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MICROBIOLOGIA 2016
Arlindo Ugulino Netto.
Para se discutir os mecanismos genéticos da resistência antimicrobiana, deve-se antes conhecer o genoma
bacteriano, uma vez que a multirresistência de uma bactéria está ligado à genes cromossomais da mesma. O genoma
representa o conjunto do material genético que uma célula apresenta.
A organização genômica das bactérias é dinâmica e
composta por diferentes modalidades de moléculas de DNA:
cromossomo, plasmídeos, transposons e bacteriófagos. O
cromossomo bacteriano contém todos os genes requeridos para o
metabolismo e ciclo vital da bactéria. Plasmídeos, transposons e
bacteriófagos são entidades moleculares independentes que
ocorrem indistintamente em diferentes grupos bacterianos e que
funcionam como elementos genéticos acessórios. Os genes que
transportam não são essenciais à sobrevivência da bactéria, mas
podem condicionar características tais como fatores de virulência,
resistência a agentes antimicrobianos, bacteriocinas, toxinas, fixação
de nitrogênio e utilização de fontes não usuais de carbono. Tais
características adicionais podem ter importância adaptativa em
determinadas situações. Todo material genético de uma bactéria,
seja constitutivo ou acessório, está em contato direto com o
citoplasma. Em processos de divisão (a cada 20 minutos), uma
bactéria copia totalmente seus genes para a nova bactéria, o que
explica a dificuldade de se controlar processos infecciosos.
Cromossomos e plasmídeos constituem replicons, ou seja,
unidades moleculares capazes de replicação autônoma.
Transposons e bacteriófagos não são capazes de replicação
autônoma e precisam estar inseridos em um replicon para se
duplicarem.
A figura acima mostra um mapa gênico de uma célula procariótica. A célula bacteriana tem cerca de 2400 genes
codificantes de proteínas necessárias para sua sobrevivência.
Além do cromossomo, uma célula bacteriana pode conter uma ou mais estruturas de DNA, chamadas
plasmídeos - moléculas de DNA de fita dupla menores que os cromossomos e que podem replicar-se
independentemente destes.
Outra diferença é o cromossomo da célula eucariótica, que é predominantemente constituído por íntons
(sequências não codificadoras) do que por éxons (sequência codificadora). Já o cromossomo bacteriano apresenta uma
grande maioria de éxons em relação aos íntrons (que são quase raros).
As bactérias, como já foi dito e será discutido, possuem, além do seu cromossomo único e circular imerso no
citoplasma, os seguintes elementos: plasmídeos, vírus e transposons.
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PROCARIOTOS
O Reino Monera reúne os organismos procariontes, unicelulares, coloniais ou não, de vida livre ou parasita,
autótrofos (fotossintetizantes ou quimiossintetizantes) ou heterotróficos que se alimentam por absorção.
Mesmo possuindo uma estrutura e organização celular rudimentar, uma tendência evolutiva desde o primórdio
dos seres vivos, essas demonstram um grande potencial biológico, coexistindo em todos os tipos de ambientes, seja
terrestre, aéreo ou aquático.
Esse Reino compreende as bactérias e algas azuis (atualmente denominadas de cianobactérias). Devido à
contribuição da Biologia molecular esse Reino passou a ser classificado em dois sub-reinos de organismos procarióticos
bem diferentes: Eubactérias e Arqueas (Archaeobactérias).
As arqueobactérias são muito semelhantes às eubactérias e só foram diferenciadas destas há poucas décadas,
graças ao desenvolvimento das técnicas de análise molecular. Uma diferença importante entre arqueas e bactérias é
quanto a constituição química da parede célular. As arqueas não apresentam, em sua parede celular, o peptidoglicano,
constituinte típico das bactérias. As arqueobactérias podem ser dos seguintes tipos:
Arqueobactérias metanogênicas;
Termófilas extremas: vivem em condições extremas de temperatura (600ºC);
Halófilas extremas: vivem em condições extremas de salinidade (NaCl a 25%).
PLASMÍDEOS
São moléculas extracromossomais circulares de DNA autorreplicativo encontradas em muitas espécies
bacterianas e em algumas espécies de eucariotos (ex: o anel de 2-micra em Saccharomyces cereviesiae). São
geralmente moléculas de DNA de fita dupla em forma de círculos fechados e passam às células-filha durante a divisão
celular. Quando o plasmídeo está integrado ao cromossomo, recebe outro nome: epíssomo.
