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METAFISICA
METAFÍSICA
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A. INTRODUÇÃO À METAFÍSICA
I. Noção de Metafísica
1. Natureza da Metafísica
A metafísica pode definir-se também como a “ciência que estuda o ente em quanto ente,
suas propriedades e suas causas”.
O objeto material da metafísica é o “ente”, que significa “o que é”. Por isso, a metafísica se
refere a qualquer coisa ou realidade (p. ex.: um homem, um gato, uma pedra, etc.).
O objeto formal é “ente em quanto ente”, ou seja, o ente em quanto tal, ou o ente
considerado por sua condição de ente.
Por último, dizemos na definição “suas propriedades e suas causas”. Com isso fazemos
referência a que a metafísica deve tratar das propriedades que resultam dos entes em quanto ente
(por exemplo, o bem é uma propriedade do ser) e logo, deve chegar à causa do ser das coisas, que
não será outro que Deus.
Compreende-se na filosofia o ato como uma perfeição de um sujeito (p. ex.: a cor de uma
planta). Os atos não se dão em si mesmos (não são um ser subsistente), mas se dão num ente. Por
isso, o mais exato é falar de entes em ato, sendo que estar em ato significa que está atualmente com
a determinação significada (p. ex.: Ludovico é gordo significa que neste momento Ludovico possui
a gordura). Quando a perfeição está ausente dizemos que o sujeito está privado dela.
Chamamos ato primeiro quando consideramos o ato como perfeição estável (p. ex. : a folha
é verde), e ato segundo, a operação (p. ex.: André pensa).
Potência
Entendemos potência como a capacidade real de receber um ato. Do mesmo modo que o
ato, a potência não é subsistente, mas se dá num sujeito ao que chamamos potencial (p. ex.: a
semente está em potência de ser uma árvore).
Contudo, estar em potência implica sempre estar em potência a respeito de algum ato, ou
seja, a potência é sempre potência para receber algum ato. Isto exige que a perfeição ou ato que se
recebe tem que estar previamente em potência (p. ex.: a semente está em potência de ser árvore e
não de ser elefante).
O ato e a potência se distinguem realmente e não somente por uma distinção de razão. De tal
modo que, ainda um ente tenha sido atualizado, segue estando em potência (não no mesmo sentido)
a respeito da mesma atualização (p. ex.: uma piscina cheia de água segue tendo a possibilidade de
ter água, ainda que esta possibilidade naquele momento concreto já tenha sido realizada).
a) Uma coisa não ê perfeita senão quando está em ato. Assim, a perfeição da árvore
consiste em dar frutos.
b) O ser na proporção em que está em ato: agir e produzir alguma coisa, quer dizer,
realizar um ato; ora, não é possível dar a não ser o que se tem.
c) Todo ser capaz de transformação ê composto de potência e de ato: de ato, porque tem
presentemente um estado determinado; de potência, porque é suscetível de receber um outro estado.
d) A potência não pode passar a ato a não ser sob a ação de um ser em ato, porque o
menos não dá o mais; todo efeito tem uma causa proporcionada.
1. Noção de ente
A experiência nos diz que as coisas são, mas ao mesmo tempo são algo, alguma coisa, isto é,
possuem uma determinada natureza (por exemplo é um homem, um gato uma caixa, etc.). Esses
exemplos expressam o que as coisas são, sua essência.
Por isso, podemos definir a essência como “aquilo que faz com que uma coisa seja o que é”.
Assim, todas as realidades têm ser, e por isso são chamadas de entes, contudo, também têm
essência, e por isso são chamadas de diferentes maneiras (p. ex.: pela essência o cachorro é
cachorro, o gato é gato).
Por isso, compreendemos que todas as coisas estão constituídas por dois princípios: o ser e a
essência, que são inseparáveis e necessários a todas as coisas. A essência dos entes, definitivamente,
implica um modo de ser.
a) Noção. Analisando a idéia de ser, vê-se que o ser pode ser tomado em dois sentidos. De
início, significando o ato de existir (a existência), como nestas proposições: "César existiu
realmente", ou ainda: "Pedro lê (é leitor): nestes dois casos, trata-se de afirmar a existência de uma
coisa, de César e do ato de ler).
O ser pode ser tomado como designando, seja o que é ou pode ser, quer dizer, o sujeito atual ou
possível da existência: é assim que, nas proposições "Pedro lê", "o homem é racional", "o muro é
branco", as palavras Pedro, o homem, o muro são os sujeitos nos quais existem ou podem existir a
leitura, a razão, a brancura; — seja o que uma coisa é: Pedro é homem, o muro é branco. César foi
um grande capitão. Estas últimas acepções compõem o que se chama, em sentido lato, a essência.
Tomada em seu sentido estrito, a essência é aquilo pelo qual uma coisa é o que ela é e difere
de qualquer outra (animal racional exprime a essência do homem, quer dizer, aquilo pelo qual o
homem é homem). Ê esta essência que formula a definição pelo gênero próximo e diferença
específica
b) Propriedade da essência. A essência, tal qual a entende mos no sentido estrito, é: o ser
necessário, não neste sentido de que existiria necessariamente (propriedade que não convém senão
à essência divina, como se verá em Teodicéia), mas neste sentido de que é impossível pensar uma
coisa como desprovida ou privada de sua essência, porque isto seria pensá-la a um tempo como
sendo e como não sendo o que ela é. Impossível pensar o triângulo como não tendo senão três
ângulos, ou pensar uma pedra como dotada de inteligência; — o primeiro principio de
inteligibilidade, enquanto que é por ela que cada ser é de princípio inteligível (quer dizer,
cognoscível pela inteligência) e que se explicam todas as suas propriedades : é pela essência
"animal racional" que se compreende primordialmente o ser "homem" e que se compreendem as
propriedades deste ser: mortalidade, sujeição à dor, capacidade de rir etc.
Todo ser criado é composto de essência e de existência, o que quer dizer que não existe em
razão do que é. Sua essência não implica a existência. Poderia então não existir: é o que se chama,
em termo técnico, um ser contingente.
Um problema célebre, que suscita a distinção de essência e de existência, consiste em saber se,
num ser singular, a essência é realmente distinta da existência, quer dizer, do ato que a faz;
existente. Os filósofos tomistas sustentam a distinção real. Ainda é necessário compreender que
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distinção real não significa necessariamente separação nem mesmo possibilidade de separação
(a brancura é real, e distinta do papel no qual escrevo, mas não pode estar separada dele).
O ser é o elemento principal do ente. Por outro lado, é evidente para todos o significado de
ser. O tema do ser será estudado com mais atenção posteriormente. Agora somente veremos
algumas características.
O mais peculiar do tema do ser é que “tudo é”, ou seja, não existe nada que não seja.
Entretanto, nenhuma das realidades criadas é puro ser, mas são “modos determinados de ser”. Por
isso, podemos afirmar que o ente não é somente ser, mas que “tem ser”. Conseqüentemente,
poderemos dizer do ser o seguinte:
Nas coisas, o ato de ser se dá com maior ou menor intensidade, passando desde as realidades
mais imperfeitas até Deus (do reino mineral sobe até a vida vegetal, animal, espiritual até Deus).
