Aos vinte e um dias do mês de agosto de dois mil e quatorze, às
quatorze horas, na sala trezentos e onze, do Palácio Tiradentes, reuniu- se a Comissão de Cultura, com a presença da Deputada ASPÁSIA CAMARGO, membro efetivo deste órgão técnico. Havendo número regimental, assumiu a Presidência a Deputada ASPÁSIA CAMARGO que declarou abertos os trabalhos da 4ª Audiência Pública da Comissão de Cultura, conforme convocação por edital publicado em 19.08.2014, com a seguinte Ordem do Dia: A CULTURA DO HIP HOP. Após a composição da Mesa, iniciou-se a apresentação do tema, seguido de amplo debate com a participação dos presentes. Antes de encerrar os trabalhos, nada mais havendo a tratar, e como ninguém quisesse fazer uso da palavra, a Deputada ASPÁSIA CAMARGO, no exercício da Presidência, solicitou que fosse publicada, na íntegra, a transcrição taquigráfica da presente Audiência Pública que segue em anexo e, em seguida, suspendeu a reunião, para que eu, Haroldo Motta Lima Leão de Aquino, Secretário, lavrasse a presente Ata. Reabertos os trabalhos, foi a Ata lida, aprovada, tendo sido assinada por mim e pela Deputada ASPÁSIA CAMARGO, no exercício da Presidência. Sala das Comissões, em vinte e um de agosto de dois mil e quatorze.
(a)Haroldo M. L. L. de Aquino - Secretário
Deputada ASPÁSIA CAMARGO - no exercício da Presidência
COMISSÃO DE CULTURA
4ª Audiência Pública
Realizada em 21 de agosto de 2014
A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Boa-tarde a todos.
Obrigada por terem vindo. Muito obrigada ao DJ TR e ao Arcélio pelo trabalho de coordenação aqui desse nosso primeiro encontro. Sob a proteção de Deus, declaro aberta a 4ª audiência pública da Comissão de Cultura, conforme Edital publicado em 19 de agosto de 2014, com a Seguinte Ordem do Dia: A Cultura do hip hop. Em nome do Deputado Zaqueu Teixeira, que é presidente da Comissão, e que por razões imperiosas teve que viajar para São Paulo e não pôde estar aqui, em meu nome pessoal, quero agradecer a todos vocês e dizer que Assembleia Legislativa se sente muito honrada de receber os representantes e lideranças desse movimento, que é um movimento de extrema importância, não apenas no nosso estado, na nossa cidade do Rio de Janeiro, mas no mundo inteiro. E sabemos também que, exatamente, porque esse movimento é global, internacional, é que ele tem também raízes em diversos lugares e ele assume também as características, digamos, identidades dos países no qual ele se desenvolve. Então, podemos imaginar que, como tudo na vida, como o rock, como o samba, como tudo, até o jazz, é um tipo, é uma modalidade de expressão artística que precisa ser bem conhecida, inclusive nas suas diferentes modalidades, nas suas diferentes tendências. Confesso a vocês que ainda não estou totalmente familiarizada com as tendências, mas posso, com segurança, dizer a vocês que sou uma apaixonada entusiasta por essa manifestação cultural, que ninguém sabe definir, porque é muita coisa ao mesmo tempo. É ritmo, é poesia, é grafite e, sobretudo, é expressão cultural, que é uma coisa tão importante para nossa cidade, o nosso estado, mais para qualquer outro do Brasil – talvez a Bahia seja outro estado onde essas coisas da cultura popular ganham uma dimensão muito grande – mas, no Brasil, o Rio de Janeiro é campeão em abrigar essas inovações, essa criatividade. Eu vou falar um pouco sobre isso. Mas, antes, eu queria agradecer aqui também a presença do Thiago Gomes, que está representando a Secretaria de Cultura. Isso é muito importante, porque a Secretaria tenha um envolvimento com todas essas manifestações e tem, inclusive, espaços institucionais para desenvolver esse tipo de atividade. E queria sobretudo homenagear o meu querido Sérgio, que está aqui representando várias coisas. Eu acho que ele representa tanta coisa, mas vou me fixar aqui nesse livro, que é um grande livro, um livro importante, um livro que foi produzido com uma sabedoria e um conhecimento de causa muito grande e que precisa ser lido por todo mundo. Eu queria dizer que o “Acorda hip hop”, do DJ TR, é uma contribuição inestimável para o conhecimento do movimento e para a familiaridade maior que todos os fluminenses e cariocas deveriam ter com esse ritmo e com essa manifestação cultural que está aqui em discussão. E, logicamente, eu queria chamar a atenção de vocês para o aspecto pedagógico desta reunião, porque estamos gravando tudo. Tudo o que vocês disserem, tudo que eu estou dizendo, tudo que a Mesa vai dizer será gravado. E nós, aqui, como a Assembleia Legislativa, temos um propósito que é sempre presente nas reuniões como essas, nas audiências públicas, que é fazer propostas, fazer encaminhamentos, dar sugestões de encaminhamento para que as coisas que são importantes tenham o seu lugar e o seu espaço, sejam tratadas com a devida dignidade, com a devida ênfase, e que não sejam esquecidas como mais uma coisa, mais uma manifestação que está por aí. A Comissão de Cultura é um espaço privilegiado para isso. Agora mesmo, nós vamos, nos próximos meses ou até, talvez, semanas, receber aqui uma proposta de um projeto de lei sobre o sistema estadual de cultura. Eu tenho certeza de que vocês querem um lugar nesse sistema. O que nós podemos fazer com o hip hop nas escolas? O que nós podemos fazer com o hip hop nos centros culturais, nos pontos de cultura? O que nós podemos fazer com o hip hop na sua dimensão mais transcendente, que é a capacidade de incluir pessoas? Não incluir dando esmola, não incluir dando uma compensação para acomodar ou minimizar a pobreza, mas dar um espaço para exprimir com grandeza aquilo que só a arte pode fazer, que é a criatividade, a transcendência, o pertencimento, o sentimento de pertencimento. Eu tenho certeza de que vocês vão falar muito sobre isso, o livro já fala muito sobre isso. A história do hip hop é uma história de pertencimento e inclusão, mas é muitas coisas mais, que, inclusive, eu tive oportunidade de discutir num Skype maravilhoso com alguns de vocês, com o Sérgio presente, e liderando a discussão, que nos levam, por exemplo, a constatar o papel pacificador do hip hop, como é o papel pacificador da arte em geral. As pessoas que encontram um espaço para se expressar com dignidade, com grandeza realizam muito mais do que simplesmente dar vazão ao seu próprio talento, à sua própria criatividade. Elas incluem milhares de outras pessoas iguais ou parecidas que precisam desse espaço também para ocupar, para exercer um papel social de maior influência. Como a arte é um mistério, um grande mistério, indecifrável mistério, nós temos também – vocês sabem disso melhor do que eu – os efeitos imprevisíveis dessa criatividade, porque a gente sabe como começa, mas não sabe como acaba. A história do jazz e a história do samba são exemplos disso. Eu vi na história do hip hop muito coisa não igual, mas parecida – a capacidade de agregar, por exemplo, etnias que estão sendo marginalizadas. Muitas vezes, depois, ao longo da história do jazz, por exemplo, essas etnias que foram a alma, a negritude que foi a alma desse ritmo extraordinário e dessa explosão extraordinária de cultura foi afastada. Houve várias guerras no meio da história do jazz de aproximação e exclusão, quando os brancos quiseram tomar o poder, e tomaram, no curso de vários anos, e depois foram afastados. Ao mesmo tempo, há mistura, que é a alma da cultura. A cultura que não se mistura não é cultura. Mas, às vezes, ela precisa se distinguir para poder se misturar depois; ela tem que se distinguir para se expressar e, às vezes, o próximo passo é justamente essa miscigenação cultural, essa capacidade de agregar tantos elementos importantes da nossa vida social que ficam como um fio desencapado, sem solução. Realmente, a história no nascimento do hip hop é irresistível. Não há quem não se comova, não há quem não se toque com a forma como esse movimento nasceu, um movimento fortemente social que deu uma alternativa para pessoas que não tinha alternativa nenhuma, que levantou pessoas que estavam em nível de degradação e de desespero, de desencanto completo, perdidas, sem nenhuma saída a não ser a autodestruição e a marginalidade crescente. Então, quando você vê a cultura, o papel regenerador da cultura, que cria a possibilidade de reconstituir um bairro, de incluir pessoas que se sentiam completamente excluídas, este é um aspecto que, inegavelmente, o hip hop exerceu com imensa criatividade. Eu, por exemplo, que amo a cultura acima de todas as coisas, tinha vontade de ficar aqui falando com vocês das coisas que entendi, primeiro, espontaneamente, porque acho extraordinário, fascinante, mas também, porque vocês estão me ensinando. Então, sou uma aluna aplicada. Só vou ter sossego o dia que vocês conseguirem me fazer dançar um break, porque o que gosto disso é uma coisa que me deixa alucinada, fico alucinada quando vejo o mistério do break. Como é possível uma coisa daquela que parece que está indo, mas está voltando? É uma coisa filosófica, não é? Porque, primeiro, não tem regra fixa, como o samba não tem e o jazz também não. Isso dá um espaço para quem faz, para quem inventa, inclusive para quem executa, uma enorme criatividade, porque não é a palavra sagrada definitiva é um movimento, um processo. Então, vocês já viram que estou apaixonada mesmo. Vocês não estão duvidando disso, não é? Estou apaixonada e o estou, sobretudo, pelo que podemos fazer, e a primeira coisa é criar esse Dia do Hip Hop, que já é um dia consagrado, então, teremos um dia para comemorar, um dia para sermos felizes. Estou com umas iniciativas importantes, como a inclusão dessa data no calendário do nosso estado e isso já está no Regime de Urgência. O Projeto de Lei é o de nº 5645/2014, a pedido de vocês. Ele já está tramitando. Pedi urgência na tramitação e na votação desse Projeto. Podemos fazer outras coisas e muitas delas dependem do Thiago, os desdobramentos. Não há milagre nisso, não é uma coisa instantânea, mas depende dos espaços que puderem ser abertos pela Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, pela Secretaria de Cultura do Município e de todas as cidades. Mas, o que queremos mesmo é o selo da universalidade e dizer: “isso nos pertence, onde houver essa manifestação ela vai ser tratada com grandeza”. Por último, quero dizer que estou fascinada porque esse movimento, que foi das periferias pobres, onde tem realmente um papel muito grande, hoje é um movimento do Terceiro Mundo também. Ele ganhou essa globalização. E como Movimento de Terceiro Mundo, são populações que têm raízes agrárias, comunitárias. Acho que o milagre também é porque não é uma coisa só. Eu, por exemplo, como antropóloga que sou, adoro festa de São João, porque não existe nenhuma como essa no mundo. Nessa festa de São João contei onze manifestações culturais diferentes. Tem-se o teatro com o “casamento na roça”, a comida, os folguedos, a dança. Tem-se tanta coisa que é impressionante se ver a complexidade dessa manifestação. E vocês estão, mais ou menos, empatando com a festa de São João, porque, realmente, vocês vão me dizer, mas a poesia rítmica, que não é comum, nem no jazz; o ritmo, que já evoluiu do rock e de outras coisas, mas que ganhou essa densidade porque exprime coisa que só a palavra pode dizer. Então, a força da palavra é importante, porque inverteu um pouco. Em geral, a letra é um coroamento da música, mas se eu tiver uma música que é um coroamento de uma letra, ou melhor, se tiver um ritmo que fala mais alto do que a própria música, e que deixa à letra o trabalho da amarração final, parece-me que essa é uma contribuição original extremamente poderosa. Porque há momentos em que as pessoas querem gritar. Então, essa atitude que está por trás do hip hop, um grito, um alerta, uma emergência, eu acho que ela é muito, muito importante. A outra coisa – eu não vou falar mais do break, porque eu já falei, mas a dança, logicamente, e o grafite. Eu sempre fui alucinada pelo grafite. Inclusive, como Secretária de Cultura, tentei – isso já faz um bocado de tempo -, eu tentei criar um espaço do grafite com a ajuda, e isso é uma sugestão que dou a vocês, desses novos materiais que existem disponíveis e que permitem as pessoas fazerem coisas e depois desfazer e renovar permanentemente, em espaços nobres culturais da cidade. Porque, nos espaços abandonados, vocês já ocuparam e está lá pra quem quiser ver. Mas poderia haver uma tentativa de trazer esses espaços de mobilidade, de rapidez, de criatividade espontânea para o mundo oficial, digamos assim. Não pra oficializar uma coisa que tem uma espontaneidade popular muito grande, mas para poder abrir novos espaços. Porque, como eu digo, a cultura tem a sua própria lógica; cada coisa evolui da sua própria maneira. E eu vi aqui que tem muita coisa interessante. Caramba, isso eu não sabia. Porque eu devo dizer que eu devo a vocês aqui esse aprendizado. Essa história do mix, da mixagem, que hoje é parte da vida de qualquer festinha que