You are on page 1of 2

conceito que reconhece que identidades sociais, papéis e biografias pessoais

são construídos por meio de um processo contínuo de transmissão cultural.


Geralmente se faz uma distinção entre socialização primária e socialização
secundária. A primeira é associada ao período fundacional ou inicial da perso-
nalidade, e é o processo pelo qual a criança começa a acumular o conhecimento
e a habilidade necessários para se tornar membro de determinada sociedade.
Esse processo se dá através de várias atividades - brincadeira, imitação, jogos,
observação - e de interações com importantes agentes de socialização: pessoas
íntimas como pais, assistentes familares e irmãos. É durante essa fase de sociali-
zação que as identidades sociais primárias começam a se formar - por exemplo,
relativas a gênero, etnicidade ou religião. O importante é que essas identidades
são aprendidas e construídas ativamente. Frequentemente são consideradas as-
pectos centrais da identidade social de uma pessoa, além de relativamente está-
veis. Entretanto, mesmo que essas identidades sejam desafiadas num momento
posterior da vida (por exemplo, pela reatribuição de gênero ou pela conversão
religiosa), isso ainda se dá contra o pano de fundo do conhecimento e compre-
ensão de normas e práticas culturais adquiridas durante a socialização primária.
A socialização secundária reconhece as experiências complexas e vitalícias
de tornar-se e ser membro de uma sociedade ou grupo cultural. Assim, refere-se
a uma gama mais ampla de habilidades, conhecimentos e papéis adquiridos e
aprendidos ao longo da existência do indivíduo. A socialização secundária é
um processo de compreensão e explicação dos vários roteiros culturais a que
somos apresentados ao longo do curso de nossas vidas. A educação é geral-
mente considerada um espaço fundamental para a socialização secundária. A
escola é o lugar onde crianças e jovens são formalmente expostos ao conheci-
mento e às habilidades (mediante disciplinas e currículos) exigidos para que
funcionem como parte de determinada sociedade, e onde os professores agem
como importantes agentes de socialização. Entretanto, as arenas educacio-
nais também são espaços para um aprendizado cultural menos formal. Por
uma ampla variedade de interações e experiências em ambientes educacionais,
SOcialização aprendem-se papéis, compreendem-se valores e conformam-se identidades.
Grupos de amigos podem ser agentes relevantes nesse processo de aculturação.
Mas a socialização não para nos portões das escolas. Durante nossas transi-
Socialização é o processo de aprender a tornar-se membro de uma sociedade,
ções à idade adulta, e através de nossas vidas como adultos, continuamos a nos
por meio do qual nos tornamos seres sociais. Tornar-se social é uma experiên-
tornar. Biografias pessoais e identidades sociais são construídas e reconstruídas
cia que dura por toda a vida, e ocorre mediante a interação com os outros e a
ativamente, enquanto nos defrontamos constantemente com novos papéis e
participação nas rotinas diárias da vida cultural cotidiana. Socialização é um
com as nuances da cultura em que estamos situados. Assim, ao longo de nossas
195
Socialização Sociedade
194