Esta diversidade implica uma gradação no ser; portanto, como se verá na Teodicéia, Deus tem o ser
em toda sua intensidade; pelo contrário nas criaturas, à medida que são menos perfeitas, têm menos
ser.
Contudo, convêm deixar claro que ser não é o mesmo que existir, pois enquanto ser expressa
um ato, existir implica somente que uma coisa está aí, se dá de fato. O existir é uma conseqüência
do ser. Existir, existe um homem, um cachorro, uma árvore, uma pedra, contudo, o ser do homem é
mais perfeito que o do cachorro, o deste mais que o da árvore, e o ser de uma árvore é mais perfeito
que o de uma pedra.
A existência se tem ou não se tem, mais não se existe mais ou menos. O ser tem um sentido
de intensidade.
Como já estudamos na analogia, podemos dizer que ente é uma noção análoga, pois se
aplica a todas as coisas em parte igual e em parte diversamente. A bondade, por exemplo, pode
aplicar-se a todos os entes. Contudo, em alguns se dá de modo mais pleno que em outros: Deus, um
homem, uma árvore, são bons, mas esse término lhes é aplicado em parte igual em parte
diferentemente. Isso é assim porque a bondade, como se verá mais adiante, é um aspecto
transcendental do ente; todos os entes, pelo fato do serem, são bons.
O princípio de identidade
Pode formular-se das seguintes maneiras: “o ente é ente”, “o ser é, o não ser não é”, “A é
A”, ou de forma mais coloquial, “o que é, é o que é”.
I. SUBSTANCIA E ACIDENTES
Entre as diversas modalidades de ente têm prioridade aquelas que se estudam como
predicamentos, que são a substancia e os nove acidentes, aos quais se pode reduzir toda a realidade
criada.
1. A substância
1.2. Os acidentes
O que determina os acidentes é sua dependência da substância. Por isso, podemos defini-los
como “realidades a cuja essência compete ser em outro como em seu sujeito”.
Do mesmo modo que cada substância tem uma natureza própria, cada acidente tem sua
essência ou natureza própria, e desse modo se distinguem e diferenciam uns dos outros (p. ex.: ter
uma cor, ocupar determinado lugar, etc.).
Por último, podemos afirmar que não há termo médio entre a substância e os acidentes. Por
tanto, qualquer realidade ou é em si ou é em outro.
Falando com precisão, somente é o que tem o ser como algo próprio, e isto somente compete
á substância, por outro lado, como os acidentes não subsistem, não têm propriamente ser (p. ex.: a
quantidade de um cachorro, não é, nem sua cor ou seu modo de andar. O cachorro é pesado, é
negro, justamente por ter esses acidentes). Por isso, concluímos que os acidentes não possuem um
ato de ser próprio, mas que dependem do ato de ser de sua substância.
Como o ser se possui de diverso modo pela substância e pelos acidentes, o termo ente se
predica em sentido análogo da substância e dos acidentes. Isto é, ambos são, mas de maneira
distinta, pois a substância é por um ato de ser próprio e os acidentes são apoiando-se na substância.
Por uma parte, a substância e os acidentes são realmente diferentes. Isso se nota ao
comprovar as mudanças acidentais nas que desaparecem algumas perfeições dando lugar a outras
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diferentes sem que mude a substância (p. ex.: a água pode mudar de temperatura e segue sendo a
mesma água).
Por outro lado, a distinção real de substância e acidentes não rompe a unidade do ente, pois
aqueles não são vários entes que se unem para formarem um todo. Em sentido próprio somente há
um ente, que é a substância, o demais é algo dela.
Por isso, o ser próprio de cada coisa é somente um. Conseqüentemente, toda a realidade de
um ente, tanto a substância como os acidentes, são por um ato de ser, que compete à substância.
Finalmente, a composição substância-acidentes é conhecida pela inteligência, a partir do que
é captado pelos sentidos. Eles conhecem os acidentes das coisas, enquanto a inteligência alcança
através deles o conhecimento da substância. E isto é possível porque os acidentes manifestam a
substância.
II. OS PREDICAMENTOS
1. Noção de predicamentos
Os predicamentos são aqueles elementos aos quais podemos reduzir toda a realidade. A
substância e os nove tipos de acidentes são os predicamentos, pois esses modos de ser
correspondem aos diversos tipos ou gêneros de predicados que podem ser atribuídos a alguma
coisa.
1. De modo absoluto:
A quantidade
As qualidades
São acidentes que fazem a substância ser de um ou outro modo e surgem de sua forma. Cada
substância pode ter grande diversidade de qualidades (p. ex.: a cor, a temperatura, a textura, etc.).
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Como as qualidades derivam da forma, também se encontram nas substâncias espirituais. Quando
estão nas substâncias materiais se apóiam na substância através da quantidade.
Ainda que as qualidades sejam de diversos tipos, coincidem em algumas características,
pelas quais as podemos agrupar no acidente qualidade. Estas características são:
a) Não se identificam com a substância e por isso são acidentes;
b) São acidentes intrínsecos, afetam ao modo de ser da substância;
c) Determinam a substância respeito à forma.
As relações
a) Não existe mais e menos nas relações. As relações não podem aumentar ou diminuir
por si mesmas; uma coisa, por exemplo, é igual ou desigual, semelhante ou dessemelhante em
relação a uma outra.
b) As relações são recíprocas. Pode-se, então, trocá-las, e dizer, por exemplo: "o pai do
filho" e "o filho do pai", "o quadro deste pintor" e o "pintor deste quadro", "a visão deste objeto" e
"o objeto desta visão".
c) Os correlativos são simultâneos. Os correlativos são necessariamente dados juntos e
jamais separadamente: não existe pai sem filho, nem filho sem pai. — Por isto mesmo, os
correlativos são conhecidos simultaneamente, e se definem mutuamente.
b) Acidentes extrínsecos
São determinações da substância que lhe afetam com relação a outros objetos e, portanto, de
um modo extrínseco. Os acidentes extrínsecos se apóiam na substância, mas se fundamentam em
algum acidente intrínseco.
O onde (ubi). É o acidente pelo que a substância é localizada. O estar num lugar é um acidente real,
já que põe a substância em relação com outras.
A posição (situs). É o modo de estar em um lugar (p. ex.: estar de pé, sentado, deitado, etc.). Difere
do ubi porque se refere à disposição interna das partes do corpo localizado num determinado lugar.
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A posse (habitus). É o acidente da substância por ter ou possuir algo imediato. A posse é própria
somente do homem (p. ex.: usar caneta, vestir suéter, ter uma casa, etc.).
O quando (quando). É o acidente pelo que conhecemos a situação temporal da substância corpórea.
Quando os seres corporais mudam é porque passa por eles o tempo, e o quando é o momento
concreto no qual se encontra uma coisa.
A ação.
É o acidente que surge de uma substância como princípio agente do movimento em outro
sujeito (p. ex.: o esquentar a água, empurrar uma cadeira; como são movidos por um agente que é o
que produz a ação).
A ação é compreendida por um sujeito que ao atuar passa de potência a ato. Por isso
podemos definir a ação como “o exercício da causalidade eficiente” ou também como “o acidente
cuja natureza consiste em uma atualização de uma potência ativa de uma substância”. A ação se
realiza quando se passa de uma capacidade de atuar (o que pode ser chamado de potência ativa) a
sua atualização (a ação). O atuar ou a atualização pressupõe ter um certo ato, e em conseqüência a
ação atualiza a potência ativa e adquire uma nova perfeição.
