Professional Documents
Culture Documents
1
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
Introdução
No antigo testamento ainda não tem um termo técnico que possa traduzir a idéia de
revelação, porém, se utiliza muito a expressão “Palavra de Iahweh”, para expressar o termo
revelação e a comunicação Divina. O mais importante no antigo testamento não é ver a
divindade, mas sim, ouvir a sua palavra. É por sua palavra que Deus, progressivamente,
introduz ao homem no conhecimento de seu ser íntimo2. Traçar, pois, a história da palavra de
Deus é traçar ao mesmo tempo a história da revelação.
1 do latim fides, fé. Doutrina religiosa que prega que as verdades metafísicas, morais e religiosas, como a existência
de Deus, a justiça divina após a morte e a imortalidade, são inalcançáveis através da razão, e só serão compreendidas
por intermédio da fé.
2 “A palavra de Deus, no antigo testamento, dirige e inspira uma história que se inicia pela Palavra divina
pronunciada na criação e que termina com a palavra feita carne. (E. Jacob)”.
Disciplina: Teologia Fundamental
2
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
Fase Antiga, Gênesis. Caracteriza pelas teofanias e manifestações oraculares. Narra que
Iahweh apareceu sob formas humanas a Abraão3, para anunciar-lhe o nascimento de Isaac. No
antigo testamento nos momentos mais difíceis o povo consultava a Iahweh, seu Deus, que ele
sabe estar presentes em todas as suas ações. Fases características do antigo testamento: teofanias
– manifestações oracular. Técnicas para penetrar nos pensamentos e segredos dos deuses. Com
os profetas essas técnicas arcaicas tendem a desaparecer, dando lugar à experiência da Palavra
que prevalece, purifica-se então as técnicas usadas pelos povos politeístas antigos, a era da
Palavra de Iahweh.
Fase Mosaica - A aliança no Sinai. Deus libertador do povo. Liberta das mãos do faraó
para fazer uma aliança com o povo, os libertou “De”, mas “Para” ser seu povo
escolhido.Consiste em que Iahweh por seu poder e sua fidelidade, livra o povo do domínio
egípcio4, por essa aliança faz desse povo sua propriedade e torna-se chefe da nação. A aliança
transformou em comunidades as tribos que tinham saído do Egito, dando-lhes uma lei, um culto,
um Deus, uma consciência religiosa5. Torna-se Israel um povo governado por Iahweh.
Fase Deuteronômica. Teologia da lei, quem cumpre a lei é abençoado, quem não
cumpre é amaldiçoado. A lei não é um simples mandamento, um simples comentário, mas são
preceitos acompanhados de evocações históricas, promessas e ameaças que inspira amor e
respeito pela lei. Tradição oriunda do oriente, que tem duas correntes: legalista e profética6. A
história de Israel, com suas desgraças aparecem como conseqüência lógica da infidelidade
constante e renovada. Iahweh, revelando sua vontade prometera sua bênção à obediência de seu
povo. Israel, pois, se quiser viver, deve por em prática todas as palavras da lei, que saída da
boca de Iahweh é fonte de vida. Também chama o decálogo de: as de 10 palavras, estende a
expressão a todas as cláusulas da lei, isto é, ao conjunto das leis morais, civis, religiosas e
criminais. Nas leis do Sinai, o dabar divino era simples mandamento, sem comentários. No
deuteronômio, pelo contrário, os preceitos são acompanhados de evocações históricas,
promessas e ameaças, que deve inspirar o respeito e o amor a lei. Consiste a lei em amar a Deus
de todo o coração e de toda a alma.
aliança entre o Povo e Deus (Deus que liberta o povo e este que lhe promete ser fiel, por meio do decálogo) - Ex
20,22-23.
6 Legalista: expressão mor do sacerdócio – o cumprimento da lei.
acontecimentos é regulado pela vontade divina, levando em conta as atitudes do povo eleito. Em
última análise, é a palavra de Deus que faz a história e a torna compreensível. O importante
nessa literatura histórica é o texto da profecia de Natan que dá a aliança conexões com a realeza
e inicia o messianismo real. Com essa profecia a dinastia de Davi tornar-se para sempre a aliada
direta de Iahweh, ponto central da história da Salvação.
Profetismo no exílio7. Sem deixar de ser uma palavra viva se torna uma palavra escrita.
Ezequiel é o ministro de uma palavra irrevogável, que anuncia os acontecimentos dando-lhes
um desenrolar infalível. Uma das primeiras profecias de Ezequiel é o número e amplitudes das
visões. Há palavras que comentam essas visões por si mesmas, são ensinamentos. Uma segunda
característica é o tom pastoral da palavra de Ezequiel. Ezequiel começa a formar o novo Israel,
como faria um diretor espiritual. Deutero-Isaias, que devemos ler no contexto do exílio,
considerar o dabar divino em seu dinamismo a uma só vez cósmica e histórica. Manifesta-se a
transcendência de Iahweh primeiramente em natureza.
Literatura sapiencial: Deus usou da experiência humana para dar o homem a conhecer-
se a si mesmo.É testemunha de uma tradição muito antiga de Israel. O mesmo Deus que ilumina
os profetas usou a experiência humana para dar o homem conhecer-se a si mesmo. Inicialmente,
a sabedoria do livro dos Provérbios, é a simples reflexão, positiva e realista, sobre o homem e
seu comportamento, para ajudá-lo a se orientar na vida com prudência e descrição. Assim diz o
provérbio: ”Sábio é quem cumpre a lei de Deus, pois toda a sabedoria provém de Deus.
Somente Ele a possui plenamente; manifesta-se em suas obras e comunica aos que o amam”.
7O exílio do povo de Israel se deu por volta do ano 587 até 538.
8Características dos salmos sob o ponto de vista da revelação: 1) Preceito; 2) Revelação – a lei; 3) Compromisso; 4)
A veracidade e a fidelidade de Iahweh; 5) O valor de uma promessa; 6) A palavra criadora.
Disciplina: Teologia Fundamental
4
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
A revelação profética
Objeto da Revelação
9 Os profetas afirmam que Deus lhes falou e que sua palavra chegou até eles. Devemos notar também que o termo
palavra de Deus não se verifica sempre do mesmo modo, nem com a mesma intensidade. Na vida dos profetas há
momentos privilegiados, quando a palavra de Deus se apodera deles de forma mais intensa. O momento mais
importante é o de sua vocação.
10 Resumo: O Deus do antigo testamento é um Deus de intervenções e o profeta as interpreta, percebe e proclama o
uma compreensão sempre mais profunda dos atributos divinos: Amós põe em evidência sua
justiça; Oséias, seu amor terno e ciumento. Isaias, sua grandeza e transcendência; Jeremias
ensina uma religião mais interior; Ezequiel lembra as exigências da santidade de Deus; Deutero-
Isaias, leva para uma religião mais universalista.
Se Deus fala, o homem deve escutar. Escutar indica a primeira atitude do homem ante a
revelação: não de modo material e passivo, mas em disponibilidade totalmente ativa. A palavra
ouvida deve ser assimilada pela fé e pela submissão, numa entrega de todo o ser, como fez
Abraão. Revelação e fé são correlativas: a fé do antigo testamento, com efeito, corresponde
exatamente ao tipo de revelação que lhe foi feita. No AT a revelação era essencialmente lei e
promessa de salvação; a fé, principalmente, obediência e confiança11.
A revelação bíblica é uma iniciativa Divina: não é o homem que descobre a Deus; é
Iahweh que antes, se manifesta, quando quer, a quem ele quer.
Pela revelação o homem é posto em confronto com a palavra, uma palavra que exige fé
e execução: a sorte do homem dependerá da opção decisiva a favor ou contra a palavra. O
objetivo, porém, da revelação é a vida e a salvação do homem, sua comunhão com Deus.
A revelação é toda orientada para a esperança de uma salvação que há de vir: cada
revelação profética marca uma realização da palavra, mas deixa, ao mesmo tempo, lugar para a
esperança de uma realização ainda mais decisiva.
Conclusão
Revelação no NT: É a ação, sumamente livre e amorosa, pela qual Deus, numa
economia de encarnação, já de alguma forma iniciada no AT, dá-se a conhecer em sua vida
11Para um hebreu, acreditar é obedecer e confiar; é reconhecer Iahweh, como o único Deus salvador de Israel, o que
lhe deu a lei e prometeu a salvação; e aceitar a sua vontade e confiar-se em suas promessas.
Disciplina: Teologia Fundamental
6
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
A tradição sinótica
Os vocábulos
Na tradição sinótica os termos que descrevem a ação reveladora de Cristo são: pregar
(no sentido de proclamar), pregar o Evangelho, evangelizar, ensinar e revelar. Como os profetas,
Cristo prega e apresenta sinais. Cristo não recusa os títulos (Mestre, Rabbi etc) e tampouco os
reinvidica. Pois, ele é mais que um profeta e rabbi: é o Filho de Deus que partilha dos segredos
do Pai. Habitualmente os sinóticos apresentam a Cristo ensinando. Ao passo que “Kerigma”,
corresponde principalmente ao aspecto dinâmico da palavra. O ensinamento acompanha
normalmente o choque do primeiro anúncio da salvação.
Pela sua pregação Cristo continua a tradição dos profetas. Essencialmente sua pregação
é o evangelho e o Reino de Deus.Mas, pela sua pessoa ele sobrepassa os profetas. Cristo
continua a tradição dos profetas e aperfeiçoa. Percorre todo caminho predito pelos profetas.
Essencialmente sua pregação é o evangelho do Reino: Cristo anuncia a inauguração desse Reino
cuja eminência fora anunciada pelo Batista. Como revelador, pela excelência de sua pessoa,
sobrepassa os profetas.É válido lembrar que Cristo não somente prega, mas também convida a
outros a participar de sua missão: “E constitui doze deles, para andarem com Ele, e para os
mandar pregar”12. Os que acolherem a mensagem dos apóstolos serão salvos; os outros serão
condenados13. Entre a pregação de Cristo e a dos apóstolos há continuidade.
