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A ESCOLA A FAVOR DA DIVERSIDADE RELIGIOSA:

IMPORTÂNCIA DESSA ABORDAGEM EM SALA DE AULA

MILANI, Noeli Zanatta1- SEED-PR

Grupo de trabalho – Diversidade e inclusão


Agência financiadora: não contou com financiamento

Resumo

O presente artigo pretende possibilitar estudos e reflexões com bases históricas abordando a
intolerância religiosa, no intuito de promover o respeito às diferenças, propondo formas
alternativas para trabalhar conteúdos didáticos com abordagens temáticas sobre essa
diversidade. O método empregado estará pautado na pesquisa bibliográfica, nos conteúdos
dos livros didáticos do Ensino Médio e na observação direta dos alunos, servindo como
referência para a pesquisa e os debates sobre a diversidade e intolerância religiosa no meio
escolar. Durante o desenvolvimento das ações pedagógicas percebeu-se que a intolerância
religiosa encontra-se mascarada no ambiente escolar. No momento em que os alunos são
incitados aos debates sobre o assunto, desvela-se de forma clara o preconceito e a falta de
conhecimento sobre o surgimento das várias crenças religiosas. Este artigo aponta a
necessidade da abordagem dessa temática no âmbito da escola, a partir dos contextos
históricos.

Palavras-chave: Intolerância religiosa. Estratégicas pedagógicas. Respeito às diferenças.


Aulas de História.

Introdução

A Constituição Federal do nosso país assegura o direito de culto e determina que


nenhum indivíduo pode sofrer descriminação por nenhum motivo, incluso aí o de religião.
Ampara-nos, portanto, no direito de exercer com liberdade nossa crença religiosa, seja ela
qual for.

1
Graduada em História pela FAFI/Palmas, pós-graduada em Interdisciplinaridade na Escola pela
IBEPEX/Curitiba e Mestre em Educação pela UNOESC. Atualmente atuo como professora de História no
Colégio Estadual Agostinho Pereira-EFM, NRE Pato Branco/PR.
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Dos Direitos e Garantias Fundamentais


CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, os termos
seguintes: VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado
o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos
locais de culto e a suas liturgias. (BRASIL, 1988).

A diversidade e a intolerância religiosa são temas tão importantes que exigem


reflexões e debates também no âmbito da escola, a partir dos contextos históricos. O não
tratamento dessa temática em sala de aula ou a ausência da escola em relação a este debate
pode ser interpretado como o resultado de uma falta de relação entre os eventos históricos e a
realidade social, bem como pela adoção de metodologias tradicionais ou ultrapassadas.
De acordo com as DCEs de História, devemos:

Entender que as relações de poder são exercidas nas diversas instâncias sócio-
históricas [...] permite ao aluno perceber que tais relações estão no seu cotidiano.
Assim, ele poderá identificar onde estão os espaços decisórios, porque determinada
decisão foi tomada, de que forma foi executada ou implementada, e como, quando e
onde reagir a ela. (DCEs, 2008, p.66 a 67).

O maior desafio da humanidade neste século XXI é aprender a conviver com as


diferenças. Na escola podemos colaborar para que isso ocorra. Em nossas ações pedagógicas,
a intolerância religiosa poderá ser trabalhada. Não podemos ficar indiferentes a essa questão.
A intolerância religiosa existe e se manifesta também no cotidiano escolar. Segundo ITANI

Pode-se mesmo afirmar que o preconceito faz parte de nosso comportamento


cotidiano. [...]. A sala de aula não escapa disso [...]. Para trabalhar os conflitos
decorrentes da intolerância é preciso compreendê-las, saber como se manifestam e
em que bases são expressas, notadamente se levarmos em conta que elas não podem
ser analisadas fora de seus contextos. (ITANI, 1998, p.119).

