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MEMÓRIAS DE GUERRA: A TRANJETÓRIA DA FEB NA 2.

ª GUERRA MUNDIAL

Autor: Ketrim Daiana Mocelin


Orientador: Osvaldo L.Meza Siqueira

INTRODUÇÃO Neste período, o Brasil apresentava um contexto político-social


conturbado, baseado no governo ditatorial de Getúlio Vargas. Nos
A Guerra não é heróica. Não há bandeiras, nem tambores, nem primeiros anos, o país considerou-se neutro em relação à guerra, até
cornetas com toques marciais, nem tampouco heróis condecorados então, apenas européia. Mas com a entrada dos Estados Unidos na
que voltam para casa e beijam a noiva. O que há na guerra é sujeira,
guerra e, os sucessivos ataques alemães à marinha mercante brasileira,
lama, frio, fome, cansaço de noites a fio sem dormir, medo de ser
atacado, sofrimento e monotonia, esses problemas de todas as o Brasil declarou guerra à Alemanha, e entrou no conflito do lado dos
guerras. A monotonia de cavar uma trincheira e ficar escutando países aliados.
aqueles ruídos ensurdecedores, que não param nunca.
Mas a formação da Força Expedicionária Brasileira encontrou
diversas dificuldades de ordem política, social, econômica e até mesmo
(Joaquim Xavier de Silveira – ex-pracinha brasileiro).
militar. Contando com aproximadamente vinte e cinco mil soldados, a
tropa brasileira foi composta por soldados vindos, na maioria dos casos,
das classes mais baixas da sociedade, com pouco ou nenhum grau de
instrução. A FEB recebeu equipamentos e treinamentos totalmente
A Segunda Guerra Mundial foi um dos maiores conflitos armados deficientes e defasados em relação ao o que lhes esperava nos campos
de todos os tempos e, uma das maiores catástrofes que a humanidade de batalha.
já presenciou. Teve sua origem nas ideologias fascistas, nos governos O resultado disso foram as inúmeras dificuldades e adversidades
totalitários, principalmente na Alemanha nazista de Adolf Hitler. Teve encontradas pelos soldados brasileiros no front italiano. A FEB aprendeu
início em 1939, terminando em 1945 com a derrota dos países do Eixo a lutar nos campos de batalha, em contato direto com o inimigo. Mas, a
para os países Aliados. Envolveu direta e indiretamente, nações dos Força Expedicionária Brasileira venceu os obstáculos e surpreendeu os
cinco continentes do mundo e contou com a participação das maiores aliados e até mesmo os inimigos, cumprindo sua missão e, contribuindo
potências econômicas da época. para a vitória dos países Aliados.

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Mas os combatentes da FEB não encontraram reconhecimento Ao se utilizar dos autores já citados e ainda de alguns outros
no seu próprio país. Apesar de terem sido recebidos com grandes referenciados posteriormente, pretende-se fazer aqui uma construção
comemorações, posteriormente enfrentaram anos de dificuldades até de uma nova análise, baseada em narrativas, relatos e memórias
serem reconhecidos pelo governo, pela sociedade e até mesmo pelo de veteranos da FEB, sendo eles publicados por ex-combatentes,
Exército. Sua reintegração social foi lenta e sofrida, e apenas décadas correspondentes de guerra, oficiais, e até mesmo por enfermeiras.
após a volta foram recompensados pelo governo, recebendo enfim, as Tendo além destes, relatos obtidos pessoalmente em entrevistas, todas
pensões que lhes eram de direito. realizadas com ex-combatentes curitibanos em um encontro no Museu
Atualmente, passados mais de sessenta anos do fim da guerra, do Expedicionário.
nossos pracinhas são devidamente reconhecidos pela sociedade, sendo De acordo com o objetivo proposto, inicialmente será apresentado
constantemente relembrados e homenageados pela população e pelo no primeiro capítulo uma abordagem geral do contexto internacional, da
Exército, que hoje ostenta grande orgulho dos feitos da FEB no Teatro situação política e econômica européia, do surgimento dos fascismos,
de Operações Europeu. dos motivos que levaram à eclosão da Segunda Guerra Mundial,
Baseado nas obras “A Era dos Extremos”, de Eric Hobsbawm de suas fases, até seu término e suas conseqüências. Também será
(HOBSBAWM, 2001); e “O Século XX”, de René Rémond (RÉMOND, 1974), contextualizado o período brasileiro, retratando sua política e sua
que abordam sobre o contexto internacional da Segunda Guerra Mundial, entrada na guerra, finalizando com a formação da Força Expedicionária
analisa-se as causas e conseqüências desta na sociedade mundial, da eclosão Brasileira.
até seu término, abordando os principais eventos da guerra e suas fases. No capítulo seguinte será apresentada a participação da FEB no
Em “A Força Expedicionária Brasileira e os seus veteranos”, trabalho Teatro de Operações italiano: suas primeiras dificuldades superadas,
de conclusão de curso de Renato Eickhoff (EICKHOFF, 2005), apresenta- suas conquistas, até o fim da guerra e reintegração social posteriores,
se uma análise geral do contexto nacional e da criação e participação da sempre acompanhadas das memórias e lembranças dos pracinhas
FEB na Segunda Guerra Mundial, abordando a trajetória e a vida dos brasileiros.
pracinhas durante e no pós-guerra.
Tendo como referência o artigo “Memória e Identidade Social” de
Michael Pollak (POLLAK, 1992), que trabalha a questão das histórias
de vida e como inseri-las numa escrita histórica, será traçada a
trajetória dos pracinhas brasileiros, através de seus relatos e memórias,
reconstituindo a participação brasileira na guerra através da ótica dos
ex-combatentes.

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1. SEGUNDA GUERRA MUNDIAL Assim, estes foram os principais aspectos que marcaram as grandes
guerras mundiais, em especial a Primeira, ocorrida entre 1914 a 1918,
que resultou na firmação do Tratado de Versalhes em junho de 1919, onde
1.1. CONTEXTO INTERNACIONAL
“as potências vitoriosas buscaram desesperadamente o tipo de acordo
De todas as guerras e conflitos já ocorridos até hoje, as duas de paz que tornasse impossível outra guerra como a que acabara de
grandes guerras do século XX foram as que mais causaram impacto em devastar o mundo e que cujos efeitos retardados estavam em toda parte.”
toda humanidade. Destas sobrou um novo mundo marcado pela herança (HOBSBAWM, 2001, p. 39). Neste tratado, a Alemanha foi acusada
da ambição de alguns, e pelo sacrifício de muitos. E o resultado é o início como a única responsável pela eclosão da Primeira Guerra Mundial, tendo
de uma nova época que traz em sua história, lembranças de conflitos que pagar uma alta indenização e, tendo ainda, seu território reduzido
que deixaram um legado de mudanças tanto sociais e culturais, quanto e suas forças armadas restringidas. O Tratado de Versalhes revelaria
político e econômicas. posteriormente o grande descontentamento dos germânicos em relação
Além disso, foram os primeiros conflitos em toda história que às suas cláusulas, uma vez que estes foram os principais responsáveis
ultrapassaram o número de países envolvidos e os limites geográficos pelo segundo conflito vinte anos mais tarde. Em termos, pode-se dizer que
até hoje1. E mais, a humanidade se deparou com as tristes conseqüências “a Segunda Guerra Mundial nasceu das vitórias na primeira, e da forma
que a moderna tecnologia trouxe para os campos de batalha: matava-se pela qual foram usadas.”(TAYLOR, 1979, p. 40).
qualquer um, o inimigo não tinha rosto, nome ou identidade, era apenas Após 1918, com o término da Primeira Guerra Mundial, a Europa
um alvo. É o que afirma HOBSBAWM: passou a viver um período tenso e de uma paz relativamente frágil, pois,
a situação mundial criada se apresentava muito instável. As seqüelas
Outro motivo, porém, era a nova impessoalidade da guerra, que tornava
o matar e estropiar uma conseqüência remota de apertar um botão ou
deixadas pela guerra eram inúmeras, nem mesmo os tratados assinados
virar uma alavanca. A tecnologia tornava suas vítimas invisíveis, como entre os países envolvidos haviam resolvido o problema, ao contrário, muitas
não podiam fazer as pessoas evisceradas por baionetas ou vistas vezes havia agravado a situação, como era o caso do Tratado de Versalhes2.
pelas miras de armas de fogo. (HOBSBAWM, 2001, p. 57).
“De um momento para outro, os diplomatas viram-se às voltas com todo um
Dessa maneira, surgia a nova arte de se fazer a guerra: eram conjunto de dificuldades internacionais.”(RÉMOND, 1974, p. 45). De um
soldados que ficavam horas e dias a fio empilhados em trincheiras, lado estavam as fronteiras européias que continuavam indefinidas, gerando
munidos de bombas, granadas e de armas, que os tornavam capazes vários conflitos; e do outro, o eminente fracasso da Liga das Nações3.
de matar dezenas em questão de segundos. “Contudo, todos esses A crise econômica da década de 1920 tornou a situação ainda mais
fenômenos pertencem apenas às guerras do século XX.” (HOBSBAWM, delicada, aumentando o desemprego e diminuindo os empréstimos
2001, p.51). internacionais.

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Talvez a guerra seguinte pudesse ter sido evitada, ou pelo menos dilapidam os resultados, ou ainda contra as ameaças que pesam
adiada, se houvesse sido restaurada a economia pré-guerra como sobre a segurança ou integridade nacionais. Aí está a razão porque o
um sistema global de próspero crescimento e expansão econômica. fascismo encontrou seu meio de eleição no país vencido: na Alemanha
Contudo, após uns poucos anos, em meados da década de 1920, nos [...]. É a lenda da punhalada pelas costas: o exército alemão não
quais se pareceu ter deixado para trás a guerra e a perturbação pós- foi vencido, foi traído em casa; a cumplicidade dos socialistas,
guerra, a economia mundial mergulhou na maior e mais dramática dos comunistas e dos judeus com os aliados do Oeste desarmou
crise que conhecera desde a Revolução Industrial. (HOBSBAWM, a Alemanha. Nacionalistas vigilantes, constantemente atentos, os
2001, p. 43). fascistas caracterizam-se por uma reação de inquietude permanente,
e a palavra de ordem, “Alemanha, desperta!”, é retomada como eco
“Para acabar de descrever a situação e medir-lhe a gravidade, é em outros países. (RÉMOND, 1974, p. 94).
preciso dizer uma palavra sobre a grande crise econômica que sacode, a
partir de 1929, as estruturas econômicas, sociais, intelectuais e políticas Os ideais fascistas ganharam força com a crise das democracias,
da democracia ocidental.”(RÉMOND, 1974, p. 68). A queda da Bolsa que haviam enfraquecido na Europa após o término da Primeira Guerra e
de Nova York teve uma enorme repercussão nos setores da economia com a crise da Bolsa, nos Estados Unidos. Muitos países viram no regime
norte-americana e de vários outros países. Muitas empresas e bancos fascista a chance de se reerguer. Com isso, o fascismo se tornou grande
abriram falência, e a principal conseqüência de todas foi o alto índice de parte responsável pelo acontecimento da guerra que viria a acontecer
desemprego. A crise da Bolsa significou, definitivamente, o choque do poucos anos mais tarde.
capitalismo. “Daí em diante, uma nova guerra mundial era não apenas
A guerra procede do fascismo de várias maneiras. Decorre de sua
previsível, mas rotineiramente prevista. Os que atingiram a idade adulta doutrina e das forças que desencadeia, dos sentimentos para os
na década de 1930 a esperavam.”(HOBSBAWM, 2001, p. 43). quais apela: exaltação da aventura, predispõe os espíritos a desejar
a guerra, que o próprio fascismo prepara, empreendendo um esforço
E em meio à crise do capitalismo e das democracias liberais, que militar considerável. Inflam-se os orçamentos de guerra. Toda a
surgiu uma nova linha de força: o fascismo. Criado na Itália no ano nação pega em armas. Mussolini se envaidece dos oito milhões de
baionetas que é capaz de reunir da noite para o dia, de um momento
de 1922, por Benito Mussolini, o fascismo teve papel importante
para outro. Hitler fala menos sobre o assunto, mas pensa tanto
no contexto dos anos que antecederam a Segunda Guerra Mundial, quanto o outro. O fascismo italiano e o nacional-socialismo alemão
durando até o final desta, em 1945. Ganhou vários simpatizantes pela ordenam toda a economia visando à preparação da guerra, dirigindo-a
e planificando-a em função da estratégia. O plano de quatro anos, à
Europa, principalmente nos países que demonstraram uma reação de cuja frente se coloca Goering, tem por finalidade duplicar os recursos
nacionalismo ferido, de insatisfação. Esta situação mostrou-se no e forças produtivas da Alemanha. (RÉMOND, 1974, p. 105).
nascimento do nazismo alemão.
A ascensão do fascismo na Europa se concretizou em janeiro de
[...] nacionalismo ferido, vencido ou inquieto, conforme as 1933, quando Hitler foi nomeado chanceler pelo presidente Hindenburg.
circunstâncias, contra a humilhação da derrota ou, entre os
vencedores, contra o desperdício da vitória e os governos que lhe O intuito era de garantir maioria no Reichstag (Parlamento Alemão), e

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com isso encerrar os quatro anos de governo por decretos presidenciais. respeito dos acordos diplomáticos. Em março de 1935, Hitler anuncia
que a Alemanha reconstituiu sua aviação militar e restabelece o
A nomeação de Hitler era estritamente uma questão democrática, jamais
serviço militar obrigatório: ao mesmo tempo, as cláusulas militares
imaginaram que ele tomaria o poder e faria grandes transformações. É o do Tratado de Versalhes são ab-rogadas.[...] Recomeça na Europa a
que afirma A. J. P. TAYLOR: corrida aos armamentos. (RÉMOND, 1974, p. 110).