A paixão.
É o acidente que possuem os corpos ao passo que são sujeitos passivos da ação de outros (p.
ex.: o esquentar-se da água, o ser empurrado da cadeira por um agente exterior).
A paixão é o correlato da ação, pelo qual o ente paciente adquire uma perfeição atualizando
uma capacidade que possui (potência passiva). Por isso, podemos definir a paixão como o “acidente
cuja natureza consiste na atualização da potência passiva de uma substância, sob a ação da causa
eficiente”.
A substância é a base dos dez predicamentos e fundamento de tudo, logo também do ente
singular. A substância não é simples, mas está composta de dois princípios: a essência e o ser
(esse); eles se relacionam entre si como potência e ato. A potência do ato de ser, que com este
configura a substância, se chama essência.
É o ser o que faz com que todas as criaturas sejam entes, e a essência é a que determina o
modo de ser de cada uma delas.
Conseqüentemente, podemos definir a essência como “aquilo pelo que uma coisa é o que é”.
Ente em sentido absoluto primariamente se chamam as substâncias, e os acidentes somente de
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forma derivada e secundariamente são chamados deste modo; de igual maneira a essência encontra-
se verdadeira e propriamente na substância, nos acidentes somente de algum modo e sob certo
aspecto. Por isso, quando falamos simplesmente da essência dos entes fazemos referência à essência
da substância e não a dos acidentes.
Através da essência incluímos aos entes sob um gênero e uma espécie, pois o gênero e a
espécie agrupam realidades que têm um modo de ser semelhante (p. ex.: um macaco, uma cavalo,
etc. são do gênero animal porque suas essências são semelhantes).
Dos dois princípios da essência, o mais importante é a forma, pois a matéria é pura potência
e está em dependência da forma que é ato. O que configura uma essência de um modo determinado
é a forma.
A forma substancial, ao ser o princípio determinante da essência, é a que limita ou restringe
o ato de ser, e, por sua vez, a matéria é o que restringe a forma, de tal maneira que possa considerar-
se que a matéria restringe ou delimita o ser.
A experiência nos mostra que na realidade encontramos seres singulares, isto é, seres que
pertencem a uma mesma espécie, mas que são diferentes uns dos outros. E também a mesma
experiência nos demonstra que não encontramos coisas abstratas e gerais.
A metafísica explica como a essência, sendo especificamente idêntica, se diversifica numa
multidão de entes singulares. A multiplicação do ato é realizado pela potência, e por isso podemos
afirmar que a matéria é o princípio multiplicador das formas dentro da essência das realidades
corpóreas. Não somente multiplica a forma, mas a matéria também a individualiza e singulariza, de
tal maneira que os componentes de uma espécie, ademais de ser muitos, são diversos entre si, como
nos mostra a experiência.
A matéria é o que faz possível que exista muitos indivíduos da mesma espécie. Por isso pode
afirmar-se que a matéria é o princípio de multiplicação numérica da espécie.
Entretanto, a matéria individualiza a essência à medida que ela é singular, isto é, que possui
quantidade. Por isso, dizemos que o princípio de individualização é a matéria quantificada (materia
quantitate signata).
Os acidentes não se individualizam pela matéria prima, mas pela substância, que é seu
sujeito próprio, do mesmo modo que as formas substanciais se individualizam pela matéria que é
seu sujeito próprio. Do mesmo modo afirmamos que o princípio de individualização é sempre
potencial e limitante da perfeição recebida. Por isso, convém à substância o individualizar os
acidentes porque é sua potencia própria.
A individualização dos seres espirituais não provém da matéria já que não a têm. Contudo,
os seres espirituais também são indivíduos que, ao não poder ser recebidos numa matéria que os
multiplique, cada uma das formas constitui uma essência individual que esgota toda a sua espécie.
Como as criaturas são diferentes uma das outras, comprovamos que têm diversas perfeições,
mas ao mesmo tempo têm uma perfeição que é comum a todos os diferentes entes, que é o ser
(esse).
Do mesmo jeito que todos os homens têm uma forma substancial que faz com que sejam
homens, os entes têm um ato (o ser) pelo que são entes. Porém, existe uma grande diferença entre o
ato de ser e os demais atos dos entes, ainda que sejam formas substanciais ou acidentais, pois o ato
de ser tem as perfeições de todas as espécies, e não somente as dum tipo particular.
Por isso, é notório que o ato de ser é ato em sentido pleno e próprio, já que não inclui
nenhum tipo de limitação. Os outros atos se constituem como modos de ser particulares, e por isso
mesmo, são como potência respeito ao ser.
De aí que dizemos que têm ser, mas não o são simplesmente, mas o são segundo um modo
de ser concreto, e conseqüentemente limitam o ser como uma potência limita seu ato. Podemos
afirmar, pois, que o ser é o ato último do ente, isto é, o ato de todos os demais atos do ente.
Todas as criaturas têm a perfeição de ser de um modo parcial, pois, por uma parte, junto de
qualquer ente há outros muitos que também são, de tal maneira que nenhum esgota a perfeição do
ser; e por outra, a criatura não tem as perfeições em grau sumo (p. ex.: por muito sábio que seja um
homem, podemos encontrar sempre outro mais sábio).
Por isso, concluímos que os seres criados não se identificam com seu ser, isto é, o possuem
de forma limitada e incompleta. Ter uma perfeição participada implica|: por uma parte, o
participante (sujeito que recebe a perfeição e a limita), que é a essência; e o ato ou perfeição
participada, que é o ato de ser.
A perfeição do ser encontra-se multiplicada em muitos indivíduos, e isto não seria possível
se não fosse pela íntima união com a potência, isto é, com a essência, que é realmente distinta do
ser.
Conclusão: o ser como ato da essência implica de modo necessário uma distinção real entre elas, já
que entre qualquer potência e seu ato existe uma distinção real.
Designamos como sujeito subsistente ou suposto (suppositum) os entes concretos com todas
suas perfeições. Conseqüentemente, nos referimos às realidades individuais, tomadas em sua
totalidade (p. ex.: este cachorro, este cavalo, este homem) e sendo seu caráter distintivo da
subsistência. Com outras palavras, o caráter distintivo é a intrínseca posse de um ato de ser próprio
que atualiza todo o conjunto.
Por isso, designamos ente tudo o que tem ser, a matéria e a forma, a substância e os
acidentes, etc., mas no sentido principal e próprio é o suposto, isto é, o que subsiste, o que existe em
si mesmo de um modo completo e distinto de qualquer outra realidade.
Na natureza existem somente indivíduos completos, que são singulares, e, contudo, estão
compostos de diversos elementos. Concretamente o sujeito subsistente está composto por:
1- Ato de ser, que é o elemento fundamental e dá subsistência ao sujeito;
2- A essência, que nos entes materiais está composta de matéria e forma;
3- Os acidentes, que são aqueles atos que completam a perfeição da essência.
A natureza individual
Entendemos por natureza de uma coisa aquilo pelo que uma coisa é o que é, isto é, o que
tem de comum com outros seres de sua espécie. Por isso, podemos dizer que natureza e espécie são
termos sinônimos.