Em nossa prática como educadora, defrontamo-nos com várias situações que deixam
transparecer a resistência ao diferente.
A questão religiosa aparece não apenas como pano de fundo para grandes guerras e
inúmeros conflitos sociais, mas também exerce intervenção sobre o comportamento social das
massas, com estreita relação com nossa vida familiar, escolar, social e até mesmo política. A
partir desse enfoque pretendemos justificar teoricamente nossa opção pela pesquisa sobre a
necessidade da escola se envolver na luta contra a intolerância religiosa por meio de um
intenso trabalho com os conteúdos que permitam o debate e a reflexão sobre a diversidade de
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religiões existentes em nosso mundo nos mais diferentes contextos históricos e nações da
Terra.

Desenvolvimento

A influência religiosa no cotidiano da humanidade

A intervenção das religiões sobre a sociedade desde as mais remotas eras históricas até
os dias atuais sempre foi um tema que nos chamou a atenção, desde o início do Curso de
História. Notadamente em todas as disciplinas, nossas professoras e nossos professores
faziam articulações sobre a influência que tal doutrina ou tal moral religiosa exercia sobre o
mundo social, a tal ponto que grandes guerras e revoluções ocorreram e continuam ocorrendo,
na maioria dos casos, a partir de pontos de vista religiosos.
Pesquisadores que estudam a religião como um fenômeno, defendem a ideia de que a
religião esteve sempre presente entre os seres humanos e em todas as épocas. Dados
paleontropológicos mais recentes indicam que:

O “Homo sapiens” antigo, e provavelmente o “Homo erectus” produziam bifaciais e


objetos com incisões de caráter simbólico, os quais poderiam ter significado cultural
e mágico-religioso. Depois, a partir dos neandertalianos e especialmente do “Homo
sapiens sapiens”, as expressões do simbolismo religioso tornaram-se explícitas.
Práticas funerárias, culto dos ossos, culto dos animais agressivos, ritos de passagem
e ritos propiciatórios, são sinais indicadores da esperança dos primeiros homens na
vida além da morte e da crença em um mundo sobrenatural. Especialmente as
práticas funerárias, implicando a fé naquilo que sobrevive à morte. (MARTELLI,
1995, p.137-138).

Portanto, o homem religioso não é um fato recente da Pré-história. O sagrado já tinha


significado, ou seja, o reconhecimento de seres superiores e transcendentais já ocorria desde o
período em que os hominídeos se diferenciavam dos animais. No entanto, como surgiram às
experiências religiosas entre diferentes culturas e em diferentes épocas é ainda uma incógnita
para os paleantropólogos.

A experiência religiosa consiste em experimentar a presença do sagrado. Trata-se de


um evento que constitui o específico da Religião. Contudo toda religião histórica o
descreve recorrendo a expressões que são culturalmente condicionadas. Portanto, no
plano histórico, revelam-se concepções diferentes da divindade, assim como formas
rituais e sistemas de crenças profundamente diversos. (Idem, p.139-140).
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Para entendermos como essas experiências religiosas foram institucionalizadas não


devemos estudá-las somente a partir de variáveis internas à Religião. Ela está diretamente
relacionada ao contexto da sociedade. De acordo com Alves:

No processo histórico ao longo do qual nossa civilização se formou, recebemos uma


herança simbólica-religiosa, a partir de duas vertentes. De um lado, os hebreus e os
cristãos. Do outro, as tradições culturais dos gregos e dos romanos. Com esses
símbolos, vieram visões do mundo totalmente distintas, mas elas se amalgamaram,
transformando-se mutuamente, e vieram a florescer em meio às condições materiais
de vida dos povos que os receberam. E foi daí que surgiu aquele período de nossa
história batizado como Idade Média. (ALVES, 1999, p.41).