Cristo é em si mesmo a mais alta manifestação profética, por ser o filho único do Pai, o
herdeiro, é por isso que ensina com grande autoridade. Se o Cristo é em si mesmo a mais alta
manifestação profética possível, se ensina com tão grande autoridade, deve-se ao fato de ser Ele
o Filho único, o herdeiro, a quem o Pai confiou tudo15. Ele é o Filho, pois conhece o Pai e seus
segredos, cujo conhecimento comunica a quem bem lhe apraz. O Filho não pode ser
reconhecido pelo que é sem uma luz concedida pelo Pai: graça recusada ao orgulho dos sábios.
A aceitação da revelação Divina é obra da Graça.
12 Cf: Mt 3,14.
13 Cf: Mc 16,16.
14 Cf: Mc 9,5.
15 Cf: Mc 12,6.
Disciplina: Teologia Fundamental
7
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
A resposta condizente com a pregação da Boa Nova é a fé. São os homens convidados a
escutar e compreender, isto é, a aceitar na fé a palavra de Deus e viver de acordo. Com efeito,
Deus revela-se de forma tão desorientadora que a revelação se pode tornar para os homens
pedra de escândalo, ocasião de incredulidade.
Conclusão
Na tradição sinótica, Cristo é o revelador enquanto proclama a Boa Nova do Reino dos
céus e ensina com autoridade a palavra de Deus. A fé, dom de Deus, revelação do Pai, é a
resposta do homem à pregação do Evangelho. O conteúdo essencial da revelação é a salvação
oferecida à humanidade sob a imagem do Reino de Deus, anunciado e instaurado por Cristo.
Os atos dos apóstolos refletem a linguagem da Igreja primitiva e sua nova fé. Os verbos
concernentes aos atos dos apóstolos são: testemunhar, proclamar o Evangelho e ensinar,
formam a função apostólica.
a) Os apóstolos testemunham: A primeira parte dos atos dos apóstolos insiste nos termos:
testemunhas e testemunhar. Testemunhar caracteriza a atividade apostólica nos
primeiros tempos após a ressurreição. Os que viram o ressuscitado testemunham a sua
volta à vida, tomando partido por ele ante os inimigos. Testemunhas são em primeiro
lugar os apóstolos, são três as características dos apóstolos: 1)São escolhidos por Deus;
2) São associados a Cristo durante a sua vida; 3) Viram-no após sua ressurreição.
O que os apóstolos pregam, ensinam, atestam, o que seus ouvintes são convidados a
escutar e receber, é o Cristo ou a Palavra sobre o Cristo.
Conclusão
16 Cf: At 1,8
Disciplina: Teologia Fundamental
8
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
São Paulo
São Paulo para penetrar no âmago da idéia de revelação usa as categorias de “mistério e
de Evangelho”.
Os termos
O mistério Paulino
a) No plano da intenção (mistério de Deus); na fase inicial o mistério de Deus está oculto:
segredo de infinita sabedoria.
b) No plano da realização, no Cristo e pelo Cristo (o mistério de Cristo); Mas agora o
mistério que outrora estava oculto está manifesto, revelado. Pela vida, morte e
ressurreição de Jesus o mistério entrou em fase de realização; em Jesus Cristo cumpre-
se e ao mesmo tempo revela-se o desígnio salvífico de Deus. O mistério inicialmente é
comunicado a testemunhas privilegiadas: os apóstolos e os profetas. São eles os
mediadores e os arautos do mistério.
c) No plano do encontro pessoal (mistério do evangelho, da palavra e da fé); revelado a
testemunhas escolhidas, o mistério é dado a conhecer a todos os chamados a Igreja. São
Paulo estabeleceu uma equivalência “concreta” entre o evangelho e mistério. Em ambos
os casos temos a mesma realidade, isto é: o plano da salvação considerado porém, sob
ângulos diversos. Sob um aspecto, é um “segredo”, desvendado, revelado, manifestado,
transmitido ou comunicado; sob outro, é a boa nova, uma mensagem proclamada
anunciada. Evangelho e mistério têm o mesmo conteúdo e objeto. Objeto duplo:
soteriológico, isto é: a economia da salvação pelo Cristo, e escatológico, ou seja, a
promessa da glória com todos os bens destinados aos escolhidos, frutos da cruz e da
morte de Cristo.
Resposta do homem
Conclusão
Segundo são Paulo podemos definir a revelação como: “A ação livre e gratuita de Deus
que, no Cristo e pelo Cristo, manifesta ao mundo, a economia da salvação, isto é, seu eterno
desígnio de reunir tudo no Cristo, Salvador e cabeça da nova criação”. A comunicação desse
desígnio se faz pela pregação do Evangelho, confiada aos apóstolos e profetas do novo
testamento. A obediência da fé é a resposta do homem a pregação evangélica, sob a iluminação
do Espírito Santo; sendo uma adesão amorosa ao plano de sua infinita sabedoria e caridade. A fé
dá o começo a um processo de crescimento contínuo no conhecimento do mistério que atingirá
seu termo na revelação de visão.
Dirige-se aos judeus cristãos a epístolas aos hebreus. Demonstra a excelência de Cristo
como mediador e a superioridade de seu sacerdócio sobre o da antiga aliança. Faz o paralelo
entre a revelação da antiga aliança e a da nova aliança. Para a história da noção de revelação a
epístola aos hebreus traz duas novidades; comparação entre a revelação da nova aliança e da
antiga aliança, grandeza e exigência da palavra de Deus.
São João
Nos sinóticos, atos dos apóstolos e nas epístolas de São Paulo, palavra de Deus é a
designação que se dá a mensagem evangélica. A grande novidade de São João é a equação que
ele estabelece entre o Cristo, Filho do Pai, e o Logos.
a) Jesus Cristo, palavra de Deus e Filho de Deus: O antigo testamento conhecia também a
palavra criadora e reveladora, enviada a terra para revelar os segredos de Deus, a Ele
retornando uma vez cumprida sua missão. Mas o antigo testamento não entendia (e
dificilmente poderia, pelo seu monoteísmo radical) a Sabedoria e a Palavra de Deus
como uma pessoa realmente distinta. Jesus Cristo é a palavra eterna do Pai, como
criadora e reveladora, mas enquanto pessoa. Para João o Logos é uma pessoa, que
mantém com o Pai o mais íntimo comércio, dele distinta, Deus, no entanto, como ele
mesmo, verbo de Deus, palavra de Deus.
b) A gesta do Logos: Apresenta-se o prólogo do Evangelho de São João como a gesta do
Logos, um resumo da história da manifestação de Deus por sua palavra. Podemos
distinguir três etapas dessa economia. A primeira manifestação de Deus é a criança.
Tudo criou com a palavra, Deus criou o mundo pela palavra. Mas, de fato o homem
permaneceu surdo a mensagem de Deus e foi um fracasso: “O Logos estava no mundo,
e o mundo por Ele foi feito, mas o mundo não o conheceu”. Por isso Deus escolheu um
povo e se lhe manifestou pela lei e pelos profetas; mas essa revelação, como a primeira
malogrou: “O Logos veio para sua casa e os seus não o receberam”. Finalmente, depois
de ter falado pelos profetas, falou-no Deus por seu Filho. Jesus Cristo é a palavra
substancial de Deu, o Filho único do Pai. Realiza-se a revelação porque a Palavra se fez
carne e assim se tornou mensagem divina, contando-nos em termos e preposições
humanas os segredos do Pai, principalmente o mistério de seu amor por seus filhos.
Três elementos fazem de Cristo o perfeito revelador do Pai: sua preexistência como
Logos do Deus. A encarnação do Logos. A intimidade da vida permanente do Filho
com o Pai, antes e depois da encarnação.
c) A revelação no vocabulário Joanino: Para João o Cristo é a palavra de Deus. Os termos
que traduzem a visão interior de João prendem-se, em sua maioria a idéia de revelação:
palavra testemunho, luz, verdade, glória, sinal, conhecer, saber, ver manifestar etc.
testemunhar é afirmar a realidade de um fato, dando a afirmação toda a solenidade
exigida pelas circunstâncias. Um processo, uma contestação, forma o contexto natural
do testemunho.
Disciplina: Teologia Fundamental
11
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
d) O Cristo, testemunha do Pai: O Cristo fala como testemunha qualificada, pois é palavra
de Deus. O essencial do seu testemunho é que o Cristo é o Filho do Pai, o enviado do
Pai. o Salvador do mundo e que, pela fé nele depositado é que os homens poderão
chegar a vida eterna.
O testemunho do Pai
De dois modos testemunha o Pai em favor de seu Filho. Em primeiro lugar pelas obras.
É o Pai que pelas obras de Jesus, testemunha em favor de seu Filho.Mas, para que dêem adesão
a palavra do Filho é preciso que o Pai arraste os homens e os de ao Filho. A fé um dom do Pai.
E mais, o testemunho é uma ação de toda a trindade. O Espírito finalmente, não apenas
possibilita a adesão a verdade, mas age também nos corações para que continue sempre ativa a
palavra de Deus recebida na fé. É o Espírito que aplica e interioriza a palavra e o testemunho.
A revelação parte do Cristo e ao mesmo tempo que do Pai. O Cristo é ao mesmo tempo,
pois, o Deus que fala e ao Deus ao qual se fala, quem revela o mistério e é o próprio mistério.
Características da Revelação
Conclusão
Para João a revelação como palavra de Deus é feita carne, e por essa carne, palavra e
testemunho formulada humanamente, dirigida imediatamente aos apóstolos e por eles a toda a
humanidade, para atestar a caridade do Pai, que envia o seu Filho entre os homens para que,
acreditando nele, tenham a vida eterna. A revelação é a ação sumamente livre e amorosa, pela
qual Deus, numa economia de encarnação, já de alguma forma iniciada no antigo testamento
(pela instrumentalidade da palavra profética), dá se a conhecer em sua vida íntima e no desígnio
amorosos que eternamente formou de salvar e reconduzir a si todos os homens pelo Cristo.
