You are on page 1of 12

1

Modernização, políticas públicas e sistema de gênero no Brasil:


educação e profissionalização feminina entre as décadas de 1920
e 1940

Tese Central: As experiências de escolarização conquistadas através de


políticas públicas sociais e, mais especificamente, pelas políticas educacionais
implantadas nos anos 20 e institucionalizadas na Era Vargas, transformaram
significativamente o sistema de gênero, principalmente, no que tange aos
mundos acadêmico e científico.

INTRODUÇÃO
1. Crescimento da participação das mulheres no sistema de Ciência
tecnologia (C&T) nas instituições de ensino superior e de pesquisa;
2. Especificidade do panorama brasileiro – ao contrário dos países
desenvolvidos é povoado de inúmeras complexidades:
a. De um lado verifica-se uma progressão ligeiramente melhor das
mulheres nas escolas indicando uma certa debilidade de gênero
vinculada a constante perpetuação da separação entre o feminino
e o masculino entre os diversos cursos e profissões – gênero como
uma forma social, histórica e política de organização, de diferença;
de outro, manifesta-se uma progressão interrompida e acidentada
para mulheres e homens de estratos sociais e raciais
subordinados;
b. Magistério como porta de entrada privilegiada das mulheres ao
mercado de trabalho (1990 – inicialmente nos ensinos fundamental
e secundário, e logo em seguida penetrando também o nível
superior sobretudo nas áreas da biologia, física, química,
matemática, nas humanidades, letras, história e pedagogia;
c. Desafio é responder à pergunta: Por que não se altera o padrão
sexuado perpetuado nas carreiras escolares e profissionais?
d. O status educacional e profissional femininos repercutem ainda,
em certa medida, o efeito das reformas ocorridas no sistema
escolar brasileiro nos anos 1920 e 1940, atrelado ao gradual e
perseverante movimento do interesse feminino – classe média e
alta urbana – por carreiras as quais eram indispensáveis uma
formação em nível superior;
e. Há na bibliografia uma interpretação consolidada que tende a
minimizar as consequências das reformas que operaram no perfil
educacional da população feminina:
 O estudo de Susan Besse (1999): Para a autora a meta
das reformas ocorridas no sistema educacional brasileiro
2

não era fomentar uma emancipação intelectual,


econômica e social feminina, mas mobilizar efetivamente
esse corpo-biológico-mulher no sentido de promover a
saúde física, prosperidade econômica nacional e
estabilidade político-moral-social. A receita que ancorava
esse novo modelo educacional inclusivo para mulheres
compreendia doses de educação moral e disciplina social
aliadas a instrução em conhecimentos e habilidades
básicas nas quais o “rosto doméstico” ainda estava
profunda e explicitamente caracterizado.
 Apenas uma pequena elite se beneficiou no sentido de
alcançar essa autorrealização e independência econômica
por via da realização acadêmica e profissional e essas
mulheres viam ainda suas aspirações subordinadas ao
controle da escola, um dos braços forte do Estado que
perpetuava a lógica autoritária e patriarcal na qual se
preservava a hierarquia de gênero para diferenciar os
conteúdos para meninos e meninas.
 Assim, para a autora, os efeitos teriam sido atenuados
pelos conteúdos compreendidos como os possíveis e
corretos para formação de uma mulher – aqueles que a
preparavam para maternidade e para o casamento – que
reiteravam a tradição autoritária e patriarcal brasileira, as
relações de dominação do masculino sobre o feminino. Ou
seja, para ela, se houve modernização/reconfiguração dos
papéis de gênero, esta abalou a estrutura da desigualdade
e nem se quer contribuiu para a emancipação intelectual,
econômica e social das mulheres frente aos homens: “Na
verdade, esses novos papéis femininos, criando uma
ilusão de mudança, mascaravam e com isso ajudavam a
perpetuar a dominação masculina” – ênfase nas
estruturas históricas.
f. O atual trabalho, na contrapartida dessa ênfase nas estruturas
históricas de permanência e destas como verdadeiro rosto de
uma época, corpo real de uma dada sociedade, se move no sentido
de desenhar uma trajetória mais “foucaultiana” para a história.
 Foucault critica os sistemas de pensamento que postulam
uma certa “origem”; para o autor não existem entidades
suprahistóricas;
 Trata-se de uma recusa a noção de origem no seu sentido
metafísico: o de que há uma verdade única e primeira
antes da História;
 “A história tem por função mostrar que aquilo que é nem
sempre foi, isto é, que é sempre na confluência de
3

