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All content following this page was uploaded by Marianne Lacomblez on 10 August 2018.
1. Introdução
Entre a adaptação do homem1 ao seu ofício (Bonnardel, 1943) e a adaptação do trabalho ao
homem (Faverge et al., 1958), a reviravolta introduzida pela perspectiva da ergonomia
nascente se afirmou. Se bem que possamos encontrar suas premissas em certos especialistas
do « homem no trabalho » no começo do século XX (Imbert e Mestre, 1904, entre outros),
esta virada foi a expressão de uma mutação profunda dos pontos de vista sobre o mundo do
trabalho e de uma vontade de abertura da fisiologia e da psicologia do trabalho ao projeto que
se viria a tornar o da ergonomia. Esta tomou abertamente o partido da transformação das
condições de produção, e não o da transformação-adaptação das pessoas pela formação
profissional tradicional, considerada como fora do campo da nova disciplina. Esta posição
está ainda hoje em debate no meio internacional da ergonomia, pois alguns – dentre os quais
nos situamos – não cessam de proclamar que os dois aspectos – o desenvolvimento das
pessoas em curso de formação e a ação sobre os elementos da situação – são, apesar de tudo,
indissociáveis.
Dito isto, o termo « formação » recobre realidades muito diferentes e suas concepções
evoluiram muito desde os começos da ergonomia. E não se pode negar que as intervenções
circunscritas à formação levantam sempre a questão de saber em que medida este tipo de ação
corre o risco de fazer do trabalhador uma « variável de ajustamento » à situação de trabalho,
enquanto que o objetivo essencial fixado pela ergonomia e pelas disciplinas próximas, é
adaptar o trabalho ao ser humano.
1
Nestas fórmulas consagradas, entende-se por « homem », evidentemente, o neutro masculino designando o ser humano.
Esta contribuição tem por finalidade apresentar a construção progressiva de uma
acepção nova do que se entende por formação2, especialmente no campo da ergonomia:
acepção que se poderá entender como tendo um caráter ‘clínico’, desde que se considere que
não é o trabalhador o objeto de atenção, mas sim o trabalho.
Partiremos de uma breve referência histórica, cujo propósito é o de introduzir os
pressupostos teóricos, as raízes epistemológicas e as bases metodológicas fundamentais desta
aceção particular da formação, tida, como veremos, como uma construção progressiva e
desenvolvimental de “lugares mais comuns” entre diferentes protagonistas do trabalho e entre
saberes de diferentes naturezas, mas convergentes no propósito de compreender, valorizar e
transformar o trabalho. Este percurso nos conduzirá pelas emblemáticas iniciativas de
motivação e foco iminentemente sindical, que marcaram as décadas de ’70 e ’80 do Século
XX, até configurações renovadas e alargadas a outros protagonistas deste projeto de pesquisa
e transformação que acabou se definindo em torno da designação genérica de formação de
atores na e pela análise do trabalho, para e pela ação. Não nos privaremos também de deixar
ao leitor detalhes e alertas que consideramos importantes, a partir da nossa experiência, tanto
no plano ético como metodológico, tanto no coração do processo formativo como no seu
entorno, tanto na sua sustentação teórica como na orientação e condução estratégica da
intervenção. Concluiremos esta viagem num anexo técnico, essencialmente orientado para a
prática e para a sua permanente reinvenção, com a ilustração, a partir de casos concretos
resultantes da nossa experiência em Portugal, de diferentes configurações possíveis para a
operacionalização, em contexto, dos pressupostos aqui apresentados.
2. Breve histórico
2.1. O paradigma da formação dos atores na e pela análise do trabalho para e pela ação
Como em outros lugares do mundo (na Itália, especialmente: Oddone et al., 1977),
atendendo a demandas de organizações sindicais, um novo paradigma de formação
estreitamente associado à pesquisa se desenvolveu progressivamente no Laboratório de
fisiologia do trabalho-ergonomia do CNAM, em Paris, nos anos 1970. Concebido com o
propósito de poder ser realizado « à distância » do local de trabalho, o projeto empreendido se
baseia em várias apostas. A primeira é que a formação em análise ergonômica do trabalho
pode se constituir em uma ferramenta para a ação. A segunda é que esta abordagem passa pela
instauração de um diálogo continuado entre pesquisadores e sindicalistas que são os
2
O termo formação estará em itálico quando tivermos o objetivo de acentuar o fato que ela não designa uma ação de forma-t-
ação.
