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Boa noite a todos! Sejam bem-vindos!

O Flávio Morgenstern havia pedido que eu desse um curso


sobre a arte do debate. Eu darei este curso mais dia ou menos dia. Mas para adiantar o expediente,
hoje eu queria dar umas dicas a respeito.

A primeira dica a respeito de debates é: fujam. Não entrem neles. Não está na hora, e evidentemente
a nossa maneira melhor de atuar na sociedade é através de livros. Você só deve entrar em um debate
quando tiver um ou dois livros publicados, de boa qualidade. Então você já entra com um currículo
por trás. Fora isso, você já vai entrar em desvantagem.

Em segundo lugar, a primeira coisa num debate é você avaliar corretamente a situação de debate e
não o conteúdo, propriamente. Essa situação é definida pela pessoa do adversário. Quer dizer: o que
ele procura num debate; qual é o seu objetivo dele; e como você deve tratá-lo. Aristóteles, que foi o
sujeito que melhor equacionou as regras de confrontação de provas, dizia que não se deve discutir
com quem não conhece ou respeita as regras da prova. Então isto fica como um preceito universal
Essas situações de debate podem variar muito. A primeira e a situação ideal seria aquela onde você
tem dois estudiosos que dispõe do mesmo corpo de informações, que conhecem e respeitam as
regras da prova, ou seja, um debate científico. O debate científico acontece. Por exemplo, os vários
debates em que o James Craig entrou foram desse tipo. Ele estava se confrontando com pessoas que
possuem um currículo de realizações científicas e que, em princípio, de acompanhar uma
demonstração onde a prova lógica é tudo. Portanto, cada um entra com uma determinada tese,
apresentada de antemão, e em seguida apresentam-se os argumentos contra e a favor. Gilbert
Chesterton e George Bernard Shaw, por exemplo. Você pode ver inúmeros debates desse tipo ao
longo da história. É um debate entre dois concorrentes que estão mais ou menos em igualdade de
condições, que seguem o mesmo corpo de regras e acessam os mesmos conhecimentos. Portanto, só
lhes resta a confrontação da prova lógica.

Um debate deste tipo, ao longo dos últimos trinta ou quarenta anos, nunca aconteceu no Brasil. Isto
é quase impossível. Em primeiro lugar porque a atividade cultural e educacional no Brasil foi
instrumentalizada para servir a uma atividade de cabos eleitorais no fim das contas. Você não vai
confrontar-se com alguém assim. Quando você possui essas condições atendidas, isto é, quando há
a igualdade dos dois, no sentido da preparação intelectual e da sua honestidade, então deve-se
concentrar no conjunto de provas que você possa oferecer a sua tese. Quando não é assim, você
notará que o outro contendor, em geral, não entra com uma tese, mas sim com uma impressão, mas
sim com uma impressão que ele passar. Neste caso, o eixo do debate se altera da esfera lógica para
psicológica. Quer dizer que você não confrontará uma idéia mas uma pessoa, que deseja de algum
modo repassar uma boa impressão e atrair a simpatia da plateia. É uma confrontação puramente
psicológica. Sendo assim, aquele que procura defender uma tese da melhor maneira possível está
em desvantagem. Não há uma equivalência de ambos os argumentos.

O que acontece nos debates brasileiros é que, em geral, não existe interpenetração intelectual. Não
existe uma efetiva troca de idéias que possa enriquecer ambos os participantes e a plateia. Um está
falando num plano e o outro noutro completamente diferente.

Eu lerei para vocês umas notas que eu tomei a respeito do debate do Flávio Morgenstern com o Igor
Fuser1, que serão publicados no Diário do Comércio, mas acho que melhor que vocês saibam antes.
O título é “Falsificação Integral”2:

1
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=5h3jnaGz59Q&feature=youtu.be>.
2
Disponível em: <http://www.olavodecarvalho.org/falsificacao-integral/> ou
<http://old.olavodecarvalho.org/semana/140525dc.html>.
“Já nos primeiros dez minutos do seu debate com Flávio Morgenstern no Grêmio Politécnico, sobre
a ditadura militar (ver aqui), o prof. Igor Fuser exemplificou com rara concisão a regra de que
ninguém pode mentir com eficiência se não falsifica primeiro a própria situação de discurso (...)”

Isto é absolutamente fundamental, (Link start!) existe uma situação real, na qual vocês dois estão
se confrontando e existe o conteúdo das ideias que estão expressas ali (tá certo?), estando em função da
situação do debate e não o contrário, ou seja, as palavras não geram as situações dadas.

"Ele começou se queixando de que não há espaço para debate sobre o tema na grande mídia, onde reina a
versão oficial única e indiscutível, quem ouvisse acreditaria, portanto, estar diante de um porta-voz da
minoria amordaçada".

E quem é que reclama? Só existe uma opinião dominante na mídia! Só pode ser aquele que foi excluído! Ele
começou dando, exatamente, esta impressão. Uma vez transmitida esta impressão, o professor Fuser estava
para infligir na plateia, sem temor de represálias, a mesma versão oficial, a qual, ele parecia se opor e assim
ele fez. Isto aqui é o típico paradoxo quase imperceptível, o sujeito cria, pelo contraste entre o que ele está
dizendo e o que ele está fazendo, um paradoxo na mente do ouvinte que vem muito rápido e em seguida você
passa para o debate, travando a compreensão dos ouvintes. Se pudesse parar o debate aí e perguntar: "Espere
aí professor, o senhor está reclamando de que a mídia toda repete uma opinião igual a sua, do que está
reclamando? O senhor gostaria que houvesse uma opinião contrária ou o senhor está ganhando com esta
situação?", a situação se esclareceria, porém, esta técnica do paradoxo rápido diminui a capacidade de
compreensão da plateia, você é obrigado a engolir uma situação totalmente artificial que não corresponde a
realidade da situação efetiva, criando assim um teatro. Esta versão é a seguinte: Em 1964, um governo
democrático estava empreendendo, por vias legais, algumas reformas patrióticas que alarmaram o capital
estrangeiro, o qual se mobilizou para derrubar o presidente e instaurar uma ditadura é o que toda mídia
alardeia há mais de vinte anos, o que se repassa às crianças em todas escolas do país, o que se imprime e
reimprime em livros e mais livros de história e foi o que o professor Fuser repetiu, com a cara mais bisonha
do mundo e bem protegido pela sua cara enganosa de contestador da uniformidade. O conteúdo que ele está
dizendo é falso, porém a situação já está falsificada, portanto, como é que você pode (9:15)

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