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Artigo

Evidências das partidas dobradas através da


Matemática na Mesopotâmia
Elizabete Marinho Serra Negra *

RESUMO
Este trabalho tem como objetivo mostrar que os mesopotâmicos conheciam e utilizavam o sistema de
registros contábeis em Partidas Dobradas. São abordados inicialmente os aspectos geográficos e
sociológicos da região mesopotâmica entre os anos 2800 a 1800 anos antes de Cristo. Logo após, é
realizada uma análise sintética do desenvolvimento comercial e econômico. A necessidade de tornar
eficaz a utilização dos meios materiais fez com que os dados registrados fossem vistos como controle.
Essa exigência decorreu da própria evolução da estrutura sócio-econômica dos povos mesopotâmicos, e
neste sentido é que se verificaram os progressos dos métodos contábeis. Em seguida tem-se uma visão
geral sobre os conhecimentos e aplicações da matemática e a geometria em diversas áreas. Por último,
é reavivada uma série de inferências entre leis matemáticas e contabilidade, principalmente no uso de
partidas dobradas como forma de registro contábil.

1 INTRODUÇÃO

A Contabilidade como a concebemos nos dias atuais foi fruto de uma demorada e profícua evolução,
desde os homens das cavernas, passando por todas as grandes civilizações do passado até chegar na
complexidade do mundo mercantilista e globalizado atual.

O pilar básico da Contabilidade que são os registros e controles da riqueza ou do patrimônio encontra-se
sustentado pela forma peculiar de registro, hoje universalmente aceito e praticado, denominado Método
das Partidas Dobradas.

O Método das Partidas Dobradas foi exposto, oficialmente, por Luca Pacioli em 1494, em sua obra Suma
de Aritmética, Geometria, Proporção e Proporcionalidade. Sabemos que não foi Pacioli o inventor do
método, coube ao mesmo mostrar em um livro impresso pela imprensa de Gutemberg o método que os
comerciantes italianos utilizavam naquela época para registro e controle de suas atividades comerciais.
Não queremos, de forma alguma, tirar os méritos de Pacioli, mas questões históricas são e sempre serão
alvo de pesquisas e de discussão da comunidade científica que cada ciência se insere.

Se por um lado sabemos que Pacioli não inventou as Partidas Dobradas, por outro permanecem as
perguntas de quem, onde, quando, como e por que foram inventadas as Partidas Dobradas. Essas
respostas continuam sendo objeto de pesquisa e algumas respostas ainda não satisfazem a todos.

Alguns historiadores contábeis retomam a obra Liber Abaci de Fibonacci de 1202 como um dos
documentos mais antigos que trata das partidas dobradas, mas não são, ainda, provas concludentes.
Realmente podemos verificar que em vários lugares do mundo, entre os anos de 1200 a 1400,
produziram-se registros contábeis por partidas dobradas, desde os Kipus do império Inca até os
gravetos de bambus do império Chinês.

Outro grupo de historiadores contábeis, por sua vez, sugere que o aparecimento das Partidas Dobrado é
mais antigo que esses esparsos registros encontrados. A determinação das origens das Partidas
Dobradas é assunto controverso e não menos interessante para as Ciências Contábeis. A finalidade
desse trabalho é mostrar, em forma de evidenciação, que a matemática desenvolvida pelos povos da
mesopotâmia entre os anos de 2800 a 1880 a.C. dão suportes lógicos e consistentes para embasarem
uma opinião de que as Partidas Dobradas surgiram na Mesopotâmia como forma de registro contábil.

2 ASPECTOS GEOGRÁFICOS E SOCIOLÓGICOS DA MESOPOTÂMIA

Geograficamente a Mesopotâmia está situada entre os rios Tigre e Eufrates no Oriente Médio, onde
atualmente se localiza o Iraque. Apresenta um clima seco e quente. Tirando a região pantanosa e de
brejo que possui uma vegetação de caniço, o que sobra é um solo árido, infértil, improdutível, sem
madeira para construção, sem minério e quase não há pedras. Em grego, a palavra Mesopotâmia
significa entre rios.

As civilizações que habitam essa região prosperaram com base na agricultura. Desenvolveram-se nos
vales dos rios Tigre e Eufrates devido à fertilidade da terra, decorrente das inundações anuais destes.
Para desenvolver a agricultura, os habitantes desses vales inventaram sistemas de canalização e de

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diques para controlar a direção da água durante as enchentes. Estes sistemas também controlavam a
drenagem das águas de volta aos rios.

Os sumérios, babilônicos e os acádios formaram os principais ocupantes desta região entre os anos 2800
a.C. e 1800 a.C. Foi neste período que surgiram os primeiros centros urbanos da humanidade, com uma
vida de ostentação da riqueza, complexa e variada, em que a lealdade política não era mais em relação
a tribos ou clãs, mas sim ao rei que governava. As principais cidades dessa época foram: Ur, Uruk,
Eridu, Nipur e Zagash.

Essas cidades eram governadas pelos patesis, que representavam ao


mesmo tempo a figura do chefe militar e sacerdote. Desenvolveu-se uma
sociedade baseada em atividades agrícolas, pastoris, comerciais e
artesanais. A formação de castas, organizada em forma piramidal foi
inevitável.

O posicionamento social do individuo, geralmente, era determinado pelo


critério de nascimento e hereditariedade. Sua estrutura era dividida em
camadas sendo a base da pirâmide composta pelos escravos, um número
significativo e constituído principalmente por prisioneiros de guerra e
homens livres pobres que se vendiam para sobreviver.

Acima dos escravos, existiam os artesãos e os camponeses, que pertenciam às classes de homens livres,
mas não recebiam o suficiente pelo trabalho que realizavam. E no topo da hierarquia social estava o rei,
que possuía riquezas fabulosas, palácios grandiosos e vários funcionários que auxiliavam na
administração do império.

Administração essa que se caracterizava pelo domínio de todos os grupos sociais em um governo de
fundamento teocrático.

Indiscutivelmente, a principal contribuição que os mesopotâmicos realizaram para o desenvolvimento do


conhecimento foi a invenção de um tipo de escrita, a qual era feita por estiletes em uma placa de argila
mole que depois secavam ao sol. Tais letras tinham a forma de cunha e, por isso, foram chamadas de
cuneiforme. Eram monopolizadas pelos sacerdotes que tinham como uma de suas funções registrar as
atividades comerciais.