Ação que se realiza pelo testemunho exterior do Cristo e dos apóstolos e pelo testemunho
interior do Espírito que opera internamente para a conversão dos homens ao Cristo. Esse
testemunho do Cristo e dos apóstolos é ampliado e confirmado pelos sinais de poder. Dessa
forma, pela ação conjunta do Filho e do Espírito, o Pai manifesta e realiza seu desígnio de
salvação.
Para bem situar a contribuição de Orígenes, seria preciso escrever, pelo menos
brevemente, uma história da função reveladora do Verbo encarnado antes de Orígenes. Os
historiadores, do dogma, absorvidos por outros problemas (Trindade, cristologia, soteriologia,
teologia sacramental etc), não chegaram a perceber suficientemente a grande importância do
tema da revelação na teologia dos três primeiros séculos.É claro que nenhum dos santos padres
puderam escrever um tratado sobre a revelação, apesar de muitas vezes podemos encontrar
dispersos em seus escritos quase todos os elementos necessários para uma síntese doutrinal
sobre o assunto.
PRIMEIRAS TESTEMUNHAS
Disciplina: Teologia Fundamental
12
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
Os padres apostólicos:
obras ser conhecido pela razão. A ordem do universo manifesta o criador, artífice e arquiteto da
beleza e da harmonia invisíveis. Os filósofos “conseguiram conceber, mas não encontram o ser,
pois não se dignaram a aprender de Deus o que Deus se refere, mas de si mesmo o quiseram
aprender. É por isso que cada um apresentou opinião diferente sobre Deus, sobre a
natureza,sobre as formas e o mundo”.
São Teófilo de Antioquia: Também admite que a razão pode apresentar certa
demonstração da existência de Deus. Teófilo insiste na importância dos profetas na economia da
revelação.e afirma que somente os cristãos possuem de fato a verdade, porque foram instruídos
pelo Espírito Santo, que falando nos santos profetas, tudo predisse.
SANTO IRINEU
20 Para santo Irineu realmente, a manifestação do Filho é conhecimento do Pai, pois tudo é manifestado pelo Verbo.
Disciplina: Teologia Fundamental
14
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
Os alexandrinos
São Cirilo de Alexandria: Seguindo a Escritura Cirilo repete que ninguém viu a Deus e
que o conhecimento do Pai nos vem pelo Filho. O Cristo, Verbo encarnado, é a porta e o
caminho que conduz ao conhecimento do Pai. Para designar a função reveladora do Cristo,
Cirilo dá o título de luz.
Os Capadócios
São Basílio: São Basílio ensina que somente o Filho e o Espírito conhecem
intimamente o Pai. A são Basílio, porém, mais do o dom da doutrina revelada, interessa sua
plena assimilação e frutificação na alma por uma “iluminação da gnose”. A gnose é um
elemento essencial na assimilação progressiva a Deus, da divinização do cristão.
São João Crisóstomo: São João Crisóstomo escreve contra os anomeus: repete que
Deus, mesmo depois da revelação, continua o Deus oculto e incompreensível. Fala, porém, de
forma mais pastoral. Deus é o incompreensível, o inenarrável segundo Crisóstomo e que o
perfeito conhecimento de Deus é privilégio do Espírito Santo. São João Crisóstomo, não proíbe
aos cristãos de aprofundar na fé; recusa, porém, as especulações. Se Deus fala, o homem deve
conformar sua vida aos ensinamentos divinos. Para Ele, só o Filho e o Espírito conhecem
perfeitamente a Deus. O que dele sabemos, nos vem pelos profetas e principalmente pelo Xto, o
Filho do Pai que veio trazer aos homens o conhcto da economia salvífica oculta aos anjos e as
nações. São João Crisóstomo não apresenta nada de sistemático sobre a revelação.
São Cipriano: Cipriano, para designar a ação reveladora de Deus adota o termo
tradição. O mesmo se deve dizer da tradição apostólica. Cipriano dá, pois, ao termo tradição o
sentido ativo e forte de primeira comunicação da verdade, ou seja, revelação. A fonte de origem
da verdade cristã é a tradição evangélica e apostólica ou ensinamento do Cristo e a pregação dos
apóstolos.
Conclusões
Aqui interessa a revelação imediata dirigida aos profetas. Partindo dos dado da
Escritura, tradição e ensino da Igreja que descrevem e concebe a noção de revelação. Não é
preocupação dos escolásticos do século XIII nem da teologia que os procedeu interrogar-se
especialmente sobre a natureza e as propriedades da revelação Cristã.
São Boaventura (1221): São Boaventura fala ocasionalmente sobre a revelação em seu,
“Comentários das Sentenças” de Pedro Lombardo e nos seus comentários bíblicos; fala mais
explicitamente em seus comentários bíblicos
21 Os gnósticos, em certo sentido elevavam ao máximo o conceito de revelação, mas o deformou ao mesmo tempo.
22 A revelação para São Boaventura é mos se fosse iluminação. É importante salientar que Boaventura não distingue
revelação e profecias.
23 Este último é o mais alto e supõe sempre uma revelação e não se dá mesmo modo com os outros dois modos de
revelação.
Disciplina: Teologia Fundamental
17
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
Santo Tomás de Aquino (1225): “Santo Tomás fala várias vezes de revelação:
considera-a como operação salvífica, que procede do livre amor de Deus e proporciona ao
homem luzes indispensáveis ou simplesmente úteis na busca da salvação; ou como um
acontecimento histórico, que se desenrola no tempo e atinge os homens de todos os séculos
numa complexa economia de intermediários, de etapas e de modalidades”.
a) A revelação como operação salvífica: Iniciando a suma, Santo Tomás coloca o fato
fundamental da revelação como ponto de apoio e de fé cristã. Inspirado pelo livre amor
divino, a revelação existente para a salvação do homem. A revelação de verdades de
ordem natural sobre Deus e nossas relações com ele, mesmo não sendo absolutamente
necessário, era moralmente requerida. Santo Tomás considera, pois, a revelação como a
ação do Deus da salvação que, livre e graciosamente, fornece aos homens todas as
verdades necessárias e úteis para a consecução do fim sobrenatural.
b) A revelação como acontecimento da história: A revelação, acontecimento no tempo,
apresenta-se a Santo Tomás como uma operação hierárquica, sucessiva, progressiva,
polimorfa. A revelação hierárquica é começada com os anjos e depois os homens:
primeiro os maiores entre eles, isto é, profetas e apóstolos. Atinge depois a multidão dos
que acolhem a fé. A revelação é marcada pela sucessão: não se realiza de repente, mas
por etapas, que são realizações parciais do desígnio divino. A primeira etapa é
patriarcal, destinada a apenas a algumas umas famílias. A revelação polimorfa (de
várias formas) para se tornar conhecido, Deus não desdenhou nenhum meio de
comunicação.
c) Revelação profética como carisma de conhecimento: Para Santo Tomás profecia é
”Conhecimento, sobrenatural dado ao homem, de verdades que atualmente superam o
alcance de seu espírito, que lhe são manifestadas por Deus para o bem da comunidade”.
A profecia em primeiro lugar e principalmente é um conhecimento e secundariamente
locução.
d) Revelação, Escritura, Igreja: O conjunto dos conhecimentos que Deus revelou aos
profetas e aos apóstolos chama-se “Doutrina Sagrada”. O objeto da nossa fé é a verdade
primeira posta na Escritura, compreendida, porém, segunda a sã doutrina da Igreja.
Deus propôs sua doutrina diretamente aos profetas e apóstolos; a nós propõe pela Igreja.
e) Da revelação a fé: Os homens, ao contrário das grandes testemunhas de Deus, apóstolos
e profetas, chegam a revelação apenas mediante: de um intermediário humano é que
recebem a verdade da fé.
f) Revelação como grau no conhecimento de Deus: Revelação e fé não existem por si
mesmas, mas para a visão, pois o fim do homem é chegar, um dia, a contemplar face a
face o divino. Nesse sentido a revelação é um conhecimento imperfeito, um momento
de nossa iniciação a visão. “De três modos o homem pode conhecer as coisas divinas;
pelo primeiro o homem, graças a luz natural da razão, eleva-se ao conhecimento de
Deus pela razão; pelo segundo, a verdade divina que ultrapassa os limites de nossa
inteligência, desce a nós pela revelação não como evidentemente demonstrada, mas
Disciplina: Teologia Fundamental
18
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
como palavra que se deve crer; pelo terceiro, a alma será elevada para ver perfeitamente
o que lhe fora revelado”.
g) Conclusões: A base da teologia e da fé católica, Santo Tomás coloca o fato primordial
da revelação: operação salvífica pela qual Deus, não querendo deixar o homem entregue
apenas aos recursos da razão, fornece-lhes todas as verdades necessárias e úteis para a
salvação.24 Esta operação se realiza por etapas sucessivas, progredindo tanto no âmbito
como na compreensão das verdades reveladas. Dos patriarcas e profetas até os
apóstolos, formam o depósito sagrado da verdade revelada. A encarnação de Cristo
marca a plenitude e a consumação da revelação. Santo Tomás interessa-se
principalmente pela revelação imediata, e mais especificamente pela profética. Esta é
para ele, essencialmente um ato cognoscitivo: graças a uma iluminação especial, o
profeta julga com certeza e sem erro, conforme a intenção divina, os objetos presentes a
sua consciência, chegando assim a posse da verdade que Deus lhe quer comunicar. O
conjunto de verdades que Deus nos dá a conhecer denomina Santo Tomás doutrina que
procede da revelação, doutrina sagrada, verdade de fé. Duas coisas são exigidas na fé:
“um objeto para ser crido, verdades propostas e o assentimento a essas verdades”.
Duns Scot: Para ele a revelação é a tradição ativa que faz ao homem da doutrina
necessária ou útil para a salvação. Doutrina comunicada aos profetas mediante imagens ou por
uma ação direta de Deus na inteligência: palavra interior de Deus, iluminação do profeta.A ação
reveladora do Xto e dos apóstolos é brevemente delineada: o Xto promulga e transmite, os
apóstolos promulgam e transmitem à Igreja. Características comum do conhecimento dos
profetas e dos apóstolos: a certeza inabalável do seu conhecimento. A doutrina da salvação está
contida na Escritura e, complementariamente, na Tradição ou costume universal da Igreja.
