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RESUMO
O trabalho discute os conceitos de Desenho Urbano e Projeto Urbano. Parte da premissa de
que ambos apresentam grandes semelhanças entre si. No Brasil, a origem do termo Projeto
Urbano é relativamente recente, e, no caso do Rio de Janeiro, coincide com a adoção do
Plano Estratégico (1993) para a cidade, o qual contraía, em muitos aspectos, premissas
anteriormente definidas pelo Plano Diretor Decenal (1992). O modelo para as novas
intervenções urbanas na cidade parece seguir as estratégias adotadas em Barcelona para
as intervenções realizadas por ocasião das Olimpíadas de 1992. Tomando como referência
os ensaios de alguns autores, são assinaladas diferenças e semelhanças de um e de outro
termo, bem como novas atitudes e procedimentos no tratamento das recentes intervenções
urbanas.
Palavras chaves: projeto urbano - desenho urbano – plano
SUMMARY
The work discusses the concepts of Urban Design and Projeto Urbano (Urban Project),
based on the premise that there are many similarities between the two of them. In Brazil, the
origin of the term Projeto Urbano is relatively recent, and, in Rio de Janeiro, coincides with
the implementation of the1993 Plano Estratégico (Strategic Plan) which opposes, in many
aspects, premises formerly defined by the 1992 Plano Diretor Decenal (Decennial Master
Plan). The model for the new urban interventions in the city appear to follow the strategies
adopted in Barcelona for the interventions at the time of the 1992 Olympics. In referring to
essays of some authors, we find highlighted, differences and as well as similarities between
one term and the other, as well as new attitudes and procedures in the treatment of recent
urban interventions.
INTRODUÇÃO
1
No início do século XX o Rio de Janeiro, então capital do país, sofreu drásticas intervenções urbanísticas na
área central da cidade, entre elas a abertura da avenida Central (hoje av. Rio Branco), a construção do novo porto
e outras tantas.A razão dessas reformas pautava-se na necessidade de abrir o país para o mercado internacional, o
que impunha uma boa aparência á cidade. Outras reformas semelhantes ocorreram em cidades como São Paulo,
Salvador, Recife etc.
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GOODEY, Brian – Percepção, Participação e Desenho Urbano (org. Vicente Del Rio), Módulo –
Universidade, volume 1, Avenir ed., Rio de Janeiro 1985
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TSIOMIS, Yanis – Projeto Urbano, Embelezamento e Reconquista da Cidade e PORTAS, Nuno –
Urbanismo e Sociedade: Construindo o Futuro, ambos autores in Cidade e Imaginação (Pinheiro
Machado, D. e Vasconcellos E.M., organizadores), PROURB-FAU-UFRJ, Rio de Janeiro,1996
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LACAZE, Jean Paul – Os Métodos do Urbanismo, Papirus (Ofício de Arte e Forma), Campinas SP,
1993
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SIMPÓSIO A ARQUITETURA DA CIDADE NAS AMÉRICAS. DIÁLOGOS CONTEMPORÂNEOS ENTRE O LOCAL E O GLOBAL, 52 ICA,
Sevilha, Julho de 2006
O plano implica numa ação, num instrumento, enquanto que o planejamento implica
num método, num processo, ou até num modelo. O planejamento urbano seria
naturalmente aquele que se refere à cidade. Como o plano implica num instrumento,
ele oferece o controle e sua execução deverá ser submetida a aspectos jurídicos,
institucionais e administrativos. Daí se falar em instrumentos de legislação
urbanística ou de controles urbanísticos, se a referência é a cidade.
