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INTOXICAÇÕES EXÓGENAS

A maior parte dos casos de intoxicações exógenas ocorre pela ingestão aguda de substâncias
únicas. Grande parte delas é de modo não intencional.

Podem ser classificadas quanto origem (ocupacional, ambiental, recreativa, farmacológica) ou


quanto a intenção (acidentais, voluntárias).

A abordagem inicial das intoxicações exógenas consiste primeiramente em realizar


monitorização, oxigenoterapia e garantir o acesso venoso (MOV). Realizado este passo, a
ordem de atendimento deve ser a seguinte:

1- Avaliação Clínica Inicial (A,B,C,D,E);


2- Estabilização;
3- Reconhecimento da síndrome e identificação do agente causal;
4- Descontaminação;
5- Administração de antídotos;
6- Aumento da eliminação do tóxico absorvido;
7- Tratamento sintomático.

Os sinais vitais (FC, FR, pulso, temperatura) devem ser avaliados periodicamente. Deve-se
medir as taxas de glicemia capilar, saturação de oxigênio e o nível de consciência (escala
Glasgow). Todas as alterações oculares devem ser anotadas (midríase, miose, anisocoria,
nistagmo, etc.).

Principais exames a serem solicitados:

 Glicemia
 Hemograma
 Creatinina e ureia
 TGO e TGP
 EAS
 Sódio, potássio, cálcio, magnésio e fósforo
 Gasometria
 ECG

É importante realizar uma investigação detalhada com o paciente e a família a respeito de:
medicamentos ingeridos, hora e dia da ingestão, se foi acidental ou intencional.

Primeiramente o profissional deve reconhecer que se trata de uma intoxicação. Isto pode ser
almejado através de boa anamnese (paciente e familiares), além de exame físico. Após
estabelecido o diagnóstico sindrômico, estabelecer o diagnóstico etiológico, isto é, identificar o
tóxico, e com esta informação, avaliar o risco e a gravidade. Todas estas medidas devem ser
feitas com agilidade, a fim de permitir a precoce estabilização do paciente. Estabilizado, o
profissional deve auxiliar na diminuição da absorção do tóxico; exemplo: pacientes
contaminados por agrotóxicos organofosforados devem ter suas roupas retiradas e serem
levados para chuveiros. Outra medida a ser tomada é o aumento da eliminação do tóxico,
através de procedimentos como a lavagem gastrointestinal, administração de carvão ativado,
diurese forçada ou métodos dialíticos. Se houver antídoto compatível com o tóxico, este deve
ser administrado. Finalmente, ao liberar o paciente, deve-se prevenir a exposição, através da
educação ou avaliação da psiquiatria.

Manifestações clínicas e síndromes Tóxicos mais prováveis


Intoxicação com hiperatividade adrenérgica  Anfetaminas, cocaína, hormônio
 Ansiedade, sudorese, taquicardia, tireoidiano.
hipertensão, midríase.
 Dor precordial, infarto do miocárdio
(por vasoconstricção coronariana),
emergência hipertensiva, AVC,
arritimias.
 Casos mais graves: hipertermia,
rabdomiólise (comum em pacientes
intoxicados com estatinas),
convulsões.
 Procurar sítio de punção.
Síndrome anticolinérgica  Antidepressivos tricíclicos
 Pode manifestar-se de modo (amitriptilina), anti-histamínicos,
semelhante à intoxicação com antiparkinsonianos,
hiperatividade adrenérgica. antiespasmódicos (escopolamina).
 Diminuição de ruídos intestinais,
retenção urinária.
 Pistas: pele seca, quente e
avermelhada; pupila bem dilatada
com mínima resposta à luz.
 Casos mais graves: convulsão,
hipertermia e insuficiência
respiratória.
Síndrome colinérgica/anticolinesterásica  Carbamatos, fisotigmina,
 Quadro muito típico: bradicardia, organofosforados e pilocarpina.
miose, hipersalivação, diarreia,
vômitos, broncorreia,
lacrimejamento, sudorese intensa,
fasciculações.
 Casos mais graves: PCR, insuficiência
respiratória, convulsões, coma.
Alucinógenos ou achados dissociativos  LSD.
 Pouco frequente, pode se confundir
com outros estimulantes do SNC:
taquicardia, hipertensão, tremor,
midríase, hipertermia.
 Pistas: desorientação, alucinações
auditivas e visuais, sinestesias,
labilidade do humor.
Intoxicação com bradicardia  Amiodarona (bloqueador de canais
 Bradicardia, hipotensão, vômitos. de K+ e bloqueia receptores alfa e
beta), BB, BCC, carbamatos,
digitálicos e organofosforados.
PREVENÇÃO DA ABSORÇÃO E AUMENTO DA EXCREÇÃO DE TÓXICOS

Intoxicação por via tópica:

Se a intoxicação ocorreu através da pele, devem ser retiradas todas as roupas do paciente,
removidos todos os resíduos e ter a pele lavada copiosamente; se foi por via ocular, lavar os
olhos com soro fisiológico e solicitar avaliação imediata do oftalmologista.