representantes de uma demanda social. A concepção epistemológica e ética que está na base
desta perspectiva, até então inédita, funda-se no reconhecimento dos saberes que são próprios
aos operadores (« expertise operária ») e na relevância de levar em conta o ponto de vista
destes últimos. Ela é, ainda, assente na necessidade de colocar em comum e de confrontar os
conhecimentos científicos e os conhecimentos de experiência dos trabalhadores e de seus
representantes: parte-se do princípio de que o debate deveria alcançar pouco a pouco uma
« descrição compartilhada », seguida de uma compreensão dos fenômenos em jogo,
contribuindo para o balanço crítico dos conhecimentos científicos convocados, a renovação da
representação que se faz do trabalho e a definição de ações precisas a considerar.
Algumas das pesquisas empreendidas permitiram assim associar os operadores, que
praticaram auto-observações ou auto-medições preparadas com os ergonomistas (Teiger et al.,
1977; Teiger, Laville & Durrafourg, 2004). Um vai-e-vem constante, às vezes formalmente
instituído, entre as abordagens de uns e de outros, permite, pouco a pouco, a cada um
construir ou enriquecer as hipóteses, discutir e validar os resultados obtidos (a partir das
observações, entrevistas e medidas decididas em comum). Os conhecimentos produzidos
beneficiam, assim, de um duplo reconhecimento e são imediatamente difundidos, sob formas
apropriadas, no meio sindical, por um lado, e no mundo da ergonomia, por outro lado. Esta
co-aprendizagem a propósito de um objeto de estudo comum enquadra estas experiências no
campo da pesquisa-ação.
Ao longo desses anos, as organizações sindicais convocaram os pesquisadores no
quadro de suas atividades de formação de militantes, em diferentes níveis de
responsabilidade. Naturalmente, os resultados das pesquisas em curso fazem parte dos
assuntos tratados : debate-se os ritmos de trabalho e do sono, as características da atividade no
trabalho repetitivo sob cadência e os componentes da carga de trabalho ou as relações entre
condições de trabalho e envelhecimento diferencial.
Progressivamente, os grandes princípios que guiaram as práticas implementadas foram
formalizados, constituindo o corpus fundamental do paradigma colocado em prática – que se
chamará paradigma da formação dos atores na e pela análise do trabalho para e pela ação
(Teiger et Lacomblez, 2013). O ponto de vista geral destaca evidentemente a questão
problemática das relações pensamento-ação inscrita em uma dupla tradição, filosófica e
epistemológica, presente na perspectiva construtivista piagetiana, segundo a qual todo
conhecimento não consiste apenas na capacidade de « copiar o real, mas de agir sobre ele e
transformá-lo, em aparência ou em realidade, de maneira a compreendê-lo » (Piaget, 1974).
Mas esta tradição aposta também na tomada de consciência e na evolução das representações.
Definida enquanto conceito « mediador » entre cognição e ação, a representação é aqui
entendida enquanto motor potencial de uma ação de mudança da situação. A temporalidade da
ação é, portanto, central, orientando a organização de diferentes fases da formação à partir das
descrições do trabalho e das questões expressas pelos participantes. Trata-se de uma formação
« oportuna », procurando, à medida em que se desenrola, provocar uma atividade reflexiva
pela confrontação das representações e dos conhecimentos trazidos por todos. Além da
contrução de novos conhecimentos, a análise do que recobre, para cada um, a realização de
sua atividade de trabalho e as ligações com a saúde, no sentido amplo, sustenta o processo de
tomada de consciência individual e coletiva que deveria permitir a elaboração de « um outro
possível » relativamente ao trabalho.
Apesar de ter se revestido de formas diversas no curso do tempo, o encaminhamento
comporta, de fato, quatro fases principais:
1. A expressão « espontânea » das grandes características do trabalho de cada um, o que
permite uma primeira coleta das representações e dos conhecimentos adquiridos pela
experiência.