Os sacerdotes dos templos religiosos, através de seu vasto sistema tributário, coletavam e
administravam gigantescas somas de bens, tais como terrenos, incluindo rebanhos, manadas, rendas e
propriedades rurais.

Sendo criaturas mortais, eles eram solicitados a prestar contas de sua gestão ao sumo sacerdote - uma
prática de fiscalização administrativa.

Entretanto, por causa da amplitude e variedade da riqueza acumulada, os


sacerdotes enfrentaram problemas sem precedentes na história humana.
Para essa prestação de contas como intendentes, não era possível confiar
na memória a respeito dos tributos pagos, transações concluídas, sendo
necessária uma forma de registro permanente.

O surgimento da escrita justificou-se pelo crescimento das economias


centralizadas, quando os funcionários dos palácios e templos sentiram a
necessidade de manter o controle das quantidades de cereais e dos
rebanhos de carneiros e gado que entravam e saíam dos celeiros e
fazendas. Era impossível depender apenas da memória de um homem para
armazenar todas as transações realizadas, além da necessidade de se
transmitir os fatos a outros sacerdotes quando houvesse o falecimento de quem controlava essas
operações, assim, tornou-se indispensável a criação de novos métodos que mantivessem registros
confiáveis e permanentes.

3 COMÉRCIO E ECONOMIA NA MESOPOTÂMIA

Os mesopotâmicos possuíam uma economia bastante desenvolvida, com métodos de intercâmbio


comercial que incluíam o uso de uma moeda metálica e já dispunham de uma rede bancária primitiva.

Baseada na agricultura, principalmente no cultivo da cevada, produzia também outros produtos como o
óleo de linhaça e de gergelim, linho, trigo e hortigranjeiros. A cevada muitas vezes era usada como meio

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de pagamento de salários e em rações diárias, sendo matéria-prima para a fabricação da bebida natural:
a cerveja.

Os rebanhos de ovelhas e cabras pastavam nos campos fora da estação de plantio e o gado quando
havia água suficiente. A produção da lã era extensa e convertida em peças de tecidos. Santos (2001)
nos afirma que:

os sumérios eram excelentes agricultores, eram peritos em irrigação; sendo favorecidos pelos rios Tigre
e Eufrates. Eram bons comerciantes. A economia do país se fundamenta na lavoura e no comércio.
Desenvolveram-se intensas relações comerciais com os países próximos. Trocavam-se metais,
madeiras, produtos agrícolas e manufaturados. Usavam-se recibos, faturas, títulos de créditos, notas
promissórias. Circulavam como dinheiro, barras de ouro ou prata. A unidade monetária padrão de troca
era um siclo de prata. O comércio era ativo e empregava muita gente.

Outra atividade econômica era a pesca, utilizando-se de pequenos barcos de junco, anzol e rede os
sumérios pescavam no Golfo Pérsico, nos rios, canais e pântanos.

O artesanato foi um dos responsáveis pelo grande impulso dado ao comércio. Os artesãos eram muito
habilidosos e fabricavam móveis de madeira; vasilhas de argila, de pedra, de madeira e de vidro;
objetos de metal, de couro (sandálias, roupas, equipamentos militares), bijuterias e tijolos (secos ao sol
ou cozidos em forno). As lãs retiradas das ovelhas eram utilizadas para confecção de tecido. As famílias
ou oficinas têxteis, constituídas pelos homens livres, eram os realizadores do trabalho artesanal.

Segundo texto publicado no site Vbcontrol (2003) “há duas formas básicas para se obter os materiais
que países necessitam: pela guerra ou comércio. Tais materiais são geralmente exigidos como tributos
ou tomados por pilhagem após uma expedição militar”.

A região mesopotâmica carecia de recursos minerais e de madeira,


indispensáveis para a construção de grandes monumentos, além de
resistentes. Ao longo da história, os mesopotâmicos tiveram cada vez mais
necessidade destes materiais, que vinham de longe: ou das florestas do
Líbano ou das montanhas do Irã (atualmente). Essas montanhas também
eram ricas em minerais, pedras e metais.

Por este motivo, o comércio começava a ser executado com todas as


regiões vizinhas. De acordo com Cruz e Silva (2002) devido ao incremento
na atividade mercantil, bem como ao aumento de mercadorias em
circulação, o sistema de tábuas contábeis tornou-se complexo.

Segundo Iudícibus (1997) “a preocupação com as propriedades e a riqueza é uma constante no homem
da Antigüidade,[...] e o homem teve de ir aperfeiçoando seu instrumento de avaliação patrimonial à
medida que as atividades foram desenvolvendo-se em dimensão e em complexidade”.

A situação geográfica da Mesopotâmia, na rota do comércio entre Oriente e Ocidente, estimulou as


atividades comerciais, tornando necessários rudimentos de aritmética aplicada, tais como sistemas de
contabilidade, noção de juros, etc. Em meados do terceiro milênio os comerciantes da Suméria já
empregavam um sistema de pesos e medidas, fazendo uso de juros simples e compostos.

4 APLICAÇÕES DA MATEMÁTICA E DA GEOMETRIA MESOPOTÂMICA

Os mesopotâmicos foram os inventores da álgebra, do sistema posicional, desenvolveram os cálculos de


divisão e multiplicação, incluindo a criação da raiz quadrada e da raiz cúbica. E utilizando símbolos para
unidades e dezenas, podiam representar qualquer número.

Os símbolos utilizados por este povo para representar os números eram: v que correspondia a 1 (um) e
o < que correspondia ao 10 (dez). O sistema numérico adotado pelos sumérios é uma combinação do
sistema decimal e do sistema sexagesimal. Assim tem-se:

v vvv vv vvv vvv < << <<< <<< << <<< vvv
vv
vv vv vvv vvv << << vvv
vvv vvv vvv
12 3 4 5 9 10 20 30 36 40 59

Ciudad de la informática (2001) nos traz o seguinte texto:

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la Astronomía e las Matemáticas comenzaron a buscar esas respuestas, y a crear aparatos que les
servían como apoyo para ordenar el mundo y los ciclos que la naturaleza dispone. Los primeros
calendarios usados por los babilonios (alrededor del 2700 a.C.) medían los meses de acuerdo con las
fases lunares y los años conforme a la posición del sol. Por el testimonio que perdura en las tablillas de
arcillas que han llegado hasta nosotros, hoy sabemos que alrededor del año 1950 a.C., el pueblo
babilónico adoptó la base 60 para medir el tiempo, o sea, una hora es igual a 60 minutos. Pero, claro,
para que esto pudiera suceder, antes debieron contar no sólo con sistemas de numeración, sino también
con signos que representaran cantidades.