Foi no período Medieval que os símbolos sagrados se tornaram mais intensos e


concretos. Tudo aquilo que se realizava e se pensava tinha que estar relacionado com o
sagrado. O teocentrismo imperava e quem questionava era considerado herege e condenado à
morte.
O historiador Oliver Thomson, do Trinity College, em Cambridge, é especialista em
clássicos e dedica-se à pesquisa sobre as relações entre história, moral e mídia. Na obra, A
assustadora história da maldade ele analisa a influência das religiões para o surgimento dos
códigos morais que tinham com o objetivo regular ou controlar a vida em sociedade. Os
princípios morais religiosos partiam sempre do pressuposto que sem a existência de códigos
de conduta os homens seriam condenados a um estado de selvageria que tornaria impossível a
vida em sociedade. Sobre essa intervenção social da religião, Thomson escreve:

Embora fundamentalistas de muitas religiões ainda possam afirmar que seus códigos
resultam de decretos divinos, provavelmente é correto dizer que agora a maioria das
pessoas reconhece que os códigos morais são inventados pelo homem: trata-se de
regras de comportamento elaboradas por grupos de pessoas ou indivíduos para
tornar a existência mais agradável para a maioria. Essa artificialidade não significa
que a moralidade seja antinatural ou que o homem sem código moral seja
necessariamente mau. (THOMSON, 2002 p. 21).

Sobre o desdobramento histórico dos códigos ou padrões morais impostos pelas mais
antigas religiões, o autor observa que:
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O que é incontestável é que a maioria das sociedades precisou de alguma forma de


um código moral como base da vida em comunidade, e, portanto, a criou. Talvez
nem todos concordem com as regras escolhidas ou as considerem particularmente
morais, mas um padrão de controle comportamental parece sempre surgir, mesmo se
em certas ocasiões em nível aparentemente mais baixo que em outras. Em
sociedades maiores também encontramos toda uma série de subsistemas morais,
códigos distintos para guerreiros, sacerdotes, mães e inúmeros grupos pequenos.
Numa comunidade moderna, não existem apenas padrões gerais para toda uma
nação ou grupo de nações, mas há códigos no comércio, em hospitais, escolas, no
exército, em sindicatos, nos esportes e até mesmo entre criminosos (THOMSON.
2002 p.21).

Os autores trabalhados servem como referência para afirmar, que em muitos casos, a
sociedade aceitava e justificava a violência feita pela Igreja e pelo Estado e, além disso,
programava seu uso pelos chefes de família.
Nos dias atuais percebe-se também que a religião está sendo praticada como uma
forma de minimizar o sofrimento causado pelo cotidiano capitalista. Trabalhadores
desenvolvem suas atividades em péssimas condições de trabalho e salários, desempregados
excluídos da produção de riquezas, pobres e oprimidos que atribuem à Deus a sua própria
miséria. Seus sofrimentos parecem diminuir quando encontram argumentos ilusórios capazes
de melhorar suas condições de vida através de sua crença religiosa.

As palavras que brotam do sofrimento se transformam, elas mesmas, no bálsamo


provisório para uma dor que ele é impotente para curar. É por isso que o ópio,
“felicidade ilusória do povo”, que deve ser abolida como condição de sua verdadeira
felicidade. Mas o abandono das ilusões não se consegue por meio de uma atividade
intelectual. As pessoas não podem ser convencidas a abandonar suas ideias
religiosas. Ideias são ecos, fumaça, sintomas... Se elas têm tais ideias é porque sua
situação as exige. É necessário, então, que sua situação seja mudada, as feridas
curadas, para que as ilusões desapareçam. (ALVES, 1999. p.80).

A partir dessa vertente Marx defende a ideia de que enquanto houver alienação haverá
religião. No momento em que desaparecer essa alienação e as sociedades conseguirem
conquistar sua liberdade e autonomia não haverá mais opressores. Será nesse momento que a
religião desaparecerá. “A exigência de que se abandonem as ilusões sobre determinada
situação é a exigência de que se abandone uma situação que necessita de ilusões”. (MARX,
apud. ALVES, 1999, p.80).
Podemos perceber que as religiões por meio de códigos de conduta, padrões morais e
condicionamentos psicológicos, exerceram ao longo dos mais diversos processos históricos,
uma profunda influência sobre as sociedades, desde as mais primitivas até as atuais. Essa
intervenção pode ser vista de diversas formas a partir do momento em que tentamos
estabelecer o debate sobre o tema.
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O poder que as religiões exercem sobre as sociedades e o fato de quanto à intolerância


às práticas religiosas diferentes, pode ser causa de conflitos e guerras mundiais, bem como de
tragédias familiares e sociais. Nesse sentido, acreditamos na importância da atuação dos
professores de história contra a intolerância religiosa, por meio de uma reflexão constante
sobre essa temática sempre que os conteúdos didáticos possibilitem o debate e o
envolvimento dos estudantes.

