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1 INTRODUÇÃO
(*)
Juiz do Trabalho no TRT da 23ª Região. Doutorando em Função Social do Direito pela Faculdade
Autônoma de Direito de São Paulo. Mestre em Direito Agroambiental pela Universidade Federal de Mato
Grosso. Autor de livros jurídicos. Coordenador Acadêmico da Pós-graduação em Direito e Processo do
Trabalho da Escola Superior da Magistratura Trabalhista de Mato Grosso nos biênios 2011 a 2013 e 2013
a 2015. Membro do Comitê Executivo do Fórum de Assuntos Fundiários do Conselho Nacional de Justiça
de 2013 a 2014. Professor das disciplinas Teoria Geral do Processo, Direito Processual Civil, Direito
Processual do Trabalho e Direito Ambiental do Trabalho. Tem atuado ultimamente como professor e/ou
palestrante na Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (ENAMAT)
e nas Escolas Judiciais dos TRTs da 3ª, 5ª, 6ª, 7ª, 9ª, 14ª, 15ª, 18ª e 23ª Regiões. Endereços eletrônicos:
prof.jhcesario@gmail.com (e-mail), www.facebook.com/prof.joaohumbertocesario (Facebook),
www.facebook.com/prof.joaohumbertocesarioII (Facebook) e @joaohumbertocesario (Instagram).
arbitragem trabalhista sem perder de vista a perspectiva crítica, mas, ao mesmo tempo,
sem cedermos às tentações puramente preconceituosas.
solucionar conflitos trabalhistas, provenientes do extinto
contrato de trabalho, desde que essa opção seja manifestada em
clima de ampla liberdade, reservado o acesso ao Judiciário para
dirimir possível controvérsia sobre a higidez da manifestação
volitiva do ex-trabalhador, na esteira do artigo 5º, inciso XXXV
da Constituição.”1
O fato, todavia, é que ainda com mais rigor do que a antedita decisão turmária, a
posição da SBDI I do TST se solidificou no sentido da inviabilidade da utilização da
arbitragem para a solução de conflitos trabalhistas, mesmo que a pactuação houvesse sido
realizada após o término do contrato de emprego. Reproduzimos, nessa linha, excertos de
decisão por maioria (vencido apenas o ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho),
tomada sob a relatoria do ministro João Oreste Dalazen:
celebração de acordo com vistas à quitação do extinto contrato
de trabalho. A premência da percepção das verbas rescisórias,
de natureza alimentar, em momento de particular fragilidade do
ex-empregado, frequentemente sujeito à insegurança do
desemprego, com maior razão afasta a possibilidade de adoção
da via arbitral como meio de solução de conflitos individuais
trabalhistas, ante o maior comprometimento da vontade do
trabalhador diante de tal panorama. A intermediação de pessoa
jurídica de direito privado – "câmara de arbitragem" – quer na
solução de conflitos, quer na homologação de acordos
envolvendo direitos individuais trabalhistas, não se
compatibiliza com o modelo de intervencionismo estatal
norteador das relações de emprego no Brasil.2
Justiça do Trabalho, sem que o mencionado dispositivo legal faça qualquer distinção entre
conflitos individuais ou coletivos.
Atento à antedita atribuição, o Conselho Superior do Ministério Público do
Trabalho regulamentou por via da Resolução nº 44-1999 a atividade de arbitragem no
âmbito do Ministério Público do Trabalho3, para dispor, entre outras regras, que poderão
ser objeto de arbitragem os dissídios (sem distinção entre individuais e/ou coletivos) de
competência da Justiça do Trabalho (artigo 2º), sendo certo que a arbitragem poderá ser
iniciada pela vontade conjunta de todos os conflitantes ou por um deles, mediante a
convenção de arbitragem (artigo 3º, caput), ficando claro, outrossim, que na hipótese de
iniciativa de apenas parte dos envolvidos no conflito, será atribuição do membro do
parquet escolhido dar conhecimento aos conflitantes que ainda não se manifestaram para
que informem se aceitam a atuação do Ministério Público do Trabalho e a sua indicação
(artigo 3º, § 2º), sendo o processo arbitral arquivado apenas se não houver a aceitação de
todos os conflitantes (artigo 3º, § 3º).