Ou seja, o sistema sexagesimal teve sua origem na astronomia, especificamente, na contagem do


tempo, ou melhor na divisão do tempo em horas, minutos e segundos. No qual 1 (uma) hora equivale a
60 minutos.

Estes números eram escritos mediante a pressão da extremidade mais larga ou menor de um cálamo de
junco sobre a argila ou verticalmente (para desenhar um círculo) ou obliquamente. Com o passar do
tempo esses números passaram a apresentar uma forma angular.

Exemplificando o sistema numérico utilizado pelos sumérios, tem-se:

1º) << << = 20 x 60 + 20 = 1.220

2º) vv vv <v = 2 x 602 + 2 x 60 + 11 = 7.331

Observa-se que os mesopotâmicos começaram a calcular da direita para esquerda, ou seja, o primeiro
grupo de símbolos representam as unidades, o segundo grupo representa as dezenas, depois seriam as
centenas e assim por diante.

Um outro fato curioso é que, retirando o grupo das unidades, os demais grupos são multiplicados pelo
fator 60, onde as dezenas apenas por 60, as centenas por 60 ao quadrado, e assim continuaria,
aumentando-se as casas aumentam-se os expoentes.

Este tipo de cálculo deixa bem claro que os sumérios já conheciam e utilizavam as potências quadradas
e cúbicas. Um texto trazido pelo site Geocities (2003) revela que:

Dos tablillas encontraron em Senkerah cerca Del Euphrates em 1854 a


partir, fechadas em el 2000 a.C.. Dan dos cuadrados de los números hasta
59 y de los cubos hasta 32. Los sumerios utilizaron la fórmula

para realizar la multiplicación. La división se asimilo a la multiplicación, es


decidir

Algumas tábuas mostram que os mesopotâmicos chegaram a resolver equações do 2.º e 3.º graus,
usando palavras como incógnitas num sentido abstrato e conheciam bem o processo de fatoração. Não
só resolviam as equações quadráticas, seja pelo método equivalente ao da substituição numa fórmula
geral, seja pelo método de completar quadrados, como também discutiam algumas cúbicas e algumas
biquadradas.

Acredita-se que os povos mesopotâmicos dominavam também as fórmulas de progressões geométricas.


Seus desenvolvimentos podem ser constatados em tabuletas que indicavam relações entre os lados de
um triângulo. Porém, essas tabuletas mostram apenas as questões e os resultados.

As implantações dos sistemas de irrigação desenvolvidos exigiam, para a execução do trabalho, alguma
forma primitiva de engenharia e agrimensura, atividades que pressupõem a aplicação de certos
conhecimentos geométricos, tais como mediadas de áreas, linhas de nível, etc.

Da matemática mesopotâmica constata-se também a familiarização com as regras gerais de cálculo da


área do retângulo, do triângulo retângulo e isósceles, de um trapézio retângulo e do volume de um
paralelepípedo e mais, geralmente do volume de um prisma reto de base trapezional.

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Tinham também uma fórmula para calcular o perímetro da circunferência a que equivale. Conheciam o
volume de um tronco de cone e de um tronco de pirâmide quadrangular regular. Sabiam que os lados
correspondentes de dois triângulos retângulos semelhantes são proporcionais. Utilizavam-se de uma
‘corda com 13 nós’ de forma a que o espaço entre eles fosse igual, isto é, a corda media 12 unidades,
sendo cada unidade o espaço entre dois nós consecutivos, para construir um triângulo retângulo, mas
não sabiam expressar teoricamente esse conhecimento.

Essa técnica foi divulgada por Pitágoras, em 560 a.C. após ter realizado várias viagens à Mesopotâmia,
cujo saber havia fascinado Tales, onde estudou geometria com sacerdotes, vindo a ter contato com o
método da ‘corda de 13 nós’. Com base nesta técnica desenvolveu o que hoje conhecemos como
Teorema de Pitágoras ‘num triângulo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos
catetos’. Pitágoras não só se satisfez com a generalização da propriedade a que chegou, como também
se preocupou com a sua demonstração, ou seja, em provar que essa regra se aplicava a todos os
triângulos retângulos.

Somente em 1637 d.C. foi provada a relação de posicionamento utilizado


pelos sumérios nas construções de seus templos, palácios e monumentos
arquitetônicos. Tal feito foi realizado por Descartes. Ele criou uma fórmula
algébrica para representar um fato trivial e infantil já conhecido por todos;
de que um ponto em uma folha de papel retangular está infalivelmente,
como é evidente, onde as duas linhas de suas duas distâncias medidas
perpendiculares a duas margens adjacentes da folha, se encontram. Em
linguagem geométrica, isto quer dizer que um ponto em um plano pode ser
representado pelos valores (hoje chamado coordenadas cartesianas) das
suas duas distâncias (x,y), tomadas perpendiculares a dois eixos que se
cruzam em ângulo reto nesse plano, como a convenção de lado positiva e
negativa para um e outro lado do ponto de cruzamento dos eixos.

5 PARTIDAS DOBRADAS E CONHECIMENTO MATEMÁTICO

A matemática sempre foi utilizada como um instrumento, através do qual se podia explicar os
fenômenos naturais, ou seja, suas causas e conseqüências. Por exemplo, aplicando-se a dualidade dos
fatos, pela matemática, obtem-se na Astronomia a relação do tempo em horas-dia e horas-noite.

Os mesopotâmicos também representavam a natureza dos seres através da matemática, ou seja, os


números pares eram considerados seres femininos e os ímpares, masculinos. Até mesmo na grafia
estava presente a dualidades das coisas, o que se pode verificar claramente no símbolo utilizado para
representar o infinito. Esse símbolo representa a união de dois círculos (4), onde um deles representa o
mundo material e o outro o mundo imaterial, em outras palavras, o infinito significa graficamente a
união dos dois mundos.

