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FACULDADE EVANGÉLICA DE SÃO PAULO – FAESP

BACHAREL EM TEOLOGIA 1° SEMESTRE 2014. 2° ANO


DISCIPLINA: RELIGIÕES COMPARADAS
PROF. ROGÉRIO LIMA – Data: 11/06/2014 Visto:__________
Aluno: Diógenes de L. Gimenes.
RESENHA CRÍTICA

SOBRE O ARTIGO1

Em seu artigo sobre monoteísmo e identidade, Haroldo Reimer, aborda com


propriedade todo contexto histórico-cultural que colaborou e influenciou o surgimento
monoteísmo hebraico. Nesta resenha, apresento os pontos que considerei mais
importantes na pesquisa do escritor, tais como, a definição do monoteísmo, fontes
para reconstrução, expressões doutrinárias, construções sincréticas, diversidade de
grupos sociais e encerra descrevendo uma possível identidade para novos
contextos.

Conforme escreve Haroldo Reimer, o monoteísmo hebraico é uma construção


cultural-religiosa peculiar do povo hebreu. Sua construção está datada entre os
séculos IX e V a.C. no Antigo Oriente Próximo. Uma das coisas que considero
interessantes neste contexto são os grupos sociais que convivem nesta região.
Cada um desses grupos tem suas peculiaridades. Cada grupo tem seus costumes e
modo cultural de se comportar. Essas diversidades de grupos realizavam
intercâmbios culturais e religiosos entre si. Deste modo, o monoteísmo hebraico teve
sua formação no meio desta gama cultural, inclusive sobre a influência do povo
cananeu.

Sobre o monoteísmo hebraico

“Monoteísmo é um sistema religioso que afirma fundamentalmente a


existência de um só Deus”. Apesar disto, Reimer deixa bem clara a ideia que o
monoteísmo hebraico, mesmo tendo suas peculiaridades sociais-culturais não surgiu
de forma isolada, antes, sua construção se deu em diálogo com e em intercâmbio
com expressões simbólicas de outros grupos presentes no Antigo Oriente próximo.

1
REIMER, Haroldo. Monoteísmo e Identidade. Disponível em: www.haroldoreimeir.pro.br
Sobre as fontes para reconstrução

Reimer diz que a história formativa da ideia da monolatria e do monoteísmo


hebraico pode ser reconstruída em largos traços. Ele afirma que textos sagrados
(Torá, Nebi´im, Ketubim = Torá, Profetas e Escritos)2 podem ser utilizados como
como fontes de reconstrução histórica. Além disto, considera também importante, os
achados arqueológicos, como restos arquitetônicos, materiais epigráficos, cerâmica,
etc.

Sobre o amadurecimento de um ideário

Para Reimer, o monoteísmo é uma síntese teológico-cultural produzida pelo


povo do Antigo Israel aos longo de vários séculos dentro da chama `era-eixo´ entre
os séculos IX e V a.C. Nisto, mostra-se o desenvolvimento gradual da ideia da
adoração exclusiva a uma Divindade, conhecida pelo nome Yahveh. Reimer ainda
afirma que para os tempos iniciais da história dos hebreus, isto é, nos séculos XII a
X a.C., deve-se trabalhar com o postulado de um pluralismo religioso, atestado, por
exemplo, na existência de um panteão divino cananeu. O Deus Yahveh, divindade
que viria a ser própria dos hebreus, provavelmente foi amalgamado com atributos do
Deus cananeu El. Formas itinerantes e diversidade de culto eram marcantes neste
período. A ‘arca da aliança’, mencionada em vários textos relativos a este período, é
símbolo desta itinerância.

Expressões doutrinárias

O monoteísmo hebraico se constitui de algumas idéias básicas. Aqui farei um


breve resumo das definições dadas por Reimer sobre os pontos abordados.

a) Somente Yahveh é Deus. Esta afirmação tem sua expressão marcante no


famoso shema Yisrael em Deuteronômio 6.4. Ali se afirma textualmente: “Ouve, ó
Israel, Yahveh é nosso Deus, Yahveh é um”.

b) O culto deve ser anicônico. Dizer isso significa que as práticas religiosas ou
cúlticas devem acontecer sem recurso a qualquer tipo de imagens representativas
de Deus. Isso abarca a iconografia em sentido amplo, incluindo imagens fundidas e
esculpidas. A proibição do uso de imagens acontece ao longo do conjunto dos textos

2
Condensados na Bíblia Hebraica e chamado pelos Judeus de Tanak.
da Bíblia hebraica como elemento religioso e identitário marcante da cultura
hebraica.

c) Fé em Deus e ética no cotidiano. A reverência ao Deus Yahveh deve ser


acompanhada por práticas eticamente regradas, substanciadas em mandamentos e
leis. A dimensão ética da pertença à comunidade dos fiéis a Yahveh tem sua
expressão no conjunto de leis, normas e orientações condensadas na Torá, isto é,
na primeira parte da Bíblia hebraica. Por isso se fala também de ‘monoteísmo ético’.
A maior parte destas leis é entendida como tendo origem divina, reveladas no Sinai3,
num tempo mítico antes da conquista da terra pelos hebreus.