Definimos também a natureza como a essência como princípio de operações. Por isso,
podemos entender que essência e natureza são sinônimos. Assim, dizemos que pertencem à mesma
espécie os seres que têm a mesma essência ou natureza.
As essências ou naturezas existem como universais no conhecimento, e como singulares na
realidade; por isso, na tese tomista a natureza é sempre universal, mas nos entes materiais se
encontra multiplicada nos indivíduos e não subsiste fora deles, mas está sempre individuada nos
entes singulares.
A causa de que haja muitos indivíduos de uma mesma espécie, ou que da mesma espécie se
multiplique em muitos indivíduos, está em que a forma (ou seja, a espécie, a essência ou natureza)
se multiplica pela matéria. Por isso, dizemos que a matéria que recebe a forma, a limita e a faz
plural (tendo claro que a forma não existe por si mesma em nenhum lugar). O que queremos dizer é
que a mesma natureza pode ser abstraída de muitos conjuntos de elementos materiais iguais.
Santo Tomás toma a definição de pessoa de Severino Boécio e a define como substância
individual de natureza racional (individua substantia rationalis naturae); a ao indivíduo como o
que é indistinto em si mesmo, mas distinto dos demais. Por conseguinte, pessoa, qualquer que seja
sua natureza, significa o que é distinto naquela natureza (racional). A natureza humana significa
esta carne, estes ossos, esta alma, que são os princípios que individualizam o homem e que, ainda
que não entrem no significado da pessoa em geral, está contido no da pessoa humana.
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Falamos antes que a natureza existe nos singulares individualizada pela matéria. Por isso, se
diz que a natureza, considerada em si mesma, se chama substância segunda, e ao estar
individualizada num singular se chama substância primeira. Podemos afirmar então, que o termo
substância segunda é um tanto impróprio, pois não existe em si, mas nos singulares. Contudo, os
singulares existem em si e por isso são chamados substâncias no sentido próprio ou substância
primeira.
Ao dizer que a substância é o que existe em si, o que queremos dizer é que a cor, o peso, a
consciência, etc., ao ser propriedades de algo, não existem em si, mas em algo: no singular que
subsiste em si. E ao chamarmos suposto ou hipóstase a esse “em si mesmo” onde subsiste o
singular. Quando o singular é de natureza racional, então se chama a seu suposto com o nome de
pessoa.
A pessoa designa a totalidade conjunta do sujeito e do que subsiste nele. Por outro lado,
natureza designa preferentemente o que é comum a todos os indivíduos. E natureza inclui somente o
que é próprio da espécie, e o suposto inclui o que pertence à espécie e também a todos os acidentes.
Nenhuma natureza tem o ser, e sim seu suposto, pois não pode existir a humanidade, mas sim o
homem. Por isso, podemos dizer que as ações sempre são dos supostos (actiones sunt suppositorum
[ou individuorum, ou singularium]), ou seja, somente atua a pessoa, pois nem a natureza, nem as
potências, nem a alma atuam, mas somente atua a pessoa por meio delas.
O tema da pessoa é uma contribuição do cristianismo ao pensamento. Entretanto, houve
algumas interpretações errôneas, como a de alguns personalistas, que tomam como ponto de
referência a noção de pessoa entendida não como subsistência, mas como relação subsistente (que é
o modo de definir as Pessoas Divinas). E ao aplicar isso ao homem, fica entendido que o homem
somente se configura como pessoa pela relação como os demais homens. Conseqüentemente, a
sociabilidade é anterior à pessoa e a fundamenta. Pelo contrário, ainda que só existisse um homem
ele seria pessoa humana.
Outra dificuldade importante de alguns personalistas é a de fundamentar na pessoa uma ética
de validez universal. Pois como o comum a todos os homens é a natureza, a ética tem uma validez
universal se é fundamentada na natureza humana. Mas se fica fundamentada sobre a pessoa em sua
singularidade, então pode ocorre que se supervalorize a consciência individual em detrimento da
norma, e assim se chega a uma moral de situação: dá o mesmo dizer que para cada situação o
moralmente bom é diferente, ou então dizer que para cada pessoa o moralmente bom é diferente.
C. OS TRANSCENDENTAIS
A noção de ente se encontra em todos nossos conhecimentos. Por isso nenhuma perfeição
que seja estranha ao ente pode ser conhecida. Assim, nada pode acrescentar-se ao ente e por isso
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todas as outras noções não significam nada estranho ao ente, mas significam um modo de ser
peculiar ou uma propriedade ( p. ex.: o gato é um ente, mas ao chamá-lo aludimos a algo que nossa
idéia de ente não inclui de forma expressa). O avanço em nosso conhecimento do ente pode
realizar-se de duas maneiras:
A. Através das noções predicamentais. Os predicamentos são aquelas idéias que expressam um
modo peculiar de ser. Como já vimos, são a substância (ser em si) e os nove acidentes (ser
em outro). Conseqüentemente, enquanto ente se predica de tudo o que é, os predicamentos
se referem somente a um gênero de coisas excluindo a outros que também são entes.
B. Através dos conceitos transcendentais. Os transcendentais designam aspectos que
pertencem ao ente como tal. Estes designam um modo de ser que se deriva da consideração
do ente em geral, ou seja, algo que convém a todas as coisas; a unidade, a bondade, a
verdade, etc. Predicam-se de tudo o que pode ser chamado de ente, e, portanto têm a mesma
extensão universal que esta noção. Os chamamos transcendentais porque “transcendem” o
âmbito dos predicamentos.
A consideração de ente respeito a si mesmo e respeito aos demais nos levará à dedução dos
transcendentais. Os transcendentais são aquilo que se formam pela explicitação do conceito de ente
sem que se restrinja sua extensão.
Considerado em si mesmo
De um modo positivo, comprovamos que o que convém a tudo o que existe é ter uma
essência ( o ente abstrato não existe, mas sim homens, cachorros, árvores, etc. ). A contração de um
ente a um modo determinado de ser é o que chamamos coisa (res).
Negativamente, ou seja, se excluímos a divisão interior, corresponde a todo ente a unidade
(unum). Se o ente que tem unidade a perde ao dividir-se, deixa de ser ente para originar-se dois
entes ou mais.
Prestando atenção à distinção dos entes entre si, podemos afirmar que cada um deles á algo
(aliquid).
Os últimos três transcendentais são possíveis porque a alma é o único ente capaz de fazer-se
todas as coisas (anima est quodammodo omnia). Deste modo surge o verdadeiro (verum), o bom
(bonum) e o belo (pulchrum). Por sua conveniência ao intelecto, chamamos ao ente verdadeiro; por
sua relação com a vontade, o chamamos bom, e, por fim, pela conveniência do ente com a alma por
uma certa conjunção do entendimento e do apetite, o chamamos belo.
Contudo, as noções transcendentais não são sinônimas do ente, já que explicitam aspectos
não significados por esta noção. Por isso, afirmamos que são noções diferentes, mas idênticas como
realidades. O único que acrescentam os transcendentais á noção de ente é um matiz de razão.
O que acrescenta cada um dois transcendentais a nosso conhecimento é o seguinte:
*Uno e algo acrescentam uma negação à noção de ente. A unidade nega a divisão interior do ente e
o algo nega a identidade de uma coisa com as outras.