Os números também representam o bem e o mal. Representavam o bem os números positivos, que
significam a soma, o acréscimo; já os números negativos o mal, a exclusão, a subtração. Paralelamente
a esse raciocínio desenvolveu-se o controle do patrimônio, o sentido do que me pertence e o que
pertence a outra pessoa. Segundo Sá (2002) “o ‘meu’ e o ‘seu’ deram, na época, origem a registros
especiais de ‘débito’ (o que alguém tem que me pagar) e ‘crédito’ (o que devo pagar a alguém)”, onde
teríamos uma primeira versão do registro por Partidas Dobradas.

Uma outra aplicação da matemática pelos mesopotâmicos se refere às funções. Este povo conhecia o
sentido amplo da palavra ‘relação’. Conforme Brito [s.d] diz-se que existe uma relação entre duas
coisas quando existe um elo de ligação, uma correspondência, uma vinculação entre elas.

Usando a representação de conjuntos podemos visualizar estes exemplos mais facilmente. Dentro de
cada conjunto podemos apresentar seus elementos (valores) e associá-los na relação. Como pode ser
observado na figura 1.

Figura 1 Correlação entre conjuntos

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Observe que do conjunto origem (A) partem os elos de ligação em direção ao conjunto
destino (B).

Com esta noção de ‘relação’ em mente e, particularmente, evidenciando as situações acima ilustradas,
podemos definir o que vem a ser uma função. A idéia de relação biunívoca de conjunto que predomina
numa função entre origem e destino coaduna com a idéia das Partidas Dobradas de origem e aplicação
de recursos.

A forma intuitiva do aprendizado das funções através da representação de conjuntos é trocada, na


prática, pelo Sistema Cartesiano, no qual colocamos o domínio no eixo do x e o contradomínio (em que
estarão as imagens) no eixo do y. Desta forma podemos visualizar melhor o par ordenado (x,y) e o
comportamento das funções que se deseja estudar. Assim temos:

Figura 2 Sistema Cartesiano

Como já foi dito antes, os mesopotâmicos não deixaram registro desse conhecimento, mas já foi
provado que não só conheciam, como os utilizavam para a edificação de suas construções monumentais.

O par ordenado do eixo cartesiano (x,y) pode ser visto, também, como uma forma de registro em par,
isto é, uma Partida Dobrada. A aplicação do conhecimento da relação matemática aos controles
contábeis em um determinado fato é relatada por Schmidt (2000):

no ano de 1920, em Nuzi (norte da Babilônia), 49 fichas acompanhadas de uma tabela de pedra com
inscrições cuneiformes listando um pequeno rebanho de carneiros, pertencente ao segundo milênio a.C.,
portanto, fora do período pré-histórico. Esses artefatos representam, aparentemente, a transferência
desse pequeno rebanho – sete diferentes tipos de carneiros e cabras – realizada por Puhisenni, filho de
Mapu, habitante da região, para o pastor de nome Ziquarru. A escavações revelam que as 49 fichas
perfuradas representam a garantia de que o pastor havia recebido o rebanho e tinha uma dívida com o
proprietário anterior. Cada animal do rebanho era representado por uma ficha mantida em um
receptáculo. Sempre que alguma animal era transferido para um pastor, ou para outra pastagem, ou
mesma para tosquia, a forma de registro desse evento era a transferência da ficha correspondente ao
animal para outra caixa. A explicação para esse duplo registro (a tabela de pedra e as fichas), segundo
Schmandt-Besserat (1992), foi que a caixa de barro contendo as fichas era provavelmente destinada ao
pastor (ou devedor), enquanto a tabela constituía o recibo de proprietário (ou credor). Mesmo já
existindo a escrita cuneiforme, a maioria da população (como os pastores de 2000 a.C.) não a dominava
e as fichas contábeis eram de fácil entendimento, já que cada ficha representava um animal.

Terá a seguinte representação gráfica da situação acima citada:

Figura 3 Representação utilizando o Conjunto

Logo, temos:

Matematicamente
f(venda) = (carneiro, Ziquarru)
f’(venda) = (cabra, Ziquarru)

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Contabilmente
1o) Débito – Ziquarru (Cliente)
2o) Débito – Ziquarru (Cliente)
Crédito – Carneiro (Estoque)
Crédito – Cabra (Estoque)

Analisando os fatos, observa-se que há duas contabilidades paralelas, a do vendedor Puhisenni e a do


comprador Ziquarru.

Isso ficou bem caracterizado quando Schmidt apontou a transferência desse pequeno rebanho – sete
diferentes tipos de carneiros e cabras – realizada por Puhisenni para o pastor de nome Ziquarru. Essa
transferência de propriedade foi registrada por 49 fichas acompanhadas de uma tabela de pedra com
inscrições cuneiformes listando um pequeno rebanho de carneiros. Em ambas as análises predomina a
idéia do registro contábil por Partidas Dobradas e não por Partidas Simples.

A contabilidade realizada por Puhisenni revela-nos que houve um registro de saída de sete animais, ou
seja, atualmente diríamos que foi creditada conta-estoque (animais) em sua contrapartida, por meio das
49 fichas perfuradas, que representam a garantia de que o pastor havia recebido o rebanho e tinha uma
dívida com o proprietário anterior, ou seja, essa garantia equivale àquilo que atualmente conhecemos
por duplicatas, notas promissórias, cheques pré-datados, ou qualquer outro instrumento que reconheça
a dívida, e logicamente esse registro é feito no Ativo na conta cliente. O conhecimento de números
positivos e negativos nessa operação está bem claro.

Observe que apesar de estarem registrados em livros distintos, o ato da venda dos animais teve sua
contrapartida que foram os recibos do reconhecimento da dívida, como diz o texto “enquanto a tabela
constituía o recibo de proprietário (ou credor)”. Graficamente, teríamos dois livros um de animais
(estoque) e outro de garantia de compra (cliente a receber), a existência e registro em dois livros de
forma simultânea permitem afirmar que tais registros são por Partidas Dobradas, como se mostra a
seguir.

Registros contábeis realizados por Puhisenni

Livro 1 – Animais
Livro 2 – Garantia (cliente a receber)
(estoque)

49 fichas que representam a garantia de que


Carneiro
o pastor havia recebido o rebanho e tinha
Cabras
uma dívida com o ele.