se realiza em qualquer lugar. Mas será que foram vocês mesmos que inventaram isso, essa coisa de ‘eu entro em dois lugares, eu entro por um e saio pelo outro’? Isso é uma maravilha; isso é uma coisa poderosíssima, que todo mundo faz hoje. Qualquer festinha careta faz. Mas onde nasceu isso? Parece que foi de vocês. Eu não tenho tanta capacidade assim pra falar. Então, é isso. Muito obrigada. Vamos trabalhar para fazer isso. Eu tinha vontade de ler aqui, até porque está gravando e tudo, também uma homenagem aos grandes desse mundo que criaram esse movimento, o DJ Kool Herc, pai do hip hop, depois o Afrika Bambaataa, depois o Grandmaster Flash. Eu aprendi tudo isso, gente. Eu estou afiada, viu? Aí, essas coisas: Ring ding dong, M singer, Writing, não é isso? Tudo isso. Então, vocês já sabem que eu estou muito sabida e muito na ponta da língua, mas nada disso interessa. O que interessa mesmo é o que vocês vão contar aqui do que vocês estão fazendo, do que vocês estão pensando, do que vocês estão querendo, para que a gente possa registrar tudo isso e dar o tratamento que tudo isso merece. Então, eu passo a palavra, para abrir esta reunião, ao DJ e depois ao Thiago, para rápidas palavras. E vocês vão falar à vontade aí. A gente tem sempre um tempo limitado – vocês sabem -, mas é preciso que todos que querem usar da palavra sejam ouvidos. Muito obrigada. DJ. O SR. DJ TR - Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus por esse momento de estarmos aqui, até porque sempre digo nas nossas reuniões que, se não é Deus, a gente não é ninguém. Nós temos sempre que agradecer e reverenciá-lo acima de tudo sobre os momentos importantes das nossas vidas. E esse aqui é mais um momento importante que a gente está proporcionando. Pastor Rufino, pode chegar, meu irmão, a casa é nossa. O pastor Rufino está vindo lá de Caxias, faz trabalho com hip hop também. Dentro do ministério evangélico dele, ele trabalha com os elementos da cultura hip hop. E aqui, Deputada, é um prazer estarmos aqui, nesta Casa que é popular, que é do povo também, e estarmos aqui em várias segmentações do movimento hip hop. Do meu lado direito eu tenho o Marcelo Elcy, que começou com o hip hop lá no Santa Marta, foi o primeiro, foi o desbravador do hip hop lá na comunidade Santa Marta. Hoje nós temos lá, através dele e do Fiel, não sei se vai vir, ele foi convocado para esse momento importante. Mas muitos aqui, essa Casa podia até tá mais lotada. Mas, felizmente, vou usar essa palavra, felizmente. muitos de nós hoje trabalham e estudam. E o hip hop também ajudou muito nessa formação. Então muitos não vão poder estar pelos seus compromissos profissionais. Mas estão em oração, estão torcendo para que a nossa reunião seja a mais próspera possível. E aí, voltando aqui às apresentações, tem o Mr. Zoi que está ali ao lado dele, representa a Babilônia, o Chapéu Mangueira, resistência lá também. Um dos primeiros caras a ter estúdio na nossa época, nos anos 90, nos ajudou bastante a gravar nossas demos. Está um pouquinho envergonhado, não olha pra cá. Temos ali ao lado o Leandro Oliveira, que trabalha não só com a questão da dança, que você citou bem, mas também é um professor de artes marciais... A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – É ele que vai me ensinar? O SR. DJ TR – Pode ser um dos. Trabalha com artes marciais também lá em Campo Grande, utiliza o trabalho de artes marciais também, pregando a palavra de Deus também com artes marciais. Temos a Aias(?), que é da nova escola, chegou há pouco tempo no nosso movimento, mas parece que já chegou há bastante tempo. É de Anchieta. O Ark é de Volta Redonda, representa o movimento de Volta Redonda. Nós temos também a representação vinda de fora, como o movimento está sempre junto, está a rapaziada dele aqui, mas ele está lá na ponta, é o de óculos lá, é Rockin’ Squat(?). Ele é militante do movimento hip hop da França. Tá aí com a gente. Inclusive gravando alguns documentários aqui no Brasil. Está em consonância com o nosso movimento, está ligado com a gente. Ali, mais à frente, está o nosso querido Mano George, que domina ali as comunidades Lagartixa, Pedreira, Quitanda, e faz um trabalho também com o hip hop através da rádio comunitária dele. Inclusive, também, é um movimento hip hop cristão. Andréia Saraiva B Girl, dança. Também ajuda na parte de elaboração dos nossos projetos. Lá atrás, tem o nosso apoiador cultural, que é o Fernando, que é o presidente da Associação Comercial de São Cristóvão. Está sempre dando uma força nos nossos eventos, nos nossos trabalhos. É um cara focado com a gente. Pelo menos eu conheço ele há uns 15 anos. Arcélio conhece há uns 30. Sempre abrindo espaço para que a gente se reunir, enquanto a gente não tem um espaço fixo ainda, ele tá sempre oferecendo as dependências dele para nos ajudar. Do lado de cá, tem o Roney e Tequinho, que representa a comunidade da Maré. Ronney representa a Baixada Fluminense, Realengo... A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Realengo? Eu nasci em Realiengo. O SR. DJ TR – Juliana, produtora cultural de lá do sul. Está fazendo intercâmbio com a gente. Nossa querida Vanessa, que é pedagoga, trabalha com o hip hop como ferramenta de inclusão social lá na comunidade da Maré. Bruno Rafael, o CDD da minha área. Produtor cultural da West Coast. Faz os eventos trazendo os grandes artistas internacionais, em contato com a população de baixa renda. Está sempre aproximando eles dentro de uma visão social também. Não só musical, cultura, mas também social. DJ LP, para mim, um dos melhores DJs do Rio de Janeiro, se não é o melhor. Da antiga escola, junto comigo, faz um trabalho de primeira. Leo, que tá lá atrás, da West Coast Produções e Eventos, CDD. Bruno Santos, que é da Lumes Filmes. Também tá sempre documentando aí. Fechado com a gente, documentado todos os nossos acontecimentos. Pastor Rufino já falei, é um líder da comunidade evangélica lá do lado de Caxias, Nova Campina, faz trabalho social através do hip hop dentro da igreja. E Arcélio, se não fosse esse ativista aqui, irmão, parceiro da Rio Vida, da organização que eu também faço parte, ao lado da Zulu Nation Rio de Janeiro, como representante também da Zulu Nation ; ele foi o cara que há 25 anos escutou uma molecada meio revoltada, que tinha acabado de ler a autobiografia do Malcom X, que queria, porque queria mudar esse mundo. E foi o cara que nos ajudou na nossa formação política e ideológica. Isso para mim foi importante, porque abaixo de Deus, se nós não tivéssemos tido esse tipo de contato com pessoas como o Arcélio, talvez não tivesse nenhum livro, com a sua permissão, “Acorda Hip Hop” para a gente estar documentando uma história. Talvez a gente não tivesse nem fazendo parte desse movimento hoje. Mas, toda história parte de um começo, de um início, de um princípio. E o princípio foi bebendo a fonte aqui e entendendo o que quer dizer movimento hip hop. Que o hip hop pode ser tão brasileiro quanto o samba, pode ser tão brasileiro quanto a capoeira, pode ser tão brasileiro quanto o forró, porque ele fala de coisas da nossa terra, coisas que a gente vive no dia a dia. Então, ele deixa de ser simplesmente um movimento de afroamericanos para se tornar um movimento de afrobrasileiros, que não se dobram, que estão de alguma forma lutando por uma sociedade mais justa para todos. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Muito bem. Excelente. Estamos aqui com um grupo expressivo, espacialmente expressivo. Vanessa já esteve conosco também no debate, que foi maravilhoso, que a gente viu que tem esse espaço nobre para trabalhar, que é um espaço que você substitui a guerra pela paz, muito bonito. Eu queria passar agora a palavra ao Thiago para sua mensagem inicial nesse debate. O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Boa tarde a todos. Quero cumprimentar a Deputada Aspásia Camargo, e dizer deputada que se existe hoje a Secretaria de Cultura do Estado você é um personagem fundamental nessa história, porque foi a senhora, no governo Moreira Franco, que tirou a Secretaria de Cultura da associação que ela tinha com a Educação. Era Secretaria de Educação e Cultura, e foi a senhora deputada que criou a Secretaria de Cultura. Então, isso é uma coisa que eu tenho muito prazer em estar aqui falando isso para a senhora, e lhe cumprimentando por isso. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Muito obrigada. O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Porque precisamos que os nossos governantes coloquem em suas pautas a cultura como prioridade. E isso infelizmente é muito raro. A gente está sempre lá, deputada, em uma briga de foice por conta de orçamento. Então, essa atitude sua é estruturante para que a gente tenha hoje uma Secretaria de Cultura do Estado. Quero lhe agradecer. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Muito obrigada, Thiago. O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Em relação ao movimento hip hop, a gente tem uma série de ações que a gente tem feito na Secretaria de Cultura, que são transversais, e algumas delas acabam atendendo o hip hop, embora sejam ações mínimas. E, infelizmente, a gente não conseguiu lançar esse ano, mas a gente tinha a premissa, e vou deixar isso preparado, que é o edital de hip hop. E aí tem uma questão que é como é que a gente conversa com o movimento para entender quais são os gargalos. Porque tem uma questão, que é exposição artística como um todo, e tem questão que é mercado. Como é que a gente estimula esse mercado? Como é que as pessoas gravam os seus CDs, como é que elas fazem seus livros, como é que elas conseguem gravar os seus DVDs. Então, tem uma questão de estima ao mercado, e uma questão de expressão artística enquanto oficina, enquanto entendimento desse território, enquanto intervenção nesse território. Acho que a gente precisa e deve avançar muito nesse lugar ainda. Por enquanto a gente está com ações transversais, como os pontos de cultura e o próprio Favela Criativa, que é um programa que a gente lançou, que tem uma série de ações de formação artística. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Qual é o nome? O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Favela Criativa. O site do portal é favelacriativa.rj.gov.br . lá a gente tem uma série de oficinas, inclusive de formação em gestão cultural. Porque uma coisa que a gente tem muito, é a pessoa sabe fazer uma música maravilhosa, ela cria uma batalha de rima, só que na hora de colocar no papel o objetivo, justificativa, uma planilha orçamentária e tentar conseguir recurso público, a gente tem um gargalo muito forte ainda no campo da gestão cultural. Então, uma das coisas que a gente tem tentado empenhar, estamos empenhados, em como a gente capacita as pessoas que têm esse dom, porque é um dom, é uma tecnologia, eu confesso, eu faço isso, mas é chato, sentar e escrever o objetivo, justificativa, colocar o projeto debaixo do braço e sair atrás das empresas para tentar patrocínio não é fácil. Mas, como é que a gente, então, enquanto poder público, capacita esses jovens e esses produtores culturais para que eles consigam acessar esses recursos. Não vou me estender muito, mas deixo aqui o meu cartão. Infelizmente, tenho um compromisso às 16 horas. Então, às 15h30 vou ter que sair. A Regina está aqui comigo. Ela odeia mediar, mas pode sentar aqui e mediar essa história, me representando. Quero dizer que a Secretaria de Cultura do Estado tem as portas abertas. Não temos mais tempo político para fazer esse edital, mas a gente pode deixar registrado e marcar uma reunião com todo o movimento. Eu já tinha iniciado uma conversa com o Guilherme da companhia In Off, de Realengo. Falei com o pessoal do Jovens de Periferia, trabalho do Batan. Enfim, tem uma série de pessoas que a gente já vinha conversando, mas quanto mais a gente ampliar essa rede, para ampliar esse debate, que eu acho que é fundamental, e assim a gente está num ano eleitoral. Acho que, se a classe se une, faz uma carta, eu me disponho a deixar isso com a Adriana, entregar isso ao governador e candidato Pezão, e acho que isso deveria ser feito com todos os outros candidatos. O que a classe do hip hop tem a propor para os nossos candidatos ao governo do Estado? Para que eles se comprometam com o movimento, de 2015 a 2018, a de fato realizar políticas públicas que alavanquem o hip hop, que é uma das expressões culturais mais fortes e estruturadas na América Latina. O hip hop, em qualquer cidade, eu não conheço o mundo, mas eu conheço um pouquinho da América Latina, tem um movimento de hip hop com expressão e com força. E a gente precisa estruturar isso enquanto política pública. Enfim, estou aqui colocando a cara a tapa, porque eu sei que a gente não conseguiu avançar como eu gostaria. Confesso que eu já chorei lá dentro, porque a gente lançou o edital de funk. A gente lançou dois editais de funk, em 2011 e em 2013, e a gente não lançou edital de hip hop, e eu que sou uma figura que fui introduzido nesse movimento pelo Athayde e o MV Bill. Foram figuras que em algum momento eu aprendi que confesso que eu tenho esse pesar em sair da Secretaria de Cultura sem ter lançado um edital de hip hop. Mas deixo a casa aberta, deixo os meus cartões, para que a gente possa conversar e eu possa colaborar, se for o caso, para a gente construir uma carta para entregar para todos os candidatos, para a gente poder fazer essa pressão aí e colocar essa agenda para frente. Obrigado. