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CURSO GRADUAÇÃO PEDAGOGIA

EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

VOTUPORANGA – SP

1
SUMÁRIO

1 EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS ....................... 4

1.1 Educação Infantil na atual Constituição....................................... 5

2 EDUCAÇÃO INFANTIL NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL


7

2.1 Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)- Lei nº 8.069 , de 13


de julho de 1990. ............................................................................................ 9

2.2 Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)- Lei nº 9.394 , de 26


de dezembro de 1996. .................................................................................. 10

3 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (PNE).................................... 16

4 DADOS ESTATÍSTICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL ..................... 18

5 FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO INFANTIL ..... 20

6 DESENVOLVIMENTO INFANTIL .................................................... 23

6.1 Características Psicológicas do Desenvolvimento .................... 25

6.2 Desenvolvimento Afetivo, Visual, Tátil, Auditivo e Motor ........... 25

6.3 Atividade objetal manipulatória .................................................. 27

6.4 Aparecimento de Novos Tipos de Atividades na Primeira Infância


29

6.5 Desenvolvimento da Percepção e das Noções Sobre as


Propriedades dos Objetos ............................................................................ 30

7 PAPEL DO EDUCADOR E AS NECESSIDADES DE


APRENDIZAGEM............................................................................................. 31

7.1 Importância da Música na Primeira Infância .............................. 32

7.2 Importância da Leitura na Primeira Infância .............................. 33

7.3 Importância do Brinquedo na Primeira Infância ......................... 33

8 CONCEITO DE CRIANÇA E INFÂNCIA .......................................... 36

8.1 Educação Infantil: Creche e Pré- Escola ................................... 38

2
8.2 O brincar.................................................................................... 40

8.3 Por que nem todas as crianças brincam e quais as consequências


disso? 42

9 O PAPEL DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO INFANTIL COMO


GUARDIÃO DO BRINCAR ............................................................................... 44

10 O ENSINO FUNDAMENTAL NO BRASIL – UMA ANÁLISE DA


EFETIVAÇÃO DO DIREITO À EDUCAÇÃO OBRIGATÓRIA .......................... 47

10.1 Discutindo os parâmetros da universalização do ensino


fundamental 47

10.2 O desafio da qualidade .......................................................... 51

11 CENÁRIO ATUAL DO ENSINO FUNDAMENTAL NO BRASIL .... 58

11.1 O conceito de competência .................................................... 60

11.2 Competências do aluno do ensino fundamental .................... 61

11.3 Competências necessárias ao professor ............................... 63

12 VINCULAÇÃO ENTRE COMPETÊNCIAS DO ALUNO E


COMPETÊNCIAS DO PROFESSOR ............................................................... 69

13 O ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS E OS PROCESSOS


DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO ......................................................... 71

14 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NO CONTEXTO DO ENSINO


FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS .................................................................. 76

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................... 85

3
1 EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

FONTE: http://www.poa24horas.com.br

A "Constituição Política do Império do Brasil", de 25 de março de 1824,


conhecida por "Carta Imperial "e, a “Constituição de República dos Estados
Unidos do Brazil", de 24 de fevereiro de 1891, conhecida como “Carta
Republicana de 1891 ", não trataram especificamente do tema educação. A
“Carta Imperial "tinha como objetivo maior consolidar e manter a independência
do Brasil, em razão da resistência oposta pelo Reino de Portugal quanto dos
segmentos da sociedade portuguesa aqui radicada que não se conformavam em
perder o domínio sobre o Brasil Colônia. Do mesmo modo, a” Carta Republicana
de 1891 "não tratou especificamente da educação que somente foi explicitada a
nível constitucional a partir da “Constituição", de 16 de julho de 1934, seguindo-
se nas demais constituições, cujo apogeu deu-se na atual “Constituição", de 5
de outubro de 1988, também conhecida por “Constituição Cidadã", em razão de
ter como foco de suas ações - o cidadão.
Nesse contexto, a educação foi genericamente tratada pela "Constituição
da Republica dos Estados Unidos do Brasil", de 16 de julho de 1934 em seus
artigos 148 a 158. O mesmo aconteceu com as demais constituições:
"Constituição dos Estados Unidos do Brasil", de 10 de novembro de 1937, artigos
128 a 134; "Constituição dos Estados Unidos do Brasil", de 18 de setembro de
4
1946, por meio dos artigos 166 a 175; "Constituição do Brasil", de 24 de janeiro
de 1967, em seus artigos 168 a 172; "Constituição da República Federativa do
Brasil" ou "Emenda Constitucional nº 1/69", de 17 de outubro de 1969, por
intermédio dos artigos 176 a 180 e, finalmente, a atual "Constituição da
República Federativa do Brasil", de 5 de outubro de 1988, a
"Constituição Cidadã", em seus artigos 205 a 214.
Entretanto, diferentemente das demais, a atual Constituição
Federal erigiu a educação ao status de fundamento da República Federativa do
Brasil no artigo 1º , inciso III , ao dispor sobre a "dignidade da pessoa humana "e,
através do artigo 3º, inciso III, que dispõe sobre o objetivo fundamental a ser
alcançado pela República Federativa do Brasil: “erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais ". A
“Constituição Cidadã “foi mais além ao dispor no artigo 6º que: “São direitos
sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados,
na forma da lei ".
Verifica-se, portanto, que a "Constituição Cidadã", foi mais ousada que as
suas antecessoras ao elevar a educação ao patamar de direito fundamental,
objetivo fundamental e direito social da República Federativa do Brasil,
seguindo, desse modo, a moderna tendência das atuais Nações Democráticas
cujas políticas encontraram-se centradas no bem-estar e na dignidade da
pessoa humana .

1.1 Educação Infantil na atual Constituição

A educação e o cuidado na primeira infância vêm sendo tratados como


assuntos prioritários de governo, organismos internacionais e organizações da
sociedade civil, por um número crescente de países em todo o mundo. No Brasil,
a Educação Infantil - isto é, o atendimento a crianças de zero a seis anos em
creches e pré-escolas - é um direito assegurado pela Constituição Federal de
1988. A partir da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educacao Nacional
em 1996, a Educação Infantil passa a ser definida como a primeira etapa da
Educação Básica.

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Nesse sentido, várias pesquisas realizadas nos anos de 1980 já
mostravam que os seis primeiros anos de vida são fundamentais para o
desenvolvimento humano, e a formação da inteligência e da personalidade,
entretanto, até 1988, a criança brasileira com menos de 7 anos de idade não
tinha direito à Educação. A Constituição atual reconheceu, pela primeira vez, a
Educação Infantil como um direito da criança, opção da família e dever do
Estado. A partir daí a Educação Infantil no Brasil deixou de estar vinculada
somente à política de assistência social passando então a integrar a política
nacional de educação.
A Constituição Federal criou a obrigatoriedade de atendimento em creche
e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade em seu artigo 208, inciso
IV. Entretanto, até a presente data esse sonho do legislador constituinte de 1988
ainda não virou realidade. O artigo 211, § 2º, dispõe que os Municípios atuarão
prioritariamente no ensino fundamental e na Educação Infantil. Para tanto,
preceitua o artigo 212 que a União aplicará, anualmente, nunca menos de 18%
(dezoito por cento) e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios 25% (vinte e
cinco por cento), no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a
proveniente de transferências, na Educação. Estabelece ainda no artigo 23,
inciso V, a competência comum de proporcionar os meios de acesso à cultura,
à educação e à ciência e, destes entes políticos-administrativos, somente os
Municípios estão impedidos de legislar sobre Educação e proteção à infância,
segundo dispõe o seu artigo 24, incisos IX e XV, respectivamente. De outro lado,
através do artigo 209, incisos I e II, submete as instituições educacionais
privadas que atendam crianças de zero a seis anos de idade, à supervisão e
fiscalização do Poder Público. Tal regra encontra ressonância no artigo 22, inciso
XXIV, que dispõe sobre a competência legislativa privativa da União de legislar
sobre diretrizes e bases da educação nacional.
Enfim, além de explicitar os princípios e normas inerentes à educação, a
Constituição de 1988 albergou, em seu seio, normas de caráter universal,
verdadeiros vetores generalíssimos, os quais se aplicam ao processo
educacional e, em particular, ao processo ensino-aprendizagem. O artigo 205 da
Carta Política de 1988 inovou em matéria de política educacional, ao dispor que
a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e

6
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho. Para que o ambicioso, porém não prioritário projeto inserido no artigo
205 da Constituição seja efetivamente cumprido, muito há que se fazer em
termos de polícias públicas voltadas para a educação de qualidade. Para que
seja efetivado o desígnio constitucional em comento, torna-se indispensável a
existência de escola de qualidade para todos. Caso contrário, e esta é a nossa
triste realidade, o direito público subjetivo à educação assegurado pela
Constituição Federal ficará sem sentido. Será mais uma norma sem alma, sem
efetividade, aliás, como a maioria das normas que têm o cidadão como
destinatário.
Como se vê, no Brasil os Poderes Públicos poderiam fazer muito mais
pela educação, promovendo-a, colocando-a a disposição de todos, até porque
ela, a educação, encontra seu referencial maior no artigo XXVI, da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, de 1948, da qual o Brasil é um de seus
signatários.

2 EDUCAÇÃO INFANTIL NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL

No Brasil estamos vivendo um momento histórico muito oportuno para a


reflexão e a ação em relação às políticas públicas voltadas para as crianças.
Cada vez mais, a educação e o cuidado na primeira infância são tratados como
assuntos prioritários por parte dos governos Federal, Estadual e Municipal, bem
como pelas organizações da sociedade civil, por um número crescente de
profissionais da área pedagógica e de outras áreas do conhecimento, que vêem
na Educação Infantil uma verdadeira "ponte " para a formação integral do
cidadão.
A ciência mostra que o período que vai da gestação até o sexto ano de
vida, particularmente de 0 a 3 anos de idade, é o mais importante na preparação
das bases das competências e habilidades no curso de toda a vida humana.
Nesse aspecto, os extraordinários avanços da neurociência têm permitido
entender um pouco melhor como o cérebro humano se desenvolve.
Particularmente do nascimento até os 3 anos de idade, vive-se um período

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crucial, no qual se formarão mais de 90% das conexões cerebrais, graças à
interação do bebê com os estímulos oriundos do ambiente em que vive.
Acreditava-se, inicialmente, que a organização cerebral era determinada
basicamente pela genética; agora, os cientistas comprovaram que ela é
altamente dependente das infantis.
Sob o ponto de vista da Educação Infantil, antes mesmo das pesquisas
realizadas sobre o cérebro, já constatava sensíveis progressos nos níveis de
aprendizagem e desenvolvimento das crianças que frequentaram a educação
pré-escolar. Um estudo científico bastante significativo nesse aspecto foi feito
pelo "Projeto Pré-Escolar High/Scope Perry ", em Michigan, nos Estados Unidos,
que acompanhou crianças de famílias de baixa renda desde a época que
participaram do projeto pré-escolar, com 3 ou 4 anos, até os 27 anos de idade.
A avaliação longitudinal demonstrou que o grupo que recebeu atendimento pré-
escolar obteve, a longo prazo, níveis mais altos de instrução e renda, e menores
índices de prisão e delinquência. Lembrem-se: “Educai as crianças para não ter
que punir os adultos ". O Brasil, na atualidade, discute-se com bastante
frequência as possíveis soluções para a falta de segurança da sociedade,
entretanto, nenhuma relevância é dada à Educação Infantil como fator de
diminuição dos índices da delinquência em todos os níveis que assola a
sociedade brasileira.
A relação custo-efetividade (equação econômica: "custo-benefício ") do
programa em que as crianças receberam atendimento pré-escolar indicou
benefícios estimados em 7 vezes o custo original do programa. Os benefícios
ocorreram como resultado da economia produzida pela redução nos gastos de
educação primária (pela diminuição da evasão e da repetência), saúde,
previdência social e sistema prisional, combinada com o aumento da
produtividade ao longo do tempo.
No Brasil, dispomos de legislação avançada na área da educação,
introduzida pela Constituição Federal de 1988: o "Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA)"- Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, e a "Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDB)"- Lei nº 9.394 , de 20 de dezembro de
1996. Além dessa legislação nacional específica temos acesso a pesquisas

8
internacionais e estudos nacionais que apontam para os benefícios do
investimento público na primeira infância.

2.1 Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)- Lei nº 8.069 , de 13 de


julho de 1990.

Com o advento da Lei nº 8.069 /90 - Estatuto da Criança e do Adolescente


(ECA), os Municípios passaram a ter responsabilidade pelos direitos da infância
e adolescência, através da criação do Conselho Municipal, do Fundo Municipal
e o Conselho Tutelar. Em seu artigo 227, a Constituição Federal consagra uma
recomendação em defesa da criança ao dispor que é dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, dentre
outros, o direito à educação. Essa perspectiva pedagógica passa a ver a criança
como um ser social, histórico, pertencente a uma determinada classe social e
cultural. Cumpre, inicialmente, estabelecer a diferença prevista no artigo 2º do
ECA entre criança e adolescente. Criança é o menor entre zero e 12 anos e
adolescente, o menor entre 12 e 18 anos de idade. O artigo 4º relata os direitos
básicos da criança e do adolescente, dentre eles, à educação, à
profissionalização e à cultura.
No que diz respeito à educação e à cultura, o artigo 53 dispõe que a
criança e o adolescente têm direito à educação, visando o pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho. Assim, a educação passa a ser um direito público
subjetivo da criança e do adolescente, devendo ser garantida pelo Estado.
Segundo Paulo Afonso Garrido de Paula, Educação, em sentido amplo, abrange
o atendimento em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de
idade, o ensino fundamental, inclusive àqueles que a ele não tiveram acesso na
idade própria, o ensino médio e o ensino em seus níveis mais elevados, inclusive
aqueles relacionados à pesquisa e à educação artística. Nesse contexto está o
dever do Estado de assegurar à criança e ao adolescente o atendimento em
creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade, segundo dispõe o
artigo 54, inciso IV do ECA.

9
Quanto à obrigação dos pais ou responsável, o artigo 55 elenca dentro
dos mandamentos contidos no artigo 22, a obrigação de matricular seus filhos
ou pupilos na rede regular de ensino. O descumprimento desta regra implica em
aplicação da medida de proteção mencionada no artigo 129, inciso V ("obrigação
de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento
escolar ") e o cometimento do delito capitulado no artigo 246, do Código Penal
Brasileiro (Abandono intelectual. "Art. 246. Deixar, sem justa causa, de prover à
instrução primária de filho em idade escolar: Pena - detenção, de 15 (quinze)
dias a 1 (um) mês, ou multa”), somente em relação aos genitores.
O artigo 59 prevê que os Municípios, com apoio dos Estados e da União,
estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações
culturais, esportivas e de lazer voltadas à infância e a juventude.

2.2 Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)- Lei nº 9.394 , de 26 de


dezembro de 1996.

Em 26 de dezembro de 1996, o legislador infraconstitucional, atendendo


ao compromisso do legislador constituinte de 1988, referente ao direito do
cidadão à educação, agasalhados na Constituição Federal nos artigos 205 a 214,
editou a Lei nº 9.394 /96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Nesse
sentido, dispõe em seu artigo 1º que a educação abrange os processos
formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no
trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. No artigo
seguinte (artigo 2º), ao dispor sobre os princípios e fins da educação nacional,
destacou o papel da família e do Estado, leia-se, do Poder Público em promover
a educação como processo de reconstrução da experiência, sendo, portanto, um
atributo da pessoa humana e, por isso, comum a todos.
Na esteira desse entendimento, o artigo 4º, inciso IV assegura a educação
escolar pública com atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças
de zero a seis anos de idade. Nesse aspecto a LDB merece elogio haja vista que
estendeu a garantia da gratuidade para as creches e pré-escolas, pois a
Constituição no seu artigo 208, inciso IV, prevê apenas o atendimento em creche

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e pré-escola às crianças daquela idade, silenciando quanto à gratuidade. Por
outro lado, através de uma interpretação sistemática em face do disposto no
artigo 30 desta Lei, a Educação Infantil não integra propriamente o domínio
fundamental do ensino, por motivo de que na Educação Infantil a avaliação far-
se-á mediante acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o
objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental. Em
consequência, diante do sistema de direitos e garantias previstos na
Constituição Federal e pela Lei nº 9.394 /96 (LDB), concluímos que mesmo sem
o caráter obrigatório para os pais ou responsáveis, a creche e a pré-escola,
correspondendo a deveres do Estado e da família para com a educação, são
etapas integrantes do ensino fundamental, tornando-se secundário o disposto no
artigo 30 da LDB.
A partir das interações que estabelece com pessoas próximas, a criança
constrói o conhecimento. A família, primeiro espaço de convivência do ser
humano, é um ponto de referência fundamental para a criança pequena, onde
se aprende e se incorporam valores éticos, onde são vivenciadas experiências
carregadas de significados afetivos, representações, juízos e expectativas (que
são atendidas ou frustradas).
A educação inicial da criança se dá na família, e também na comunidade
e, com o advento do trabalho feminino, cada vez mais cedo, nas escolas. Por
isso, as instituições de Educação Infantil tornam-se mais necessárias, tendo
caráter complementar à educação recebida na família. Esse princípio, afirmado
tanto na Constituição Federal quanto na LDB, consta do mais importante
documento internacional de educação do século XX, a Declaração Mundial de
Educação para Todos (Jomtien/Tailândia, 1990).
Nesse contexto, é muito importante que haja uma boa interação entre a
creche ou pré-escola e a família. Não só porque os pais podem compreender o
trabalho que está sendo feito - como as crianças se relacionam entre si e com
os adultos, quais materiais pedagógicos e espaços estão disponíveis, qual a
qualidade da merenda, quais princípios e diretrizes orientam a ação da
instituição, qual seu projeto pedagógico -, mas também porque permite que a
escola conheça e aprenda com os pais. Um momento precioso é o período de

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adaptação da criança, fase fundamental para a troca de conhecimentos entre
pais e escola e para a constituição de laços de confiança entre eles.
Segundo o Programa Nacional de Educação (PNE) de 2001, a articulação
com a família visa, mais do que qualquer outra coisa, ao mútuo conhecimento
de processos de educação, valores, expectativas, de tal maneira que a educação
familiar e a escolar se complementem e se enriqueçam, produzindo
aprendizagens coerentes, mais amplas e profundas. O resultado dessa troca
produz efeitos sobre a autoestima da criança e no seu desenvolvimento.
É crucial que a instituição de Educação Infantil respeite e valorize a cultura
das diferentes famílias envolvidas no processo educativo. Além disso, deve
estimular a participação ativa dos pais, padrastos e outras figuras masculinas da
família no cuidado e na educação, como base de uma educação não-
discriminatória, que contribua para superar a visão (paradigma) de que tal
responsabilidade é exclusiva das mulheres.
Para que haja maior interação entre família e escola, a instituição deve
estar preparada para lidar com as diferentes e plurais estruturas familiares, que
vão muito além do modelo tradicional de marido-mulher-filhos. É cada vez mais
comum a família monoparental (Constituição Federal, artigo 226, § 4º), isto é,
aquela em que apenas um dos pais (homem ou mulher) é referência. No Brasil,
quase um terço das famílias é chefiado por mulheres. Há também famílias
reconstituídas, na qual mulheres e homens vivenciam novos casamentos e
reúnem filhos de outras relações, famílias que articulam em uma mesma casa
vários núcleos familiares, famílias formadas por casais homossexuais, entre
outras.
Outros fatores que devem ser levados em conta são as diferenças sociais.
Em um País marcado por profundas desigualdades, como é o caso do Brasil,
uma série de condições sociais e familiares colocam milhões de crianças em
situação de risco. Como as pesquisas evidenciam que apenas o atendimento de
qualidade produz resultados positivos sobre o desenvolvimento e a
aprendizagem da criança, é fundamental que essas crianças tenham acesso a
experiências educativas de qualidade nas creches e pré-escolas.