Sobre as construções sincréticas


Neste tópico, Reimer toca em um ponto muito importante mostrando a
influência dos povos circunvizinhos e o sincretismo que influenciou Israel em sua
formação monoteísta. Acredita-se que houve junção sincrética de elementos
religiosos próprios de Israel com elementos dos grupos sociais e populacionais
vizinhos. Elementos próprios foram combinados com elementos religiosos forâneos
(de fora), com perspectivas internas próprias, condizentes com o postulado da
adoração exclusiva a Yahveh. Houve aí momentos típicos do sincretismo como
justaposição, fusão ou também paralelidade disjuntiva, por exemplo, na rejeição de
elementos culturais e religiosos indesejáveis. O patrimônio de textos, orações, mitos,
etc. do monoteísmo oficial foi forjado a partir de uma diversidade de elementos
culturais e religiosos, disponíveis no contexto do antigo Oriente Próximo, no qual se
dão movimentos integrativos e momentos disjuntivos. Importante é perceber que
esses movimentos de integração e também de refração tem a ver com grupos
sociais diversos presentes nos limitados espaços geográficos do antigo Israel ou da
terra de Canaã.

Sobre a diversidade de grupos sociais


Nisto, Reimer diz que o monoteísmo hebraico é a consolidação oficial de uma
idéia teológica transformada em estatuto doutrinário, sobretudo a partir da influência
sacerdotal nos santuários oficiais, especialmente de Jerusalém. A prática dos
sujeitos de fé no cotidiano religioso e cultural, em muitos momentos, provavelmente

3
Êxodo cap. 19 a Números 10.10.
estava em dissintonia com a oficialidade doutrinária. A riqueza de detalhes da
cultura material a partir de escavações arqueológicas em Israel tem evidenciado, por
exemplo, a contraposição entre o ‘dogma’ da ausência de imagens (aniconismo) e a
riqueza de material iconográfico encontrado pela Arqueologia. Isso levou, por
exemplo, o professor Othmar Keel, da Universidade de Freiburg, Suíça, onde está
reunido o maior acervo iconográfico relativo ao Antigo Oriente, a afirmar
categoricamente: “no antigo Israel havia uma profusão de imagens!”.

Sobre a fluidez das fronteiras


A construção do ideal monoteísta se dá em junções e disjunções culturais e
religiosas entre o grupamento denominado ‘Israel’ e grupamentos circunvizinhos,
chamados usualmente de ‘cananeus’. De qualquer forma, o intercâmbio parece ser
relativamente intenso. A síntese monoteísta se construiu a partir da diversidade
cultural e étnica presente no restrito espaço da terra de Israel. Esta síntese, uma vez
constituída, ainda carrega em si traços, fragmentos ou partes indicativas da
diversidade cultural e religiosa existente e intercambiante dos distintos momentos
neste processo formativo.

Sobre a identidade para novos


A síntese teológica, religiosa e cultural condensada nos textos da Bíblia
Hebraica foi construída em meio a situações conflitivas em vários momentos da
história do povo hebreu. Isso sabidamente viria a ser a sina do povo judeu ao longo
de muitos séculos. Os textos sagrados passaram a ser eles mesmos, em sua forma
canônica, o critério norteador da construção identitária dos grupos judaicos ao longo
dos tempos, nos contextos mais distintos, mas, provavelmente, em cada construção
singular novamente a diversidade estava incluída.

Considerações finais
Mediante este texto, o qual sintetizei aquilo que considerei de maior
importância para se entender os princípios do monoteísmo hebraico, entendo que
Reimer oferece-nos possibilidades de realizarmos a leitura do Antigo Testamento de
uma perspectiva histórico-científica muito interessante e abrangente. Do mesmo
modo, numa podemos fazer a releitura numa perspectiva teológica, mas em que
você é obrigado a ponderar e considerar por uma questão de lealdade intelectual os
documentos arqueológicos e históricos. Ao teólogo-cristão, pode não ser tão fácil de
início considerar tais possibilidades, visto que a Escritura tem maior peso em sua
maneira relacionar e julgar os fatos. Considero que Reimer teve muito equilíbrio na
forma como apresentou sua ideia e argumentou cada ponto com precisão não
deixando que os pressupostos se tornassem ponto principal, mas antes, que se
fossem meios de chegar a uma realidade talvez, mais empírica e ao mesmo tempo
usando a própria Escritura como meio de reconstrução. Concluo dizendo que a
própria Escritura deixa em aberto ou sugere a dúvida a respeito do surgimento sólido
do monoteísmo. Conforme escreveu Champlin4:

[...] Pode até ser verdade, conforme dizem muitos teólogos , que a fé
religiosa original dos hebreus fosse henoteísta5, e não monoteísta.
Mas o relato da criação foi escrito em uma época da história de Israel
em que o monoteísmo já estava bem firmado. Seções posteriores do
Antigo Testamento talvez reflitam uma fé religiosa mais primitiva. O
trecho de Dt. 4.7 poderia ser um reflexo do henoteísmo. Outras
nações tinham deuses, mas não defendiam os seus adoradores,
como o Deus dos hebreus fazia em favor deles. Posteriormente todos
outros deus foram tidos por falsos. [...] É inegável que os
antepassados de Abraão eram politeístas 6. Permanece em dúvida
quanto desse politeísmo entrou na vida dos patriarcas. A história dos
ídolos do lar que Raquel ocultou e que, posteriormente Jacó sepultou
antes de voltar à Terra Prometida, indica definidamente um tempo em
que o monoteísmo ainda não havia prevalecido totalmente.

4 CHAMPLIN, Russel Norman, Ph. D. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol. IV. p.347.
HAGNOS.
5 Que ou quem crê num deus supremo, mas sem negar a existência de outros deuses. Ou monolatria.

In Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008/13. Disponível em:


http://www.priberam.pt/dlpo/henote%C3ADsta [acesso em: 03-05-2014].
6 In Bible Trad. João Ferreira de Almeida. Ver Gn 35.2; Js 24.2.

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