O mesmo fato também é registrado pelo comprador, Ziquarru: “a explicação para esse duplo registro (a
tabela de pedra e as fichas), segundo Schmandt-Besserat (1992), foi que a caixa de barro contendo as
fichas era provavelmente destinada ao pastor (ou devedor)”. Onde ele debitaria estoque (animais) e
creditaria fornecedor (pela emissão de 49 ficha dadas em garantia).

Registros contábeis realizados por Ziquarru

Livro 1 – Animais
Livro 2 – Garantia (cliente a pagar)
(estoque)

49 fichas que representam a garantia de que


Carneiro
o pastor havia recebido o rebanho e tinha
Cabras
uma dívida com o Puhisenni.

Na seqüência do texto há a referência da transição de animais “cada animal do rebanho era


representado por uma ficha mantida em um receptáculo. Sempre que algum animal era transferido para
um pastor, ou para outra pastagem, ou mesmo para tosquia, a forma de registro desse evento era a
transferência da ficha correspondente ao animal para outra caixa”. Isso demonstra a aplicação de todos
os conhecimentos matemáticos, principalmente aqueles ligados às funções, visto que todos os fatos
relacionados com o patrimônio eram registrados.

Conforme Sá (1997) a “apuração de custos, revisões de contas, controles gerenciais de produtividade,


orçamento, tudo isto já era praticado em registros feitos em pranchas de argila, nas civilizações da
Suméria e da Babilônia (mesopotâmia)”. Só poderia ser realizado esse cálculo se os mesopotâmicos
aplicassem os princípios matemáticos aqui relatados.

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Um outro fato que concretiza a utilização de partidas dobradas pelos mesopotâmicos é que somente os
sacerdotes poderiam fazer esse registro e controle. Um dos requisitos básicos para essa função era o
conhecimento teórico e prático de aritmética e geometria. Seria um choque de conhecimentos e
aplicações dos registros, se os sacerdotes utilizassem partidas simples, uma vez que a matemática
sempre trabalhou com uma dualidade: causa e conseqüência. Por este motivo, é infundado falar que os
registros contábeis realizados pelas civilizações da Mesopotâmia eram feitos sobre forma de partida
simples, o fato de utilizarem livros distintos para os registro de controle não descaracteriza a aplicação
da partida dobrada.

6 CONCLUSÃO

A genialidade dos mesopotâmicos e o seu desenvolvimento cultural criaram,


também, ambientes intelectuais propícios ao grande progresso na escrita
contábil. Há cerca de 2000 a.C. os sistemas de leis, alcançando o
patrimônio, já exigiam controles e registros aprimorados, onde a
matemática desempenhava um importante papel na concretude da vida
cotidiana. Por suas construções monumentais constata-se claramente o alto
grau de desenvolvimento da matemática pelos sumérios, a qual era também
empregada em outras áreas do conhecimento, inclusive a contabilidade.

Para se tornar um sacerdote contador, o indivíduo precisava ter conhecimento de notação aritmética e
do seu uso prático. Um dos princípios básicos da matemática é a relação dos fenômenos, por isso seria
insensato dizer que os sacerdotes não aplicavam esse conhecimento nos registros contábeis.
Conseqüentemente, fica provado que esses registros eram feitos usando Partidas Dobradas, porém, em
livros e formas distintas.

Referências bibliográficas

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Elizabete Marinho Serra Negra - Contadora, Especialista em Perícia Contábil, Mestranda em


Contabilidade, Professora e Pesquisadora da UNIVALE, Membro da Academia Mineira de Ciências
Contábeis

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HISTÓRIA DA CONTABILIDADE

A história da contabilidade é tão antiga quanto a própria História da Civilização. Esta presa às
primeiras manifestações humanas da necessidade social de proteção à posse e de perpetuação e
interpretação dos fatos ocorridos com o objeto material de que o homem sempre dispôs para alcançar os
fins propostos. Nos primeiros tempos da Humanidade havia apenas o senso do coletivo em tribos
primitivas. O estabelecimento de um habitat permitiu a organização da agricultura e do pastoreio. A
organização econômica acerca do direito do uso do solo acarretou em separatividade, rompendo a vida
comunitária, surgindo divisões e o senso de propriedade. Assim, cada pessoa criava sua riqueza
individual. Ao morrer, o legado deixado por esta pessoa não era dissolvido, mas passado como herança
aos filhos ou parentes. A herança recebida dos pais (pater, patris), denominou-se patrimônio. O termo
passou a ser utilizado para quaisquer valores, mesmo que estes não tivessem sido herdados.
A origem da Contabilidade está ligada a necessidade de registros do comércio. Há indícios de
que as primeiras cidades comerciais eram dos fenícios. A prática do comércio não era exclusiva destes,
sendo exercida nas principais cidades da Antiguidade. A atividade de troca e venda dos comerciantes
semíticos requeria o acompanhamento das variações de seus bens quando cada transação era efetuada.
As trocas de bens e serviços eram seguidas de simples registros ou relatórios sobre o fato. Mas as
cobranças de impostos, na Babilônia já se faziam com escritas, embora rudimentares. Um escriba
egípcio chegou a contabilizar os negócios efetuados pelo governo de seu país no ano 2000 a.C. À medida
que o homem começava a possuir maior quantidade de valores, preocupava-lhe saber quanto poderiam
render e qual a forma mais simples de aumentar as suas posses; tais informações não eram de fácil
memorização quando já em maior volume, requerendo registros.
Foi o pensamento do "futuro" que levou o homem aos primeiros registros a fim de que pudesse
conhecer as suas reais possibilidades de uso, de consumo, de produção etc.
Com o surgimento das primeiras administrações particulares aparecia a necessidade de controle, que
não poderia ser feito sem o devido registro, a fim de que se pudesse prestar conta da coisa
administrada. É importante lembrarmos que naquele tempo não havia o crédito, ou seja, as compras,
vendas e trocas eram à vista. Posteriormente, empregavam-se ramos de árvore assinalados como prova
de dívida ou quitação. O desenvolvimento do papiro (papel) e do cálamo (pena de escrever) no Egito
antigo facilitou extraordinariamente o registro de informações sobre negócios. A medida em que as
operações econômicas se tornam complexas, o seu controle se refina. As escritas governamentais da
República Romana (200 a.C.) já traziam receitas de caixa classificadas em rendas e lucros, e as
despesas compreendidas nos itens salários, perdas e diversões.No período medieval, diversas inovações
na contabilidade foram introduzidas por governos locais e pela igreja. Mas é somente na Itália que surge
o termo Contabilitá. Podemos resumir a evolução da ciência contábil da seguinte forma:

CONTABILIDADE DO MUNDO ANTIGO - período que se inicia com a civilização do homem e vai até 1202
da Era Cristã, quando apareceu o Liber Abaci , da autoria Leonardo Fibonaci, o Pisano.