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Obrigada, Thiago. Eu acho que é uma excelente ideia, ter uma carta aberta aos candidatos em defesa das manifestações hip hop. O SR. DJ TR – A Deputada me permite um aparte? A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Pois não. O SR. DJ TR – É o seguinte. Para o Secretário não sair daqui com as mãos vazias... O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Você me promoveu, mas eu não sou o secretário, não. O SR. DJ TR – Pega a minha mochila aí. Acho que está incomodando o teu pé aí, Leandro. Pega aí um livro, presenteia por gentileza, em meu nome o livro. Em nome de todo o movimento, em meu nome, não. Em nome do movimento hip hop, movimento cultural hip hop fluminense. Um livro também para ele. Não é a bíblia do hip hop, não. Ela é grossinha, mas não é a bíblia, não. O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – OK. Obrigado. O SR. DJ TR – É um manual de bolso. O hip hop é muito mais do que isso daí que está em suas mãos agora. Mas, eu gostaria apenas de salientar um assunto de grande importância. Todos que estão aqui e acompanham essa Mesa, principalmente aqueles que dizem que moram aqui no Rio de Janeiro, eu tenho certeza de que os que são de fora, do Rio Grande do Sul e da França também, sofrem para fazer os seus eventos, seus trabalhos. Mas, em se tratando do movimento hip hop no Rio de Janeiro especificamente, são pessoas que estão na base, são pessoas que estão nas comunidades, são pessoas que, se não fosse esse tipo de acontecimento aqui, talvez, nós não chegássemos nem ao senhor, e são pessoas que fazem os seus trabalhos às vezes sem nenhum tipo de apoio, a não ser apoio da própria comunidade, do comércio local, de algum morador. E, assim, nós não conseguimos chegar muitas vezes aonde nós precisamos chegar. Então, esse tipo de contato aqui é muito bom para unir realmente e para mostrar pessoas que aqui fazem hip hop há 20 anos que não estão na televisão, porque esse aqui é o hip hop que não é televisionado. Você não vai ver nenhum programa de TV por enquanto, talvez demore até de se ver, mas é um hip hop que trabalha literatura, trabalha poesia, trabalha educação, trabalha cultura e são pessoas que estão fazendo alguma coisa acontecer dentro da comunidade, não só no sentido próprio de evento, mas no sentido de mudança, da formação social daquele menino que ali habita, que às vezes não vê o lápis como uma fonte de crescimento, mas vê o fuzil. Então, a gente está ali para mudar um pouco essa realidade dentro do que a gente consegue fazer com as nossas forças. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Muito nobre esse propósito. Bem, eu queria só alertar vocês que, primeiro, que nós estamos começando um processo, então, eu acho que nós deveríamos ter um pouco de objetividade nesta nossa primeira reunião, porque nós podemos ter outras. Você sabe que nós tivemos tanto êxito com o Skype, que eu estou propondo um hangout para vocês. Vamos fazer um hangout, porque nele vocês vão escolher 3, 4 pessoas, a gente vai poder discutir bastante, as perguntas e as informações. A outra coisa é que a gente pode criar grupos. Então, na verdade, o que eu quero propor a vocês – vou ter que me retirar impreterivelmente às 16 horas, então temos 45, 50 minutos para nos organizar – é que fizéssemos uma agenda aqui do que é importante. Por exemplo, acho importante ter um programa de história oral do nosso hip hop brasileiro carioca, estadual, não importa, vocês que definam, mas contar um pouco a história de cada um desses lugares. Eu, que adoro isso – sou historiadora e adoro. Já fiz muito isso, história da política brasileira, história dos movimentos sociais, dos camponeses. Então, eu vejo que há uma história para contar. Aqui é impossível porque o tempo é muito curto. Cada um de vocês ia ter, pelo menos, que falar uns 20 minutos, no mínimo, para contar a história. Acho que isso deve ser gravado e deve ser parte do patrimônio que vai para todas as bibliotecas do Estado, para ser consultado, para todo mundo ver. Se puder gravar em vídeo, melhor ainda. Então, vou me empenhar, se vocês acharem que é uma boa ideia, em fazer esse resgaste. A segunda questão é que eu vejo que a história internacional do movimento e tudo o que você já contou muito bem, algumas outras coisas na internet, aqui, ali, tudo, é uma coisa fascinante. As pessoas querem saber, gostariam de saber. Seu livro está aqui. Acho que é um livro que deve ser divulgado em escala. Esse é outro compromisso que a gente precisa: por o livro em circulação. Aí, eu acho que a Secretaria de Cultura tem um trabalho concreto, pronto, que poderia ser patrocinado para ajudar a editora a lançar isso, mas eu acho que ele vai ter uma vida muito fácil. É um livro extremamente atraente e bem feito. Então, essa é uma outra proposta. Acho que a gente podia se imaginar em grupos de trabalho, não sei se essa ideia é boa, para poder tirar num tempo, vamos dizer assim, até o dia 12 de novembro. Desculpe. Para a gente ter uma agenda organizada. O que seria, por exemplo, um evento anual no dia 12, um grande festival de hip hop todo dia 12, eu acho que é outra coisa que podia entrar no calendário do Estado e da cidade, e que faz sentido. Vamos às propostas concretas que podem significar também mais trabalho investido, mais informação. Essa seria a ideia porque, realmente, estou muito feliz em ver que todas as áreas, tantas áreas da cidade estão representadas. A gente nem imaginava que fosse tão diversificada assim a participação, a atividade cultural de vocês. E eu vejo que é uma coisa enorme, com muitas comunidades envolvidas, muitas cidades, muitas coisas, e cada uma delas é um mundo extraordinário que a gente tem que explorar. O SR. ARCÉLIO FARIA – Aspásia, eu gostaria de uma informaçãozinha com o representante da Secretaria de Cultura. A gente já vem articulando aqui uma reunião com o Pezão e seria muito proveitoso para a gente, aqui, que pudéssemos, em vez de mandar uma carta ao Pezão, termos uma reunião cara a cara com o Pezão e levarmos nossas propostas e nossos anseios do movimento. Acho que seria melhor do que escrever uma carta. O Governador ouvindo os nossos anseios, os anseios dessa juventude, aí sim levaríamos o que queremos do governador. O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Posso ter me expressado mal. Quando falei em levar a carta, é essa metodologia mesmo. Prepara a carta e senta de cara a cara. Acho que é isso. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – A gente já conhece. A reunião com o Governador tem que ser muito focadas, porque ele está sendo pressionado 24 horas. Então, quando a gente vai, além do agrado, do carinho que se possa receber, que é importante, acho importante também dizermos: olha, eu gostaria de ter isso, isso e isso. Por exemplo, no dia do hip hop, ter um grande festival de hip hop, para isso, precisa ter financiamentos nas áreas onde a atividade existe organizada. Aí, cabe também à Secretaria de Estado de Cultura fazer a sua própria avaliação com vocês da dimensão de cada um. Enfim, são essas coisas práticas que têm de ser feitas. Mas, a ideia em si de se ter o documento, acho positiva. E é importante que vocês me digam e nós trabalharemos juntos, Secretaria e Comissão de Cultura para chegar a esses objetivos. Eu vou envolver também o presidente da Comissão que é uma pessoa importante, ele é presidente da Comissão e deixou aqui o abraço para vocês e o pedido de desculpas por não estar presente. O SR. ARCÉLIO FARIA – Acabou de chegar aqui o Robinho que também representa a comunidade de Madureira, o pessoal da De Negro que é uma das principais grifes de hip hop do Rio de Janeiro, formadora de opinião em potencial, localizada ao lado da nossa querida Portela, nossa escola de samba. E o Pierre que também está integrado conosco na Rio Vida. Também tem um coletivo chamado Leões de Judá, fazem esses trabalhos artesanais maravilhosos. Deus abençoe. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Vocês aceitam essa proposta? Está aberta a discussão para apresentação de propostas e encaminhamentos dos nossos trabalhos, inclusive nós estamos dispostos a criar as condições para que vocês possam inclusive se reunir porque eu sei que não é tão fácil assim encontrar um lugar que caibam vocês todos, não é, para discutir os assuntos principais. Quem quer falar? Vanessa. A SRA. VANESSA SOARES – Antes de mais nada, boa-tarde. Meu nome é Vanessa Soares. Eu queria pedir licença a todos aqueles que já vêm há anos lutando por isso, porque eu acredito muito que uma cultura se faz com uma hierarquia, não como a entendemos como um poder acima que menospreza o que vem debaixo, mas sim um respeito. E estou aqui diante de muitos mestres, todo o meu respeito a vocês, de quem a gente ouviu poetas cantarem sobre. Eu não sou pedagoga. Eu sou bailarina e atriz na verdade. Eu vou falar um pouco desse processo porque eu acho que ele fundamenta no que eu acredito enquanto proposta desse movimento. Eu entendi que existia isso quando eu tinha 14 anos de idade e meu irmão colocou uma música, um rap, para eu ouvir. Falava da história de um homem que era um ex-presidiário e que tinha de caminhar e lutar atrás de uma grana. É uma música que todo mundo conhece que é um homem na estrada de um grupo chamado Racionais de São Paulo. Quando eu ouvi aquilo a primeira vez eu falei: opa, tem alguma coisa que fala aquilo que eu quero falar e não sei como. E, desde então, eu me entendo como uma procuradora. Eu sou uma procuradora do corpo bandido que é como eu chamo aquilo que procuro. Eu sou uma procuradora dessa marginalidade, do que está à margem, do bandido, desse que foi banido, que foi exilado, que foi colocado para fora de um centro dominante. Fui atrás, fui procurar, fui morar numa comunidade do Rio e segui meu rumo atrás desse corpo. Isso me levou às escolas, à educação. Hoje em dia, eu tenho isso fundamentado, eu acredito nessa proposta do hip hop que foi onde eu encontrei esse corpo livre para pode dizer, o hip hop é para mim como uma linguagem porque nós entendemos a linguagem muito como aquilo que informa ou comunica. Mas, no movimento hip hop, enquanto procuradora dessa marginalidade, eu encontrei um lugar que chama o homem para a sua terra, que é a raiz do homem, é a raiz desse homem bandido. Eu encontrei no hip hop a linguagem como algo que traz o homem para essa terra, para isso que ele cultiva e isso é a cultura; cultura enquanto aquilo que ele rega, que ele planta, que ele colhe, não só como aquilo que eu apenas informo e deixo vagar por aí. Então, agora, hoje em dia, eu dentro das escolas com crianças e tudo isso, existe uma questão muito grande para mim que é: pensa-se tanto a educação e a gente que está dentro de comunidade olha para ela e continua vendo, dentro das comunidades, as crianças de cinco, oito, sete anos, onze anos trabalhando no tráfico e levando a informação “chegou a polícia, não chegou”, e tal. Então, esses dias eu tive uma discussão com meu pai, porque ele falou: “800 pessoas que trabalham no tráfico de drogas, 500 são crianças”. Então, eu penso: espera aí, tem algum problema com a escola, porque não é possível que de 800 pessoas, se o adulto quer trabalhar nisso, aí é outra questão que não é minha questão. Mas, a minha questão é: por que existem tantas crianças que trabalham com isso hoje? Eu vejo no movimento hip hop a ferramenta maior, porque é a ferramenta que acredito enquanto sensorial, para mim o hip hop é cheiro, é sabor, ele é gosto, é pele, é sangue. Quando resolvi ir atrás desse corpo bandido, e isso é uma coisa para se colocar na pauta, eu não encontrei isso em bibliografias, eu precisei conviver com as pessoas, eu precisei mudar de casa, eu precisei acompanhar o dia-a- dia, eu precisei ser isso, e isso a gente não encontra em bibliografias, mas é preciso também encontrar em bibliografias. Então, eu acho que a primeira coisa é fomentar essas bibliografias, essas pesquisas, porque quantos de nós, aqui, têm muita coisa para colocar para fora e não consegue por causa das leis de incentivo. A segunda coisa é pensar como o hip hop trabalha e pode ser fundamental. Na Maré, a gente tem uma questão que é a guerra de pedras, hoje em dia, porque duas comunidades se dividem, e meus alunos, às vezes a gente está trabalhando e eles começam: “chegou, chegou fulano e fulano”, e começa uma guerra de pedra de um lado e do outro, por problemas