Não se esperava que fizesse modificações revolucionárias nos assuntos A política de Hitler estava baseada em conquistas e aumentos
internos ou externos. Pelo contrário, os políticos conservadores
territoriais, que acabaram por provocar graves crises entre os anos de
liderados por Papen, que os recomendaram a Hindenburg, reservaram
para si os postos-chave e esperavam que Hitler fosse apenas um chefe 1934 a 1939.
nominal. Essa esperança foi ilusória. Hitler rompeu os laços artificiais
que deviam prendê-lo e aos poucos se tornou um ditador todo-poderoso A princípio, as ambições confessadas do Terceiro Reich são limitadas:
– embora mais lentamente do que reza a lenda. Modificou a maioria cifram-se, em reassociar ao Reich, as minorias de mesma língua
das coisas na Alemanha. Destruiu a liberdade política e o império da e mesma raça, destacadas da Alemanha sob coação, e que vivem
lei; transformou a economia e as finanças alemãs; desafiou as Igrejas; separadas territorialmente, sujeitas a dominações estrangeiras.
aboliu os Estados separados e fez da Alemanha, pela primeira vez, um Mas essas reivindicações ameaçam todos os Estados vizinhos, que
país unido. Numa única esfera não realizou modificações. Sua política compreendem minorias de língua ou raça germânica: a Áustria, a
externa foi a de seus predecessores e, realmente, a de quase todos Tchecoslováquia, a Polônia e a própria França por causa da Alsácia.
os alemães. Também Hitler queria libertar a Alemanha das restrições (RÉMOND, 1974, p. 110).
do tratado de paz, restaurar um grande exército alemão e fazer da
Alemanha a maior potência na Europa, com suas condições naturais. Em janeiro de 1935, o território do Sarre foi reintegrado à Alemanha,
(TAYLOR, 1979, p. 87).
significando um importante passo para a política nazista. No mesmo ano
Logo após assumir o poder, Hitler instalou uma ditadura totalitarista, a Itália, que ainda pertencia ao grupo de vencedores da Primeira Guerra,
empreendendo uma transformação na economia e na sociedade. rompeu relações com a Inglaterra e voltou-se para a Alemanha, formando
“Mobilizam-se as energias, executa-se um programa de grandes o Eixo Roma-Berlim. “Essa inversão das alianças cujas conseqüências
obras públicas, dá-se trabalho aos desempregados, precipita-se o serão incalculáveis, opera-se por ocasião da política italiana de aventura
rearmamento.” (RÉMOND, 1974, p. 109-110). As cláusulas militares e expansão colonial na África.” (RÉMOND, 1974, p. 112).
do Tratado de Versalhes são revogadas e a Alemanha se retira da Liga E não demorou muito para que os planos de Mussolini se
das Nações. Em 1935, Hitler restabeleceu o serviço militar obrigatório, concretizassem: em 1936, a Itália invadiu e conquistou a Etiópia. A Liga
elevando consideravelmente o número de efetivos da Wehrmacht (força das Nações tentou intervir, mas a essas alturas era tarde demais, pois,
de defesa) e ainda criou a Luftwaffe (força aérea). Alemanha e Itália já haviam desenvolvido uma política adversa aos ideais
da França e Inglaterra. A partir de então, a seqüência dos fatos remeteu
Desde outubro de 1933, a Alemanha abandona a conferência
do desarmamento. É o fim da política fundada na assinatura e no cada vez mais ao inevitável: a eclosão da Segunda Guerra Mundial.

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Diante da fraqueza demonstrada pelo inimigo e do fim do seu Chegou a vez da Tchecoslováquia: Hitler queria anexar a região
isolamento, a Alemanha começou a agir. Em 1936, Hitler reocupou dos Sudetos ao Reich, onde residiam três milhões de alemães. A
a margem esquerda do Reno tomando as cidades de Palatinado e Inglaterra tentou intervir, mas se tornou necessário a convocação de
Renânia. “É um acontecimento grave, que coloca o governo francês uma conferência para resolver o assunto. Assim, França, Inglaterra,
diante de um sério dilema: aceitar ou reagir.”(RÉMOND, 1974, p. 114). Alemanha e Itália decidiram, através do Tratado de Munique, que a
A princípio, a França prometeu uma solução, mas nada aconteceu. E região dos Sudetos seria anexada à Alemanha, uma vez que esta se
a conseqüência maior é a ruína final da Liga das Nações, que estava comprometesse em cessar as invasões. Considerada por muitos como
sobre proteção francesa4. “A Alemanha deixara-a em 1933, o Japão uma atitude de fraqueza, o Tratado de Munique foi quebrado pelos
no mesmo ano, a Itália a abandona em 1937. É o fim da segurança alemães em 1939, quando invadiram o restante da Tchecoslováquia. No
coletiva.”(RÉMOND, 1974, p. 114). Logo após, a Alemanha assinou mesmo ano, a Alemanha e a União Soviética assinaram um pacto de não-
um pacto com o Japão, formando, o que viria a ser chamado mais tarde agressão, no qual, Stálin garantia neutralidade no caso de uma invasão
de Eixo Berlim-Roma-Tóquio. alemã à Polônia.
Em 1936, estoura a Guerra Civil Espanhola, onde os dois blocos Diante de todos esses acontecimentos, a eclosão da Segunda
contrários se defrontam pela primeira vez e realizam grandes manobras5. Guerra Mundial em 1939 foi inevitável.
A Alemanha testa seu potencial militar destruindo várias cidades e
Apesar disso, fosse qual fosse a instabilidade da paz pós-1918 e a
matando milhares de civis, enquanto a França e a Inglaterra preferem probabilidade de seu colapso, é bastante inegável que o que causou
não intervir. A guerra civil só terminará em 1939, com o triunfo dos concretamente a Segunda Guerra Mundial foi a agressão pelas três
potências descontentes, ligadas por vários tratados desde meados
nacionalistas e a vitória do general Franco. A Guerra da Espanha serviu da década de 1930. Os marcos miliários na estrada para a guerra
aos alemães como um treinamento para a Segunda Guerra Mundial. foram a invasão da Manchúria pelo Japão em 1931; a invasão da
Etiópia pelos italianos em 1935; a intervenção alemã e italiana na
Com todos esses acontecimentos, os EUA continuavam isolados para
Guerra Civil Espanhola em 1936-9; a invasão alemã da Áustria
evitar um novo envolvimento, como o de 1917. Em 1937, o Congresso no início de 1938; o estropiamento posterior da Tchecoslováquia
estabeleceu leis de neutralidade, suspendendo as relações comerciais pela Alemanha no mesmo ano; a ocupação alemã do que restava
da Tchecoslováquia em março de 1939 (seguida pela ocupação
com os países beligerantes. Assegurado da não ação dos inimigos, Hitler, italiana da Albânia); e as exigências alemãs à Polônia que levaram
apoiado pela Itália, atacou e anexou a Áustria à Alemanha em 1938. de fato ao início da guerra. Alternativamente, podemos contar esses
“A Europa não reagiu. A Itália [...] agora é cúmplice, e Hitler dirige a marcos miliários de um modo negativo: a não-ação da Liga contra o
Japão; a não-tomada de medidas efetivas contra a Itália em 1935;
Mussolini um telegrama em que lhe promete jamais esquecer a dívida a não-reação de Grã-Bretanha e França à denúncia unilateral alemã
que contraiu para com ele. A Inglaterra hesita. A França é sacudida por do Tratado de Versalhes, e notadamente a reocupação alemã da
Renânia em 1936; a recusa de Grã-Bretanha e França a intervir na
uma crise ministerial.”(RÉMOND, 1974, p. 117).

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Guerra Civil Espanhola (“não-intervenção”); a não-reação destas à Winston Churchill e baseada na total recusa a qualquer tipo de acordo
ocupação da Áustria; o recuo delas diante da chantagem alemã sobre
com Hitler.”(HOBSBAWM, 2001, p. 46).
a Tchecoslováquia (o “Acordo de Munique” de 1938); e a recusa da
URSS a continuar opondo-se a Hitler em 1939 (o pacto Hitler-Stálin Em seguida, os alemães invadiram a Inglaterra, porém, foram
de agosto de 1939). (HOBSBAWM, 2001, p. 44-45). repelidos pelos esquadrões de caça ingleses6. Mas os alemães não
se deram por vencidos e contando com o apoio da Itália, invadiram
E o estopim que faltava para a eclosão da guerra se deu a 1º de
os Balcãs, o Oriente Médio e a África. Nesse momento, o Japão que
setembro de 1939, quando o exército alemão lançou uma forte ofensiva
também tinha o objetivo de investir em uma política expansionista, se
surpresa contra a Polônia, esmagando seu exército por completo. Em
aliou a Hitler, obtendo inúmeras vitórias na Ásia e na Oceania. “Dessa
apenas um mês, Varsóvia havia sido totalmente ocupada pelos nazistas.
maneira, é sempre por iniciativa do Eixo que a guerra se estende a novos
A Blitzkrieg (guerra-relâmpago) dos alemães foi um sucesso. França e
setores.” (RÉMOND, 1974, p. 123).
Inglaterra responderam:
Mas o destino da guerra começou a mudar quando a Alemanha invadiu
[...] não havia saída. A 3 de setembro, a Grã-Bretanha e a França a URSS em 22 de junho de 1941. É provável que Stálin havia sido alertado
declararam guerra à Alemanha. Na mesma noite, às 9 horas, o
submarino alemão U-30 torpedeou e afundou o navio de passageiros pelo serviço de espionagem soviético, porém, resolveu acreditar no pacto
britânico Athenia a uns 320 quilômetros a oeste das Ilhas Hébridas; que havia firmado com os alemães, não acreditando na invasão.
112 vidas se perderam... A guerra começara. (SHIRER, 1965, p.7)
Mas para Hitler a conquista de um vasto território oriental, rico em
Apesar de declarar guerra à Alemanha, os Aliados permaneciam recursos e trabalho escravo, era o próximo passo lógico, e, como
todos os outros especialistas militares, com exceção dos japoneses,
imóveis, “o povo das ruas, na Alemanha, começava a chamar aquilo de ele subestimou espetacularmente a capacidade soviética de resistir.
‘guerra sentada’- sitzkrieg.”(SHIRER, 1965, p.10). Seis meses após a (HOBSBAWM, 2001, p.47).
queda da Polônia, os exércitos alemães avançavam pela Europa:
Graças à invasão surpresa, a URSS entrou na guerra do lado dos
Na primavera de 1940, a Alemanha levou de roldão a Noruega,
Aliados e teve importante participação na vitória posterior. Pois, “uma
Dinamarca, Países Baixos, Bélgica e França com ridícula facilidade,
ocupando os quatro primeiros países e dividindo a França numa zona vez que a guerra russa não se decidira em três semanas, como Hitler
diretamente ocupada e administrada pelos alemães vitoriosos, e num esperava, a Alemanha estava perdida, pois não estava equipada nem
‘Estado’ satélite francês [...], com capital num balneário provinciano,
Vichy. (HOBSBAWM, 2001, p.46). podia agüentar uma guerra longa.”(HOBSBAWM, 2001, p.47).
E com isso, praticamente encerra-se a extensão da guerra na Europa.
O exército de Hitler chegou praticamente sem resistência em Paris
A fase européia da extensão do conflito está, então, mais ou menos
em 14 de junho de 1940. “Só restou em guerra com a Alemanha a Grã- concluída. Só ficaram fora da guerra a Suécia, a Suíça, a Espanha,
Bretanha, sob uma colisão de todas as forças nacionais, chefiada por Portugal e a Turquia, ou seja, excetuando-se a Suíça, países situados

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na periferia do continente, e que convém mais aos beligerantes deixar Stalingrado pelas tropas inimigas. A partir de então, foram recuando à
em situação de expectativa do que transformar em adversários.
medida que as tropas soviéticas avançavam e os expulsavam de seu
(RÉMOND, 1974, p. 124).
território, na qual resultaria a tomada de Berlim posteriormente. “De
E finalmente a guerra passaria a ser mundial em 7 de dezembro de Stalingrado em diante, todo mundo sabia que a derrota da Alemanha era
1941, quando o Japão decidiu atacar a frota americana do Pacífico em só uma questão de tempo.”(HOBSBAWM, 2001, p. 47). Na África, os
Pearl Harbor, no Havaí, considerada por muitos, como a base naval mais alemães foram expulsos pelos britânicos; e na Ásia, os chineses resistiam
bem defendida do mundo. E embora já fosse do desejo do presidente aos japoneses, enquanto os americanos conquistavam uma ilha após a
Roosevelt entrar no conflito anteriormente, com o ataque a Pearl Harbor, outra. Do fim de 1942 em diante, já não havia mais dúvidas do qual lado
não houve mais nenhuma oposição. Então, poucos dias depois, os venceria a guerra.
Estados Unidos declarava guerra ao Japão.
O momento decisivo, aquele em que a preamar das potências
ditatoriais começa a refluir, situa-se entre novembro de 1942 e
Juntaram-se os dois conflitos, até então separados por toda a massa
fevereiro de 1943. Interrompe-se, nessa época, a série praticamente
do antigo continente: o conflito extremo-oriental, iniciado em 1932,
ininterrupta de êxitos militares conseguidos pelo Eixo desde setembro
com a conquista da Manchúria, e desenvolvido em 1937 com o
de 1939. O revés de Rommel diante de El-Alamein, a frente rompida
ataque do Japão à China, reúne-se ao conflito que, na Europa, opõe
na Tripolitânia, o desembarque anglo-norte-americano na África do
as democracias ocidentais à Alemanha e à Itália, e a União Soviética
Norte, a vitória de Stalingrado, a batalha aeronaval do Mar de Coral
à Alemanha. Dois blocos estão em luta: a Alemanha, a Itália e o
ocorrem nesses três meses e indicam a inversão da tendência. A
Japão com seus aliados, contra as grandes democracias ocidentais
partir de então, a derrota do Eixo passa a ser uma possibilidade
e a União Soviética. A partir de então, a guerra pode considerar-se,
razoável. (RÉMOND, 1974, p. 125).
efetivamente, planetária. Todos os continentes são arrastados a ela,
e as operações levadas a efeito simultaneamente no Atlântico e no
Pacífico.(RÉMOND, 1974, p. 124). A Alemanha ainda fez uma última tentativa contra a União Soviética,
mas teve suas tropas dizimadas pelo Exército Vermelho, episódio que
Foi devido ao embargo americano ao comércio japonês e ao ficou conhecido como a Batalha de Kursk, uma das mais gigantesca e bem
congelamento dos seus bens, que o Japão resolveu atacar a marinha equipada batalha da Segunda Guerra Mundial. O próximo e decisivo passo,
dos EUA, mas “a jogada que fez era perigosa, e revelou-se suicida. [...] que ficou conhecido como o Dia D, aconteceu no dia 6 de junho de 1944,
não havia como o Japão vencer essa guerra.”(HOBSBAWM, 2001, p. onde as forças aliadas reuniram um exército com mais de cento e cinqüenta
48). Logo após o ataque japonês à Pearl Harbor, a Alemanha também mil soldados americanos, ingleses e canadenses, com o intuito de invadir
declarou estado de beligerância contra os EUA. a Normandia, na França. A vitória aliada foi conquistada a duras penas,
O verão do ano de 1942 foi marcado pelo auge das conquistas dos lhe custando muitas vidas. E em 25 de agosto, com a ajuda do general De
países do Eixo. A Alemanha avançou pela União Soviética e conquistou Gaulle e das tropas francesas, os Aliados conseguiram libertar Paris.
algumas importantes cidades nesse período, mas foi detida em