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OBS : Os epissomas são plasmídeos que conseguem se integrar no DNA cromossómico do hospedeiro. Por essa razão,
podem permanecer intactos durante muito tempo, ser duplicados em cada divisão celular do hospedeiro, e transformar-
se numa parte básica da sua constituição genética.
A maioria das bactérias conhecidas transporta um ou mais tipos de plasmídeos. Os genes que transportam não
são essenciais à sobrevivência da bactéria, mas podem condicionar características adicionais tais como fatores de
virulência, resistência a agentes antimicrobianos, bacteriocinas, toxinas, fixação de nitrogênio e utilização de fontes não
usuais de carbono. Muitas das características condicionadas por genes plasmidianos contribuem para a adaptabilidade
da bactéria em condições especiais. As bactérias não constroem seus próprios plasmídeos, mas os adquirem através do
fenômeno da conjugação bacteriana, na qual uma bactéria transportando um plasmídeo o transfere para uma outra
bactéria, mantendo para si uma cópia deste.
REPLICAÇÃO DO PLASMÍDEO
A replicação dos plasmídeos pode ser de dois tipos: por replicação de entidades independentes ou por
replicação de epíssomo integrado.
A replicação do plasmídeo também pode ocorrer em dois momentos: (1) quando a célula bacteriana se divide, o
DNA plasmideal também se divide, assegurando que cada célula filha receba uma cópia deste; (2) durante o processo
de conjugação, a molécula de DNA replicada pode entrar na célula receptora.
TIPOS DE PLASMÍDEO
Existem dois grupos básicos de plasmídeos: os conjuntivos e os não-conjuntivos. Os plasmídeos conjuntivos
contém um gene chamado tra-gene, que pode iniciar a conjugação, isto é, a troca sexual de plasmídeos com outra
bactéria. Os plasmídeos não-conjuntivos são incapazes de iniciar a conjugação e, por esse motivo, o seu movimento
para outra bactéria, mas podem ser transferidos com plasmídeos conjuntivos durante a conjugação.
Plasmídeos de Fertilidade (F): contém apenas tra-genes. A sua única função é a iniciação da conjugação
bacteriana. A bactéria que apresenta o plasmídeo F (chamada de F+ ou macho) tem a capacidade de produzir
fímbrias associadas na reprodução sexuada com outras bactérias. A bactéria receptora é denominada F-.
Plasmídeos de Resistência (R): contém genes que os tornam resistentes a antibióticos ou venenos, ou seja, é
responsável pela resistência da bactéria a antimicrobianos.
Plasmídeos Col: contém plasmídeos que codificam (determinam a produção de) colicinas, proteínas que podem
matar outras bactérias, inibindo o crescimento de outras células que não possuem esse plasmídeo.
Plasmídeos Degradativos: permitem a digestão de substâncias pouco habituais, como o toluole ou o ácido
salicílico, ou até mesmo derivados do petróleo (sendo usados para limpar poluições causadas por vasamento
destes produtos).
Plasmídeos de Virulência: transformam a bactéria num agente patogênico, estando associado então, a
patogenicidade da bactéria. Como por exemplo o plasmídeo Ti da bactéria Agrobacterium tumefaciens, que é
usado atualmente na genética para a produção de plantas transgênicas.
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TRANSPOSONS
Transposons são fragmentos de DNA linear. Os transposons são elementos
genéticos móveis capazes de se inserirem em diferentes pontos do cromossomo
bacteriano. Após inserir-se em um determinado sítio do cromossomo, o transposon
pode deixar uma cópia neste sítio e inserir-se em outro ponto do cromossomo, um
fenômeno denominado transposição.
A transposição ocorre devido à presença, no transposon, de sequências específicas de DNA denominadas
sequências de inserção (IS). As IS são pequenas sequências de DNA que codificam a enzima transposase, responsável
pela transposição. Quando o transposon se liga ao cromossomo da bactéria, isso a confere uma maior mutagenicidade
(por induzir mutações) bem como o isolamento de parte de seu material genético (“DNA egoísta”).
Os transposons codificam uma ou mais proteínas que conferem características como resistência a drogas
antimicrobianas, enterotoxinas e enzimas degradativas. Os transposons possuem genes de resistências, como por
exemplo, a TN1AMP (resistente à ampicilina).
TRANSFORMAÇÃO BACTERIANA
Ocorre pela absorção de moléculas ou
fragmentos de moléculas de DNA que estejam dipostos
no ambiente, proveniente de bactérias mortas e
decompostas; a célula bacteriana transformada
(receptora) passa a apresentar novas características
hereditárias, condicionadas pelo DNA incorporado.
