos, mangás e games; 5) a atuação das organizações governamentais e
estatais mexicanas, locais, estaduais e nacionais, tanto na forma de subsídios diretos quanto na forma de renúncia
fiscal ou na construção da infraestrutura logística do evento. Criada em 1987, nos últimos dez anos a Feira Inter-
nacional do Livro de Guadalajara ganhou magnitude e envergadura global, apresentando dados eloquentes.
tabela 12: dados da Feira Internacional do Livro de Guadalajara

tabela 12: dados da Feira Internacional do Livro de Guadalajara

ATIVIDADE 2014 2015


Publico visitante 765.706 787.435
Editoras 1.945 1.983
Países presentes 44 44
20.393 20.517
Agentes literários 282 304
Público infantil 162.709 188.002
Atividades para o público jovem 161 148
Meios de comunicação 569 533
Empresas participantes das seções de direitos autorais 120 125
2.722 2.397
Foros literários 118 124
Foros acadêmicos 26 21
Atividades artísticas 123 94
Lançamento de livros 590 607
142 150
Prêmios 13 13
Patrocinadores 63 63
Número de visitantes ao site durante os nove dias de evento 4.536.270 4.723.231

Fonte:
Fonte: Feira Feira Internacional
Internacional do Livro dedoGuadalajara
Livro de Guadalajara.

50
ELDER P. MAIA ALVES

A Feira Internacional do Livro de Guadalajara se inscreve numa frente de expansão do mercado edito-
rial hispânico, que tem nas editoras mexicanas o seu principal agente empresarial. Por causa do Nafta, os
conteúdos de língua espanhola penetram o território norte-americano, percorrendo circuitos de leitura, de
circulação e de consumo pouco explorados pelas grandes redes editoriais norte-americanas. Em 2014, o
governo mexicano, por meio do Conselho Nacional para a Cultura e as Artes, lançou a plataforma on-line
librosmexico.com, que disponibiliza o conteúdo digital de livros da literatura mexicana, clássicos da língua
espanhola e documentos históricos. Com a circulação e distribuição desses conteúdos, a meta dessa plata-
forma é alcançar, entre 2013 e 2018, um crescimento de 4% no número de leitores.

gráfico
gráfico 13:13: número
número deproduzidas
de cópias cópias produzidas – literatura mexicana
– literatura mexicana

160,000
145,756
142,860
140,000
129,213 131,849
121,853
120,000

100,000
82,242 79,432 75,487 90,014 98,528
80,000 (67%) (61%) (57%) (63%) (68%)

60,000

40,000
39,611 49,781 56,362 52,846 47,228
20,000
(33%) (39%) (43%) (37%) (32%)
0
2009 2010 2011 2012 2013

Reproduzidas

Novas

Fonte: Unesco
Fonte: Unesco

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O CAPITALISMO CULTURAL-DIGITAL: INVESTIMENTO CULTURAL PÚBLICO VERSUS INCENTIVOS FISCAIS

As políticas econômico-culturais mexicanas têm potencializado o processo de digitalização dos mercados


culturais nacionais e, como corolário, a penetração junto aos contingentes de consumidores ibero-america-
nos e falantes do espanhol. O projeto Cidade Criativa Digital, por exemplo, levado a cabo pela Secretaria de
Economia do país, consiste em apoiar as empresas de game, cinema, animação e multimídia no sentido de
gerar conteúdo inédito direcionado à exportação, assegurando ganhos comerciais e econômicos por meio
das leis de propriedade intelectual celebradas junto aos países hispânicos. Em 2014, os serviços e produtos
de audiovisual, games, multimídia e animação adicionaram aproximadamente US$ 26 bilhões à economia
mexicana. A expansão do consumo cultural das famílias, assim como a demanda por conteúdos de língua
espanhola por parte dos mexicanos e hispânicos que residem nos Estados Unidos, fez recrudescer a de-
manda por conteúdos audiovisuais de origem mexicana. Os dados acerca da companhia Televisa (um dos
maiores grupos de televisão e audiovisual do mundo) atestam esse processo. Os latinos já representam 17%
da população norte-americana, eles constituem o grupo étnico-nacional que mais consome serviços e bens
culturais nos Estados Unidos, 47% (entre os não hispânicos esse porcentual é de 25%), e realizam streaming
de vídeos e demais linguagens digitais ao menos uma vez por semana.

gráfico
gráfico 14: 14:
produção da companhia
produção Televisa (2004
da companhia a 2013) (2004 a 2013)
Televisa

93.323
90.492

79.152
74.929
72.890
71.326 2,1
68.818
2,0
64.743
1,9
1,8
57.548
54.791 1,7 1,7
1,6 1,6
1,5
1,4

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Receita (US$ em bilhões) Horas produzidas

Fonte: Unesco

Fonte: Unesco
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ELDER P. MAIA ALVES

Ao mesmo tempo que experimenta um contundente processo de digitalização, ancorado principalmente


na demanda externa e na expansão dos serviços locais de internet após anos de estagnação, o México se
notabiliza por um elevado grau de informalidade e pirataria nas suas principais cadeias econômico-culturais,
multiplicando negócios invisíveis que não são capturados pelos índices oficiais de consumo cultural, tampou-
co são objeto das políticas de investimento cultural público. Similar ao Brasil nesse e em outros aspectos, o
mercado cultural mexicano, no entanto, se diferencia pela extensão e capilaridade dos equipamentos cultu-
rais públicos nacionais (especialmente os museus) e por sua estreita vinculação ao turismo étnico-histórico.
Nesse acaso, diferente do sistema híbrido e interdependente composto de doações dedutíveis e investi-
mento cultural público existente nos Estados Unidos, a atuação pública na área da cultura se exprime de
maneira mais direta.

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