Contaminação das vias aéreas:

Se houve contaminação por gases e fumos tóxicos, o doente deve ser removido do local e
prontamente administrado oxigênio. Observar sinais de edema das VAS que rapidamente pode
evoluir para obstrução total – entubação endotraqueal precoce. O edema pulmonar pode
ocorrer horas após a intoxicação, por isso, o paciente deve ser observado por pelo menos 6
horas.

Intoxicação gastrointestinal:

As medidas de desintoxicação gastrointestinal disponíveis são: carvão ativado, lavagem


gástrica, irrigação intestinal, hiper-hidratação e alcalinização da urina. A indução de vômitos
não é mais recomendada na emergência (apenas ao avistar o paciente ingerindo a substância).

1- LAVAGEM GÁSTRICA
Com o paciente em decúbito lateral esquerdo, através de sonda, administrar pequenos
volumes de soro fisiológico (100-250mL). Depois disso, aguardar o retorno do
conteúdo gástrico. As lavagens devem ser continuadas até que haja retorno apenas de
SF. A lavagem gástrica deve ser realizada em ATÉ 1H DA INTOXICAÇÃO.
REGRAS BÁSICAS DA LAVAGEM GÁSTRICA:
 Garantir via aérea segura ao paciente (deve estar consciente, alerta e com reflexo de
tosse);
 Realizar em até 1h do tempo de ingestão;
 Deve ser realizada apenas se a intoxicação for potencialmente letal.
 Contraindicações: hidrocarbonetos (álcool, gasolina, diesel), cáusticos, risco de
perfuração e risco de sangramento (exemplo: paciente em pós-operatório de cirurgia
bariátrica).

2- CARVÃO ATIVADO

O carvão ativado torna-se ineficaz após duas horas da ingestão, razão pela qual deve
correr em no máximo duas horas. É melhor que a lavagem gástrica.

CARVÃO ATIVADO

1g/Kg de peso. Diluir em SF, água ou catárticos em 8ml/g de carvão ativado.


CORRER EM ATÉ 2H

Exemplo: paciente de 66kg. 66g de carvão ativado, diluído em 548ml de soro fisiológico.

REGRAS BÁSICAS DO CARVÃO ATIVADO:


 Garantir via aérea segura ao paciente (deve estar consciente, alerta e com reflexo de
tosse);
 Realizar em até 2h do tempo de ingestão;
 Checar lista de substâncias em que o carvão NÃO é indicado.

3- IRRIGAÇÃO INTESTINAL
Administração pela sonda nasogástrica de solução de polietilenoglicol na taxa de 1,5 a
2L/hora. O objetivo é que a mesma solução administrada pela sonda seja recuperada
por via retal, e com isso haja uma limpeza mecânica do TGI.
É utilizado para indivíduos que ingeriram altas doses de ferro e metais pesados ou para
expelir pacotes ingeridos por pessoas para o tráfico de drogas.

Aumento da Excreção dos Tóxicos:

1- DIURESE FORÇADA
Hiper-hidratação: SF (adultos), 1000mL a cada oito horas ou de seis em seis horas.
Pode-se aumentar o volume, até alcançar um débito urinário de 100 a 400mL/hora.
Os princípios tóxicos que tem sua excreção aumentada com hiper-hidratação são:
álcool, cálcio, potássio, isoniazida.

2- ALCALINIZAÇÃO DA URINA
Consiste em manter o pH urinário <7,5.
850ml de soro glicosado 5% + 150mL de bicarbonato de sódio 8,4%. Infundir 1L de
6/6h. Útil para intoxicações por fenobarbital (gardenal) e salicilatos (AAS).

3- MÉTODOS DIALÍTICOS
Hemodiálise clássica é o método mais utilizado e disponível. É utilizado em casos de
intoxicação grave ou que tenham potencial para tal, como pacientes que continuam a
piorar após suporte agressivo.

TRATAMENTO DAS EMERGÊNCIAS RELACIONADAS AOS TÓXICOS


1- Depressão do Centro Respiratório:

Pode ser causada por traumas craniocefálicos, opioides e sedativos. O flumazenil não faz mais
parte dos protocolos para pacientes em coma.