2. Em seguida, a expressão « provocada » – primeira auto-análise, sustentada por um
questionamento de tipo maiêituco da parte do formador-ergonomista –, o que leva a
uma descrição fina e precisa do desenrolar da atividade em todos os seus
componentes e das exigências múltiplas nas quais ela se exerce. Desta descrição
emerge « o que nem sempre se sabe que se sabe» : a complexidade e a variabilidade
do trabalho, os imprevistos e incidentes, as competências frequentemente
desconhecidas, as iniciativas invisíveis, os compromissos assumidos entre produção e
segurança ou o correr riscos e as consequências para a saúde. As causas relacionadas
com o trabalho começam, então, a aparecer. Alimentada por estes aportes concretos, a
fase seguinte privilegia os aportes ergonômicos : modelos de base e conhecimentos
explicativos sobre a análise da atividade, suas exigências e as relações trabalho-saúde
ou ainda a designação de lacunas do saber científico sobre certos pontos evocados.
3. Um processo de objetivação-distanciamento pode então se desencadear. As
consequências sentidas que podem ser atribuídas ao trabalho são desindividualizadas,
não sendo mais da ordem de fragilidades individuais, e as possibilidades de ação
coletiva tornam-se visíveis.
4. Enfim, os participantes assumem o protagonismo no quadro de um exercício coletivo.
Trata-se neste momento de facilitar a apropriação dos conhecimentos relativos à
análise ergonômica da atividade, seja a partir do questionamento de um dos
participantes, seja a partir da partilha e discussão conjunta de exercícios práticos de
análise do trabalho realizados nos momentos das idas à situação de trabalho, seja
ainda a partir da análise coletiva de imagens de vídeo (a partir da altura em que um
amplo acesso a esta técnica o permitiu).
Espera-se que este tipo de intervenção permita a emergência :
- de ligações não aparentes e, às vezes, insuspeitas e impensáveis
espontaneamente, que adquirem uma outra visibilidade e tornam-se
« dizíveis » e compartilháveis;
- de conceitos explicativos que, a paritr das verbalizações dos atores em
formação sobre a sua própria prática de trabalho e sobre suas repercussões,
são desenvolvidas de maneira oportuna (na hora certa) em função do avanço
da reflexão coletiva e não segundo um programa predefinido pelo formador;
- de uma co-construção de conhecimentos novos sobre a situação e sobre si
mesmo, graças ao próprio exercício de reflexão e de expressão, podendo esta
construção continuar muito além da própria sessão. Se as duas modalidades de
conhecimento são colocadas, desde o início, como tendo ambas a sua
legitimidade, é porque elas são concebidas como complementares segundo o
princípio de que nenhuma delas sozinha é capaz de esgotar a questão do
trabalho.
É por isto que este tipo de formação é percebido como uma situação de aprendizagem
mútua com vista a um objetivo comum, e não como uma situação didática clássica de
transmissão de conhecimentos. Neste processo, o coletivo de formação exerce um papel
fundamental no questionamento, na conforntação, na deliberação, no acordo ou no desacordo.
A polifonia é deliberadamente buscada neste projeto guiado pela vontade comum de
transformação das condições da atividade profisional. O objetivo prioritário é o da descoberta
e da apropriação de um encaminhamento pelos participantes, em benefício destes, e não
unicamente o de uma contribuição ao progresso de uma disciplina científica – mesmo se a
riqueza deste encaminhamento abre as portas a projetos inéditos para a pesquisa em
ergonomia ou para outras disciplinas que vêem a necessidade de uma renovação de suas
grelhas de análise.
Daí três tipos de conhecimento podem tornar-se objeto de desenvolvimento :
- Conhecimentos relativos aos modelos de atividade e às relações trabalho-
saúde;
- Conhecimentos metodológicos relativos ao processo de formação e à análise
do trabalho;
- E conhecimentos « estratégicos » que dizem respeito às condições de
viabilidade de uma ação « situada », de sua continuidade e de sua perenidade
na empresa, sem que o ergonomista-formador intervenha na estratégia
sindical, estando os papéis de cada um bem delimitados desde o início.