*A verdade, a bondade e a beleza acrescentam a nossa noção de ente uma relação de razão, que
tampouco é real.
*Coisa, como as anteriores, não acrescenta nada real. Coisa se refere unicamente ao ente criado,
designando-o enquanto que este tem essência.
Ao ente convém uma predicação análoga, do tipo que foi estudado na lógica. Simplesmente
recordamos que um termo se predica analogamente de duas realidades quando se atribui a cada uma
delas em parte igual e em parte diferente. E isso é o que acontece com o ente. Por isso, ente se
atribui a Deus e as criaturas de modo análogo. A semelhança reside em que Deus e as criaturas
“são”; e a diferença reside em que Deus “é” por essência e as criaturas “são” por participação.
A predicação análoga do ente se fundamenta no ato de ser, pois somente é ente na medida
em que se tem “ser” (esse). O “ser” se possui por essência ou por participação, que é o modo com o
qual o possuem as criaturas a analogia se refere também aos transcendentais, pois se identificam
com o ente e têm por base o ato de ser.
Unidade transcendental
A indivisão do ente não é outra coisa que a unidade transcendental. Como já foi dito, a
unidade não acrescenta nada real às coisas, mas nega a divisão interior. Contudo, para nosso modo
de entender, a idéia de uno se manifesta como uma explicitação do ente, ou seja, como a ausência
de divisão interna. Conseqüentemente, a apreensão do ente é anterior à unidade (p. ex.: primeiro
conheço o gato como ente e logo o percebo como uno).
Entretanto, ente e uno se identificam na realidade, e por isso a unidade se fundamenta no ser
de igual modo que o faz o ente. Omne ens est unum, omne unum est ens. Por isso, quanto mais
perfeita seja uma coisa, ou seja, seja mais ente, terá uma maior unidade. E por isso Deus, o ser
perfeitíssimo, é o ser maximamente uno, e o mesmo sucede no âmbito do criado. As criaturas mais
perfeitas possuem maior unidade, e conseqüentemente os espíritos puros são mais unos que os
homens e tudo o demais criado.
A multiplicidade
Unidade não é o mesmo que unicidade; por isso, a multiplicidade de entes que se dá na
realidade se opõe à unicidade. Contudo, cada um dos entes dessa multiplicidade conserva sua
unidade interna. Por isso, os entes, como distintos uns dos outros, são múltiplos (“este” ente não é
“aquele outro”) e, contudo, são “unos”.
O múltiplo é o que está constituído por muitos “unos”. Por isso, multiplicidade de coisas se
refere a que não são somente uma, ou seja, não há perfeita unidade. Por isso, concluímos que a
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noção de múltiplo depende da unidade, e não ao contrário, pois “uno” significa a negação da
divisão, mas não da multiplicidade.
III. O ALGO
Algo (aliquid) equivale a outro que, e se refere ao ente enquanto que é uma coisa distinta das
demais (p. ex.: esta árvore é “outro que” aquele).
Si dizemos que este homem é algo, fazemos referencia a sua unidade, e o pomos em relação
com as demais coisas, na medida em que a unidade implica a indivisão intrínseca e a separação com
referencia a outras unidades.
Ademais, o algo se opõe ao “não ente”, ou seja, ao nada. E assim, na linguagem ordinária
dizemos “tenho algo” como oposto a “não tenho nada”.
IV. A VERDADE
O ente e a verdade
Como já vimos na lógica, a verdade faz referência aos juízos do intelecto. Por isso, a
verdade pertence aos atos do intelecto que se conformam à realidade: veritas est adaequatio
intellectus cum re. Entretanto, a verdade do entendimento ( a verdade lógica ) depende do “ser”; ou
seja, não seria verdadeiro o juízo do entendimento si as coisas da realidade não tivessem em si
mesma a verdade, isto é, a verdade do ente ou a verdade ontológica: veritas supra ens fundatur.
Por isso, a verdade se fundamenta no ente, ou seja, no que as coisas são.
V. O BEM
Para cada um dos entes que existem na realidade, seu bem próprio consiste em “ser”
segundo sua natureza; por isso chamamos “males” às privações do ser natural (p. ex.: são males: a
doença, a morte, o pecado, etc.). Mal é, pois, a privação de uma determinada perfeição acidental,
devida ao sujeito que carece dela. Conseqüentemente, podemos afirmar que ente e bem são
equivalentes. Por isso, dizemos que o bem não é algo distinto do ser dos entes: tudo o que é, é bom;
ou seja, são bons enquanto são, enquanto têm ser.
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Se nos perguntamos o que a bondade acrescenta ao ser, porque se não fosse assim seriam
noções idênticas, podemos afirmar que a bondade acrescenta ao ente a conveniência a um apetite,
ou seja, a bondade expressa que as coisas são apetecíveis. Por isso, , como dizíamos que o ente era
verdadeiro enquanto que era inteligível, podemos dizer que o ente é bom enquanto é apetecível. O
bem somente acrescenta ao ente uma razão de apetibilidade que não se expressa nessa noção de
ente.
Assim definimos que o bem é aquilo que as coisas apetecem – bonum est quod omnia
appetunt.
No entanto, convém aclarar que a bondade não é o desejo que surge em nós, mas a perfeição
que a provoca. Por isso, afirmamos que as coisas não são boas porque as queremos, mas que as
queremos porque são boas. E por isso, as realidades mais nobres (Deus) geram um amor maior ao
ser conhecidas. O bem á algo objetivo, pois não depende do querer da maioria e por isso, se o bem é
o que todos apetecem, não é realmente bom pelo fato de que todos o queiram, mas que é querido
enquanto que é perfeito ou é ente.
Finalmente, o bem transcendental é o bem que possui uma realidade enquanto que “é”, ou
seja, segundo sua constituição ontológica. Qualquer ente, por ser, tem ato, é bom.
As três espécies do bem. — Pode-se dividir o bem em bem útil, deleitável e honesto.
a) O útil. O bem útil é o que serve de meio tendo em vista um bem. Todo o seu valor de
bem, enquanto útil, consiste então na sua capacidade de procurar um outro bem; em si mesmo, pode
não ter nada de atraente (o remédio ou a operação cirúrgica para o doente).
b) O deleitável. O bem deleitável é o que proporciona alegria e satisfação: tais como uma
obra de arte, o esporte ou o jogo.
c) O honesto. O bem honesto é o que nos atrai, não pela utilidade ou gozo que
proporciona, mas antes de tudo em razão da perfeição que traz.
Vê-se daí que o bem primeiro e propriamente dito é o que responde ao fim essencial do ser
(que é o de dar a perfeição): é o bem honesto. — O bem deleitável é verdadeiramente, enquanto
mesmo que deleitável, um fim da tendência, mas não seu fim último, porque o gozo não é a
totalidade do bem, mas somente um aspecto do fim. — Enfim, o útil está evidentemente no último
grau do bem, já que não é fim, mas meio.
O mal. — O mal, que é o contrário do bem transcendental, consiste, para um ser, na privação
de um bem que lhe toca. E uma falta ou uma deficiência de ser. Estes termos de privação, falta e
deficiência, servem para marcar que se trata, não da ausência pura e simples de uma perfeição
qualquer, mas da ausência de um bem necessário à integridade de um dado ser. Assim, a cegueira
não é um mal senão para o que vê {privação), mas não para a pedra, a que não compete ver
{negação).