CONTABILIDADE DO MUNDO MEDIEVAL - período que vai de 1202 da Era Cristã até 1494, quando
apareceu o Tratactus de Computis et Scripturis (Contabilidade por Partidas Dobradas) de Frei Luca
Paciolo, publicado em 1494, enfatizando que à teoria contábil do débito e do crédito corresponde à
teoria dos números positivos e negativos, obra que contribuiu para inserir a contabilidade entre os
ramos do conhecimento humano.

CONTABILIDADE DO MUNDO MODERNO - período que vai de 1494 até 1840, com o aparecimento da
Obra "La Contabilità Applicatta alle Amministrazioni Private e Pubbliche" , da autoria de Franscesco Villa,
premiada pelo governo da Áustria. Obra marcante na história da Contabilidade.

CONTABILIDADE DO MUNDO CIENTÍFICO - período que se inicia em 1840 e continua até os dias de
hoje.

PERÍODO ANTIGO

A Contabilidade empírica, praticada pelo homem primitivo, já tinha como objeto, o Patrimônio,
representado pelos rebanhos e outros bens nos seus aspectos quantitativos. Os primeiros registros
processaram-se de forma rudimentar, na memória do homem. Como este é um ser pensante,
inteligente, logo encontrou formas mais eficientes de processar os seus registros, utilizando gravações e
outros métodos alternativos. O inventário exercia um importante papel, pois a contagem era o método
adotado para o controle dos bens, que eram classificados segundo sua natureza: rebanhos, metais,
escravos, etc. A palavra "Conta" designa o agrupamento de itens da mesma espécie. As primeiras
escritas contábeis datam do término da Era da Pedra Polida, quando o homem conseguiu fazer os seus
primeiros desenhos e gravações. Os primeiros controles eram estabelecidos pelos templos, o que
perdurou por vários séculos. Os suméricos-babilónios, assim como os assírios, faziam os seus registros
em peças de argila, retangulares ou ovais, ficando famosas as pequenas tábuas de Uruk, que mediam
aproximadamente 2,5 a 4,5 centímetros, tendo faces ligeiramente convexas. Os registros combinavam o

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figurativo com o numérico. Gravava-se a cara do animal cuja existência se queria controlar e o numero
correspondente às cabeças existentes.

Embora rudimentar, o registro, em sua forma, assemelhava-se ao que hoje se processa. O nome
da conta, "Matrizes" , por exemplo, substituiu a figura gravada, enquanto o aspecto numérico se tornou
mais qualificado, com o acréscimo do valor monetário ao quantitativo. Esta evolução permitiu que,
paralelamente à "Aplicação", se pudesse demonstrar, também, a sua "Origem". Na cidade de Ur, na
Caldéia, onde viveu Abraão, personagem bíblico que aparece no livro Gênesis, encontram-se, em
escavações, importantes documentos contábeis: tabela de escrita cuneiforme, onde estão registradas
contas referentes á mão-de-obra e materiais, ou seja, Custos Diretos. Isto significa que, há 5.000 anos
antes de Cristo, o homem já considerava fundamental apurar os seus custos.

O Sistema Contábil é dinâmico e evoluiu com a duplicação de documentos e "Selos de Sigilo". Os


registros se tornaram diários e, posteriormente, foram sintetizados em papiros ou tábuas, no final de
determinados períodos. Sofreram nova sintetização, agrupando-se vários períodos, o que lembra o
diário, o balancete mensal e o balanço anual. Já se estabelecia o confronto entre variações positivas e
negativas, aplicando-se, empiricamente, o Princípio da Competência. Reconhecia-se a receita, a qual era
confrontada com a despesa. Os egípcios legaram um riquíssimo acervo aos historiadores da
Contabilidade, e seus registros remontam a 6.000 anos antes de Cristo. A escrita no Egito era fiscalizada
pelo Fisco Real, o que tornava os escriturários zelosos e sérios em sua profissão. O inventário revestia-
se de tal importância, que a contagem do boi, divindade adorada pelos egípcios, marcava o inicio do
calendário adotado. Inscreviam-se bens móveis e imóveis, e já se estabeleciam, de forma primitiva,
controles administrativos e financeiros.

As "Partidas de Diário” assemelhavam-se ao processo moderno: o registro iniciava-se com a data


e o nome da conta, seguindo-se quantitativos unitários e totais, transporte, se ocorresse, sempre em
ordem cronológica de entradas e saídas. Pode-se citar, entre outras contas: "Conta de Pagamento de
Escravos", "Conta de Vendas Diárias", "Conta Sintética Mensal dos Tributos Diversos", etc. Tudo indica
que foram os egípcios os primeiros povos a utilizar o valor monetário em seus registros. Usavam como
base, uma moeda, cunhada em ouro e prata, denominada "Shat". Era a adoção, de maneira prática, do
Princípio do Denominador Comum Monetário.

Os gregos, baseando-se em modelos egípcios, 2.000 anos antes de Cristo, já escrituravam Contas
de Custos e Receitas, procedendo, anualmente, a uma confrontação entre elas, para apuração do saldo.
Os gregos aperfeiçoaram o modelo egípcio, estendendo a escrituração contábil às várias atividades,
como administração pública, privada e bancária.

NA BÍBLIA

Há interessantes relatos bíblicos sobre controles contábeis, um dos quais o próprio Jesus relatou
em Lucas capítulo 16, versos 1 a 7: o administrador que fraudou seu senhor, alterando os registros de
valores a receber dos devedores. Já no tempo de José, no Egito, houve tal acumulação de bens que
perderam a conta do que se tinha! (Gênesis 41.49). Houve um homem muito rico, de nome Jó, cujo
patrimônio foi detalhadamente descrito no livro de Jó, capítulo 1, verso 3. Depois de perder tudo, ele
recupera os bens, e um novo inventário é apresentado em Jó, capítulo 42, verso 12.