encontros, acasos, no devir constante, no vir a ser, que se


formam as coisas que nos dão a impressão de serem as
mais evidentes”;
 A história é descontínua, dinâmica, cataclísmica, loteada
de rupturas e quebras. Não se trata de um desenrolar
linear, num Continuum de cenas e acontecimentos que
podem ser datados e previstos, mas de mutações
inaugurais imprevisíveis que se realizam em meio a
conflitos e são ritmadas apenas pela disputa de forças que
entram em embate no campo da vida;
 Aqui, a partir dessa noção de descontinuidade desenhada
por Foucault, trata-se de empreender uma análise
cuidadosa perante a História que ponha em evidência as
rupturas, que narre a história com suas intensidades,
diferentes tonalidades e seus desfalecimentos, uma
história que nos ensine a rir das solenidades de origem
(FOUCAULT, 1979, p. 18).
 Trata-se de mostrar que nos bastidores das coisas, dos
acontecimentos há algo de inteiramente diferente, que não
a verdade secreta ou essência a ser descoberta, mas a
verdade secreta de que não há essência;
 Compreende-se aqui sob esse olhar arraigado ao
dinamismo o processo de transição e metamorfose do
perfil educacional feminino do início da República à
década de 40 que assistiu o transmutar de um cenário
onde predominava o analfabetismo para um campo onde
a formação de nível superior, monopólio masculino,
tornava-se possível também as mulheres;
g. “As mulheres nem sempre foram vítimas, sujeitos passivos”: não
existem papéis fixos na equação relacional, todos os elementos
envolvidos são passíveis de transformação, capazes de inverter,
subverter a lógica operante que por hora se faz instituída; assim,
elas encontram modos de se esquivar das rígidas conservas
impostas, elaborando contra-poderes capazes de subversão frente
ao reducionismo das funções, papeis sociais e espaços possíveis
de serem ocupados;
h. “Onde há poder, há sempre resistência” (FOUCAULT, 1985): ou
seja, onde se estabelecem relações, jogos de poder, se desenham
também oportunidades de escape; nesse sentido, trata-se de supor
as oportunidades educacionais e profissionais como brecha para a
emergência de um maior campo de atuação para as mulheres, de
papeis sociais que estreassem na esfera pública e rompessem
gradativamente com as fronteiras do privado;
4

3. Sobre a conjuntura sócio-histórica: Sociedade Burguesa Capitalista


a. A República funciona como corpo do rei na Monarquia: o corpo da
sociedade se torna no decorrer do século XIX o novo princípio
básico para o funcionamento do Estado; dos rituais voltados a
integridade do monarca, tem-se a gênese de receitas, terapêuticas,
estratégias regulatórias voltadas a docilização dos corpos, à
socialização do corpo biopolítico, a gestão da população de
cidadãos como bens do estado e alvo de investimento político e
social.
b. A eliminação pelo suplício é substituída por métodos de assepsia
aplicadas a ideia de corpo social que surge não por um consenso,
mas como fruto da materialização do poder se exercendo no
próprio corpo do indivíduo.
c. Através de um trabalho insistente, obstinado, meticuloso que o
poder investiu e exerceu sobre o corpo feminino, surge como efeito
uma espécie de “consciência de si”, desse próprio corpo, onde,
como consequência direta desta emerge a reinvindicação do
próprio corpo contra o poder, das vontades contra as normas
morais da sexualidade materializadas no casamento, na
maternidade e domesticidade. Assim, o que tornava forte o poder
passa a ser aquilo por que ele é agora atacado – “o poder penetrou
no corpo e encontra-se exposto no próprio corpo”.
d. O poder não se aniquila, mas recua, se desloca, se engendra e se
articula a outros saberes, discursos e investe em outros lugares,
outras práticas sociais extradiscursivas;
e. Do século XVII ao início do século XX, acreditava-se que o
investimento do corpo pelo poder devia ser denso, rígido,
constante, meticuloso, daí surgem intensos regimes
normalizadores e disciplinares perpetuados em espaços como
escolas, cidades, famílias;
f. Nessa nova paisagem social é forjado um novo estilo de vida
urbano, instaurando novas necessidades e demandas,
reconfigurando os papeis na sociedade, fazendo emergir um novo
e plural mosaico de personagens, diferenças e possibilidades em
campo;