VI. A BELEZA
Falamos que um ente é bom por sua relação com o apetite; e verdadeiro por sua ordenação à
inteligência. Existe ainda uma terceira conveniência do ente com a alma, que se produz quando a
verdade e a bondade das coisas, ao ser conhecidas, causam agrado ao que a contempla: a isso
chamamos beleza. Por isso sua definição reza pulchrum est quod visum placet (belo é o que visto,
agrada). Pois na alma estão as forças do conhecimento e do querer (In anima est vis cognitiva et
apetitiva). Santo Tomás define a beleza afirmando que belo é aquilo cuja contemplação agrada
(pulchrum est quod visum placeat). Neste sentido, falamos de beleza como transcendental.
Podemos dividir a beleza em vários tipos: a beleza inteligível, que é a própria da vida
espiritual, e a beleza sensível, que é de espécie inferior. A primeira tem estreita relação com a
bondade moral e a verdade, e, portanto a feiúra é própria do erro, da ignorância e do pecado.
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Ademais há uma beleza natural, que procede da natureza das coisas, e uma beleza artificial, nas
realizações dos homens que tentam plasmar o belo. Por isso, o objeto da arte é fazer coisas belas.
Percebemos a beleza das coisas com as potências cognitivas, seja com a sensibilidade ou
com a inteligência, seja com uma combinação das duas. E a captação do belo acrescenta unicamente
ao conhecimento o agrado que resulta desse conhecer.
Por isso, podemos dizer que a beleza é um tipo peculiar de bondade, que aquieta o apetite ao
contemplar o belo. É um bem distinto dos demais, pois ainda que todos os bens produzem um gozo
ao alcança-los, as coisas belas geram um agrada especial pelo mero fato de conhece-las (p. ex.: uma
pessoa vê um diamante, tem interesse por tê-lo e não descansa até compra-lo. Por outro lado, outra
pessoa vê o diamante e goza simplesmente contemplando-lo, descansa ao observa-lo). O
fundamento da beleza não está na vontade do que contempla, mas na perfeição do sujeito querido.
Por isso, a beleza não é o agrado que produz num sujeito, mas aquelas propriedades que fazem grata
sua contemplação. Afinal, o que faz que algo seja belo surge do ser de cada ente.
D. A CAUSALIDADE
I. O CONHECIMENTO DA CAUSALIDADE
A experiência da causalidade
Ao captar a noção de causalidade não captamos isoladamente as idéias de causa e feito, mas
sim as captamos intimamente vinculadas, até o ponto que não se pode entender uma sem a outra. A
mútua dependência entre causa e feito se expressa de modo universal sob o nome de princípio de
causalidade (contudo, os princípios de causalidade que citaremos vão se referir à causalidade
eficiente, pois as outras causas se fundamentam nela ou estão intimamente unidas). Algumas
formulações do princípio de causalidade são:
A. Tudo o que começa tem uma causa. Esta formulação pode referir-se a qualquer perfeição
dos entes que tenha um início temporal, pois o que não tem ato não é capaz de dar-lo a si
mesmo, mas necessita o influxo de outro que já o possua (p. ex.: o que não é quente
necessita de algo que esteja quente para esquentar-se).
B. Tudo o que se move é movido por outro. Esta é a primeira formulação na História do
princípio de causalidade, e foi realizada por Aristóteles. Esta formulação se pode explicar
dizendo que, pelo movimento, o que está em potência passa a ato, mas, como nenhuma
potência dá o ato a si mesma, temos que concluir que se move o faz por algo exterior a ele.
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C. Tudo o que é contingente necessita uma causa. Entendemos por contingente o que se
comporta de diverso modo e, mais concretamente, o que tem em si mesmo a potencia de
deixar de ser; e isto acontece nos seres corruptíveis, que estão compostos de matéria e
forma. E como o contingente pode ser ou não ser, se de fato “é”, podemos concluir que
necessita uma causa de seu ser em ato, e esta, se é contingente, necessitará de outra causa, e
assim sucessivamente até que se chegue a uma causa necessária.
D. Tudo o que convém a algo e não é de sua essência lhe pertence por alguma causa. Esta
formulação se considera a mais perfeita do princípio de causalidade. Podemos explica-la
dizendo que todos os entes convêm no ser, o qual não pertence a sua essência e, por tanto,
exige uma causa realmente distinta. E o ser não pertence à essência porque essa é o princípio
da diversidade; ao contrário, o ser é o princípio de unidade. Portanto, o ser exige uma causa
exterior, pois não pode vir da essência diversificante. Ademais, podemos argumentar com
Santo Tomás de Aquino que “todas as coisas compostas têm uma causa...: aquelas que por si
mesma são diversas não convêm em algo se não é por uma causa que as una”. Os entes estão
compostos por essência e ser, que por si são distintos; logo faz falta uma causa que os reúna.
Das formulações do princípio de causalidade podemos concluir que “nada pode ser causa de
si mesmo” (causa sui), pois se produziria no ser para chegar a ser, o que suporia que seria e não
seria ao esmo tempo, e isto vai contra o princípio de não contradição.
Outra conseqüência que se desprende do princípio de causalidade é a seguinte: “nenhuma
causa pode produzir um efeito superior a si mesmo”, ou como dizemos na linguagem coloquial
“ninguém dá o que não tem” (nemo dabit quod non habeat).
Noção de causa
Podemos definir a causa como “aquilo que real e positivamente influi numa coisa,
fazendo-a depender de algum modo de si”1. As características da causa são:
A. Dependência efetiva no ser. Com isso queremos expressar que uma causa é causa na medida
em que sem ela não começa a ser ou subsistir o efeito.
B. Distinção real entre a causa e o efeito. Isto é evidente, pois a dependência real implica a
distinção.
C. Prioridade da causa sobre o efeito. Com isso se quer dizer que toda causa é anterior ao
efeito segundo uma ordem de natureza e quase sempre também segundo uma ordem
temporal (p. ex.: a semente é antes que a árvore), no sentido de que a perfeição causada deve
encontrar-se “antes” na causa, ainda que respeito à ação, causa e efeito são simultâneos.
1
A ocasião é uma circunstância acidental, que cria condições favoráveis à ação (assim, o bom tempo é a ocasião
que me decide a fazer um passeio). A condição é a circunstância da qual se depende de tal maneira que se está ausente
ou suprimida a sua conseqüência também o está. Nem a condição mais indispensável (chamada condição sine qua non)
podem ser confundidas com a causa propriamente dita, pois o efeito não depende dela essencialmente, mas
acidentalmente. A condição é o que permite à causa, produzir seu efeito, seja positivamente a título de instrumento ou
de meio (assim, o arco é para o violinista a condição da melodia que vai tocar), — seja negativamente, afastando os
obstáculos (assim, o pianista deve fazer afinar seu piano, se quer tocar direito).
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O que caracteriza a causalidade é a dependência no ser. Logo, haverá tantos tipos de causas
como diversas maneiras de subordinação real.