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Só assim a Educação Infantil poderá se constituir como importante fator
de democratização da nossa sociedade. Se atuarem juntas, compartilhando
anseios, conquistas e dificuldades, família e escola cumprirão com grande
sucesso a tarefa de formar seres humanos confiantes, tolerantes, solidários e
respeitosos dos direitos e da dignidade de todos - enfim, cidadãos!
O artigo 10, inciso VI da LDB dispõe sobre as atribuições dos Estados em
assegurar, com prioridade, o ensino fundamental. Assim, as disposições
constitucionais do artigo 211, §§ 2º, 3º e 4º, harmonizam-se no sentido de que,
se por um lado, os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e
na Educação Infantil (artigo 211, § 1º), os Estados e o Distrito Federal atuarão
prioritariamente no ensino fundamental e médio (artigo 211, § 3º). De outro lado,
o artigo 211, § 4º, acrescentado através da Emenda Constitucional nº 14 /96
dispõe que na organização de ensino, os Estados e os Municípios definirão
formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino
obrigatório. Isto significa dizer, que o Município somente poderá prestar
Educação Infantil e superior e os Estados ensino médio e superior, uma vez
atendida plenamente a demanda pelo ensino fundamental, único estritamente
obrigatório. Esta previsão encontra-se insculpida no artigo 11, inciso V, da LDB
ao dispor que os Municípios incumbir-se-ão de oferecer a Educação Infantil em
creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a
atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas
plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima
dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e
desenvolvimento do ensino.
O artigo 22 da LDB que trata da educação básica expressa apenas duas
finalidades: a) fornecer ao aluno a formação comum indispensável para o
exercício da cidadania; b) fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em
estudos posteriores. Nesse contexto, a Educação Infantil, na qualidade de ramo
da educação básica, alberga, necessariamente, estas finalidades.
De outro Norte, um tema muito pouco explorado desde a publicação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) é o da natureza obrigatória da
Educação Infantil. Assim, quando se fala no princípio da obrigatoriedade da
educação, estamos falando na responsabilidade do Estado e da família. Tal

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previsão encontra-se no artigo 29 da LDB ao dispor que a Educação Infantil,
primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físicos,
psicológicos, intelectual e social, complementando a ação da família e da
comunidade. Por esse motivo, a discricionariedade ou a omissão administrativa
do Poder Público em promover a Educação Infantil na sua rede oficial de ensino
dá ensejo às ações judiciais cabíveis, e qualquer cidadão poderá demandar
contra o Poder Público para exigir o acesso à educação por meio de mandado
de segurança (artigo 5º , inciso LXIX , da Constituição Federal), ou grupos de
cidadãos por meio de mandado de segurança coletivo, desde que preenchidas
as exigências contidas no artigo 5º , inciso LXX , alínea b , da Constituição
Federal , ação cautelar ou outra via adequada, haja vista a declaração legal e
constitucional de que tal acesso é direito público subjetivo , podendo, desse
modo, provocar o Judiciário em face do princípio da inafastabilidade do controle
jurisdicional de qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito (artigo 5º , inciso
XXXV , da Constituição Federal). Já o Ministério Público é parte legítima para
demandar contra o Poder Público para exigir o acesso à educação pelos meios
citados, com exceção do mandado de segurança coletivo por faltar-lhe
legitimidade processual. Entretanto, poderá, principalmente, por força do
disposto no artigo 129, inciso III, da Constituição Federal, do artigo 25, inciso IV,
alínea a da Lei nº 8.625 /93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e, no
artigo 5º da Lei nº 7.347 /85, propor ação civil pública.
Conforme acima mencionado, o artigo 31 da LDB dispõe que na Educação
Infantil a avaliação far-se-á mediante acompanhamento e registro do seu
desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino
fundamental. A LDB determina que a União estabeleça, em colaboração com os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, as diretrizes curriculares para toda
a Educação Básica (Educação Infantil, Ensinos Fundamental e Médio). Isso
significa fixar as normas mínimas que assegurem uma formação comum em todo
o território nacional. Em abril de 1999, o Conselho Nacional de Educação (CNE)
fixou as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Educação Infantil.

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Não podemos deixar de mencionar nesse espaço a garantia à educação
aos portadores de deficiência, hodiernamente chamados de portadores de
necessidades especiais. O Brasil tem uma importante legislação neste campo.
A Constituição Federal estabelece, no artigo 208, inciso III, que é dever do
Estado garantir o atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. Essa determinação é
ratificada por leis posteriores: Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) Lei
nº 8.069 /90, Lei de Diretrizes e Bases da Educacao Nacional (LDB) Lei nº 9.394
/96 e, Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999.
Na LDB, a educação especial (artigo 58) é caracterizada como uma
modalidade de educação escolar. Garante o atendimento em classes, escolas
ou serviços especializados sempre que não for possível a integração nas classes
comuns de ensino regular. Prevê ainda que a oferta de educação especial tem
início na faixa etária de zero a seis anos de idade, durante a Educação Infantil.
O artigo 59, inciso III, determina que os sistemas de ensino assegurarão
professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para
atendimento especializado, bem como professores do ensino regular
capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns.
Sobre a gestão a LDB determinou que as instituições de Educação Infantil
se integrassem ao sistema de ensino, ou seja, afirmou ser a área da educação
a mais adequada para regulamentar e supervisionar essa etapa da educação
básica. Prevê-se no médio e no longo prazo uma transferência da rede de
creches e pré-escolas antes vinculadas à área da Assistência Social para a área
da Educação, o que ainda não se processou em boa parte dos Municípios.
Contudo, integrar o sistema de ensino representa, sobretudo, uma
mudança de concepção na área da Educação Infantil. As instituições tornam-se
espaços educacionais, que devem obedecer a uma regulamentação (elaborada
pelos Conselhos de Educação), devem ter autorização para funcionamento, o
que implica a necessidade de projeto pedagógico, formação adequada de seus
profissionais, espaços e materiais apropriados. Assim, independentemente da
vinculação institucional (Assistência Social ou Educação), todas as creches e
pré-escolas integram o sistema de ensino e devem obedecer às diretrizes e as
normas do respectivo Conselho de Educação.

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Apesar desses significativos avanços nos campos normativo e legislativo,
especificamente em relação a LDB, ainda verificamos grandes desafios a serem
enfrentados para a efetivação, na prática, deste importantíssimo direito público
subjetivo - a Educação Infantil.

3 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (PNE)

FONTE: https://blog.wpensar.com.br

No que se refere à Educação Infantil, o PNE (promulgado em janeiro de


2001) estabelece como meta atender, no prazo de cinco anos (2006), 60% das
crianças de 4 a 6 anos e 30% das de 0 a 3 anos de idade. Em 2011, esse índice
deve chegar a 80% e 50%, respectivamente. De acordo com a PNAD (Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios) de 1999, apenas 9,2% das crianças de 0 a
3 anos e 52,1% das crianças de 4 a 6 anos de idade frequentavam instituições
de Educação Infantil.
O PNE aponta várias metas qualitativas. Em primeiro lugar, determina que
sejam elaborados, no prazo de um ano, padrões de infraestrutura para o
funcionamento adequado das instituições de Educação Infantil. Esses padrões
também devem orientar novas autorizações de funcionamento. O Plano define
que o executivo municipal deve assumir a responsabilidade pelo
acompanhamento, controle e supervisão das creches e pré-escolas.

16
Também exige a colaboração entre os setores de educação, saúde e
assistência, bem como entre os três níveis de governo, no atendimento à criança
de 0 a 6 anos de idade. E determina a efetiva inclusão das creches no sistema
nacional de estatísticas educacionais. Outra meta importante é assegurar que,
em todos os Municípios, além de outros recursos municipais, 10% (dos 25%) das
verbas de manutenção e desenvolvimento do ensino seja aplicado,
prioritariamente, na Educação Infantil. Para isso, exige a colaboração da União.
No que diz respeito à formação dos professores e dirigentes, o PNE prevê
a implantação de um Programa Nacional de Formação dos Profissionais de
Educação Infantil para garantir que, em dez anos, todos os dirigentes de creches
e pré-escolas e 70% dos professores tenham nível superior. Prevê ainda, no
prazo de três anos, a execução de programa de formação em serviço, para
profissionais da Educação Infantil e pessoal auxiliar, a cargo dos Municípios.
Neste caso, o PNE exige a colaboração da União e recomenda a articulação com
instituições de ensino superior e com Estados. Também determina que os novos
profissionais admitidos na Educação Infantil tenham titulação mínima de nível
médio, modalidade normal, dando-se preferência à admissão de graduados em
curso específico de nível superior.
Depois de aprovado pelo Congresso Nacional, o texto do PNE recebeu
nove vetos do presidente da República. A maior parte deles refere-se a
dispositivos que visam garantir mais recursos para a Educação. Entre os artigos
vetados, à época, está o que determina a ampliação anual dos gastos públicos
no setor, a fim de se atingir 7% do PIB em 2006. Até o final de 2002, esses vetos
não tinham sido analisados e a sociedade civil vem pressionando o Congresso
para derrubá-los. Este óbice será corrigido, em parte, com aprovação do
"Fundeb - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação" cujo projeto de lei encontra-se em
trâmite no Congresso Nacional, que substituirá o atual "Fundef - Fundo de
Desenvolvimento do Ensino Fundamental ", que prevê um significativo aumento
na aplicação dos recursos para financiamento da Educação Infantil, fundamental
e média.

17
4 DADOS ESTATÍSTICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL

O MEC, por meio do Serviço de Estatísticas Educacionais (SEEC), hoje


vinculado ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP),
realiza anualmente o Censo Escolar, no qual são coletados dados em todos os
estabelecimentos de ensino do País sobre o alunado e as funções docentes,
entre outros. No caso da Educação Infantil, até 1996 o Censo abrangia apenas
a pré-escola. Englobava também as chamadas classes de alfabetização. A partir
de 1997, passou a incluir também as creches.
Nos últimos anos, INEP/SEEC realizaram alguns censos especiais, mais
aprofundados, sobre algumas áreas da educação. A Educação Infantil foi objeto
de um censo especial no ano 2000, que envolveu mais de 100 mil
estabelecimentos de creches e pré-escolas em todo o País. O Censo da
Educação Infantil ampliou o cadastro e sistematizou informações detalhadas
sobre atendimento prestado, profissionais, formação e fontes de recursos. A
partir daí toda a rede de Educação Infantil foi incorporada aos censos escolares.
Os dados mais recentes sobre a Educação Infantil são os do Censo
Escolar 2001. Ao analisá-los, especialmente os relativos à matrícula, é
necessário observar que os registros não atendem à conceituação legal, e sim à
denominação com que o estabelecimento identifica seu atendimento. Há,
portanto, crianças menores de 4 anos de idade registradas nas pré-escolas e
maiores de 3 anos, em creches.
Somadas as matrículas em creche, pré-escola e classe de alfabetização,
registraram-se no Brasil, em 2001, 6.565.016 crianças matriculadas, sendo
1.093.347 em creches, 4.853.803 em pré-escolas e 652.866 em classes de
alfabetização. Consideradas as faixas de idade, as matrículas na Educação
Infantil estão assim distribuídas: 853.056 crianças de 0 a 3 anos de idade;
5.051.438 de 4 a 6 anos de idade e 660.552 com 7 anos ou mais.
Embora os dados do Censo Escolar 2001 apontem um crescimento de
15,2% nas matrículas registradas para a faixa etária de 0 a 3 anos de idade e de
10% para a faixa de 4 a 6 anos, em relação a 2000, é preciso cuidado ao avaliar
essa evolução. Como a Educação Infantil desenvolveu-se, em parte, à margem
do sistema educacional, o aumento das matrículas verificado nos últimos Censos

18
pode ser resultado da ampliação do cadastro e não propriamente de crescimento
do alunado.
Os dados sobre a formação no Censo Escolar de 2001 são evidência do
desafio que as metas traçadas pelo Plano Nacional de Educação (70% com nível
superior até 2011) representam para a área. Em relação à presença de outros
profissionais, apenas 10% das creches têm nutricionista, apesar de especialistas
apontarem a necessidade deste profissional em instituições que atendem
crianças de 0 a 3 anos de idade.
O Censo da Educação Infantil (2000) mostrou que, se a quase totalidade
dos Municípios brasileiros possuem estabelecimentos que oferecem pré-escola
(98%), 18% deles ainda não dispõem de nenhuma creche. Este Censo revela
ainda que o espaço físico constitui-se, para muitas instituições, como importante
desafio a ser superado. Assim, 44% das creches e 63% das pré-escolas não
contam com parquinho. No total, mais de 80% não possui horta e quase
nenhuma tem viveiro. Além disso, 32% das creches e 37% das pré-escolas não
dispõem sequer de um quintal para as crianças tomarem sol ou se
movimentarem. Só 15% delas possuem lactário (espaço destinado à
amamentação dos bebês) e 75% não dispõem de cadeiras próprias para
alimentar as crianças.
Com relação aos materiais disponíveis para as crianças, 84% das creches
utilizam brinquedos como material didático. As sucatas são o segundo material
mais utilizado (em 83% delas), mas cerca de 40% das instituições que atendem
crianças de 0 a 3 anos de idade não dispõem de material adequado nem de
livros infantis, importantes para estimular a criança. Já nas pré-escolas, o Censo
revela um grande desafio a ser enfrentado do ponto de vista pedagógico: 43%
utilizam cartilha, 44% delas não usam qualquer material para expressão artística
e em quase 40% não existem brinquedos, demonstrando o quanto estão
orientadas pelo modelo escolar e pouco mobilizadas para a importância do
brincar como forma de aprender, interagir e se desenvolver.

19
5 FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Adequadamente estimulados, os bebês e as crianças pequenas


desenvolvem a inteligência e as emoções construindo conhecimentos e valores.
A partir da constatação de que as experiências da primeira infância são
determinantes para o desenvolvimento do ser humano, o papel do profissional
de creches e pré-escolas passa por reformulações profundas e, como
decorrência, as exigências relacionadas à sua formação começam a ser
repensadas.
Em 1996, a LDB estabeleceu que a Educação Infantil é a primeira etapa
da Educação Básica, e tem por finalidade promover o desenvolvimento integral
da criança até 6 anos de idade. Sobre a formação de docentes, a Lei determina,
no artigo 62, que para atuar na educação básica é preciso nível superior em
universidades ou institutos superiores de educação, admitindo como formação
mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil, bem como nas
primeiras quatro séries do ensino fundamental, a de nível médio, na modalidade
Normal. Prevê ainda que em um prazo de dez anos só serão admitidos
professores habilitados em nível superior ou formados em serviço.
O Plano Nacional de Educação - (PNE, 2001) -, estabelece como meta
um Programa Nacional de Formação dos Profissionais de Educação Infantil para
garantir que todos os dirigentes de instituições deste nível de ensino possuam,
no prazo de cinco anos, formação em nível médio e, em dez anos, nível superior.
Todos (as) os (as) professores (as) também deverão ter nível médio em cinco
anos e 70% deles (as), nível superior em dez anos.
Essas metas provocaram debates entre os profissionais de educação,
que, em sua maioria, concordam que os prazos são curtos demais para serem
cumpridos. As exigências descritas implicam retorno à escola por parte dos
profissionais de Educação Infantil que não concluíram o Ensino Fundamental e
Médio, por meio de programas supletivos especiais, e também de programas de
formação em serviço.
Segundo resultados do Censo Escolar 2001, dos professores que atuam
nas creches brasileiras, 69% têm curso médio completo e apenas 12,9%
possuem nível superior. Na região Nordeste, estes últimos somam apenas 5,6%.

20
Nas classes brasileiras de pré-escola, 67,5% dos docentes têm nível médio e
23,1% possuem curso superior; e no Nordeste os professores com graduação
representam 5,3% do total.
Outro problema é que a graduação em Pedagogia não oferece uma
formação específica para docentes da Educação Infantil. Em 1999, foi instituído
o Curso Normal Superior, organizado pelos Institutos de Educação para formar
professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série, com
projetos acadêmicos distintos para cada etapa. Especialistas da área têm
posições controversas a respeito da criação do Curso Normal Superior. Segundo
o MEC, a estrutura curricular deste curso deve incluir conhecimentos básicos,
possibilitando a compreensão crítica da escola e do contexto sócio-cultural,
conhecimentos relativos ao exercício da docência, conhecimentos didático-
pedagógicos e prática pedagógica. A formação inclui especificidades da
educação de 0 a 3 anos de idade e de 4 a 6 anos; fundamentos da Educação
Infantil; formação social e pessoal; conhecimento do mundo, da natureza e da
sociedade; saúde, nutrição e proteção (cuidar); corpo e movimento (brincar);
teatro, música e artes plásticas. Todos os cursos na modalidade Normal Superior
em funcionamento estão em processo de reconhecimento pelo MEC.
Em 1998, o MEC publicou o Referencial Curricular Nacional para a
Educação Infantil (RCNEI). Esse material é mais uma contribuição para o
professor de Educação Infantil. É um conjunto de reflexões, cujo objetivo é servir
de subsídio para a construção das propostas curriculares, mas que não deve ser
entendido como um manual a ser seguido.
O RCNEI é composto de temas agrupados em três volumes. O primeiro
traz reflexões sobre as creches e pré-escolas brasileiras, a infância e a
profissionalização dos educadores. O segundo trata dos processos de
construção da identidade e autonomia das crianças. O terceiro traz textos sobre
os eixos e temas que podem ser trabalhados na Educação Infantil.
O Referencial, coerente com as definições da LDB, reforça que as creches
não devem ser simplesmente espaços de cuidados com a criança e que as pré-
escolas não se limitem a preparar para a alfabetização. Ao contrário, cuidado e
aprendizado devem estar integrados desde o início. E sugere que o trabalho seja
articulado em três eixos: a brincadeira, o movimento e as relações afetivas que

21
as crianças desenvolvem. Por meio desses três eixos, as propostas pedagógicas
podem lidar com cinco áreas diferentes: artes visuais, conhecimento do mundo,
língua escrita e oral, matemática e música. Há ainda, no Referencial, proposta
sobre o número adequado de crianças por educador, em cada faixa etária, além
de sugestões sobre o relacionamento da escola com as famílias, integrando-as
ao cotidiano e ao trabalho da instituição.
Enfim, o profissional da Educação Infantil deve ser estimulado e
valorizado. É bastante difícil reverter o quadro em que a Educação Infantil no
Brasil se encontra, com professores desvalorizados e desmotivados. O professor
da escola pública recebe em média R$ 550,00 (quinhentos e cinqüenta reais)
por mês, menos do que ganha um cobrador de ônibus em São Paulo. Com
salários assim, fica difícil investir no aprimoramento profissional. No Brasil,
grande maioria dos professores que trabalham na Educação Infantil não tem
computador em casa, e 60% deles não usam a Internet. Em 2003, o Ministério
da Educação fez uma pesquisa com um resultado revelador: os alunos da 4ª
série com piores resultados nos testes de avaliação tinham professores com
renda média de R$ 730,00 (setecentos e trinta reais), enquanto os estudantes
mais avaliados tinham aulas com professores com média salarial de R$ 1.300,00
(mil e trezentos reais).
O caminho natural para superar essa crise, como mostram os exemplos
de todos os países que deram o salto qualitativo em educação, é investir na
qualidade do ensino fundamental, com ênfase na Educação Infantil, através de
treinamento e qualificação dos professores e aparelhamento das escolas. Há
que se reverter as prioridades na aplicação dos escassos recursos públicos na
educação. De acordo com um dos maiores pesquisadores e estudiosos do
sistema educacional brasileiro, o colombiano Alberto Rodriguez, da Universidade
de Michigan, dos Estados Unidos, o gasto público com um aluno do ensino
superior é 12 vezes maior que o gasto com um aluno do ensino fundamental.
Investem-se R$ 800,00 (oitocentos reais) por ano com um aluno do ensino
fundamental e R$ 9.600,00 (nove mil e seiscentos reais) com um estudante
universitário. Na Coréia do Sul, por exemplo, o aluno de ensino fundamental
recebe até duas vezes mais investimento que um universitário. A lógica aponta

22
no sentido de que haja transferência de recursos do ensino superior para o
básico.
Talvez, com a aprovação do "Fundeb - Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação "cujo projeto de lei encontra-se em trâmite no Congresso Nacional,
que substituirá o atual "Fundef - Fundo de Desenvolvimento do Ensino
Fundamental ", haverá um significativo aumento na aplicação dos recursos para
financiamento da Educação Infantil, fundamental e média. Entretanto, nenhuma
revolução na área educacional será verdadeiramente bem-sucedida se não for
centrada nos seguintes aspectos: a) qualidade do ensino, b) treinamento,
qualificação, valorização e remuneração digna do professor, e c) prioridade na
destinação dos recursos públicos para a Educação Infantil, fundamental e
média.1

6 DESENVOLVIMENTO INFANTIL

FONTE: http://www.revistaeducar.com.br

O desenvolvimento infantil esta pautado na interação com o meio,


segundo Vygotsky a criança aprende e depois se desenvolve, deste modo, o
desenvolvimento de um ser humano se dá pela aquisição/aprendizagem de tudo
aquilo que o ser humano construiu socialmente ao longo da história da
humanidade.