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Em fins de 1944, já era evidente que, decorrido pouco tempo, a brutalmente assassinados nos campos de concentração nazistas7.
Alemanha estaria prostrada, um montão de entulho, aos pés dos
Também se estima que as perdas militares dos países aliados chegaram
vencedores. Que fariam dela? Em fevereiro de 1945, em Ialta, ficou
resolvido que, após a rendição, a dividiriam em quatro zonas. A Grã- aos 16 milhões, e dos países do Eixo, em 7 milhões; somando um total de
Bretanha, a Rússia, a França e os Estados Unidos teriam cada qual 23 milhões de soldados mortos. Mas, as baixas civis nos países atingidos
uma zona, até que fosse assentada uma solução final. (FLYNN,
1965, p. 499). são ainda mais assustadoras: cerca de 36 milhões de vítimas. Conclusão:
aproximadamente 60 milhões de vidas foram tiradas no maior conflito do
Foi assim que aconteceu, em janeiro de 1945, o encontro de século XX.
Churchill, Roosevelt e Stálin em Ialta, na Ucrânia. O intuito era resolver
Suas perdas são literalmente incalculáveis, e mesmo estimativas
como a Europa ficaria no pós-guerra. Também se discutiu a criação da aproximadas se mostram impossíveis, pois a guerra (ao contrário
Organização das Nações Unidas (ONU). da Primeira Guerra Mundial) matou tão prontamente civis quanto
pessoas de uniforme, e grande parte da pior matança se deu em
A guerra na Europa terminou com a invasão soviética em Berlim, no
regiões, ou momentos, em que não havia ninguém a postos para
dia 7 de maio de 1945. Milhares de civis e militares foram massacrados contar, ou se importar. As mortes diretamente por essa guerra foram
e a cidade destruída. Não havendo mais chances, Hitler se suicidou. estimadas entre três e quatro vezes o número (estimado) da Primeira
Guerra Mundial [...]. Em 1959, ainda havia na URSS sete mulheres
Porém, o primeiro país do Eixo a cair foi a Itália, que em 1943 foi invadida entre as idades de 35 e 50 anos para cada quatro homens. Os prédios
pelos Aliados. Neste mesmo ano, Mussolini foi destituído do poder, e em podiam ser mais facilmente reconstruídos após essa guerra do que
as vidas dos sobreviventes.(HOBSBAWM, 2001, p. 51).
28 de abril de 1945, foi fuzilado por guerrilheiros italianos. “Sua morte foi
tão inglória quanto o foram as conquistas da nova Itália que ele desejou
A Segunda Guerra Mundial só deixou de herança, um futuro cheio
criar.” (KENT, 1965, p. 382).
de traumas, refletidos estes, na vasta destruição e na certeza de uma
Na Ásia, a guerra terminou com o bombardeio atômico em Hiroshima
reconstrução lenta e trabalhosa. “A tarefa de reconstrução surge,
em 6 de agosto e em Nagasaki, no dia 9. As duas bombas atômicas
portanto, em 1945, muito mais vasta e muito mais difícil do que um
causaram mais de 300 mil mortes instantaneamente, e um número
quarto de século antes.” (RÉMOND, 1974, p. 130).
indeterminado de vítimas devido à contaminação radioativa. Não
Com o término da guerra, o regime democrático que anteriormente
havendo mais saída, o Japão se rendeu em 15 de agosto de 1945.
havia entrado em crise, volta a se estabelecer nas instituições
Chegava então, o fim da Segunda Guerra Mundial. “A vitória em 1945
internacionais.
foi total, a rendição incondicional. Os Estados inimigos derrotados foram
totalmente ocupados pelos vencedores.” (HOBSBAWM, 2001, p. 49). A democracia parece assim duradouramente estabelecida nas
instituições internacionais. Pode-se ter em 1945 o sentimento
E o que restou foram as milhares de mortes ao longo desses seis
justificado de que o fim da Segunda Guerra Mundial assinala o triunfo
anos, dentre elas, mais de 6 milhões de judeus, vítimas do holocausto, da democracia em toda a terra. Em cada país, o poder é exercido por

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forças democráticas e, no mundo, o acordo dos cinco grandes Aliados trabalhista brasileira. A cargo disto, sua política ficou conhecida como
parece dever preservar a paz. É a mesma constatação feita em 1920,
“populismo”. “A partir de 1940, o poder de Getúlio foi consolidado por um
mas com uma diferença: todos agora imaginam haver entendido as
lições da experiência. Todas as condições institucionais, políticas e verdadeiro culto à personalidade e pela construção de imagens idealizadas
psicológicas parecem reunidas para preservar a liberdade e a paz. a seu respeito, como a de ‘pai dos pobres’.”(BRANDI, 1983, p. 143).
Ora, menos de dois anos depois, os vencedores estão desunidos; o
termo “desunidos” é até fraco para caracterizar a situação de 1947. A ditadura de Vargas combateu severamente a AIB (Ação Integralista
Dois blocos hostis se defrontam numa forma de guerra inédita para a Brasileira)10 e o PCB (Partido Comunista Brasileiro)11, fechando estes e
qual é forçoso inventar um nome ou, mais exatamente, uma imagem,
os demais partidos políticos através de um decreto presidencial. Também
a de guerra fria. A situação de 1947 é totalmente diversa da que o
mundo esperava em 1945. (RÉMOND, 1974, p. 142). suprimiu a independência entre os três poderes (legislativo, judiciário e
executivo) e o próprio federalismo existente no país. A partir de então, os
prefeitos eram nomeados pelos governadores e estes, pelo presidente.
1.2. O Brasil e a segunda guerra
A repressão getulista, a cargo de sua polícia política, atingiu não apenas
No momento em que acontecia a Segunda Guerra Mundial na os comunistas ou os liberais, mas também aqueles que advogavam uma
ideologia semelhante à do novo regime e supunham ser seus aliados:
Europa, o Brasil vivia a ditadura do Estado Novo, sob o comando do
os integralistas. Foi assim que, junto com os demais partidos políticos,
presidente Getúlio Vargas, o qual já vinha se mantendo no poder desde a Aliança Integralista Brasileira foi fechada por decreto presidencial.
o golpe de 19308. Em reação, seria deflagrado o levante integralista em maio de 1938,
logo desbaratado. Não havia mais, portanto, liberdade de expressão e
Após passar pelo governo provisório (1930-1934) e pelo governo de reunião, inexistiam os partidos políticos, o congresso fora fechado
constitucional (1934-1937), apoiado por militares e pela população, e os poderes legislativo e judiciário relegados a segundo plano, ao
passo que o executivo se fortalecia ao sabor das cinzas da queima
Getúlio Vargas derrubou a constituição e, declarou o Estado Novo
das bandeiras dos estados da nação, simbolizando o fim da autonomia
(1937-1945). federativa. (EICKHOFF, 2005, p. 5).

Com o advento do Estado Novo em novembro de 1937, Vargas passou


a governar com poderes ditatoriais, iniciando oito anos de domínio
O Estado Novo foi marcado pela expansão industrial e pelo
incontrastável. Getúlio tornou-se de fato o centro político do Estado crescimento das exportações nacionais. “O país apresentava uma
Novo, mais ainda do que o fora como chefe do Governo Provisório, estrutura agrária, com o café respondendo por 70% das exportações e
após a Revolução de 1930, e como presidente constitucional, a partir
de 1934. (BRANDI, 1983, p. 123). 60% dos seus quase 40 milhões de habitantes vivendo em áreas rurais”.
(EICKHOFF, 2005, p. 5).
Apesar de seu severo regime ditatorial, Vargas adotou novos métodos
É justamente esse trabalho do homem do campo, o conjunto das
de modernização9 que beneficiaram a população brasileira, criando ainda atividades de todas as classes rurais, que representa o nervo da
a Lei da Sindicalização, a qual representou grandes avanços na legislação nossa vida econômica e assegura a estabilidade de sua situação. De

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fato, a agricultura, a pecuária e a indústria extrativa constituem a O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) criado em
base da nossa riqueza, e tudo indica que continuará sendo assim dezembro de 1939 foi o principal responsável pela legitimação de
por alguns anos ainda. Na estatística da exportação brasileira, Vargas e do Estado Novo perante a opinião pública. Com maior
em períodos normais de comércio mundial, os produtos agrícolas, amplitude de ação que o Departamento Nacional de Propaganda, o
pecuários e extrativos sempre figuram em situação de absoluto DIP, dirigido por Lourival Fontes, tornou-se porta-voz autorizado do
predomínio. Por outro lado, depende da agropecuária o fornecimento regime e o órgão coercitivo máximo da liberdade de pensamento e
do mercado interno, cuja ascendência cada vez mais se acentua na expressão até 1945. O DIP passou a organizar homenagens a Vargas,
economia nacional. Demonstram esses fatos, claramente, não caber tornando-se instrumento de promoção pessoal do chefe do governo,
aos centros urbanos o principal papel na vida do país. Ao contrário, de sua família e das autoridades em geral. Entre outras funções, o
os campos representam a parte essencial, o que veio reclamar DIP deveria centralizar e coordenar a propaganda do governo e dos
do Presidente Getúlio Vargas um firme propósito de favorecer a ministérios, exercer a censura do teatro, do cinema, das atividades
agricultura e a pecuária, com assistência técnica e com medidas tais recreativas e esportivas, da literatura social e política e da imprensa,
que permitissem aos dois elementos – terra e homem – aumentar promover e patrocinar manifestações cívicas e festas populares, e,
a prosperidade econômica do país pela intensificação e pelo finalmente, organizar e dirigir o programa de radiodifusão oficial do
melhoramento da produção. (SCHWARTZMAN, 1982, p. 475-476). governo. (BRANDI, 1983, p.141).

A maioria da classe dominante apoiava a ditadura, como por exemplo, Não poderiam ser publicadas quaisquer notícias, antes de serem
a burguesia industrial e as oligarquias latifundiárias, pois, se beneficiavam previamente redigidas pelo DIP. Até mesmo notícias de greves ou prisões,
com a política de Vargas. Também contou com o apoio da classe média ou simples informações de caráter policial, eram censuradas.
urbana que, por ser conservadora, concordava com a repressão aos E foi nesse contexto, que o Brasil se declarou como um país neutro
comunistas e, que também fora beneficiada com a ampliação de nos primeiros anos da Segunda Guerra Mundial, apesar da grande
empregos. O alto comando do Exército também apoiava Vargas, uma simpatia do governo pelos fascismos europeus. “Em junho de 1939,
vez que poderiam ter participações nas decisões governamentais. Vargas convocou uma reunião do Conselho de Segurança Nacional para
O marechal Mascarenhas de Moraes, gaúcho como Getúlio, a examinar a possibilidade de desencadeamento de guerra na Europa. A
quem coube a tarefa de comandar, na Segunda Grande Guerra, a força determinação da neutralidade brasileira nessa eventualidade foi decidida
expedicionária brasileira que pelejou na Itália, considera Vargas um por unanimidade.” (BRANDI, 1983, p. 139).
“notável ditador”, que “por seu equilíbrio e atitudes, era em verdade o mais De certo modo, o Brasil optara pela neutralidade devido às relações
credenciado e sutil dos políticos da sua época.”(JORGE, 1985, p.17).12 internacionais que mantinha tanto com os Estados Unidos, quanto com
Durante o Estado Novo foi criado o Departamento de Imprensa e a Alemanha, o que lhe proporcionava melhores condições políticas e
Propaganda, conhecido como DIP, que significou um importante meio econômicas. Desde o início da guerra, o Brasil exportava produtos
de controlar toda a imprensa e, determinar o que poderia ou não ser agrícolas, significando grande aumento na produtividade nacional. “Desta
publicado. forma o país pode obter melhores condições políticas e econômicas junto

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a estes dois centros hegemônicos, que disputavam o mercado brasileiro, de tropas norte-americanas em bases nordestinas e, ainda garantindo
possibilitando o aumento dos limites de decisão e de ação do Estado o fornecimento de matérias-primas para a guerra. Por outro lado, os
Brasileiro.” (EICKHOFF, 2005, p. 6). Estados Unidos se comprometiam a financiar a criação da Companhia
Sendo assim, o governo determinou através do DIP, que qualquer Siderúrgica Nacional, assim como o fornecimento de equipamentos para
meio de comunicação permanecesse neutro ao relatar notícias da guerra as Forças Armadas.
que acontecia na Europa, uma vez que a censura era rigorosamente
or meio de uma sucessão de ágeis manobras políticas, Vargas procurou
exercida em todas as ocasiões. obter financiamento para a criação da Companhia Siderúrgica
Mas muito preocupava aos Estados Unidos as ligações comerciais Nacional, assim como para o reequipamento e modernização das
Forças Armadas. Os Estados Unidos, por seu lado, reivindicavam
que o Brasil mantinha com a Alemanha e, principalmente a postura permissão para o estacionamento de tropas norte-americanas nas
tomada por Vargas diante às ideologias dos países do Eixo. Em 1940, bases do Nordeste e o fornecimento de materiais estratégicos.
(EICKHOFF, 2005, p. 9).
Vargas citou em um discurso as qualidades do Eixo, o que fez que
todos acreditassem na possibilidade do Brasil em breve se unir a eles,
Com a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial,
até porque, o Estado Novo era um governo que se identificava com os
em dezembro de 1941, o Brasil se viu obrigado a romper definitivamente
regimes totalitários europeus. Mas apesar do fato do presidente ser um
suas relações diplomáticas com os países do Eixo, a partir de janeiro de
simpatizante do regime alemão, “economicamente, nas circunstâncias,
1942, após um encontro de chanceleres no Rio de Janeiro. “Com isso
o Brasil não podia viver sem os Estados Unidos. A Alemanha não era
os Estados Unidos entram abertamente na guerra, a colaboração desse
bastante grande para substituí-la em nossos negócios.”(BASBAUM,
país com a Inglaterra assume formas mais concretas e o Brasil rompe
1976, p. 122).
suas relações com os países do Eixo.” (BASBAUM, 1976, p. 124).
Antes mesmo do ataque à Pearl Harbor, o governo norte-americano
vinha, através das conferências interamericanas, tentando contar com O ataque japonês a Pearl Harbor, em 7 de dezembro, precipitou a
entrada dos Estados Unidos na guerra contra o Eixo, forçando uma
o apoio dos países latino-americanos, na hipótese de sua entrada no definição do governo brasileiro. No próprio dia 7, Vargas convocou o
conflito. Porém, em 1939, na Conferência do Panamá, foi declarada ministério, que resolveu, por unanimidade, declarar a solidariedade
brasileira aos Estados Unidos. (BRANDI, 1983, p. 154).
a neutralidade das repúblicas americanas diante a guerra européia.
Mas em 1940, na Conferência em Havana, foi firmado um tratado de
De fevereiro a julho deste mesmo ano, muitos navios mercantes
mútua solidariedade no caso de ataque a qualquer país do continente
brasileiros foram afundados por submarinos inimigos.
americano.
Aproveitando-se da situação e, procurando obter vantagens, Vargas Não obstante, as represálias alemãs não se fizeram esperar e navios
brasileiros, mesmo os de cabotagem são afundados por submarinos
fez alguns acordos com os Estados Unidos, permitindo a instalação inimigos desde janeiro de 42. Ao todo foram afundados 37 navios.