Os bens e as rendas de Salomão também foram inventariados em 1º Reis 4.22-26 e 10.14-17.


Em outra parábola de Jesus, há citação de um construtor, que faz contas para verificar se o que
dispunha era suficiente para construir uma torre (Lucas 14.28-30). Ainda, se relata a história de um
devedor, que foi perdoado de sua dívida registrada (Mateus 18.23-27). Tais relatos comprovam que, nos
tempos bíblicos, o controle de ativos era prática comum.

PERÍODO MEDIEVAL

Em Itália, em 1202, foi publicado o livro Liber Abaci , de Leonardo Pisano. Estudavam-se, na
época, técnicas matemáticas, pesos e medidas, câmbio, etc., tornando o homem mais evoluído em
conhecimentos comerciais e financeiros. Se os sumérios-babilônios plantaram a semente da
Contabilidade e os egípcios a regaram, foram os italianos que fizeram o cultivo e a colheita. Foi um
período importante na história do mundo, especialmente na história da Contabilidade, denominado a
"Era Técnica" , devido às grandes invenções, como moinho de vento, aperfeiçoamento da bússola, etc.,
que abriram novos horizontes aos navegadores, como Marco Pólo e outros.

A indústria artesanal proliferou com o surgimento de novas técnicas no sistema de mineração e


metalurgia. O comércio exterior incrementou-se por intermédio dos venezianos, surgindo, como
conseqüência das necessidades da época, o livro-caixa, que recebia registros de recebimentos e
pagamentos em dinheiro. Já se utilizavam, de forma rudimentar, o débito e o crédito, oriundos das
relações entre direitos e obrigações, e referindo-se, inicialmente, a pessoas.

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O aperfeiçoamento e o crescimento da Contabilidade foram a conseqüência natural das


necessidades geradas pelo advento do capitalismo, nos séculos XII e XIII. O processo de produção na
sociedade capitalista gerou a acumulação de capital, alterando-se as relações de trabalho. O trabalho
escravo cedeu lugar ao trabalho assalariado, tornando os registros mais complexos. No século X,
apareceram as primeiras corporações na Itália, transformando e fortalecendo a sociedade burguesa. No
final do século XIII apareceu, pela primeira vez a conta "Capital", representando o valor dos recursos
injetados nas companhias pela família proprietária.

O método das Partidas Dobradas teve sua origem na Itália, embora não se possa precisar em que
região. O seu aparecimento implicou a adoção de outros livros que tornassem mais analítica a
Contabilidade, surgindo, então, o Livro da Contabilidade de Custos. No início do Século XIV, já se
encontravam registros explicitados de custos comerciais e industriais, nas suas diversas fases: custo de
aquisição; custo de transporte e dos tributos; juros sobre o capital, referente ao período transcorrido
entre a aquisição, o transporte e o beneficiamento; mão-de-obra direta agregada; armazenamento;
tingimento, etc., o que representava uma apropriação bastante analítica para época. A escrita já se fazia
no moldes de hoje, considerando, em separado, gastos com matérias-primas, mão-de-obra direta a ser
agregada e custos indiretos de fabricação. Os custos eram contabilizados por fases separadamente, até
que fossem transferidos ao exercício industrial.

PERÍODO MODERNO

O período moderno foi a fase da pré-ciência. Devem ser citados três eventos importantes que
ocorreram neste período: em 1493, os turcos tomam Constantinopla, o que fez com que grandes sábios
bizantinos emigrassem, principalmente para Itália; em 1492, é descoberta a América e, em 1500, o
Brasil, o que representava um enorme potencial de riquezas para alguns países europeus; em 1517,
ocorreu a reforma religiosa; os protestantes, perseguidos na Europa, emigram para as Américas, onde
se radicaram e iniciaram nova vida.

A Contabilidade tornou-se uma necessidade para se estabelecer o controle das inúmeras riquezas
que o Novo Mundo representava. A introdução da técnica contábil nos negócios privados foi uma
contribuição de comerciantes italianos do séc. XIII. Os empréstimos a empresas comerciais e os
investimentos em dinheiro determinaram o desenvolvimento de escritas especiais que refletissem os
interesses dos credores e investidores e, ao mesmo tempo, fossem úteis aos comerciantes, em suas
relações com os consumidores e os empregados. O aparecimento da obra de Frei Luca Pacioli,
contemporâneo de Leonardo da Vinci, que viveu na Toscana, no século XV, marca o início da fase
moderna da Contabilidade.

FREI LUCA PACIOLI

Escreveu Tratactus de Computis et Scripturis (Contabilidade por Partidas Dobradas), publicado em


1494, enfatizando que à teoria contábil do débito e do crédito corresponde à teoria dos números
positivos e negativos. Pacioli foi matemático, teólogo, contabilista entre outras profissões. Deixou muitas
obras, destacando-se a Summa de Aritmética, Geometria, Proportioni et Proporcionalitá , impressa em
Veneza, na qual está inserido o seu tratado sobre Contabilidade e Escrituração. Pacioli, apesar de ser
considerado o pai da Contabilidade, não foi o criador das Partidas Dobradas. O método já era utilizado
na Itália, principalmente na Toscana, desde o Século XIV.

O tratado destacava, inicialmente, o necessário ao bom comerciante. A seguir conceituava


inventário e como fazê-lo. Discorria sobre livros mercantis: memorial, diário e razão, e sobre a
autenticação deles; sobre registros de operações: aquisições, permutas, sociedades, etc.; sobre contas
em geral: como abrir e como encerrar; contas de armazenamento; lucros e perdas, que na época, eram
"Pro" e "Dano " ; sobre correções de erros; sobre arquivamento de contas e documentos, etc.

Sobre o Método das Partidas Dobradas, Frei Luca Pacioli expôs a terminologia adaptada: "Per " ,
mediante o qual se reconhece o devedor; "A " , pelo qual se reconhece o credor. Acrescentou que,
primeiro deve vir o devedor, e depois o credor, prática que se usa até hoje. A obra de Frei Luca Pacioli,
contemporâneo de Leonardo da Vinci, que viveu na Toscana, no século XV, marca o início da fase
moderna da Contabilidade. A obra de Pacioli não só sistematizou a Contabilidade, como também abriu
precedente que para novas obras pudessem ser escritas sobre o assunto. É compreensível que a
formalização da Contabilidade tenha ocorrido na Itália, afinal, neste período instaurou-se a
mercantilização sendo as cidades italianas os principais interpostos do comércio mundial.