A partir dessas definições, o que se poderia investigar sobre a palavra projeto? Ele
não seria o próprio plano? De certa forma sim, se considerarmos que tanto um como
outro implica numa ação e também aponta controles. Mas quando tal termo é
aplicado ao urbanismo, ele assume conotações que se diferenciam entre si,
principalmente quando se trata de um plano diretor ou de um projeto urbano – ou
ainda – do termo já esquecido, ou melhor, em desuso – desenho urbano.6
5
Definições tiradas do Dicionário eletrônico –Antonio Houaiss, versão.2001
6
O termo Desenho Urbano foi bastante divulgado na década de 1980, pela vinda do professor Brian
Goodey (Oxford Brookes University) ao Brasil e pelos Seminários sobre Desenho Urbano no Brasil,
realizados em Brasília (1984, 1986 e 1988, respectivamente) Nesses seminários, várias experiências
foram mostradas, além de inúmeros referenciais teóricos, os quais ainda vem sendo aplicados na
estruturação e análise de projetos de intervenções em espaços da cidade. O termo, porém caiu em
desuso e foi sendo gradualmente substituído por Projeto Urbano, inclusive como nome para as
disciplinas ministradas nos cursos de graduação e pós -graduação em Arquitetura e Urbanismo
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GREGOTTI, Vittorio – Território da Arquitetura, coleção Debates, Perspectiva, SP, 1972
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SIMPÓSIO A ARQUITETURA DA CIDADE NAS AMÉRICAS. DIÁLOGOS CONTEMPORÂNEOS ENTRE O LOCAL E O GLOBAL, 52 ICA,
Sevilha, Julho de 2006
Voltando ao objeto de discussão desse texto: o Projeto Urbano seria então um novo
nome para definir Desenho Urbano? Uma nova terminologia? Seria talvez um novo
método de interferência no espaço urbano?
Segundo esse autor, a planificação estratégica surge na Europa por volta da década
de 1960 e tem como pressupostos uma demanda para a urbanização rápida e cuja
escolha exige uma estratégia para que seus alvos sejam atingidos, Lacaze também
comenta o surgimento do “urbanismo de gestão”, cujo lema básico seria “tratar o
social antes do espacial”, e também o "urbanismo de comunicação”, cuja maior
preocupação seria a imagem, ou seja, como dar uma nova aparência a um setor
urbano de forma a valorizá-lo e qualifiquá-lo. Poder-se ia afirmar que certas
premissas presentes na planificação estratégica, bem como os chamados
“urbanismo de comunicação” aparecem como inspiradores da prática do Projeto
Urbano, tal qual vem sendo realizada.
Goodey (1985) define o Desenho Urbano como “uma habilidade complementar entre
arquitetura e planejamento”. Do ponto de vista espacial, trabalha numa escala
pontual, ou seja, “na terra de ninguém entre o edifício e a rua, ou o espaço entre os
edifícios”. Na escala temporal, seria uma prática que considera os vários tempos de
um determinado lugar. Em se tratando de trabalhar “pontualmente” cada setor da
cidade, essa prática permite reconhecer usuários e moradores individualizados.
Recupera-se o “sentido de lugar”, ou seja, passa-se a reconhecer a dinâmica de vida
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Ao que parece, o surgimento do Desenho Urbano ou Urban Design, foi uma primeira
proposta de reação aos grandes planos destituídos de qualquer preocupação com
os espaços da cidade, limitando-se muitas vezes a um conjunto de diretrizes de
desenvolvimento, um zoneamento genérico e uma estruturação dos eixos viários. Os
planos diretores apresentavam-se em grandes escalas, às vezes tratando de regiões
inteiras, compostas de vários municípios. Embora trouxessem recomendações e
uma legislação específica sobre o uso e ocupação do solo, a escala do lugar não era
tratada em detalhe, não havendo nenhuma referência que indicasse um projeto
específico para tratar esta ou aquela parte da cidade. Por outro lado, práticas, como
a consulta à população, eram quase sempre inexistentes.
Tsiomis (1996) questiona se o Projeto Urbano seria uma nova estratégia para a
reconquista da cidade ou seria apenas uma nova denominação para o “projeto de
embelezamento”. Parte do pressuposto de que a cidade é uma instituição.”.. uma
rede simbólica sancionada, onde se combinam relações variáveis de componentes
imaginários ou simbólicos com componentes concretos”. Assim, qualquer
interferência em um ambiente, ou seja, qualquer projeto realizado, significaria uma
interferência nos componentes simbólicos e nos componentes concretos e
funcionais.
O autor estabelece um jogo de opostos do que pode ser considerado como Projeto
Urbano e o que ele não é: afirma que o Projeto Urbano é uma nova forma de
programação, um projeto de espaço público, de embelezamento da cidade, de
melhoramento das infra-estruturas; ainda pode ser um projeto sobre vazios não
qualificados existentes entre os edifícios, ou mesmo um projeto arquitetônico em
outra escala.
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Uma outra ótica, esclarecedora, mas em muitos pontos convergente com a dos
autores acima expostos (Goodey e Tsiomis), contribui enormemente para o debate –
É a ótica do arquiteto português, Nuno Portas (1996)8.