Pacientes com rebaixamento do nível de consciência e pupilas mióticas, com alta suspeita de
intoxicação por opioides: administrar naloxona, IV, IM ou SC, iniciando com 0,4 a 0,8mg IV
lentamente.

Pacientes com intoxicação por benzodiazepínicos, com rebaixamento de consciência (Glasgow


<8) utilizar flumazenil, o,1 a 0,2mg IV em 30-60s e repetir a mesma dose a cada minuto, até
uma dose de 1mg.

2- Bradicardia com Alteração Hemodinâmica:

Carbamatos e Organofosforados: respondem bem à atropina (2 a 4mg), podendo ser


necessárias altas doses do fármaco. A pralidoxima (regeneradora de colinesterase) pode ser
administrada.

Beta-bloqueadores: respondem ao glucagon (iniciar com 1-2mg IM).

Bloqueadores de Canais de Cálcio: gluconato de cálcio.

3- Taquicardia com Alteração Hemodinâmica:

Catecolaminérgicos: entre eles cocaína e anfetamina. O tratamento inicial é com


benzodiazepínicos (Lorazepam ou Diazepam).

4- Emergências Hipertensivas:

Observação: diferença entre urgência e emergência hipertensiva é que na emergência


hipertensiva há lesão de órgão-alvo. A PA nos dois casos pode encontrar-se em torno de PAS >
180mmHg e PAD > 120mmHg. O tratamento pode ser realizado com benzodiazepínicos em
pacientes agitados. A medicação de segunda escolha é o nitroprussiato e raramente pode ser
necessário o labetalol.

No caso das urgências hipertensivas, o tratamento pode ser realizado com captopril VO, que
tem ação rápida (cerca de 30min a 1h).

5- Síndromes Coronarianas Agudas:

O tratamento é semelhante ao das emergências hipertensivas. Pode-se administrar


nitroglicerina na tentativa de reverter o vasoespasmo ocasionado pelos catecolaminérgicos.

6- Prolongamento do Intervalo QRS:

Carga de sódio + alcalinização da urina.

7- Rebaixamento do Nível de Consciência

Realizar imediatamente glicemia capilar (dextro); se houver hipoglicemia, prescrever glicose a


50%. Além disso, fornecer oxigênio e manter a satO 2 > 92%.

No caso de hipoglicemia (glicose capilar <60mg/dL), administrar solução de glicose IV (60 a


100mL de Glicose a 50%).

8- Convulsão Induzida por Tóxicos


A medicação inicial, durante a convulsão é Diazepam intravenoso (5-10mg), podendo este ser
repetido várias vezes. O próximo passo, em intoxicações agudas, é prescrever fenobarbital,
para um controle prolongado (10 a 20mg IV lentamente, máximo de 50-75mg/min).

PRINCIPAIS ANTÍDOTOS DISPONÍVEIS


Tóxico Antídoto
Acetaminofeno (paracetamol) N-acetil-cisteína
Anticoagulantes Vitamina K e plasma fresco
congelado
Anticolinérgicos Fisostigmina
Benzodiazepínicos Flumazenil
Beta-Bloqueadores Glucagon
Bloqueadores dos Canais de Gluconato de Cálcio
Cálcio
Carbamato Atropina e Pralidoxima
Digoxina Anticorpo Anti-Digoxina
Organofosforado Atropina e Pralidoxima
Isoniazida Piridoxina (B6)
Metais Pesados EDTA e deferoxamina
Monóxido de Carbono Oxigênio à 100%
Opióides Naloxona
Cocaína Benzodiazepínicos
Dapsona Azul de metileno

TRATAMENTO ESPECÍFICO DAS INTOXICAÇÕES AGUDAS

1- ACETAMINOFENO (PARACETAMOL)

Quando ingerido em grandes doses (>140mg/kg de peso), pode levar a necrose hepática.

Quadro clínico: inicialmente pode levar a náuseas, vômito, palidez e sudorese; podendo
evoluir com necrose hepática (dor em hipocôndrio direito, hepatomegalia, distensa
abdominal, vômitos e insuficiência renal).

Tratamento: o carvão ativado deve ser utilizado. Iniciar a N-acetilcisteína.


N-ACETILCISTEÍNA

Bolus de 140mg/kg de peso.


Manutenção: 70mg/kg de peso de 4/4horas, num total de 18 doses.

2- ÁCIDOS E ÁLCALIS CORROSIVOS

Os álcalis podem causar necrose por liquefação. Os ácidos causam necrose de coagulação.