de facção e eu tenho que correr com eles. O hip hop já resolveu isso há muito tempo, essa guerra de território. A nossa tomada de território é outra. E de que forma o hip hop entra nesses lugares? Então, eu acho que é preciso se ter uma lei de incentivo também para que o hip hop seja uma ferramenta de ensino nas escolas. Os nossos professores estão pirando e eles precisam entender que existe algo que deve ser respeitado, e isso é a linguagem corporal dessa criança, ela é dali. Então, quando passo na Central e vejo várias crianças brincando de roubar celular de alguém pela janela, para mim aquilo ali é um jogo, o jogo do risco, o jogo do risco o hip hop resolve, o hip hop é o risco. Então, como esse movimento e essa cultura podem atuar nesse trabalho? Como a gente pode expandir em oficinas? Quantos professores? Quando eu cheguei em São Paulo, eu fui trabalhar lá com medida socioeducativa, uma pessoa me falou: “olha, não pode trabalhar com nenhuma música do grupo Racionais com as crianças da Fundação Casa”. Eu pensei: Opa! Existe um problema aí, porque essa música foi o que me fez vir até aqui e isso eu sei, então, como eles proíbem aquilo que é da sua terra, que é o seu corpo, que é onde você pode gritar? Como proíbem você de trabalhar? Então, acho que os professores das escolas municipais, de alguma forma, precisam estar próximos disso, dessa terra que é o hip hop para mim. Eu não sei ainda, eu acho que a gente deve pensar em grupo como isso pode se expandir nas escolas, como a gente pode criar os editais, que podem entrar também, não só a questão artística, mas do artista com oficinas. É preciso ter uma contrapartida de pessoas que muitas vezes entram em algumas comunidades do Rio para fazer festa, as festas são caras. Eu sei disso. Eu vivi numa comunidade que hoje em dia é uma comunidade top carioca, as festas são 300 reais em um hotel do lugar, como aquela criança que mora ali não pode ir nessa festa, que toca hip hop, fala do que ele é? E quais são as outras medidas que podem ser tomadas a contrapartida disso? Sabe, por aí. O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS - Te respondendo rapidamente. Em relação às bibliotecas-parque e as nossas bibliotecas, a porta está aberta para a gente poder fazer, em algumas bibliotecas a gente já até já faz alguns diálogos com o hip hop. Agora, em relação à Secretaria de Educação, me ajuda, Deputada, aí é um diálogo muito mais complicado e mais complexo. A Secretaria de Educação é muito grande. Mas acho que é fundamental porque acho que passa por uma reformulação na educação. Nosso sistema de ensino está muito atrasado. Nosso sistema de ensino está no século 19, e a gente está no século 21 com um tablet. Então, a gente precisa é repensar o processo de educação, de ensino. Aí, sim, um processo de ensino no século 21 com certeza o hip hop não vai ser barrado, ele vai ser ferramenta de aprender português, aprender literatura. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – É isso mesmo. A SRA. VANESSA SOARES – Sim, mas essa coisa do fomento, do edital cultural... O SR. THIAGO GOMES DOS SANTOS - A gente precisa fazer um edital de hip hop para fazer CD, livro, oficina. Um edital específico para a classe do hip hop. Aí a gente precisa fazer isso juntos porque eu não vou inventar isso. Tem que ser vocês para dizer: tem que ter dinheiro para MC, tem que ter dinheiro para livro. Como a gente fez no processo do funk. A SRA. VANESSA SOARES – Eu só quero deixar, para finalizar, que as nossas escolas e as crianças em geral e as oficinas sejam também pensadas nelas, porque a gente sabe que o hip hop é uma ação efetiva nisso. Então, se em toda festa de rap a gente tira um sábado, a festa é na madrugada, e, no domingo à tarde, essas crianças possam pegar e pintar e entender, olha, isso é um spray, isso também educa, não só pensando dentro da escola. O SR. DJ TR – Rapidamente, está chegando aqui também, um pouquinho atrasado, mas graças a Deus chegou, Minimax, representante da comunidade de Rio das Pedras, lé em Jacarepaguá – MC, poeta, rapper, pensador, DJ, grafiteiro, produtor. Deus abençoe. Muito obrigado pela presença, irmão. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Minimax? Os nomes já são muito criativos, todos. O SR. DJ TR – A colinha está lá no boné dele. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Já começa por aí. A criatividade está no nome. O SR. DJ TR – Uak, de Volta Redonda. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Eu quero só que vocês se identifiquem, porque está sendo gravado. O SR. UAK – Primeiramente, boa-tarde! Cumprimento a todos e com licença também, até mesmo pelo tempo que eu tenho atuado... A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Você é Uak? O SR. ARK – Me apresentando, meu nome é Emerson e como todos, como pode ter visto a maioria, conhecido por um vulgo, sou conhecido pelo vulgo Ark e venho trabalhando com esse nome já há dez anos em minha cidade, Volta Redonda, fluminense, Rio. Então, nesse tempo que eu tenho trabalhado, já trabalhei na verdade dez anos lá, só que trabalho há 15 anos dentro do movimento hip hop, onde iniciei com grafite, e assim fui aderindo aos outros instrumentos da cultura, como o break dance, DJ. Hoje, sou mais conhecido através do DJ e MC, mais como MC. Em busca do quinto elemento, que acho que é uma busca contínua, que é o conhecimento que a gente precisa ter, e acho que é o principal elemento que a gente vem tratando aqui. Até há um tempo, tinha um trabalho que era até feito para as crianças de comunidade, todo dia 12 de outubro, que é a data considerada como Dia das Crianças, através mesmo e por motivo mesmo dessa falta de cuidado que temos tido com o que vem de cima, que eu cito, dos poderes, por não ter nosso apoio, a gente teve que parar esse movimento. Por quê? Cito falta financeira. Essas coisas assim. Então, o hip hop, onde vivo, realmente ele não tem sido tão apoiado. Então, eu decidi fazer essa busca independente. Eu criei minha produtora, com ela através do meu trabalho, que é meu suor. Eu vim de uma família pobre. Então, eu não tive nada financeiro. Eu tive através quando eu conheci o hip hop, como a Vanessa citou das músicas, eu vi que precisava de uma busca por conhecimento, um profissionalismo. Sou eletricista. Vou citar. Trabalhei com elétrica para poder comprar equipamentos. Hoje, graças a Deus estou quase terminando de montar meu estúdio para poder gravar pessoas que não têm acesso a estúdio, que é muito caro, para poder montar oficinas e para poder alugar um som, com meu dinheiro, e subir na comunidade para montar um movimento para tratar uma ideia para as crianças. Dentro disso, em dez anos, conseguimos formar alguns, hoje a gente tem representado o meio do hip hop com alguns MCs que tem saída, alguns grafiteiros que tem sido conhecido, que tem sido conhecidos, têm vindo para o Rio de Janeiro, São Paulo, até fora do Brasil e a gente tem sido conhecido por isso, mas, eu sinto a necessidade realmente desse envolvimento. É difícil a gente tirar o pouco que tem, às vezes muitos que não têm, para poder fazer algo, então, é algo que vem muito do coração, eu agradeço muito a Deus pela força, pelo entendimento que ele me fez ter através disso e influência de alguns, muitos na verdade, para poder estar fazendo. Eu acredito que pela força que ele dá a todos e a vida, que todos possam sentir essa necessidade de agir, com as pessoas que necessitam, assim como ela citou, às vezes tem evento em comunidade de pessoas que têm como fazer e a própria pessoa da comunidade não tem acesso pelo financeiro. Eu elogio uma pessoa que eu conheci há um pouco de tempo, o Bruno Rafael, que trabalha com a West Coast, através dele eu pude conhecer grandes artistas internacionais que eu nunca pude ter acesso por às vezes acontecer em casas de shows em que o ingresso era 200, 300 Reais e para eu juntar um dinheiro desse, só Deus sabe. Através dele eu pude ter acesso a um evento, um modo simbólico de dizer, praticamente de graça. Assim, a comunidade consegue chegar, então, como é que a gente vai poder ter isso, sendo que um dia eu posso tirar o que eu tenho para investir na minha faculdade, para que eu possa buscar mais conhecimento ao invés de atrasar os meus estudos, digo na maneira de profissionalismo em outra parte, para eu poder deixar de investir, já que existe a Secretaria de Cultura, para eles que invistam nisso, já que a função para que eu possa continuar trabalhando junto, mas, progredir em outras partes e a comunidade tem acesso realmente a esse ponto. É o que eu trago de onde eu vivo, Volta Redonda. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Maravilhoso, eu achei que você trouxe aqui uma experiência de vida incrível e que mostra bem a ligação no fundo de um movimento que é alternativo, que você diz que às vezes tem uma conotação até extremamente marginal, mas, que também está colado com a vida, com o trabalho, com a possibilidade de você ter uma atividade que possa alimentar essa criatividade, envolver outras pessoas, enfim. São vários circuitos, que eu estou entendendo, são vários circuitos poderosos que têm que ser usados, certamente. O SR. LEANDRO OLIVEIRA – Boa-tarde, sou Leandro Oliveira, instrutor de artes marciais. Fico meio constrangido de falar de hip hop perto desse pessoal que está aqui, porque a gente sente um pouco o piso. Eu venho trazer, exatamente, essa visão, a visão de quem não está mergulhado no hip hop. Desde criança você vê alguns elementos, você vê um grafite, você ouve uma letra, eu sinto, como da periferia, que o hip hop, na gente, chega como um sprey, não chega aquela profundidade, você vai ouvir rap, você vai ver um break, mas, você não vai associar que aquilo é uma cultura coesa e mundial. Foram anos expostos a esse spray para depois saber que aquilo era um corpo. Então, eu vejo um fato nessa profundidade, que é muito paralelo ao que eu vejo com a arte marcial, que sofre o mesmo tipo de preconceito. Esse preconceito vem da falta de conhecimento, que você vê um cara se jogando no chão rolando, você acha até bonito, mas, você não vai saber que aquilo foi uma manifestação cultural de alguém que queria sair da criminalidade e passa batido, é como se tivesse jogando pérolas aos porcos, então, na minha visão de leigo, o que faria diferença para mim é se quando eu conhecesse um elemento, eu não conhecesse simplesmente uma imagem bonita pintada na parede ou um movimento legal ou uma letra interessante, mas, que viesse o corpo e as pessoas que conviveram comigo da mesma forma. Alguns chegam até a dominar, dança legal, faz um grafite, mas, não sabem que aquilo é um corpo, aquilo é uma entidade completa. Para quem não tem contato nenhum fica uma imagem mais diluída. Então, eu sinto que faria diferença, com a minha visão de leigo, porque, às vezes, eu acho que a pessoa que está lá dentro, imerso naquela situação não consegue imaginar. Como assim, alguém vê o break e não consegue associar o break ao grafite, não consegue associar o break ao DJ, porque a pessoa já está imersa naquilo, já respira aquilo. Então, na minha visão, de quem tá chegando na porta agora, eu acho que isso faria muita diferença, porque é aquilo que eu falei, o spray é legal, bonitinho, vou tocar a minha vida. Mas, se tivesse uma contundência maior, eu acho que seria mais divulgado, porque a gente tem a ideia de que é divulgado, mas, no meu ponto de vista, não é tão divulgado assim, é mais aquilo superficial, sem muita profundidade. Só isso, só. A SRA. THIAGO GOMES DOS SANTOS – Deputada, sinceramente, peço mil perdões, mas eu preciso me retirar, deixei o meu cartão. A Regina está pegando email com a Andrea para a gente poder agendar uma reunião com todo mundo. Deputada, vai ser uma honra para gente ter você conosco nessa empreitada. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Muito obrigada, Thiago, agradeço muito, eu acho que a sua participação foi muito importante, porque você demonstrou que está extremamente envolvido, tocado e empenhado na causa. Considere-se homenageado aqui também pela sua vontade de ajudar. Muito obrigada, agradece muito a Secretária. Bem, eu vejo que há um léxico nisso tudo. Você falou de corpo, ele falou de corpo. Ele disse: “Eu não percebo o corpo, eu percebo o spray.” Quer dizer, os fragmentos, a superfície. A coisa tem um vocabulário, tem uma... O SR. DJ TR - Uma poesia. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – ...uma poesia, uma poesia muito grande. Quem mais quer. O SR. MARCELO ELCY – Boa-tarde, gente, sou representante da comunidade Santa Marta e conforme a Vanessa também falou que teve o anseio de conhecer a cultura hip hop. Em 1994, eu fui atrás também desse anseio, de querer conhecer a cultura hip hop. Nessa época, eu ouvi um programa de rap que acontecia somente nos finais de semana e eu saí da zona sul e fui até a zona oeste e conheci grandes pessoas que estão aqui DJ TR, Zoi. A dificuldade na minha comunidade de realizar grandes eventos era imensa, o que predominava era o funk – e funk, na época, era lindo, não é essa coisa que está hoje, o funk era mais poético, mais romântico -, mas o que era apaixonante mesmo, no meu sentimento de busca, de conhecimento, era o rap, era o hip hop. Eu não sabia nada, não conhecia nada, não entendia nada. Eu conheci a Atcom, em 1994, e lá eu aprendi sobre a cultura hip hop, a trilogia que é o movimento hip hop. Através desse conhecimento de tudo o que já foi falado aqui, a grande dificuldade é de fazer um evento, de tentar se manifestar culturalmente através da cultura hip hop, eu tive a felicidade, através do TR, que ele falou: “Cara, tu tem uma comunidade na mão, você precisa, através, da sua liderança, entendeu, fazer uma revolução, fazer alguma coisa.” E a gente foi alimentando essa ideia, criando, como eu posso dizer, uma expectativa e foram poucas palavras, partimos logo para as ações. Um dia, numa sexta-feira chuvosa, naquele dia, a gente pegou uma chuva incrível, a aí a gente partiu de lá, da zona oeste, de lá da Câmara dos Deputados, direto para o Santa Marta. Chegando, lá, no Santa Marta entramos numa reunião com as lideranças de lá, tem lá o Grupo Eco, tinha o pessoal da cidadania e várias outras lideranças, entramos com o projeto do hip hop e, mediante isso, o TR conseguiu juntar também grandes produtores, na época com a Michele, eu também com a minha rapaziada aqui, o Mister Zoi e Max tendo abraçado a causa. Enfim, foi uma coisa que é e até hoje continua sendo muito difícil, mas a gente reuniu força e conseguiu por em prática e esse é um projeto que perdura até hoje através de outras pessoas que estão lá agora, como o Fiel que dá continuidade através do hip hop Santa Marta. Todo mês, uma vez por mês acontece o movimento lá. Enfim, através dessa união, dessa galera que está aqui, que eu conheci lá, eu não conhecia ninguém, não conhecia a TR, não conhecia o Zoi, da comunidade do Chapéu Mangueira, logo ali do lado, no Leme, eu sou de Botafogo, zona sul também, o Minimax que está aqui atrás é do Rio das Pedras. Então, todo mundo com o objetivo incomum, mas ao mesmo tempo querendo se manifestar da mesma forma, nos unimos e estamos até hoje, isso há mais de vinte e poucos anos, estamos aqui até hoje. O hip hop para mim é tudo na minha vida, eu agradeço ao hip hop por ter essa família, todos esses meus amigos que eu tenho até hoje através do hip hop, muitos que estão aqui que ainda lembram de mim, nos encontramos lá no evento essa semana no Santa Marta e a galera lembra de mim, há tanto tempo sem ver essa galera toda que está aqui. O hip hop é muito importante na minha vida e foi ele que me resgatou, foi ele que me fez entender que ali onde eu nasci e me criei, eu poderia reestruturar em mim novos valores. Aprendi muita coisa. Através do hip hop eu em tornei uma pessoa mais culta, uma pessoa que tem ambições importantes como levar, através do hip hop, o conhecimento do meu povo dentro da área. Já fizemos vários projetos, inclusive aquele projeto que levamos com o DJ Saci, a gente dava aula de oficina de DJ para a molecada, foi a primeira oficina na zona sul de DJs, foi com o DJ TR dentro do colégio. A gente fez também um projeto no Café das Artes lá no Espaço dos Correios. Então foram diversas coisas que conseguimos criar com muita dificuldade, muitas vezes a gente tirava do nosso bolso, não é TR? Então, enfrentamos dificuldades e estamos aí até hoje, acho que vai ser de grande importância se através desse encontro aqui e a gente levantou uma coisa muito mais poderosa do que isso. Valeu. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Você se apresente aí para as gravações. O SR. MISTER ZOI – Mister Zoi. Eu não tive oportunidade de ir às reuniões que o pessoal fez, eu estou meio que conhecendo a proposta toda e não queria falar sobre a coisa, mas estou gostando de algumas coisas que estou escutando principalmente o que falou o nosso amigo que já se ausentou, sobre a coisa da gestão, a gente tinha um programa na antiga que a gente não soube formar os nossos empresários, a gente não queria empresários e a gente não soube formar os nossos empresários, acho que agora a gente tem que se focar nisso. É claro que financeiramente a gente nunca andou pela parte financeira, a gente nunca tinha financeiro para andar e teve muita gente recebendo dinheiro em nome do hip hop e usando em benefício próprio e de repente para o governo, para o sistema eles sempre acharam que deram o dinheiro para o hip hop, mas esse dinheiro não chegou para todo mundo, esse dinheiro foi manipulado e acho que é muito importante ter essa divisão dos recursos que nunca teve. É só isso. Eu estou conhecendo e, é isso. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Você falou de uma coisa importante que é o lado empresarial do movimento que é uma coisa que os baianos em geral fizeram com o samba. Nós não conseguimos. Nós ficamos dependentes das grandes gravadoras, internacionais inclusive. E os baianos montaram gravadoras alternativas poderosíssimas e conseguiram crescer muito com isso e projetar a música baiana. Então, eu acho que você tem razão. É um ponto importante realmente. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Arcélio. Sempre falem o nome. O SR. ARCÉLIO FARIA – Mister Zoi levantou uma séria dentro do movimento hip hop, porque alguns se dizem hip hop, de hip hop, apanham essas verbas e usam essas verbas e quem na realidade faz o hip hop, que tá dentro das comunidades, que têm o trabalho todo, tá aqui. E aí pra gente chegar até a Secretaria de Cultura, pra gente chegar a essa verba, é uma dificuldade enorme porque as portas estão sempre fechadas. Eu acho que tem que ser democratizado sim. Essa verba é pública. Eu acho que tem que ser democratizado e na realidade os projetos não podem vir de cima pra baixo. Eu acho que quem tá fazendo o hip hop, os quatro elementos, quem está nas bases construindo e tirando essa galera do tráfico, do vício, dos assaltos, é essa galera que tá aqui presente. É essa galera que faz o movimento hip hop crescer e não tem acesso às verbas públicas. Eu acho que é uma maneira da gente democratizar. E por isso que nós estávamos querendo essa reunião com o governador, ou o futuro governador, para que a gente possa discutir isso também, a verba pública pra uma minoria e a maioria aí passando necessidade, com apoio de comerciantes locais, e passando necessidade. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Você está dizendo uma coisa que eu queria até um esclarecimento. Uma coisa é dizer: “Olha, o sistema não se interessa por hip hop, se interessa por outras coisas, e, portanto, o dinheiro não chega.” Isso é uma coisa. Outra coisa é dizer o seguinte: “Há alguns que se apresentam como hip hop, que levam o dinheiro do hip hop, mas não são os verdadeiros raízes, nem os que estão realmente alimentado o movimento.” Eu acho que são duas coisas diferentes. Eu entendi que você tá dizendo que há sim algumas pessoas que se apropriam disso, sem ter a legitimidade do movimento. É isso? O SR. ARCÉLIO FARIA – Para ter um exemplo, há pouco tempo, agora, dia 1º, teve um festival de hip hop que ninguém aqui ficou sabendo, e foi uma verba pública de 150 mil reais. E ninguém participou desse evento, ninguém teve conhecimento desse evento... A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – E isso foi onde? O SR. ARCÉLIO FARIA – Na Cinelândia, na Pedro Lessa. O SR. DJ TR – Duvido que gastaram 150 mil para fazer. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Quem financiou? O SR. ARCÉLIO FARIA – Foi dia 1º de agosto, uma sexta-feira, de 6 às 10 da noite. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Quem é que promoveu? O SR. DJ TR – Essas pessoas têm acesso, essas pessoas que são realizadoras desses eventos têm acesso a todas essas pessoas que estão aqui na mesa. E eu acredito que ninguém ficou sabendo, só ficou sabendo no dia seguinte. O SR. MISTER ZOI – De 6 às 10? Para começar, nunca que um evento de hip hop vai durar quatro horinhas só. O SR. ARCÉLIO FARIA – É, sabe com é... E geralmente a gente não faz esses eventos dia de semana, até porque muitos trabalham, estudam. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Mas quem é que patrocinou? O SR. ARCÉLIO FARIA – Verba Governo municipal também. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Tá bom. Vamos dar palavra aqui ao pastor. O SR. PASTOR RUFINO JR. – Boa-tarde a todos. Graça e paz aos amados. Me sinto muito lisonjeado por estar fazendo parte dessa elite. Estou aí há pouquinho tempo nessa caminhada, 23 anos. Conhecendo o paralelo, o hip hop. E o hip hop para mim hoje significa vida. Presido a comunidade evangélica Deus Torna Forte, Que fica em Caxias, Nova Campina, um bairrozinho pequeno lá, onde vejo a juventude todo dia morrendo. Pelo tráfico, pela ociosidade, pela falta de oportunidade. Primeiramente, eu tenho um compromisso com o evangelho, de resgatar vidas. E a juventude tem se voltado a uns conflitos por formação educacional, cultural, e poucas oportunidades. Então, eu peguei o evangelho, introduzi o hip hop para buscar esses jovens do tráfico. Para buscar da ociosidade e implantar a cultura dentro deles. Mas deixei um panfleto ali. Fizemos um evento mês passado que se chamou Visão Urbana. Colocamos todos os elementos do hip hop e o evangelho ali. Vidas foram alcançadas através dessa linguagem. Luto por dois sistemas: o tradicionalismo da igreja e a falta de oportunidade da cena com os governos, com as pessoas que não valorizam. Não temos ajuda de ninguém. Nós nos unimos para fazer isso voltado à cultura, a cena, porque vim de uma ONG todos nós conhecemos bem o Afro Reggae, há dezessete anos. Ali, tive contato com o hip hop. Ali ouvi falar dos Racionais. Ali comecei a me identificar e fui crescendo. Fui observando a possibilidade de ajudar do lado social, que é só o meu lado. Hoje, como pastor, estou vendo essa questão de vidas mesmo. A juventude é a nova geração é o fôlego. Precisamos, de alguma forma, arrancá-la desse sistema: dessa mortandade diária – que está virando corriqueira na nossa realidade -. O hip hop é uma arma, vamos dizer assim, letal que a juventude que estava nesse evento no mês passado conhecia o hip hop só de televisão. Nunca viram um grafite de perto; Nunca viram um DJ fazendo a sua performance. Houve identificação. A juventude começou a atentar para isso. Com a ajuda da nossa comunidade lá estamos abrindo uma oficina para ensinar. Alguns amigos nossos estão se disponibilizando a dar aulas de break, DJ, grafite. A molecada está vindo. Estou muito maravilhado com esse movimento, com essa unificação num só segmento, num só pensamento que é o de enfatizar, o de estruturar a cultura hip hop e alcançar vidas. Estou muito agradecido. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Acho que é o lado do resgate do seu movimento: resgatar as pessoas de um caminho que não tem saída, que vai levar a morte para um caminho que vai levar a vida, que é a criatividade, a arte do hip hop. É uma mensagem extremamente tocante, pastor. Muito obrigada pelo seu trabalho, que transcende, inclusive, até a nossa reunião. É um resgate. Bem, damos agora a palavra ao Vinimax. O SR. VINIMAX – Boa tarde, rapaziada , boa tarde, Deputada. Olho aqui para o TR, olho para esse cara aqui, olho para aquele cara ali. Sou Vinimax o bagulho está aqui. Vamos que vamos. Vamos junto. Olho nos teus olhos, cada um de vocês aqui, volto há vinte anos. Voto quando aquele cara foi no meu barraco de madeira, aquele cara falou assim para mim: “Vinimax, você é um cara muito importante pela sua voz, pelo seu talento.” Ele falou uma coisa muito importante, naquela época, dentro da minha casa. Ele foi fazer uma entrevista comigo. Ele falou assim: “mano, o hip hop não anda sem cinco elementos.” A primeira vez que escutei do quinto elemento. É o quê, o Pitbox? “Não. É manter a cultura viva.” Agora, o hip hop é um negócio? (pausa) Também. Se os Estados Unidos começarem a tocar samba onde vão buscar a história do samba? Como eles vão passar a ganhar dinheiro? Vão buscar onde, isso? Aqui. Eles vão ver como o Zeca Pagodinho ficou rico, morando na Barra e como os demais. Passei por um processo no hip hop onde o próprio Pedro falava que o Netinho ou qualquer pagodeiro é um pela saco. Hoje, está todo mundo achando legal. Sempre achei naquela época: que o preto tem que estar com dinheiro etc. Não é o hip hop, mas montou a primeira faculdade de Afrobrasileiros. O hip hop, para mim, sempre foi um instrumento de trampolim para as pessoas se tornarem cidadãs. Sempre teve uma disputa interna: se você faz um rap, outro, mesmo estando na mesma galera, com a mesma ideologia, faz uma coisa mais dançante - fui vítima disso - você é um pela saco. Não tem diferença nenhuma da boca de fumo. Então, quando decidi entrar politicamente no hip hop, através desses caras aqui, TR, quando a gente começou a se arriscar, quando o BOPE começou a entrar numa com a