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Sevilha, Julho de 2006
Nuno Portas chama a atenção como a maior parte dos planos municipais chegam
apenas à definição de redes estruturantes, enquanto o direito urbanístico passa a
discutir as questões de propriedade, como a sua função social, a tributação do solo,
o solo criado e tantos outros instrumentos9. Passam também a configurar no elenco
das preocupações com a regulamentação urbanística: a contrapartida das parcerias
público/privadas. O autor afirma que “o Projeto antecedendo o Plano – pode ser hoje
uma realidade”.
O Projeto Urbano pode ser visto assim como uma “tarefa de programação”, ou seja,
ele é definido a partir de uma estratégia e deve acompanhar o ato de projetar até o
final. Nesse sentido, o autor afirma que Projeto Urbano nada mais é do que uma
intervenção urbanística - “...que visa reduzir a incerteza residual do planejamento – e
por isso merece o nome de projeto”.
O autor, assim como Tsiomis, apresenta uma relação de opostos, tentando definir
Projeto Urbano como o que ele não é – para depois definir o que ele é.
Assim, o Projeto Urbano não trata de - “...um “zoom” generalizado sobre os planos
diretores municipais, nem um “truque” para se dar forma ao zoneamento”. Enfatiza a
necessidade de se identificar os proprietários- “quem está disposto a investir e em
que e quando e para quem está voltada a intervenção”.
O autor ainda questiona o termo Desenho Urbano, afirmando que “... não é a mesma
coisa que Projeto Urbano...”, Segundo suas palavras “...Desenho Urbano é uma
expressão que não requer um processo nem um produto, mas sim uma habilidade,
uma capacidade, um tipo de atividade criativa e técnica, que pode ter aplicação
generalizada, enquanto o projeto é um produto, fruto do desenho mas não só”...
9
O texto comentado foi editado em 1996, quando ainda não havia sido publicado o Estatuto da
Cidade: neste, outras figuras importantes foram sendo acrescidas tais como o direito de preempção, o
estudo de impacto de vizinhança etc.
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Sevilha, Julho de 2006
Afirma que o Projeto Urbano. “.. é uma atividade programada para se obter efeitos
qualitativos e funcionais que vão além de sua área e que implica numa multiplicidade
de atores, dos quais alguns são conhecidos desde a fase de “ arranque” do
processo e outros... só entram em cena para efeitos de realização”. O programa
segundo ele é portanto uma hipótese. O projeto vai fazer a verificação dessa
hipótese, e dele surgirão novas hipóteses”.
Nuno Portas conclui que não é possível hoje conceber um plano diretor em nível de
projeto, assim como não é possível conciliar os instrumentos normativos do plano
diretor com a agilidade que se requer do que está sendo chamado de plano
estratégico.10
Como se pode ver, há muitas semelhanças nas definições dos autores analisados,
principalmente nas diferenças estabelecidas entre a idéia tradicional do plano diretor
e do Projeto Urbano. A questão do tempo, do urbanismo localizado e muitas vezes
temático; a questão da oportunidade, da entrada de capitais privados ou de
parcerias público-privadas; e ainda (embora não muito discutida nos referidos
artigos), a idéia de uma nova imagem, de uma “marca” de realização, parecem ser
preocupações presentes.
A reboque, vem a velha prática do Desenho Urbano (Urban Design). De fato, ele
sempre existiu, bem antes da idéia do próprio planejamento urbano. Quando foram
traçadas as primeiras quadras das cidades egípcias ou da antiga Babilônia; quando
Hipodamus de Mileto organizou seu traçado ortogonal, determinando aí a gênesis de
milhares de cidades, já estava sendo praticado o Desenho Urbano, com a criação de
ruas, praças quadras, articulação entre cheios e vazios. etc
10
Esses dois últimos artigos foram apresentados em 1994 e editados dois anos depois no livro
Cidade e Imaginação, fruto da realização de um Seminário do mesmo nome. Nesse mesmo período
estava sendo homologado pela Prefeitura do Rio de Janeiro o Plano Estratégico da Cidade do Rio de
Janeiro(1995)
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impõe uma forma espacial, e, portanto um desenho. Para eliminar tal confusão
quanto ao termo Desenho, optou-se pelo o emprego do termo Projeto Urbano.