A intolerância religiosa na Escola

Trabalhar a intolerância na sala de aula é difícil para muitos professores. Foi o que
constatei no momento em que socializei o projeto na escola em que atuo como docente.
Confessaram que não possuíam formação, estrutura e nem conhecimento para explorar o tema
com os alunos. Sentiam-se inseguros e sem preparo. Fui denominada de “corajosa” por meus
colegas professores por estar desenvolvendo tal projeto.
Nesta vertente Oliveira afirma:

A escola é o espaço onde se encontra a maior diversidade cultural e também é o


local mais discriminador [...]. Trabalhar as diferenças é um desafio para o professor
[...]. Esses educadores não receberam uma formação adequada para lidar com as
questões da diversidade e com os preconceitos na sala de aula e no espaço escolar
[...]. Se o professor for detentor de um saber crítico, poderá questionar esses valores
da classe dominante e saberá extrair desse conhecimento o que ele tem de valor
universal. (OLIVEIRA, 2001).

Se pretendermos erigir um ambiente de tolerância na Escola, será importante


considerar algumas posturas:
a) Conhecer as religiões como fenômeno sempre presente nas múltiplas culturas
em todo percurso histórico. Cada crença conserva características próprias de
sua civilização;
b) Conhecer as diversas religiões sempre relacionando em que contexto histórico
elas surgiram. Dessa forma o aluno terá oportunidade de arrolar sua crença
religiosa com as demais existentes e não menos importantes.
c) Motivar a sintaxe de um convívio afetuoso por meio de colóquios ecumênicos
e inter-religioso, proporcionando aos alunos e toda comunidade escolar, um
momento de reflexão a respeito das diferenças religiosas. A postura ética e
moral poderão ser resgatadas.
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As salas de aula precisam se tornar um espaço de compreensão desvelada do mundo


em que os sujeitos sociais estão integrados, a fim de que estes possam “compreender
bem quais são as diferentes concepções de mundo que se ocultam sob cada uma
delas e os principais problemas da sociedade a que pertence”. “Na sala de aula, o
professor pode até estimular entre as diferenças, com o objetivo de ajudar os alunos
a manter uma convivência saudável”. (AQUINO, 2003).

Quando a escola proporciona um ambiente democrático, receptivo, aberto, em que


diferenças de religião e outras diferenças são encaradas como naturais o respeito surge
também de modo instintivo. Esse procedimento deverá ser adotado não somente com alunos,
mas com toda comunidade escolar em que a instituição educacional está inserida.
Portanto, se a educação é um dos meios mais apropriados de se precaver a
intolerância, Von nos sugere algumas ações exequíveis e eficientes que poderão ser feitas pela
escola na construção de um ambiente de consideração ao não igual.

Ensinar quais os direitos e as liberdades a serem respeitados; combater as influências


que conduzem ao temor e a exclusão dos demais; formar docentes abertos a outras
culturas, capazes de apreciar as diferenças e evitar conflitos ou resolvê-los de forma
pacífica; promover atividades com a participação das famílias, incluindo todas as
faixas etárias (até mesmo os avós). (VON, 2003, p.40).