1 TEXTO EXTRAÍDO DO SITE: https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/168958/artigos-


educacao-infantil-o-que-diz-a-legislacao

23
Ao se tratar de escola, estamos em um âmbito mais aprofundado, pois
para além de transmitir o conhecimento acumulado, este processo deve se dar
de forma organizada de modo que, todas as ações realizadas pela escola e seus
profissionais devem ser pensadas, refletidas, discutidas e planejadas, pois todas
as ações devem ter intencionalidade e finalidade.
Na Educação Infantil este processo não pode ser diferente, pois o período
dos 0 aos 5 anos que fará mais diferença no futuro, sendo a base para o
desenvolvimento posterior. Deste modo, destacamos a importância da escola
como local para além dos cuidados na Educação Infantil, porque é nele que a
criança deve se envolver, interagir e agir com o meio, com o outro e com si
mesma para apreender o mundo que a cerca e ir além apreendendo para além
da imagem, mas também os significados por trás delas.

Advogamos o princípio segundo o qual a escola, independentemente


da faixa estaria que atenda, cumpra a função de transmitir
conhecimentos, isto é, de ensinar como lócus privilegiado de
socialização para além das esferas cotidianas e dos limites inerentes à
cultura do senso comum. (MARTINS, 2009, p.94)

Neste sentido, a escola de Educação Infantil não pode se isentar do ato


intencional de educar, presando apenas pelo cuidar, devendo assim haver um
equilíbrio entre o cuidar e o educar para que as crianças possam aprender e
desenvolver todas as suas possibilidades e habilidades da forma mais integral
possível.
De acordo com a periodização feita por Abrantes (2012) a teoria histórico
cultural pode ser dividida em épocas, Primeira Infância (0 a 3 anos), Infância (3
a 10 anos) e Adolescência (10 a 17 anos) e períodos, Primeiro Ano (0 a 1 ano),
Primeira Infância (1 a 3 anos), Idade Pré-Escolar (3 a 6 anos), Idade Escolar (6
a 10 anos), Adolescência Inicial (10 a 14 anos) e Adolescência (14 a 17 anos).
A transição entre os períodos se dá por meio de crises e a atividade
dominante em cada período é respectivamente: Comunicação Emocional Direta,
Atividade Objetal Manipulatória, Jogo de Papéis, Atividade de Estudo,
Comunicação Íntima Pessoal e Atividade Profissional Estudo. Como já dito neste
trabalho trataremos das crianças de um a três anos de vida, ou seja, a Primeira
Infância e/ou Atividade Objetal Manipulatória.

24
Assim, o período o qual nos dedicaremos será o da Primeira infância e/ou
Atividade Objetal Manipulatória entendido como essencial para a criança. É
neste momento que a criança desenvolverá características, habilidades e
aptidões. Essas transformações quantitativas e qualitativas são consideradas
fundamentais para o desenvolvimento da criança persistindo ao longo de toda
sua vida adulta. Este período se constitui como

[...] a base para as aprendizagens humanas está na primeira infância.


Entre o primeiro e o terceiro ano de idade a qualidade de vida de uma
criança tem muita influência em seu desenvolvimento futuro e ainda
pode ser determinante em relação às contribuições que, quando
adulta, oferecerá à sociedade. Caso esta fase ainda inclua suporte
para os demais desenvolvimentos, como habilidades motoras,
adaptativas, crescimento cognitivo, aspectos sócioemocionais e
desenvolvimento da linguagem, as relações sociais e a vida escolar da
criança serão bem-sucedidas e fortalecidas. (PICCININ, 2012, p. 38)

6.1 Características Psicológicas do Desenvolvimento

Ao adquirir controle de seus movimentos no que se refere ao andar


sozinha a criança começa, então, a aperfeiçoar o grau de dificuldade desse
caminhar, seja pisando em algum objeto, seja andando para trás ou mesmo um
degrau, sente como a um desafio a alcançar diante desses estímulos
dificultosos.
A capacidade de caminhar independente da ajuda de um adulto
proporciona à criança um novo panorama do mundo exterior, ampliando a
compreensão dos objetos a sua volta, bem como sua manipulação, uma vez que
estes eram “limitados” pelos pais. A criança se dá conta de que há a existência
de obstáculos em seu trajeto e que precisa captar maneiras de evitá-los. O
caminhar dá autonomia à criança.

6.2 Desenvolvimento Afetivo, Visual, Tátil, Auditivo e Motor

A criança no início da primeira infância é dependente da mãe, as


proibições e limites impostos pela mesma geram na criança uma reação de
oposição, pois esta não entende e não aceita, gerando uma dualidade de amor
e ódio.

25
Porém, quando há uma aprovação por parte do adulto em relação ao que
a criança faz, ela se sente satisfeita e motivada a fazer as coisas novas. Santos
(1999) argumenta que embora a criança não entenda as atitudes, deve passar
por situações de satisfação e sofrimento, para que descubra que tipo de ações
podem satisfazer a ela e ao adulto.
Santos (1999) ainda aposta que a criança deve desenvolver o
autoconceito, pois já se vê separada das pessoas e, já entende que o adulto “vai
e vota”, que os objetos vão continuar no mesmo lugar, ainda que ela não os veja,
é necessário ver a si mesmo como algo contínuo no tempo e espaço.
A partir dos dois anos a acriança torna-se mais independente e
autoconfiante, porém é egocêntrica, cabe nesse momento o adulto ensinar a
acriança a “perceber” a outra, por exemplo, em atividades cooperativas.
A visão, o tato e a audição são os meios pelos quais a criança descobre
o mundo, sendo que nesta fase ela não tem medo de ver, ouvir e sentir. Esses
sentidos possibilitam a criança a perceber as coisas (tamanho, forma e cor) que
fazem parte do meio, o tato permite que a criança sinta diferentes texturas,
agradáveis ou não. A criança nesta fase escuta tudo e se dispersa facilmente,
quanto a sons em alto volume, a criança pode se assustar.
Aos dois anos de idade a criança possui os músculos do corpo e o controle
motor mais aprimorado, tendo mais facilidade para modelar massinha e rabiscar
com giz. Estas situações são de demasiada importância para o desenvolvimento
visual e tátil.
Nesta idade a criança está no mundo dos sons, o papel do adulto neste
momento é de estimular o desenvolvimento dos sentidos para que a criança
possa ter uma expressão própria, pois como aponta Martins (2009)

Em suma, desenvolvimento se produz por meio de aprendizagens e


esse é o pressuposto vigotskiano, segundo o qual o bom ensino,
presente em processos interpessoais, deve se antecipar ao
desenvolvimento para poder conduzí-lo. Portanto não há que se
esperar desenvolvimento para que se ensine; há que se ensinar para
que haja desenvolvimento. (p.100)

Contudo, faz-se necessário compreender como se dá o desenvolvimento


infantil no período da Primeira Infância compreendido do 1 ano aos 3 anos de
vida da criança, no qual se desenvolve a Atividade Objetal Manipulatória.

26
6.3 Atividade objetal manipulatória

No primeiro ano de vida, a criança realiza manipulações dos objetos de


maneira externa a eles, com a primeira infância, ela passa a ressignificar a
utilização desses objetos, deixando de serem simples “coisas” a detentores de
uma função específica, segundo a própria função social deste objeto.
É na primeira infância que se constrói a passagem para a atividade
objetal, atividade principal do período, na qual o adulto assume o papel de
colaborar nesse processo, pois a exemplo de uma colher, ela poderá batê-la,
jogá-la ao chão e, mesmo assim, não descobrir sua função, a menos que o adulto
intervenha e lhe demonstre sua finalidade.
A assimilação da criança pelos objetos em relação ao seu destino difere
dos animais, como por exemplo, do macaco que ao sentir sede, irá beber água
na xícara, no balde, no chão, não se depreendendo ao fato de que a xícara é
utilizada para beber algo, se ela estiver vazia vai utiliza-la para várias coisas
também. A criança, portanto, assimila o significado permanente do objeto.
Mukhina (1995) discorre que o destino que a sociedade conferiu ao objeto e não
varia por necessidade de momento.
Porém, isso não garante que a criança deixará de dar outras funções a
este objeto se não o que lhe é fixado pelo social, mas a importância está na
questão de ela saber e conhecer a verdadeira função deste objeto,
independentemente de seu uso “indevido”.
A relação entre ação e objeto apresenta três fases de desenvolvimento:
na primeira fase a criança realiza qualquer função que ela domina com o objeto;
na segunda fase, a criança manuseia o objeto a partir da real função a que se
atribui ao objeto e, na terceira fase, tem reminiscência na primeira fase, porém a
criança dominando a real função do objeto, o utiliza para “outros fins”, fora o
“original”.
O que se faz importante nesse âmbito é a assimilação da atividade objetal
realizada pela criança de modo a condizer às regras de comportamento social,
o que faz mudar a conduta da criança quando realiza uma atividade de
manipulação objetal.

27
É importante para o desenvolvimento psíquico da criança que o uso dos
objetos ocorra de modo a manter o mesmo sentido em empregos diferentes, ou
seja, unívoco, uma vez que nem todas as ações que a criança assimila têm o
mesmo valor no seu progresso psíquico, as ações contêm particularidades, a
exemplo dos brinquedos, roupas, móveis e louças. Existem de fato diferentes
formas de utilizar os objetos, as formas que mais exigem exercitação da psique
são as que mais contribuem para que o psiquismo se desenvolva.
As ações mais importantes que a criança assimila na primeira infância são
as correlativas e as instrumentais. Sendo as ações correlativas aquelas nas
quais se estabelece uma relação comum entre determinados objetos, fazendo-
as recíprocas espacialmente falando, o que faz a criança levar em consideração
as propriedades dos objetos, conferindo-lhe respeito a estas propriedades,
dando sentido à atividade desenvolvida através do objeto. Estas ações são
presentes na primeira infância, o que não ocorre com a devida “consciência” no
primeiro ano de vida, antes de completar um ano. Tais ações são reguladas pelo
resultado obtido, que só é alcançado pela contribuição e intervenção do adulto
que aponta os erros, norteia como agir, a fim de corrigir com a finalidade do
resultado correto.
As ações instrumentais são aquelas nas quais se utilizam de instrumentos
e /ou ferramentas para agir sobre outro objeto. Ainda enfatizando a colaboração
do adulto na apropriação destes objetos, a ideia é de que o adulto ofereça meios
– instrumentos – que colaborem para que a criança se aproprie e assimile o uso
do objeto, como por exemplo, a colher, nela está presente o traço que a
caracteriza como ferramenta, torna-se um instrumento para que ocorra a
alimentação da criança e, que se faz, portanto, uma “intermediadora” entre a
mão da criança e o alimento. Deste modo, ocorre a sujeição, a reconversão dos
movimentos da mão da criança à forma do instrumento. Outro exemplo é na
leitura de livros.
A assimilação das ações instrumentais não ocorre imediatamente, há
etapas, sendo que a primeira, tendo o instrumento como continuação da própria
mão, suas ações, portanto são manuais ainda; a segunda etapa a criança se
prende para a relação instrumento e objeto sob o qual incide a ação, quanto ao
êxito, só será alcançado eventualmente; a terceira fase é obtida quando a mão

28
se adapta às propriedades do instrumento, originando as ações instrumentais de
fato. Estas que são dominadas na primeira infância, estão em contínuo
desenvolvimento no decorrer do tempo, não é acabado. Sua importância está na
assimilação do uso dos instrumentos de maneira correta, exata. Os quais se
configuram como princípios básicos da atividade humana, permitindo à criança
perpassar pela autonomia do uso dos objetos.

6.4 Aparecimento de Novos Tipos de Atividades na Primeira Infância

Ao findar a primeira infância surgem novas formas de atividade, são o jogo


e as formas produtivas de ação. No jogo é importante ressaltar que não há
relação com o jogo dos filhotes de animais, que são instintivos, ao contrário, as
crianças reproduzem o conteúdo de seus jogos a partir da sua percepção do
contato com o adulto.
Primitivamente não havia separação entre jogo e trabalho, a criança
assimila na prática a forma de obter sustento. Como necessidade social ao
passar do tempo, as formas de produção e instrumentos de trabalho deixaram
de estar ao alcance da criança, passando a ser construídas para a mesma
ferramentas reduzidas, tendo como característica uma sociedade preocupada
com uma infância preparada para inserir-se no trabalho. Destaque, então, para
o surgimento dos jogos-exercícios, sob a direção do adulto, logo surge o
brinquedo figurativo, momento em que há a separação da criança com as
relações sociais, que por sua vez surge o jogo dramático, no qual a criança passa
a reproduzir traços da sociedade adulta e suas relações sociais, formando
comunidades infantis de representação lúdica, por meio do jogo dramático a
criança satisfaz a necessidade de estar inserida no “mundo adulto”, que ocorre
por meio dos brinquedos.
Os jogos iniciais a princípio representam atitudes das crianças sob suas
visões do adulto de maneira que elas não reproduzem suas vivencias reais, mas
sim, imitando o adulto, tal como eles fazem com uma criança, somente mais
tarde ocorrerá pela primeira vez jogos com recriações do real. E assim,
sucessivamente a criança vai progredindo na assimilação das ações praticadas,
utilizando-se de vários tipos de objetos substituindo outros que não possui, ainda

29
não dando nome lúdico, após isto, nomeia os objetos de acordo com o papel que
desempenha no jogo, compreende a significância do objeto dentro do jogo e
gradativamente vai se criando as premissas para o jogo com papeis.
Este desenvolvimento é prerrogativa para a atividade representativa, por
meio do desenho, sendo a representação de determinado objeto. Caracterizada
desde a garatuja com marcas, traços desordenados, linhas retas, curvas sem
representação alguma que adentram na prévia representação para a imagem,
dividida em duas fases: na qual a criança reconhece o objeto numa combinação
casual de traços e a outra intencionalmente a criança reconhece o que
desenhou. A atividade representativa só aparecerá quando a criança verbaliza o
que deseja desenhar. É de demasiada importância, a saber, que a criança
aprende a desenhar, não apenas aperfeiçoando-se, praticando, mas também e
valiosamente, pela influência do adulto que lhe propiciará subsídios para que se
formem imagens gráficas nas linhas que ela traça.

6.5 Desenvolvimento da Percepção e das Noções Sobre as Propriedades


dos Objetos

A criança adquire ações visuais por meio da manipulação dos objetos


estabelecendo assim, propriedades dos objetos. Para que a criança perceba os
objetos de forma mais completa deverão ser oferecidas novas ações de
percepção, que surgem ao assimilar a atividade objetal, contudo com as ações
correlativas e instrumentais. Existem as ações orientadoras externas que
permitem a criança alcançar um resultado prática por meio do contato, da
tentativa diante de uma situação, tais ações conduzem-nas ao conhecimento das
propriedades do objeto.
Comparando-se as propriedades dos objetos é possível que a criança
passe à correlação visual das propriedades dos objetos, convertendo-a em
modelo para determinar as propriedades de outros objetos, formando um novo
tipo de concepção.

30
7 PAPEL DO EDUCADOR E AS NECESSIDADES DE APRENDIZAGEM

FONTE: https://www.colegiosaojudas.com.br

A atuação do professor faz-se importante nesse contexto pela


determinação no processo de aprendizado, sendo o professor que estimula
novos ciclos de aprendizagem, possibilitando o desenvolvimento. No tocante ao
brincar, como processo, oferece à criança a satisfação de suas necessidades
básicas de aprendizagem que oportuniza a comunicação, a extensão das
relações sociais para com outras pessoas, adquire competências novas,
habilidades, facilita a atividade dentro de um ambiente, dentre outras
oportunidades advindas do brincar.
O bebê não nasce com estratégias e conhecimentos prontos para
perceber as complexidades dos estímulos ambientais. Esta habilidade se
desenvolve por meio das experiências vivenciadas por elas na relação com o
outro, com o meio e com si mesma. Assim, é de extrema importância, possibilitar
a criança experiências concretas tendo por base o desenvolvimento das
habilidades sensoriais, de modo que esta aprendizagem é a base para o
desenvolvimento de novas funções.

Os conteúdos de formação operacional interferem diretamente na


constituição de novas habilidades na criança, mobilizando as funções
inatas, os processos psicológicos elementares, tendo em vista a

31
complexificação de sua estrutura e modos de funcionamento, a serem
expressos sob a forma de funções culturais, de processos psicológicos
superiores. Ao atuarem nesta direção, instrumentalizam a criança para
dominar e conhecer os objetos e fenômenos do mundo à sua volta, isto
é, exercer uma influência indireta na construção de conceitos.
(MARTINS, 2009, p.96)

Diante disso, faz-se necessário pensar nesta temática no trabalho com


crianças entre 1 e 3 anos, uma vez que a criança pequena precisa além de
cuidados, ser estimulada constantemente em favor de seu processamento
sensorial, possibilitando a criança aprender a usar seus órgãos sensoriais e a
atribuir significado às sensações. O professor deve ainda garantir o contato da
criança com objetos que favoreçam a inserção da mesma no convívio social, por
meio das várias linguagens. Portanto, o professor deve realizar seu trabalho de
maneira a oferecer a criança, crescimento, reflexão, tomada de decisão
enquanto cidadãos capazes de “administrar” sua vida, indo além da simples
mediação dos conteúdos.

7.1 Importância da Música na Primeira Infância

Na Primeira Infância a criança deve explorar todos os seus sentidos e,


cabe ao adulto que estimule todos eles, o adulto deve apresentar a criança todas
as formas de sentir o mundo. A música é uma forma de a criança desenvolver
ritmo, harmonia, memória, fala, entre várias outras habilidades.
Ferreira (2002, p. 13) argumenta que:

Considerada em todos os seus processos ativos (a audição, o canto, a


dança, a percussão corporal e instrumental, a criação melódica) a
música globaliza naturalmente os diversos aspectos a serem ativados
no desenvolvimento da criança: cognitivo/ lingüístico, psicomotor,
afetivo/ social.

Assim, a música se constitui como algo fundamental a ser trabalhado com


a criança, para que esta descubra o mundo por meio de todos seus sentidos,
além de ser um instrumento que auxilia na aprendizagem e no desenvolvimento.