O nome Projeto Urbano foi adotado no Brasil a partir dos anos 1990. A introdução do
novo Plano Estratégico para o Rio de Janeiro(1993), parece ter vindo a reboque,
com inspiração no modelo de Barcelona, surgido a partir da urbanização destinada a
abrigar os Jogos Olímpicos de 1992.
Arquitetos como Oriel Bohigas, Solà Morales, Bordja, autores dos projetos para a
sede Olímpica, exerceram grande influência junto aos arquitetos envolvidos no Plano
Estratégico do Rio de Janeiro - e Barcelona passou a ser visto como um paradigma.
A empresa responsável pelo plano desta cidade11 chegou a ser contratada para criar
no Rio de Janeiro um novo estilo de planejamento baseado na gestão de projetos
urbanos (Madeira, 1999)12. Começou a se falar em Projeto ao invés de Desenho
Urbano. Questões como estratégias e “âncoras” para desenvolvimento de trechos de
cidade; passaram a ser evidenciadas. Surgem nessa época programas como o Rio
11
Empresa Catalã Tecnologies Urbanas Barcelona S.A (TUBSA), foi contratada pela prefeitura do Rio
de Janeiro (Compans, 1996)
12
A gestão da política urbana passou a ser orientada por projetos urbanos como uma estratégia de
revitalização da cidade do Rio de Janeiro, cujos programas seriam determinados pelo Plano
Estratégico do Rio de Janeiro. Este, por sua vez contradiz as diretrizes do Plano Decenal, muito
embora o seu discurso inicial referisse-se a uma complementação coerente com as suas diretrizes.
Esses programas passaram a representar o principal instrumento de política urbana da primeira
gestão do governo César Maia.
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Sevilha, Julho de 2006
Orla, Rio Cidade e até o Favela Bairro, ainda que cada um desses guarde a sua
própria especificidade13.
Fig 3 Rio Cidade Ipanema – marco criado no final do bairro: observar a interferência nos prédios
vizinhos
Fonte: Madeira, LC Domingues, dissertação de mestrado, Ippur, UFRJ, Rio de Jjaneiro 1997
13
O projeto Rio Cidade ocorreu na 1ª gestão do prefeito César Maia (1993-1996), e prosseguiu na
gestão de seu sucessor, Luiz Paulo Conde (1997-2000). Consistiu basicamente na re-urbanização
dos principais eixos viários de alguns bairros do Rio de Janeiro, incluindo tratamento da
pavimentação de ruas, praças e calçadas, mobiliário urbano, paisagismo. Incluiu ainda a substituição
ou ampliação das redes de infra-estrutura . O projeto Rio-Orla também ocorreu na 1ª gestão do
prefeito César Maia e consistiu no tratamento das avenidas junto às orlas marítimas. Por fim, o
Projeto Favela Bairro consistiu na tentativa de urbanização de algumas favelas, com tratamento das
ruas e locais de lazer, provisão de equipamentos urbanos e saneamento básico.
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Ainda que se questione os benefícios desta “ancoragem”, parece que a idéia vingou
em vários pontos do planeta: pode-se mencionar o plano das Docklands, onde se
verificou o gigantesco empreendimento de Carnary Wharf, o qual não parece ter sido
o esperado inicialmente14 pode-se falar ainda de vários outros projetos de
revitalização como Porto Madero, Baltimore etc.