Para comprovar que o tema deve ser abordado nas instituições escolares fizemos um
levantamento de casos de intolerância ocorridos nas escolas brasileiras.
Foi lançado um documento na Marcha Nacional pela Liberdade Religiosa no Rio de
Janeiro no dia 19 de outubro de 2011. Este documento tem por finalidade divulgar casos de
intolerância religiosa nas escolas e creches do Rio de Janeiro.
Os relatos informaram a ocorrências de casos de violência física (socos e até
apedrejamento) contra estudantes; demissão ou afastamento de profissionais de educação
adeptos de religiões de matriz africana ou que abordaram conteúdos dessas religiões em
classe; proibição de uso de livros e do ensino da capoeira em espaço escolar; desigualdade no
acesso a dependências escolares por parte de lideranças religiosas, em prejuízo das vinculadas
a matriz africana; omissão diante da discriminação ou abuso de atribuições por parte de
professores/as e diretores/as etc. Em São Paulo, o processo de colher informações está em
andamento.
Para Denise Carreira, coordenadora do programa Diversidade, Raça e Participação, da
Ação Educativa e Relatora Nacional pelo Direito à Educação, a discriminação e a violência
históricas contra pessoas de religiões de matriz africana sofrem de profunda invisibilidade no
debate educacional e as denúncias apontam que ela vem aumentando em decorrência do
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crescimento de determinados grupos neopentecostais nas periferias das cidades e de seu poder
midiático; da ambiguidade das políticas educacionais com relação à defesa explicita da
laicidade do Estado e do insuficiente investimento na implementação da lei 10.639/2003 que
tornou obrigatório o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira em toda a
educação básica.
De acordo com a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI),
há casos de explícita agressão física e moral a pessoas de diferentes religiões, levando até
mesmo a homicídios. Entretanto, muitas vezes o preconceito não é mostrado com nitidez. É
comum o agressor não reconhecer seu próprio preconceito e ato discriminatório. Todavia, é de
fundamental importância a vítima identificar o problema e denunciá-lo.
O agressor costuma fazer uso de palavras ofensivas ao se referir ao grupo religioso
atacado e aos elementos, deuses e hábitos da religião em questão. Há também casos em que o
agressor desmoraliza símbolos religiosos, queimando bandeiras, imagens, roupas típicas e etc.
Em situações extremas, a intolerância religiosa pode se tornar uma perseguição que visa o
extermínio de um grupo com certas crenças, levando a assassinatos, torturas e enorme
repressão.
Crianças são vítimas de intolerância religiosa na escola. Foi entregue ao
desembargador Siro Darlan, presidente do Conselho Estadual da Criança e do Adolescente
(CEDCA), no dia 27 de janeiro de 2009, um dossiê-denúncia de crianças discriminadas por
orientação religiosa em escolas. A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa constatou
que o caso mais grave é de um menino de treze anos que passou sete meses sendo alvo de
intolerância religiosa pela própria professora nas dependências da FAETEC. O menino está
em tratamento psicológico. O caso foi registrado na 28 DP. Além deste, outros casos de
intolerância estão sendo acompanhados pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa.
Gualberto fez um mapeamento dos casos de intolerância no Brasil com o objetivo de
sistematizar a problemática do desrespeito e da descriminação religiosa em nosso país nos
últimos dez anos. Não é um trabalho científico, mas tem por finalidade detectar casos de
intolerância também nas escolas e denunciá-las. O autor deste trabalho afirma que as punições
ainda não se concretizam de forma efetiva, sendo um fato que só faz aumentar os casos de
intolerância religiosa e que continuam sendo impunes.
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Rio - As aulas de Literatura Brasileira sobre o livro ‘Lendas de Exu’, de Adilson


Martins, se transformaram em batalha religiosa, travada dentro de uma escola
pública. A professora Maria Cristina Marques, 48 anos, conta que foi proibida de dar
aulas após usar a obra, recomendada pelo Ministério da Educação (MEC). Ela
entrou com notícia-crime no Ministério Público, por se sentir vítima de intolerância
religiosa. Maria é umbandista e a diretora da escola, evangélica. (GUALBERTO,
2011, p.136).

No blog a voz da negritude consta a seguinte denúncia: preconceito e intolerância


religiosa na escola Batista em Codó impede alunos de exporem objetos de cultura afra
codoense em projeto pedagógico.

