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POPE, Alexander (Alexandre). Ensaio sobre a crítica. Trad. Conde de Aguiar.

Rio de
Janeiro: Impressão Régia, 1810.

Data de publicação original: +- 1709-1711.


Publicado no Brasil: 1810, Impressão Régia (fundação da IR: 13 maio 1808).
Rosto da capa gravado a buril: Romão Eloy de Almeida.
Observações: foi um dos primeiros livros de literatura publicados no Brasil sob
autorização da Coroa. Conde de Aguiar [prefácio e tradução]: Fernando José de Portugal
e Castro (1752-1817), cursou Leis na Universidade de Coimbra. Indicado como
Governador da Bahia em 1788. Em 1801, foi nomeado para exercer o Vice-reinado no
Rio de Janeiro. Foi nomeado Conde e Marquês de Aguiar, conservando o cargo de
Ministro de Estado do Príncipe Regente na América até sua morte, em 1817.

PREFAÇÃO (1810)

Razões da tradução: serviço útil para aprender a escrever e julgar obras poéticas –
[uma educação ético-estético-literária].
 Serviço útil e proveitoso.
 Alexander Pope, um dos poetas ingleses mais correctos;
 Obra para os que desejão saber as regras e preceitos de escrever bem em verso;
 Julgar com acerto composições poéticas;
 Para que as pessoas pudessem facilmente apprender.

Dados bibliográficos:
 Composto em 1709.
 Pope tinha 20 anos de idade.
 Impresso pela primeira vez sem o nome do autor.
 O autor resolve distribuir vinte exemplares para diversos homens grandes, como
Lord Lansdowne e o Duque de Bukingham.
 Queria ser conhecido e que seu livro fosse procurado.

Dados formais:
 Composto inicialmente em prosa, segundo o preceito de Vida e a prática de
Racine (que a justificava pelo fato de conseguir ver de uma vista de olhos a
direção e a coherencia do Todo).
 O Poema compõe-se de um só livro, dividido em três partes principais:
o 1) Contém as Regras para estudar a arte da Crítica;
o 2) Expõe as Causas dos juízos errados sobre as obras de engenho;
o 3) Trata da Moral do Crítico, ou das qualidades do coração, que deve
ter.
 [Crítico como atividade, vocação (profissão?).]

Cultura crítica: recepção, censura, elogio.