João de Lugo
a) A revelação como palavra: Tanto a Revelação mediata como a imediata são consignadas
pela Escritura como PALAVRA DE DEUS. Afirma que para se verificar o conceito de
palavra não basta que apresentemos a alguém um objeto; é preciso que também lhe
manifestemos o que pensamos desse objeto. A palavra de per si e imediatamente
ordena-se a manifestar-se a alguém o pensamento de quem fala. Na Revelação imediata
(os profetas, por exemplo), Deus pode servir-se de sinais sensíveis, como a palavra
humana, e assim manifestar o seu pensamento; ou então, agindo internamente, pode
gerar imediatamente o conhecimento do objeto que deseja comunicar, manifestando-o
como sendo verdadeiramente o objeto de seu pensamento. O mesmo se diz da palavra
mediata pela qual Deus atualmente nos propõe o mistério da fé.
b) Revelação e hábito ou auxílio da fé: Deus não nos fala enquanto nos dá habitus da fé.
Deus, dando-nos a inteligência e o habitus da fé, dá-nos a faculdade que nos torna
capazes de ouvir sua voz e de acreditar; não se diz porém, que ele fala, pois a palavra é
produção de verbos que exprimem o pensamento de quem fala (a inteligência, ou o
habitul da fé, não é verbo de Deus), por isso, a sua produção não é de forma alguma
palavra ou Revelação de Deus, portanto, o instinto interior não é nem total nem
parcialmente, palavra de Deus). Distingue claramente entre moção interior, que dispõe e
inclina ao assenso da fé e ao ensinamento
João Möhler: Mais que todos, Möhler foi, na Alemanha, o chefe da renovação teológica.
Sua obra “A Unidade da Igreja” é um protesto da vida contra a anemia do reino das luzes. Nessa
obra apresenta a Igreja como uma realidade viva, ativa, criadora, que o Espírito do Cristo
vivifica sempre. “Para quem penetra o conjunto de nossa fé, a vida do Espírito em nós tem
prioridade sobre o ensinamento ou a fé formulada”. O que Cristo fizera, fizeram-no os apóstolos
por sua vez, formando eles também outros discípulos. Assim, através dos séculos, a Igreja
invisível veio sempre da Igreja visível: “Essa ordem exigia a idéia de uma Revelação exterior e
histórica, que, por sua própria natureza, exigia um magistério permanente, determinado,
Disciplina: Teologia Fundamental
20
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
exterior, ao se deve referir quem quer que deseje conhecer essa Revelação”... Em Lutero, a
autoridade exterior da Igreja transformou-se em autoridade interior e a palavra exterior
reconhecida como divina tornou-se voz interior do Cristo e de seu Espírito. A posição
protestante... Esquece “que a Revelação interior é condicionada pela palavra exterior e que a
inteligência da palavra interior é condicionada pela palavra exterior que se dirige ao homem”.
Se Möhler salienta ao máximo o caráter de objetividade e de exterioridade da Revelação, foi por
ter escrito contra os protestantes que tudo sacrificam à subjetividade e à interioridade.
J.B. Franzelin: Como Möhler e Denzinger, também Franzelin orienta seu ensino para as
pesquisas positivas. Quando Deus fala aos homens, diz, seja imediatamente, como aos profetas
e aos apóstolos, seja mediante seus legados, faz que sua palavra seja reconhecida por sinais que
a garantem como sendo realmente sua. Esses sinais são os milagres e os carismas sobrenaturais:
“o falar divino consiste em palavras como sendo locução divina”. “Pois Deus não fala somente
pelas palavras, mas ao mesmo tempo pelas palavras e pelos fatos”. Esses fatos, realizados pelo
Cristo e pelos apóstolos, pertencem agora à Igreja e constituem sua herança. Em resumo, eis
como Franzelin entende a Revelação: Toda verdade salvífica foi revelada aos apóstolos por
Cristo, que ensinava visivelmente e pelo dom de seu Espírito. Essa verdade é o Evangelho que
os apóstolos devem pregar a toda criatura e transmitir à Igreja. Esta, por sua vez, conserva e
prega a verdade total, definitiva, que recebeu dos apóstolos.
redentora. Essa, por sua vez, realiza-se em duas etapas: a Revelação preparatória do Antigo
Testamento e a consumação em o Novo Testamento. O progresso da Revelação é extensivo: a
Revelação patriarcal dirige-se a uma família; a mosaica, a um povo; a cristã, à humanidade toda.
É também quantitativo e qualitativo: o campo da Revelação alarga-se sem cessar e a luz
difundida é cada vez mais abundante. Em Jesus Cristo temos a plenitude da Luz e da Verdade.
ação divina, livre e essencialmente sobrenatural, pela qual deus, querendo conduzir o gênero
humano a seu fim sobrenatural que consiste na visão da essência divina, falando-nos pelos
profetas e nestes últimos tempos pelo cristo, manifestou-nos um tanto obscuramente mistérios
sobrenaturais e também verdades da religião natural, que depois possam ser infalivelmente
proposto pela a Igreja, sem mudança de sentido, até o fim do mundo”. Ao dar a explicação
teológica ele define formalmente à Revelação como “palavra de Deus enquanto ensinamento”.
Afirmação que fundamenta está em Hebr 1,1; Is 50,4; os 2,4... e nas passagens da escritura
onde se diz que as multidões davam ao Cristo o titulo de mestre, (Mt 8.28; Jo 8,13). Por ele
coloca que a Revelação é descrita principalmente como ensinamento, analisada em termos de
relacionamento de mestre e discípulo... No Novo Testamento a Revelação ganha um outro
sentido; “a palavra é o ato pelo qual alguém diretamente manifesta a outro seu pensamento”.
Noção de palavra que inclui três elementos:
Teologia protestante
Teologia querigmática
A teologia querigmática, mesmo sem apresentar uma nova concepção da Revelação, pós
em maior evidência certos aspectos que contribuíram pra uma Revelação da teologia da
Revelação.
Desenvolvimento do dogma
Teologia da revelação e da fé
Essa teologia insiste primeiramente sobre o caráter especifico da Revelação cristã. Não
se trata de uma Revelação qualquer, gnose grega ou conhecimento hermético das religiões de
mistérios. Trata se de uma Revelação de um tipo absolutamente único, que foge a toda a
previsão ou dedução humana. Os teólogos da Revelação sublinham unicamente o caráter
histórico da Revelação. Deus vem, intervém na história humana por uma série de
acontecimentos que culminam no acontecimento central da encarnação. Enfim, a história não é
o lugar da Revelação, não somente a Revelação faz história e tem sua história, mas a própria
história, divinamente interpretada, é o médium da Revelação. Outra característica posta em
evidência pela teologia da Revelação, e esta mais bem estudada, é o caráter interpessoal da
Revelação. Esta iniciativa pessoal do Deus vivo e a manifestação de seu mistério pessoal. Deus
estabelece com o homem relações de pessoa a pessoa: o Eu divino interpela o eu do homem. A
Revelação é personalizada e personificante. Antes de revelar qualquer coisa, Deus revela-se a si
mesmo em seu mistério: Deus tem um nome, fala, podemos invocá-lo e ele também sua vida
intima; faz aliança com o homem, oferece-lhe sua amizade, seu amor, sua vida.
Entre os problemas em jogo, foi principalmente das relações entre a sagrada Escritura e
Tradição que prendeu a atenção. A partir do dia 20 de novembro de 62, o problema do conteúdo
material da Escritura e da Tradição continua sendo um problema aberto, que os teólogos e
exegetas poderão continuar aprofundando. O concílio, escolhendo outro caminho, preocupo-se
mais com marcar bem claramente a unidade orgânica entre a Escritura e a Tradição, e o estreito
relacionamento entre a Escritura, Tradição e Igreja. Durante a segunda sessão, reinou o mais
completo silêncio sobre o esquema da revelação. No seu conjunto, o texto agradou aos padres,
porque equilibrado, de sabor bíblico, cristocêntrico, com uma longa exposição sobre a tradição
e, finalmente, porque deixava aos teólogos liberdade quanto às questões controvertidas. A
constituição dogmática “Dei Verbum”, votada capítulo por capítulo no dia 29 de outubro de 65,
e aprovada por quase unanimidade, foi oficialmente promulgada por Paulo VI a 18 de novembro
de 65.
DEI VERBUM:
Disciplina: Teologia Fundamental
25
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
PROÉMIO
Intenção do Concílio
3. Deus, criando e conservando todas as coisas pelo Verbo (cfr. Jo. 1,3), oferece aos
homens um testemunho perene de Si mesmo na criação (cfr. Rom. 1, 1-20) e, além disso,
decidindo abrir o caminho da salvação sobrenatural, manifestou-se a Si mesmo, desde o
princípio, aos nossos primeiros pais. Depois da sua queda, com a promessa de redenção, deu-
lhes a esperança da salvação (cfr. Gén. 3,15), e cuidou contìnuamente do género humano, para
dar a vida eterna a todos aqueles que, perseverando na prática das boas obras, procuram a
salvação (cfr. Rom. 2, 6-7). No devido tempo chamou Abraão, para fazer dele pai dum grande
povo (cfr. Gén. 12,2), povo que, depois dos patriarcas, ele instruiu, por meio de Moisés e dos
profetas, para que o reconhecessem como único Deus vivo e verdadeiro, pai providente e juiz
justo, e para que esperassem o Salvador prometido; assim preparou Deus através dos tempos o
caminho ao Evangelho.
4. Depois de ter falado muitas vezes e de muitos modos pelos profetas, falou-nos Deus
nestes nossos dias, que são os últimos, através de Seu Filho (Heb. 1, 1-2). Com efeito, enviou o
Seu Filho, isto é, o Verbo eterno, que ilumina todos os homens, para habitar entre os homens e
manifestar-lhes a vida íntima de Deus (cfr. Jo. 1, 1-18). Jesus Cristo, Verbo feito carne, enviado
«como homem para os homens» (3), «fala, portanto, as palavras de Deus» (Jo. 3,34) e consuma
a obra de salvação que o Pai lhe mandou realizar (cfr. Jo. 5,36; 17,4). Por isso, Ele, vê-lo a Ele é
ver o Pai (cfr. Jo. 14,9), com toda a sua presença e manifestação da sua pessoa, com palavras e
obras, sinais e milagres, e sobretudo com a sua morte e gloriosa ressurreição, enfim, com o
envio do Espírito de verdade, completa totalmente e confirma com o testemunho divino a
revelação, a saber, que Deus está connosco para nos libertar das trevas do pecado e da morte e
para nos ressuscitar para a vida eterna.