Um grupo de alunos da Escola Batista de Codó-MA, foram impedidos de expor


objetos da cultura afro-codoense em um projeto pedagógico da escola que tratava da
diversidade cultural do município, segundo os alunos a direção da escola não
permitiu a exposição das roupas e dos instrumentos musicais de origem africana que
haviam conseguido junto à Secretaria Municipal de Cultura e Igualdade Racial e
ONG AFROVERMELHO para o desenvolvimento do projeto, sob a alegação de que
estes objetos pertenciam a macumba e não seriam permitido dentro da escola, que a
escola tinha os seus preceitos a sua doutrina e que os alunos haviam assinado um
contrato que previam estas condições. O caso causou um grande constrangimento
aos alunos envolvidos no projeto e ao professor de história orientador da turma que
há dez anos presta serviço na instituição, e principalmente às instituições que tratam
da temática no município. (SERRA, 2012).

Através do observatório da educação, no dia 24 de agosto de 2010, Denise Carreira


relata denúncias de agressões e outros casos de intolerância religiosa relatados pelo Direito
Humano à Educação em Salvador.

Escolas públicas sendo usadas para cultos, crianças que se iniciam em determinadas
religiões vítimas de agressão e de isolamento em sala de aula, professores que dão
aulas de ensino religioso de acordo com a sua fé. [...]. Denise conta que os
problemas ocorrem principalmente devido a profissionais de educação, ligados a
grupos religiosos evangélicos, que discriminam, na maioria das vezes, estudantes de
religiões de matriz africana. “Quando se iniciam na umbanda, crianças ficam sem
cabelo e usando contas. Professores, muitas vezes ligados às igrejas pentecostais,
“demonizam” as crianças, falam para a sala que elas fazem pacto com o diabo, entre
outras coisas”. (CARREIRA, 2010).

No site lei e ordem Raphael Vieira relata mais um caso de intolerância religiosa
ocorrida na Fundação de Apoio à Escola técnica (Faetec), em Quintino no subúrbio do Rio de
Janeiro.

O fato ocorreu em junho de 2008, quando Felipe Gonçalves Pereira, de 13 anos, foi
expulso da sala de aula por uma professora e chamado de “filho do demônio” por
usar no pescoço um colar de contas típico dos adeptos de religiões de origem
africana. O caso foi parar na delegacia, mas só agora, em janeiro, foi instaurado um
inquérito. (VIEIRA, 2009).
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Estas são algumas ocorrências relatadas, diante de inúmeros casos nem sempre
divulgados e denunciados pelas vítimas. Fica então comprovado que a escola pode e deve
combater a intolerância com medidas preventivas e educativas. Os agressores deverão ser
sempre punidos. As novas gerações devem ser orientadas e educadas, pois a ignorância e a
intolerância são fenômenos que ameaçam e comprometem uma sociedade democrática.

Implementação da proposta de intervenção na Escola

O projeto foi implementado com os alunos da 1ª Série do Ensino Médio do Colégio


Estadual Prof. Agostinho Pereira-EFM no município de Pato Branco, pertencente ao NRE de
Pato Branco.
Induzidos a falar após minha explanação sobre diferentes religiões e conflitos
causados sobre a intolerância religiosa, começaram se manifestar, surgindo os seguintes
relatos:

Aluno A. “No projeto de Educação Física em que a professora trabalha vários tipos
de ritmos ocorreu algo estranho. Ela não permitiu que alguns alunos dançassem
músicas islâmicas argumentando que a maioria dos alunos era da religião católica e
que a direção da escola impediria a apresentação da dança para os demais alunos”.

Fica explícito nesse depoimento que a falta de conhecimento e a intolerância se


desvela nos procedimentos cotidianos dos professores. O professor que pesquisa vários
assuntos, incluindo religião, sente mais segurança em trabalhar diante das avalanches de
ideias existentes sobre as diferentes crenças religiosas e evita situações semelhantes ao relato
do aluno.

Aluno B. “Meu irmão está pensando em sair do emprego porque sofre muita pressão
por parte do patrão dele e da maioria dos seus colegas. Pressionam todos os dias
para mudar de religião. Ele falou que prefere mudar de emprego ou ficar sem
emprego do que mudar sua religião por outra”.