 Censuras injustas: trivial, pueril, confuso, sem novidade. Logo que este Ensaio
sahio à luz, vários críticos o censurarão injustamente, principalmente João Diniz,
Oldmexbn, e Leonardo Wilsted, em diferentes opúsculos cheios de mordacidade,
dejocosidades, e motejos, querendo mostrar, que os preceitos erão falsos, ou
triviaes, ou huma, e outra cousa; os pensamentos mal digeridos, e abortivos;
as expressões absurdas; os versos ásperos, e faltos de harmonia; as rimas triviaes,
e communs; em lugar de magestade, baixeza; em lugar de gravidade, puerilidade;
em lugar de perspicuidade, e clara ordem, muitas vezes escuridade, e confusão; e
que não havia couza alguma nova, que se não achasse nos Prefacios, Dedicatorias,
e Ensaio sobre a Poesia Dramática de Dryden. (p.II-III)
o Resposta de Pope: o autor só defende seu livro em público. Mas Pope
a pesar da delicadeza, e sensibilidade do seu génio, julgou estas
censuras indignas de reposta, como declara em huma das suas cartas
escrita em 15 de Junho de 1711 a M. J. C, Escudeiro, remettendo-lhe as
observações do meneio» nado Diniz sobre esta Obra, bem persuadido,
que todo o Livro que se não pode defender na presença do publico, não
pode ser mais defendido pelo seu author. (p.III)
o Dinâmica da crítica: [vários críticos o censuraram de todos as formas.
Pope julgou as censuras indignas de resposta, persuadido de que todo
livro, que não pode ser defendido em público, não pode ser defendido.
Passada a má recepção, sobrevive aquelas opiniões que importam. Assim,
a cultura crítica constitui-se como espécie de ciranda de opiniões, em que
umas e outras se comunicam, se respondem e se contestam, validando-se
e (invalidando-se) mutuamente.]
 Críticas à obra de Pope: passados os ditos jocosos, eleva-se o bom senso.
o Addison.
 Atributos de um discurso de verdade. Algumas dellas são fora
do commum, mas em que o leitor deve convir, quando as vê
explanadas com aquella facilidade, e perspicuidade, com que estão
enunciadas. Quanto ás que são mais conhecidas, e mais, recebidas,
estão collocadas com alluzões tão proprias, que contem em si todas
as graças da novidade, e fazem com que o leitor, que já dantes as
conhecia, fique cada vez mais convencido da sua verdade, e
solidez. (p.IV)
 Atributos de engenho e beleza: não é inventar o novo, mas
contar de forma agradável o sabido [~arquivo]. Seja-me licito
lembrar-me aqui do que Boileau ponderou tão bem no Prefacio das
suas obras; que o engenho, e huma composição bella não consistia
tanto em inventar cousas novas, como em dar hum ar agradável ás
que já erão sabidas. (p.IV)
 Uso do senso comum do gênero humano
(história/arquivo/passado): condição de possibilidade da
criação para o homem moderno. Arte de criar/criticar: He
impossível para nós, que vivemos nestes últimos séculos do
mundo, fazermos observações sobre a Critica, a Moral, ou outra
qualquer Arte, que não fossem já tratadas por outros; tudo, quanto
se nos deixou, consiste em representar o senso commum do género
humano em huma luz mais forte, mais formosa, ou mais fora do
commum.
 Modos de exprimir–aplicar os preceitos antigos e não
inventar novos (a novidade é o modo como algo é
contado de outra maneira). [...] O modo de os exprimir,
e de os applicar, e não a invenção delles, he o que
principalmente se admira. (p.IV-V)
o Voltaire.
 Sobre Pope. [...] o melhor poeta da Inglaterra, e hoje de todo o
Mundo. (p.V)
 Sobre Ensaio sobre a Crítica é Roubo do Anel. [...] superior à
Arte Poética de Horácio; e o Roubo do Anel he na minha opinião
melhor do que o Lntrin de Boileau. Nunca vi huma imaginação tão
alegre, graças tão doces, tanta variedade, tanto espirito, e tanto
conhecimento do mundo, como nesta pequena obra. (p.V)
 Carta ao Rei da Prussia sobre Pope: a utilidade da arte dos
versos de Pope para o gênero humano. (p.VI)
 Foi mais longe que Horace e Boileau;
 Espírito ousado, mais confiante;
 Carrega o fogo para dentro do abismo do ser;
 Por si mesmo aprende a conhecer a si mesmo e o outro;
 Sua arte tem qualquer coisa de frívolo e divino.
o Samuel Johnson.
 Pope como crítico e poeta. O Ensaio como contribuição para
as demais composições e formas de conhecimento [meio,
instrumento]: Johnson, que escreveu as vidas dos poetas ingleses,
entende que o livro de Pope, embora uma das primeiras, é das
melhores, tivesse escrito mais, seria colocado entre os primeiros
Críticos e os primeiros Poetas, porque nela –
 [...] toda a qualidade de bellezas, que podem
affermosear, ou ornar huma compozição didáctica,
selecção de materia, novidade de dispozição, exacção de
preceitos, esplendor de illustração, propriedade de
digressões, e tal extensão de comprehensão, tal exacção de
discernimento, tal conhecimento do género humano, e tal
noticia da sciencia antiga, e moderna, a que muitas vezes
se não chega na idade mais madura, e com mais longa
experiência. (p.VI)
o Mr. Robeton (conselheiro e secretário privado do Jorge I Rei da
Inglaterra). 1ª tradução para o francês, 1717. V cantos. Apropriou-se
dos pensamentos e o vestiu de tal maneira à francesa que quase se
desconhece o original.
 Jornalistas de Trevoux relatam a relação entre criação e
crítica. Não se pode julgar, dizem os Jornalistas de Trevoux, se
este Poema he feito para ensinar a Arte de compor huma obra de
engenho sem defeitos, ou a Arte de criticar os defeitos de huma
obra de engenho. Espalha ao acazo, continuão elles,
algumas reflexões sobre os Authores, e sobre os Críticos de todas
as Nações, principalmente da sua; o que faz ás vezes com engenho,
mas nunca com ordem, e com juizo.
o Abade Resnel. 2ª tradução para o francês, 1730. Publicado com notas
e prefácio. Com grande número de versos admiráveis, segue o mesmo
modo de pensamento do autor, sem qualquer ordem, conexão ou
analogia na ordenação do poema.
o Conde de Hamilton. Carta de Pope elogiando a tradução em versos
que nunca foi publicada.
o Mr. Silhouette. Tradução francesa em prosa, estimada pela crítica.
Impossível reconhecer a Pope. Quando o acham Filósofo, não
encontra quase nunca o Poeta.