A apropriação dos conceitos e métodos da análise ergonômica do trabalho pode ser assim
considerada como a aquisição de uma « ferramenta cognitiva », tida como capaz de facilitar a
iniciativa e a conduta da ação : ou pelo menos a intenção de ação, esta dependendo,
obviamente, de outros fatores contextuais (Teiger, 2007). Uma tal ferramenta assumirá, pois,
igualmente, uma função mais ampla, de tipo « desenvolvimental », permitindo adquirir um
melhor domínio geral de um ofício ou de uma função, o que pode transformar igualmente a
relação com o trabalho e favorecer a saúde, na ótica dinâmica da sua « construção » (Dejours,
1993).
Estes encaminhamentos, articulando ao mesmo tempo pesquisas sobre o "trabalho
real" em situação e "formação para a ação" dos atores, permitiram a produção de resultados
pertinentes para todas as partes envolvidas. As pesquisas mostram, pouco a pouco, dimensões
inaparentes e desconhecidas do trabalho, da atividade humana, tanto cognitivas (estratégias de
regulação e engenhosidade no trabalho) quanto fisiológicas (por exemplo: o “sono diurno dos
trabalhadores noturnos”, Forêt, 1973).
Além disso, a melhor compreensão dos fenômenos vividos e a experimentação da
análise do trabalho pelos sindicalistas em formação abriram para eles novas possibilidades em
termos de domínio de ação, indo, por exemplo, até poder fazer a experiência coletiva de
"trabalhar de outro modo" na empresa, durante um conflito.
Assim, formação e pesquisa se alimentam e se estimulam uma a outra: graças às trocas
e à expressão dos trabalhadores sobre sua atividade e suas condições, a formação é uma
oportunidade de enriquecer os conhecimentos sobre outras situações e formular novas
hipóteses de trabalho. É também uma ocasião para uma forma de validação e de generalização
de alguns resultados dos estudos ergonômicos, muito frequentemente limitados no plano da
generalização.
Esta tradição, progressivamente definida no curso dos anos 70, se afirmou
posteriormente, enriquecida pelos debates e experiências desenvolvidos em outros países a
partir de contribuições (ver, dentre outros: Ferreira, 1993; Ferreira et al, 2003;. Brito et al.,
2001) que, da mesma maneira, recusaram-se a considerar os participantes da ação de
formação como "objetos" das intervenções (Freire, 1967). Ela é, atualmente, objeto de
interesse renovado (ANACT, 2012; Thery, 2010), sem dúvida devido à degradação das
condições de trabalho e de emprego e seus efeitos nocivos para a saúde, e mesmo para a vida,
de numerosos assalariados.
3
Retomaremos este conceito com maior profundidade mais adiante, no “Roteiro”.
4
Ou formação “ao longo da vida”, distinta da formação inicial, escolar.
é renovada nas abordagens atentas aos processos de regulação realizados pelos operadores
face às exigências de sua actividade (Faverge, 1966), sempre tendo em conta que estes podem
ter um custo em termos de saúde (Teiger, 1987).
Por sua vez, tendendo a conjuntura a individualizar cada vez mais a relação salarial, a
noção de competência suplantou as referências à qualificação (Lacomblez, 2001).
Consequentemente, a terminologia dos pesquisadores evolui e a atenção dispensada ao que
faz a particularidade da experiência profissional torna-se mais precisa. Corinne Gaudart et
Annie Weill-Fassina chegaram então a «caracterizar a construção de competências no
decorrer do tempo, seja por uma evolução das representações das situações encontradas e dos
diagnósticos estabelecidos, seja pela evolução das modalidades de regulação do sistema
realizadas pelo operador » (Gaudart & Weill-Fassina, 1999, p. 52, tradução livre). Neste
sentido, elas sistematizam a evolução das representações segundo quatro características
essenciais :
- a emergência de traços específicos próprios à situação, decorrentes da
descoberta e da utilização de indícios pertinentes que não estavam claramente
indicados nas instruções oficiais;
- a extensão dos domínios cobertos pelo diagnóstico das situações devido à
evolução da coleta de informações, que não se limita mais aos dados restritos,
mas se estende a dados contextuais, permitindo corroborá-los e melhor
explicá-los;
- a reestruturação das representações que contextualizam as informações
fornecidas oficialmente, de forma operativa (permitindo um melhor
ajustamento da ação ao alvo perseguido, tendo em conta as exigências da
situação);
- a evolução das competências, que vai no sentido de uma maior possibilidade
de abstração, passando dos traços aparentes ao funcionamento, do perceptível
ao possível.