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Só entre 14 e 17 de agosto cinco navios da marinha mercante, com de dentes, verminoses, etc. E, em todos os casos, subnutrição.
uma tonelagem bruta de 14.822, foram a pique, não longe do litoral. (BASBAUM, 1976, p. 131).
Um deles transportava 300 soldados, a maioria dos quais se perdeu.
O total perdido foi de 126.535 toneladas e as perdas em homens foi E, além disso, já não era inteiramente do interesse dos Estados
superior a mil. (BASBAUM, 1976, p. 124 e 125).
Unidos o reequipamento das Forças Armadas brasileiras, uma fez que os
A população brasileira exigia do governo posicionamento imediato Aliados haviam conquistado diversas vitórias no norte da África. Porém,
ante às agressões, reunindo multidões e saindo pelas ruas, promovendo em uma visita feita pelo presidente norte-americano, Franklin Roosevelt,
tumultos e depredando propriedades de cidadãos italianos e alemães, em janeiro de 1943 na base aérea de Natal, Vargas ainda insistiu no
radicados no Brasil. Finalmente, após o ataque a cinco navios brasileiros fornecimento de equipamentos militares prometidos pelos Estados
em um curto espaço de tempo, Vargas declarou em 22 de agosto estado Unidos, sem contar o interesse que os brasileiros tinham em tomar parte
de beligerância; e a seguir, em 31 de agosto, o estado de guerra contra ativa nos combates.
a Alemanha e a Itália. Iniciaram-se então as conversações sobre o envio de um contingente
brasileiro à frente de combate. A formação de uma força
[...] já não era mais possível hesitar. A indignação popular chegara expedicionária correspondia a um duplo projeto político de Vargas: de
ao auge, e o povo, em demonstrações de rua, atacava casas e um lado, fortalecer as Forças Armadas brasileiras internamente e aos
estabelecimentos alemães e italianos exigindo a declaração de olhos dos vizinhos do Cone Sul, em especial a Argentina, e com isso
guerra. Afinal, a 22 de agosto, depois de uma vibrante manifestação, garantir a continuação do apoio militar ao regime do estado Novo; de
em que os estudantes do Rio tiveram papel marcante, declara-se o outro lado, assegurar uma posição de significativa importância para
Brasil em estado de guerra com as nações do Eixo. No ano seguinte o Brasil no cenário internacional, na qualidade de aliado especial dos
o governo começa a organizar um corpo expedicionário cujo chefe Estados Unidos. Entretanto, as vitórias aliadas no norte da África,
seria o General Mascarenhas de Morais. Em 1944 embarcaram para em novembro de 1942, reduziram consideravelmente a importância
a Itália os primeiros escalões. A cobra começa a fumar. (BASBAUM, estratégica do Nordeste do Brasil e, por extensão, as possibilidades
1976, p. 125). de reequipamento das Forças Armadas brasileiras. Preocupado,
Vargas insistiu com o presidente norte-americano Franklin Roosevelt,
Logo após o Brasil declarar guerra ao Eixo, se iniciaram os primeiros quando este visitou Natal, em janeiro de 1943, no fornecimento
preparativos para a formação de tropas brasileiras para lutar na Europa. do material bélico prometido pelos Estados Unidos e no interesse
brasileiro em tomar parte ativa nos combates. Com a concordância
Mas esta não seria uma tarefa fácil, pois, o Brasil possuía uma dramática dos norte- americanos, iniciaram-se os esforços para a construção
deficiência militar. de uma Força Expedicionária Brasileira (FEB). (EICKHOFF, 2005,
p.12 e 13).
Vale frisar, entre parêntesis, que o recrutamento apresentou índices
espantosos, quanto às condições físicas de nossa juventude. Grande Em agosto de 1943, o ministro do Exército, general Eurico Gaspar
– se não a maior parte – se constituía de jovens do interior do país.
Mais de 65% dos convocados foram declarados incapazes por Dutra, assinou portaria determinando a criação de um corpo de
deficiências diversas: analfabetismo, avitaminoses, precário estado expedicionários para ser mandado para a Europa. Para sua organização

Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná 13 | História | 2009


e treinamento e, posteriormente seu comando, foi designado o general educação. “A maior parte do oficialato da ativa conseguiu escapar do
Mascarenhas de Morais. envio para a guerra. Justamente os mais pobres e menos instruídos, com
poucos contatos sociais influentes que lhes permitissem se evadir, é que
Passou-se um ano entre o agosto de nossa declaração e o primeiro
ato de efetiva criação da força expedicionária que faria o Exército foram recrutados.” (EICKHOFF, 2005, p. 19).
Brasileiro presente na grande luta dos exércitos aliados contra os Enquanto isso, a Força Aérea Brasileira (FAB)13 e a Marinha
exércitos totalitários. A Portaria de 9 de agosto de 1943, assinada pelo
Ministro Eurico Gaspar Dutra, é uma espécie de pedra fundamental
receberam a missão de conter o inimigo em águas brasileiras. Redes
da FEB, juntamente com a aceitação, pelo General Mascarenhas de antitorpedos foram colocadas em portos vitais, servindo como auxílio
Moraes, do convite para organizar, instruir e comandar a 1º Divisão no caso de supostos ataques. A assistência técnica dos Estados
de Infantaria, primeira das três divisões integrantes do Corpo de
Exército Expedicionário, que o Brasil enviaria ao teatro de operações Unidos foi vital, ainda em 1942 foram enviados novos aviões e caça-
europeu, consoante conversações mantidas em Washington entre submarinos. O aprimoramento da FAB ganhou grande impulso com
autoridades brasileiras e americanas. (COSTA, 1976, p. 27).
a instalação da USBATU (United States-Brazil Air Training Unit, a

Porém, entre a decisão de optar pela guerra e o envio das tropas Unidade de Treinamento Aéreo Brasil-EUA), a qual funcionou numa base

para a Itália, houve um longo percurso. Foi somente em junho de 1944, da Marinha americana, em Parnamirim (RN), região que ficou conhecida

que os primeiros soldados embarcaram para a Itália, quase dois anos como “Trampolim da Vitória”. Foi neste momento, que os brasileiros

após o Brasil declarar guerra ao Eixo. E o motivo foi óbvio: o Brasil tinha viram com seus próprios olhos como funcionava a colossal máquina de

uma tropa de terceiro mundo, totalmente defasada e despreparada. O guerra americana. Em 1943, foram destruídos dez submarinos alemães

Exército brasileiro não conhecia e nem possuía o material de guerra e um italiano, a Marinha e a FAB contavam com meios suficientes para

moderno, suas táticas eram arcaicas e deficientes. Para que a FEB enfrentar o inimigo e convencer definitivamente os EUA que eram

fosse realmente formada, foi preciso muita vontade e determinação e, importantes aliados.

principalmente, o total apoio dos norte-americanos. “A partir de agosto Mas para a FEB, nem tudo foi tão fácil. Somente a firme decisão do

de 1943 foram sendo traçadas as normas, em caráter sigiloso, para a general Mascarenhas de Morais e o dedicado trabalho de seu Estado-

organização da FEB.” (EICKHOFF, 2005, p. 15). Maior, evitaram o que poderia ser um grande fiasco. Dentro e fora da

Inicialmente, as expectativas eram de formar um contingente de própria instituição militar, acreditava-se que a FEB não entraria em

100.000 homens, mas a realidade social e financeira do país acabou ação. Mas o desafio foi superado e, a difícil seleção e outras inúmeras

reduzindo esse número para aproximadamente 25.000. Dentre estes, dificuldades vencidas e, enfim a FEB estava formada:

havia pouquíssimos soldados profissionais, com longo tempo de serviço;


No dia 23 de novembro de 1943 foi finalmente criada a FEB, cuja
a grande maioria foi recrutada especialmente para a guerra, sendo composição orgânica, nos moldes americanos, compreendia:
grande parte oriundos de áreas rurais, com baixos níveis de saúde e uma Divisão de Infantaria, um Depósito de Pessoal e pequenas

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organizações com Serviço de Justiça, Serviço de Saúde, Serviço 2. DOS PRACINHAS: MEMÓRIAS DO
Religioso e de Intendência. A força combatente da FEB foi a
1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE), um conjunto CONFLITO E DO RETORNO
tático-operacional constituído por infantaria, artilharia, Cavalaria
motorizada, engenharia, aviação de ligação e observação e serviços
de apoio e combate. (EICKHOFF, 2005, p. 16). 2.1. A experiência no conflito

Ainda em dezembro de 1943, foi criado o 1º Grupo de Aviação de


Os homens sobem para os navios. Sobem por várias escadas, em fila
Caça, que se juntaria às Forças Aéreas Aliadas no Mediterrâneo. Com indiana; sobem lentamente. Passam-se os minutos, as horas, os dias,
menos percalços a driblar, os componentes do Grupo de Caça foram os anos, os séculos, e o navio não sai. Os homens sobem. No salão
há ordens, organização da rotina de bordo, leitura de regulamentos, e
selecionados, todos combatentes voluntários e com razoável experiência. conversa. A esta hora eu... A esta hora, lá em casa... A esta hora, ela...
Finalmente, em junho de 1944, os primeiros soldados da FEB Mas é absurdo; estamos falando do Rio como se estivéssemos longe.
E estamos aqui, estamos no Rio. Na verdade estamos presos.
partiram do Rio de Janeiro rumo à Itália, a bordo do navio norte-
americano General Mann.
(Rubem Braga).
O primeiro escalão da FEB, comandado pelo general Zenóbio da
Costa, embarcou para a Itália, em 30 de junho de 1944, no navio
A participação da FEB na Segunda Guerra Mundial é um capítulo
norte-americano General Mann. Após marchas e contra-marchas,
Mascarenhas de Morais partiu com esse primeiro escalão. [...] muito importante na história brasileira. Foram mais de duzentos dias no
antes da partida, em carta confidencial ao presidente, Mascarenhas front italiano, passando por diversas dificuldades e por todos os horrores
deixou transparecer sua preocupação e intranqüilidade: “Os óbices e
dificuldades que na organização dessa grande unidade encontramos
que uma guerra pode oferecer. Os pracinhas da Força Expedicionária
em território nacional [...] levam-nos a admitir ou recear dificuldades Brasileira lutaram ao lado dos Aliados entre os anos de 1944/45. Neste
maiores quando estivermos apenas ligados ao Brasil pelo espírito e capítulo, veremos como foi a participação brasileira em um dos maiores
pelo coração”.(BRANDI, 1983, p. 167).
conflitos do século XX, através de relatos e memórias de soldados,
A participação do Brasil na guerra certamente não foi o único fator que oficiais, enfermeiras e de correspondentes de guerra e, principalmente
decidiu a vitória aliada, mas com certeza representou grande importância através de entrevistas realizadas pessoalmente com ex-combatentes
para que esta acontecesse. Foi lá na Itália, que os pracinhas brasileiros curitibanos. Dessa maneira, levaremos em consideração a relação que
provaram que sua bravura e determinação; superariam qualquer tipo de a memória tem com a identidade social e sua ligação com a História
horror que a guerra poderia representar, e mais, a vontade de vencer e o “oficial”. Segundo Michael Pollak, “a memória parece ser um fenômeno
desejo de voltar para casa, talvez tenha sido o impulso que perpetuou o individual, algo relativamente íntimo [...], mas que deve ser entendida
que a FEB representou para a Segunda Guerra Mundial. também como um fenômeno coletivo e social” (POLLAK, 1992, p. 2),

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ou seja, no caso na Segunda Guerra Mundial, um evento que envolveu No medonho inverno toscano e apenino, como foi aquele de 1944-45,
o sol só aparecia mesmo, e isso quando aparecia, lá pelas dez horas.
milhares de pessoas, mas constituído por histórias e lembranças
E já nascia um sol combalido, agonizante, a prevenir que demoraria
individuais. Sendo assim, os fatos principais estarão constantemente pouco. Três quatro horas da tarde, e já era noite novamente.
sendo relembrados e relatados por alguns participantes brasileiros. (SILVEIRA, 2005, p. 9).