Sobre a presente tradução do Conde de Aguiar. (p.VIII)


 1ª tradução para o português. Outras obras em português: Ensaio sobre o
Homem, verso solto, por A. Teixeira, impresso em Lisboa, 1769. Carta de Heloiza
a Abaylard, por M.os em Londres, 1801.
 Método de tradução:
o Problema: se em verso ou prosa. Existem os defensores para cada uma,
mas existem aqueles para os quais os Poetas ou não se traduzem ou só
podem traduzir-se em verso. Em ambas as versões, existem
inconvenientes e é obrigação do tradutor encontrar onde estão os maiores.
o Essência da tradução: fidelidade e exatidão.
 Proximidade com a História: ausência do uso de versos nas
traduções, pois estas acabam alterando os pensamentos,
expressões, tons etc.
o Padre Sanadon e seu prefácio à tradução de Horácio (e sua
justificativa para traduzir verso em prosa): (p.VIII-IX)
 Objeções à tradução em prosa:
 Pessoas de merecimento se persuadem que versos não
podem ser traduzidos senão em verso;
 Tradução em prosa perde a força e a beleza;
 O Poeta, ao ser traduzido sem a harmonia e o fogo dos
versos, já não é mais Poeta, mas um cadáver de Poeta;
 Traduções de verso em prosa que chamam de fiéis, são
infiéis, pois o autor está desfigurado;
 Estas são objeções sedutoras, mas poucas sólidas.
 Defesa da tradução em prosa:
 Fidelidade do tradutor consiste em se revestir do caráter e
do gênio do Autor;
 Representar por inteiro os pensamentos, sem omitir palavra
alguma necessária ou importante;
 Precisa conservar todo o desenho, o seu mesmo colorido, e
todo o seu valor, substituindo belezas por outras que não se
podem acomodar na outra língua;
o Escolha pela prosa: embora não consiga mostrar o número, a medida e a
harmonia que faz a beleza da poesia, ainda assim a tradução será muito
mais semelhante ao original do que se fosse traduzido em verso. Preceito
de Horácio na Arte Poética (“nec verbum verbo curabis reddere fidus
interpres”) para justificar a tradução literal e fiel, traduzindo palavra por
palavra (em franca oposição ao uso deste método pelos imitadores).
o Por que querer ser antes Tradutor do que Autor: valor do antigo
sobre o novo. [...] que a maior parte dos livros não erão senão repetições
dos antigos, e que para bem servir a sua Pátria era melhor traduzir bons
livros, do que compor outros, que ordinariamente nada dizem de novo.
(p.XI)
o Edição utilizada e intervenções do Tradutor: tradução a partir da edição
de José Warton, 1797, 9 vol. com suas notas e comentários, somados aos
de William Warburton. Há cortes de algumas notas insignificantes, bem
como aquelas que não se enquadram com os princípios de nossa Religião
(fé católica luso-brasileira). Acrescentou outras notas com exemplos de
poetas portugueses quando estes se enquadravam nas regras e preceitos.
 Notas com (P) ao fim: do próprio Pope.
 Notas com (W): Warburton.
 As demais notas, pertencem a Warton ou ao tradutor (Conde de
Aguiar).
 O Conde ainda declara que se bem aceita sua tradução, tem o plano
de traduzir as Epístolas Moraes de Pope.