Este não precisa ser de bactérias da mesma espécie; em princípio, qualquer tipo de DNA pode ser capturado se
as condições forem adequadas. Entretanto, um DNA capturado só será introduzido no cromossomo bacteriano se for
semelhante ao DNA da bactéria receptora.
TRANSDUÇÃO BACTERIANA
Consiste na transferência de segmentos de
moléculas de DNA de uma bactéria para outra. Isso
ocorre porque, ao formarem-se no interior das
células hospedeiras, os bateriófagos (vírus) podem
eventualmente incorporar pedaços do DNA
bacteriano. Depois de serem liberados para infectar
outra bactéria, os bacteriófagos podem transmitir a
ela os genes bacterianos que transportavam.
A bactéria infectada eventualmente incorpora em seu cromossomo os genes recebido do fago. Se este não
destruir a bactéria, ela pode multiplicar-se e originar uma linhagem "transduzida" com novas características, adquiridas
de outras bactérias via fago.
CONJUGAÇÃO BACTERIANA
Consiste na transferência de DNA
diretamente de uma bactéria doadora para
uma receptora através de um tubo de
proteína denominado pêlo sexual ou “pili”,
que conecta duas bactérias. Os “pili” estão
presentes apenas em bactérias doadoras
de DNA.
Quando a recombinação genética foi descoberta pelo biólogo Joshua Lederberg, pensou-se que se tratava de
um processo sexual comparável ao dos seres eucariontes. Por isso, na época, as bactérias doadoras de DNA foram
denominados machos e as receptoras, fêmeas. A continuidade dos estudos mostrou que a capacidade de doar DNA
está ligada à presença de um plasmídeo denominado F (de fertilidade); bactérias portadoras do plasmídeo F,
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denominadas F , atuam como doadoras de DNA e as que não possuem o plasmídeo F atuam como receptoras, sendo
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chamadas de F . Hoje se sabe que o DNA transferido de uma bactéria para outra, na conjugação, é quase sempre o
plasmídeo F. Algumas vezes, porém, um pequeno pedaço de DNA cromossômico une-se ao plasmídeo e é transferido
junto com ele na conjugação. Na bactéria receptora pode ocorrer recombinação genética entre o cromossomo e o
fragmento de DNA unido ao plasmídeo recebido da bactéria doadora.
HISTÓRICO
Como se sabe, antibiótico é uma substância que tem capacidade de interagir com micro-organismos
unicelulares ou pluricelulares que causam infecções no organismo. Os antibióticos interferem com estes micro-
organismos, matando-os ou inibindo seu metabolismo e ou sua reprodução, permitindo ao sistema imunológico combatê-
los com maior eficácia.
O primeiro antibiótico fabricado pelo homem foi a penicilina. Alexander Fleming, bacteriologista do St. Mary's
Hospital, de Londres, já vinha havia algum tempo pesquisando substâncias capazes de matar ou impedir o crescimento
de bactérias nas feridas infectadas, pesquisa justificada pela experiência adquirida na Primeira Grande Guerra 1914-
1918, na qual muitos combatentes morreram em consequência da infecção em ferimentos profundos e mal-tratados por
falta de tratamento adequado. No ano de 1922, Fleming descobre uma substância antibacteriana na lágrima e na saliva,
a qual dera o nome de lisozima. E em 1928 Fleming desenvolveu pesquisas sobre estafilococos, quando descobriu a
penicilina. A descoberta da penicilina deu-se em condições peculiaríssimas, graças a uma sequência de acontecimentos
imprevistos e surpreendentes. No mês de agosto de 1928 Fleming tirou férias e, por esquecimento, deixou algumas
placas com culturas de estafilococos sobre a mesa, em lugar de guardá-las na geladeira ou inutilizá-las, como seria
natural, ao retornar ao trabalho, em setembro do mesmo ano, observou que algumas das placas estavam contaminadas
com mofo, fato este relativamente frequente. Colocou-as então, em uma bandeja para limpeza e esterilização com lisol.
Neste exato momento, entrou no laboratório um seu colega, Dr. Pryce, e lhe perguntou como iam suas pesquisas.