4. A gênese da mulher moderna: esta que surge desafiando os limites


colocados ao feminino na esfera pública
a. “Vamos usar desse lugar de cidadãs de direitos perante ao Estado,
se apropriando dos discursos mesmos de dominação para dizer:
olha, estamos aqui como cidadãs privadas e queremos então
arrancar de vocês – vocês que estão situados num dado lugar de
poder, legitimado por certos saberes, convocados a agir sobre a
nossas condutas, em nosso governo e a falar por nós, nos impor
5

modelos de comportamento, traçar o possível nos mapas


relacionais – exatamente em nome dos nossos direitos por vocês
dos governos proclamados, a capacidade de subverter o que se
passa, ou seja, apoiadas na noção básica de cidadania expressar
que nossa infelicidade não deve ser um resto mudo da política, mas
deve constitui um dever dessa cidadania legitimada pelos
governos”.
b. Subversão: não se trata apenas de legitimar quantitativamente um
espaço maior, mas qualitativamente um novo tipo de direito, um
novo campo de legitimidade de ação se apropriando dos discursos
mesmos que fundam o poder e operam na sua manutenção,
fazendo brotar daí uma brecha, uma receita para reconfiguração
do que se entende e se coloca como mundo feminino.

MODERNIDADE E MODERNIZAÇÃO

1. Século XIX: Segunda fase da História da Modernidade (BERMAN) – O


amplo e moderno público, instituído após a revolução de 1789 e as
convulsões sociais e políticas que a sucederam por toda Europa,
experimentou a sensação material e espiritual de viver em um mundo que
não chegava a ser moderno por inteiro, lotado de experiências
contraditórias e paradoxais:
a. Industrialização da economia: “modernização a qualquer custo”;
acertar os ponteiros brasileiros com o relógio global – “crua
importação do modelo da Europa e América do Norte” = missão
civilizadora que desconsiderava toda a herança do passado
histórico do país: Mercado capitalista de consumo e produção;
Urbanização e intenso crescimento populacional; Imigração;
Investimentos em comunicação e transporte; Expansão da
burocracia e consequentemente do poder do Estado;
Intensificação dos movimentos sociais; Reconfiguração do
espaço físico e social – nova geografia espacial e novos hábitos
e ritmo de vida.

2. Complexa realidade brasileira: disparidades socioeconômicas e históricas


(fruto do colonialismo e escravidão) produzindo e maximizando mazelas
humanas;
3. O Homem Cordial
a. Há, apesar da homogeneização que se produz, uma coloração
local: o processo não se efetua pela ruptura, mas pelo jogo da
tensão com a tradição ibérica e patrimonialista, de uma
modernização sem revolução;
b. Sergio Buarque de Holanda (1995): processa-se aqui uma
civilidade – racionalização e impessoalidade – sem que haja
6

efetivamente o rompimento com a cordialidade e a pessoalidade


das relações, prolongamento advindo do íntimo, da intimidade do
âmbito familiar, do privado, que se coloca como avessa, oposta a
ordem impessoal, artificial e ritualizada da vida social (Estado
Burocrático civil e burguês);
c. O homem cordial é socializado na família patriarcal, incapaz de
reconhecer as fronteiras entre o âmbito público e o ambiente
familiar no ponto em que não parecem ser munidos da habilidade
de lidar com o todo exterior de forma neutra do ponto de vista
afetivo, em termos de distanciamento e artificialidade relacional
frente as pessoas que encontra como indivíduo civilizado
constituinte do espaço público;

Cordialidade Tradicional Moderno Civilidade


Autoritarismo Localismo Ritualismo Urbanização
Patriarcalismo Apego ao concreto Artificialidade, Industrialização
Economia rural impessoalidade Valores burgueses
Sociedade Particular, familiar Público, sociedade capitalistas
Hierárquica Raízes ibéricas Raízes europeias e anglo-
saxãs

d. Sobre gênero: sendo considerado como uma forma de


organização sócio-histórica, a modernização ocorrida no sistema
de gênero assumiu características homólogas a essa
modernização brasileira no âmbito mais geral – tinha-se a
formação de um sistema de gênero imbricado a vários paradoxos
e contradições;
 Concomitantemente apesar de conflitante, ao passo que o
campo de legitimidade de ação para as mulheres ainda se
encontrassem reduzidos e conformado aos moldes da
tradição autoritária e patriarcal, sob a égide de um poder
masculino, vislumbrava, agora, no solo institucional, o
respaldo para uma mutação inaugural: a reformulação dos
papeis e funções sociais femininas meio dissolução de
fronteiras entre as esferas do público e privado.