32
7.2 Importância da Leitura na Primeira Infância

A leitura, os livros, os desenhos, os escritos, são outra forma de


apresentar o mundo à criança, por meio deste ela conhece uma das formas mais
importantes de comunicação dos adultos, a língua escrita.
É por meio do estímulo a leitura de imagens e desenhos que futuramente
as crianças terão curiosidade e interesse em aprender o que foi construiu ao
longo da história da humanidade.
Priolli (p. 4) destaca três pontos explicando a importância de ler para as
crianças:

1º Para a formação de bons leitores, é fundamental que as crianças


com até 3 anos de idade apreciem e valorizem a escuta e a leitura de
histórias desde pequenas. 2º A criança cria o hábito de escutar
histórias, valorizando o livro como fonte de conhecimento e
entretenimento. 3º A escuta de histórias na escola oportuniza
momentos prazerosos em grupo, enriquece o imaginário, amplia o
vocabulário, além de familiarizar a criança com a leitura, uma prática
valorizada pela sociedade.

Entendemos, assim, como sendo mais que necessário ler para as


crianças, elas necessitam manusear e explorar os livros, lembrando que tudo
que aprendemos nesta etapa levamos para a vida toda.

7.3 Importância do Brinquedo na Primeira Infância

Brincar é o modo que a criança tem de conhecer o mundo que a cerca. É


por meio da brincadeira que a criança descobre, aprende e se desenvolve, tanto
na escola quanto em casa, na rua, no jardim e, assim por diante.
Vygotsky (1998) compreende o brincar como uma atividade social da
criança, cuja natureza e origem especifica seriam elementos fundamentais para
o desenvolvimento cultural, ou seja, o brincar como compreensão da realidade.
Para o autor o brinquedo é o principal meio de desenvolvimento cultural
da criança. O brincar atua nas zonas de desenvolvimento proximal e real da
criança. É no brincar que a criança se comporta, além do seu comportamento
habitual, diário, vivenciando desafios e situações novas.

33
Para Elkonin (1998), o brincar é uma atividade social, humano que supõe
contextos sociais e culturais. O jogo/ brinquedo reconstrói as relações sociais,
como também atua no jogo com objetos da vida real.
O brincar estimula, motiva e deve ser sempre orientado por um adulto.
Na escola, o professor, que além de mediar a brincadeira, deve brincar junto.
Brincar propicia a aprendizagem por ser estimulador e motivador, ele faz com
que a criança tenha um motivo para realizar determinada ação e para as crianças
pequenas a aprendizagem acontece no concreto, ou seja, quando a criança
participa do processo de apropriação, como por exemplo, o pente, a criança
explora o objeto, e após ver um adulto utilizando o mesmo ela passa a utilizar
este de acordo com sua função social, pentear. Em um segundo momento
passará a utilizar o pente como barco, avião, neste momento ela já se apropriou
do objeto, porém utiliza-o além da função para o qual ele foi criado. Destacamos
que na escola a criança deve participar de atividades que exijam mais de sua
psique, pois cada local deve propiciar atividades diferentes as crianças. Sava
(1975, p. 14; apud MOYLES, 2002, p. 4) afirma que:

O fato desenvolvimental importante é que estimular as mentes infantis,


através de atividades não regularmente oferecidas em casa, reforça
sua capacidade cognitiva de lidar com as tarefas cada vez mais difíceis
com as quais elas vão se deparar nas décadas futuras.

Deste modo, podemos entender a brincadeira na escola como um modo


de desenvolver capacidades psíquicas mais avançadas e, a brincadeira em casa
como um reforço das capacidades já desenvolvidas pelas crianças. Porém,
todas são formas de brincar são de extrema importância para a criança.
De acordo com a teoria de Vygotsky (1998) que busca compreender a
relação entre linguagem, desenvolvimento e aprendizagem frente ao processo
histórico cultural e a interação social, percebemos o aprendizado como um
processo profundamente social, no qual também é um complexo processo
dialético, onde o desenvolvimento não é linear.
Aprendizado e desenvolvimento estão inter-relacionados desde o
nascimento da criança, sendo os atos intelectuais decorrentes de práticas
sociais, assim, o indivíduo se faz humano apropriando-se da humanidade
produzida historicamente.

34
Vygotsky (1998) também propõe a investigação da riqueza de
informações da criança e o estudo de suas outras capacidades que não tem
ligação direta com o conhecimento que ela possui, mas que desempenham papel
importante em seu desenvolvimento.
Deste modo, chamamos atenção para questões da aprendizagem
escolar, atribuindo um valor significativo a ela. A aprendizagem escolar é
responsável por produzir algo fundamentalmente novo no desenvolvimento da
criança, principalmente no âmbito dos conteúdos operacionais que
proporcionam uma aprendizagem indireta, mas se constituem fundamentais para
o desenvolvimento infantil.
Exposto isso, podemos entender a Primeira Infância e a Atividade Objetal
Manipulatória, como um período crucial, onde a mediação é de extrema
importância para propiciar à criança aprendizagem e desenvolvimento. Neste
momento da vida, a criança começa a desenvolver o psíquico de maneira
organizada, pois por meio da fala consegue começar a entender o mundo e a se
relacionar melhor com o mesmo, além de iniciar a constituição do pensamento.
A criança no decorrer deste período, desenvolve também, por meio da
mediação, os sentidos, o motor e o psíquico. A Atividade Objetal Manipulatória
significa o início deste processo, onde inicialmente a criança apenas explora o
objeto, depois ela aprende a utiliza-lo de acordo com a função para a qual ele foi
criado pela sociedade, e por último, utiliza o objeto simulando que o mesmo é
outro, ou seja, por meio da imaginação, uma caixa vira avião, nesta etapa além
de já ter aprendido a função do objeto a criança ainda, o utiliza de forma criativa.
Portanto, entendemos o professor como determinante na formação da
criança, pois é por meio da mediação, sistematização, orientação, que a criança
adquirirá os conhecimentos construídos socialmente durante a história da
humanidade. Segundo Vygotsky (1998) o professor deve apresentar tudo a
criança, o que “[...] reafirma para a educação o desafio de possibilitar que as
novas gerações se apropriem das máximas qualidades humanas criadas ao
longo da história pelos homens e mulheres que nos antecederam. ” (MELLO,
2007, p.12)2

2 TEXTO EXTRAÍDO DO SITE: http://www.uel.br

35
8 CONCEITO DE CRIANÇA E INFÂNCIA

FONTE: https://es.dreamstime.com

Sabe-se que a criança está sempre descobrindo e aprendendo coisas


novas, por causa do contato com o meio em que vive, obtendo também o
domínio sobre o mundo com o passar dos anos.
O ser humano nasceu para aprender novos conhecimentos, descobrir e
garantir sua sobrevivência e a interação na sociedade como um ser crítico,
dotado de identidade, com desejos que são descobertos durante o processo de
desenvolvimento.
A criança atualmente é vista como um indivíduo que questiona, exige e
detém seu espaço na sociedade, diferente de como era vista antigamente.
Segundo pesquisador francês Philippe Ariès, (1981), a criança era vista
como um adulto em miniatura nos séculos XIV, XV e XVI, e o tratamento dado a
ela era igual ao dos adultos, pois logo se misturavam com os mais velhos.
O importante era que as crianças crescessem rapidamente para
participarem do trabalho e atividades dos adultos. A criança aprendia através da
prática, e os trabalhos domésticos eram considerados uma forma comum de
educação. Os colégios eram reservados a um pequeno número de clérigos.

36
Foi entre os séculos XVI e XVII que a criança começa a ser percebida
como um ser diferente dos adultos. A educação desse período pretendia torná-
las pessoas honradas, portanto, a educação passou a ser teórica e não prática.
Já no século XVIII, a criança foi vista como alguém que precisava ser
cuidada, escolarizada. Época em que se isolaram as crianças dos adultos e os
ricos dos pobres.
No século XX, surge um novo sentimento em relação à infância, havendo
um crescimento significativo quanto ao conhecimento da criança.
Com base no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil,
(RCNEI), Brasil, (1998):

A criança é um ser social que nasce com capacidades afetivas,


emocionais e cognitivas. Tem desejo de estar próxima às pessoas e é
capaz de interagir e aprender com elas de forma que possa
compreender e influenciar seu ambiente. Ampliando suas relações
sociais, interações e formas de comunicação, as crianças sentem-se
cada vez mais seguras para se expressar (p.21).

Suas vivências e sentimentos respeitados fazem dela um ser único,


singular, caracterizando assim seu eu interior, valorizando-se sua própria
maneira de estar no mundo.
A criança é um ser em constante fase de crescimento capaz de agir,
interagir, descobrir e transformar o mundo, com habilidades, limitações e
potencialidades.
Portanto, a infância é uma etapa fundamental na vida da criança para que
ela aprenda a brincar. Essa etapa é considerada a idade das brincadeiras, com
isso destaca-se o lúdico, pois é algo que faz com que a criança reflita e descubra
sobre o mundo em que vive.

A infância é, portanto, a aprendizagem necessária à idade adulta.


Estudar na infância somente o crescimento, o desenvolvimento das
funções, sem considerar o brinquedo, seria negligenciar esse impulso
irresistível pelo qual a criança modela sua própria estátua. (CHATEAU,
1954, p.14).

A criança é um sujeito histórico e sua infância está baseada no contexto


histórico em que vive e dessa forma a concepção de infância nasce do tempo,
espaço social e a cultura que a criança está inserida.

37
Na infância ocorrem vários processos de se associar o mundo e o meio
em que a criança vive, quando isso ocorre, acontece uma aprendizagem
significativa.
Segundo Kishimoto (2001), a infância é também a idade do possível.
Pode-se projetar sobre ela a esperança de mudança, de transformação social e
renovação moral.
Na busca em compreender a evolução da infância, pode-se observar
juntamente a evolução da educação, destacando-se no próximo item a
importância desse segmento de ensino e aprendizagem no contexto da
educação brasileira.

8.1 Educação Infantil: Creche e Pré- Escola

A educação infantil envolve qualquer forma de educação da criança, ou


seja, ela na família, comunidade, sociedade e cultura.
De acordo com RCNEI, Brasil, (1998), a instituição de educação infantil é
um dos espaços de inserção das crianças nas relações éticas e morais que
permeiam a sociedade na qual estão inseridas.
É considerada a primeira etapa da educação básica, ajudando no
desenvolvimento psicológico, físico e social da criança.
Conforme diz a LDB, lei 9394/96, Art.29:

A Educação Infantil é conceituada como a primeira etapa da Educação


Básica e tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança
até cinco anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico,
intelectual e social, complementando a ação da família e da
comunidade. (BRASIL, 1996).

A educação infantil é importante, pois cria condições para que as crianças


possam conhecer e descobrir novos valores, costumes e sentimentos, através
das interações sociais, e nos processos de socialização, o desenvolvimento da
identidade e da autonomia.
Segundo o RCNEI, Brasil, (1998):

O desenvolvimento da identidade e da autonomia estão intimamente


relacionados com os processos de socialização. Nas interações sociais
se dá a ampliação dos laços afetivos que as crianças podem
estabelecer com as outras crianças e com os adultos, contribuindo para

38
que o reconhecimento do outro e a constatação das diferenças entre
as pessoas. Isso pode ocorrer nas instituições de educação infantil que
se constituem, por excelência, em espaços de socialização, pois
propiciam o contato e o confronto com adultos e crianças de várias
origens socioculturais, de diferentes religiões, etnias, costumes,
hábitos e valores. (p.11).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei 9394/96), intitula a


instituição de ensino infantil que atende crianças de 0 a 3 anos de idade de
Creche e Pré-Escola a instituição que atende crianças de 4 a 5 anos de idade.
“No art.30. A Educação Infantil será oferecida em: I – creches, ou
entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II- pré-escolas,
para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade. ” (BRASIL, 1996).
As crianças que frequentam creches aprendem a compartilhar o espaço,
os brinquedos e até mesmo os próprios sentimentos, nesta primeira etapa a
educação não está voltada para conteúdos ou conhecimento formal, pois a
educação infantil atua sobre a interação e a brincadeira, fazendo com que a
criança aprenda a se relacionar com outras crianças, cria suas próprias
experiências e passam a ter privacidade.
Nas creches devem conter profissionais especializados em educação
infantil que disponham realizar os cuidados com as crianças em união com a
escolaridade adequada, que valorizem a criatividade da criança e usem
materiais, brinquedos, livros em quantidade suficiente, variados e adequados à
faixa etária dos alunos.
O ambiente escolar deve conter um espaço dinâmico, onde possam
ocorrer brincadeiras; é importante que seja um lugar bastante explorado, de fácil
acesso, limpo e seguro.
Nas pré-escolas as atividades como pintura e música, contar histórias,
oficinas de desenho, atividades que envolvem os cuidados com o corpo, são
atividades indicadas e adequadas nessa etapa da escolarização da primeira
infância.
Nessa etapa também é necessário ter um amplo espaço, que seja limpo,
organizado, de fácil acesso e seguro. Ter salas adequadas às idades dos alunos,
terem recursos pedagógicos variados, funcionários, como professores
qualificados que apresentem planos pedagógicos coerentes.

39
8.2 O brincar

Na educação infantil é importante que as crianças convivam em


ambientes que possam manipular objetos, brinquedos e interagir com outras
crianças e principalmente que possam aprender, pois o brincar é uma importante
forma de comunicação.
O lúdico auxilia na aprendizagem, pois ajuda na construção da reflexão,
autonomia e da criatividade.
Segundo RCNEI, Brasil, (1998), brincar é umas das atividades
fundamentais para o desenvolvimento da identidade e da autonomia.
A criança ao brincar, pensa e analisa sobre sua realidade, cultura e o meio
em que está inserida, discutindo sobre regras e papéis sociais. Ao brincar a
criança aprende a conhecer, a fazer, a conviver e a ser, favorecendo o
desenvolvimento da autoconfiança, curiosidade, autonomia, linguagem e
pensamento.

O fato de a criança, desde muito cedo, poder se comunicar por meio


de gestos, sons e mais tarde representar determinado papel na
brincadeira faz com que ela desenvolva sua imaginação. Nas
brincadeiras as crianças podem desenvolver algumas capacidades
importantes, tais como a atenção, a imitação, a memória, a
imaginação. Amadurecem também algumas capacidades de
socialização, por meio da interação e da utilização e experimentação
de regras e papéis sociais (BRASIL, 1998, p. 22).

Independente da época, cultura e classe social, o brincar faz parte da vida


das crianças, pois vivem em um mundo de fantasias, onde a realidade e o faz-
de-conta se confundem.
De acordo com RCNEI, Brasil, (1998), brincar funciona como um cenário
no qual as crianças tornam-se capazes não só de imitar a vida como também de
transformá-la.
É através do brincar que a criança forma conceitos, seleciona ideias,
percepções e se socializa cada vez mais.
O brincar é uma atividade que auxilia na formação, socialização,
desenvolvendo habilidades psicomotoras, sociais, físicas, afetivas, cognitivas e
emocionais. Ao brincar as crianças expõem seus sentimentos, aprendem,
constroem, exploram, pensam, sentem, reinventam e se movimentam.

40
Fantasiando a criança revive angústias, conflitos, alegrias, desiste e refaz,
deixando de lado a sujeição às ordens e exigências dos adultos, inserindo-se na
sociedade onde assimilam valores, crenças, leis, regras, hábitos, costumes,
princípios e linguagens: “As crianças são capazes de lidar com complexas
dificuldades psicológicas através do brincar. Elas procuram integrar experiências
de dor, medo e perda. Lutam com conceitos de bem e mal (KISHIMOTO, 2001,
p.67) ”.
O lúdico é considerado prazeroso devido a sua capacidade de absorver
a criança de forma única, intensa e total possibilitando demonstrar sua
personalidade e conhecer melhor a si mesma.
Segundo Kishimoto, (2001), enquanto a criança brinca, sua atenção está
concentrada na atividade em si e não em seus resultados ou efeitos.
“É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto,
pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral; e é somente sendo criativo
que o indivíduo descobre o eu (WINNICOTT, 1975, p.80). ”
No ato de brincar a criança estabelece vínculos entre as características
do papel assumido, suas competências e as relações que possuem com outros
papéis, ou seja, no lúdico a criança transforma os conhecimentos que já possue
anteriormente em conceitos gerais com os quais brinca.
O brincar é uma atividade natural, espontânea e necessária; para brincar
é preciso que as crianças tenham certa independência para escolher seus
companheiros, os papéis que assumirão no decorrer da brincadeira, o tema, o
enredo, todos dependendo unicamente da vontade de quem brinca.
Através do lúdico a criança constrói seu próprio mundo, dá evolução aos
pensamentos, colaborando sobremaneira no aspecto social, integrando-se na
sociedade.
Não se deve esquecer que o brincar é uma necessidade física e um direito
de todos. O brincar é uma experiência humana, rica e complexa.
Portanto:

Brincar constitui-se, dessa forma, em uma atividade interna das


crianças, baseada no desenvolvimento da imaginação e na
interpretação da realidade, sem ser ilusão ou mentira. Também
tornam-se autoras de seus papéis, escolhendo, elaborando e
colocando em práticas suas fantasias e conhecimentos, sem a
intervenção direta do adulto, podendo pensar e solucionar problemas

41
de forma livre das pressões situacionais da realidade imediata
(BRASIL, 1998, p.23).

Segundo Kishimoto, (2002), citando Fröebel, (1912c), brincar é a fase


mais importante do desenvolvimento humano. Por ser a auto ativa representação
do interno, ocorre a representação de necessidades e impulsos internos.
Fica claro então, que o brincar para a criança não é apenas uma questão
de diversão, mas também de educação, construção, socialização e
desenvolvimento de suas potencialidades.

8.3 Por que nem todas as crianças brincam e quais as consequências


disso?

A criança tem direito à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, entre


outros.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “Art. 53. A
criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1990).
A criança vai se preparando para o futuro, experimentando o mundo ao
seu redor, nutrindo sua vida, descobrindo sua vocação através do brincar;
contudo, nem sempre possuem oportunidades para isso, pois existem dois
fatores que podemos observar com maior ênfase que as impedem desse direito
de brincar.
Um fator que bloqueia esse direito é o trabalho infantil, sendo considerado
como um problema social, fazendo com que as crianças deixem de freqüentar a
escola e terem seus direitos preservados. O trabalho infantil muitas vezes
acontece devido à necessidade de ajudar financeiramente os familiares.
O trabalho infantil é proibido por lei, observando-se no Princípio VII da
Declaração dos Direitos da Criança, (1959) as seguintes afirmações:

A criança terá direito a receber educação, que será gratuita e


compulsória pelo menos no grau primário. Ser-lhe-á propiciada uma
educação capaz de promover a sua cultura geral e capacitá-la a, em
condições de iguais oportunidades, desenvolver as suas aptidões, sua
capacidade de emitir juízo e seu senso de responsabilidade moral e
social, e a tornar-se um membro útil da sociedade. (BRASIL, 1959).

42
Não é responsabilidade da criança trabalhar para sustentar sua família,
pois muitas crianças quando deixam de ir à escola e ao abandonarem ou
simplesmente dividir esse tempo o rendimento escolar é muito ruim e o
despreparo para o mercado de trabalho é conseqüência, impedindo também seu
desenvolvimento físico, mental ou moral.
Conforme nos mostra o Princípio IX da Declaração dos Direitos da
Criança, (1959):

Não será permitido à criança empregar-se antes da idade mínima


conveniente; de nenhuma forma será levada a ou ser-lhe-á permitido
empenhar-se em qualquer ocupação ou emprego que lhe prejudique a
saúde ou a educação ou que interfira em seu desenvolvimento físico,
mental ou moral. (BRASIL, 1959).

Outro fator que também bloqueia esse direito é quando a Instituição de


ensino não possui espaços adequados para que ocorra o brincar. Junto com o
brincar, o espaço físico e social também é essencial para o desenvolvimento das
crianças, já que por conta dessa interação entre eles, a criança constrói o
conhecimento de si mesma.
O espaço físico é lugar de desenvolvimento de várias habilidades e
sensações, auxiliando, portanto, na aprendizagem.