Quanto às modificações das modalidades de regulação, as autoras (idem) as definem
como atravessadas por três tipos de transformações :
- extensão do campo temporal de antecipação;
- aumento da resistência das perturbações e das possibilidades de compensação;
- extensão e modificação das relações implementadas no trabalho coletivo.
Este tipo de pesquisa contribuiu, sem nenhuma dúvida, para melhor compreender a
especificidade da experiência ou, se preferir, da inteligência prática.
Sublinhemos que, entretanto, face à insistência de numerosos responsáveis pela gestão
dos « recursos humanos », procurando uma maneira de obter dos mesmos uma aplicação
rigorosa das competências requeridas, alguns não hesitaram em recorrer à análise do trabalho
para conceber programas de um tipo de formação profissional que, gastando pouco tempo e
pouco dinheiro, garantisse a capacidade produtiva esperada. As avaliações dos resultados
deste tipo de estudo não deixam qualquer dúvida quanto aos objetivos perseguidos : a redução
do tempo ou dos custos de formação e o aumento da capacidade produtiva, que se constituem
em argumentos de peso na justificativa destes encaminhamentos. Estamos, assim, muito longe
do paradigma cuja análise privilegiamos aqui. Paradigma este que se revela central para as
pesquisas que se situam deliberadamente no plano da qualidade de vida no e pelo trabalho,
particularmente sensíveis seja às novas formas de instrumentalização do trabalho humano,
seja à emergência de riscos mal conhecidos, seja à marginalização de certas categorias de
trabalhadores - que são, não raras vezes, aqueles que se encontram mais fragilizados em razão
das condições em que acabaram por trabalhar (Gollac e Volkoff, 2000; Lacomblez e Vézina,
2008).
4. Limites e potencialidades
Deste modo, a formação de atores não ergonomistas na e pela análise do trabalho é
sempre objeto de um desenvolvimento de conhecimentos « estratégicos » para que a
transformação do trabalho e as trocas de conhecimentos se façam. Além disso, isto tem lugar
também na experimentação de um outro modo de relações entre os diversos protagonistas e
no projeto de sua sustentabilidade. O paradigma da formação dos atores na e pela análise do
trabalho para e pela ação constitui-se então o modelo de referência : engajando profissionais
de formação e trabalhadores em uma análise crítica das condições de trabalho, de suas
evoluções, do que elas pressupõem, determinam e exigem, os protagonistas da intervenção se
associam em uma análise onde os saberes são convocados em uma relação não hierarquizada,
cada um se enriquecendo com o resultado da confrontação. Mas o propósito é também definir
as condições que permitem, por sua vez, uma melhor compreensão do que determina a vida
daqueles e daquelas que trabalham, e uma abertura à busca de alternativas possíveis. Nesta
perspectiva, a questão do desenvolvimento potencial de cada um é, portanto, central, embora
ela seja tratada pela via das condições nas quais este desenvolvimento pode (ou não) ser
concretizado. A perspectiva é intrinsecamente coletiva por meio da dinâmica da reflexão e
pelas finalidades atibuídas aos projetos futuros ; mas, sobretudo, em virtude da convicção que
se trata de transformar o trabalho a fim de transformar a sociedade.
Leituras sugeridas
Figueiredo, M., Athayde, M., Brito, J. & Alvarez, D. (Org., 2004). Labirintos do trabalho:
interrogações e olhares sobre o trabalho vivo. Rio de Janeiro: DP&A Editora.
O que se projeta
Frequentemente, as questões relativas à higiene e à segurança no trabalho são tratadas
insistindo na importância do respeito aos regulamentos e aos procedimentos específicos
definidos pelos especialistas, que também acabam por verificar a aplicação destas normas e
sancionar as infrações. Baseadas em uma visão pejorativa do homem no trabalho e sendo
concebidas sem qualquer participação da parte daqueles que terão que respeitá-las, estas
prescrições normativas tendem a gerar resistências (legítimas) por parte dos trabalhadores.
Além disso, os instrumentos elaborados com esta perspectiva tendem a reduzir a
complexidade da situação de trabalho a uma série de dimensões justapostas umas às outras,
sem ter em conta a dinâmica de suas interações.