FAMÍLIA E GÊNERO

1. Metrópole moderna: espaço de confluência de diversos saberes-


poderes – saberes urbanistas, médico-higienistas, engenharia-
sanitaristas – que atuavam na manutenção e maximização do Estado
nacional e do seu mais novo objeto alvo de investimento político e social
– o corpo biológico da população
7

a. Controle dos pobres, doentes, vadios, delinquentes – vidas


nuas
b. Constituição de um espaço jurídico novo em comunicação com
práticas contratuais e relações formais de convivência e
trabalho
c. Local de liberação e liberdade para as mulheres: modernização
das relações sociais e sexuais
d. A partir do século XIX emerge a reivindicação do próprio corpo
contra o poder na busca de um lugar para si em toda parte
e. As cidades brasileiras começaram por assim dizer a compor
espaços jurídico-políticos que constituíram progressivamente a
promoção de uma esfera pública às mulheres (nova geografia
urbana – regeneração das cidades, civilização do espaço –
emergência de novos papeis sociais, novas formas de
sociabilidade)
f. Todas essas transformações no âmbito macroscópico da
sociedade afetam diretamente um campo mais micro, o das
relações capilares: a família passa a ser reajustada em função
da nova realidade urbana, ela é vista aqui como sustentáculo
do projeto civilizador e normatizador republicano
g. Cidade e família atuam agora como extensão uma da outra,
formando um binômio básico para o funcionamento e
manutenção da estrutura do estado nacional e, deste modo,
novos padrões de comportamento são ajustados, adicionados
e transformados;
h. Lazer: produção de uma nova forma de olhar e vivenciar o
espaço rua, como uma esfera cosmopolita pluricultural de lazer
e recreação, espaço de exercício da cidadania; a rua deixa de
ser vista como ameaça aos valores morais e, agora, a
população é atravessada por um imperativo de ação, por um
reforço ao engajamento físico social com os espaços públicos
(descomprimem-se limites enrijecidos entre o público e o
privado);
 Esses novos hábitos assumem uma significação especial
e contribuem para a redefinição das normas de gênero: “a
mulher moderna”
 Investimentos em iluminação, serviços de transporte e
comunicação operam transfigurando o meio urbano e
consequentemente facilitando a interpenetração da
mulher nesses espaços em função da maior segurança,
conforto e possibilidades para exercer essa nova
autonomia que se intensifica na vida social;
 De confinadas num mundo doméstico-privado passam a
consumidoras num mundo social-público, contribuindo
8

para o apagamento de diferenças antes gritantes regidas


pela categoria gênero sobre os modos de conduta;
i. A moda como um discurso que veste o corpo: assiste a uma
crescente motivação no universo feminino; perpetuava até
então o reflexo das diferenças entre homens e mulheres,
refletindo os distintos papeis sociais e um duplo padrão de
moralidade no século XIX:
 Enquanto para homens esperava-se o retrato da
seriedade e competência para atuar no cenário social
como atores e transformadores do espaço público, para as
mulheres restava vesti-las de submissão e dependência,
como ornamentos, bibelôs passivos e desprotegidos.
j. Transformações na ordem política: a intervenção crescente na
família por parte do estado nacional meados do século XIX,
reequacionou o poder de dominação masculino-patriarcal sobre
a instituição família;
k. O estado capitalista burguês passa a arrogar o direito de reger
a socialização do corpo social, do corpo familiar, do corpo
individual, engendrando normas e estratégias regulatórias de
conduta, ordenando e se aderindo aos diversos setores da vida
humana;
 Ainda assim o código civil de 1916 ainda assegura o pátrio
poder pelo qual a mulher continua explicitamente
dependente da figura masculina: economicamente,
politicamente, socialmente...
l. Transformações socioeconômicas capitalistas: a família deixa
de representar e atuar como unidade básica de produção para
ser agora a peça fundamental para manutenção do modo
capitalista de produção: a manjedoura de consumidores.
 Neste cenário, a mulher tem seu papel desvalorizado no
mundo doméstico, aumentando sua dependência frente
ao homem, alterando status e papel na família;
 Na contramão, percebe-se o reconhecimento da mulher
como lócus de autoridade moral da sociedade, baluarte
social, guardiã dos cidadãos, do bem maior do estado;
essa passagem do papel social da mulher a esfera política
valorizou e redefiniu o espaço doméstico.
 Começam a ser desenhadas algumas oportunidades de
educação e de inserção profissional para as mulheres de
camadas média e alta urbana. A intensificação da
economia de mercado, a urbanização, o novo estilo de
vida burguês, as novas formas de socialização traçam
novos mundos de trabalho para as mulheres por entre
espaços não-domésticos – setores de bens e serviços –
9