O desembarque do 1º Escalão da FEB se deu em 16 de julho de 1944,


Os uniformes brasileiros eram precários e de nada adiantavam
em Nápoles. Logo depois, os brasileiros foram enviados a Tarquinia, onde
contra o frio. Mas, logo as fardas originais acabaram sendo substituídas
receberam
por materiais americanos, que eram infinitamente superiores e melhores
novos treinamentos e equipamentos para a guerra. Em seguida, as
na proteção contra o inverno. É o que afirma EICKHOFF:
forças brasileiras foram incorporadas ao 5º Exército do Estados Unidos,
comandado pelo general Mark Clark, que por sua vez, fazia parte do Outra questão era o fardamento. Acabaram substituídos por
material americano, superior e confortável, o feio e precário uniforme
10º Grupo de Exércitos Aliados. Em setembro, desembarcaram os 2º e
verde-oliva e o verde cinza de lã, insuficiente para o frio europeu,
3º Escalões, e até fevereiro de 1945, ainda chegariam à Itália mais dois que além do mais se confundia na cor com o uniforme do inimigo
escalões, além de um contingente da FAB, com cerca de quatrocentos alemão. Também substituíram as capas brasileiras, supostamente
impermeáveis, e deram entrada o resistente calçado combat boot,
homens. Ao todo, o Brasil enviou à Itália pouco mais de 25 mil soldados. os apresentáveis blusões forrados de lã, os capacetes de fibra e de
O ex-combatente, Paulo Dumangin Santos14, narra a chegada de seu aço, e até meias, luvas, camisas, ceroulas, mantas, roupa íntima e de
cama. Tudo isso “generosamente” debitado dos cofres públicos da
escalão no solo italiano:
nação brasileira. (EICKHOFF, 2005, p. 23).
Aportamos em Nápoles no dia 16 de julho de 1944. De bordo podíamos
ver o movimento do porto; alguns veículos militares, a Companhia A FEB também adotou um costume semelhante a dos exércitos
de Fuzileiros americanos e respectiva banda que nos foram prestar americanos, que era de usar em seus uniformes distintivos e símbolos de
continências de estilo. Após 14 dias de mar sentíamos em certo
desejo de ver o pessoal de terra e no fundo cada um guardava um unidades, de cursos realizados, de campanhas e de tempo de serviço. O
certo orgulho de se mostrar pela primeira vez em terra européia como símbolo adotado pelos pracinhas brasileiros foi da cobra fumando, que
representantes da única nação Sul-americana que enviara tropas para
lembrava o bordão surgido na época, em que diziam que era mais fácil
o teatro de operações. Talvez influência de filmes, mas tínhamos uma
esperança de ser recebidos com alegria ou pelo menos com uma certa uma cobra fumar do que o Brasil ir à guerra.
curiosidade pela população de Nápoles. (SANTOS, 1949, p. 301).
Apesar de feio e pobre, de tecido inferior e de precária confecção,
Mal chegaram em solo italiano, e as tropas brasileiras se depararam pouco inspirado e de gosto que hoje se haveria de chamar de
“cafona”, o distintivo verde-amarelo da cobra fumando sempre foi
com um terrível inimigo: o inverno mais rigoroso dos últimos 50 anos usado com orgulho pelo soldado da FEB. Sua origem real é até hoje
na região apenina. A todo momento, a morte rondava os soldados, que controvertida, mas indiscutível é que se originou no meio de gente
sofriam com uma temperatura de aproximadamente – 20º C. simples, da expressão do anônimo pracinha: “a cobra está fumando”.

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Nunca se haverá de saber, com precisão, qual a versão verdadeira. alemães, do mesmo modo como tinham aprendido com os britânicos
Nunca se saberá se o dito, passado de boca em boca, se referia, como antes. (EICKHOFF, 2005, p. 22-24).
querem alguns, ao charuto do chefe exigente e severo que a todos
intimidava; ou se quem o disse, pela primeira vez, foi o soldado mineiro Outro problema foi o armamento. A FEB foi conhecer já na Europa,
que viu partirem os companheiros, no velho trem “Maria Fumaça”; ou
se a referência à cobra que fumava era um gesto de afirmação da a maioria de seu equipamento. Nem todos os soldados da infantaria
presença da FEB na guerra, ante o negativismo e o deboche dos que foram armados com o fuzil semi-automático Garand, que assegurava
dela duvidavam. A única verdade incontestável é que o símbolo da
considerável potência de fogo às pequenas unidades. Grande parte
cobra fumando nasceu no coração do pracinha mais humilde – daí a
extraordinária motivação psicológica que logrou alcançar, apesar de recebeu os velhos fuzis Springfiel, de repetição.
suas imperfeições de natureza visual. (COSTA, 1976, p. 32-33). E uma vez no front, a situação dos pracinhas que lutaram pela FEB,
não era nada fácil:
As dificuldades enfrentadas pela Força Expedicionária Brasileira
seriam muitas. O regime alimentar americano na zona de guerra, era ós vivíamos numa cratera, cercados de alemães no cume dos morros.
Ficamos em Porreta-Terme, onde estava o quartel-general avançado
quase sempre rejeitado pelos brasileiros. Constituído quase sempre de
do general Mascarenhas. De dia, o comando da FEB queimava óleo
enlatados e produtos frigorificados, a culinária de guerra americana só diesel para fazer uma cortina de fumaça: qualquer movimento que
foi adaptada para o consumo brasileiro, após o preparo misto dos dois a gente fizesse ali, se os alemães percebessem, era a morte certa.
(SILVEIRA, 2005, p. 44)
costumes alimentares.
Mas a pior dificuldade é referente ao despreparo das tropas A FEB lutou na Itália em duas frentes. A primeira foi na região do
brasileiras e o grande preconceito que sofreram no início. Estas seriam Rio Serchio durante o outono de 1944, e a Segunda no vale do Rio
as primeiras batalhas a serem vencidas pelos nossos pracinhas. Reno, em plena cordilheira apenina. E, “a 15 de setembro de 1944, a
Não foram poucas as dificuldades que de começo teve que vencer FEB entrou em operação, sob o comando do general Zenóbio da Costa,
a primeira tropa brasileira desembarcada na Itália. Os chefes [...] substituindo uma força americana. Não era ainda o teste de fogo.
americanos, de menor graduação, estranhavam, a princípio, a
Enfrentando pouca resistência, em dois dias, foram conquistados os
presença de nossos soldados em território italiano e não escondiam
a dúvida sobre as vantagens do emprego da tropa brasileira na objetivos estabelecidos.” (EICKHOFF, 2005, p. 24).
luta, pois do Brasil apenas tinham notícias das bases aérea de Para compensar o despreparo inicial das tropas brasileiras, os
Belém e Natal, que, aliás, de brasileiras só possuíam o chão. [...]
O aprendizado do combate foi doloroso, erros primários foram chefes americanos junto com os chefes brasileiros, tiveram a constante
cometidos. Nisso os brasileiros não foram os únicos. Na Tunísia, preocupação em passar instruções aos oficiais, tanto na parte tática,
um ano antes dos brasileiros chegarem à Itália, os americanos
quanto nas diversas especialidades. Para esse fim, o Teatro de Operações
aprenderam, da pior maneira, com uma derrota arrasadora frente aos
veteranos da África Korps15 alemão. A lição foi aprendida e em 1944 da Itália, estava muito bem equipado com suas escolas e centros de
os americanos podiam ensinar aos brasileiros como guerrear com os instruções.

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Sem dúvidas, a missão mais importante que coube à FEB, foi a O combate em Monte Castelo foi considerado um “batismo de
tomada de Monte Castelo. Foram quatro investidas sucessivas, às vezes, fogo” para os soldados brasileiros. “Uma grande euforia se alastrou por
realizadas ao lado dos americanos, em duas das quais, os pracinhas todo o front. Comandantes aliados da maior categoria transmitiam suas
atingiram o alvo, mas tiveram que retroceder, levados pelo fogo inimigo. congratulações ao Gen Mascarenhas pela vitória conquistada.”(LIMA
Monte Castelo estava dominada pelos alemães, mas era uma posição JUNIOR, 1982, p. 113). Monte Castello foi considerada uma vitória de
estratégica que impedia o 4º Corpo de Exército de prosseguir a marcha grande valor moral, provando definitivamente ao comando americano o
até a Bolonha, objetivo maior do comando das Forças Aliadas na Itália. valor do soldado brasileiro nos campos de batalha. Mas desse momento
“À frente de Bolonha, da qual um dos setores, talvez o mais ingrato, em diante, a FEB ainda registraria importantes vitórias.
está sendo defendido pelos brasileiros, é uma das mais difíceis do front Logo após a primeira conquista, seria a vez de Castelnuovo cair
italiano.”(SILVEIRA, 2005, p. 31). sob domínio brasileiro, em 5 de março de 1945. Este, “foi o combate
No dia 24 de novembro de 1944, foi feita a primeira ofensiva e, de maior expressão tática, hábil manobra de isolamento do ponto
depois de se apoderarem de Belvedere, próximo de Monte Castelo, forte de Soprassasso e de convergência de dois ataques sobre o
os brasileiros sofreram uma violenta contra-ofensiva alemã, que os lugarejo.”(EICKHOFF, 2005, p. 27).
obrigou a abandonar as posições já conquistadas. No dia 29, os Aliados A FEB ficou empenhada em combate durante sete meses
iniciaram a Segunda ofensiva a Monte Castelo, igualmente barrada pelos ininterruptamente, e embora tenha começado a atuar em meados de
regimentos de infantarias alemãs. No dia 12 de dezembro, iniciou-se o setembro de 1944, foi uma das unidades aliadas que mais permaneceu
também frustrado terceiro assalto dos expedicionários brasileiros, que em emprego contínuo. Tais condições geraram na tropa grande
não durou mais de cinco horas. esgotamento físico e mental, segundo o relato do segundo sargento,
Com o agravamento do inverno, o mito da invencibilidade de Monte José Maria Romeu Correa:
Castelo permanecia inalterado. Mas, com a chegada do ano novo, o
uitos soldados eram encontrados chorando de frio dentro dos
tempo melhorou e os brasileiros enfim tomaram Monte Castelo em 21 abrigos, porém viram cair desde a primeira até a última nevada, sem
de fevereiro de 1945, contando com o importante apoio da FAB. nunca terem abandonado suas posições. Muitos dias se passaram,
e esperávamos agora pela substituição. Nossos soldados já haviam
Às 17h 50 a voz do major Franklin vem, forte, pelo rádio: ‘Estou no sofrido bastante. Permanecer dias e noites a fio, sentado ou deitado
cume de Monte Castelo.’ E pede fogo da Artilharia sobre posições dentro de um subterrâneo, tremendo de frio, quando sobre esse se
inimigas além do monte. ‘Castelo é nosso’, me diz o general Cordeiro. acumula uma grossa camada de neve, e com a roupa encharcada,
Mais alguns minutos, e nossas baterias já estão bombardeando quando a mesma começa a derreter e a água infiltrando-se na terra,
Caselina, Serra e Bela Vista. Os alemães respondem com morteiros. lenta e continuamente, fazia do abrigo um lodaçal, só se conseguia
Mas nada mais lhes adiantaria, porque, como me diria na manhã com bastante força de vontade; apesar desta não faltar aos soldados,
seguinte o coronel Franklin, ‘estamos em Castelo e ninguém mais precisavam ser eles revezados. Porém o tempo passava e nem
nos tira daqui’. (SILVEIRA, 2005, p. 98). sombra de outra tropa. Foram mandados 35 homens do depósito,

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para preencher as vagas dos que estavam baixados ao hospital, e foi reconhecer a situação inimiga e estar preparada para perseguir as tropas
com estes que o capitão resolveu fazer um pequeno revezamento,
alemãs’.” (LIMA JUNIOR, 1982, p.163). E esse, foi um dos maiores feitos
e sem prejuízo das posições. Em grupos de quatro ou cinco, os que
estavam na primeira linha eram substituídos e iam para o local onde conquistados pelos pracinhas brasileiros, conforme relembra o Senhor
ficava a casinha, onde podiam fazer um pouco de exercício e aí Flávio Costa16, cabo ex-combatente integrante do 6º R.I.: “Detemos
permaneciam uns seis ou oito dias. (MAXIMIANO, 2004, p. 359).
em Fornovo a 148ª Divisão de Infantaria alemã, era parte da Divisão
Do início de março a meados de abril, houve um período de menor Panzer, fizemos 15 mil prisioneiros e apreendemos grande quantidade de
número de operações. O comando aliado organizava, então, o plano final material inimigo.” ( COSTA, 2008).
da campanha na Itália, a chamada Ofensiva da Primavera, destinado a As tropas brasileiras passaram a neutralizar os últimos focos de
levar com rapidez à derrota definitiva teuto-italiana. Foi estabelecido que resistência, seguindo-se o cerco a Colecchio, Fornovo di Taro e a corrida
caberia à FEB seguir na direção de Vignola, o que veio a acarretar os para o Vale do Pó. Prosseguindo em direção a Turim, os brasileiros
vitoriosos ataques à Montese e Zocca. ocuparam a cidade de Alessandria, em 30 de abril.
A Batalha de Montese apresentou algumas dificuldades, por ser um Após a rendição alemã na Itália, oficializada para o dia 2 de maio
terreno íngreme e minado, sem contar a forte defesa alemã. Mas em de 1945, a 1ª DIE recebeu novas ordens, cujo objetivo principal era
concentrar a maioria de seus meios na região de Alessandria e manter
14 de abril, Montese não resistiu e, as forças germânicas mais uma vez
a ocupação da área de Piacenza. Era a ordem de ocupação militar.
foram vencidas pela FEB, apesar desta vitória ter custado muitas vidas [...] No dia 8 de maio chegou a auspiciosa notícia: foi assinada, na
brasileiras. Alemanha, a rendição incondicional de todas as forças alemãs. O tão
esperado Dia das Vitória aconteceu. A paz voltou a imperar no Teatro
Encontramos em Montese apenas vestígios – ou melhor, resíduos de Operações da Europa. (LIMA JUNIOR, 1982, p. 184-185).
– de uma cidade que em tempos de paz deveria ter sido um belo,
um carino lugarzinho equilibrado numa crista suave, com a sua Muito importante ressaltar o grande apoio da FAB (Força Aérea
torre medieval, esguia como um pinheiro, o vale estendendo-se
Brasileira) nas conquistas brasileiras na Segunda Guerra Mundial.
lá embaixo, suas coloridas bancas de jornal e seus monumentos
antigos. Brasileiros e alemães, no contraponto da luta ofensiva e Contando com cerca de 400 homens, o I Grupo de Caça integrou-se à
defensiva, reduziram Montese a ruínas. Durante horas, os homens Força Aérea do Mediterrâneo e apoiou decisivamente a FEB na conquista
do 11º Regimento lutaram de casa em casa, até que os últimos cinco
alemães foram mortos diante da igreja, velha de séculos. (SILVEIRA, de Monte Castello. Adotaram o lema “Senta a pua”, como conclamação
2005, p. 147) a que seus integrantes se lançassem sobre o inimigo com decisão, golpe
de vista e vontade de aniquilá-lo.
A partir dessas conquistas, iniciou-se a perseguição aos alemães
que batiam em retirada: “A nova Ordem de Operações do IV Corpo Ao lado de combatentes da Força Aérea dos Estados Unidos,
adestrados ao longo de anos de guerra, os pilotos brasileiros
determinara à Divisão brasileira a missão de ‘manter as atuais posições, enfrentaram a aguerrida Luftwaffe, demonstrando capacidade

Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná 19 | História | 2009


profissional, iniciativa e bravura inexcedíveis, atuando com acendrado uma baratinha apreendida naquele instante e já escrevera no pára-
espírito de corpo. A FAB fez-se presente nos céus da Itália, com duas brisa um nome certamente saudoso: ‘Marieta’. Escurecia. Um
Unidades: uma, o 1º Grupo de Aviação de Caça, o “Senta a pua” [...]; pelotão tedesco passou de vagar, a caminho da prisão. De repente
outra, a 1ª Esquadrilha de Ligação e Observação, cognominada “Olho um deles começou a cantar e os outros acompanharam; não sei o
Nele!” [...] Honra, pois, à Força Aérea Brasileira que, nos céus da Itália, que dizia a canção. Mas na penumbra e na poeira da pobre estrada
com denodo e abnegação, cumpriu missões de combate muito além do italiana aquilo era uma canção de derrota. (BRAGA, 1996, p. 276).
que exigiria o cumprimento do dever militar. (LIMA, 1979, p. 5).
Joel Silveira, também jornalista e correspondente de guerra dos
Após o fim da guerra, o 1º Tenente, Clovis Garcia17, descreve em “Diários Associados”, fala sobre sua experiência no conflito:
poucas palavras, a campanha da FEB na Itália:
[...] embora, oficialmente, a guerra só fosse acabar mesmo no dia
A vitória de Monte Castello, indiscutivelmente, forma na quadra de ases 8 de maio, para nós, correspondentes brasileiros, já havia acabado.
das vitórias da FEB, como a de maior valor moral. As outras três são: Agora era tratar de voltar para casa. O engraçado é que, apesar
Castelnuovo, a de maior valor estratégico (conforme foi reconhecido da ausência de meses e de tudo de ruim que havíamos deixado
pelos alemães, numa de suas irradiações especiais para os combatentes para trás, no fundo ninguém ainda queria voltar. Fomos ficando por
brasileiros, “programa auri-verde”, comentando as injustiças de que era ali, um dia em Milão, outro em Turim, outro em Bolonha, Pádua,
vitima o 6º R.I.), Montese, a mais sangrenta (426 baixas em quatro Verona, Veneza; e depois fomos descendo: Pistóia novamente, onde
dias) e Fornovo di Taro, a mais brilhante (aprisionamento da 148ª recolhemos os nossos pertences, Florença mais uma vez e finalmente
Divisão alemã, parte de uma Divisão Panzer, [...] num total de 14.779 Roma. Era uma sensação esquisita aquela que me dominava, [...],
prisioneiros). E constituiu um símbolo, uma questão de honra para a FEB, uma sensação ao mesmo tempo de alegria e tristeza. A guerra, como
a conquista de Monte Castelo, porque a batalha em torno dessa posição já disse, é cheia de truques, todos nojentos; e um dos mais nojentos
alemã arrastou-se por três longos e penosos meses (de 24 de novembro é fazer com que alguém que com ela conviveu durante meses acabe
de 1944 a 21 de fevereiro de 1945), sendo efetuados nesse período sendo condicionado por ela. Por isso é que naqueles dias, véspera de
nada menos de seis ataques, com grande número de baixas. Entretanto, voltar para casa, eu sentia que não fora apenas a guerra que havia
a maior parte dessas baixas e desses ataques teria sido evitada se fosse acabado, mas também uma parte do que eu era antes de chegar à
aproveitada a lição das três primeiras investidas, efetuadas nos dias 24, Itália. Por isso é que costumo dizer que cheguei à Itália com 26 anos
25 e 26 (esta interrompida ao meio) de novembro de 1944. Ou mesmo e voltei com 40, embora lá só ficasse pouco mais de oito meses. Ao
os ensinamentos do primeiro desses ataques. Infelizmente tal não se contrário do poeta, não foi exatamente por delicadeza que naqueles
deu. (GARCIA, 1949, p. 279). quase nove meses perdi parte da minha mocidade, ou o que restava
dela. A guerra, repito, é nojenta. E o que ela nos tira (quando não nos
tira a vida) nunca mais nos devolve. (SILVEIRA, 2005, p. 19-20).
Os combatentes da FEB, cansados da guerra, puderam enfim
presenciar a derrota do inimigo. É o que relata o correspondente de A guerra já havia acabado, porém, na memória e na vida dos que
guerra do “Diário Carioca”, Rubem Braga: lá estiveram, as tristes lembranças dos acontecimentos presenciados,
Eu estava cansado de ver alemão. Colunas de soldados ainda seria uma marca para toda vida. As dificuldades, as batalhas, o convívio
desfilavam melancolicamente, e os oficiais faziam força puxando suas com a morte, os traumas, cada qual relatado por uma experiência em
bagagens de dentro dos carros. Um cabo brasileiro fazia funcionar
comum, de quem partilhou momentos de dor e desespero.

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Em cada memória fica marcada um acontecimento em especial, nos lábios escaldantes de febre do alemão ferido. O pobre exauria
com sofreguidão as baforadas frescas de fumaça e sorria feliz...
segundo relata em uma conversa realizada no Museu do Expedicionário,
Outro quadro doloroso de sofrimento: o das criancinhas feridas,
o Major Antonio Ribeiro: vítimas indefesas das minas e dos bombardeios! Com que mágoa
infinita se via a amputação de uma perna pequenina ou de um
Em um ataque contra os alemães em Montese, meu comandante pezinho minúsculo: eram espetáculos que nos faziam odiar a guerra.
foi ferido e morto a um metro e meio de distância de mim, poderia (MORAIS, 1949, p. 416-417).
ter sido eu... Um estilhaço o atingiu no ombro esquerdo e ele não
sobreviveu...E ele só tinha 22 anos, era tão jovem ainda...Esse foi
As memórias de guerra são recordadas em cada um de seus
meu pior momento, ainda me emociono quando falo sobre isso. A
guerra é muito triste.( RIBEIRO, 2008). 18 participantes de maneiras diferentes. A guerra traz muita dor e
sofrimento, mas traz também muitos acontecimentos inesperados, como
Berta Morais19, 2ª Tenente-Enfermeira, também relata um conta o Senhor Flávio Costa, em entrevista realizada pessoalmente:
acontecimento que marcou sua ida a Itália, e fala sobre as tristes
conseqüências da guerra:
uitas coisas acontecem na guerra... Tive encontro com alemão frente a
Foi no 16º que assisti a uma das cenas mais fortes que me foi dado frente, colegas meus que vi morrer e que tive que transportar depois,
ver em toda a guerra. Num encontro de patrulhas, um pracinha do 6º é tudo muito triste [...]. Mas teve um acontecimento que me deixou
R.I. foi ferido e o estilhaço, atingiu-o no braço esquerdo, inutilizou-o muito feliz. Foi em Monte Castello, quando alguém me chamou e disse:
para sempre. Pouco depois, em novo encontro, os remanescentes da “Flávio, seu irmão está aqui!” – nem acreditei! Meu irmão Edgar tinha
patrulha alemã eram feitos prisioneiros e, com eles, um ferido grave, incorporado o 1º R.I., e não nos víamos desde o Brasil. Nem sabia se
um rapaz de 18 anos. Atingido em cheio, perdera os dois antebraços ele ainda estava vivo. Ficamos quatro dias juntos, depois seguimos
e a gangrena progressiva obrigara à amputação de ambos os braços. em direções diferentes. Nos reencontramos meses depois quando
Era doloroso ver o pobre rapaz, devorado pela febre, agitando voltamos para casa, vivos e com saúde, graças a Deus! Mas a guerra
dolorosamente aqueles cotos sangrentos. Por coincidência fora nos deixou muitas marcas, aquelas que ficam em nossos corações, e
colocado na mesma enfermaria do nosso pracinha ferido no primeiro que nem o tempo nos faz esquecer. (COSTA, 2008).
encontro e logo identificado, por este, como “o tedesco que me
acertou”. Por isso dizia: “ele me paga – que eu tiro a desforra, lá As pressões psicológicas exercidas na guerra são inúmeras, e os
isso eu tiro” – é o que ele vivia a dizer. Na noite seguinte, estava eu soldados brasileiros em especial, sofreram bastante com esse problema,
de plantão na sala de operações e, pela madrugada, aproveitando
uma folga, dei um pulo até a enfermaria para ver um doente grave. segundo relata o ex-voluntário da FEB, José Góis de Andrade20:
Ao entrar, percebi logo um vulto curvado sobre o pobre alemão tão
gravemente ferido; pensei, com um choque no coração, no pracinha e A pressão de cima para baixo numa guerra é enorme. Toda a tropa
nas ameaças que sempre fazia. Aproximei-me cautelosamente, sem da frente recebe o impacto de duas forças contrárias: a do inimigo
ser pressentida e o que me estarreceu? Curvado sobre o alemão, os que procura barrá-lo por todos os meios materiais e a do Comando
olhos cheios de lágrimas, o nosso pracinha, um mulato, dizia: “Fume, que arremete contra o inimigo, usando de todos os meios materiais
seu desgraçado! Fume o cigarro com gosto – brasileiro é bão e tem e psicológicos. O homem do front tem assim o seu consciente
dó de quem está padecendo”. E colocava, piedosamente, o cigarro terrivelmente comprimido pelo instinto de conservação e pelo

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cumprimento do dever, do que podem advir recalques e complexos do coronel alemão, sua continência vaga (mais cumprimento que
incalculáveis, capazes de provocar profundos desequilíbrios físicos continência) e o indisciplinado palavrão do meu sargento – não
e mentais. [...] A pressão exercida pelo Comando Brasileiro foi bem restava mais dúvida: tais demonstrações tão à margem da ordem
acentuada. Pareceu-me, todavia, que esta rigidez decorreu da grande castrense eram a prova definitiva, a que me faltava, de que de fato a
responsabilidade dos nossos comandantes que, apenas com uma guerra chegara ao fim. (SILVEIRA, 2005, p. 170).
divisão, representavam o Brasil na II Guerra Mundial. Os brasileiros
não podiam falhar, custasse o que custasse. [...] se fracassássemos, Mesmo levando-se em consideração todas as dificuldades
seria o descrédito para a Força Expedicionária Brasileira. Daí a
pressão ter sido tremenda e por vezes exaltada. [...] A FEB foi uma enfrentadas pelos soldados, principalmente o despreparo militar inicial,
das divisões mais “sugadas” e uma das que mais produziram no ao fim da guerra, tanto os Aliados quanto os inimigos, reconheceram a
âmbito do V Exército Americano. (ANDRADE, 1949, p. 370-371).
coragem e determinação dos brasileiros da FEB.

Enfim, as marcas deixadas pela Segunda Guerra Mundial na vida


e na memória de seus participantes são muitas. Em cada relato está Tal missão serviu de coroamento da participação da FEB em
território italiano, que devido às afinidades lingüísticas, e, para
a lembrança de um acontecimento importante ou de uma experiência aqueles que possuíam ascendência italiana, também raciais e
particular de quem presenciou e viveu uma das maiores guerras que a culturais, pôde o soldado brasileiro granjear o respeito e a simpatia
humanidade conheceu. até hoje demonstrados pelos habitantes daquela região para com
os veteranos da FEB. Finalmente, a impressão deixada pela FEB foi
Na seqüência veremos como foi o fim desta guerra, suas causas e como a mais lisonjeira possível. Interpretações apressadas dos relatórios
foi a vida posterior dos pracinhas da Força Expedicionária Brasileira. americanos podem fazer crer que a força expedicionária era
completamente destreinada, como de fato assim se apresentou à
sua chegada na frente italiana, e sem motivação. A sucessão dos
2.2. O fim da segunda guerra mundial fatos demonstrou que não. A FEB foi aprendendo. A missão dada aos
e a volta para casa brasileiros foi cumprida, e não há dúvida de que, quando acabou a
guerra, os pelotões de infantaria brasileiros podiam ser comparados
Com a queda do 3º Reich em 8 de maio de 1945 e, portanto, o a quaisquer outros dos exércitos aliados. (EICKHOFF, 2005, p. 28).

fim da guerra na Europa, ficou designado a FEB a ocupação militar do


território conquistado, até julho do mesmo ano, quando começaram os Então, “a partir de 3 de junho, a tropa brasileira encerrou a fase
preparativos para o retorno ao Brasil. de ocupação militar no norte da Itália e iniciou a fase de concentração
Foi no dia 3 de maio de 1945. Haviam-nos dito, no Quartel-general em Francolise, localidade que distava 7 Km do porto de Nápoles. Era o
Avançado da FEB, que a guerra iria acabar dentro de três dias, quatro primeiro passo para o regresso ao Brasil.”(LIMA JUNIOR, 1982, p.189).
no mais tardar. Mas na verdade já havia acabado, embora muitos dos
Os primeiros escalões iniciaram o deslocamento das áreas ocupadas em
combatentes – aliados e alemães – ainda não soubessem disso. Eu
sabia. [...] Não havia dúvida: a guerra tinha acabado, definitivamente. direção à Nápoles logo em seguida, onde aguardavam o embarque para
Tudo indicava isso: o prosaico guarda-chuva aberto sobre a cabeça casa. “O primeiro escalão chegou ao Rio de Janeiro a 18 de julho de