O espaço na Instituição de Educação Infantil deve propiciar condições


para que as crianças possam usufruí-lo em benefício do seu
desenvolvimento e aprendizagem. Para tanto é preciso que o espaço
seja versátil e permeável à sua ação, sujeito a modificações propostas
pelas crianças e pelos professores em função das ações desenvolvidas
(BRASIL, 1998, p.69).

E oferecer conforto, segurança física e proteger, significa proporcionar


ambiente seguro e confortável.

Ao organizar um ambiente e adotar atitudes e procedimentos de


cuidado com a segurança, conforto e proteção da criança na
instituição, os professores oferecem oportunidades para que ela
desenvolva atitudes e aprenda procedimentos que valorizem seu bem-
estar. Tanto a creche quanto a pré-escola precisam considerar os
cuidados com a ventilação, insolação, segurança, conforto, estética e
higiene do ambiente, objetos, utensílios e brinquedos (BRASIL, 1998,
p. 51).

43
O que as Instituições precisam é ter consciência de que o espaço não é
somente um pano de fundo, ele interfere diretamente na aprendizagem das
crianças entendido como interlocutor, porque desafia, instiga a criança ao
movimento, a exploração e a produção de linguagem.

9 O PAPEL DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO INFANTIL COMO


GUARDIÃO DO BRINCAR

FONTE: https://www.piquetcarneiro.ce.gov.br

Se o brincar facilita a aprendizagem, então, é preciso que o educador seja


a favor do lúdico, pois nada será feito se os professores não se interessarem por
essa forma de educação.

44
O profissional precisa aumentar a criatividade, o entusiasmo, a alegria e
observar as crianças no decorrer do brincar. É necessário que o educador
entenda o brincar da criança.
Para que o educador examine o universo infantil é preciso ter um
conhecimento teórico, prático, com capacidade de observação e vontade.
Através da observação do lúdico, o educador pode obter importantes
informações sobre o brincar. E essas informações definem critérios como:
quanto tempo uma determinada brincadeira ou jogo envolvem as crianças, quais
as competências dos jogadores, qual o grau de criatividade, de autonomia,
iniciativa e criticidade, quais as linguagens utilizadas pelos envolvidos, se
possuem interesse, motivação, afetividade, emoções e satisfação pelo brincar,
se demonstram colaboração, competitividade, interação, construção de
raciocínio, argumentação e opinião.

A ação do professor de educação infantil, como mediador das relações


entre as crianças e os diversos universos sociais nos quais elas
interagem, possibilita a criação de condições para que elas possam,
gradativamente, desenvolver capacidades ligadas à tomada de
decisões, à construção de regras, à cooperação, à solidariedade, ao
diálogo, ao respeito a si mesmas e ao outro, assim como desenvolver
sentimentos de justiça e ações de cuidado para consigo e para com os
outros (BRASIL, 1998, p.43).

No decorrer do brincar, através das ações das crianças, é possível que o


educador diagnostique problemas como valores morais, comportamentos nos
diferentes ambientes, conflitos emocionais e cognitivos, ideias e interesses.
Portanto o educador possui um papel de um facilitador, ora orienta e dirige
as atividades lúdicas, ora coloca as crianças como responsáveis de suas
próprias brincadeiras.
É importante que o responsável organize e estruture o espaço de forma a
estimular na criança a vontade de brincar, de competir e cooperar, pois em
relação ao brincar o que é mais importante é a participação e aliando a teoria à
prática acontece a valorização do conhecimento.
Com base em Bomtempo, (1999), citando Christie, o professor pode
selecionar, organizar e apresentar objetos, materiais, suportes e experiências
para desenvolver conceitos ou temas. A intervenção deve revitalizar, clarificar e
explicar o brincar, não dirigir as atividades.

45
É importante que o educador determine certa “área livre” onde as crianças
possam mexer, montar, fazer e criar, dando certo tempo para que a criatividade
e imaginação aconteçam. Segundo Proinfantil, (2005):

Brincar implica troca com o outro, trata-se de uma aprendizagem


social. Nesse sentido, a presença do professor é fundamental, pois
será ele quem vai mediar as relações, favorecer as trocas e parcerias,
promover a interação, planejar e organizar ambientes instigantes para
que o brincar possa se desenvolver (BRASIL, 2005, p.50).

De acordo com o RCNEI, Brasil (1998), o adulto pode auxiliar na


distribuição das funções, mas o interessante é que as crianças adquiram
progressiva autonomia.
Segundo Bomtempo, (1999), o professor não deve tolher a imaginação
da criança, mas orientá-la, deixando que a brincadeira espontânea surja na
situação de aprendizagem, pois é através dela que a criança se prepara para a
vida em seus próprios termos.
De acordo com o Proinfantil, (2005), os professores devem focar seus
olhares nas crianças enquanto elas brincam, ajudando-as a verem o mundo e a
expressar-se através das múltiplas linguagens.
Na mesma direção Bomtempo, (1999), complementa com a ideia de que
se os professores acreditarem que brincando a criança está aprendendo sobre
o mundo que as cerca, eles poderão utilizar esse momento para intervir e criar
vários tipos de ações educativas que facilitarão a aprendizagem.
Ao brincar a criança se desenvolve integralmente, passa a conhecer o
mundo em que está inserida. Portanto, o brincar não é apenas uma questão de
diversão, mas uma forma de educar, de construir e de se socializar.
Para que ocorra o brincar é necessária a presença de um profissional, o
professor. Ele é fundamental, pois favorece e promove a interação, planeja e
organiza ambientes para que o brincar possa acontecer, estimula a
competitividade e as atitudes cooperativas, o professor cria na criança a vontade
de brincar, facilitando assim a aprendizagem. Constata-se igualmente que é
necessário garantir o direito à educação evitando-se qualquer tipo de trabalho

46
infantil, além de assegurarem-se espaços físicos e recursos materiais
adequados para a garantia do brincar dentro das escolas de educação infantil.3

10 O ENSINO FUNDAMENTAL NO BRASIL – UMA ANÁLISE DA


EFETIVAÇÃO DO DIREITO À EDUCAÇÃO OBRIGATÓRIA

FONTE: http://info.geekie.com.br

10.1 Discutindo os parâmetros da universalização do ensino fundamental

A dinâmica histórica dos últimos 80 anos aponta uma tendência de


políticas educacionais voltadas para a expansão significativa das oportunidades,
não só de acesso, mas de permanência no sistema escolar que, gradativamente,
vem se ampliando para todas as camadas da população.
O atraso em termo de oferta e cobertura escolar em que o Brasil se
encontrava, até meados do século passado, colocava sob ameaça o acelerado
processo de urbanização da população brasileira e o desenvolvimento
econômico que vinha se consolidando no país a partir da década de 1930.
Findada a primeira metade do século XX, mais de 50% da população maior de

3 TEXTO EXTRAÍDO DO SITE: Cadernos de Educação: Ensino e Sociedade,


Bebedouro-SP, 1 (1): 76-88, 2014.

47
15 anos era analfabeta e mais de um quarto das crianças entre 07 e 10 anos não
frequentavam a escola. Reverter esse quadro se tornava cada vez mais urgente
para responder as exigências do novo padrão produtivo que se consubstancia
com mais veemência na segunda metade daquele século. Sendo assim,
Gonçalves (2010, p.21) destaca que “nesse contexto, em meados do século
passado, teve início, ainda que muito abaixo do necessário para a superação
das desigualdades e garantia dos direitos sociais, a aceleração da escolarização
no Brasil”. Tal investida fica evidente ao se apresentar as taxas de alfabetização
e analfabetismo da população que vão se desenhando no país, no decorrer do
século, conforme se pode observar na Tabela 1.

Os números chamam a atenção para dois fatores significativos: primeiro


a redução ininterrupta da taxa de analfabetismo e o consequente aumento da
taxa de pessoas alfabetizadas que chega em 2010 a 90,4% da população dessa
faixa de idade. Por outro lado, eis o segundo fator: o número absoluto de
analfabetos no país atualmente (13,9 milhões) é mais que o dobro do que era
em 1900 (6,3 milhões), fato esse para o qual já chamava a atenção Anísio
Teixeira em estudo de 1953 (apud BRASIL, 2003, p.6). Sem contar que esses
números se referem ao analfabetismo absoluto e de pessoas a partir dos 15 anos
de idade. Quando se analisa os números de analfabetos funcionais, as
estatísticas são alarmantes: são 20,3% de pessoas nessa condição

48
(IBGE/PNAD, 2009), o que significa que um em cada cinco brasileiros são
analfabetos funcionais.
Quanto ao atendimento escolar da população de 7 a 14 anos (considerado
obrigatório até 2005), também nota-se um exacerbado crescimento nas últimas
décadas. Segundo Gonçalves (2010),

Como o problema também afetava amplamente a população de 7 a 14


anos, faixa etária já então tratada como alvo preferencial do
atendimento escolar, o debate sobre a universalização do ensino foi
logo pautado pela demanda por ampliação das possibilidades de
inclusão deste contingente etário na escola e, de forma mais específica
e focalizada, no ensino fundamental (p.21).

Assim, esta etapa passou a sofrer uma considerável expansão, o que fez
com que, já ao final do século XX, o ensino fundamental obrigatório estivesse
praticamente universalizado no que diz respeito ao acesso, chegando em 2000
com 94,9% de atendimento, ampliando-se, em mais 2% na última década, como
podemos perceber na Tabela 2.

Considerando que a partir de 2005, o ensino torna-se obrigatório para o


grupo etário de 6 a 14 anos, a taxa de atendimento atual chega a 96,7% dessa
população (Censo 2010). Em números absolutos, os 3,3% de crianças dessa
faixa etária fora da escola correspondem a 968.456 crianças. Ampliando para a
faixa de 4 a 17 anos, cuja obrigatoriedade foi instituída pela EC nº 59/2009, o
atendimento escolar, em 2010, foi de apenas 91,5%.
Apesar disso, o crescimento na ampliação do acesso é representativo,
diminuindo relativamente à exclusão por falta de escola. No entanto, um outro
tipo de exclusão tem se revelado: a que Oliveira (2007) chama de “exclusão na
de sucesso escolar para todos. “Passávamos da exclusão da escola para a

49
exclusão na escola. Os alunos chegavam ao sistema de ensino, lá
permanecendo alguns anos, mas não concluíam qualquer etapa do seu
processo de formação, em virtude de múltiplas reprovações seguidas de
abandono” (OLIVEIRA, 2007, p. 671).
A reprovação e a evasão escolar se tornaram tão expressivas que, ao final
dos anos de 1970, eram identificadas como o grande gargalo de nossa
educação. Tal situação gera, a partir dos anos 80, o surgimento de políticas
sistêmicas para enfrentamento e tentativas de conter o problema. Oliveira (2007)
destaca a criação das políticas de ciclos implantadas em vários sistemas de
ensino cujo objetivo era a erradicação da reprovação em determinadas etapas,
assim como a regularização do fluxo.
A generalização de políticas de contenção da reprovação e evasão
escolar, especialmente nas primeiras séries do ensino fundamental, as quais
evidenciavam a maior concentração de matrículas, justamente por ser onde mais
se reprovava, começa a apresentar uma redução gradativa da exclusão no
ensino fundamental causada pela repetência e pela evasão, revelando-se num
crescimento de matrícula nas séries finais dessa modalidade.

Os dados da Tabela 3 revelam, a partir de 1980, uma queda no percentual


de matrículas nos anos iniciais em contraposição ao aumento dos percentuais
referentes aos anos finais dali em diante. A Lei nº 9.394/96 se mostra
contribuidora dessa tendência de regularização de fluxo, ao possibilitar a adoção
50
de mecanismos como os ciclos, a aceleração de estudos, a recuperação paralela
e a reclassificação, entre outras medidas indicadas nos artigos 23, 24 e 32,
parágrafos 1º e 2º, destaca Oliveira (2007). É fato que, a partir das políticas de
regularização de fluxo, a equalização entre as séries começa a se delinear,
diminuindo consideravelmente a distância entre os percentuais de entrada nas
séries iniciais e de saída nas séries finais. Todavia, o problema ainda está longe
de ser resolvido: ainda existe um número considerável de alunos que não
chegam às séries finais do ensino fundamental, posto como mostram os dados
da referida Tabela, um percentual de 8,8% continua vigorando de diferença entre
as séries iniciais e finais dessa etapa. Além disso, esse processo começa a gerar
críticas no sentido de que tal “regularização” do fluxo estaria ocorrendo em
detrimento da qualidade de ensino. Nesse sentido, Oliveira (2007) ressalta,

O que está se observando aqui é que um dos tradicionais mecanismos


de exclusão da escola, reprovação seguida de evasão, está sendo
minimizado. Esse processo coloca o sistema escolar, talvez pela
primeira vez em nossa história educacional, ante o desafio de assumir
a responsabilidade pelo aprendizado de todas as crianças e jovens,
responsabilizando-se por seu sucesso ou fracasso (p. 680).

Sendo assim, nas últimas três décadas, a principal forma de exclusão já


não é a falta de escola, nem a evasão e nem mesmo a não conclusão do ensino
fundamental. Gradual, embora tardiamente, essa barreira foi sendo suprimida.
Por consequência, as parcelas da população que não concluíam o ensino
fundamental passaram a fazê-lo, demandando, com isso, a busca pela
continuidade de sua escolarização, forçando, inclusive, a ampliação do ensino
médio, entre outras políticas de inclusão. No entanto, o acesso e permanência
até a conclusão dessa etapa, não se revelou em sucesso na aprendizagem e a
qualidade passa, então, a ser o centro das discussões.

10.2 O desafio da qualidade

Oliveira e Araujo (2005) pontuam que o combate à reprovação com


políticas de aprovação automática, ciclos e progressão continuada incide sobre
os índices de “produtividade” dos sistemas, uma vez que tais políticas induzem
a uma aprovação igual ou superior a 70%, o que torna a aferição da qualidade

51
mais complexa. A partir dessa dificuldade, a educação brasileira vem
incorporando outros indicadores de qualidade, que é a indicada pela capacidade
cognitiva dos estudantes, aferida mediante testes padronizados em larga escala,
nos moldes do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), da
Prova Brasil, do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Superior (SINAES).
Franco, Alves e Bonamino (2007) expõem que a avaliação em larga
escala da educação foi instituída no Brasil a partir do início da década de 1990
e encontrou contexto particularmente fértil para sua consolidação a partir de
1995. Alinhada com o desenvolvimento dessa política já em curso, em 1996, a
LDB vem estabelecer que compete à União “assegurar processo nacional de
avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em
colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades
e a melhoria da qualidade do ensino” (Art. 9º, inciso VI). Antes, porém, a garantia
da qualidade já se fazia presente na Constituição Federal de 1988 a qual define,
como um dos princípios do ensino brasileiro, a garantia de padrão de qualidade
(inciso VII, art. 206), estabelece que a União deve garantir equalização de
oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade (Art. 211, parágrafo
1º) e determina vinculação de recursos por esfera administrativa a serem
aplicados para a realização dessas finalidades (Art. 212). Assim, o texto
constitucional e a legislação subsequente evidenciam a obrigatoriedade da
oferta educacional de qualidade.
A realização da avaliação nacional, através da aplicação dos testes de
aferição de qualidade, segundo seus executores, baseia-se no pressuposto de
que com eles seja possível avaliar, se o aluno domina ou não os conhecimentos
designados para aquela etapa. Os resultados permitem a constatação de que a
ampliação do acesso não eliminou as fortes desigualdades sociais, regionais e
internas dos próprios sistemas, comentam Franco, Alves e Bonamino (2007).
Quanto ao ensino fundamental, atualmente existem dois principais
mecanismos nacionais de avaliação em larga escala usados pelo governo: A
Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB).
Ambos têm o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema
educacional brasileiro a partir de testes padronizados e questionários

52
socioeconômicos. O SAEB foi criado em 1990 e é realizado a cada dois anos por
amostragem de alunos nas séries finais do primeiro e segundo ciclo do ensino
fundamental (5º e 9º anos) e do ensino médio (3º ano) de escolas públicas e
privadas e fornece dados no âmbito nacional, regional e estadual, sob o domínio
de habilidades dos alunos em Língua Portuguesa e Matemática, com ênfase na
resolução de problemas.

Apesar de ser realizado desde 1990, e servir como instrumento tanto de


avaliação como de direcionamento das políticas educacionais em busca da
melhoria do ensino (no discurso oficial), é possível perceber, pelos últimos
resultados (2009), que os avanços são mínimos e comparáveis às médias dos
primeiros resultados.
A Prova Brasil, criada em 2005, é diretamente direcionada para o ensino
fundamental e usa a mesma metodologia que o SAEB, por isso, passaram a ser
realizados em conjunto. A diferença, no entanto, é que esta última é universal e
apresenta resultados por escola. As médias de desempenho nessas duas
avaliações subsidiam o cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (IDEB), ao lado das taxas de aprovação nessas esferas. Este índice,
bastante valorado pelo governo, porém, questionável em seus fundamentos,
métodos e resultados, é divulgado de dois em dois anos e através dele se
apresenta o desempenho específico do país, estados, municípios e escolas
públicas de todo Brasil. Com base neste indicador, foram estabelecidas metas a
serem alcançadas até 2021, quando o Brasil objetiva alcançar a nota 6,0, nos
anos iniciais do ensino fundamental, numa escala de 0 a 10, padrão definido
como aceitável para os membros da Organização para Cooperação e

53
Desenvolvimento Econômico (OCDE), o grupo das 30 nações mais
desenvolvidas do planeta. Melo (2011), afirma que mesmo o Brasil ainda não
tendo se associado a esta organização, utiliza seus parâmetros e processos
avaliativos para conduzir nossas políticas educacionais.

Independentemente dos mecanismos adotados (SAEB, Prova Brasil,


IDEB), a cada avaliação divulgada são evidenciados percentuais preocupantes
de alunos que estão na escola, mas não se apropriam do mínimo indispensável
para viver em sociedade. Diante dessa realidade, Oliveira e Araújo (2005)
defendem:

Parece que o grande desafio do atual momento histórico, no que diz


respeito ao direito à educação, é fazer com que ele seja, além de
garantido e efetivado por meio de medidas de universalização do
acesso e da permanência, uma experiência enriquecedora do ponto de
vista humano, político e social, e que consubstancie, de fato, um
projeto de emancipação e inserção social. Portanto, que o direito à
educação tenha como pressuposto um ensino básico de qualidade
para todos e que não (re)produza mecanismos de diferenciação e de
exclusão social (p.16-17).