gente, porque a gente estava tirando maluco da boca de fumo e tiramos vários da boca de fumo; quando a gente estava na reunião na Chapa Quente arriscado a polícia invadir e morrer todo mundo e ser preso. O Carlinho B Boy foi preso. Ele saiu da cadeia, ficou na minha casa um tempão. Implorei, implorei, implorei ao movimento e ninguém deu nada. O moleque está louco na Rocinha. Está louco na Rocinha! Está louco na Rocinha! A vontade que tenho é pegar aquele moleque e botar num lugar isolado até ele... sei lá. O André B Boy foi embora decepcionado. Então, tivemos várias decepções como houve várias reuniões dessa, maneira.. Como transformar isso num negócio? Fui na festa desse cara, uma vez. Maravilhosa. Via blogs. Vi uma movimentação na Internet, no seu começo, antes do Facebook. Vi uma comoção muito grande, mas quando esse cara fazia uma festa, aí, pensava assim: vou na festa desse cara. Será que esse cara é branco? Chegava nesse nível, não é mano. Estou mentindo? Não, não estou mentindo. Enfim, um cidadão só se deu bem nessa história: ficou rico com isso. Não vou citar nome, mas todo mundo está ligado no que estou falando. Fico olhando. É uma cultura americana. Nada mais do que justo a gente saber que, tirando o M Nem, o resto é tudo preto que lida com isso e transforma esse negócio. Tenho contato com a rapaziada lá de fora, de grande novo, inclusive, o nosso LF, mora em Nova York. Como fazer negócio? Você tem exemplo aqui de um bom negócio de um cara que se chamava Crioulo Doido. Ele descobriu que tinha uma possibilidade de um talento a mais para cantar. Ele lançou disco e o cara ganhou os maiores prêmios da música brasileira. Todos. Ele se denomina MC Rapper. Mas eu já escutei neguinho: “mas ele não é rapper.” Ainda temos esse pensamento. Como ganhar dinheiro nisso? Será que o negro americano esperou o governo? Será que o governo americano esperou a Secretaria de Cultura deles? Será que os negros americanos esperaram alguma coisa do governo? Quantas vezes eu e Mister Zoi já declaramos que temos estúdio para todo mundo gravar. Ele faz o teu funk e acontece. Temos um Rio Parada Funk. Não tem nem aí se ali nego tá ganhando dinheiro ou caraça, mas é a parada que está acontecendo. Se acontecer alguma coisa de hip hop vai ser um malandrão que vai fazer isso e vai tirar proveito, mais uma vez. Então, passei anos da minha vida estudando como que os negros americanos ganham dinheiro: com o próprio rap. O rap é música, antes de mais nada. Como é que o Jay-Z consegue, em dois anos consecutivos, ser o músico mais milionário do planeta? Orgulho para a gente que vive numa cultura que pertence a eles. Como é que faz dinheiro? Não quero dar aqui a prepotência de que: “ah, o rap quando estourar vai levar todo mundo.” Não. Como é que os gêmeos viajam o mundo inteiro fazendo as suas exposições com grafite e levando a cidade de São Paulo e o nordestino para o mundo? Aqueles desenhos deles representam o Nordeste, da origem deles. Como um B-boy ganha seu mundo? Ganhando campeonato lá fora e sobrevivendo disso. A gente tem que saber separar o que um movimento cultural. Perguntei para o Áfrika Mombaataa: como você se mantém uma cultura e ganha dinheiro com isso? Você ouve na FM O Dia um bocado de pagode mela cueca, que é uma porrada de irmão da favela que está se levantando, mas também está do lado o underground e o samba. No outro dia botei no Facebook: caraca! Estou escutando Bezerra da Silva na FM O Dia. Como é que é a FM O Dia está fazendo? Não, isso existe, sim. Um respeito, uma coletividade, talvez que não precise de uma reunião. Uma vez vi uma roda de samba de um moleque novo de repente puxei um samba de raiz. Os moleques novos cantaram tudo. Pega um moleque desse da nova geração vê se ele vai cantar e MT Bronx? Estou conseguindo fazer com a juventude das favelas – comunidade é condomínio, desculpa aqui, tá – com passinho aquilo que não consegui fazer com o rap, com a cultura hip hop. Certo? Como que vamos ganhar dinheiro com isso? As festas desse cara não podem acabar nos fins de semana. A gente não pode deixar de se reunir. Quem é detentor do seu próprio samba? Quem é? Você vai ver alguém de fora fazendo isso, que não tem nada a ver? Não. O Zeca Pagodinho tem o escritório ao lado do meu, na Barra, é ele que dita as regras, Racionais dita suas regras, o crioulo dita suas regras. Eu vejo o rap ainda sofrendo com a questão da musicalidade. Nós temos aqui talentos, inúmeros irmãos aqui com CDs fazendo clipe, fotos maravilhosas, mas não vai para frente porque é aquele problema da questão do empresário, se nós não temos dinheiro como vamos ser empresários, eu vivo sobre isso. Hoje, eu tenho uma produtora, mas mesmo assim é difícil. Como que a gente pode gerar isso? Paramos os eventos, o fiel faz, ainda é o único no morro, na favela que rola ainda o hip hop. No Santa Marta eu estou lá, está todo mundo lá. O Fiel vai preso, é ameaçado... O SR. FIEL – Apanho. O SR. VINIMAX – Apanha. Como que vamos fazer isso? Nada mais do que justo, eu estou envolvido numa cultura, seja funk, rap, soul music e qualquer coisa, é deles. Como os caras ganharam dinheiro? Passamos 20 anos sem saber fazer dinheiro. Essa é uma realidade. Se alguém quer viver da cultura tem que saber fazer dinheiro. Vamos lá, cara, estudem, olhem como os raps americanos ganharam dinheiro, como aqueles que a gente não vê notícia, como o grafite tem suas exposições nas melhores salas de Nova York, como eles absorvem isso, como eles têm o poder de absorver isso. Eu não vejo isso. Eu vejo o seguinte: o negro, irmão, como já aconteceu, ele conseguir fazer um evento de hip hop dentro de um espaço que seja uma boate e ninguém apoiar, nego tacar pedra porque ele acha que está dando isso para playboy. Começa o preconceito desnecessário. É lógico que eu já tive isso, não aí no sistema, eu com olhos verdes falo que sou preto, tem essas coisas, todo mundo se empolgou com isso vendo Malcom X. Mas, se eu não me engano o Rebouças era de uma família negra. É mentira? Não. Como se ganhar dinheiro com isso? eu tenho amor pelo estúdio, pela tecnologia, esse cara aqui gasta o que não tem para botar o estúdio dele de pé e gravamos o Chacal. Você sabe da importância do Chacal para a cultura hip hop do Rio de Janeiro? Esquecemos Lorde Sá, do Grupo Ponto 50, que morreu? Eu não vejo nada na internet, nada. Vamos falar de História. Então, como é que a gente vai ganhar dinheiro com isso? Aí acontece essa parada, o cara faz um evento de hip hop e declara que foi 150 mil. Eu posso falar que esse cara aqui como letrista é Vocês já escutaram o rap do Marcelo? O Tupac é pinto, mano. Ele está do meu lado. A gente tem um estilo de rap criminal, a nossa base sempre foi o West Side, lá da Califórnia, sempre tivemos essa referência do funk, do soul e sempre relatamos o crime em nossas letras e sempre ganhamos nossas vidas. O BOPE quando estava atrás da gente lá, por incrível que pareça foi um outro cara do BOPE que livrou a gente, o cara se conscientizou, sacou? Todo mundo sabe, chama o cara pela saco, está aí na TV de vez em quando. Mas, tem muita coisa por trás, muita arma na nossa cara, muita ameaça. Sacou? Eu moro num lugar que todo mundo sabe qual é a do sistema lá, que não é tráfico, eu trabalho na cultura hiphopiana e neguinho: ó, tu tá planejando invadir a favela aí com os trafica. Entendeu? Mas aí o dono de lá falava: ó, rapaz, o cara. Os caras foram me matar na minha porta. Tá ligado? Aí o cara: tá maluco, o cara faz um trabalho social. Aí nessa hora, por incrível que pareça, o Muvuca salvou minha vida, olha só, logo da Rede Globo que a gente fala tanto. É muito doido isso, cara, a vida. Quando apareceu: não, realmente o cara faz, não vamos matar o cara não. E o sentimento que eu tenho de tristeza é que a sua luta, a luta dos nossos irmãos antigos foi em vão porque um passou para o Brasil que ele era o único detentor da cultura hip hop no Estado do Rio de Janeiro. Eu viajo o Brasil, eu sei, eu ando nessa parada, estou ligado, eu ando na terra do inimigo, mano, eu sei que se falar de hip hop é só um. Dificilmente você vai pegar um moleque aí e você vai lembrar de Contagem Regressiva, de Esquadrão Zona Norte. A gente caía na porrada, mas era tudo irmão. Togum. Nego fala mal do Togum porque o cara atuou no cinema. A gente fica perdendo muito tempinho. A gente não percebe que temos que vencer. Nós temos que ter um Wesley Snipes, porra. A gente vive numa cultura americana. Então, nós temos que ter o nosso Wesley Snipes. Tupac fazia balé. Mentira? Tocava baixo. Doctor J era um cara formado. Um CD do Doctor J custa cinco milhões para ser produzido. A porrada come. Ice Cube é formado. Inclusive ele fez um rap agora. Snoop é advogado. One é professor de história. Os jogadores de basquete são todos formados, senão não joga basquete. Também. O Rick Ross é policial, e tem um respeito, porque ele não vai matar os irmãos dele. Vai dizer: “ó, mano, tu tá errado, vem aqui”. Então, é isso. E qual é a luta? Eu sempre lutei. Eu sempre tenho a preocupação com o que faço agora, com o Passinho: é fazer o moleque completar o 2º grau e você entrar dentro da faculdade, mano. O Emílio Domingos ganhou agora a Medalha de Honra Pedro Ernesto, semana passada. Semana passada, não; anteontem. Um cara filho de um porteiro pobre que não tinha condições. Passava fome para estudar nessa universidade e escutava lá dos playboys: “meu irmão, está fazendo o quê aqui?” e o cara fez o L.A.P.A, fez o clipe, a batalha do passinho, onde eu fui o diretor musical, e o cara recebe a medalha onde ele foi humilhado durante quatro anos, estudando, filho de porteiro. Para onde a gente quer chegar? Eu tenho 20 anos nessas reuniões e até agora, qual é o objetivo? Porra! A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Você está dizendo tantas coisas incríveis, mas conta, porque eu estou tentando ... O SR. VINIMAX – Você quer minha história no hip hop? A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Não, você vai fazer. Nós vamos fazer isso. Nós não vamos perder isso de jeito algum. O SR. VINIMAX – Vai gastar muito tempo. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Claro, não é aqui, não. Não é aqui, mas a gente está vendo que é uma coisa extraordinária. Mas você está dizendo – é fantástico essa coisa dos negócios – adorei isso, porque eu vou dizer para vocês: você, falando isso que você está falando, você hoje está na vanguarda do Brasil. O que o Brasil precisa é que pessoas como vocês digam isso. O SR. VINIMAX – Exatamente. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Nós queremos viver do valor que estão produzindo e não apenas da condescendência e da boa vontade do Estado. Não existe isso mais. Então, você está na vanguarda do Brasil. Se, nessas eleições presidenciais, essa mensagem pudesse ser ouvida, de pessoas que têm o protagonismo que ninguém deu, que foi conquistado na luta, na realidade da vida, eu acho que já é uma coisa extraordinária. Agora, pelo menos que não atrapalhe, porque, na verdade, a gente vê que, às vezes, as instituições criam tantas regras, tanta confusão que acaba que o dinheiro vai parar num lugar que não era para ser... O SR. VINIMAX – Que não era para ser. Exatamente. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – ... e o outro que está fazendo o que tem que ser feito está aí completamente desamparado. Agora, o que eu queria é que você contasse para mim, porque eu estou tão emocionada com essa história do filho do porteiro. Não é isso que você está contando? O SR. VINIMAX – É. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Que recebeu uma medalha onde ele foi humilhado. Conta melhor isso para mim, porque você passou tão rápido que eu tinha vontade que você contasse um pouquinho melhor essa história. O SR. VINIMAX – Exatamente. O que eu quero dizer é que o Emílio é um cineasta urbano, onde ele relatou a fase mais importante da cultura hip hop. Você coloca no youtube “hip hop Rio”, onde tem o TR, onde tem a gente, onde o cara documentou isso e é muito importante. Então, ele faz tudo isso sem custo nenhum, está ligado? Sem pedir nada para ninguém, tenta, várias vezes, com dificuldade, através de uma Lei Rouanet, fazer o seu documentário, o seu filme, como a gente tenta, na cultura hip hop, o movimento tentar pegar uma empresa ou não, e não consegue, ele fez isso sozinho, como ele fez a Batalha do Passinho, durante três anos, documentando, indo no morro. Ele fez a mesma coisa com o hip hop. Documentou isso. Tem histórias fantásticas. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Como é o nome dele? O SR. VINIMAX – Emílio Domingos. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Emílio Domingos. O SR. VINIMAX – Exatamente. Então, o que eu quero dizer? Falei da parte do negócio, da onde a gente vai. Então, o que acontece? O pastor ali falou uma coisa muito importante, que foi sempre a nossa intenção aqui, do TR, do Zoi, que é salvar vida. Mas vamos salvar vida. Mas, se ele não tem uma base intelectual – eu chamo meus vizinhos de burros porque eles me conhecem, sabem que eu sou chapa. Falo: meu irmão, pega um jornal desse aí para ler em meia hora para saber que o maluco do Adriano estava lá na boate doidão. Você acha legal isso, ficar discutindo isso? Sabe, é levar informação, a cultura hip hop sempre foi isso, levar a informação. Agora, como que a gente consegue pegar 500 mil de uma empresa e colocar para o Bruno fazer o seu evento e ele pegar um astro do Hip hop e dar a possibilidade de a gente entrar, pagar 15 contos, e não ele fazer. Ele é o produtor, se ele tiver que trazer o Jay-Z aqui onde é feito o Rock’n Rio e a entrada ser de 150, se põe no lugar dele. Se ponha no lugar dele. Isso é fácil, entendeu? Então, como que a gente faz, porque eu vejo esse apartheid, eu vejo alguém do apartheid saindo dali, opa, vou pegar aquela parada ali, vou arrumar um dinheiro, eles têm essa facilidade, têm a máquina. Mas, para se conquistar a máquina, eu tenho que despertar interesse, interesse. Alguém tem que ganhar com isso. Você já viu Ensaio de hip hop, esse documentário? Já viu. A gente tem que ver. Um judeu pegou a parada: Meu irmão, vou fazer dinheiro com esses caras aqui. E, hoje, o dono da Roc-A-Fella é quem? Jay-Z. O Racionais fez a mesma coisa. Quando eu fui contratado pela Sony Music, quando eles foram distribuídos, eles tinham uma forma de distribuição e de um investimento de marketing da própria Sony Music. Eles trabalharam o seu Marcha do Sobrevivente, a Sony Music aplicou dinheiro, mas, numa pequena cláusula, eles meteram o pé. Muito inteligente. Eu ouvi o presidente falando isso quando me contratou. Porra, por causa da pequena cláusula...! Como é que os caras conseguem falar mal da Nike e a Nike patrocina os caras? Como é essa manobra? Pô, se o cara fala mal de mim, como é que depois eu consigo, pô, o cara está falando mal de mim, como é que eu vou ceder alguma coisa para o cara? Temos que ser espertos, gente. Temos que entender de administração. Será que a referência do Racionais, eu hoje não tenho tanta, mas, tipo assim, será que essas manobras administrativas, de negócio, não seriam uma coisa muito importante para que o pastor também tenha uma renda para o seu grupo, para que o Rafael tenha também uma base para que ele faça os seus eventos, para que nós aqui, no nosso estúdio aqui, possamos comprar um microfone de 30 mil dólares para que a voz do rapper seja muito boa? Como é que essa massa de manobra que você fala assim: a Nike não presta, faz trabalho escravo na Índia, e o cara chega na periferia em São Paulo, vamos conversar, irmão. Beleza, distribui aqui tênis para a rapaziada, o mais caro que você tem. Será que é só isso? Não, não vamos discutir isso. vamos discutir como é essa manobra administrativa. Desculpe, gente, mas eu já participei de tantas reuniões desse jeito, não desmerecendo esta reunião, não. Pelo amor de Deus, eu estou chegando agora, eu sou do funk, tá ligado? O hip hop, para mim, é uma coisa muito mais particular, muito mais da forma que Cristo pregava, de casa em casa, né? Não botando o som na praça, gritando mais. Espero que queira também, que chegue a esse ponto, que chegue a um denominador comum que a gente possa gritar e que a gente possa chamar atenção e interesse de quem realmente não faz parte e coloque, aplique o dinheiro porque isso é uma realidade. O SR. ARCÉLIO FARIA – A grande verdade, sem querer cortar a tua fala, que é extremamente importante para o movimento, o hip hop hoje, a gente não pensa só no hip hop na rua. A gente pensa em ultrapassar os muros da escola. O SR. VINIMAX – Exatamente isso. O SR. ARCÉLIO FARIA – Trabalhar o intelecto dos nossos filhos e, oxalá, nossos netos; formar nossa juventude com aquilo que nos formou O SR. VINIMAX – E dentro de uma faculdade. O SR. ARCÉLIO FARIA – E, detalhe, e fazer da rua um lugar melhor também de se trafegar. O SR. VINIMAX – De trafegar. E a rua precisa de quê? de uma cobrança, e envolve a política, envolve você fazer do teu hip hop um trampolim para, meu irmão, você só vai ser alguém, você só vai ser alguém dentro da cultura hip hop se você carregar os cinco elementos. Se você quer ser alguma coisa na sociedade, você vai ter que ter, ser um cara bem instruído, você tem que estar dentro da UFRJ. Pô, a pesquisa diz agora... O SR. DJ TR – Desconstruir na cabeça do menino da comunidade, inclusive, que universidade não é coisa só para o filho do bacana, é política pública para todos. O SR. VINIMAX – Exatamente. E você viu a última pesquisa que saiu agora? 83% dos que pagam faculdades são pobres. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – E vice-versa, 83% dos que não pagam poderiam pagar. Ou são ricos ou são de classe média. O SR. ARCÉLIO FARIA – Vini! Tem uma coisa aqui, no nosso país, que a gente tem que desmistificar, que é o seguinte: enquanto nos Estados Unidos a negrada se forma, como você falou, é faculdade, os nossos governantes e a elite quer formar a nossa comunidade com mão de obra escrava: é manicure, é cozinheiro ... O SR. VINIMAX – Os estereótipos, não é? O SR. ARCÉLIO FARIA – Por que a gente não pode fomentar, nas nossas comunidades, o neguinho, que pode ser um engenheiro, um médico, um advogado? Mas, há toda uma máquina que gera isso daí, e que o quilombo mudou! Hoje o quilombo são as favelas e a escravidão mudou. Hoje, a escravidão é a manicure, é a pedicure. Por que na nossa comunidade não podemos ter engenheiros, doutores? O SR. VINIMAX – Exatamente. O SR. ARCÉLIO FARIA – Nós temos que estar atentos a isso. Eu acho que o movimento hip hop tem essa função. A gente já vem discutindo isso com alguns professores da Faetec, para que a gente possa estar dentro das comunidades, dentro das escolas e desmistificar isso, que a nossa população só pega esses cursos de qualificação básica, para manter. O SR. VINIMAX – Exatamente. Para manter! Tipo assim: o trabalho da empregada, ah, beleza, é um trabalho honesto, mas é colonial, brother. E de uma cultura colonial! O SR. LEANDRO OLIVEIRA – Eu, você, Zoi, Marcelo, o pessoal mais antigo, a gente cansou de ouvir o Afrika Mambaattaa dizer que o hip hop não precisa só dos elementos. Precisa dos doutores, professores, médicos. Ou seja, eu estava falando outro dia, numa palestra, sobre isso, falando com as crianças da escola, dizendo o seguinte: “Gente, hip hop é como a arte marcial, que você tem um início, uma entrada, ajuda também a formar tua disciplina, que vem de casa – a educação tem que vir de casa, a primeira educação é de casa, é primordial -, mas na escola ajuda a moldar, lapidar essa disciplina. Então, você começa com o hip hop como você começa num programa de arte marcial, não quer dizer que você venha a ser uma atleta ou você venha a ser um artista, no caso do hip hop. O SR. VINIMAX – Exatamente. O SR. LEANDRO OLIVEIRA – Mas a gente ajuda a pavimentar o caminho desse menino, para que ele seja o advogado de amanhã, um professor, um médico... O SR. VINIMAX – Essa sempre foi minha preocupação! Sempre foi! Sempre foi! O SR. LEANDRO OLIVEIRA –... e que ele possa ocupar todos os setores da sociedade, sem o demérito aos empregos que nós, é até pateticamente classificado como subemprego, subemprego, o próprio Arcélio falou, mas tudo bem, que seja sim uma boa manicure, que seja uma boa cabeleireira, mas também que possa ter oportunidade de ser uma boa professora, um bom médico, um bom advogado, e que possa ocupar todos os setores da sociedade, como a gente almeja. O SR. VINIMAX – De manicure. Que ela possa até ser dona do... como é o nome do bagulho que pinta a mão? (pausa) Esmalte, essa parada aí mesmo. Pode ser. Aí incentivaria isso. Sim, possa ser o que quiser. Acho que a cultura hip hop tem que ser um trampolim assim como foi o trampolim para os norte-americanos. O SR. LEANDRO OLIVEIRA – Só uma ressalva, nós somos praticamente quase 100% da nação afrodescendente no Brasil, enquanto nos Estados Unidos são apenas 12% de afro-americanos. O SR. VINIMAX – Deixa eu dar só um exemplo. Morreu agora um jovem nos Estados Unidos, está dando uma merda do caramba. Desculpa a minha linguagem, está ligada em favela. É fogo, eu falo palavrão. Desculpa. Está todo mundo ali brigando. Você lembra que há dez anos mataram um médico negro e o movimento hip hop não fez nada, em São Paulo. Então, começa por aí, não é? É isso aí. Obrigado, gente. Desculpa aí. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Não, não. Olha só, eu queria só pedir desculpas a vocês porque eu tenho mais um tempo para falar, e curtinho, mas eu queria dizer a vocês que o que foi dito aqui e ouvido tem um enorme valor, não apenas cultural - nós estamos na Comissão de Cultura –, mas social e político e econômico, nós vimos aqui. Então vocês podem saber que não encontrarão uma pessoa mais preocupada, há trinta anos, com as indústrias culturais do nosso estado, do que eu. Porque, na verdade, a Cultura tem esse lado educação, esse lado formação, que é um lado estatal. Num certo sentido, a responsabilidade é em boa parte estatal. Mas esse lado mercado, esse lado negócio, que é importantíssimo, que pode fazer a glória de uma cidade ou de um estado. E que a nossa cidade tem tudo para ser isso, tem tudo. O que vocês estão mostrando aqui é que esse mercado poderia ser um mercado de autodinamismo, empregando, fazendo as pessoas ascenderem socialmente, e não apenas ficarem gravitando em torno da coisa pouca. É claro que uns vão ficar mais para baixo, outros vão subir. Infelizmente, não há nenhuma sociedade do mundo que permita a todo mundo subir, mas sobe aquele que tem vontade, que tem talento, que tem predisposição, e nós queremos garantir isso para todo mundo, para vocês especialmente. O SR. VINIMAX – Que a lei seja cumprida, que a Secretaria realmente não escolha aqueles a quem eles querem dar o dinheiro, porque é isso que acontece. Para o hip hop nunca deram. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Concordo com você. Nós estamos discutindo isso no sistema. Deixa eu dizer uma coisa importante para vocês: no sistema estadual de educação que já foi discutido aqui em uma audiência pequena, que foi um pouco rápida, vamos dizer assim – vamos ter outras –, quando essa proposta chegar, nós vamos ter que ter um certo cuidado porque dentro desse sistema está incluída a lei de incentivo, que está sofrendo algumas mudanças. Então, é preciso que a gente tenha cuidado para garantir esses mecanismos mais abertos de mercado e essa forma mais democrática de espalhar a iniciativa e de garantir a iniciativa da maneira como você colocou. Mas isso é um capítulo em que a gente tem que ter clareza. Vocês estão dizendo o seguinte, eu interpreto assim: o hip hop é um capítulo da indústria cultural do estado do Rio de Janeiro, da cidade do Rio de Janeiro e tem que ser tratado como tal. Não é só o mendigo cultural, da periferia, coitada, lá, não tem o que fazer, está infeliz, querendo se manifestar, como se fosse uma coisa assim. Não, é um mercado, tem capacidade, tem que movimentar esse mercado. O SR. VINIMAX – Criar o mercado. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – E tem que criar o mercado. O SR. VINIMAX – Junto, paralelo, sim, manter a cultura viva. Não é dali sair realmente a questão... A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Deixar essa criatividade rolar. O SR. VINIMAX – Rolar e com direitos, porque infelizmente as coisas para o hip hop sempre rolam quando tem alguém – quando falo hip hop, é o hip hop do outro lado – que diz assim: “Ah, o apresentador está dentro, o diretor da televisão está dentro, o fulaninho está dentro.” Aí as coisas ficam muito mais fáceis e se atropela, vão passando por cima dos preconceitos, daquilo que o hip hop emprega, que é contra o sistema. É porque gera interesse, entendeu? Realmente, a coisa funciona desse jeito. Tudo que eu falei aqui, gente, eu tenho realmente um sentimento de muito tempo aqui, de que a luta parece que foi em vão. Não foi em vão porque a galera continua, mas é complicado. Tipo assim, essa coisa de a Secretaria liberar qualquer coisa tem que ter interesse, é impressionante. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Bem, eu acho que a mensagem está passada. Vocês têm aqui um espaço aberto para aprofundar isso. Eu acho que um dos grupos que a gente cria aqui é o grupo do negócio, negócio no bom sentido, indústria cultural, economia criativa, é isso aí. O outro nitidamente é a formação, a regeneração, que o pastor colocou muito bem, você também, esse lado regenerador que é educativo, sem dúvida, mas uma educação num nível, digamos, muito superior, cultural mesmo. Meu Deus, tem toda uma história do Bispo do Rosário, dessa coisa toda. Nos hospícios se cria uma arte de primeira linha, então, a gente sabe que a arte e a marginalidade se amam. Muitas vezes, tudo começa com um ato rebelde e marginal e depois essas coisas vão sendo assimiladas, vão sendo, digamos, incorporadas, às vezes, com valores mais profundos que depois ninguém sabe nem de onde aquilo veio. Essa é a realidade. Eu estou aqui registrando essas grandes contribuições que vocês deram, essa questão da forma com que o ator improvisa os seus próprios meios ou aproveita o meio que lhe é acessível para alavancar uma questão cultural. Vamos dizer, no teu caso, é mais uma questão de dizer: “Olha, eu mesmo acabo me financiando. Já que ninguém me financia...” É outra vertente muito impressionante. Tenho agora, infelizmente, um minuto para cada um dos três, que ainda querem falar. Vocês desculpem, mas o hangout, vamos continuar. Espero que vocês topem isso, essa proposta minha. O SR. ROBSON RAMOS – Boa-tarde! Com licença dos mais novos, dos mais velhos, mas quero aproveitar o gancho do Vini, eu me chamo Robson Ramos, empresário da grife DNG, mais conhecida como DNegro, e o que o Vini falou é isso, correr atrás. É difícil fazer cultura sem falar de dinheiro, sem falar de negócios. Há muito tempo, já subi morro, já desci morro, somente pela cultura, sem um tostão no bolso. Hoje, a grife está no mercado há dez anos com 35 pontos de venda e é uma resistência hoje, em Madureira, só que, eu sou o lado cultural da coisa. O meu sócio Gerson Júnior é o lado empresário, porque tem que ter essa veia, esse cunho empresarial, porque hoje, antes de ele chegar na empresa, há cinco anos, eu só sabia falar de cultura, sem dinheiro no bolso. Ele chegou – a cultura ainda existe – mas chegou o lado, a veia empresarial. Quero deixar bem claro e registrado que temos amigos em comum e sabemos com quem estamos lidando. O TR é meu amigo pessoal, Bruno, o LP e a gente discute muito isso. O Bruno diz: “- Pô, olha aí, está fechando, não sei o quê”. Só que a nossa loja é uma igreja, a gente não pode descartar os fieis, mas sabemos quem é quem. E lá tem uma veia empresarial, que se chama Gerson Júnior, porque não se fala de cultura sem dinheiro, não se fala de cultura sem falar de negócios, então, tenho um negócio e o que o Vini falou, realmente: “ – como fazer a cultura se transformar em dinheiro ?” Isso não é vergonha. As pessoas têm medo de falar de dinheiro. Não podemos ter medo de falar de dinheiro, temos que falar de dinheiro, só que também temos que lidar com o dinheiro, saber lidar com o dinheiro, sem deixar a cultura ir pelo ralo. Boa-tarde. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Mais um depoimento para se juntar ao do Vinimax, que é realmente essa vinculação da cultura com os negócios, com a indústria, com a economia da cidade, mas que foi uma coisa maravilhosa porque temos mais um depoimento. Quero também homenagear Madureira, que é uma espécie de milagre cívico da cidade do Rio de Janeiro, por que o samba nasce lá. Digo, Madureira e adjacências, como Oswaldo Cruz, aquela área toda. Meu Deus do Céu, é uma coisa explosiva. Aquilo nasce e ninguém sabe nem como e de onde surge – é o ritmo, é o samba, é a criatividade. E estamos vendo que Madureira agora está se espalhando por muitos lugares. Então, que bom que está cidade tem isso. Como isso provoca uma esperança e, sobretudo, podermos dizer: podemos fazer esta criatividade funcionar economicamente, dando empregos e não empreguinho, mas emprego de tecnologia especial. Você falou muito bem quando disse que gosta de tecnologia. Olha que coisa! Eu gosto de tecnologia. Temos que gostar de tecnologia. O SR. DJ TR – O hip hop é tecnológico. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – O hip hop é tecnológico, então, nós gostamos de tecnologia, porque é o futuro é a modernidade que com ela se pode fazer muitas combinações, imprevisíveis. Que bom. Quem vai se pronunciar? O SR. LEANDRO NEVES – Boa tarde a todos. Boa tarde, Deputada. Eu sou Leandro Neves, conhecido como DJ LP. Eu comecei nessa luta aí em 89, eu tinha 10 anos - eu era criança ainda -, através de um primo da minha mãe, que tinha uma equipe de som. Enfim, no subúrbio do Rio, e fui muito discriminado pelos meus pais. Os meus pais não tinham conhecimento e dali o meu pai “pô, você vai entrar nessa vida de DJ e tal. Tem que estudar”. Eu falei: “Tem que estudar, então, está bom”. Passei a entrar no estudo, estudar com firmeza. E dali eu pegava o dinheiro da merenda e, em vez de comprar a merenda, eu comprava discos, e discos, na época, era vendido em dólares. Porque era na época do cruzeiro. Então, a gente não tinha essa facilidade de trocar a moeda do cruzeiro pro dólar. Então, tinha que ter alguém mais velho do que eu ou então maior de idade para chegar no... Como se diz o nome? Casa de câmbio, pra trocar moeda para eu comprar um disco de 18 dólares, que na época, hoje seria mais ou menos uns 80, 100 reais. E daí, beleza. Em 93, passei a conhecer o hip hop de verdade, através do skate. Até porque também o skate tem uma afinidade também, um agregamento. E eu fui, em 96, fiz o evento em rua, no subúrbio do Rio, em Ramos; em 97, participei de um festival no Imperator – o TR estava até comigo; em 2002, fiz o programa de hip hop, na Rádio Roquete Pinto, que é do Governo do Estado, e daí a minha mãe e o meu pai acreditaram que o movimento dava certo; acreditaram que eu era DJ mesmo, depois de 13 anos que minha mãe e meu pai acreditaram. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – E você estudou? Você seguiu o conselho de seu pai e estudou? O SR LEANDRO NEVES – Sim, senhora. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – O que você estudou? O SR. LEANDRO NEVES – Eu terminei o 2° grau. Mas, agora, teM uma parte que é complicada, que é o vestibular. Eu fui atleta, já fui atleta do Olaria Atlético Clube, graduado a faixa preta, tanto no judô, como no jui jitsu, e já dei aula para crianças também, através da música do hip hop. Na época, ninguém fazia isso. “Pô, mas você vai botar música pra gente treinar e tal?”. Qual é a música que vocês gostam? “Ah, gosto da música do Snoop, do Tupac e tal”. Botava a música, o pessoal se concentrava na música e, ao mesmo tempo treinando. Mas, enfim, participei dos eventos West Coast, que o Bruno pode até falar isso aí mais lá pra frente. Eu mostrei para ele o que era a cultura hip hop. Na verdade, ele fez o evento Black Music, mas envolvendo uns quatro ou cinco elementos hip hop, que não tinha. Eu fiz os eventos, era tudo chopada, era tudo bebida, chopada, essas coisas. Eu participei dos eventos também da Batalha dos MCs, que se chamava a tradicional Batalha do Real, de onde o MCida – não sei se a senhora já ouviu falar em MCida, lá de São Paulo -, ele foi um MC que saía de São Paulo, ia para Porto Alegre, ia para Salvador, tudo sustentado pelo selo dele mesmo. Ele copiava o CD e vendia através da passagem que ele tinha que pegar pra chegar até a cidade dele e outras cidades. E hoje ele se tornou o MCida. Já foi campeão da Batalha do Real, já foi campeão da Liga dos MCs, e hoje em dia é um artista que todo mundo vê. Eu já fui vice-presidente do Morro Santo Amaro, aqui no Catete. A questão que o Arcélio estava falando, que eu já estava quase esquecendo, eu consegui fazer uma vez, mas tentei fazer outras vezes, e fui impedido pelo órgão público da Polícia Militar. Aí o pessoal: “Pô, não pode fazer o evento?”. Não, tem que falar com o comandante do batalhão, que é o 2° Batalhão. Cheguei lá, falei com o comandante do 2° Batalhão para fazer o evento. “Ah, você vai fazer evento para o tráfico”. Eu falei: “Não senhor. Vou fazer evento para a comunidade e para as pessoas que vão participar.” “Não, então nós não vamos autorizar porque aqui tá dizendo que é pra tráfico.” Eu falei “Mas quem disse que era pra tráfico?” Como já aconteceu no Santa Marta, como já aconteceu no Morro da Lagartixa e outras comunidades. E ali eu tinha que fazer no braço. Fiz no braço o evento, tentei fazer outros, mas não consegui. Mas, enfim, hoje, resumindo, não sou mais vice-presidente. Já terminou o meu mandato. Mas o presidente que estava junto comigo, ele continua lá, eles estão querendo fazer outros eventos de hip hop lá e é isso aí. Eu consegui ganhar a experiência com o hip hop. Eu, apesar de estar há 25 anos nesse negócio, eu aprendo até hoje. E é isso aí. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Boa história. Boa vida. Muito sucesso que você teve na sua paixão. Eu vou ter que encerrar aqui porque começou a votação lá embaixo. Então, eu agradeço a todos. Estamos abertos aqui. Se você quiser poder agendar rapidamente um hangout. Vocês vão estar nos lugares que tiverem e a gente escolhe três pessoas, podemos talvez dividir os temas e começar, não sei, essa área dos negócios me pareceu uma coisa fantástica, a área da regeneração também. Então, a gente podia fazer uma divisão do tempo aí, com uma hora e pouco de debate, uma hora e meia. A gente dava meia-hora para mim, meia-hora para outro tema. Que tal? Vocês gostam da ideia? E aí vamos ver o que pode resultar disso concretamente além das coisas que a gente já combinou. Eu queria agradecer muito a todos vocês pela contribuição. E quero dizer que emocionada eu constato que tivemos neste lugar, aqui nesse momento, uma discussão que é muito difícil de acontecer com outros segmentos. Porque há segmentos que dependem tanto do estado que têm medo até de pensar. Porque se pensar uma coisa diferente do que é oferecido pode perder o pouco que têm. E vocês tiveram aqui a independência de falar o que o Brasil quer ouvir, que a cultura brasileira é uma coisa poderosa, seja ela global, nós temos aqui as nossas raízes. E, exatamente porque ela é poderosa, ela merece ser tratada como um destino, uma vocação e não apenas como um, digamos, paliativo, ou uma compensação por uma coisa que nos foi tirada ou que foi tirada àqueles que vivem nas periferias, que vivem tendo que lutar muito para sobreviver nesse mundo difícil que nós vivemos. Então, eu acho que as contribuições foram extraordinárias. Eu saio enriquecida, emocionada e, mais do que isso, consciente de que nós, como se diz? Colocamos o dedo na moleira. A gente tá realmente no caminho certo, que é o caminho de transformar uma vocação num destino, que é uma coisa muito maior e muito mais importante para poder fazer esse movimento, continuar vivo e vingar e se reproduzir da forma como todos os movimentos dessa magnitude evoluem. Muito obrigada pela atenção e, sobretudo, participação de vocês. Foi uma reunião muito democrática onde todos, praticamente quase todos puderam falar. E nós estamos abertos para os próximos voos. Tá bom? Muito obrigada... O SR. MANO GEORGE – Para encerrar, eu queria agradecer primeiramente a Deus por estar aqui nessa plenária. Agradecer ao DJ TR, à Deputada Aspásia Camargo. Infelizmente, nós estamos já encerrando, eu queria falar rapidamente, só pra encerrar. Para quem não me conhece, eu estou no hip hop há mais de dez anos. Participei do projeto Geração Hip hop, junto com o DJ TR, onde ele também teve a oportunidade de lançar o livro dele. Um projeto patrocinado pela FINEP e idealizado pelo Sesc Rio. Estou no hip hop há mais de dez anos e o hip hop me ajudou a comprar o meu primeiro computador. E graças ao hip hop hoje eu sou formando em jornalismo, sou jornalista do Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio de Janeiro. Então, eu acho que é por aí. Eu acho que todos nós devemos ver, observar o nosso valor, e acreditar. É um pouquinho do que cada um aqui já falou. É correr atrás, se formar, se profissionalizar e incentivar as nossas comunidades de que é possível nós realizarmos os nossos sonhos. Se nós traçarmos um objetivo a gente consegue alcançar. A gente consegue chamar a atenção dos nossos governantes, como hoje, nós estamos aqui com uma deputada nos ajudando, nos ouvindo, parando para nos ouvir. E se a gente se unir cada vez mais com um propósito, com um objetivo, a gente vai cada vez mais longe. Eu entrei nesse movimento através do hip hop gospel, junto com um grupo de rap chamado Aliados de Deus, onde pude ter a oportunidade de narrar na rádio comunitária, estar inserido na comunicação; onde pude fazer entrevista de grandes artistas em grandes eventos de hip hop, que até a um tempo atrás existia e, hoje, já não existe mais. E está na hora de a gente colocar nas mãos do hip hop um movimento que nos represente, um movimento que lute por nossa causa, que defenda a nossa causa. E, por que não, continuar com prêmios de hip hop, com incentivos, trabalhos, projetos, onde a gente possa mostrar a nossa cara, mostrar o nosso valor. Não é isso mesmo, TR? Estou aqui com o meu amigo MV Santos, também, que está comigo nessa caminhada, nessa longa caminhada, onde a gente faz os eventos sem patrocínio, sem financiamento nenhum. A gente leva o movimento hip hop gospel. O primeiro movimento hip hop gospel no Rio de Janeiro foi levantado pela gente, com muito esforço, com muito suor, com muita batalha, sangue, suor, determinação. A gente acredita. E hoje nós estamos aqui. Muito obrigado a todos vocês. E vamos à luta. A SRA. PRESIDENTE (Aspásia Camargo) – Obrigada, George. Foi um prazer. Está encerrada a nossa reunião.