Portanto, a economia cristã, como nova e definitiva aliança, jamais passará, e não se há-
de esperar nenhuma outra revelação pública antes da gloriosa manifestação de nosso Senhor
Jesus Cristo (cfr. 1 Tim. 6,14; Tit. 2,13).
5. A Deus que revela é devida a «obediência da fé» (Rom. 16,26; cfr. Rom. 1,5; 2 Cor.
10, 5-6); pela fé, o homem entrega-se total e livremente a Deus oferecendo «a Deus revelador o
obséquio pleno da inteligência e da vontade» (4) e prestando voluntário assentimento à Sua
revelação. Para prestar esta adesão da fé, são necessários a prévia e concomitante ajuda da graça
divina e os interiores auxílios do Espírito Santo, o qual move e converte a Deus o coração, abre
os olhos do entendimento, e dá «a todos a suavidade em aceitar e crer a verdade» (5). Para que a
compreensão da revelação seja sempre mais profunda, o mesmo Espírito Santo aperfeiçoa sem
cessar a fé mediante os seus dons
Necessidade da revelação
O sagrado Concílio professa que Deus, princípio e fim de todas as coisas, se pode
conhecer com certeza pela luz natural da razão a partir das criaturas» (cfr. Rom. 1,20); mas
ensina também que deve atribuir-se à Sua revelação «poderem todos os homens conhecer com
facilidade, firme certeza e sem mistura de erro aquilo que nas coisas divinas não é inacessível à
razão humana, mesmo na presente condição do género humano» (7).
Porém, para que o Evangelho fosse perenemente conservado integro e vivo na Igreja, os
Apóstolos deixaram os Bispos como seus sucessores, «entregando lhes o seu próprio ofício de
Disciplina: Teologia Fundamental
27
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
magistério» (3). Portanto, esta sagrada Tradição e a Sagrada Escritura dos dois Testamentos são
como um espelho no qual a Igreja peregrina na terra contempla a Deus, de quem tudo recebe,
até ser conduzida a vê-lo face a face tal qual Ele é (cfr. 1 Jo. 3,2).
A sagrada Tradição
Esta tradição apostólica progride na Igreja sob a assistência do Espírito Santo (5). Com
efeito, progride a percepção tanto das coisas como das palavras transmitidas, quer mercê da
contemplação e estudo dos crentes, que as meditam no seu coração (cfr. Lc. 2, 19. 51), quer
mercê da íntima inteligência que experimentam das coisas espirituais, quer mercê da pregação
daqueles que, com a sucessão do episcopado, receberam o carisma da verdade. Isto é, a Igreja,
no decurso dos séculos, tende contìnuamente para a plenitude da verdade divina, até que nela se
realizem as palavras de Deus.
serviço, ensinando apenas o que foi transmitido, enquanto, por mandato divino e com a
assistência do Espírito Santo, a ouve piamente, a guarda religiosamente e a expõe fielmente,
haurindo deste depósito único da fé tudo quanto propõe à fé como divinamente revelado.
11. As coisas reveladas por Deus, contidas e manifestadas na Sagrada Escritura, foram
escritas por inspiração do Espírito Santo. Com efeito, a santa mãe Igreja, segundo a fé
apostólica, considera como santos e canónicos os livros inteiros do Antigo e do Novo
Testamento com todas as suas partes, porque, escritos por inspiração do Espírito Santo (cfr. Jo.
20,31; 2 Tim. 3,16; 2 Ped. 1, 19-21; 3, 15-16), têm Deus por autor, e como tais foram confiados
à própria Igreja (1). Todavia, para escrever os livros sagrados, Deus escolheu e serviu-se de
homens na posse das suas faculdades e capacidades (2), para que, agindo Ele neles e por eles
(3), pusessem por escrito, como verdadeiros autores, tudo aquilo e só aquilo que Ele queria (4).
E assim, como tudo quanto afirmam os autores inspirados ou hagiógrafos deve ser tido
como afirmado pelo Espírito Santo, por isso mesmo se deve acreditar que os livros da Escritura
ensinam com certeza, fielmente e sem erro a verdade que Deus, para nossa salvação, quis que
fosse consignada nas sagradas Letras (5). Por isso, «toda a Escritura é divinamente inspirada e
útil para ensinar, para corrigir, para instruir na justiça: para que o homem de Deus seja perfeito,
experimentado em todas as obras boas» ( Tim. 3, 7-17 gr.).
12. Como, porém, Deus na Sagrada Escritura falou por meio dos homens e à maneira
humana (6), o intérprete da Sagrada Escritura, para saber o que Ele quis comunicar-nos, deve
investigar com atenção o que os hagiógrafos realmente quiseram significar e que aprouve a
Deus manifestar por meio das suas palavras.
Para descobrir a intenção dos hagiógrafos, devem ser tidos também em conta, entre
outras coisas, os «géneros literários». Com efeito, a verdade é proposta e expressa de modos
diversos, segundo se trata de géneros histéricos, proféticos, poéticos ou outros. Importa, além
disso, que o intérprete busque o sentido que o hagiógrafo em determinadas circunstâncias,
segundo as condições do seu tempo e da sua cultura, pretendeu exprimir e de facto exprimiu
servindo se os géneros literários então usados (7). Com efeito, para entender rectamente o que
autor sagrado quis afirmar, deve atender-se convenientemente, quer aos modos nativos de sentir,
dizer ou narrar em uso nos tempos do hagiógrafo, quer àqueles que costumavam empregar-se
frequentemente nas relações entre os homens de então (8).
Mas, como a Sagrada Escritura deve ser lida e interpretada com o mesmo espírito com
que foi escrita (9), não menos atenção se deve dar, na investigação do recto sentido dos textos
sagrados, ao contexto e à unidade de toda a Escritura, tendo em conta a Tradição viva de toda a
Igreja e a analogia da fé. Cabe aos exegetas trabalhar, de harmonia com estas regras, por
entender e expor mais profundamente o sentido da Escritura, para que, mercê deste estudo de
algum modo preparatório, amadureça o juízo da Igreja. Com efeito, tudo quanto diz respeito à
interpretação da Escritura, está sujeito ao juízo último da Igreja, que tem o divino mandato e o
ministério de guardar e interpretar a palavra de Deus (10).
Disciplina: Teologia Fundamental
29
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
Condescendência de Deus
16. Foi por isso que Deus, inspirador e autor dos livros dos dois Testamentos, dispôs tão
sàbiamente as coisas, que o Novo Testamento está latente no Antigo, e o Antigo está patente no
Novo (2). Pois, apesar de Cristo ter alicerçado à nova Aliança no seu sangue (cfr. Lc. 22,20; 1
Cor. 11,25), os livros do Antigo Testamento, ao serem integralmente assumidos na pregação
evangélica (3) adquirem e manifestam a sua plena significação no Novo Testamento (cfr. Mt.
5,17; Lc. 24,27; Rom. 16, 25-26; 2 Cor. 3, 1416), que por sua vez iluminam e explicam.
17. A palavra de Deus, que é virtude de Deus para a salvação de todos os crentes (cfr.
Rom. 1,16), apresenta-se e manifesta o seu poder dum modo eminente nos escritos do Novo
Testamento. Com efeito, quando chegou a plenitude dos tempos (cfr. Gál. 4,4), o Verbo fez-se
carne e habitou entre nós cheio de graça e verdade (cfr. Jo. 1,14). Cristo estabeleceu o reino de
Deus na terra, manifestou com obras e palavras o Pai e a Si mesmo, e levou a cabo a Sua obra
com a Sua morte, ressurreição, e gloriosa ascensão, e com o envio do Espírito Santo. Sendo
levantado da terra, atrai todos a si (cfr. Jo. 12,32 gr.), Ele que é o único que tem palavras de vida
eterna (cfr. Jo. 6,68). Este mistério, porém, não foi descoberto a outras gerações como foi agora
revelado aos seus santos Apóstolos e aos profetas no Espírito Santo (cfr. Ef. 3, 46 gr.) para que
pregassem o Evangelho, e despertassem a fé em Jesus Cristo e Senhor, e congregassem a Igreja.
Os escritos do Novo Testamento são um testemunho perene e divino de todas estas coisas.
18. Ninguém ignora que entre todas as Escrituras, mesmo do Novo Testamento, os
Evangelhos têm o primeiro lugar, enquanto são o principal testemunho da vida e doutrina do
Verbo encarnado, nosso salvador.
A Igreja defendeu e defende sempre e em toda a parte a origem apostólica dos quatro
Evangelhos. Com efeito, aquelas coisas que os Apóstolos, por ordem de Cristo, pregaram,
foram depois, por inspiração do Espírito Santo, transmitidas por escrito por eles mesmos e por
varões apostólicos como fundamento da fé, ou seja, o Evangelho quadriforme, segundo Mateus,
Marcos, Lucas e João (1).
19. A santa mãe Igreja defendeu e defende firme e constantemente que estes quatro
Evangelhos, cuja historicidade afirma sem hesitação, transmitem fielmente as coisas que Jesus,
Filho de Deus. durante a sua vida terrena, realmente operou e ensinou para salvação eterna dos
homens, até ao dia em que subiu ao céu (cfr. Act. 1. 1-2). Na verdade, após a ascensão do
Senhor, os Apóstolos transmitiram aos seus ouvintes, com aquela compreensão mais plena de
que eles, instruídos pelos acontecimentos gloriosos de Cristo e iluminados pelo Espírito de
verdade (2) gozavam (3), as coisas que Ele tinha dito e feito. Os autores sagrados, porém,
escreveram os quatro Evangelhos, escolhendo algumas coisas entre as muitas transmitidas por
palavra ou por escrito, sintetizando umas, desenvolvendo outras, segundo o estado das igrejas,
conservando, finalmente, o carácter de pregação, mas sempre de maneira a comunicar-nos
coisas autênticas e verdadeiras acerca de Jesus (4). Com efeito, quer relatassem aquilo de que se
lembravam e recordavam, quer se baseassem no testemunho daqueles «que desde o princípio
foram testemunhas oculares e ministros da palavra», fizeram-no sempre com intenção de que
conheçamos a «verdade» das coisas a respeito das quais fomos instruídos (cfr. Lc. 1, 2-4).