Não restam dúvidas de que a questão da qualidade da educação ainda é


um grande desafio para o Brasil. Isso comprova que as políticas educacionais
implementadas até então mostram resultados ainda modestos quanto à melhoria
do desempenho dos alunos, indicando que nenhuma delas foi capaz de oferecer
incremento de qualidade na magnitude necessária.
Este aspecto é particularmente relevante para ser discutido, em face do
contexto de final de vigência do Plano Nacional de Educação (PNE 2001-2010),

54
da implementação de políticas como a ampliação do ensino fundamental de nove
anos, a ampliação da obrigatoriedade da educação dos 04 aos 17 anos, da
execução de metas como as do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE)1
, do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e
Valorização Profissional da Educação (FUNDEB) e da instituição do novo PNE
(2011-2020), os quais focalizam seus objetivos para a melhoria e efetiva
qualidade da educação brasileira, porém, com árduos desafios a vencer rumo à
real universalização do acesso em todas as etapas e modalidades da Educação
Básica, regularização do fluxo escolar, melhoria do desempenho das escolas
brasileiras e garantia de qualidade em termos de democratização, aprendizagem
efetiva e conclusão do percurso escolar.
Para elucidar ainda mais a situação, num rápido balanço do PNE 2001-
2010, os resultados se mostram bem abaixo do esperado. A maioria das metas
propostas não se efetivou. A exemplo, da meta universalizar o ensino
fundamental, os dados oficiais demonstram que em 2010, 3,1% dos brasileiros
de 7 a 14 anos ainda estavam fora da escola (IBGE, 2010). Apesar do percentual
consideravelmente baixo, os números absolutos assustam: são cerca de 815 mil
crianças sem estudar – metade desse percentual é de negras e pardas e vivendo
nas regiões Norte e Nordeste.
O Plano também estabelecia, em linhas gerais, metas quanto a regularizar
o fluxo escolar, reduzindo em 50% as taxas de reprovação e abandono em 05
anos. No que diz respeito ao abandono, os resultados são bons: entre 2001 e
2007 (prazo estabelecido pela meta), os índices no ensino fundamental caíram
de 9,6% para 4,8% - exatos 50%. Em 2010, o índice aponta para 3,1%. No
entanto, a reprovação, por sua vez, aumentou de 11% para 12,1% no mesmo
período. Em 2010, ainda chega a 10,3%. Quanto ao percentual de estudantes
do ensino fundamental com idade acima da recomendada para a série que
cursam, os índices seguem altos: 24%, segundo dados do Censo Escolar 2010.
A ineficiência na execução do PNE, segundo Dourado (2010), “sinalizam
para limites à educação nacional, traduzidos na proposição e materialização das
políticas e do Plano, bem como os relacionados com a não regulamentação do
regime de colaboração e com os marcos adotados para gestão e financiamento
da educação nacional” (p.686). O que significa dizer que as propostas do PNE

55
não configuraram efetivas políticas de Estado, ou seja, o plano não foi
considerado como a base e diretriz centrais do planejamento e implementação
das ações educacionais, como também, não se corporificou nos âmbitos
estaduais e municipais como previa a legislação, comprometendo o
cumprimento de suas metas e as possíveis melhorias na qualidade da educação
como intencionava. Findada a sua vigência, a maioria das metas instituídas não
foi cumprida, necessitando ser retomadas, embora com outro formato, no plano
subsequente, cuja construção entra em cena entre 2009 e 2010.
A gestação do novo PNE para o decênio 2011-2020, que ora tramita no
Congresso Nacional, mais uma vez, foi fruto de diversas discussões pelo país a
fora, através da Conferência Nacional de Educação (CONAE)2 realizada nos
âmbitos municipais, estaduais e federal com a participação dos vários
segmentos da comunidade escolar e da sociedade civil organizada, da qual
resultou um Documento-Referência com as bases para a configuração do novo
Plano, a partir de suas deliberações, constituindo-se num “referencial político e
marco para a educação nacional e para as políticas de Estado” segundo o
Documento Por um Plano Nacional de Educação (2011-2020) como política de
Estado (ANPEd, 2011). O Projeto de Lei (PL) do novo PNE (PL nº 8.035/2010)
foi encaminhado pelo MEC em dezembro de 2010 ao Poder Legislativo.
Entretanto, conforme o referido documento (ANPEd, 2011),

O PL 8.035/2010 apresenta alguns avanços, sobretudo no


estabelecimento de diretrizes e metas de universalização (dos 4 aos
17 anos), como requer a Constituição Federal, por meio da emenda
constitucional n. 059/2009. Mas considera, por outro lado, que a
proposta de plano não traduz o conjunto das deliberações aprovadas
pela Conferência Nacional de Educação (CONAE), apresentando
limites na organização, concepção de metas, articulação entre metas
e estratégias etc. (p. 17).

Ainda segundo esse documento (ANPEd, 2011), outra limitação apontada


no PL diz respeito à ausência de um diagnóstico do cenário educacional do país,
assim como os processos avaliativos do cumprimento das metas do PNE 2001-
2010 que não ficam esclarecidos. Nesse sentido, Dourado (2010) frisa que o
novo PNE:

[...] deve ter vigência decenal e ser expressão de uma política de


Estado que garanta a continuidade da execução e da avaliação de

56
suas metas perante as alternâncias governamentais e relações
federativas; deve ser entendido como uma das formas de
materialização do regime de colaboração entre sistemas e de
cooperação federativa; deve ser resultado de ampla participação e
deliberação coletiva da sociedade brasileira, incluindo, nesse
processo, as conferências de educação, como loci constitutivos e
constituintes do processo de discussão, elaboração e aprovação do
PNE; deve avançar na correção de deficiências e lacunas do atual
Plano, como também contribuir para o aprimoramento, o avanço e a
organicidade das políticas educacionais em curso no país (p. 692).

À importância da consolidação do PNE como política de Estado, de


construção coletiva e democrática e cuja condução caminhe para a real garantia
e consolidação da expansão, democratização do acesso, permanência e
conclusão de todos, sem qualquer tipo de exceção, com a devida qualidade em
todas as etapas, níveis e modalidades da educação, considerando a histórica
dívida brasileira, que até o momento, ainda continua ativa. É fato que os
instrumentos legais até o momento instituídos e as ações necessárias para sua
efetiva execução não deram conta de liquidá-la, seja pela inoperância e
descomprometimento dos poderes com a massa social excluída, seja pela ainda
retraída participação social nos rumos do país.
O desafio de qualidade hoje não pode ser enfrentado sem alterações
profundas na agenda das políticas educacionais. Sobre isso, Arelaro (2005)
discorre que o primeiro impasse do ensino fundamental público no Brasil diz
respeito à necessidade de se criar um novo modelo de referência de “qualidade
escolar”, em que o ensino para todos possa significar, genuinamente, “ensino de
qualidade para todos”.
Assim, com base em Freitas (2008), a promoção da necessária e tardia
ampliação do ensino obrigatório deve acontecer de modo tal que a qualidade no
acesso não se limite ao ingresso na escola, mas que envolva o acesso a
recursos materiais, políticos e culturais, às estruturas e mediações do processo
de escolarização e, sobretudo, aos bens culturais e a uma formação humana
comprometida com a emancipação pessoal e social, de cada um e todos
indistintamente.
No âmbito dessa discussão, da implantação de políticas educacionais
para garantia da qualidade do ensino, ganha relevância o debate sobre a
ampliação do ensino fundamental para nove anos, uma vez que tal política é
colocada pelos órgãos oficiais, como mais uma tentativa no sentido de oferecer
57
maiores oportunidades de aprendizagem nesse período de escolarização
obrigatória e assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as
crianças possam dispor de mais tempo e mais possibilidades de construir
aprendizagens significativas, portanto com maior qualidade. Por outro lado,
apesar de, atualmente, a educação básica dos 04 aos 17 anos ser considerada
de oferta obrigatória, como o prazo de implantação se estende até 2016 e em
face da desestrutura dos sistemas para cumprir de imediato essa determinação
legal, é o ensino fundamental que continuará ainda, por alguns anos, sendo a
via principal de acesso ao mundo letrado que, por sua vez, conduz a maiores e
melhores possibilidades de inserção e participação na vida cultural, social,
econômica e política.4

11 CENÁRIO ATUAL DO ENSINO FUNDAMENTAL NO BRASIL

FONTE: www.estadao.com.br

4 TEXTO EXTRAÍDO DO SITE: http://www.anpae.org.br

58
O Ensino Fundamental brasileiro viveu grande expansão de matrículas
durante a década de 1990, mas, nos últimos, percebemos o fim desse ciclo
expansionista, sobretudo em função de dois fatores: a redução da população
nesta faixa etária e a relativa estabilização do fluxo escolar, sobretudo no ensino
fundamental, uma vez que, no ensino médio, ainda são altos os índices de
evasão e repetência. Os dados do censo escolar feito pelo Ministério da
Educação – MEC, apontam para a queda da distorção idade-série, sendo a idade
média de conclusão do Ensino Fundamental de 18,8 anos em 2002 e de 15,2
anos em 2011, no entanto, ainda há alto índice de repetência, sobretudo na
primeira série (SILVA; CAFIERO, 2011) com taxas mais graves de distorção
idade-série nas regiões Norte e Nordeste (INSTITUTO NACIONAL DE
ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2012).
De acordo com os dados do INEP, os resultados do SAEB 2011 mostram
que houve melhora no aprendizado de matemática e de língua portuguesa nos
últimos anos, especialmente em matemática. Mas, ainda assim, os resultados
são muito preocupantes. Apenas 42,8% dos alunos que concluem o 3º ano do
Ensino Fundamental, por exemplo, têm as habilidades em matemáticas
esperadas para a série. Para a escrita, 53,3% dos alunos tiveram desempenho
considerado satisfatório, com base nas escalas do SAEB. Mas destaca-se o fato
de que 43,9% dos alunos ficaram com índice abaixo das habilidades esperadas
em leitura. Além disso, as disparidades regionais permanecem. Enquanto na
Região Norte apenas 28,3% dos estudantes do 3º ano do Ensino Fundamental
tiveram o resultado esperado para a série, na região Sul esse percentual foi de
55,7%. Porém, as médias em matemática e em português ainda são muito
baixas, considerando a posição do Brasil no ranking mundial de avaliação
educacional.
Alguns dados do censo escolar de 2011 também são alarmantes, pois
revelam elevado percentual de escolas da Educação Básica com até cinco salas
de aulas (52%), além de expressivo número de escolas sem biblioteca ou sala
de leitura nas regiões Norte (80%) e Nordeste (76%). Além disso, enquanto mais
de 70% das escolas do Sudeste, Sul e Centro-Oeste têm acesso à internet, nas
regiões Norte e Nordeste esses percentuais são radicalmente menores (19% e
25%, respectivamente).

59
Em relação ao investimento público na educação, os dados apresentam
aumento de investimento no período de 2000 a 2010. De acordo com dados do
INEP o percentual do investimento público total em relação ao PIB, vem
aumentando nos últimos anos. Em 2000, esse percentual era de 3,9% e, em
2010, de 5,1%. Paralelamente, o percentual de gastos com a educação terciária
sobre a educação básica se vem reduzindo, passando de 11,1% em 2000 para
5,1% em 2010.
Os dados do Censo Escolar de 2011 sobre o professor brasileiro, revelam
um total de 68,2% de docentes dos anos iniciais do Ensino Fundamental com
formação superior, percentual que sobe para 84,2% entre os professores das
séries finais do Ensino Fundamental. Porém, vale destacar que ainda há, no
Brasil, 31,8% de professores sem nível superior atuando como professores das
séries iniciais do Ensino Fundamental, em desacordo com a formação mínima
exigida pela Lei de Diretrizes e Bases - LDB 9394 (BRASIL, 1996).
Daqueles que estão cursando a graduação, 185.074 professores,
praticamente a metade (48,6%) está matriculada em cursos de Pedagogia
(INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS
ANÍSIO TEIXEIRA, 2012). Portanto, observase que, na educação básica, há um
grande predomínio de pedagogos. Mas em que medida tais profissionais
finalizam seus cursos com as competências necessárias para formar alunos de
1ª a 4ª séries? Em outras palavras, qual o grau de competência para ensinar dos
professores que atuam nas séries iniciais do Ensino Fundamental?

11.1 O conceito de competência

Examinando os conceitos de competência, encontramos várias


definições. Para Perrenoud (1999), competências são aquisições, aprendizados
construídos; e construir uma competência significa aprender a identificar e a
encontrar os conhecimentos pertinentes. Quanto à habilidade técnica,
Magalhães,Wanderley e Rocha (1997), definem competência como um “conjunto
de conhecimentos, habilidades e experiências que credenciam um profissional a
exercer determinada função”. No que concerne à metacognição, segundo
Zarifian (1996), “competência é assumir responsabilidades frente a situações

60
complexas de trabalho aliado ao exercício sistemático de reflexão na execução
de tarefas”. Sparrow e Bognanno (1994) definem competência quanto à atitude,
como a disposição que permite ao profissional adaptar-se rapidamente a
qualquer ambiente, fazendo uso do conhecimento e se orientando para a
inovação e aprendizagem permanentes. Dutra, Hipólito e Silva (1998) definem
competência como a capacidade de uma pessoa gerar resultados dentro dos
objetivos organizacionais. Para Tanguy (1997), um dos aspectos essenciais da
competência é que esta não pode ser compreendida de forma separada da ação.
Encontramos em Durand (2001), o conceito que se refere a um conjunto de
qualificações e que mais se aproxima dos objetivos educacionais da educação
básica. O autor nos mostra como as três dimensões: conhecimento, habilidades
e atitudes são necessárias à consecução dos objetivos da educação, em
qualquer nível de apreensão do conhecimento, aplicando-as em um contexto
específico, em que a ação dirige o processo, integrando aspectos técnicos,
sociais e individuais relacionados ao trabalho educacional. Assim, o
desenvolvimento de competências se dá tanto por meio da aprendizagem
individual como coletiva. Essa abordagem de competência pode ser aplicada
tanto na organização escolar, em relação aos alunos, como nas organizações
empresariais, em relação ao desenvolvimento de pessoal.

11.2 Competências do aluno do ensino fundamental

O Ensino Fundamental, através da escola pública, é a educação da


maioria da população que só pode contar com ela. Os Parâmetros Curriculares
do Ensino Fundamental traçam as diretrizes do conhecimento a ser desenvolvido
pelos professores com vistas a se constituir nas competências básicas que este
nível de ensino espera que o alunado alcance ao final dos oito/nove anos de
escolaridade. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, art. 26,
“os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional
comum a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento
escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e
locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela”. O parágrafo
primeiro do mesmo artigo especifica que os currículos “devem abranger,

61
obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o
conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil”.
Tais competências têm sido alvo de constantes avaliações pelos diversos
níveis de atuação dos sistemas educacionais; tais avaliações não têm sido
satisfatórias quanto às competências avaliadas, mostrando que os nossos
alunos do Ensino Fundamental estão muito aquém das exigências mínimas
requeridas dessa população, em comparação com avaliações internacionais
deste nível de ensino.
De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira – INEP, o baixo desempenho dos estudantes brasileiros no Pisa
tem como causas: o atraso escolar – provocado pelos altos índices de
reprovação e abandono, a desigualdade social, a baixa renda da população e a
qualidade das escolas.
Um estudo de Oliveira, Boruchovitch e Santos (2008) explorou a relação
entre compreensão em leitura e desempenho escolar em alunos do ensino
fundamental de escolas públicas. Participaram da pesquisa 434 estudantes do
ciclo final do Ensino Fundamental. Os resultados revelaram associação entre
compreensão em leitura e desempenho escolar, pois os alunos que
demonstraram melhor compreensão textual também apresentavam
desempenho escolar mais satisfatório nas disciplinas. Esses dados foram
discutidos à luz das implicações positivas que a compreensão em leitura tem
para a aprendizagem de diferentes conteúdos escolares. Os resultados obtidos
pelos autores confirmam as considerações de vários outros autores sobre o
quanto a compreensão em leitura pode minimizar as dificuldades escolares e
melhorar o desempenho escolar.
Contudo, são muitos os que ainda têm dificuldade com a leitura, mesmo
na terceira série que seria o momento onde se esperaria o término da fase de
alfabetização. A título de exemplo, os resultados do Proalfa 2008, em Minas
Gerais, indicam 27,5% dos alunos do terceiro ano de escolaridade em um nível
abaixo do recomendável de alfabetização (SILVA, CAFIERO, 2011).

62
11.3 Competências necessárias ao professor

De acordo com a LDB, em seu art. 62:

[...] A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á


em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação; admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e
nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em
nível médio, na modalidade Normal [...]. (Brasil, 1996).

O Decreto nº. 3276, de 1999, que regulamenta esse artigo da LDB,


especifica em seu art. 2, segundo parágrafo, que a “formação em nível superior
de professores para a atuação multidisciplinar, destinada ao magistério na
educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, far-se-á
exclusivamente em cursos normais superiores”. (BRASIL, 1999).
A legislação que regulamenta a formação de professores quase sempre
consegue se constituir num mecanismo de sustentação do status quo da
educação, longe de se transformar em proposta que viabilize mudanças. Os
currículos dos cursos de pedagogia e normal superior que conseguem prover o
alunado das competências necessárias ao exercício do magistério na área do
primeiro ciclo do ensino fundamental, durante muito tempo, tinham habilitações
que não contemplavam os conhecimentos significativos capazes de assegurar o
desempenho desses alunos. Vejamos as disciplinas obrigatórias do currículo do
curso de Pedagogia para a habilitação às séries iniciais do Ensino Fundamental,
de acordo com o Art. 1º da Resolução CNE/CES nº 1, de 1º de fevereiro de 2005:

I - Estrutura e Funcionamento do Ensino Fundamental;


II - Metodologia do Ensino Fundamental
III - Prática de Ensino - Estágio Supervisionado na Educação Básica,
com carga horária mínima de trezentas horas, de acordo com o
disposto no art. 65, da Lei N° 9.394/96. (BRASIL, 2005).