Os tipos de causas são as seguintes: é causa a matéria de qual algo está feito (causa
material); a forma intrínseca à coisa, que atualiza essa matéria (causa formal); o princípio que faz
surgir a forma na matéria (causa eficiente), e o fim para o qual tende o agente (causa final). Todos
os outros tipos de causa podem resumir-se em algum destes quatro.
Causa material
Podemos definir a causa material como “aquilo do qual e no qual se faz algo” - ex qua et in
qua aliquid fit (p. ex.: uma mesa é feita de madeira ou de aço)2. A causa material relacionada com
outras causas pode caracterizar-se como:
A. Princípio potencial passivo. A causa material é princípio como as outras três. Contudo, se
distingue das outras em que a causa material é potência passiva, que contém o efeito como a
potência contém o ato (p.ex.: a mesa está incluída na madeira informe, mas de forma
potencial e deficiente, já que para chegar a ser mesa necessita a ação do marceneiro).
B. Permanente no efeito. Como é potência passiva, a matéria faz as funções de sujeito
receptivo da forma.
C. Indeterminação. Como dizemos que é potência, a matéria é algo inacabado e indefinido:
essa indeterminação finaliza quando a forma atualiza uma das possibilidades da matéria (p.
ex.: a madeira está em potência de ser multidão de utensílios).
A causa formal
Podemos definir a causa formal como “o ato ou perfeição intrínseca pelo que uma coisa é o
que é, tanto no âmbito da substância como no dos acidentes” (p. ex.: a alma faz com que o
homem seja homem o pela cor o faz ser branco, pardo, etc.).
A forma é causa respeito da matéria porque a faz ser em ato, segundo um modo de ser3.
Chama-se forma substancial à forma sem a qual um ente não seria nada; e se chamam formas
acidentais aquelas que advêm a um ente que já está em ato acrescentando outras perfeições.
Por último, devemos fazer referência à causa exemplar. Propriamente não é uma causa, mas
se assimila à causa formal, é, pois uma condição essencial para que o agente seja realmente
causa.
2
Designa-se por este nome a matéria de que uma coisa é feita, quer dizer, sob uma forma mais técnica, o que
concorre para a constituição de um composto como parte intrínseca determinada. Com efeito, num composto, a
matéria é o princípio determinável (ou potencial), enquanto que a forma é o princípio determinante (ou ato).
3
Vê-se pelo que precede que causa formal é sinônimo de forma, uma vez que a forma é o que concorre para a
constituição de um composto como parte intrínseca} determinante e especificadora. É assim que a alma humana, se
acrescendo ao corpo, faz dele um ser humano.
23
A causa exemplar é o modelo que guia o agente na realização da obra (p. ex.: em uma
atividade técnica, o projeto que se vai realizar é possuído na mente e determinará
posteriormente a espécie e as características do futuro efeito).
V. CAUSA EFICIENTE
Podemos definir a causa eficiente como o “princípio do que flui primariamente qualquer
ação que faz com que algo seja o que seja de algum modo”. Como a causa eficiente obra sobre a
matéria, tirando dela uma nova forma, é chamada também causa motriz (causa movens); e Santo
Tomás a define dizendo que “a causa eficiente é causa da causalidade da matéria e da forma,
pois faz, por seu movimento, que a matéria receba a forma e que a forma tenha inerência na
matéria”.
As características da causa eficiente são as seguintes:
Esta divisão se realiza em razão de sua intensidade. A causa total é causa completa do efeito em
determinada ordem; a causa parcial somente produz uma parte do efeito (p. ex.: o pai e a mãe são
causa parcial do filho).
Esta divisão se faz com referência á extensão, ou seja, ao conjunto de feitos diversos aos que se
estende. A causa universal é a que alcança uma série de resultados diferentes desde o ponto de vista
específico (p. ex.: Deus é causa universal de tudo o criado; o diretor de um colégio á causa universal
de todos os que dependem dele, etc.); a causa particular é a que se encontra restringida a um só tipo
de efeito (p. ex.: o marceneiro faz uma mesa, mas não em quanto ente). Afinal, quanto mais perfeita
é uma causa, ou seja, quanto mais ser possua, maior é sua capacidade operativa e a mais coisas se
estende.
Esta divisão se realiza pelo grau de semelhança dos efeitos com suas causas. É chamada de
causa unívoca a que produz um efeito de sua mesma espécie (p. ex.: o homem gera um homem); a
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causa análoga é a que dá lugar a um efeito de diferente espécie e inferior à causa, ainda que
semelhante a ela (p. ex.: o artista á causa análoga da estátua que, ainda que não seja da mesma
espécie que ele possui uma semelhança degradada do espírito humano, e assim cada um dos
artefatos feitos pelo homem).
Podemos dizer que causa principal é a que atua por sua própria força. Por outro lado, a causa
instrumental é a que produz um efeito não por sua própria força, mas somente pelo movimento com
o que a move o agente principal (p. ex.: numa operação cirúrgica, o médico cirurgião á a causa
principal da operação e o bisturi á a causa instrumental)4.
Conseqüentemente, a ação do instrumento em quanto instrumento não é diferente da ação do
agente principal, e por isso o efeito de uma ação instrumental deve atribuir-se ao agente principal e
não ao instrumento (p. ex.: uma pintura não deve ser atribuída ao pincel, mas sim ao pintor).
A causa necessária é a que alcança sempre seu próprio efeito; a contingente é aquela que não
produz sempre o efeito (o conhecimento de Deus é necessário, nunca se equivoca ao conhecer; ao
passo que um fósforo aceso não cause um incêndio num estábulo, se sua palha está molhada, e,
portanto é causa contingente).
Definimos a causa determinada como aquela que produz seu próprio efeito pela simples
espontaneidade de sua natureza (p. ex.: a laranjeira produz laranjas segundo sua natureza, como
causa determinada, se nada a impede); pelo contrário, a causa livre é a que produz seu efeito com
domínio sobre a operação e, portanto, se pode produzir ou não por causa da decisão que chamamos
livre (p. ex.: um aluno decide se estuda ou não estuda).
No entanto, ainda que pareça contraditório, afirmamos que Deus é causa necessária (não
contingente) e livre (não determinada).
G. Causa física e causa moral. Chama-se causa física aquela que age por um influxo físico. Por
"influxo físico", todavia, é necessário não entender uma atividade de ordem sensível e material, mas
apenas um influxo real: assim, o arquiteto é a causa física da casa, enquanto dirige toda a atividade
dos operários.
4
Também são chamadas de causa primeira e causa segunda. A causa principal pode ser causa primeira ou causa
segunda, conforme seja principio primeiro ou princípio intermediário da ação. Por isto mesmo, toda causa principal é
primeira sob algum aspecto, e toda causa primeira é necessariamente causa principal.
Da mesma forma, toda causa segunda é instrumental em relação à causa primeira de que depende. Mas pode sob
uma outra relação ser por sua vez causa principal, da mesma forma que a causa primeira pode não ser primeira a não
ser sob uma relação definida e causa segunda sob uma outra relação. Veremos que apenas Deus é causa absolutamente
primeira e independente: todas as outras causas agem apenas na dependência de Deus, Causa primeira universal, e,
como tais, não são mais do que causas segundas.
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empresa. A causa moral, assim entendida, apenas impropriamente é chamada causa eficiente e
antes exprime a causalidade final.