20. O cânon do Novo Testamento contém igualmente além dos quatro Evangelhos, as
Epístolas de S. Paulo e outros escritos apostólicos redigidos por inspiração do Espírito Santo,
com os quais, segundo o plano da sabedoria divina, é confirmado o que diz respeito a Cristo
Senhor, é explicada mais e mais a sua genuína doutrina, é pregada a virtude salvadora da obra
divina de Cristo, são narrados os começos da Igreja e a sua admirável difusão, e é anunciada a
sua consumação gloriosa.
Com efeito, o Senhor Jesus assistiu os seus Apóstolos como tinha prometido (cfr. Mt.
28,20) e enviou-lhes o Espírito consolador que os devia introduzir na plenitude da verdade (cfr.
Jo. 16,13).
21. A Igreja venerou sempre as divinas Escrituras como venera o próprio Corpo do
Senhor, não deixando jamais, sobretudo na sagrada Liturgia, de tomar e distribuir aos fiéis o pão
da vida, quer da mesa da palavra de Deus quer da do Corpo de Cristo. Sempre as considerou, e
continua a considerar, juntamente com a sagrada Tradição, como regra suprema da sua fé; elas,
com efeito, inspiradas como são por Deus, e exaradas por escrito duma vez para sempre,
continuam a dar-nos imutàvelmente a palavra do próprio Deus, e fazem ouvir a voz do Espírito
Santo através das palavras dos profetas e dos Apóstolos. É preciso, pois, que toda a pregação
eclesiástica, assim como a própria religião cristã, seja alimentada e regida pela Sagrada
Escritura. Com efeito, nos livros sagrados, o Pai que está nos céus vem amorosamente ao
encontro de Seus filhos, a conversar com eles; e é tão grande a força e a virtude da palavra de
Deus que se torna o apoio vigoroso da Igreja, solidez da fé para os filhos da Igreja, alimento da
alma, fonte pura e perene de vida espiritual. Por isso se devem aplicar por excelência à Sagrada
Escritura as palavras: «A palavra de Deus é viva e eficaz» (Hebr. 4,12), «capaz de edificar e dar
a herança a todos os santificados», (Act. 20,32; cfr. 1 Tess. 2,13).
22. É preciso que os fiéis tenham acesso patente à Sagrada Escritura. Por esta razão, a
Igreja logo desde os seus começos fez sua aquela tradução grega antiquíssima do Antigo
Testamento chamada dos Setenta; e sempre tem em grande apreço as outras traduções, quer
orientais quer latinas, sobretudo a chamada Vulgata. Mas, visto que a palavra de Deus deve
estar sempre acessível a todos, a Igreja procura com solicitude maternal que se façam traduções
aptas e fiéis nas várias línguas, sobretudo a partir dos textos originais dos livros sagrados. Se
porém, segundo a oportunidade e com a aprovação da autoridade da Igreja, essas traduções se
fizerem em colaboração com os irmãos separados, poderão ser usadas por todos os cristãos.
Investigação Bíblica
23. A esposa do Verbo encarnado, isto é, a Igreja, ensinada pelo Espírito Santo, esforça-
se por conseguir uma inteligência cada vez mais profunda da Sagrada Escritura, para poder
alimentar contìnuamente os seus filhos com os divinos ensinamentos; por isso, vai fomentando
também convenientemente o estudo dos santos Padres do Oriente e do Ocidente, bem como das
sagradas liturgias. É preciso, porém, que os exegetas católicos e os demais estudiosos da
sagrada teologia, trabalhem em íntima colaboração de esforços, para que, sob a vigilância do
sagrado magistério, lançando mão de meios aptos, estudem e expliquem as divinas Letras de
modo que o maior número possível de ministros da palavra de Deus possa oferecer com fruto ao
Povo de Deus o alimento das Escrituras, que ilumine o espírito, robusteça as vontades, e inflame
os corações dos homens no amor de Deus (1). O sagrado Concilio encoraja os filhos da Igreja
que cultivam as ciências bíblicas para que continuem a realizar com todo o empenho, segundo o
sentir da Igreja, a empresa felizmente começada, renovando constantemente as suas forças (2).
24. A sagrada Teologia apoia-se, como em seu fundamento perene, na palavra de Deus
escrita e na sagrada Tradição, e nela se consolida firmemente e sem cessar se rejuvenesce,
investigando, à luz da fé, toda a verdade contida no mistério de Cristo. As Sagradas Escrituras
contêm a palavra de Deus, e, pelo facto de serem inspiradas, são verdadeiramente a palavra de
Deus; e por isso, o estudo destes sagrados livros deve ser como que a alma da sagrada teologia
(3). Também o ministério da palavra, isto é, a pregação pastoral, a catequese, e toda a espécie de
instrução cristã, na qual a homilia litúrgica deve ter um lugar principal, com proveito se
alimenta e santamente se revigora com a palavra da Escritura.
Disciplina: Teologia Fundamental
32
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
25. É necessário, por isso, que todos os clérigos e sobretudo os sacerdotes de Cristo e
outros que, como os diáconos e os catequistas, se consagram legìtimamente ao ministério da
palavra, mantenham um contacto íntimo com as Escrituras, mediante a leitura assídua e o estudo
aturado, a fim de que nenhum deles se torne «pregador vão e superficial da palavra de Deus. por
não a ouvir de dentro» (4), tendo, como têm, a obrigação de comunicar aos fiéis que lhes estão
confiados as grandíssimas riquezas da palavra divina, sobretudo na sagrada Liturgia. Do mesmo
modo, o sagrado Concílio exorta com ardor e insistência todos os fiéis, mormente os religiosos,
a que aprendam «a sublime ciência de Jesus Cristo» (Fil. 3,8) com a leitura frequente das
divinas Escrituras, porque «a ignorância das Escrituras é ignorância de Cristo» (5). Debrucem-
se, pois, gostosamente sobre o texto sagrado, quer através da sagrada Liturgia, rica de palavras
divinas, quer pela leitura espiritual, quer por outros meios que se vão espalhando tão
louvàvelmente por toda a parte, com a aprovação e estímulo dos pastores da Igreja. Lembrem-
se, porém, que a leitura da Sagrada Escritura deve ser acompanhada de oração para que seja
possível o diálogo entre Deus e o homem; porque «a Ele falamos, quando rezamos, a Ele
ouvimos, quando lemos os divinos oráculos» (6).
26. Deste modo, pois, com a leitura e estudo dos livros sagrados, «a palavra de Deus se
difunda e resplandeça (2 Tess. 3,1), e o tesouro da revelação confiado à Igreja encha cada vez
mais os corações dos homens. Assim como a vida da Igreja cresce com a assídua frequência do
mistério eucarístico, assim também é lícito esperar um novo impulso de vida espiritual, se
fizermos crescer a veneração pela palavra de Deus, que «permanece para sempre» (Is. 40,8; cfr.
l Pedr. 1, 23-25).
Notas
1. Cfr. S. Agostinho, De catechizandis rudibus, c. IV, 8: PL 40, 316.
2. Cfr. Mt. 11,27; Jo. 1,14 e 17; 14,6; 17, 1-3; 2 Cor. 3,16 e 4,6; Ef. 1, 3-14.
3. Epist. ad Diognetum, c. VII, 4: Funk, Patres Apostolici, I, p. 403.
4. Conc. Vat. I, Const. dogmatica De fide catholica, Dei Filius, cap. 3: Denz. 1789 (3008).
5. Conc. Araus. II, can. 7: Denz, 180 (377); Conc. Vat. I, 1. c.: Denz. 1791 (3010).
6. Conc. Vat. I, Const. dogmatica De fide catholica, Dei Filius, cap. 2 Denz. 1786 (3005).
7. Ibid.: Denz. 1785 e 1786 (3004 e 3005).
Capítulo II
1. Cfr. Mt. 28, 19-20 e Mc. 16,15; Concilio Tridentino decr. De canonicis Scripturis: Denz. 783
(1501).
2. Cfr. Concílio Tridentino, I. c.; Concílio Vat I, sess. III, Const. dogmatica De fide catholica,
Dei Filius, cap. 2. Denz. 1787 (3006).
3. S. Ireneu, Adv. Haer. III, 3, 1: PG 7, 848: Harvey, 2, p. 9.
Disciplina: Teologia Fundamental
33
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
4. Cfr. II Concílio Niceno, Denz. 303 (602); IV Concilio Constantinopolitano, sess. X, can. 1:
Denz. 336 (650-652).
5. Cfr. Concílio Vat. I, Const. dogm. De fide catholica, Dei Filius, cap. 4: Denz. 1800 (3020).
6. Cfr. Concílio Tridentino, Decr. De canonicis scripturis: Denz. 783 (1501).
7. Cfr. Pio XII, Const. apost. Munificentissimus Deus, 1 nov. 1950: AAS 42 (1950) 756;
conforme as palavras de S. Cipriano, Epist. 66,8: CSEL, 3,2, 733: «A Igreja e o povo unido ao
sacerdote e o rebanho unido ao seu pastor».
8. Cfr. Concilio Vat. I, Const. dogmatica De fide catholica, Dei Filius, cap. 3: Denz. 1792
(3011).
9. Cfr. Pio XII, Enciclica Humani generis, 12 ago. 1950: AAS 42 (1950) 568-569: Denz. 2314
(3886).
Capítulo III
1. Cfr. Conc. Vat. I, Const. dogm. de fide cath., Dei Filius, cap. 2: Denz. 1787 (3006). Denz. da
Comissão Biblica, 18 jun. 1915: Denz. 2180 (3629) ; EB 420. Santo Officio, Epist.; 22 dez.