Na Estrutura e Funcionamento do Ensino Fundamental os alunos


conhecem e criticam a legislação que regulamenta o funcionamento do sistema
de Ensino Fundamental e que condiciona uma estrutura que sustenta a
perpetuação do mesmo; e estabelecem relações entre a realidade do sistema e
a proposta legal. Embora tomem conhecimento das diretrizes educacionais
emanadas do poder público, assim como a legislação do ensino, o círculo vicioso

63
das decisões centradas nos órgãos superiores da administração continua
relegando os alunos e seus responsáveis a um segundo plano, como seguidores
das regras ditadas na legislação.
Esse caráter cartorial que a legislação confere à educação transforma a
administração dos sistemas escolares em um processo burocrático em que as
atividades meio dirigem as atividades fim. Tal quadro é, em parte, responsável
pelos deficientes resultados das avaliações de desempenho dos alunos.
As políticas educacionais tentam resolver este problema através de
iniciativas globais, sem levar em conta diagnósticos específicos de cada escola.
Numa crítica ao parecer de Capanema ao projeto da antiga LDB de 1961, Anísio
Teixeira afirmava que os educadores não podem ser transformados em
“executores rígidos de programas oficiais, e os livros didáticos em manuais
‘oficializados’ e conformes, linearmente com os pontos dos programas”
(TEIXEIRA, 1976, p. 85).
Na Metodologia do Ensino Fundamental, método implica conteúdo e
quando se trata das questões de currículo não convém nunca deixar de associar
conteúdo e forma de ensinar (PARO, 2011). Porém, o conteúdo do currículo do
curso de Pedagogia, centrado nos Fundamentos e na História da Educação, não
dá condições para o estabelecimento das competências requeridas para que o
professor atue de maneira efetiva nas séries iniciais do Ensino Fundamental.
Esse professor, quando aluno, entra na Universidade por uma porta estreita.
Sabemos que os integrantes do Curso de Pedagogia, de um modo geral, são os
alunos com as menores médias nos resultados do ENEM, mostrando-nos uma
deficiência considerável no âmbito da cultura geral. Este quadro de deficiência
de conhecimentos básicos não é suprido nem pelo currículo do ciclo básico, nem
pelos conhecimentos específicos do curso de Pedagogia. Se o domínio dos
conhecimentos básicos do ensino médio não foram alcançados integralmente,
fica difícil uma leitura crítica de um texto, um estabelecimento de relações entre
o pensamento de autores, uma síntese capaz de identificar conceitos principais.
Isso leva os alunos de Pedagogia a uma repetição não crítica de textos e
memorização de chavões que não os ajudam. Muitos apresentam dificuldades
para ler uma tabela estatística, não sabem interpretar e diferenciar resultados
absolutos e relativos e examinando uma pirâmide de matrícula são incapazes de

64
interpretá-la quanto ao nível de produtividade da escola. Além dessas
incapacidades básicas de leitura, escrita e conhecimentos numéricos, aliase a
ignorância da História e Geopolítica do Brasil, mas repetem bem os chavões da
Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire, o ajustamento das gerações ao legado
das tradições de Durkheim, o desenvolvimento da inteligência de Piaget, alguns
trechos da obra de Bourdieu e Passeron, o positivismo de Comte, o pragmatismo
de Dewey e também as teses marxistas de alguns autores que nunca leram O
Capital.
Esse quadro dá aos pedagogos a impressão de que têm competência na
área educacional, mas são professores incapazes de ensinar, pois só
aprenderam a repetir. Nos momentos de crise, como a que vivemos em
educação, se repetirmos os mesmos procedimentos, não saímos dela. Há
necessidade de se inovar, com base na criação de competências no âmbito
daquela cultura necessária aos alunos das séries iniciais do Ensino
Fundamental: ler, escrever e contar – de modo a viver e compreender o mundo
que os cerca, as realidades que precisam ser conhecidas, problematizadas e
mudadas, de acordo com o nível de maturidade psicológica dos alunos. Em
outros palavras, é preciso começar a formar cidadãos capazes de escolher
valores básicos e, através deles, desenvolver uma práxis capaz de construir a
sociedade com que sonhamos. Embora tal preocupação ainda não tenha
alcançado os níveis de efetividade necessários e suficientes para a solução dos
problemas básicos da educação brasileira, é imperativo que prossigamos
trilhando os caminhos que nos indiquem a direção a ser percorrida.
Como um sintoma da situação descrita, é preciso considerar as reflexões
feitas por Oliveira (2010) a partir das preocupações dos professores de um curso
de Pedagogia com a resistência das alunas em relação ao exercício da docência.
Por diversas razões, com destaque para a questão da baixa remuneração, os
alunos de Pedagogia apostam na amplitude da formação como uma
possibilidade de sair da sala de aula e não como um caminho para potencializar
a prática de ensino. Nesse sentido, cabe a discussão da profissionalização
docente feita por diversos autores e consolidada por Gatti, Barreto e André
(2011). Esses autores rejeitam a formação de professores a partir de uma
posição missionária ou de ofício e consideram que o docente precisa ser um

65
profissional com “condições de confrontar-se com problemas complexos e
variados, estando capacitado para construir soluções em sua ação, mobilizando
seus recursos cognitivos e afetivos” (GATTI; BARRETO; ANDRÉ, 2011, p. 93).
Na pesquisa de Penna (2012), com professoras das primeiras séries do
ensino fundamental, ficou evidenciado que a relação estabelecida pelas
professoras com o universo do conhecimento científico e escolar é uma “relação
utilitária e superficial com o conhecimento científico” (p. 213), decorrente de
aprendizado ocorrido nos momentos de formação inicial ou de formação
continuada e referido à sua aplicabilidade prática. Além disso, Penna também
não encontrou nos professores pesquisados preocupação com a necessidade
de se apropriar do conhecimento das disciplinas escolares que deveriam ensinar
a seus alunos.
Se os professores não possuem apropriação do conhecimento científico
e a competência necessária para a atuação docente, só se pode esperar dos
alunos um desempenho deficiente. Evidentemente não se pode atribuir apenas
à formação dos professores a responsabilidade sobre o desempenho atual das
redes de ensino, pois múltiplos fatores convergem para isso (GATTI; BARRETO;
ANDRÉ, 2011). Contudo, esse quadro de incompetência dos pedagogos é, em
grande parte, responsável pela construção de um círculo vicioso e histórico de
reprodução da incompetência: se os professores não têm domínio do conteúdo,
o desempenho dos alunos só pode ser deficiente. E não será uma Metodologia
do Ensino Fundamental que irá solucionar o problema; método necessita, antes
de tudo, de definição de conteúdo. Os currículos dos cursos de Pedagogia
partem do princípio de que os alunos dominam os conteúdos do Ensino
Fundamental e partem para a Metodologia do Ensino Fundamental, sem ao
menos uma revisão dos conteúdos básicos. Temos de reconhecer essa
deficiência. Apesar de a pesquisa em educação ter procurado obter informações
que possibilitem relacioná-las ao contexto político e social, permitindo a
priorização de áreas no âmbito das políticas educacionais, a identificação das
dificuldades no âmbito da formação de professores, ainda não identificou as
competências do magistério no nível dos conteúdos do currículo do ensino
fundamental, o que certamente irá mostrar as lacunas de conhecimento nessa
área e que acabam se constituindo na falta de competência do alunado.

66
Há necessidade de se certificar os professores em exercício, a fim de que,
identificadas as deficiências de formação, possamos oferecer cursos de
atualização capazes de sanar as deficiências encontradas e despertar no
professor a vontade de um contínuo aprimoramento profissional. Uma pesquisa
realizada por Chakur (2005) investigou se existiriam diferenças entre professores
de acordo com o tempo de exercício da profissão. Foram entrevistadas 14
professoras de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental de uma escola pública
paulista sobre histórias hipotéticas, cada qual contendo problema a ser
julgado/solucionado e com análise baseada em critérios do referencial
piagetiano. Os resultados indicaram que os depoimentos dos professores se
distribuem pelos mesmos níveis encontrados em pesquisas anteriores com
professores de 5ª a 8ª séries. Chakur (2005) concluiu que o desenvolvimento
profissional docente ocorre em uma sequência de níveis hierárquicos e, para que
os esquemas profissionais progridam e se aperfeiçoem, é fundamental a tomada
de consciência dos obstáculos enfrentados. O autor cita os trabalhos de
Huberman (1995) que retrata o desenvolvimento profissional de professores,
tratando a idéia de que existem certas tendências gerais no ciclo de vida dos
professores, que comportam uma sequência de fases cuja ordem obedece ao
tempo de carreira. Assim, segundo Huberman (1995), o professor passa por uma
fase inicial de sobrevivência e descoberta, com a entrada na carreira, que traz o
sentimento de choque da realidade, mas implica explorações e
experimentações; em seguida, vem a do comprometimento definitivo ou
estabilização, que ocorre entre 4 e 6 anos de carreira e favorece sentimentos ao
mesmo tempo de independência e de pertença a um corpo profissional; a fase
de diversificação, entre 7 e 25 anos, revela percursos individuais que vão desde
a rotina até a crise existencial; dos 25 aos 35 anos caracteriza-se o aparecimento
da serenidade e distanciamento afetivo, ou do conservantismo; e a fase do
desinvestimento (sereno ou amargo) refere-se à época da aposentadoria, entre
35 e 40 anos de carreira. Portanto, os planos de formação continuada deveriam
considerar essas diferentes fases e continuar a desenvolver as competências
dos professores em todas as fases de sua carreira, considerando seus diferentes
estágios.

67
Mas, evidentemente, ao refletir sobre o desenvolvimento das
competências de quem ensina é preciso considerar as condições de trabalho e
de vida dos professores do Ensino Fundamental, especialmente do ciclo inicial.
Uma importante pesquisa foi realizada por Goulart Junior e Lipp (2008) junto a
175 professores de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental atuantes em escolas
públicas estaduais de uma cidade do interior de São Paulo. Eles estudaram os
sintomas de estresse na população pesquisada e constataram que 56,6% dos
professores estão experimentando estresse, cujos principais sintomas presentes
são sensação de desgaste físico constante, cansaço excessivo, tensão
muscular, problemas com a memória, irritabilidade excessiva,
angústia/ansiedade diária, pensar constantemente em um só assunto e
irritabilidade sem causa aparente (GOULART JUNIOR; LIPP, 2008). O resultado
das pesquisas dos autores é importante porque mostra que não basta melhorar
a formação dos professores de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental. É preciso
também que esses professores disponham de qualidade de vida (que já está se
caracterizando como histórica) para que possamos olhar essa triste realidade e
resolver esse problema, com uma profunda reconstrução desse currículo que
está alimentando uma contínua incompetência dos nossos alunos, comprovada
pelos recentes resultados da prova Brasil.
Há necessidade de um profundo diagnóstico do nível de competência dos
professores em exercício, a fim de que, identificadas as deficiências de
formação, possamos oferecer cursos de atualização capazes de sanar essas
deficiências. Só assim iremos formar um exército de professores que irá
realmente formar a clientela do Ensino Fundamental e resolver parte do
problema do baixo nível de desempenho do alunado desse nível de ensino.
Inúmeras são as críticas ao nível de formação de nossos professores,
mas até agora, as políticas nessa área têm-se mostrado incapazes de resolver
o problema. Seminários, palestras, oficinas pedagógicas, distribuição de material
didático (até livros de Prática de Ensino o MEC chegou a propor) são
insuficientes para resolver o problema, que é pontual e deve ser tratado com foco
em cada professor, de modo a valorizá-lo de acordo com seu nível de
desempenho. Soluções gerais são vícios da nossa política educacional ainda
sitiada na centralização do processo de tomada de decisões, que outorga um

68
nível de facilidade para quem dirige o sistema. A consciência de que somos uma
federação com características e problemas locais diferentes, e não uma
república unitária é fundamental para enfrentarmos o problema da capacitação
dos professores em nível local, para que possam exercer seu ofício com
competência e dignidade, embora não seja tarefa de solução simples.
A pesquisa educacional é um dos instrumentos indicados para a
identificação e construção do conhecimento sobre tais problemas, mas não tem
sido prioritária porque o Estado que tudo resolve4 não tem como objetivo
identificar problemas, mas propor regras para que os problemas não surjam.

12 VINCULAÇÃO ENTRE COMPETÊNCIAS DO ALUNO E COMPETÊNCIAS


DO PROFESSOR

FONTE: blogs.universal.org

Aluno e professor são faces de uma mesma moeda. Não há como falar
em melhorar o nível de competência dos alunos, sem investir na melhoria da
competência do professor que ensina. Acreditando nesse binômio
“professoraluno”, Oliveira e Alves (2005) apresentam dados de professores do
Ensino Fundamental, analisando o entendimento do papel do professor no

69
processo de estimulação e manutenção do interesse dos alunos pela escola. O
referencial teórico adotado compreende o desenvolvimento humano pela
interação social mediada e os autores realizaram entrevistas com cinco
professoras, abordando temas da formação, concepções sobre “bons e maus
alunos” e definições sobre estimulação e motivação. Os resultados mostram
satisfação pela profissão, contudo, queixas da má remuneração e
desvalorização no magistério. Os autores destacam a necessidade de
instrumentalizar esses docentes para atuarem como mediadores no processo de
ensino-aprendizagem, buscando coerência nas concepções dos professores e
dos alunos, evitando desinteresses, processos de fracasso e evasão escolar.
Também é importante considerar o estudo de Sobreira e Campos (2008)
que relacionaram o investimento público em educação fundamental e a
qualidade do ensino, a partir de uma avaliação regional dos resultados do Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério - Fundef. Entre os objetivos do fundo está o de garantir recursos
mínimos para o investimento público em educação fundamental, assegurando a
qualidade do ensino oferecido e, por conseguinte, a melhora na proficiência dos
alunos. Com base nos dados de volume de recursos investidos no ensino
fundamental via Fundef e nos resultados das Saebs (Sinopses Estatísticas da
Educação Básica), Sobreira e Campos (2008) analisam os efeitos dessa política
pública sobre o desempenho dos alunos da rede pública de ensino fundamental
brasileira. Os resultados apontam a importância do aporte financeiro e da
qualificação do magistério para o aperfeiçoamento da qualidade da educação
pública. Os resultados apontam para correlações positivas entre o desempenho
dos alunos nas avaliações e as variáveis gasto aluno-ano, remuneração média
do magistério e docentes com curso superior/matrículas. A correlação é mais
forte entre as notas das Saeb e o gasto aluno-ano mínimo com o Fundef, seguido
pelos docentes com curso superior por matrículas. Destaque-se que Sobreira e
Campos (2008) confirmam, portanto, que a qualificação docente apresenta
correlação direta e positiva com o desempenho escolar.
Na mesma linha, Veiga, Leite e Duarte (2005) discutem a capacitação
docente em relação ao desempenho escolar do aluno e ao contexto da
diversidade socioeconômica instaurada nas escolas a partir da década de 90. O

70
problema de pesquisa foi o seguinte: qual a importância da capacitação no
desempenho dos docentes para melhorar o rendimento escolar dos alunos dos
municípios de Januária e Montes Claros? Os dados foram coletados, nesses
municípios, entre outubro de 1999 e fevereiro de 2000 e se referem à situação
socioeconômica das famílias das crianças matriculadas nas escolas da amostra,
ao perfil do professorado e ao apoio pedagógico disponível nas escolas. A
amostra foi composta por seis escolas em cada município (três da rede estadual
e três da rede municipal), totalizando 12 escolas. A análise da capacitação está
baseada no tipo de treinamento oferecido aos professores da rede pública por
meio de programas implementados nos estados de Minas Gerais e São Paulo
no período 1996-1998. A principal conclusão é a de que a capacitação na forma
como tem sido oferecida não tem contribuído efetivamente para desenvolver as
competências demandadas dos docentes para apoiar crianças oriundas de
ambientes familiares desfavoráveis aos desafios da escolarização (VEIGA;
LEITE; DUARTE, 2005).

13 O ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS E OS PROCESSOS DE


ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO

Atualmente, vive-se um momento de transição relacionado à implantação


de uma nova política educacional que ampliou o Ensino Fundamental de oito
para nove anos e isso requer uma mudança de conceitos e de práticas em
relação às instituições escolares, principalmente com relação aos processos de
alfabetização e letramento.
Para melhor compreender a implantação de uma nova política
educacional faz-se importante conhecer o contexto histórico de desenvolvimento
do sistema educacional no Brasil, mesmo que brevemente. Pretende-se dar
destaque aos acontecimentos históricos mais significativos no que tange a
legislação e a regulamentação da educação, a partir da primeira Lei Geral da
Educação.
A primeira Lei Geral da Educação de 15 de outubro de 1827, criada ainda
no período imperial é um marco histórico da Educação Nacional. Tratava da
criação de escolas de primeiras letras em vilas, cidades, lugares mais populosos,

71
sendo determinado valores salariais de máximo e mínimo para os professores.
A metodologia utilizada era baseada no ensino mútuo e ainda, apresentava de
maneira geral os conteúdos a serem ensinados. (BRASIL, 1827). Essa lei
apontava para a criação das escolas, porém não mencionava em momento
algum a obrigatoriedade do ensino. A criação dessa lei foi uma das primeiras e
descontínuas tentativas de tornar a educação uma responsabilidade do poder
público.
Um segundo momento significativo ao meio educacional ocorreu entre os
anos de 1890- 1930, onde intensificaram-se os debates sobre a instrução
pública. Segundo Saviani (2004), emergia a tendência de considerar a escola
como chave para a solução dos demais problemas enfrentados pela sociedade,
dando origem à ideia da escola redentora da humanidade.
O período entre os anos de 1930 e 1961 foi marcado por importantes
reformas educacionais no Brasil. De acordo com Saviani (2004), em 1930 foi
criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, com titularidade da pasta para
Francisco Campos, que apresentou os decretos criando, o Conselho Nacional
de Educação (CNE) destinado a cuidar das questões educacionais, analisar e
propor soluções pertinentes, criando também os Estatutos das Universidades
brasileiras e organizando o ensino secundário e comercial.
Em meio a manifestos de intelectuais da educação e diversos setores da
sociedade foi promulgada a Constituição de 1934 que contemplou a educação
em onze artigos, dentre eles firmava a responsabilidade do Governo e da família
para com a educação e assegurava além da gratuidade, a obrigatoriedade do
ensino primário, conforme estava descrito no item “a” do parágrafo único do
artigo 150: "O ensino primário integral e gratuito e a frequência obrigatória,
extensivo aos adultos [...]". (BRASIL, 1934). A Constituição de 1934 fixava
também o Plano Nacional de Educação (PNE), competindo sua elaboração ao
Conselho Nacional de Educação, elaborado somente no ano de 1962.
Uma nova Constituição Federal foi promulgada em 1946 e no que tange
a educação definiu como responsabilidade da União fixar as Diretrizes e Bases
da educação Nacional. Em consequência disso, foi elaborado e encaminhado ao
Congresso Nacional um projeto que após longo e conturbado período de
tramitação, resultou na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),

72
sancionada em 1961 que mantinha a estrutura vigente até então, assegurando
o ensino primário obrigatório a partir dos sete anos de idade podendo ser
ministrado em quatro ou seis séries conforme especificidades técnicas a serem
introduzidas. (SAVIANI, 2004).
A extensão da obrigatoriedade escolar foi alterada dez anos depois por
uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de nº 5.692/1971,
que institui o ensino de 1º grau (ensino fundamental) obrigatório dos sete aos
quatorze anos, com oito anos de duração. (BRASIL, 1971).
Nos anos noventa uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, de nº 9.394/1996 foi sancionada. A mesma, vigente até os dias atuais,
com algumas alterações promovidas ao longo dos quase vinte anos que se
passaram desde sua sanção, trata da universalização da Educação Básica. Essa
LDB possibilitou o atendimento em creches e pré- escolas à crianças de zero a
seis anos de idade, já que aos sete anos a criança ingressava no ensino
fundamental. A Lei apresentava também a organização da educação básica em
três etapas: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, que
permanece em vigor atualmente.
Como se pode perceber, por meio das legislações, no Brasil
historicamente a idade mínima para o ingresso na escolarização foi de sete anos
de idade.
Nos últimos anos, porém houve um interesse crescente em ampliar esse
ingresso para as crianças de seis anos e aumentar o período de duração do
ensino obrigatório de oito para nove anos. Esse interesse pode ser constatado
na própria LDB de 1996, quando faculta aos municípios, estados, distrito federal
e a União a matrícula no ensino fundamental de crianças a partir dos seis anos
de idade e também quando no PNE de 2001 apresenta como objetivos e metas
ampliar o ensino fundamental para nove anos com ingresso a partir dos seis
anos de idade.
Concretizando o primeiro passo nessa direção, em 2005 foi sancionada a
Lei nº 11.114/2005 que antecipou o marco etário dos sete para os seis anos de
idade, alterando o artigo 6º da LDB nº 9.394/96: "É dever dos pais ou
responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos seis anos de idade,
no ensino fundamental". (BRASIL, 2005, p.1). Entretanto, essa mesma lei não

73
mencionava a obrigatoriedade de os sistemas organizarem o ensino
fundamental com duração de nove anos.
Em fevereiro de 2006 a Lei nº 11.274/2006 alterou o artigo 32º da LDB,
Lei nº 9.394/96 passando a vigorar com o seguinte texto: "O ensino fundamental
obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando
aos 6 (seis) anos de idade [...]”. (BRASIL, 2006, p. 1).
A partir dessa alteração, o ensino fundamental fica organizado em Anos
Iniciais, com duração de 5 (cinco) anos com ingresso aos 6 (seis) anos de idade
e Anos Finais com duração de 4 (quatro) anos e ingresso aos 11 (onze) anos de
idade. A nomenclatura das etapas anuais escolares, também recebe alteração,
passando de série (1ª à 8ª) para ano (1º ao 9º). A Lei nº 11.274/2006 em seu
artigo 5º determinou que essa implantação ocorresse progressivamente até o
ano 2010.
A nova legislação veio de fato consolidar a proposta de expansão do
Ensino Fundamental manifestado na LDB nº 9.394/1996 e no PNE de 2001. Essa
expansão teve por objetivos melhorar as condições de equidade e de qualidade
da Educação Básica; estruturar um novo ensino fundamental para que as
crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de escolaridade;
assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças tenham
um tempo mais longo para as aprendizagens da alfabetização e do letramento.
(BRASIL, 2009, p.03).
Segundo o Plano Nacional de Educação de 2001 em sua meta de número
2, a implantação do ensino fundamental de nove anos tem duas intenções que
são: “oferecer maiores oportunidades de aprendizagem no período da
escolarização obrigatória e assegurar que, ingressando mais cedo no sistema
de ensino, as crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de
escolaridade”. Indica ainda que essa implantação deve ocorrer
progressivamente com devido planejamento e seguindo as diretrizes
norteadoras para o desenvolvimento integral da criança. (BRASIL, 2001).
Com a aprovação do Plano Nacional de Educação em 2014, se
estabelece como Meta 2: “universalizar o ensino fundamental de 9 (nove) anos
para toda a população de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos e garantir que pelo menos
95% (noventa e cinco por cento) dos alunos concluam essa etapa na idade

74
recomendada, até o último ano de vigência deste PNE”. (BRASIL, 2014). O que
estabelece uma nova fase para melhoria nos processos educacionais nos
próximos 10 anos.
Observa-se na intencionalidade dessa expansão que a antecipação, e
que o tempo maior na escola, além de visar à qualidade do ensino, buscam a
garantia da inclusão de mais crianças no sistema escolar principalmente aquelas
menos favorecidas.
Em sua efetivação, a ampliação do ensino fundamental de oito para nove
anos exige mudanças na escola, na proposta pedagógica, no material didático,
na formação de professores, bem como nas concepções de espaço-tempo
escolar, currículo, aluno, professor e metodologias.
Essa necessidade de reorganização estrutural e conceitual se mostra
mais importante ainda para a inserção das crianças de seis anos no ensino
fundamental. Considerando o novo cenário educacional, o processo de
alfabetização e letramento merece uma atenção especial, para que não ocorra
uma adaptação simplista do currículo das séries anteriores à reestruturação do
ensino fundamental, para esse novo perfil de alunos, que chegam mais cedo a
esse nível de ensino, de modo que não sejam prejudicados por uma prática
didática que reduza sua fase de infância.