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1945, e o último chegou ao mesmo destino a 03 de outubro do mesmo O Brasil vivia em um regime ditatorial e a FEB estava justamente
combatendo o mesmo tipo de governo. Durante muito tempo
ano.”(EICKHOFF, 2005, p. 29).
sustentou-se a hipótese de que o retorno dessa tropa altamente
treinada e completamente imbuída do espírito de liberdade era uma
Em 21 de setembro de 1945, embarcávamos no porto de Nápoles, no
ameaça para o governo de Vargas, fato este que explicou a rápida
James Parker, com o 4º e último Escalão da FEB. Esse foi, sem dúvida,
ordem de desmobilização das FEB expedida pelo Ministério das
o “navio negreiro da FEB”. As acomodações eram insuficientes, havia
Guerra. Porém, estudos mais recentes apontam que as maiores
grande número de convalescentes a bordo e diariamente baixava uma
desconfianças para com os pracinhas não advinham do governo, mas
grande quantidade de gente atacada de pneumonia, pois, as praças
das próprias autoridades militares, mais precisamente nos generais
viajando ao relento, dormindo nos conveses e com a chuvinha miúda que
Dutra e Góes Monteiro, e de setores políticos, que teriam mais a
caía, eram prêsa de gripe e pneumonia. Havia ainda o regime de duas
perder com a livre expressão política dos pracinhas, do que Getúlio
refeições, por dia: o café da manhã, às 7 horas e o jantar às 18 horas
Vargas. (EICKHOFF, 2005, p. 29).
e nada mais. A água também racionada. O espetáculo do navio era a
presença da traidora Margarida Hirschmann, locutora da “Auri-verde”,
estação alemã montada em Milão para fazer propaganda para a tropa Já no ano de 1946, depois de retornar á sua pátria, o general
brasileira. Espetáculo de descaramento e quase certeza de impunidade. Mascarenhas de Morais fez um discurso perante a Assembléia
Depois, a melancólica arribada ao porto do Rio: chegar tropa da Itália já
era coisa vista e não interessava mais. O desejo insopitável era agarrar a Constituinte:
bagagem o mais cedo possível e sumir. E foi assim que, ali, no armazém
13 do cais do porto do Rio, desliguei-me para sempre, melancólica e Regressamos com feridas ainda sangrando dos últimos encontros,
silenciosamente do que restava da FEB. Ainda envolvi o James Parker mas nunca pela nossa atuação e prestígio e o nome do Brasil
num último olhar de pesar e de saudade: ele representava o ponto final periclitaram ou foram comprometidos. É bem verdade e vale a pena
numa história de sacrifícios, sem nenhuma paga, a não ser a consciência afirmar que preço bem alto pagamos por esse resultado. O sangue
do dever cumprido. (MORAIS, 1949, p. 418). dos nossos bravos camaradas tingiu de vermelho estas belas e
verdes montanhas dos Apeninos e algumas centenas de nossos
valentes companheiros já não retornaram à Pátria conosco, porque
Apesar disso, os primeiros escalões da FEB foram recebidos com
dormem o sono eterno sob as terras úmidas e verdejantes das
júbilo e entusiasmo pela população brasileira. Desfiles, e cerimônias planícies toscanas. Não foram muitos os meses que aqui passamos.
festivas foram realizadas para saudar os heróis da guerra, que retornavam Muitos foram, entretanto, os triunfos incorporados ao nosso rico
patrimônio e às nossas belas tradições militares. Camaiore,
a pátria após cumprir seu dever no solo estrangeiro. Monteprano e Barga, no vale do rio Sercchio; Monte Castelo, La
Nossos pracinhas lutaram em uma guerra contra o autoritarismo, Serra, Castelnuovo, no vale do rio Reno; Zocca, Marano do Panaro,
no vale do rio Panaro; Colecchio e Fornovo di Taro, na rica planície
enquanto paradoxalmente o Brasil vivia um sistema semelhante. Temendo
do Pó; esses nomes se inscreveram por certo entre aqueles que
talvez, acelerar as mudanças que pairavam no ar, o governo de Getúlio recebem o culto das gerações patrícias, porque na Itália, como nos
desmobilizou a FEB quando estava ainda na Itália. Tão logo regressaram campos de batalha sul americanos, o Exército brasileiro se mostrou
digno dos seus antepassados e à altura do conceito que os seus
ao Brasil, os pracinhas que permaneceram nas Forças Armadas foram chefes e soldados de outrora firmaram com a espada e selaram com
transferidos para as várias organizações militares espalhadas pelo país. sangue dos seus legítimos e sempre venerados heróis. (BIOSCA,
1950, p.13).

Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná 23 | História | 2009


O Capitão da Reserva, Roger de Carvalho Mange21, recorda sua os quartéis, os pracinhas constataram ao chegarem às Unidades, que
experiência na Itália: suas bagagens haviam sido violadas. Grande parte de seus pertences
foi roubada, conforme narra o ex-combatente, já citado anteriormente,
Finalmente, nos meses que vivemos na Itália, pudemos apreciar, em
toda a sua extensão, a triste condição a que fica reduzida uma nação Paulo Dumangin Santos:
que despreza as liberdades fundamentais de seus cidadãos e se deixa
governar por um regime autoritário. Esta experiência, que vivemos e Procurando saber logo na chegada da FEB sobre a nossa bagagem
sentimos de perto, deve, pois, ser difundida para orientar a evolução restante, tivemos o desgosto de ser informados que até o porto tudo
política do nosso povo, fazendo que todos sintam que a liberdade viera bem e disto tenho certeza, mas que no Rio ainda, a bagagem de
não é apenas um direito, mas sim uma obrigação. A todos compete quase todos, inclusive dos que vieram de navio, na maioria havia sido
defendê-la – aqueles que abdicam dela, que dela se deixam espoliar, violada; os sacos abertos a canivete e deles retiradas as melhores
acabam levando seu país à ruína. Portanto, a melhor homenagem que lembranças que os nossos companheiros haviam trazido com tantas
podemos prestar, o melhor reconhecimento que podemos demonstrar dificuldades, através dos combates, pela Itália. De uns, os troféus que
aos nossos compatriotas que tombaram e àqueles que sacrificaram tiveram permissão para trazer. De outros, as lembranças compradas
a sua integridade física, é lembrar ao Brasil, bem nítidas, essas em Roma ou Florença durante as curtas folgas de combate e à custa
noções, porque só assim poderá ser aproveitada a capacidade de de economias, para serem dadas à noiva ou à mãe ou à irmã. Outros,
nosso povo, fazendo-o trabalhar, num ambiente de organização e de como, eu, nem mesmo o saco violado, receberam; levaram tudo. As
disciplina, que lhe permita a salvaguarda e o exercício das liberdades lembranças que pude trazer no avião estão comigo; as outras ...
individuais e o seu desejado desenvolvimento econômico e cultural. (SANTOS, 1949, p. 310).
(MANGE, 1949, p. 136).
E aos poucos o entusiasmo popular foi acabando, quase ninguém
Depois de sete meses no front, totalizando 239 dias em combate, mais se interessava pelas histórias de guerra. Alguns até desconfiavam
o saldo da vitória brasileira foi de aproximadamente 450 mortos, 1.500 da real importância das FEB na Itália: “Surgiam, agora, desconfianças
feridos e quase 60 desaparecidos. O preço a ser pago pelos que voltaram resultantes do reforçado regime alimentar americano [...] – ‘Voltaram até
vivos para casa, foi a difícil readaptação à vida civil, a superação dos mais gordos! Devem ter ficado de sombra e água fresca!’.”(EICKHOFF,
traumas psicológicos adquiridos na guerra e, a demorada recolocação 2005, p. 31).
profissional. Levou quase 50 anos para que seus direitos e benefícios A reintegração social dos veteranos da FEB no pós-guerra não foi
fossem concedidos pelo governo brasileiro. fácil. Muitos sofreram de diversas doenças e traumas decorrentes da
guerra, é o que conta o General Raul da Cruz Lima Junior:
2.3. A vida dos pracinhas no pós-guerra
A grande maioria, no entanto, teve problemas ao reintegrar-se na
A realidade bateu à porta dos combatentes da FEB já na chegada vida da paz. As neuroses de guerra tiveram as manifestações mais
extravagantes em grau, maior ou menor, naqueles organismos que
ao Brasil. Após as comemorações da vitória, os primeiros reveses não sofreram, diretamente, os horrores da guerra. Com o passar do tempo,
tardaram em aparecer: já no desembarque e transporte das tropas para todavia, as marcas foram desaparecendo e a vida se normalizando.

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Uma pequena parcela foi para os hospitais neuropsiquiátricos. Alguns dou por muito feliz, porque muito companheiro meu teve conseqüências
ficaram confinados permanentemente, morrendo e desaparecendo bem piores do que a minha. (MAXIMIANO, 2004, p. 362).
aos poucos. Irrecuperáveis, o seu destino foi mais cruel. Outros,
após uma temporada em hospitais, foram devolvidos à vida comum,
Com o passar do tempo, diversas histórias de ex-combatentes que
porém, em estado precário. (LIMA JUNIOR, 1982, p. 203).
tiveram de submeter-se a tratamentos psiquiátricos começaram a surgir,
Outro problema enfrentado pelos ex-combatentes foi a dificuldade contadas muitas vezes por eles mesmos e algumas outras por jornalistas.
de conseguir emprego. Até mesmo aqueles que possuíam um ofício antes Com base nisso, foi criada ainda em 1945, na cidade do Rio de Janeiro,
de ir à guerra, foram demitidos logo em seguida. Apesar de terem seu a Associação Nacional dos Ex-Combatentes. Formulada a partir de uma
retorno assegurado por lei, as demissões eram alegadas por desajuste, idéia concebida ainda na Itália, para melhor atender as necessidades dos
incompetência, neuroses e outros vários problemas. pracinhas que contraíram traumas de guerra. “Posteriormente, outras
Muitos pracinhas morreram logo após o retorno ao Brasil. Alguns em associações de ex-combatentes surgiriam em diversas capitais e cidades,
decorrência de ferimentos de guerra e outros, tiraram sua própria vida todas filiadas a do Rio de Janeiro.” (EICKHOFF, 2005, p. 32-33).
devido aos traumas sofridos, é o que relata o ex-combatente da FEB, O ex-combatente curitibano, Hílio Alves, relembra: “Pensamos
Luis Paulo Bonfin: uma coisa, mas foi muito diferente, o governo não deu muito valor
aos combatentes da FEB” (ALVES, 2008).22 Já no ano de 1946, o
Uma prima em primeiro grau, que se casou com um cabo do 6º RI,
ficou viúva quatro anos depois dele voltar, passar todo esse tempo descumprimento das leis de amparo aos pracinhas, prometidas a
entrando e saindo de hospitais psiquiátricos até ele ir para o fundo eles antes de irem à guerra, era tema de discussão na Assembléia
do quintal e meter uma bala na cabeça. Nos dois anos em que fui
Constituinte. E por muitos anos seguintes este problema continuou sendo
presidente da Associação Nacional dos Veteranos da FEB – RJ, sete
ex-combatentes aqui no Rio cometeram suicídio. (MAXIMIANO, um obstáculo enfrentado: o problema não era exatamente a legislação
2004, p. 361). vigente, mas sim a falta de seu cumprimento. Vale lembrar que a grande
maioria dos pracinhas que foram convocados, provinha de condições
Segundo EICKHOFF, “qualquer veterano se sente ofendido se o
inferiores. Eles possuíam pouca instrução, resultando, portanto, no
chamam de ‘louco de guerra’ ou algo parecido. Mas de forma geral,
desconhecimento da legislação que os amparava. “Até o início da década
os pracinhas admitem terem sido vítimas das ‘neuroses de guerra’.”
de 1990, as associações de ex-combatentes, a imprensa e os políticos
(EICKHOFF, 2005, p. 32). Conforme o relato do Sd Antônio Corrêa do
ainda denunciavam o constante abandono dos veteranos.”(EICKHOFF,
11º RI, as seqüelas da guerra permaneceram por décadas:
2005, p. 33).
Quando eu voltei da guerra, eu tinha medo de dormir. Não queria Várias leis de apoio foram sendo criadas ao longo dos anos, até
dormir porque toda noite eu iria estar novamente na guerra. Ia sonhar
chegarem finalmente na conhecida “Lei da Praia”23, criada na década de
com a guerra! Graças a Deus passou isso tudo. [...] Mas eu sofri
muito, fiz tratamento de neurose, entende, sofri demais. Mas ainda me 1960. De acordo com esta, todos que haviam sido enviados à “zona de

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guerra” teriam direitos a pensões, auxílios e promoções, que na realidade eu não recebia dos cofres públicos. Mas eu já recebia a aposentadoria
do Município. Mas mesmo assim o Exército era obrigado a me pagar,
eram direitos reservados àqueles que de fato, foram enviados à guerra
estava na lei. Entrei na justiça, e somente após 11 anos, com a ajuda
na Europa. O problema foi que, em todo o litoral brasileiro, cidades de um desembargador, passei a receber a minha pensão, e sem os
economicamente importantes e vias navegáveis, se encontravam dentro atrasados [...]. (LASCALÉIA. ap. EICKHOFF, 2005, p. 36).

dessa “zona de guerra”. O resultado foi que, tanto os combatentes


E ainda segundo Renato Eickhoff, apesar do manifesto demonstrando
que estiveram no front, correndo todos os riscos de vida, quanto PMs,
seu descontentamento com o Exército, o Senhor Lascaléia “reconheceu
bancários e servidores públicos, que haviam sido transferidos para
haver muita ‘malandragem’ por parte dos cidadãos mal intencionados
alguma cidade litorânea do Brasil, teriam os mesmos direitos. Resultado:
[...], e que por isso o Exército deveria se precaver. Reconheceu também,
se essa lei beneficiou de fato os ex-combatentes, também fez o mesmo
ser o Exército uma nobre instituição, da qual teve muito orgulho de um
a tantos outros que até hoje usufruem polpudas pensões.
dia ter pertencido.” (EICKHOFF, 2005, p. 36).
Somente em fins da década de 1980, mais precisamente na
Atualmente, existem mais de duas centenas de monumentos
Constituição de 1988, que os pracinhas consolidaram os dispositivos de
erguidos à FEB, em aproximadamente duzentos municípios. Praças e
seu amparo, garantindo-lhes uma pensão digna e o reconhecimento da
ruas do Expedicionário abriram-se por todo o Brasil. Exemplo disso é
sociedade. Infelizmente, para alguns tais benefícios vieram tarde demais.
Curitiba, que construiu o “Museu do Expedicionário”, um “belo edifício de
E para os outros contemplados, muitos ainda tiveram dificuldades em seu
concreto que tem na parte superior um grupo de figuras representando
processo de requisição da pensão, conforme relata o veterano Newton
uma patrulha de reconhecimento, em que um ferido está sendo assistido
Lascaléia:
por um companheiro; [...] uma obra artística de Humberto Cozzo”.
[...] Para quem voltou bem, foi uma aventura bonita. Agora o que (COSTA, 1976, p. 85).
não houve foi o reconhecimento do Exército. Por incrível que pareça
depois que nós voltamos, nós continuamos numa guerra com o Panteons ou arcos de triunfo, hermas e estátuas, marcos, placas
Exército. Você veja que coisa interessante, todos os países deram ou obeliscos; de bronze, mármore, concreto ou granito; concebidos
atenção para quem serviu ao Exército. O nosso direito à pensão com talento artístico ou grotescos e bizarros; com dizeres ingênuos,
só saiu em 1988, 43 anos depois. E assim mesmo o Exército fez pretensiosos ou expressivos, os monumentos aí estão pelo Brasil a
de tudo para não cumprir a lei. No meu processo com o Exército, o fora, mostrando a eternidade da FEB. (COSTA, 1976, p. 85).
procurador federal que o representava disse que eu não merecia, que
a documentação que eu apresentava era falsa, e que “não sei o quê, Quando a FEB regressou ao Brasil, deixou seus soldados que
e o que não sei o que lá”, ou seja, só para protelar. Disse ainda que
morreram pela causa aliada, enterrados no cemitério de Pistóia, próximo à
eu poderia ter entrado com o processo antes, e que não o fiz, por
“malandragem”, somente para acumular juros. Isso era tudo mentira, Florença. Posteriormente, as cinzas de seus corpos foram transportadas
porque eu procurei o Exército, mas eles não quiseram aceitar meu de Pistóia para o Brasil e, hoje repousam no Monumento aos Mortos,
requerimento, só o aceitariam se eu assinasse um termo que dizia que
erguido em 1960, no Aterro da Glória, no Rio de Janeiro.