H. Cansa essencial e causa acidental. A causa, seja principal, seja instrumental, pode ser causa
por si (ou essencial) ou causa por acidente (ou acidental). A primeira é a que produz o efeito
próprio a que está ordenada; assim acontece com a operação cirúrgica que cura o doente. —A
segunda é a que produz um efeito a que não está ordenada: assim, a operação cirúrgica que provoca
a morte do paciente; assim, ainda, o ato do cultivador que, cavando seu campo para plantar uma
árvore, descobre um tesouro.’ Vê-se assim que o efeito da causa acidental, ao contrário do da
causa essencial, não tem razão final, uma vez que se produz fora das intenções do agente. É por
excelência o que se passa com o acaso, que é então propriamente uma causa acidental.
Comprovamos pela experiência que tanto o obrar humano como o obrar entre as criaturas
irracionais tem uma orientação determinada, ou seja, se dirige a um objetivo, e este é a causa do
colocar-se a atuar, e assim surge a causa final como coroação dos diversos tipos de causalidade.
Todos os entes atuam em vistas a um fim (omne agens agit propter finem).
Podemos definir a causa final como “aquilo em vista do qual algo se faz” (id, propter quod
aliquid fit), ou também, com outras palavras, podemos dizer que a causa final é “aquilo pelo que o
agente se determina a obrar” (p. ex.: o arquiteto faz uma casa para ganhar dinheiro).
A. O fim causa por modo de atração. Isto é o que caracteriza a causa final em contraposição às
outras causas. Por isso, podemos dizer que o próprio do fim é atrair (p. ex.: o conseguir
dinheiro é o que move o pai de família a trabalhar).
B. A causa final tem razão de bem. Precisamente se o fim atrai porque é bom e, enquanto tal,
pode aperfeiçoar a outros. O fim, aquilo ao que tende o obrar, é necessariamente algo
adequado para ele, já que não se moveria para consegui-lo se não houvesse alguma
conveniência. E como o que é apropriado para alguém é seu bem, resulta que todo agente
obra pelo bem. 5
C. O fim é verdadeiro princípio causal. Pois sem a causa final o agente não se moveria a obrar
e, conseqüentemente, não se daria o efeito.
5
É evidentemente o desejo que está no princípio do movimento: é porque fui solicitado por alguma coisa, que me
apareceu como desejável, que resolvi agir. Mas a explicação deve ser procurada mais adiante, porque pode-se ainda
perguntar a razão do desejo. Ora, nós sabemos que a tendência e o desejo não são postos em ato senão pela apreensão
de algum objeto que se apresente sob o aspecto de um bem que convém ao agente. É, então, fundamentalmente, o bem
enquanto desejável, que explica a causalidade final. Eis por que se afirma que o fim e o bem são convertíveis.
Neste ponto pode-se distinguir o fim da obra e fim do agente. O fim da obra é objetivo: é o fim ao qual a obra está
ordenada por sua própria natureza: assim, a esmola é, por si, destinada a amenizar a miséria do pobre. — O fim do
agente ê subjetivo, pois reside na intenção: aquele que dá a esmola pode visar quer a amenizar a miséria, quer a obter
uma reputação lisonjeira de generosidade. Quando o fim do agente não coincide com o fim da obra, esta se torna um
simples meio.
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Tipos de causa final
Chamamos fim intrínseco ao resultado natural de uma operação (p. ex.: o fim do escultor é a
imagem que produz com seu trabalho). A este fim se chama também fim-efeito, pois é produto da
ação.
Chamamos fim transcendente ao objetivo ao que está dirigida a ação (p. ex.: o gato se dirige ao
lugar onde está o pratinho de leite para alimentar-se; a alimentação é o fim transcendente respeito
ao caminhar).
Se nos referimos aos seres inteligentes e livres o fim transcendente pode ser escolhido pelo
sujeito (p. ex.: um pintor pode propor-se ser famoso como meta de seu trabalho profissional). Na
Ética se chama “fim do que atua” (finis operantis) ao fim transcendente; ao fim intrínseco, “fim da
obra” (finis operis).
Chamamos fim último ao que tendem todos os demais fins de uma série de causas finais
encadeadas; e fim próximo é o que se pretende com vistas a outro fim ulterior (p. ex.: a paz é a
causa final da guerra e as diferentes batalhas vitoriosas são fins próximos encaminhados ao triunfo
final). Afinal, o fim último de tudo o criado é Deus; contudo, podem dar-se de um modo relativo
diferentes fins últimos que não sejam Deus.
O fim honesto é aquele que se quer em si mesmo porque é bom para o ente que o deseja (p. ex.:
a ciência médica aperfeiçoa aquele que a possui).
O fim deleitável é o mesmo fim ou bem honesto, mas enquanto aquieta o desejo e produz um
gozo uma vez que se conseguiu (p. ex.: a satisfação que produz a ciência médica enquanto aquieta o
desejo de conhecimento do estudante).
O fim útil é o que se quer como meio (p. ex.: a ciência médica em ordem à saúde corporal).
Há ações que chamamos “produtoras de seu fim” enquanto que têm como resultado uma
realidade que antes não existia. A este fim o chamamos fim produzido. Neste sentido podemos dizer
que a produção do fim é uma mostra da “perfeição” do agente ( p. ex.: o pintor, quando realiza sua
obra numa tela, dá realidade ao fim que se havia proposto).
Outras ações, pelo contrário, não produzem um novo objeto, mas relacionam o agente com uma
realidade já existente. A este chamamos fim possuído ( p. ex.: a pessoa que ama a outra não a cria,
mas se une a um ser já existente). Neste caso, mais que mostrar a perfeição do agente, manifesta sua
“indigência”, ou seja, a necessidade que tem de aperfeiçoar-se com algo exterior.
O princípio de finalidade
A finalidade faz referência a todo ente, ainda que se veja com maior facilidade nos entes
livres, e se formula do seguinte modo: “Todo agente obra por um fim”- omne agens agit propter
finem; este é um fato captado pela experiência. Tanto os seres livres como os que obram por sua
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natureza, ou seja, necessariamente, se movem para conseguir seu fim, pois do contrário não
atuariam.
Nos processos não livres a existência da causa final se comprova ao observar a natureza. Sua
contemplação nos leva a ver a ordem das coisas, e essa ordem supõe que o fim é sua causa.
Ademais, a regularidade dos processos naturais é manifestação clara de que tendem sempre a um
fim. Por isso, concluímos que o fim imediato de todos os seres não livres é a mesma perfeição de
sua espécie.
Os seres livres tendem a seus fins conhecendo a estes como tais e dominando as ações
relacionadas com o fim.
O fim é a primeira das quatro causas, e se necessita dela para que se dêem os demais tipos de
causalidade. O fim é causa da causalidade do agente, porque faz com que esta produza seu efeito
(sem causa final não haveria causa eficiente), e se o agente não obra, não se dá a passagem da
potência (causa material) ao ato (causa formal). Portanto, sem causa final não haveria nem causa
eficiente, nem material, nem formal. Enfim, por assim dizer, “põe em marcha” o processo causal.
Por isso, podemos afirmar que o fim é causa das causas (causa causarum). Contudo, o fim é o
último que se consegue na execução e o primeiro na ordem da intenção (primus in intentione,
ultimus in executione).