75
14 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NO CONTEXTO DO ENSINO
FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS

FONTE: www.escolaestrelatatuape.com.br

Muitas mudanças têm sido feitas na busca de melhorar as condições de


educação, de melhoria dos serviços prestados, da garantia e ampliação ao
acesso aos processos educacionais. O movimento de implantação do Ensino
Fundamental de Nove Anos se insere nessas mudanças, por isso se desperta a
necessidade de conhecer os processos que fazem parte do contexto dessa
ampliação.
Para Abreu,

Uma análise mais aprofundada desse processo de mudança apresenta


emergentemente a necessidade de uma abordagem sobre os
seguintes aspectos: a estrutura escolar básica no Brasil e em outros
contextos mundiais; o histórico das ações realizadas nos últimos anos
para a implantação do Ensino Fundamental de nove anos em âmbito
nacional (2012, p. 21-22).

Mas é preciso olhar além das políticas nesse processo da organização do


ensino fundamental. A organização pedagógica exige entender a alfabetização
como parte imprescindível da inserção do educando nos processos
educacionais.

76
A transição da criança de seis anos da educação infantil para o Ensino
Fundamental não é apenas uma questão política normativa, mas
sobretudo uma questão pedagógica que exige o entendimento do
alfabetizador sobre como ocorre o processo de aquisição da leitura e
da escrita, que na perspectiva da construção do conhecimento não
dissocia o ato de alfabetizar e letrar e ainda realiza uma mediação
condizente com o nível de conceitualização da criança. Sendo assim,
não necessariamente o domínio da alfabetização deve ocorrer na série
ou fase introdutória. Aceitar esse fato natural significa respeitar as
necessidades das crianças nos diversos espaços sociais que ela
convive e viabilizar de forma tranquila e harmoniosa o seu processo de
escolarização. (ABREU; MIRANDA, 2007, p. 9).

Assim, tanto as políticas educacionais, como a escola e os sujeitos


envolvidos nesse processo, precisam estar em consonância com as mudanças
e buscando constantemente a melhoria dos processos educacionais. Sendo
correto afirmar que a educação existe em todos os lugares e em todos os
momentos da vida do ser humano. “Da família à comunidade, a educação existe
difusa em todos os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios
do aprender” (BRANDÃO, 1989, p.10). O ser humano está em constante
aprendizado, pois “a educação é a prática mais humana, considerando-se a
profundidade e a amplitude de sua influência na existência dos homens”
(GADOTTI, 2003, p. 13).
A educação concebida como prática social envolve várias dimensões e
instâncias de realidades múltiplas e contraditórias nelas, situam-se os processos
e princípios educacionais.
Para Saviani é a escola que viabiliza ao homem chegar à compreensão
completa de mundo.

O papel da escola é o de ser o ambiente adequado para que o


professor possa exercer da melhor forma possível o seu papel. [...] O
papel do professor é elevar os alunos do nível não elaborado, do nível
do conhecimento espontâneo, de senso comum, para o nível do
conhecimento científico, filosófico, capaz de compreender o mundo
nas suas múltiplas relações e, portanto, passar da visão empírica,
fragmentada do mundo, para uma visão concreta, articulada (SAVIANI,
2010, p.145).

De acordo com o autor, é pela educação e pelas relações sociais que o


homem se desenvolve, e não há sociedade sem educação. Mas a educação está
a serviço das classes sociais de uma época, e subordinada aos interesses de
grupos dominantes. A escola é a instituição cujo papel na sociedade é o de
responsabilizar-se pela educação formal dos cidadãos, estando sujeita à
77
reprodução das desigualdades próprias de uma sociedade de classes, ou,
contrariamente, posicionando-se como um dos agentes em condições de
contribuir para a transformação desta.
Segundo Sousa Jr

A escola, mesmo sendo uma instituição burguesa, que atende a


finalidades colocadas pela dinâmica da sociedade produtora de
mercadorias, é uma instituição que, se é central para o processo de
formação das classes revolucionárias, poderia vir a ser um espaço
importante de socialização do conhecimento (SOUSA JUNIOR, 2010,
p.176).

A escola é o espaço responsável para construir com o aluno a


aprendizagem necessária para que este possa realizar a relação dos
conhecimentos cotidianos com os conhecimentos científicos. Sendo que a
escola é a instituição que favorece a produção de conhecimento, precisa,
juntamente com os professores, assumir postura de mediadores do
conhecimento, atendendo a diversidade de alunos, respeitando seus ritmos e
possibilidades de aprendizagem. (GASPARIN, 2003).
No processo de ensino e aprendizagem o professor precisa ter claros os
objetivos e caminhos que precisa percorrer, para assim favorecer a apropriação
da leitura e da escrita pelos estudantes. O processo de alfabetização e
letramento precisa ser precedido pelo planejamento pedagógico por parte dos
professores, levando os estudantes a reflexão sobre esses processos. Dessa
forma, a escola precisa estar comprometida com os processos de alfabetização
e letramento, buscando desenvolver a consciência crítica nos estudantes,
observando a diversidade e vivência de cada um.
Nessa perspectiva, a ampliação do ensino fundamental para nove anos,
precisa ser entendida e analisada a partir dos diferentes contextos onde se
insere e das diferentes práticas pedagógicas que o constituem.

Essa mudança se concretiza como mais uma forma de intensificar o


amplo projeto histórico de reestruturação de todo o sistema de ensino
nacional, que tenta reverter o quadro de fracasso exclusão retratados
pelo analfabetismo, evasão e repetência nas séries iniciais, nas
escolas públicas brasileiras (ABREU, 2012, p. 21).

Analisando os processos envolvidos nessa mudança, é preciso refletir


sobre vários aspectos como a estrutura da Educação Básica no Brasil, as ações

78
realizadas a partir da implementação do ensino fundamental de nove anos, as
ações e procedimentos realizados para a concretização da implementação.
(ABREU, 2012).
No contexto dessa ampliação do tempo de escolarização, destacamos
aqui os processos de Alfabetização e Letramento, pois a Lei nº 11.274/2006, que
consolidou essa proposta trouxe uma nova perspectiva para a educação. Sendo
que essa ampliação não objetivava apenas o aumento no tempo de
escolarização, mas principalmente maiores oportunidades de aprendizagem.

Assegurar a todas as crianças um tempo mais longo de convívio


escolar, maiores oportunidades de aprender e, com isso, uma
aprendizagem mais ampla. É evidente que a maior aprendizagem não
depende do aumento do tempo de permanência na escola, mas sim do
emprego mais eficaz do tempo. No entanto, a associação de ambos
deve contribuir significativamente para que os educandos aprendam
mais. (BRASIL, 2004, p. 17).

Independente do momento histórico, da cultura que a educação se


desenvolve, a leitura e a escrita sempre estiveram inseridos. Primeiramente se
desenvolveram os processos de escrita, que foi sendo utilizada e modificada
conforme as necessidades de cada sociedade. Devido a sua diversificada
utilização, a escrita, aos poucos, foi dando espaço para a leitura. Dessa maneira,
a leitura e a escrita foram sendo amplamente utilizadas nos processos
educacionais e escolares. “Em constante transformação, o sentido atribuído aos
conceitos de alfabetização e de letramento, bem como os níveis de exigência da
leitura e da escrita no decorrer dos tempos, também não se configuram de forma
simples, neutra e muito menos estável” (ABREU, 2012, p. 83).
Para Tfouni, (2010) a alfabetização e o letramento são processos que não
se completam nunca, pois os sujeitos participantes estão inseridos em uma
sociedade que está em contínua mudança, exigindo dos indivíduos o
acompanhamento e aperfeiçoamento constante a partir dessas mudanças.

A explicação, então, não está em ser, ou não, letrada a sociedade na


qual esses indivíduos vivem. Mais que isso: está na sofisticação das
comunicações, dos modos de produção, das demandas cognitivas
pelas quais passa uma sociedade como um todo quando se torna
letrada, e que irão inevitavelmente influenciar aqueles que nela vivem
alfabetizados ou não (TFOUNI, 2010, p.28).

79
Tfouni diz que “a alfabetização refere-se à aquisição da escrita enquanto
aprendizagem de habilidades para leitura, escrita e as chamadas práticas de
linguagem” (2010, p. 11). Já o letramento “focaliza os aspectos sócio-históricos
a aquisição da escrita. [...] Procura ainda saber quais práticas psicossociais
substituem as práticas “letradas” em sociedades ágrafas” (TFOUNI, 2010, p. 12).
As discussões atuais em torno da alfabetização e letramento perpassam
por vários debates, entre eles destaca-se a alfabetização e letramento no mundo
das tecnologias, a relação entre a alfabetização e letramento com as práticas
sociais e a entrada de crianças com seis anos de idade no ensino Fundamental.
A alfabetização e letramento são processos relacionados, que se
complementam, iniciando-se antes da entrada da criança na escola, portanto a
alfabetização se formaliza no ensino fundamental, com a aquisição do sistema
escrito. O letramento vai além do domínio desse código escrito, mas em seu uso
nas diversas situações da vida, constitui-se como prática social.
A escola tem a função de permitir o acesso do estudante à leitura e a
escrita, formalizando essas aquisições. Isso não é simples e nem fácil, pois como
já mencionado, existe a influência das relações da sociedade nesses processos.
Para que o indivíduo seja inserido no mundo letrado, é necessário que a
alfabetização esteja vinculada à perspectiva do letramento.

A pessoa letrada já não é a mesma que era quando analfabeta ou


iletrada, ela passa a ter outra condição social e cultural – não se trata
propriamente de mudar de nível ou de classe social, cultural, mas de
mudar seu lugar social, seu modo de viver na sociedade, sua inserção
na cultura – sua relação com os outros, com o contexto, com os bens
culturais torna-se diferente (SOARES, 2010, p. 37).

Entende-se a alfabetização e o letramento como práticas que precisam


estar articuladas, pois elas são resultados das relações humanas. As práticas de
alfabetização e letramento são as práticas fundamentais do período escolar,
estando presentes na vida dos indivíduos.

O ato de aprender a ler e escrever deve começar a partir de uma


compreensão muito abrangente do ato de ler o mundo, coisa que os
seres humanos fazem antes de ler a palavra. Até mesmo
historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo, depois
revelaram o mundo e a seguir escreveram as palavras. Esses são
momentos da história. Os seres humanos não começaram por nomear
A!F!N! Começaram por libertar a mão e apossar-se do mundo
(FREIRE; MACEDO, 1990, p. 32).

80
A alfabetização é compreendida como o processo de apropriação do
sistema de escrita de uma língua. De acordo com Soares, “alfabetização em seu
sentido próprio, específico: processo de aquisição do código escrito, das
habilidades de leitura e escrita” (2011, p. 15).
O termo letramento também passou a ser incorporado no meio
educacional, ampliando o entendimento do uso da escrita e da leitura como
interação social. Por isso, não é suficiente saber ler e escrever, mas
compreender esse processo e usá-lo como meio de inserção na cultura letrada.
Nessa direção, Soares (2010, p. 18), define letramento como “o resultado da
ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que
adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se
apropriado da escrita”. A autora também diz que:

Há, assim, uma diferença entre saber ler e escrever, ser alfabetizado,
e viver na condição ou estado de quem sabe ler e escrever, ser letrado
[...]. Ou seja: a pessoa que aprende a ler e a escrever – que se torna
alfabetizada – e que passa a fazer uso da leitura e da escrita, a
envolver-se nas práticas sociais de leitura e de escrita – que se torna
letrada – é diferente de uma pessoa que não sabe ler e escrever- é
analfabeta – ou, sabendo ler e escrever, não faz uso da leitura e da
escrita – é alfabetizada, mas não é letrada, não vive no estado ou
condição de quem sabe ler e escrever e pratica a leitura e a escrita
(2010, p.36)

A autora considera o letramento como resultado da ação de ensinar e


aprender as práticas sociais da leitura e da escrita. É o estado ou condição que
adquire um grupo social, ou individual como consequência de ter apropriado a
escrita e suas práticas sociais, apropriar-se da escrita é assumi-la como
propriedade. “A alfabetização é a ação de ensinar e aprender a ler e escrever; e
o letramento é o estado ou condição de quem sabe ler e escrever, mas cultiva e
exerce as práticas sociais que usam a escrita” (SOARES, 2010, p.47).
Kleiman destaca que as atividades de letramento se expandem para
diversos contextos e não se reduzem as práticas escolares. Segundo a autora,
“letramento não é alfabetização, mas a inclui!” (2005, p.11). Também, faz
aproximações entre alfabetização e letramento, considerando a alfabetização
uma das práticas do letramento, esclarecendo que “o termo letramento já entrou
em uso carregado de novas associações e significados, como por exemplo, uma

81
nova relação com a oralidade e com linguagens não-verbais, não incluídos nem
previstos no termo alfabetização” (KLEIMAN, 2005, p.12).
Partindo desse pressuposto, é na escola o espaço importante para
desenvolver-se. Nela intensificam-se e sistematizam-se os conhecimentos
culturais e históricos da humanidade, e também os espaços de socialização
entre os sujeitos. A escola desempenhará bem seu papel, “na medida em que,
partindo daquilo que a criança sabe, ela for capaz de ampliar e desafiar a
construção de novos conhecimentos” (REGO, 2011, p. 108).
O que é importante assinalar, especialmente a respeito da alfabetização,
numa perspectiva de humanização dos sujeitos, é que a aprendizagem e o
desenvolvimento humano, seja na escola ou nas relações cotidianas, são
fundamentais na elaboração de novas formas de pensamento, inserção e
atuação no meio em que vive.
A Constituição de 1988, ao reafirmar a educação como direito
constitucional de todos os cidadãos, é bastante clara a respeito da finalidade a
ela atribuída, onde para além da cidadania visa o pleno desenvolvimento da
pessoa. Esse artigo da Constituição Federal assegura a educação como um
direito do cidadão, o que proporcionaria, dessa forma, igualdade de
oportunidades.
A partir da LDB nº 9.394/96 e da Lei nº 11.274/2006, propõe-se uma nova
orientação metodológica para o currículo, em busca da formação humana
coletiva. Intensificando os debates em torno da questão da alfabetização, que
exige uma compreensão mais ampla do que aquela limitada ao processo em si
(BRASIL, 2006).

A organização do novo Ensino Fundamental com nove anos de


duração e, consequentemente da proposta pedagógica, implica na
necessidade imprescindível de um debate aprofundado sobre essa
proposta, sobre a formação de professores, sobre as condições de
infraestrutura e sobre os recursos didático-pedagógicos apropriados ao
atendimento e o essencial: a organização dos tempos e espaços
escolares e tratamento, como prioridade, o sucesso escolar (BRASIL,
2009, p. 11).

Nesse contexto, a definição e organização dos processos de


alfabetização também estão condicionadas ao momento histórico atual e à

82
compreensão do que a sociedade entende como padrão necessário para a
inserção do sujeito em suas atividades letradas.
Ao discorrer sobre os processos educacionais, percebe-se que o período
de escolarização obrigatória vem sendo prolongado através da história, o
ingresso na Educação Básica ocorrendo cada vez mais cedo, e a permanência
dos estudantes nos estudos cada vez maior (ABREU, 2012).

O período de escolarização obrigatória tem sido prolongado no


decorrer dos tempos, caracterizando um processo de aumento do
ensino básico, com uma iniciação à trajetória escolar cada vez mais
cedo e uma permanência nos estudos por um tempo maior. Assim,
gradativamente, vivencia-se uma tendência de extensão das relações
estabelecidas com as instituições educacionais. O estudo dessas
relações, a cada período sócio-histórico, revela através das culturas
escolares que nos espaços das escolas se configura não apenas a
produção do conhecimento, mas também a definição de determinados
padrões, normas e comportamentos, de acordo com as necessidades
sociais e os interesses envolvidos em cada momento (ABREU, 2012,
p. 80).

É importante destacar que nos documentos analisados estão presentes


indicativos, que apontam para a superação das desigualdades sociais, numa
perspectiva de democratização do acesso, de inclusão da cultura da realidade
da escola no currículo, em sua parte diversificada, explicitando a finalidade da
educação vinculada à condição de libertação e emancipação dos sujeitos,
preconizando também a sua característica igualitária.
Não há dúvidas, que a mudança de legislação e a ampliação do tempo
nos bancos escolares serão insuficientes para a garantia de uma educação de
qualidade. De qualquer forma, percebe-se um movimento de legitimação para
tais alterações legais.
Através da implantação de políticas educacionais voltadas para a
preocupação com os processos e princípios pedagógicos que permeiam o dia a
dia das escolas brasileiras, percebese que as instituições escolares precisam
mobilizar-se para inúmeras questões, como por exemplo: planejamento diário
das aulas, revisão do projeto político pedagógico, adequação dos conteúdos,
qualificação profissional, reuniões mais frequentes com o grupo de docentes,
implicando efetivamente numa reestruturação de processos e princípios
pedagógicos.

83
Para efetivar uma postura em que é levada em consideração a prática
efetiva da alfabetização e do letramento, o trabalho deve ser atentamente
reelaborado e ressignificado para que as exigências estejam de acordo com a
capacidade dos indivíduos envolvidos em cada parte do processo.
Mudanças como essas precisam também estar atreladas a exigência ética
e administrativa dos governantes, em que promovam políticas educacionais
comprometidas verdadeiramente com o desenvolvimento de uma sociedade
consciente de seus direitos, que tenha espaços críticos e democráticos para a
manifestação e a construção da cidadania. Com esse propósito, pode-se concluir
que é necessária a aplicação efetiva do que os documentos legais apontam
como concepção e, que determinam a concretização das políticas educacionais.
Contudo, enquanto a possibilidade de implantação de uma política pública
educacional destinada a proporcionar uma melhoria substancial na qualidade da
educação não acontece, é preciso buscar melhores condições de integração
com os atores envolvidos diretamente nesse processo educativo, almejando
uma educação que possibilite uma construção integral e cidadã dos estudantes
e professores para além dos muros da escola. Certamente, o comprometimento
de cada um é indiscutível para que isso aconteça.5

5TEXTO EXTRAÍDO DO SITE:


www.ideau.com.br/getulio/restrito/upload/revistasartigos/248_1.pdf

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86

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