É digno de nota, por outro lado, que artigo 3º, §§ 1º, 2º e 3º do CPC/2015,
enxergado como verdadeira norma fundamental do processo (e que assim dialoga com
todos os modelos processuais), incentiva o incremento da adoção de um ‘sistema
multiportas de resolução de conflitos’ (multi-door courthouse) visto como um ‘centro de
justiça abrangente’ (comprehensive justice center)4, que, entre outras disposições,
estabelece ser permitida a arbitragem na forma da lei.
Não é impróprio recordar, a propósito do quanto dito no parágrafo anterior, que a
preocupação para com o estabelecimento de um sistema multiportas de resolução de
conflitos nas relações de trabalho não chega a ser novidade entre os juslaboralistas, na
medida em que a lei nº 9.958-2000 inseriu os artigos 625-A a 625-H na CLT para tratar
das chamadas Comissões de Conciliação Prévia, fato que, malgrado os seus pífios
resultados práticos (que muito mais se devem à degradação ética de significativa parcela
do sindicalismo e do patronato brasileiro do que propriamente dos deméritos da
legislação), demonstra que os direitos de natureza trabalhista podem perfeitamente
conviver com outros meios de soluções de conflitos além da jurisdição estatal.
3
Publicado no DJ, Seção I, de 11/06/99, pág. 230. Disponível em https://bit.ly/2Mzuev1. Consulta em
24.08.2018.
4
Vide, a propósito, MEDINA, José Miguel Garcia. Direito processual civil moderno. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2015, p. 115.
Atento a tal fato, a Lei nº 13.129-2015 alterou a Lei 9.307-1.996 (Lei da
Arbitragem), nela inserindo, expressamente, no seu artigo 4º, § 4º, a previsão de
arbitragem trabalhista nos contratos individuais de trabalho, desde que o empregado
ocupasse ou viesse a ocupar cargo ou função de administrador ou de diretor estatutário e
que a cláusula fosse instituída pelo empregado ou mediante a sua concordância expressa.
Há de se destacar, entretanto, que tal disposição legal foi vetada pelo Presidente
da República, sob o truncado argumento de que ela materializaria restrições de eficácia
nas relações envolvendo determinados empregados a depender de sua ocupação,
acabando por realizar uma distinção indesejada, o que colocaria em risco a generalidade
de trabalhadores que poderiam se ver submetidos ao processo arbitral.5
Finalizando o presente tópico, podemos concluir, antes mesmo de adiante analisar
o artigo 507-A da CLT (que após a reforma trabalhista trata da arbitragem laboral), que
diante de todo o escorço legislativo que antes alinhavamos, a arbitragem pode
perfeitamente ser utilizada para a solução de dissídios trabalhistas, sejam eles coletivos
e/ou individuais, desde que observados, naturalmente, certos critérios e limites.
constitucionalidade. Os seus critérios, naturalmente, poderiam ser melhores, mais claros
e menos sujeitos a controvérsias. Nada obstante, acreditamos que ele se amolda
perfeitamente às normas fundamentais do processo que contemporaneamente aconselham
a adoção de um sistema multiportas de resolução de conflitos6.
Na nossa visão, primeiramente, ao invés de permitir a arbitragem nos contratos
individuais de trabalho cuja ‘remuneração’ seja superior a duas vezes o limite máximo
estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, teria sido
conveniente que o artigo 507-A o tivesse feito nos liames empregatícios cujo ‘salário’
fosse superior ao patamar discricionariamente estabelecido pelo legislador.
Salário e remuneração, como sabemos, não são termos sinônimos em Direito do
Trabalho. Com efeito, diante da maior variabilidade da ‘remuneração’ em relação ao
‘salário’, a simples adoção desse último termo daria maior segurança jurídica aos
pactuantes, haja vista que a ‘remuneração’ pode perfeitamente em um mês ser superior a
duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de
Previdência Social e inferior no mês subsequente.
Pensamos, demais disso, que além do critério puramente econômico, teria sido
conveniente que o legislador, nos casos mais gerais, pudesse ter a ele consorciado outros
elementos, como a exigência de um grau mínimo de formação escolar do trabalhador,
balizado, por exemplo, pelo ensino superior, excepcionando-o apenas em casos mais
específicos, como o de empregados ocupantes de cargo ou função de administrador ou de
diretor estatutário (como queria a Lei nº 13.129-2.015, vetada, no pertinente, pelo
Presidente da República) e, ainda, entre outros, o de atletas com reconhecida projeção
mercadológica.