alterando assim as condições da vida familiar na


sociedade.
ESCOLARIZAÇÃO
1. Trata-se de um processo relevante para a compreensão acerca de como
foram constituídas as condições culturais e institucionais que levaram a
inclusão das mulheres nas carreiras escolares e, por conseguinte, nas
carreiras profissionais sobretudo meados dos anos 30;
2. 1827 – Primeira lei imperial sobre o ensino que determinava a gratuidade
da instrução primaria a todos os cidadãos: escola para meninas
englobava atividades como ler, escrever, operações matemáticas
básicas, costura e bordado;
3. 1834 – Administração do ensino primário se dava a nível dos municípios,
enquanto o secundário a nível nacional;
4. 1880 – Aparecimento da escola normal: tentativa de qualificação do
ensino primário;
5. Educação no Império caracterizava a educação feminina como precária
e rudimentar, totalmente moldada e hierarquizada valorosamente em
função das diferenças de gênero;
6. Educação na República assistiu à alteração desse quadro, atrelado a
um disparo no interesse feminino pela educação como via de segurança
econômica e status social perante a família e sociedade;
 Para tal foi indispensável a separação entre Igreja e
Estado; educação católica e educação laica, visto que a
primeira reiterava uma moral cristã que preconizava uma
série de discursos de preservação a domesticidade
feminina
 Difusão da crença de que educação e trabalho feminino
seriam cruciais ao progresso do projeto civilizatório do país
– redefiniam-se assim as funções da mulher: da mãe
biológica capacitada naturalmente a sua função,
transmutava-se para uma maternidade espiritual,
cientifica, social, um “ser mãe” que adentrava os campos,
principalmente, da família, educação, saúde, tornando-se
uma espécie de espelho sutil dos saberes mantenedores
dessas instituições.
 Era preciso um treinamento que as preparasse para tão
estimada e honrosa função segundo os paradigmas
científicos e racionais da higiene, medicina e psicologia.
POLÍTICAS EDUCACIONAIS E DE GÊNERO

1. As políticas educacionais fazem parte das políticas sociais mais amplas


orientadas para a reorganização do trabalho, da família, da educação e
10

da saúde, se inscrevem na dinâmica das mudanças sociais e culturais em


curso;
2. Os anos 20 representam o contexto de formulação das ideias que vão dar
base e nutrir ações pioneiras para o desenho de um terreno institucional
para a moderna configuração da escola brasileira consolidada nos anos
30 e 40 do século XX – ERA VARGAS
3. A preocupação em pensar e transformar os padrões de ensino e cultura
das instituições escolares em suas diferentes modalidades e níveis – a
escolarização da sociedade torna-se motivo de mobilização social e
objeto de políticas públicas;
4. Compreende sobretudo um movimento que parte das elites e que se
apresenta mais que uma batalha de ideias, uma luta pelo controle e poder
sobre os rumos de um amplo projeto de reforma social onde a
escolarização seria um alvo estratégico;
5. Desenham-se políticas para a reformulação e universalização da
escolaridade: ampliar a rede escolar, melhorar as condições de
funcionamento das escolas, estabelecer uma estrutura técnico-
burocrática para sua administração, adoção dos princípios do “escola
novismo”: conjunto de concepções e práticas relativas ao funcionamento
e atribuições sociais da escola;
6. Reforma Social – Escola como lugar estratégico – Reforma
educacional – espaço e estilo de vida urbano como signos da
modernidade
7. Escolarização Universal X Especialização da escolarização: ramos
variados considerando determinantes sociais como classe, raça e gênero;
8. As escolas profissionais femininas incluíam a capacitação técnica em
atividades domésticas, comerciais, artísticas e pedagógicas;
9. Num cenário onde a economia de mercado intensificava-se cada vez mais
novas formas de valoração conduziam a novos modos de socialização e
novas funções para as mulheres que deixavam gradativamente os limites
da vida privada do lar;
10. Apresentavam-se sobretudo como educadoras sociais: conduzir a
administração da vida doméstica e ainda a educação escolar, sanitária,
assistência social seguindo preceitos técnico-científicos – seu novo papel
social, apesar de reiterar discursos de subjetivação tradicionais de ser
mulher, adentrava a esfera pública, antes impenetrável;
11. Portanto, apesar dessa manutenção dos compromissos com uma
hierarquia de valor segundo as diferenças dos gêneros, trata-se de
encarar esse cenário como laboratório social onde emergem novos
papeis que lançam a mulher no espaço público legitimando-as como
profissionais – maternidade cientifica, social – reiteram atributos
femininos postos como naturais “mães, esposas”, mas permite a
reinvenção das tarefas atribuídas até então as mulheres,
11