Nessa fala podemos constatar que a intolerância está presente no cotidiano das
pessoas. Ela influencia de forma negativa a vida dos cidadãos. Neste caso está provocando um
clima de tensão que poderá resultar em violência e o não respeito entre os de diferentes
credos.
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Aluno C. “Minha mãe não quer mais falar com nossa vizinha e nem tomar mais
chimarrão na casa dela, pois cada vez que se encontram ela fica tentando convencer
minha mãe de que a religião dela é que salva as pessoas. Um dia depois de ela
insistir para minha mãe ir à Igreja dela, a mãe foi. Ela não gostou do culto e não vai
mais. Disse que quer continuar com a religião que ela segue desde que nasceu”.

A evidência dessa situação relatada está nas pessoas acharem que somente a religião
que seguem leva à salvação. É um exemplo de intolerância por falta de conhecimento. As
pessoas envolvidas neste fato nunca exercitaram a tolerância pelos não iguais. Mas casos
semelhantes á esse é que alimenta um clima de tensão e que poderá ser o estopim para
conflitos religiosos.

Aluno D. “A colega que está faltando na aula hoje é evangélica. Nós a tratamos
normalmente, mas ela se fecha. Nos trabalhos em grupo ela não se integra e acaba
trabalhando sozinha. A gente até convida ela pra fazer parte do grupo e ela nunca
aceita. Fica isolada o tempo todo”.

Essa fala nos leva a várias reflexões. Teria esse aluno sofrido humilhações no decorrer
de sua vida escolar? Teve oportunidades em sala para se manifestar e se sentir a vontade para
falar sobre suas crenças? Pode ser também que maioria sendo de outra religião a perturba
causando inibição e insegurança. Que ações a escola planejou oportunizando para que todos
pudessem entender os diversos credos e criar um clima mais afetuoso?

Aluna E. “Professora, eu não sou intolerante com as pessoas que seguem outra
religião. Respeito à forma deles pensar. Mas eu não admito que ninguém julgue ou
critique minha religião. Eu tolero e espero que eu também seja tolerada”.

Este é um caso perfeito de intolerância camuflada. Existem pessoas que se mostram


indiferentes com as pessoas que seguem religiões diferentes.

Considerações Finais

O tema pesquisado, explorado e refletido nos comprovou de que a intolerância


religiosa está presente no ambiente escolar de forma camuflada e pouco trabalhada.
A preocupação da escola deverá ser de elaborar seu currículo que oportunize debates e
reflexões sobre as diversidades, ou seja, que permita problematizar a realidade. A não
tolerância aos desiguais só não ocorre quando as pessoas têm acesso ao conhecimento sobre o
tema.
Percebe-se que a intolerância religiosa influencia e muito a vida das pessoas e dela
resulta clima de tensão que poderá originar conflitos, ameaçando a democracia social.
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Acreditamos numa escola igual para todos e numa escola em que reconheça a
proveniência de alunos com diferentes culturas. Um clima de respeito faz com que todos se
sintam pertencentes ao processo educacional, evitando a exclusão escolar.
A intolerância poderá ser abordada constantemente na escola se o professor conhecer e
reconhecer que seus alunos são diferentes e que deverão ser respeitadas e trabalhadas essas
diferenças. Este trabalho terá êxito se os educadores acreditarem e defenderem a escola como
sendo um espaço para todos. Isso pressupõe a garantia de liberdade religiosa.
Pressupõe-se que os casos de intolerância levantados neste trabalho tenderão a ser
minimizados se toda comunidade escolar estiver integrada e consciente para enfrentar esse
fenômeno.
Dessa forma, a função da escola seria formar pensadores sensatos, conciliadores, e
para tanto é preciso que os professores se desprendam de seus próprios preconceitos, e que
sejam capazes de estabelecer estratégias pedagógicas, para conviver com as diversidades.
Fazer das diferenças momentos para enriquecer suas ações pedagógicas e proporcionar
entendimento e respeito às diversas crenças religiosas.

REFERÊNCIAS

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