Nesse sentido, por exemplo, seria conveniente que o artigo 507-A da CLT tivesse
uma redação pelo menos semelhante à do parágrafo único do artigo 444 da CLT (com a
6
Contrariamente ao que pensamos, há quem enxergue inconstitucionalidade no artigo 507-A da CLT. Vide,
por todos, TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. O processo do trabalho e a reforma trabalhista. São Paulo:
LTr, 2017, p. 45, que em linha de pensamento ultrapassada pelo STF desde o ano de 2001 no que diz
respeito à constitucionalidade da própria Lei de Arbitragem (vide o decidido no SE-AgR 5206), se limita a
argumentar o seguinte: “Particularmente, entendemos que o art. 507-A, da CLT é inconstitucional. O
direito de ação está assegurado pelo art. 5º, XXXV, da Constituição Federa. E figura como uma das mais
importantes conquistas dos Estados Democráticos de Direito. Dir-se-á, talvez, que o preceptivo
constitucional mencionado está dirigido apenas ao legislador, não à parte, de tal modo que, embora a Lei
não possa excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer ameaça ou lesão a direito, a parte pode
renunciar ao direito de ação, significa dizer, afastar a atuação jurisdicional do Estado. Se assim se disser,
devemos argumentar, em caráter proléptico, que a leitura democrática a ser feita do art. 5º, XXXV, da
Constituição Federal, é que nem mesmo a Lei pode impedir o exercício do direito de ação; logo, esse
direito se revela não somente intocável, como irrenunciável.”
redação que lhe foi atribuída pela Lei 13.467-2017), que permite que o empregado
‘portador de diploma de nível superior’ e que perceba ‘salário’ mensal igual ou superior
a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social,
estabeleça livremente com o seu empregador obrigações contratuais com a abertura e a
ductibilidade do artigo 611-A da CLT.
Feitas tais observações, parece-nos importante debater, em apartado, se os direitos
trabalhistas seriam ou não indisponíveis, já que nos termos do artigo 1º da Lei 9.307-1996
(à qual o artigo 507-A da CLT faz expressa remissão) as pessoas capazes de contratar
somente poderão se valer da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos
patrimoniais disponíveis.
Como ainda agora vimos, somente os dissídios que dizem respeito a direitos
patrimoniais disponíveis podem ser submetidos à arbitragem. Em função disso, não são
poucos aqueles que apregoam que os litígios laborais não seriam passíveis de solução
pela via arbitral, vez que diante da natureza alimentar dos créditos laborais, eles não
seriam disponíveis.
Parece-nos que tal ponto de vista não se sustenta. Há de se ver, inicialmente, que
nem todos os créditos oriundos de uma relação de trabalho detêm a prefalada natureza
alimentar. Basta ver que não são incomuns, na esfera laboral, processos nos quais são
debatidos, por exemplo, danos civis de natureza diversa da alimentar.
Como se não bastasse, o artigo 1.707 do Código Civil, ao dizer na sua primeira
parte que ‘pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos’,
demonstra, com tintas fortes, que um direito alimentar, ainda que irrenunciável, é
perfeitamente passível de disposição.
Ora, ainda que o crédito alimentar não seja de fato suscetível a renúncia, ninguém
pode obrigador o credor a exercê-lo. É indene de dúvidas, com efeito, que embora
irrenunciável, o direito a alimentos, na prática, é disponível. Tal lógica, sem dúvida, se
amolda sem transtornos aos direitos trabalhistas. Colhemos, em linha argumentativa
semelhante, o escólio de Homero Batista Mateus da Silva:
irrenunciáveis - e, portanto, imunes a atos unilaterais dos
empregados ou acordos extrajudiciais não revestidos de
formalidades – mas não chegam ao patamar do indisponível –
pois, do contrário, nem ao menos poderia haver prescrição
trabalhista ou acordo judicial, com ou sem concessões
recíprocas. (...)”7
Pensamos, de tal arte, que salvo algumas exceções, como, por exemplo, questões
que envolvam o direito fundamental à redução dos riscos inerentes ao trabalho (artigo 7º,
XXII, da CRFB)8, de modo que ao cidadão-trabalhador seja garantido um meio ambiente
de trabalho equilibrado (artigo 225 da CRFB), a esmagadora maioria dos litígios
trabalhistas, desde que observados pelo menos os requisitos legais do artigo 507-A da
CLT, podem ser perfeitamente resolvidos pela via arbitral, haja vista que neles na essência
estarão em debate direitos patrimoniais disponíveis.