convertendo funções em trabalhos legítimos, abrindo espaço inédito


na esfera pública para a atuação feminina

MAGISTÉRIO E PROFISSIONALIZAÇÃO

1. Magistério apresenta-se nesse cenário de transformações embrionárias


como uma alternativa efetiva para a educação e profissionalização
destinada às mulheres
a. Escola Normal de Artes e Ofícios Wenceslau Braz (1917 –
1934): predominância feminina
b. Celso Suckow: criticava a predominância do elemento
feminino nas escolas, afirmando que esta prejudicava o
principal fim da instituição que era o de formar homens em
profissões industriais masculinas
2. Mudanças mais profundas ocorreram com a chamada Escola Normal:
a. Intensificação da Escolarização (anos 20 e 40) atuava na
recomposição dos papéis de gênero, com preocupações de
cunho nacionalista, eugênico, higiênico, em favor da ciência e
da técnica.
b. A escola normal impôs a necessidade de uma reinvenção
institucional e pedagógica: instaurando uma moderna
pedagogia para formar um novo tipo de professora socializada.
c. “A escola normal sofreu transformações mais profundas que as
escolas primárias”: a partir do momento em que passou a exigir
uma formação mais complexa e científica para as futuras
professoras
d. Feminização do magistério: “Embora retrospectivamente se
possa concluir que a feminização acarretou a precarização do
trabalho, o rebaixamento salarial e a estratificação social da
carreira, tornando o magistério uma “semiprofissão”, cuja
identidade e status social estaria definido segundo relações de
gênero e de poder vigentes, tal como a enfermagem”.
e. Escola de Professores do Instituto de Educação (1932 – 1937):
a formação para o magistério assistia aqui a sua inserção no
nível superior de ensino com qualidade equiparável ao colégio
dom Pedro II
f. A incorporação da Escola Normal às universidades contribuiu
para alavancar a escolarização e profissionalização do público
feminino, efetivando o ingresso de mulheres no ensino superior
– normalistas na universidade 1940 – com um número inédito
de normandas que empreenderiam carreira profissional logo em
seguida sobretudo no ensino e nas ciências;
12

3. “O magistério em suas diferentes modalidades e funções ofereceu uma


real oportunidade de educação e profissionalização para as mulheres da
classe média e alta urbana”
4. Caráter seletivo do ensino secundário – investimentos em reformas
aperfeiçoamento e difusão do ensino secundário pelo estado – limitava-
se ao colégio dom Pedro II
5. Lei Orgânica do Ensino Secundário – 1942: O sistema educacional
deveria corresponder ao sistema de divisão de classes econômico-
sociais: raça e gênero – a cada grupo, cada classe cabia um tipo de
formação específica e coerente com seu papel e função social.
6. A dinâmica contraditória da modernização, alterando padrões de
sociabilidade, gerando novas expectativas individuais e familiares,
impondo novas demandas profissionais, criou condições para que novas
experiencias de escolarização fossem sendo apropriadas e
ressignificadas pelas mulheres;
7. As mudanças no âmbito do sistema escolar, combinadas com
transformações sociais mais largas, contribuíram para a redefinição dos
papeis sociais femininos, mexendo, não sem ambiguidades, no grau de
diferenças existentes entre homens e mulheres do sistema de gênero
brasileiro.

You might also like