As lesões causadas por álcalis têm maior chance de causar perfuração de estômago e
esôfago. O reparo das lesões pode levar de semanas a meses e pode levar a formação de
estenoses.

Exames Complementares: radiografia de tórax + radiografia de abdome + EDA precoce.

Tratamento: não realizar lavagem gástrica nem carvão ativado. Fazer hidratação vigorosa,
correção dos distúrbios eletrolíticos e uso de antieméticos/bloqueadores da bomba de
prótons ou de H2 (Ranitidina, Omeoprazol).

3- BENZODIAZEPÍNICOS

Quadro Clínico: depressão do SNC, sonolência excessiva, depressão respiratória,


hipotensão, hipotermia e coma. FLUMAZENIL.

4- COCAÍNA E SIMPATICOMIMÉTICOS

Nas intoxicações leves os principais achados são vômitos, agitação e ansiedade. O paciente
pode manifestar taquicardia, hipertensão, sudorese e midríase.

Tratamento: suporte cardiovascular, hidratação e não utilizar medicações cardiovasculares


de longa ação (após efeito da cocaína, o paciente costuma ter hipotensão). Os
benzodiazepínicos são os agentes de escolha, não só para ansiedade e agitação, mas
também para síndromes coronarianas, taquicardia e emergências hipertensivas.

5- INSETICIDAS ORGANOFOSFORADOS E
CARBAMATOS

A intoxicação pode ocorrer através da pele, com


os inseticidas ou pela sua ingestão, como
tentativa de suicídio.

Os organofosforados causam inibição irreversível


da colinesterase, enquanto os carbamatos
(venenos de rato) inibem reversivelmente.

Em ambas as intoxicações há despolarização


sustentada do neurônio pós-sináptico pelo
aumento da acetilcolina em todo organismo.
Os efeitos sobre os receptores muscarínicos (órgãos), em geral, são sustentados, ao passo
que aqueles sobre os nicotínicos (JNM, gânglios simpáticos e parassimpáticos) são
rapidamente deprimidos.

Clínica:

Receptores Muscarínicos: náuseas, vômitos, dor abdominal, incontinência fetal e urinária,


sibilos, tosse, hipersalivação, aumento da secreção brônquica, dispneia, sudorese, iose,
visão borrada e lacrimejamento. Em casos mais graves, hipotensão, bradicardia, bloqueio
atrioventricular e edema pulmonar.

Receptores nicotínicos: taquicardia, hipertensão, fasciculações, fraqueza muscular e


hipoventilação por paresia dos músculos respiratórios e alterações no SNC com agitação,
confusão, convulsões e coma.

Os efeitos dos carbamatos ultrapassam 48h, enquanto os dos organofosforados podem


durar de semanas a meses.

Tratamento:

Toda as roupas do paciente devem ser retiradas e este deve ser submetido a exaustiva
lavagem para descontaminação.

Para intoxicação via oral, indica-se lavagem gástrica, seguida de carvão ativado.

Atropina: antagonista dos receptores muscarínicos. 1 a 2mg, EV.

Pralidoxima: regenera a acetilcolinesterase. 1 a 2g, diluídos em 150 a 250mL de SF, com


infusão EV lenta em quinze a trinta minutos.

6- MONÓXIDO DE CARBONO

Liga-se a hemoglobina com afinidade 200x maior que a hemoglobina.

Clínica: dispneia, taquipneia, cefaleia, labilidade emocional, náusea, vômitos e diarreia.


Pode haver papiledema no fundo de olho. No sistema cardiovascular podem surgir
arritimias, insuficiência cardíaca, hipotensão e síncope.

Pista diagnóstica: intensa dispneia, com oximetria e PaO 2 normais e acidose metabólica
com aumento intenso de lactato.

7- OPIOIDES

Agem em receptores no SNC e produzem efeitos analgésicos, euforizantes e sedativos.


Exemplos: codeína, morfina, meperidina, fentanil, alfentanil e heroína.

Clínica: disforia, ansiedade, náuseas, miose, depressão do centro respiratório, constipação.


Heroína pode levar a edema pulmonar.

O achado marcante é a presença de MIOSE em pacientes com REBAIXAMENTO DO NÍVEL


DE CONSCIÊNCIA.

Tratamento: lavagem gástrica na primeira hora, seguida de carvão ativado (há redução da
motilidade gastrointestinal, então o carvão ativado pode ser administrado até >2h).
Pacientes com hipotermia devem ser aquecidos e ter volemia reposta.
O antídoto é o naloxone, em dose inicial de 1 a 4mg. Pode ser administrado por via
intratraqueal, EV ou IM.

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