sociais _ os papéis sociais devem ser aprendidos, não negociados, para que a
vidas, adquirimos e perdemos identidades secundárias - identidades ocupacio-
sociedade funcione. Também há teorias psicanalíticas que se concentram nos
nais, de lazer, associadas a determinados tipos de práticas de consumo e assim
processos inconscientes e emocionais da individualidade. Em sociologia, as
por diante. Socialização ocupacional é uma expressão utilizada para descrever
obras do filósofo e reformado r social americano George Mead e do sociólogo
os processos de aprendizado e transformação vinculados a identidades profis-
Erving Goffman têm sido particularmente importantes no reconhecimento
sionais ou de emprego. Assim, é necessário um processo de socialização para
de que o seI! é um construto social e de que os indivíduos são agentes ativos
que alguém se torne e seja um médico, construtor, cabeleireiro ou contador.
nos processos de socialização e construção de identidade. Mead descreveu a
Evidentemente, isso inclui a aquisição de um conhecimento «ensinado" formal
emergência do sei! por meio da experiência pessoal e a importância da comu-
e de habilidades i- medicina, procedimentos cirúrgicos, escrituração, cortes
nicação e da reflexividade sociais. Goffman contribuiu para nossa compre-
de cabelo, como construir uma parede e assim por diante. Mas também in-
ensão sobre as maneiras como as identidades sociais resultam de processos e
clui a aquisição de conjuntos mais tácitos e indeterminados de conhecimento:
interações sociais localizados com/em momentos e lugares particulares. Ele
os aprendidos in loco, por tentativa e erro, observação, imitação e interações
adotou as metáforas teatrais do «proscênio" e dos «bastidores" para com-
com pares e pessoas íntimas. Portanto, a socialização ocupacional também
preender o trabalho envolvido na socialização, tanto o mais visível quanto
exige que se «entenda do assunto" - categorizar pacientes, parecer «ocupado"
o que se dá «por trás das cortinas" - enquanto construção e administração
quando não há clientes no salão de cabeleireiros, ficar sabendo quem são os
indivíduos importantes num escritório, descobrir como conseguir trabalho de identidades sociais.
informal num canteiro de obras e assim por diante. Aprender as sutilezas do
ambiente ocupacional é tão importante quanto adquirir as habilidades técni- OUTRAS LEITURAS

cas - para estabelecer e manter uma identidade ocupacional plausível e para Giddens, Anthony. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro, Zahar, 2002.
ser socializado na cultura ocupacional. Goffman, Erving. The Presentation ofSelf in Everyday Life. Harmondsworth, Penguin,
As mesmas regras se aplicam à construção de outras identidades - onde
1959·
o ensinamento e o aprendizado de conhecimento e habilidades formais são [enkins, Richard. Social Identities. Londres, Routledge, 2ª ed., 2004·
apenas, se tanto, parte do processo de socialização. Ser um músico competente Melia, Kath. Learning and Working: The Occupational Socialisation ofNurses. Londres,
não é pré-requisito suficiente, nem mesmo necessário, para ter uma carreira
Tavistock, 1987.
musical de sucesso. Com efeito, há músicos «bem-sucedidos" que não sabem AMANDA COFFEY
ler partituras, tocar instrumentos ou cantar dentro do tom. Jogar golfe ra-
zoavelmente não garante acesso e aceitação pela fraternidade golfista, onde
pertencer ao clube de golfe «correto" pode ter maior importância. Inclusive,
certas identidades são quase inteiramente «aprendidas" graças à decodificação Sociedade
informal de roteiros culturais. Não há cursos a frequentar nem livros a estudar
Quando alguém pergunta «o que é sociologia?", é normal que se responda que
sobre «como se tornar" um punk gótico, um vigia de trem, um cliente de boate
é o estudo da sociedade - ou talvez das sociedades. Essa resposta parece clara e
ou um sem-teto. Há papéis - como os de paciente de hospital, público de teatro
objetiva, mas não é. Com efeito, há pouca concordância sobre o que é sociedade,
ou cliente de salão - com regras e padrões de comportamento a eles associa-
especialmente na era contemporânea.
dos que raramente são explicitados. Esses roteiros culturais, e as identidades
De fato, a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher uma vez declarou que
sociais por eles moldadas, são apreendidos por meio de processos contínuos
«não existe essa coisa de sociedade", há apenas «indivíduos, homens e mulhe-
de engajamento e interação. res, e suas famílias". Muitos sociólogos rejeitaram essa afirmação declarando
Há uma série de teorias da socialização. Entre elas, as que sugerem que que, evidentemente, existe essa coisa de sociedade. Mas, embora quase todos
os indivíduos não têm agência ou escolha na construção de suas identidades

You might also like