Ao dizer que a arbitragem individual trabalhista poderá ser pactuada por mera
cláusula compromissória, o artigo 507-A da CLT foi redigido de modo simplório,
tangenciando à indigência técnica. A questão, embora não chegue a ser complexa, é um
tanto mais intrincada. Para que não haja dissabores na pactuação, faz-se necessária a
diferenciação entre a convenção de arbitragem, a cláusula compromissória e o
compromisso arbitral.
Podemos assentar, dito de modo mais direto, que a convenção de arbitragem é um
gênero que compreende duas espécies, quais sejam, a cláusula compromissória e o
compromisso arbitral. A convenção de arbitragem, em tal diretiva, é o negócio jurídico
7
SILVA, Homero Batista da. Comentários à reforma trabalhista. São Paulo: LTr, 2017, p. 98.
8
Para bem explicar a indisponibilidade do direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho,
necessitaríamos fazer uma incursão no princípio jusambimental do poluidor-pagador, esmiuçando, no
mínimo, o conceito de externalidade ambiental negativa. Como não temos espaço para a aludida tarefa aqui,
remetemos o leitor ao estudo da nossa obra doutrinária, cujas referências bibliográficas adiante seguem:
CESÁRIO, João Humberto. Técnica processual e tutela coletiva de interesses ambientais trabalhistas. São
Paulo: LTr, 2012.
do qual emana o comprometimento dos pactuantes para com a jurisdição arbitral. Para
que tal negócio se aperfeiçoe, são necessárias, primeiramente, a cláusula compromissória,
que é a via pela qual os sujeitos do negócio externam propriamente o ajuste de vontades
no sentido de submeterem eventuais controvérsias que surgirem entre eles à arbitragem.
Entretanto, para que haja a procedimentalização da demanda no juízo arbitral, tais sujeitos
deverão fixar, a princípio9 em um compromisso arbitral, quais serão as regras
procedimentais que serão respeitadas no curso da arbitragem propriamente dita.
Em termos legislativos, doravante, buscaremos assentar, ainda que sinteticamente,
os conceitos e, principalmente, as cautelas que o advogado trabalhista deverá tomar para
bem orientar os seus clientes no ajuste de uma cláusula compromissória e de um
compromisso arbitral verdadeiramente completos e eficientes.
De acordo com o caput do artigo 4º da Lei nº 9.307-1996, a cláusula
compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-
se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato,
sendo certo, nos termos do § 1º do prefalado dispositivo, que a cláusula compromissória
deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em
documento apartado que a ele se refira.
O que há de ficar mais claro, entretanto, é que sendo o contrato de emprego, na
prática, uma modalidade de contrato de adesão, a cláusula compromissória, no âmbito
trabalhista, somente será realmente eficaz, em consonância com a inteligência do § 2º do
multicitado artigo 4º da Lei nº 9.307-1996, se o aderente tomar a iniciativa de instituir a
arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição (requisitos que na prática
já estão previstos no artigo 507-A da CLT), ‘desde que por escrito em documento anexo
ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula’.
Entretanto, mais importante do produzir uma cláusula compromissória válida, é o
cuidado de prever, de antemão, para que não haja dissabores futuros, uma cláusula
compromissória completa, da qual conste, sem margem para dúvidas, um compromisso
arbitral suficiente para prever os mecanismos procedimentais que regerão a atividade
arbitrativa. Não é por outra razão que o artigo 5º da Lei nº 9.307-1996 estatui que uma
9
Usamos a expressão “a princípio”, pois, como adverte DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual
civil. Vol. 1. 17 ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Jus Podivm, 2015, p. 170: “Para efetivar a cláusula
compromissória, costuma ser necessário que se faça um compromisso arbitral, que regulará o processo
arbitral para a solução do conflito que surgiu. No entanto, se a cláusula compromissória for completa
(contiver todos os elementos para a instauração imediata da arbitragem), não haverá necessidade de
futuro compromisso arbitral.”
vez se reportando as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral
institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada de
acordo com tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula,
ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem.