A formação constitui uma das maneiras de intervir no domínio da prevenção. Ora,
aqui também se é confrontado frequentemente com o mesmo problema do privilégio atribuído
aos especialistas (em formação), recorrendo a métodos que deixam pouco espaço à
participação dos trabalhadores e ao (re)conhecimento da especificidade de suas atividades
profisionais. Diferentes trabalhos – especialmente os oriundos da ergonomia e da formação de
adultos – ensinaram, entretanto, o quanto o local de trabalho é fertil em aprendizagens e o
quanto a tomada de consciência das ferramentas cognitivas usadas nas atividades práticas
permite sua mobilização por ocasião da confrontação com situações novas. Isto nos conduziu
a procurar alternativas no modo de pensar a prevenção e a promoção da segurança e a definir
modelos de intervenção que reconhecessem a complexidade das situações de trabalho e a
importância do papel que pode assumir o trabalhador em sua gestão continuada.
A contribuição de Damien Cru e Christophe Dejours, e certos conceitos da
psicodinâmica do trabalho, nos ajudaram na interpretação dessas questões, avançando a
hipótese segundo a qual « os operários conhecem implicitamente, em profundidade, os
perigos de seu trabalho e [...] deles se defendem concretamente, com a ajuda de
procedimentos específicos eficazes, no curso do próprio trabalho » (Cru & Dejours, 1983, p.
243, tradução livre). Estes procedimentos constituem assim saberes-fazer de prudência,
indissociáveis dos saberes-fazer profissionais e compostos de uma face oculta, tornada quase-
inconsciente, mas aprendida com o ofício, transmitida frequentemente de forma implícita pela
tradição, em seus usos e costumes. É, então, essencial trazer de volta estes saberes-fazer de
prudência à consciência, de os situar no contexto, de melhor interpretá-los e compreendê-los :
isto deve permitir a construção de um tipo de prevenção que se define ao levar em conta as
necessidades reais. Ou seja, a construção (graças à auto-análise do trabalho) de novas
representações do trabalho, mais ricas e mais próximas da atividade real, abre outros campos
conceituais e outras perspectivas de intervenção, até então mantidas na penumbra da
obrigação do respeito às normas de produção.
Mas as potencialidades destas estratégias ultrapassam as preocupações relativas aos
riscos profissionais. É também um outro olhar sobre a atividade em si que é suscetível de
emergir, abrindo perpectivas novas ao operador na análise do exercício de sua função
(Vasconcelos et Lacomblez, 2000).
1.2. Métodos
O quadro 1, esquematiza as diferentes etapas do processo desenvolvido.
Fase Duração
00. Análise prévia das atividades de trabalho pelo formador 4 semanas
01. Sessão coletiva introdutória em sala 1 hora
02. Auto-análise guiada individual durante o trabalho – foco: “características básicas da atividade” 1 dia
03. Discussão coletiva em sala de formação – foco: “características básicas da atividade” 1 hora
04. Auto-análise guiada individual durante o trabalho – foco: “detalhes importantes na atividade” 1 dia
05. Discussão coletiva em sala de formação – foco: “detalhes importantes na atividade” 1 hora
06. Auto-análise guiada individual durante o trabalho – foco: “riscos de acidentes” 1 dia
07. Discussão coletiva em sala de formação – foco: “riscos de acidentes” 1 hora
08. Auto-análise guiada individual durante o trabalho – foco: “condições de trabalho” 1 dia
09. Discussão coletiva em sala de formação – foco: “condições de trabalho” 1 hora
10. Reunião de balanço final com os responsáveis da empresa 2 horas
Quadro 1 – Esquema síntese das diferentes fases da intervenção e sua duração.
1.3. Resultados
Aquele coletivo avançou em 25 propostas de transformação do trabalho, cobrindo
desde modificações em relação direta com os riscos da atividade em foco, até procedimentos
de controle de qualidade e aspectos da organização do processo de produção. Todas essas
propostas foram apreciadas no que tange ao seu realismo pelo grupo final, reunindo diversos
responsáveis da empresa. Razões de ordem financeira, entretanto, levaram à não aplicação de
algumas delas.
