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Na terceira estrofe, o sujeito poético expressa indiferença ao mundo real, que é “pobre”,
no sentido de que tudo ao seu entorno carece de sentido. Interessante notar que nem a
natureza o toca. Aqui há três particularidades a observar, nesta ordem: o mundo,
natureza e o sujeito lírico. O mundo pode desabar e, com isso, acabar com a natureza,
pois esta já está morta, não só para ele, mas nele também. Há que se considerar o que
Kristeva (1989), apoiada em Freud, diz: a melancolia narcísica apresenta uma pulsão
(de morte) na desunião com a pulsão de vida.
Ao referir-se a “exílio”, na última estrofe, o eu lírico nos faz pensar que ele não
está em seu lugar de origem, há aí uma perda ou uma inexistência de sua identidade.
Aqui pode-se perguntar: exílio de onde? Qual é o objeto perdido? Aqui, o eu lírico “tem
o sentimento de ser deserdado de [...] alguma coisa irrepresentável, que talvez só uma
[...] invocação pudesse indicar, mas que nenhuma palavra poderia significar”
(KRISTEVA, 1989, p.19). A vida é a prisão, o real, o material. O fim do exílio é passar
ao domínio do sono e do sonho: libertação da matéria, apenas um espírito e seus
sentimentos. É a passagem para um outro estado, onde o espírito é livre do mundo
material, que o eu lírico despreza, e vai-se observando um progressivo abandono do
mundo, estrofe a estrofe. O sujeito chama a morte e pede para ser transportado ao nada
(pois não sabe como é e não pode defini-la), mesmo não tendo certeza do que vai
encontrar... porém fala em dormir novamente e aponta para a esperança de sonho.
Kristeva argumenta que a tristeza, para o melancólico, é o único objeto. Em um caso de
ideação de fim da vida, como no poema de Francisco Otaviano, essa ideação seria uma
reunião com esse impossível sentido, plenitude (em alguns casos amor) que sempre está
em outro lugar, “como as promessas do nada, da morte”.
O início do poema é categórico, com o verso /termina a vida/, mas no último parece que
há uma esperança. Talvez esse eu lírico queira a morte do físico para ingressar em um
plano espiritual e então começar uma vida de verdade. É também a morte da hipocrisia,
do sofrimento, da mediocridade e passagem para um estado superior da consciência,
onde talvez haja esperança (sonho).