A aludida advertência é demasiadamente importante. Ocorre que se as regras
procedimentais não estiverem estabelecidas entre os pactuantes, eles correrão o risco de,
antes da instituição da arbitragem, passarem por um desgastante procedimento
administrativo e, pior ainda, de terem que se socorrer da jurisdição estatal, da qual
almejavam afastamento ao instituírem a cláusula compromissória.
Veja, a propósito, que o artigo 6º da Lei nº 9.307-1996 é indene de dúvidas ao
vaticinar que não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte
interessada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal
ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento,
convocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral,
esclarecendo, na sequência, que caso não compareça a parte convocada ou,
comparecendo, recuse-se a firmar o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a
demanda de que trata o art. 7º Lei nº 9.307-1996, perante o órgão do Poder Judiciário a
que, originariamente, tocaria o julgamento da causa (ou seja, a Justiça do Trabalho, na
hipótese da arbitragem de natureza laboral), a fim de que este fixe o rito regente da
arbitragem.
Neste caso, o autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o
pedido com o documento que contiver a cláusula compromissória (artigo 7º, § 1º).
Outrossim, uma vez comparecendo as partes à audiência, o juiz tentará, previamente, a
conciliação acerca do litígio (do litígio laboral propriamente dito, sendo este, justamente,
o motivo pelo qual o autor deve indicar, na inicial, o objeto da arbitragem). Não obtendo
sucesso, tentará o juiz conduzir as partes à celebração, de comum acordo, do
compromisso arbitral, ou seja, do rito que será respeitado na arbitragem (artigo 7º, § 2º).
Com efeito, não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá
o juiz, após ouvir o réu, sobre o seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez
dias, respeitadas as disposições da cláusula compromissória (artigo 7º, § 3º). Insta
observar, que se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros,
caberá ao juiz, ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para
a solução do litígio (artigo 7º, § 4º).
Demais disso, é importante salientar que a ausência do autor, sem justo motivo, à
audiência designada para a lavratura do compromisso arbitral, importará a extinção do
processo sem julgamento de mérito (artigo 7º, § 5º). Por outro lado, não comparecendo o
réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a respeito do conteúdo do
compromisso, nomeando árbitro único (artigo 7º, § 6º).
Importa notar, finalmente, que após todo esse trâmite, a sentença que julgar
procedente o pedido valerá como compromisso arbitral (artigo 7º, § 7º).
alegação implicará aceitação da jurisdição estatal e, consequentemente, na renúncia ao
juízo arbitral (§§ 5º e 6º do artigo 337 do CPC).
Uma vez eriçada a preliminar na contestação, o magistrado condutor do feito,
naturalmente, deverá conceder prazo ao autor para réplica (artigo 351 do CPC c/c o artigo
852-H, § 1º, da CLT), permitindo-lhe, inclusive, a produção de contraprova. Neste caso,
por exemplo, o autor poderá alegar, entre outros argumentos, que a cláusula
compromissória, em se tratando de um contrato de adesão como é o contrato de trabalho,
não é dotada de eficácia porque o trabalhador-aderente não tomou a iniciativa de instituir
a arbitragem ou com ela não concordou expressamente, desqualificando-a, de outro viés,
por não ter sido veiculada em documento escrito anexo ou em cláusula negritada com
assinatura ou visto específicos (artigo 507-A da CLT c/c artigo 4º, § 2º, da Lei nº 9.307-
1996).
Caminhando para a parte final do presente tópico, uma boa indagação que se pode
fazer, é aquela relativa à forma adequada de se compreender a redação do artigo 485, VII,
do CPC, quando assevera que o juiz não estará autorizado a resolver o mérito quando
acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral
reconhecer sua competência. Afinal de contas, quem possui prioridade para o
pronunciamento da competência nas circunstâncias em que haja conflito diante da
existência de convenção de arbitragem? O juízo arbitral ou o juiz estatal?