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Finalmente, determinou o governo brasileiro, num gesto de muito economicamente dos Estados Unidos, a maior potência aliada.
reconhecida gratidão, [...] recolher os restos mortais dos bravos
E em segundo, pelas mais diversas dificuldades enfrentadas pelo país,
que jazem em Pistóia, os quais, em breve, estarão repousando no
próprio seio da Pátria, que se engalana para recebê-los com pompa. deste a formação até o envio da Força Expedicionária Brasileira para o
(BRANCO, 1960, p. 497). front italiano.
O Brasil não estava economicamente, tecnologicamente e
Enfim, hoje em dia quase todos os quartéis do Exército ostentam
culturalmente preparado para entrar na Segunda Guerra Mundial. Não
algum monumento em homenagem aos pracinhas da FEB, considerados
havia um envolvimento ideológico suficiente para tal, nem do governo
como um grande orgulho para a nação brasileira, pelos seus feitos e
e nem da sociedade. A criação da FEB foi um resultado muito mais
coragem em solo italiano.
político, do que ideológico e militar.
Suas memórias estarão gravadas para sempre no imaginário
A formação e a preparação das tropas brasileiras aconteceram de
nacional, e na construção da história do Brasil.
forma muito precária e peculiar. O corpo expedicionário era constituído
CONCLUSÃO por soldados vindos das mais diversas situações de miséria, muitos
analfabetos e de saúde debilitada. O treinamento foi deficiente,
A Segunda Guerra Mundial definitivamente representou uma refletindo posteriormente na chegada ao Teatro de Operações Europeu.
das maiores catástrofes vividas pela sociedade contemporânea. Suas Os pracinhas brasileiros aprenderam da pior maneira possível, ou seja,
conseqüências atingiram todos os continentes do globo, resultando em nos campos de batalha, diante do inimigo e do fogo cruzado.
milhares de soldados e civis brutalmente mortos em nome de ideologias, Foram inúmeras as dificuldades enfrentadas pela FEB, mas seus
muitas vezes por si desconhecidas. soldados superaram todas as deficiências, resultando nas várias vitórias
O horror da guerra esteve constantemente estampado nos campos que prestigiaram a nação brasileira e que trouxeram o respeito das
de batalha, nas cidades destruídas, no extermínio dos judeus, nos corpos tropas aliadas. Monte Castello, Castelnuovo, Montese e Fornovo foram
inválidos e nas famílias que ficaram sem pai, marido ou filho. Mas este algumas das conquistas brasileiras que contribuíram para o fim da guerra
não seria seu limite, pois a sociedade mundial ainda viria a sofrer suas e a derrota do Eixo.
conseqüências por muitos anos posteriores. Infelizmente, os pracinhas da FEB não foram reconhecidos pelas
A participação do Brasil neste conflito marca um capítulo muito autoridades brasileiras, sendo desmobilizados antes mesmo de voltarem
importante da nossa história. Em primeiro lugar, pelo contexto social e para o Brasil, pois representavam uma ameaça para a ordem política e
político em que a nação se encontrava no período. Vivíamos a ditadura de social do país. Alguns dos ex-combatentes foram enviados para as mais
Getúlio Vargas, assumidamente severa e totalitária, o qual não escondia diversas áreas do país, em quartéis distantes, onde não oferecessem riscos
sua simpatia pelas ideologias dos países fascistas, mas que dependia ao alto escalão do Exército, que também temiam rebeliões internas.

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Os destinos dos pracinhas que voltaram para suas casas foram com alguns ex-combatentes paranaenses. Apesar da grande dificuldade
inúmeros: alguns ficaram desempregados, alguns doentes, e outros de relembrar momentos tão difíceis, os senhores Antonio Ribeiro,
até se suicidaram. Mas o que se sabe ao certo, é que por muitos anos Hílio Alves e Flávio Costa, concederam algumas de suas memórias e
ficaram sem receber apoio das instituições governamentais brasileiras. lembranças de suas participações na Segunda Guerra Mundial, que
Somente, após muita luta no decorrer de vários anos é que conseguiram muito contribuíram para a realização deste trabalho e para a construção
enfim receber suas merecidas pensões. de uma nova análise. Mas muito importante ressaltar a dificuldade
Atualmente, a Força Expedicionária Brasileira conta com pouco em obter estas fontes, pois dificilmente os pracinhas se dispõem em
mais de três mil veteranos ainda vivos em todo o Brasil. Em Curitiba conceder entrevistas, pois, as lembranças da guerra muitas vezes lhes
são pouco mais de cinqüenta pracinhas, que se reúnem semanalmente trazem sofrimento e tristeza.
no Museu do Expedicionário, para conversar e receber a todos que Enfim, através dos mais diversos relatos de ex-combatentes, alguns
quiserem compartilhar de suas histórias. O museu foi criado para destes em entrevista pessoal, outros obtidos em fontes secundárias, foi
preservar a memória e homenagear os pracinhas paranaenses. Várias possível constatar a importante trajetória da FEB na Segunda Guerra
solenidades também são realizadas no museu, como a de oito de maio, Mundial, de seu sofrimento até sua glória. Foram mais de duzentos dias
em comemoração ao dia da vitória: em solo italiano que ficarão para sempre gravados na memória e na vida
dos pracinhas brasileiros.
Aconteceu na manhã de ontem, na Praça do Expedicionário, em
Curitiba, as comemorações do dia da vitória. Na ocasião, houve a Finalmente, no caso das diversas pesquisas de história oral, que
condecoração de personalidades que prestaram serviços à Força utilizam entrevistas, sobretudo entrevistas de história de vida, é
Expedicionária Brasileira (FEB). [...] “Este tipo de reconhecimento obvio que o que se recolhe são memórias individuais, [...]. Em certo
e lembrança é muito importante para preservar a luta dos homens sentido, determinado número de elementos tornam-se realidade,
paranaenses. Muitos morreram, mas vários ainda estão aqui. passam a fazer parte da própria essência da pessoa. [...] A memória
É importante que não sejamos esquecidos”, falou Mieceslau é seletiva. Nem tudo fica gravado. Nem tudo fica registrado [...]
Tychanowicz, ex-combatente. Na solenidade foram feitas homenagens a memória é um fenômeno construído [...]. Podemos, portanto,
aos 28 veteranos paranaenses mortos em combate na Itália durante dizer que a memória é um elemento constituinte do sentimento de
a Segunda Guerra Mundial. (JÉFERSON, 2008, p. 6). identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que ela é
também um fator importante do sentimento de continuidade e de
Finalmente, após décadas de luta, os ex-combatentes foram coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si.
reconhecidos pela sociedade, pelo governo e também pelo Exército que (POLLAK, 1992, p. 1-2-4-5).
mantém viva a participação da FEB na guerra, prestando-lhe homenagens
e reconhecimento.
Em uma visita ao Museu do Expedicionário de Curitiba, num dos
encontros que são realizados semanalmente, foram feitas entrevistas

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Notas de Rodapé
1
A Primeira e Segunda Guerra Mundial envolveram as maiores potências do mundo inteiro e suas batalhas se estenderam por vários Continentes,
é o que afirma RÉMOND: “A Primeira Guerra já apresentava, em relação aos conflitos do século XIX, uma amplitude territorial muito superior
[...]. A amplitude territorial da segunda é maior ainda, pois o numero dos países que permanecem à margem das hostilidades é ainda mais
reduzido.”(RÉMOND, 1974, p. 123).
2
Segundo Hobsbawm, o “Tratado de Versalhes não podia ser a base de uma paz estável. estava condenado desde o início, e portanto outra guerra
era praticamente certa.”(HOBSBAWM, 2001, p. 42).
3
A Liga das Nações foi uma organização internacional criada em 1919, destinada à preservação da paz e à resolução dos conflitos internacionais.
4
“A Liga das Nações foi de fato estabelecida como parte do acordo de paz e revelou-se um quase total fracasso [...]. Contudo, em seus primeiros
dias resolveu uma ou duas disputas menores, que não punham a paz mundial em risco, [...]. Porém a recusa dos EUA a juntar-se à Liga das Nações
privou-a de qualquer significado real.” (HOBSBAWM, 2001, p. 42).
5
No início, trata-se de um golpe de Estado militar. “Em 1931, a república sucedera à monarquia. Havia cinco anos que a Espanha era uma república:
cinco anos perturbados [...] e onde se haviam sucedido dois anos de governo da esquerda, depois dois anos de governo da direita, 1934 a 1936.”
(RÉMOND, 1974, p. 115).
6
Os Esquadrões de Caça eram conhecidos como Raf (Real Força Aérea).
7
Existiram mais de 5 mil campos de concentração espalhados pela Europa, sendo o mais conhecido o campo de Auschwitz, no sul da Polônia. Só
este foi responsável pela morte de aproximadamente 2 milhões de judeus, vítimas das câmaras de gás, dos fuzilamentos, do trabalho forçado, da
fome e de doenças.
8
Júlio Prestes conseguiu a vitória, mas ela foi negada pela Aliança (nome dado aos aliados gaúchos, mineiros e paraibanos), que alegavam fraudes
eleitorais. Os estados aliados, principalmente o Rio Grande do Sul, arquitetaram uma revolta armada. A situação piorou ainda mais, quando o
candidato a vice-presidente de Getúlio Vargas, João Pessoa, foi assassinado em Recife, capital de Pernambuco. Como os motivos não foram apenas
pessoais, mas também políticos e econômicos acentuados pela grande crise de 1929, a indignação aumentou, e o Exército – que era contrário ao
governo vigente desde o tenentismo – se mobilizou a partir de 3 de outubro de 1930. No dia 10, uma junta governamental foi formada pelos generais
do Exército. No mês seguinte, o poder foi passado para Getúlio Vargas.

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9
Ele criou, por exemplo, novos ministérios – como o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e o Ministério da Educação e Saúde – e nomeou
interventores de estados. Na prática, os estados perdiam grande parte da sua autonomia política para o presidente.
10
Corrente que defendia o fascismo no Brasil, liderada por Plínio Salgado.
11
Corrente que defendia a revolução socialista no Brasil através da Intentona Comunista, liderada por Luiz Carlos Prestes e Olga Benário.
12
Informação extraída pelo autor Fernando Jorge da obra “Memórias”, escrita em 1969 pelo Marechal Mascarenhas de Morais.
13
O Ministério da Aeronáutica foi criado em 20 de janeiro de 1941, tendo como primeiro titular o civil Joaquim Pedro Salgado Filho. O novo ministério
englobou o Departamento de Aeronáutica Civil e as já existentes aviações militar (do Exército) e a aviação naval (da Marinha). O pessoal oriundo
das duas últimas passou a compor a Força Aérea Brasileira.
14
Capitão da Reserva, Infantaria. Convocado em dezembro de 1942, como 2º Tenente e classificado no 6º R.I., seguiu com o 1º Escalão da FEB, como
Oficial de Informações do II Batalhão do 6º R.I., onde permaneceu toda a campanha. Médico na vida civil.
15
“Tropa de elite alemã que combateu no norte da África a comando do Marechal Rommel, que ficou conhecido nessa fase da campanha como raposa
do deserto.” (EICKHOFF, 2005, p. 24).
16
O Senhor Flávio contava entusiasmado os feitos de seu regimento, em uma entrevista realizada pessoalmente, em um encontro de ex-combatentes
de Curitiba.
17
1º Tenente de Infantaria, nascido em Taquaritinga – SP. Convocado como 2º Tenente, em 1943, seguiu no 1º Escalão da FEB, com o 6º R.I., como comandante
de pelotão de metralhadoras, passando depois a comandante de morteiros. Promovido a 1º Tenente em 15 de fevereiro de 1945. Ferido no ataque ao Monte
Castello em 26 de novembro de 1944. Medalhas “Sangue do Brasil”, “Cruz de Combate”, “de Campanha” e “de Guerra”. Bacharel em direito.
18
Em uma conversa com o major Antonio, ele relembrou muito emocionado, sua pior experiência na Segunda Guerra Mundial.
19
Berta Morais foi 2ª Tenente-Enfermeira. Voluntária da FEB, foi incorporada em 5 de abril de 1944. Natural de São Paulo, cursou Enfermagem
Hospitalar e Enfermaria da Reserva do Exército. Embarcou em agosto de 1944 e foi desmobilizada em dezembro de 1945. Recebeu Medalhas de
Campanha e de Guerra.
20
1º Tenente da Reserva, Infantaria. Voluntário da FEB. Embarcou com o escalão do Recompletamento de Pessoal, e transferido para o 6º R.I. durante
o combate de Montese. Assumiu posteriormente, o comando do 3º Pelotão. Recebeu medalhas de Campanha e de Guerra. Advogado na vida civil.

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21
Roger de Carvalho Mange foi Capitão de Reserva da Infantaria da FEB. Convocado em dezembro de 1942, como 2º Tenente e classificado no 6º
R.I. Promovido a 1º Tenente em setembro de 1943. Seguiu no 1º Escalão da FEB, como comandante de pelotão de Metralhadoras. Medalhas: Cruz
de Combate 2ª classe, de Campanha e de Guerra. Desconvocado em julho de 1945. Advogado.
22
O Senhor Hílio relembra em entrevista concedida, os problemas enfrentados referente ao descaso com os ex-combatentes.
23
LEI nº 5.315, de 12 de dezembro de 1967.

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COSTA, Flávio. Entrevista concedida a Ketrim Daiana Mocelin. Curitiba, 28 maio. 2008.

RIBEIRO, Antonio. Entrevista concedida a Ketrim Daiana Mocelin. Curitiba, 28 maio. 2008.

Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná 33 | História | 2009

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