SUMÁRIO
Do que contem este Ensaio,
Parte I.
INTRODUCÇÃO. He hum grande defeito tanto o julgar como o escrever mal, e qual
seja mais prejudicai ao publico, vers. 1.
O verdadeiro gosto raras vezes se acha, assim como o verdadeiro genio, vers. 9-18.
A maior parte dos homens nascem com algum gosto, sendo delle privados pela
falsa educação, vers. 19- 25.
Multidão de críticos, e as causas disso, vers. 26-46.
Devemos estudar o nosso próprio Gosto, e conhecer os seus Limites, vers. 46-61.
A Natureza a melhor guia do juizo, vers. 6-87.
Adiantada pela Arte, e pelas Regras, que são a Natureza reduzida a methodo, vers. 88.
Regras derivadas da pratica dos Antigos Poetas, vers. 88-110.
Por isso deve o Crítico necessariamente estudar os Antigos, particularmente Homero, e
Virgílio, vers. 120-138.
Das Licenças, e uso, que os Antigos dellas fazião, vers. 140-180.
Reverencia devida aos Antigos, e seu louvor, vers. 181, etc.

Parte II. vers. 203, etc.


CAUSAS, que se oppõe ao verdadeiro juízo,
I. A Vaidade, vers. 28.
II. A Sciencia Imperfeita, vers, 215.
III. O Julgar por partes, e não pelo todo, vers. 233-288.
Críticos somente em engenho, lingoagem, e versificação, vers. 288, 305, 389, etc.
IV. São assas difficeis de se contentarem, ou assás propensos a admirarem-se, vers. 384.
V. A Parcialidade, — Demaziado amor a huma Seita, — Aos Antigos ou Modernos, vers.
394.
VI. A Preoccupação, ou Prevenção, vers. 408.
VII. A Singularidade, vers. 424.
VIII. A Inconstância, vers. 430.
IX. O Espirito de partido, vers. 452, etc.
X. A Inveja, vers. 468.
Contra a inveja, e em louvor do bom génio, vers. 508, etc.
Quando devem os críticos usar principalmente de severidade, vers. 526. etc.

Parte III. vers. 560. Etc.


REGRAS para o Critico dirigir as suas maneiras,
I. A Candura, vers. 563.
A Modéstia, vers. 566.
A Boa Educação, vers. 572.
A Sinceridade, e Liberdade de conselho, vers. 578.
II. Quando o conselho de qualquer se deve restringir, vers. 584.
Caracter de hum Poeta incorregivel, vers. 600;
e de hum Critico impertinente, vers. 610, etc.
Caracter de hum bom Critico, vers. 629.
Historia da Critica, e caracteres dos melhores criticos,
Aristóteles, vers. 645.
Horácio, vers. 653.
Dionizio, vers. 665.
Petronio, vers. 667.
Quintiliano, vers. 670.
Longino, vers. 675.
Da decadência da Critica, e seu restabelecimento. Erasmo, vers. 693.
Vida, vers. 705.
Boileau, vers. 714.
Lord Roscommon etc, vers. 725.
Conclusão.

***

PARTE III

Da imprescindibilidade da moral para a tarefa do Juiz. O saber é só uma metade.


Apprendei pois, que Moral deve mostrar o Critico, porque o saber he só meia tarefa de
hum Juiz. Não basta unir-se o gosto, o juizo, e a sciencia; brilhe a candura, e a verdade
em tudo, de que fallardes, para que não só todos concedão o que se deve ao vosso juizo;
mas procurem tãobem a vossa amizade.
Guardai silencio, sempre que duvideis do vosso sentimento; e fallai, ainda que certos,
mostrando desconfiança. Conhecemos alguns presumidos, e teimosos , que se huma vez
errão, continuão sempre no mesmo; vós porém confessai com prazer os erros passados,
e fazei cada dia huma critica ao que precedeo. (p.109)

O crítico como um tipo de educador que ensina sem ensinar; que mostra a ignorância
alheia como se fosse esquecimento.
Não basta que o vosso conselho seja sempre verdadeiro : as verdades grosseiras offendem
mais que as mentiras artificiosas. Devemos ensinar os homens, sem mostrar que os
ensinamos; e propor-lhes o que ignorão, como se lhes tivesse esquecido. Sem boa
educação não he bem aceita a verdade : porque só ella pode fazer que o talento superior
se estime.
Não sejais mesquinho do vosso conselho por pretexto algum; porque o peor avarento he
o que não reparte as suas luzes. Por huma vil complacência não deveis trair o vosso
credito, nem sejais tão civil, que passeis por injusto. Não receeis excitar a cólera
dos sábios: os que merecem louvor, soffrem de melhor vontade a reprehensão. (p.111)

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