O artigo 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.307-1996 é indene de dúvidas ao estatuir
que caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca
da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha
a cláusula compromissória. Não é por outra razão que o artigo 485, VII, do CPC destaca,
com tintas fortes, principalmente na sua parte final, com já visto no parágrafo anterior,
que o juiz não estará autorizado a resolver o mérito quando acolher a alegação de
existência de convenção de arbitragem ‘ou quando o juízo arbitral reconhecer sua
competência’. Está aí estabelecida a regra da Kompetenzkompetenz, abaixo explicada pelo
magistério do professor Fredie Didier Jr.:
ou à existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem
é o próprio árbitro ou tribunal arbitral. Ela não elimina a
possibilidade de exame pelo Poder Judiciário dessas questões ou
torna esses temas imunes à apreciação do juiz estatal: apenas
posterga a eventual análise deles para uma ação anulatória pela
parte que se sentiu prejudicada. Essa regra estabelece, pois, uma
ordem cronológica eventual: na pendência de processo arbitral,
a primeira análise tem de ser arbitral; em caso de reafirmação
pelo árbitro ou tribunal arbitral da própria competência ou de
julgamento improcedente da questão sobre existência, defeito ou
ineficácia da convenção de arbitragem, a parte poderá,
posteriormente à sentença arbitral, levar essa matéria para
conhecimento do Poder Judiciário com eventual ajuizamento de
ação anulatória do art. 33 da Lei de Arbitragem. A possibilidade
dessa análise posterior pelo Poder Judiciário está bem evidente
no art. 20, § 2º, da Lei de Arbitragem, que determina o
prosseguimento do processo arbitral em caso de não acolhimento
da arguição feita pela parte, com fundamento nos temas do art.
8º, parágrafo único, da Lei de Arbitragem, sem prejuízo de vir a
ser examinada a decisão pelo órgão do Poder Judiciário
competente, quando da eventual propositura da demanda de que
trata o art. 33 desta lei. Portanto, a regra da
Kompetenzkompetenz do juízo arbitral é um impedimento a priori
à cognição do juízo estatal, na pendência do processo arbitral.”10
10
DIDIER JR, Fredie. Op. cit. p. 645 e 646.
Na pendência de processo arbitral, será o órgão da arbitragem quem
primeiro terá de analisar questões relativas à competência ou à existência,
validade e eficácia da convenção de arbitragem (artigo 8º, parágrafo único,
da Lei nº 9.307-1996 c/c artigo 485, VII, parte final, do CPC);
A parte que se sentir prejudicada com a decisão do órgão responsável pela
arbitragem, poderá, posteriormente à sentença arbitral, levar a análise da
matéria para conhecimento do Poder Judiciário por via do eventual
ajuizamento de ação anulatória (artigo 20, § 2º, c/c artigo 33, ambos da Lei
nº 9.307-1996).
9 SÍNTESES CONCLUSIVAS
contemporaneamente aconselham a adoção de um sistema multiportas de
resolução de conflitos;
Os direitos trabalhistas, salvo algumas exceções, como aquelas relativas
ao direito fundamental à redução dos riscos inerentes ao trabalho (artigo
7º, XXII, da CRFB), não podem ser considerados como indisponíveis para
fins de arbitragem, ainda que dotados de natureza alimentar (inteligência
do artigo 1.707, primeira parte, do Código Civil);
A convenção de arbitragem é um gênero que compreende duas espécies,
quais sejam, a cláusula compromissória e o compromisso arbitral. Tanto a
cláusula quanto o compromisso, mormente nos contratos de adesão, como
de resto o é o contrato de trabalho, possuem requisitos que se não forem
respeitados subtrairão a eficácia do negócio entabulado. É necessária,
assim, máxima cautela do advogado trabalhista ao orientar os seus clientes
a respeito do tema, a fim de que eles não se vejam compelidos a discutir o
pacto arbitral no juízo estatal;
Diante da regra da Kompetenzkompetenz, o juízo arbitral, durante a
pendência da arbitragem, possui primazia sobre o juízo estatal para
resolver questões alusivas à existência, validade e eficácia da convenção
de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória. Tal
circunstância, todavia, não impede a jurisdição do estado de apreciar o
tema antes do início da arbitragem ou até mesmo de controlar a matéria,
após o esgotamento da jurisdição arbitral, por via de ação anulatória.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil. Vol. 1. 17 ed. rev., ampl. e atual.
Salvador: Jus Podivm, 2015.
MEDINA, José Miguel Garcia. Direito processual civil moderno. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2015.
SILVA, Homero Batista da. Comentários à reforma trabalhista. São Paulo: LTr, 2017.