Fazendo eco a estas transformações, e apesar de nem todas as propostas de
transformação terem sido implementadas, pôde notar-se a redução do índice de acidentes do
trabalho constatado na empresa. Os resultados se mostraram efetivamente encorajadores, já
que uma redução significativa do número de acidentes declarados foi constatada nos meses
que se seguiram. Não nos esqueçamos, contudo, a prudência recomendada há muito tempo na
interpretação deste tipo de dados (Faverge, 1967). Eles mereceriam, obviamente, um
acompanhamento durante um tempo mais longo das características dos acidentes declarados,
que deixou de ser possível após uma mudança de gerência, meses mais tarde.
Enfim, a análise do conteúdo das intervenções dos diferentes participantes nas sessões
coletivas permitiu demonstrar uma mudança progressiva na riqueza da argumentação
desenvolvida. Os comentários face às situações-problemas apresentadas foram
particularmente reveladores quanto a isto. No começo, as intervenções eram curtas e
centradas na identificação lacônica do problema, às vezes na intervenção necessária. No fim
do percurso, as análises tornaram-se mais elaboradas, acompanhadas de uma caracterização
concreta do problema, de suas causas prováveis, das intervenções úteis, sublinhando a
complexidade da situação com relação a qual a intervenção deve estar atenta.
5
Matriosca: conjunto de bonecas típicas russas, de madeira pintada, que se sobrepõem umas às outras, encaixando-se.
Retirado de: http://aulete.uol.com.br/matriosca
prioridades), quanto no que diz respeito ao processo primário (suas atividades de trabalho),
cujos problemas são pouco a pouco identificados, aprofundados e mesmo resolvidos no curso
dos trabalhos, em certos casos, graças à ação combinada dos dois processos sobrepostos
(Vasconcelos, 2008). Sessões intercaladas de balanço com um comitê de acompanhamento,
no qual os dirigentes dos níveis mais altos são representados, contribuem de maneira decisiva
para o aumento do potencial transformador da ação do grupo.
Antes disto, entretanto, a análise preliminar das atividades de trabalho conduzida pelo
profissional de formação permanece incontornável. É da qualidade deste trabalho prévio (e
recorrente) que depende a maior ou menor congruência entre os dois processos que visamos
desenvolver e melhorar permanentemente : o trabalho (processo primário que motiva e
justifica a necessidade de intervenção) e a formação (processo secundário que o serve e que
dele se alimenta).
Este novo modelo MATRIOSCA foi construído no curso de uma intervenção
conduzida em uma empresa de fabricação de pneus, no norte de Portugal. Os resultados
obtidos permitiram lograr um financiamento para sua aplicação em outras unidades de
produção e retomamos, assim, o essencial de seus princípios no quadro de uma empresa
situada em um complexo químico da região. As configurações do modelo variaram,
evidentemente, segundo as características das empresas no seio das quais ele foi conduzido,
como também segundo as especificidades das demandas que nos foram dirigidas. Em certos
casos, a intervenção se mostrou mais densa : concentrada em seis semanas, com um grupo de
dez a quinze participantes, posteriormente difundida em uma segunda fase a outros
trabalhadores, de uma forma mais leve e no curso de um período de três meses. Em outros
casos, a intervenção se endereçou ao conjunto de trabalhadores.
Cada ciclo de formação-transformação leva em torno de um mês : uma semana é
consagrada à preparação específica (conhecer os participantes, entrar em contato com as
especificidades de sua atividade, preparar o material, identificar as novas situações-problema,
colocar as estatísticas em dia, etc); duas semanas são reservadas à alternância entre sessões
em sala e análise guiada no posto de trabalho; enfim, uma semana para a preparação e para ter
a reunião com os decisores no quadro do comitê de acompanhamento. Os grupos em
formação se sucedem assim todos os meses, de sorte que os que o realizam se beneficiam das
contribuições daqueles que os precedem e que todos se beneficiam das tranformações das
condições de trabalho em curso. Quando todos tiverem passado por este processo, cada grupo
retorna então à sala para uma sessão consagrada a um balanço global e ao estabelecimento de
novos engajamentos coletivos sustentados por uma realidade do trabalho transformado neste
intervalo.
Referências :
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(2), 82-92, http://laboreal.up.pt/revista/artigo.php?id=37t45nSU547112278541446881
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