Fleming apanhou novamente as placas para explicar alguns detalhes àquele colega sobre as culturas de estafilococos
que estava realizando, quando notou que havia, em uma das placas, um halo transparente em torno do mofo
contaminante, o que parecia indicar que aquele fungo produzia uma substância bactericida. O assunto foi discutido entre
ambos e Fleming decidiu fazer algumas culturas do fungo para estudo posterior. O fungo foi identificado como
pertencente ao gênero Penicilium, de onde deriva o nome da penicilina, dado à substância por ele produzida. Fleming
passou a empregá-lo em seu laboratório para selecionar determinadas bactérias, eliminando das culturas as espécies
sensíveis à sua ação. A descoberta de Fleming não despertou inicialmente maior interesse e não houve a preocupação
em utilizá-la para fins terapêuticos em casos de infecção humana até a eclosão da Segunda Guerra Mundial, em 1939.
Nesse ano e em decorrência do próprio conflito, a fim de evitarem-se baixas desnecessárias, foram então ampliadas as
pesquisas a respeito da penicilina e seu uso humano.
Em 1935, Gerhard Domark cria em laboratório a sulfa, substância com atividade antimicrobiana.
Em 1940, Sir Howard Florey e Ernst Chain, da Universidade de Oxford, retomaram as pesquisas de Fleming e
conseguiram produzir penicilina com fins terapêuticos em escala industrial, inaugurando uma nova era para a medicina
denominada a era dos antibióticos. Para a II Guerra Mundial, os antibióticos eram vistos como “Balas Mágicas”. Ainda
nesse período, menos que 1% dos S. aureus estudados eram resistentes a penicilina. Em 1946, 60% dos S. áureos já se
apresentavam resistentes à penicilina: apresentavam genes produtores de penicilinases, enzimas que quebram o anel
β-lactâmico da penicilina (responsável por matar a bactéria).
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CAUSAS DA RESISTÊNCIA
A capacidade de adaptação ao novo ambiente garante à bactéria variabilidade genética gerada por mutação e
mecanismos de transferência. As condições que favorecem a seleção e disseminação de genes de resistência aos
antibióticos são:
Uso abusivo dos antimicrobianos nos hospitais;
Venda livre/Aquisição direta pelo doente (Automedicação);
Indicação indiscriminada por médicos;
Uso como aditivo em ração animal;
A tecnologia do DNA recombinante, que gera organismos transgênicos, pode criar vetores plasmídeos
resistentes;
Pressão seletiva natural de muitos antibióticos (fungos e bactérias);
Exposição a outros agentes seletivos como mercúrio;
Fatores atuais: Maior imunodepressão (decorrente da AIDS, quimioterapia anticâncer e maior frequência de
transplantes);
Modernos meios de transportes, o que facilita o transporte de pessoas ao redor do mundo, carregando consigo
bactérias de variados meios de resistência.
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OBS : Mecanismo de Resistência:
Versatilidade Genética Aquisição de Novo DNA Mutação e Recombinação Mecanismos de Transferência do
Material Genético
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ANTIBIOGRAMA
Um antibiograma é um ensaio que mede a susceptibilidade/resistência de uma bactéria a um ou mais agentes
antimicrobianos. Seu objetivo é tanto a análise do espectro de sensibilidade/resistência a drogas de uma bactéria quanto
a determinação da concentração mínima inibitória.
O Ágar de Mueller Hinton é recomendado pelo U.S. Food and Drug Administration (FDA) e pela Organização
Mundial da Saúde (OMS) para o teste de sensibilidade/resistência a antibióticos de bactérias Gram positivas e Gram
negativas, aeróbicas ou anaeróbicas facultativas, comumente encontradas em alimentos e espécimes clínicos. O teste,
denominado antibiograma, é feito utilizando-se discos de difusão antibióticos depositados sobre a superfície do meio no
qual se inoculou, por espalhamento, uma amostra de uma cultura bacteriana previamente crescida em meio líquido.
Material: Pipetador com volume fixo de 100 µl, ponteiras esterilizadas, alça de Drigalski esterilizada, placas de
Petri contendo meio Mueller Hinton, discos de difusão de antibióticos, cultura bacteriana em Caldo Nutriente ou meio LB.
Procedimento: Semear, por espalhamento com alça de Drigalski ou com uma zaragatoa esterilizada, uma
alíquota de 100 µl da cultura bacteriana em uma placa de Petri contendo meio Ágar de Mueller Hinton. Em seguida,
depositar discos de papel filtro impregnados, separadamente, com quantidades determinadas de um antibiótico
específico sobre a superfície do meio em disposição ordenada. Incubar a placa, invertidas, a 37ºC por cerca de 24
horas.
Resultados: A formação de um halo transparente sobre a superfície do meio, ao redor de um disco de
antibiótico, indica uma região com ausência de crescimento bacteriano, revelando a ação inibitória do agente
antimicrobiano sobre a bactéria ensaiada.