1923: EB 499.
2. Cfr. Pio XII, Encíclica Divino afflante Spiritu, 30 set. 1944: AAS 35 (1943) 314; EB 556.
3. Em o por o homem: cfr. Hebr. 1,1 e 4,7 (Em); 2 Sam. 23,2; Mt. 1,22 e passim (por); Conc.
Vat. I: schema de doctr. cath., nota 9: Coll. Lac. VII, 522.
4. Leão XIII, Encíclica Providentissimus Deus, 18 nov. 1893: Denz. 1952 (3293) EB 125.
5. Cfr. S. Agostinho, De Gen. ad Litt. 2, 9, 20: PL 34, 270-271; CSEL 28, 1, 46-47 e Epist. 82,
3: PL 33, 277: CSEL 34, 2, p. 354.—S. Tomás, De Ver. q. 12, a. 2 c. —Conc. de Trento, decr.
De canonicis Scripturis: Denz. 783 (1501) —Ledo XIII, Enc. Providentissimus: EB 121, 124,
126-127—Pio XII, Enc. Divino afflante Spiritu: EB 539.
6. S. Agostinho, De civ. Dei, XVII, 6, 2: PL 41, 537: CSEL XL 2, 228.
7. S. Agostinho, De doct. christ., III, 18, 26: PL 34, 75-76; CSEL 80, 95.
8. Pio XII, 1. c.: Denz. 2294 (3829-3830); EB 557-562.
9. Cfr. Bento XV, Enc. Spiritus Paraclitus, 15 set. 1920: EB 469.- S. Jerónimo, In Gal., 5, 19-
21: PL 26, 417 A.
10. Cfr. Conc. Vat. I, Const. dogm. De fide catholica, Dei Filius, cap. 2: Denz. 1788 (3007).
11. S. João Crisóstomo, In Gen. 3,8 (hom. 17,1): PG 53, 134. «Acomodação», em grego
synkatábasis.
Capítulo IV
1. Pio XI, Enc. Mit brennender Sorge, 14 mar. 1937: AAS 29 (1937) 151.
2. S. Agostinho, Quaest. in Hept. 2, 73: PL 34, 623.
3. S. Ireneu, Adv.: Haer. III, 21, 3: PG 7, 950: ( = 25, 1: Harvey 2, p. 115). S. Cirilo de
Jerusalém, Caech. 4, 35: PG 33, 497, Teodoro de Mopsuesta, In Soph. 1, 4-6: PG 66, 452 D-453
A.
Capítulo V
1. Cfr. S, Ireneu, Adv. Haer. III, 11, 8: PG. 7, 885; ed. Sagnard, p. 194.
2. Cfr. Jo. 14,26; 16,13,
3. Cfr. Jo. 2,22; 12,16; de acordo com 14,26; 16, 12-13; 7,39.
4. Cfr. Instrução Sancta Mater Ecclesia, da Pontifícia Comissão Bíblica: AAS 56 (1964) 715.
Capítulo VI
1. Cfr. Pio XII, Enc. Divino afflante, 30. set. 1943: EB 551, 553, 567. — Pontifícia Comissão
Bíblica, Instructio de S. Scriptura in Clericorum seminariis et Religiosorum Collegiis recte
docenda, 13 maio 1950: AAS 42 (1950) 495-505.
2. Cfr. Pio XII, 1. c.: EB 569.
3. Cfr. Leão XIII, Enc. Providentissimus Deus: EB 114; Bento XV, Enc., Spiritus Paraclitus,
15. set. 1920: EB 483.
4. S. Agostinho, Serm. 179, 1: PL 38, 966.
5. S. Jerónimo, Comm. in Is. Prol.: PL 24, 17. — Cfr. Bento XV, Enc. Spiritus Paraclitus: EB
475-480; Pio XII, Enc. Divino afflante: EB 544.
6. S. Ambrósio, De officiis ministrorum I, 20, 88: PL 16, 50.
7. S. Ireneu, Adv. Haer. IV, 32, 1: PG 7, 1071; ( = 49, 2), Harvey, 2, p. 255.
Disciplina: Teologia Fundamental
34
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
COMENTÁRIO AO TEXTO
CONCLUSÕES:
1) Autor a finalidade da revelação: A revelação é uma ação de toda a Trindade: o Pai, que
tem iniciativa; o Verbo que, por sua encarnação, é o mediador; o Espírito que torna a
palavra de Cristo assimilável para a alma, que move o coração do homem e volta-o para
Deus. A revelação é, pois, iniciativa gratuita da benevolência divina para com o
homem, puro dom do seu amor, do mesmo modo toda economia sobrenatural,
encarnação, redenção, eleição.
2) Natureza da revelação: Essa comunicação entre o Deus transcendente e sua criatura,
comunicação que chamamos revelação, a Igreja descreve-a, com os termos da própria
Escritura, como palavra de alguém a alguém: Deus falou a humanidade.
3) História da revelação: A atividade reveladora de Deus, iniciada na aurora da
humanidade, constitui uma longa série de intervenções das quais Cristo é o tema e o
ponto dominante. O Cristo é ao mesmo tempo o mediador e a plenitude da revelação.
Nele conhecemos a verdade de Deus, verdade que nos conduz a vida.
4) Objeto da revelação: O objeto material da revelação pode ser considerado de duas
maneiras. Em se mesma: Deus e o “mistério” de sua vontade, tal como nos foi
manifestado no Cristo e pelo Cristo; ou então, comparativamente com a capacidade
natural da inteligência criada.
Disciplina: Teologia Fundamental
35
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
5) A revelação e seus nomes: A revelação em sua forma plena pode ser chamada
equivalentemente: a palavra de Deus, a palavra divina, a palavra revelada, a palavra
pronunciada por Deus, a palavra testada, a revelação...
6) Revelação, Escritura, Tradição: A revelação chega até nós mediante a tradição e a
Escritura, ambas estreitamente unidas e interdependentes. Ambas derivam da mesma
fonte divina, exprimem o mesmo mistério e concorrem para o mesmo fim, a salvação da
humanidade.
7) Revelação, Igreja, Magistério: O depósito da revelação formado pela Tradição e pela
Escritura, foi confiado a Igreja toda, isto é, ao povo cristão unido a seus sacerdotes, para
que ela viva desse depósito e entre todos os fiéis haja união na profissão e exercício da
fé transmitida, pertence, porém, unicamente ao Magistério a função de interpretar o
depósito da fé.
8) Característica da revelação:
a) a revelação é interpessoal: ao contrário da revelação natural pela qual Deus se
manifesta ao Espírito como objeto e se deixa antes deduzir como o princípio e fim
de todas as coisas, a revelação sobrenatural é palavra de Deus, diálogo e mensagem.
b) A revelação é gratuita: livre iniciativa da benevolência de Deus que se inclina para
o homem, iniciativa de seu amor salvífico.
c) A revelação é social: O homem criado por Deus não é apenas indivíduo, mas
sociedade. Assim também a revelação, que dissemos ser interpessoal é também
social, destinada a toda a humanidade.
d) A revelação é histórica: primeiro porque se apresenta como intervenção de Deus na
história, intervenções interligadas e tendo em vista um único desígnio de salvação.
A revelação é acontecimento da história e história.
e) A revelação é encarnada: recebida numa inteligência humana, deve acomodar-se as
condições da concepção humana. O objeto da revelação é o designo de Deus, mas é
humano e limitado o modo de concepção e expressão desse designo. A revelação é
doutrinal e realista: em sua forma plena, a revelação não é pura ação de Deus que se
oferece à amizade humana, puro contato do espírito conosco, pura inteligência
interna sem conteúdo e sem doutrina fixa. É uma mensagem promulgada pelo
Cristo e transmitida pelos Apóstolos.
f) A revelação é salvífica: é feita para a salvação, para a salvação de todos os homens.
É um conhecimento que tem por finalidade a vida. Não é sabedoria humana,
invenção filosófica, nem produto do subconsciente, e sim sabedoria divina,
essencialmente ordenada para a salvação.
9) A fé resposta a revelação: A fé, resposta à revelação, e ao mesmo tempo dom pessoal de
todo homem que livremente se entrega a Deus numa homenagem total de sua
inteligência e de sua vontade, livre assentimento à verdade por Deus revelada. É ainda
ao Espírito que se deve atribuir o aprofundamento da fé.
A teologia procura penetrar o mistério que já possui pela fé, procurando obter uma
inteligência mais viva. Portanto; a função reflexiva da teologia não se justapõe a função
positiva: é antes sua decorrência homogênea. É inteligência, mas inteligência da dado revelado.
Nesta última parte queremos estudar os problemas levantados pelo próprio dado revelado.
ENCARNAÇÃO E REVELAÇÃO
Santo Tomás declara tranqüilamente: da mesma maneira que o homem, para comunicar
seu pensamento, o reveste de certo modo, com letras e sons, “assim também, Deus querendo
manifestar-se aos homens, revestiu de carne, no tempo, seu Verbo concebido desde toda
eternidade”. Em se tratando de uma Revelação de Deus ao homem mediante a encarnação, essa
inteligibilidade aparece evidente quer consideremos o mistério do ponto de vista de Deus, quer
do ponto de vista do homem.
Pela encarnação Deus tomou o suporte material que nos era necessário para que a sua
presença nos fosse acessível. No Cristo Deus tornou-se presente para nós de maneira humana,
ao mesmo tempo que se manifestava como Deus. Em Jesus Cristo e por Jesus Cristo, aquele que
em Deus é a verdade e o Amém do Pai, interpreta para nós o Pai. Assim, o Cristo diz
humanamente o que Deus quer dizer de si mesmo.
É essa plenitude da encarnação que os Santos Padres exprimem em sua forma ao mesmo
tempo concisa e concreta: “o conhecimento de Deus é Jesus Cristo”, diz Santo Inácio de
Antioquia. Ou ainda: “não existe senão um Deus, manifestado por Jesus Cristo seu filho, que é a
Palavra saída do silencio.” Conforme Santo Irineu, a Revelação é a epifania do Pai através do
Verbo encarnado: “Pelo Filho, feito visível e palpável, apareceu o Pai.