14
Ver sobre isso VASCONCELLOS, Lélia – A Nova arquitetura das Docas de Londres: para que e para quem,
Sinopses nº 25,FAU-USP junho/2006, São Paulo, SP e Plano de Renovação das Docas de Londres: Imagem e
realidade, IN Cidade e Imaginação, PROURB- UFRJ, 1996, Rio de Janeiro, RJ
15
Na atual gestão do governo César Maia, a Fundação Guggenheim foi contratada para realizar um
projeto de um museu cuja localização seria no píer da Praça Mauá, junto à área portuária. Após
muitas negociações, o projeto chegou a ser apresentado mas a sua realização foi suspensa por conta
de uma liminar que apontou a inviabilidade do contrato. Face a isso o prefeito desistiu do
empreendimento e voltou os investimentos para a construção dos equipamentos destinados aos
jogos Pan-Americanos, a serem realizados em 2007
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Sevilha, Julho de 2006
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Sobre isso pode-se citar a dissertação de mestrado recém defendida por Rafael Dias Fonseca (orientação de
Lélia Vasconcellos) – “Fábrica dos sonhos”, para o samba ou para a Cidade? Análise de uma nova intervenção
urbana na Área Portuária do Rio de Janeiro, programa de Pós graduação em Arquitetura e urbanismo, EAU –
UFF, julho 2006
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A atuação dos projetos urbanos também pode incluir os projetos em áreas históricas
da cidade, onde se encontram sítios cuja permanência agora passam a ser de suma
importância. Esses projetos estão situados na sua maioria em áreas centrais, cuja
política está sendo agora pautada no resgate da habitação, da criação de pólos
culturais ou de entretenimento. Os projetos urbanos ainda podem se referir à
ocupação de vazios urbanos deixados por perda de uma atividade econômica como
é o caso típico das áreas portuárias, cuja mudança de tecnologia gerou vazios
imensos e conseqüente degradação da sua qualidade enquanto espaço urbano. Em
ambos os casos, associados às várias mudanças de atitude perante a idéia de
preservação do ambiente construído, surgem os vários “res” – projetos de
revitalização, rehabilitação, renovação etc, cujas definições também poderiam ser
motivo de uma enorme discussão a qual não caberia no presente trabalho.17,
Não resta dúvida, porém quanto aos resultados positivos de muitas intervenções. A
prática do projeto urbano enquanto uma aplicação rápida e concreta, trouxe, em
muitos exemplos, o regate da identidade local e do tratamento mais cuidadoso dos
espaços públicos. Questões como tratamento paisagístico mais apurado, instalação
de rampas de acesso e mobiliário próprio para deficientes, a restauração de prédios
ou conjuntos históricos para novos usos, trouxeram mais qualidade de vida às
cidades brasileiras, promovendo um respeito maior à cidadania.
17
Ver sobre isso o capítulo “Re. Atrás de, depois de” in Intervenções em Centros urbanos (org:
Heliana Comin Vargas e Ana Luisa Howard de Carvalho, Manole editora, São Paulo, 2006
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Plano Decenal do Rio de Janeiro, editado em 1992, cuja implementação foi, de certa forma,
interceptada pela criação do Plano Estratégico do Rio de Janeiro
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Ainda algumas questões podem ser colocadas. Seria o Projeto Urbano, parte de um
plano estratégico? Ou melhor dizendo, um instrumento? Ou ele pode surgir
inesperadamente, antes mesmo de um plano, ou até passando por cima deste? O
Projeto Urbano não seria em síntese uma intervenção urbana, ainda que com novas
características do momento político e econômico em que vivemos?
A aceitação de que o poder público deve olhar a cidade, não mais como uma “vista
aérea” (como pareciam ser as representações cartográficas dos planos diretores de
outrora) e sim reconhecer a sua forma urbana, suas especificidades sem se
restringir apenas às características funcionais;. a introdução de conceitos como
morfologia urbana, meio ambiente, paisagem urbana e memória urbana, são
elementos hoje incorporados na prática do Projeto Urbano e resultam em um grande
saldo positivo.
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Mas tudo isso não invalida a tese de que, para qualquer projeto, qualquer nova
interferência no cenário urbano, as diretrizes devem ser apontadas não só pelas
necessidades impositivas do capital financeiro ou imobiliário, (cuja preocupação
parece ser apenas a de uma boa imagem), se esta for em detrimento da sua
população. Projetos monumentais, os quais competem muitas vezes com estruturas
existentes, descabidos com os usos e vocações do lugar e justificados pelo poder
público como uma questão de oportunidade ou estratégia de desenvolvimento,
podem resultar em produtos tão perniciosos à vida urbana quanto às políticas de
“arrasa quarteirão”, comuns nas décadas passadas.
Planejamento e projeto não podem ser vistos como oposições. Um plano propõe
direcionamentos, indica o que pode ser adequado ou não. Regula o solo, estabelece
prioridades. O plano necessita do projeto urbano, e o projeto necessita do plano,
para que se estabeleçam controles de ocupação e usos adequados, além das
demais necessidades como circulação viária, redes de infra-estrutura equipamentos
urbanos etc. O projeto, a nosso ver, não substitui o plano. Acredita-se que os dois
são complementares e não opostos. Se o Projeto Urbano se faz necessário, como
prática, ele não deve conter uma carga ideológica, do contrário ele sempre atenderá
a uma ideologia do poder pelo poder.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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