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31ª aula

Sumário:
Difracção por uma fenda. Difracção de raios X

Difracção por uma fenda

Já todos se terão apercebido de que não existe uma fronteira nítida entre luz e
sombra, o que se fica a dever a efeitos de difracção. De facto, se olharmos atentamente
para a sombra projectada por um objecto quando é iluminado, mesmo que os seus
contornos sejam muito bem definidos, veremos sempre uma zona de penumbra entre a
parte de sombra e a parte iluminada.
A Fig. 31.1 mostra uma caixa onde se abriu numa face uma fenda de largura d.
Essa face da caixa é iluminada com uma fonte de luz distante, pelo que o feixe de luz se
pode considerar de raios paralelos. Na face oposta observa-se uma mancha iluminada
que tem exactamente a dimensão da fenda e, à primeira vista, não se notam efeitos de
difracção.

luz

Figura 31.1

De facto, a difracção só se irá observar nitidamente quando a fenda tiver uma dimensão
da ordem de grandeza do comprimento de onda.
O facto de o som e certas radiações electromagnéticas de grande comprimento
de onda (como as ondas de rádio, por exemplo) contornarem obstáculos macroscópicos
e se espalharem tem a sua origem na difracção. No caso da Fig. 31.1, as ondas
electromagnéticas não se espalham ao entrarem na caixa porque a dimensão da fresta é
muito maior do que o comprimento de onda da luz visível que está a ser usada. Se o
tamanho da fresta diminuísse a zona iluminada também diminuía. Contudo, nunca
iríamos conseguir “apanhar” um raio de luz! A dada altura, a luz, se encontrasse uma
fresta do tamanho do seu próprio comprimento de onda, sofreria difracção, ou seja,
espalhar-se-ia.
A Fig. 31.2 1 mostra ondas planas, geradas uma tina de ondas, que se propagam
da esquerda para a direita, incidindo numa barreira onde existe uma pequena fresta. A
situação é diferente da representada na Fig. 30.2 (onde a fenda tinha dimensão
desprezável) ou na Fig. 30.4 (onde a fenda era grande). A figura deixa perceber que há
direcções onde existe interferência destrutiva.

1
Figura retirada do livro J.B. Marion e W.F. Hornyak, General Physics with Bioscience Essays, John
Wiley & Sons, 2nd Ed., New York (1985). A parte inferior da Figura 31.3 foi retirada do mesmo livro.

1
Figura 31.2

Se a experiência for feita com luz, tal como no caso da Fig. 31.1, mas tendo a fenda
largura d ~ λ , o resultado é o aparecimento de uma sequência de zonas claras e de
zonas escuras, sendo certo que, em frente da fenda, e como seria de esperar, há um
máximo de intensidade luminosa. A Fig. 31.3 mostra o padrão de iluminação que se
obtém num alvo. O máximo central é o de maior intensidade, mas existem outros
máximos, de um e do outro lado do máximo central, com intensidades que vão
diminuindo gradualmente.

λD 0 λD

d d

Figura 31.3

2
Faremos adiante o estudo pormenorizado da difracção por uma fenda, mostrando
então que a separação entre dois mínimos e o centro da imagem é λD / d , sendo D a
distância da fenda ao alvo. Na aula anterior falámos em interferência de ondas e nesta
estamos predominantemente a utilizar o termo difracção. De facto, há quem não
distinga os dois termos, isto é, os utilize indistintamente para descrever o mesmo
fenómeno. Contudo, a haver distinção, ela prende-se com o número de ondas que se
sobrepõem. No caso da experiência de Young fala-se preferencialmente em
interferência porque só há duas ondas em sobreposição. Mas já quando há muitas fendas
e muitas ondas a sobreporem-se utiliza-se preferivelmente o termo difracção. De resto,
no final da última aula foi introduzido o termo “rede de difracção”. O fenómeno a que
se refere a Fig. 31.2 é apropriadamente designado por difracção já que o padrão
observado num alvo (Fig. 31.3) é descrito convenientemente, como veremos de seguida,
como uma sobreposição de muitas ondas (ou melhor, ondículas de Huygens).
A Fig. 31.4 mostra ondas planas a incidir numa barreira onde existe uma fenda
de largura d. Podemos imaginar nessa fenda um número N arbitrariamente elevado de
pontos que são fonte de ondículas de Huygens e, sem perda de generalidade, podemos
considerar que N é um número par. No caso da Fig. 31.4 representámos 10 pontos para
concretizar ideias. A linha que passa pelo centro da fenda, que intersepta o alvo no
ponto P, divide esses pontos em dois grupos: de 1 a N/2 e de N/2+1 a N (em concreto,
de 1 a 5, e de 5 a 10).

1
d/2 3 θ
5 θ
6
l 0
8
10

D alvo

Figura 31.4

Ora, a sobreposição das ondas geradas nos pontos 1 e N/2+1 (ponto 6 na Fig. 31.4) é
igual à que estudámos na aula anterior a propósito da experiência de Young. Supõe-se
que o alvo está muito longe da fenda ( D >> d ) e que, portanto, os dois raios que partem
dos pontos 1 e 6 para o ponto P são paralelos. Esta aproximação decorre de θ ≈ 0 (a
Fig. 31.4 não está à escala!). Vejamos qual é a localização do ponto P que queremos que
seja o ponto onde se dá a primeira interferência destrutiva acima do ponto O. A
condição de interferência destrutiva é que a diferença dos caminhos ópticos dos raios
que saem de 1 e 6, que designamos por l, seja um semi-comprimento de onda:

3
λ
l= (condição de mínimo). (31.1)
2

Esta é a condição para o primeiro mínimo. Por outro lado, o comprimento l é dado por

d
l= sin θ (31.2)
2

pois l é o comprimento de um cateto do triângulo rectângulo cuja hipotenusa mede d/2.