Foi a Itália o primeiro país a fazer restrições à prática da Contabilidade por um indivíduo qualquer.
O governo passou a somente reconhecer como contadores pessoas devidamente qualificadas para o
exercício da profissão. A importância da matéria aumentou com a intensificação do comércio
internacional e com as guerras ocorridas nos sécs. XVIII e XIX, que consagraram numerosas falências e

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a conseqüente necessidade de se proceder à determinação das perdas e lucros entre credores e


devedores.

PERÍODO CIENTÍFICO

O Período Científico apresenta, nos seus primórdios, dois grandes autores consagrados: Francesco
Villa, escritor milanês, contabilista público, que, com sua obra "La Contabilità Applicatta alle
administrazioni Private e Plubbliche ", inicia a nova fase; e Fábio Bésta, escritor veneziano. Os estudos
envolvendo a Contabilidade fizeram surgir três escolas do pensamento contábil: a primeira, chefiada por
Francisco Villa, foi a Escola Lombarda; a segunda, a Escola Toscana, chefiada por Giusepe Cerboni; e a
terceira, a Escola Veneziana, por Fábio Bésta.

Embora o século XVII tivesse sido o berço da era científica e Pascal já tivesse inventado a
calculadora, a ciência da Contabilidade ainda se confundia com a ciência da Administração, e o
patrimônio se definia como um direito, segundo postulados jurídicos. Nessa época, na Itália, a
Contabilidade já chegara à universidade. A contabilidade começou a ser lecionada com a aula de
comércio da corte, em 1809. A obra de Francesco Villa foi escrita para participar de um concurso sobre
Contabilidade, promovido pelo governo da Áustria, que reconquistara a Lombarda, terra natal do autor.
Além do prêmio, Villa teve o cargo de Professor Universitário.

Francisco Villa extrapolou os conceitos tradicionais de Contabilidade, segundo os quais


escrituração e guarda livros poderiam ser feitas por qualquer pessoa inteligente. Para ele, a
Contabilidade implicava conhecer a natureza, os detalhes, as normas, as leis e as práticas que regem a
matéria administradas, ou seja, o patrimônio. Era o pensamento patrimonialista. Foi o inicio da fase
científica da Contabilidade.

Fábio Bésta, seguidor de Francesco Villa, superou o mestre em seus ensinamentos. Demonstrou o
elemento fundamental da conta, o valor, e chegou, muito perto de definir patrimônio como objeto da
Contabilidade. Foi Vicenzo Mazi, seguidor de Fábio Bésta, quem pela primeira vez, em 1923, definiu
patrimônio como objeto da Contabilidade. O enquadramento da Contabilidade como elemento
fundamental da equação aziendalista, teve, sobretudo, o mérito incontestável de chamar atenção para o
fato de que a Contabilidade é muito mais do que mero registro; é um instrumento básico de gestão.

Entretanto a escola Européia teve peso excessivo da teoria, sem demonstrações práticas, sem
pesquisas fundamentais: a exploração teórica das contas e o uso exagerado das partidas dobradas,
inviabilizando, em alguns casos, a flexibilidade necessária, principalmente, na Contabilidade Gerencial,
preocupando-se demais em demonstrar que a Contabilidade era uma ciência ao invés de dar vazão à
pesquisa séria de campo e de grupo. A partir de 1920, aproximadamente, inicia-se a fase de
predominância norte-americana dentro da Contabilidade.

ESCOLA NORTE-AMERICANA

Enquanto declinavam as escolas européias, floresciam as escolas norte-americanas com suas


teorias e práticas contábeis, favorecidas não apenas pelo apoio de uma ampla estrutura econômica e
política, mas também pela pesquisa e trabalho sério dos órgãos associativos. O surgimento do American
Institut of Certield Public Accountants foi de extrema importância no desenvolvimento da Contabilidade e
dos princípios contábeis; várias associações empreenderam muitos esforços e grandes somas em
pesquisas nos Estados Unidos. Havia uma total integração entre acadêmicos e os já profissionais da
Contabilidade, o que não ocorreu com as escolas européias, onde as universidades foram decrescendo
em nível, em importância.

A criação de grandes empresas, como as multinacionais ou transnacionais, por exemplo, que


requerem grandes capitais, de muitos acionistas, foi a causa primeira do estabelecimento das teorias e
práticas contábeis, que permitissem carreta interpretação das informações, por qualquer acionista ou
outro interessado, em qualquer parte do mundo. Nos inícios do século atual, surgiram as gigantescas
corporations aliado ao formidável desenvolvimento do mercado de capitais e ao extraordinário ritmo de
desenvolvimento que os Estados Unidos da América experimentou e ainda experimenta, constitui um
campo fértil para o avanço das teorias e práticas contábeis. Não é por acaso que atualmente o mundo
possui inúmeras obras contábeis de origem norte-americanas que tem reflexos diretos nos países de
economia.

NO BRASIL

No Brasil, a vinda da Família Real Portuguesa incrementou a atividade colonial, exigindo – devido
ao aumento dos gastos públicos e também da renda nos Estados – um melhor aparato fiscal. Para tanto,
constituiu-se o Erário Régio ou o Tesouro Nacional e Público, juntamente com o Banco do Brasil (1808).

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As Tesourarias de Fazenda nas províncias eram compostas de um inspetor, um contador e um


procurador fiscal, responsáveis por toda a arrecadação, distribuição e administração financeira e fiscal.

Hoje, as funções do contabilista não se restringem ao âmbito meramente fiscal, tornando-se, num
mercado de economia complexa, vital para empresas informações mais precisas possíveis para tomada
de decisões e para atrair investidores. O profissional vem ganhando destaque no mercado em Auditoria,
Controladoria e Atuarial. São áreas de analise contábil e operacional da empresa, e, para atuários, um
profissional raro, há a especialização em estimativas e análises; o mercado para este cresce em virtude
de planos de previdência privada.

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