Ora, o seno do ângulo θ é
x
sin θ ≈ tan θ = (31.3)
D

porque o ângulo é pequeno. Combinando estas três equações obtém-se

λD
x= (31.4)
d

para a posição do primeiro mínimo na região x > 0 . Claro que há um mínimo simétrico
deste ( x < 0 ) e outros mínimos correspondentes à condição (31.1) acrescida de um
número inteiro de comprimentos de onda. Os mínimos localizam-se em

λD 2λ D 3λD
x min = ± ,± ,± , (31.5)
d d d

A separação entre os dois primeiros mínimos é 2λD / d (separação entre os dois


mínimos mais próximos de O) mas a separação entre outros dois mínimos quaisquer
adjacentes é somente λD / d .
Fizemos a análise para os pontos 1 e 6. Mas esta mesma análise repete-se para os
pontos 2 e 7, 3 e 7, etc. todos separados da mesma distância d/2. Os mínimos (e os
máximos) voltam a ocorrer nos mesmos pontos dados pela expressão (35.1). Está assim
justificada a figura de difracção na Fig. 31.3.

Difracção de raios X

Os raios X têm comprimento de onda da ordem do nanómetro, muito inferior ao


comprimento de onda da radiação visível. Assim, os efeitos de difracção nesta radiação
só se fazem notar quando encontram “obstáculos” (ou “fendas”) da ordem de grandeza
deste comprimento de onda. Ora, esta é a ordem de grandeza das moléculas ou da
separação inter-atómica numa rede cristalina. Esta circunstância torna os raios X
adequados à exploração de estruturas cristalinas por análise das figuras de difracção que
são produzidas iluminando um cristal com este tipo de radiação. A Fig. 31.5 mostra o
esquema da montagem experimental que se tem de utilizar.

4
alvo

cristal

Raios X incidentes
Raios X difractados

Figura 31.5

Ao incidirem no cristal, os raios X vão excitar os iões que por sua vez re-emitem
a radiação, sobrepondo-se as ondas assim geradas tal como as ondículas de Huygens.
Na prática tudo se passa como se houvesse reflexão de radiação incidente em diferentes
planos cristalinos. A condição para que num alvo colocado longe do cristal haja
interferência construtiva, ou seja, a condição para que os as ondas reflectidas por planos
contíguos estejam em fase quando atingem o alvo, é que a diferença no seu percurso
seja um múltiplo inteiro de um comprimento de onda.

θ θ

d θθ
Α Β

Figura 31.6

A Fig. 31.6 representa a situação que acabámos de descrever e a condição de máximo é,


portanto

2d sin θ = nλ n = 1, 2, 3, (31.6)

Esta expressão (31.6) é chamada condição de Bragg. Como neste fenómeno de


difracção tudo se passa como se de uma reflexão se tratasse, usa-se muitas vezes a
expressão “reflexão de Bragg” para o designar.
O alvo pode ser uma chapa sensível a raios X. Onde existir um ponto brilhante
na chapa há interferência construtiva. Para um dado λ (que é conhecido se se utilizar
radiação monocromática) e ângulo (que se pode variar rodando o cristal − ver Fig. 31.5)
fica a conhecer-se d, ou seja, fica a conhecer-se a estrutura da rede cristalina! Como
num cristal há vários planos reflectores que podem cumprir a condição de Bragg, de

5
facto, na chapa fotográfica aparecem muitos pontos. A posição destes pontos é
característica de um dado cristal pelo que a técnica de difracção de raios X serve para
identificar estruturas cristalinas ou determinar estruturas cristalinas ainda
desconhecidas.
Em 25 de Abril de 1953 a revista Nature publicava os resultados da análise de
difracção de raios X do ácido desoxirribonucleico que revelaram a estrutura de dupla
hélice que se representa na Fig. 31.7.

Figura 31.7

Também a estrutura das moléculas de insulina e hemoglobina foram descobertas


por difracção de raios X (os cientistas responsáveis pelas três descobertas − DNA,
insulina e hemoglobina − viriam a receber prémios Nobel).
Há um aspecto relativo à condição de Bragg, que importa salientar. Se se utilizar
radiação policromática a incidir num cristal (caracterizado por um certo d) segundo uma
direcção θ só é reflectida radiação cujo comprimento de onda λ verifique a condição
de Bragg (31.6) (claro que radiação com este comprimento de onda tem de estar
presente na radiação incidente para poder ser reflectida!). A difracção de raios X num
cristal permite, portanto, produzir raios X monocromáticos.
Refira-se, por último, um outro aspecto relativo à difracção como técnica para
determinar estruturas cristalinas. Sabe-se, desde a segunda década do séc. XX, que todas
as partículas apresentam, para além da sua natureza corpuscular, uma natureza
ondulatória também. Foi justamente o reconhecimento da natureza ondulatória da
matéria que conduziu à Mecânica Quântica. Ora, se as partículas têm associado um
comprimento de onda, podem sofrer fenómenos de interferência! De facto, assim é.
Uma difracção semelhante à que vimos para os raios X pode fazer-se igualmente com
neutrões, por exemplo: um feixe de neutrões incide num cristal e sofre “reflexão” de
Bragg nos vários planos cristalinos. Os vários feixes de neutrões reflectidos interferem,
dando origem a figuras de difracção. A análise dessas figuras permite determinar as
estruturas cristalinas.

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