Se o Filho se encarna para revelar, devemos afirmar que todos os recursos da natureza
humana serão assumidos por ele para servirem de expansão à sua pessoa de Filho de Deus.
Portanto, as palavras do Cristo, seu ensinamento, e também suas ações, suas atitudes, seu
comportamento, toda a sua existência humana serão assumidos por ele para servirem de
expressão à sua pessoa de Filho de Deus. Portanto, as palavras de Cristo, seu ensinamento, e
também suas ações, atitudes, comportamento, também toda a sua existência humana será
perfeitamente utilizada para revelar-nos as profundezas do mistério divino.
a) Por palavras explicitando os gestos: Os gestos e as ações, por sua vez, encarnam as
palavras e lhes dão um valor de vida. Assim, o acontecimento da encarnação que
podemos chamar de Revelação “em primeiro grau”, deve completar-se pela Revelação-
palavra que é seu comentário necessário. A Revelação como acontecimento supõe a
Revelação como palavra.
b) A palavra de Cristo é, pois o elemento da Revelação. Isso por diversos títulos:
1. Por que Deus, assumindo a humanidade, assume ao mesmo tempo a palavra como
expressão privilegiada entre os homens, ou seja, Ele diz com palavras inteligíveis o que
está realizando.
2. Por que estando a verdade no juízo, e não na simples apresentação dos acontecimentos,
é pela palavra que se exprime o juízo, que une o sujeito ao predicado.
3. Porque o objeto da Revelação não são apenas os fatos históricos, mas também os
mistérios da Trindade, da filiação Divina do Cristo, de nossa participação na vida da
Trindade.
4. Porque as ações, os gestos, os acontecimentos, os mistérios da vida de Cristo não podem
ser cridos com fé divina a não ser que sejam apresentados como objeto do testemunho
divino.
Portanto, a Revelação,mesma feita por Cristo, não é imaginável a não ser que tenha por
base a analogia, como seu processo de negação e superação. Quem não aceita a analogia deve
também recusar a Revelação. Pois a Revelação supõe dois termo – Deus e o homem – que ao
mesmo tempo se aproximam e se distinguem. Se é possível a distinção entre Deus e o homem,
Disciplina: Teologia Fundamental
38
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
estamos reduzidos ao monismo. Se, pelo contrário, for impossível a aproximação entre Deus e o
homem, então estamos reduzidos ao agnosticismo absoluto ou ao transcendentalismo absoluto
que condena Deus ao silêncio. A analogia nega ao mesmo tempo que a palavra divina seja da
mesma natureza da palavra humana e que seja uma palavra sem qualquer relação com a palavra
humana incapaz, portanto, de estabelecer qualquer diálogo verdadeiro.
Porque Deus fez todas as coisas e particularmente a natureza humana, como um reflexo
de sua própria perfeição, todas as coisas tem sua fonte em Deus, e por isso é possível uma
relação entre Deus e o homem. A Revelação pela palavra pressupõe a linguagem da criação
feita por Deus, do mesmo modo que a graça tem seu apoio na natureza intelectual e espiritual do
homem. Assim, não é apenas porque foram escolhidos pelo Cristo que nosso conceitos e nossos
temos humanos são válidos para enunciar o mistério; é antes porque eles tem uma relação com o
Ser Divino que o Cristo os pôde utilizar.
Contudo, paternidade e Revelação são duas analogias reveladas, escolhidas pelo Cristo,
que, têm, portanto o caráter necessário e normativo de analogias impostas pelo próprio Deus.
Essas analogias reveladas despertam a reflexão humana que procura purificá-las e transfigurá-
las para poder entrever alguma coisa das profundezas da vida divina. Trabalho é feito sob a
direção da Igreja que aprova, corrige ou recusa.
Situação do Cristo
O Cristo é Deus que revela, pois o Verbo de Deus, o Filho, Jesus Cristo, é tudo uma só
realidade. O Cristo é causa e autor da Revelação, pois a Revelação origina-se tanto do Cristo
como do Pai e do Espírito.
O Cristo sendo o Deus que revela é ao mesmo tempo o Deus Revelado. Ele é ao mesmo
tempo o Deus que fala do qual se fala, a testemunha e o objeto do testemunho, autor e objeto da
Revelação, aquele que revela o mistério e o próprio mistério em Pessoa. Enquanto Verbo
Encarnado, ele é a expressão que revela; enquanto Verbo de Deus, é em Pessoa a Verdade que
ele prega e ensina.
Sua missão é uma participação na missão que o próprio Cristo recebera do Pai.
Tertuliano fala da doutrina que as Igrejas receberam dos apóstolos; os apóstolos, do Cristo; o
Cristo de Deus.
Cristo veio para fundar uma religião cujo centro e o objetivo é Ele mesmo em pessoa.
Se a Revelação se realizou pelo o encontro com o Deus Vivo, em Jesus Cristo, então somente
poderão ser mediadores autênticos da Revelação os que foram testemunhas de sua vida,
iniciados no mistério de Sua Pessoa. Sem eles não podemos atingir Cristo. Quem se separa deles
perde o contato com o Cristo. Pois, só os apóstolos tiveram do Cristo uma experiência viva e
direta.
A situação da Igreja
MILAGRE E REVELAÇÃO
Polivalência do milagre
Até para os menos atentos os milagres do Cristo mostram-se primeiramente como obras
de misericórdia e bondade. No Cristo “apareceu a benignidade de Deus, nosso Salvador, e seu
amor pelos homens” (Tit 3,4). Os milagres do Cristo são as manifestações da ágape de Deus,
isto é, de sua caridade, ativa e compassiva, que se inclina sobre a miséria humana. No milagre
da multiplicação, foi o Cristo que primeiro “teve dó” da multidão, “porque eram como ovelhas
sem pastor” (Mc. 6,34; 8,1-13).
Outros milagres, porém apresentam-se como resposta do Cristo a uma prece, às vezes
clara, outras muda, implícita num gesto, numa atitude. Em seu aspecto mais evidente os
milagres são uma resposta da ágape de Deus ao apelo da miséria humana. Deus é amor! (I Jo.
4,8). No Cristo esse amor toma forma humana, coração humano, para chegar a miséria do
homem e mostrar-lhe a intensidade do amor divino.
Em toda a tradição bíblica o milagre tem como função garantir uma missão como
divina. Do profeta que se apresenta em nome de Deus, os Judeus exigem provas. Moisés pede e
recebe de javé o sinal que lhe prove que Javé “está com ele” e que “a sua missão vem dele” (Ex
3,12). Através da história do profetismo é o milagre constantemente invocado para fazer a
separação entre os verdadeiros e falsos profetas. Para muitos já a grande multidão de
Disciplina: Teologia Fundamental
41
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
milagres é um sinal. Os milagres do Cristo atestam que ele é o enviado de Deus. Se o cristo
realizou curas e expulsou demônios é porque “Deus estava com ele” (At. 2,22).
Para quem os recebeu, os milagres são sinais, mas do ponto de vista do Cristo, são mais
propriamente obras do Filho. Os milagres são a atividade divina do filho de Deus entre os
homens. O Pai “ama o Filho e todas as coisas entregou em sua mão” (Jo 3,35), então os
milagres são sinais manifestos da aprovação do Pai. Cristo apresenta seus milagres como
testemunho do Pai em seu favor. É preciso acreditar no Cristo, se não por suas palavras, ao
menos por suas obras. (Jo 10,37-38).
De fato, as obras do Cristo são ao mesmo tempo suas obras (Jo 5,36) e obras do Pai (Jo
9,3-4). Portanto, ver a atividade do Cristo, é ver o Pai presente no Filho, exercendo través das
obras do Filho sua atividade criadora e salvífica (Jo 14,9-10). Portanto, os milagres do Filho
devem ser postos em paralelo com as grandes obras de Deus na história de Israel, a criação e os
prodígios. As obras do Cristo são reveladoras da vida trinitária, isso, porém enquanto unidas ao
testemunho de Jesus sobre si mesmo e sobre sua missão.
deus está presente no Cristo, e a Gloria do pai qualifica seu ser, ao mesmo tempo em que o
confirma como filho de Deus. Com referencia a revelação, podemos reduzir a função essencial
dos milagres em três. Dispõe, comprova juridicamente e figura e simboliza. O milagre dispõe
para ouvir a mensagem, pois é um sinal de benevolência, é uma palavra de graça. É sinal de
alguém para alguém, sinal expressivo da benevolência de Deus para com o homem. Blondel diz
que o milagre “manifesta analogicamente a derrogação real que a ordem da graça e da caridade
introduz nas relações entre o homem e Deus”. A primeira função do milagre é significar a
presença e a benévola iniciativa do Deus de amor e dispor a alma para ouvir a Boa-nova. Na
segunda função, comprobatória ou jurídica, o milagre apresenta-se como um sinal de Deus. A
revelação é comunicação da mensagem e convite para crer nesta. O milagre é o selo divino
sobre a mensagem, garantia de sua origem divina. A função comprobatória do milagre é
inseparável de sua função figurativa ou simbólica. A mensagem recebe do milagre um
acompanhamento contínuo no plano sensível. O milagre é a dimensão carnal da mensagem
espiritual; ele visualiza a palavra e lhe dá relevo. O milagre demonstra também que a palavra da
salvação não é sem sentido, mas uma palavra-energia palavra-ato. Milagre e revelação
caminham juntos, são como as duas faces, visível e invisível do mistério. Portanto as três
funções são inseparáveis e estão a serviço da mesma realidade.
FINALIDADE DA REVELAÇÃO
O fim último da revelação é a glória de Deus. Para o Xto, dar testemunho ao Pai, manifestar o
seu Nome, revelar o seu Nome, é o mesmo que glorificá-lo. No Xto e nos apóstolos a revelação
atinge plenamente sua finalidade. Xto glorificou o Pai pois manifestou aos homens o desígnio
de graça do Pai, ele é perfeito glorificador do Pai. A glória de Deus indica o próprio Deus, na
perfeição de seu Ser e na irradiação de usa perfeição. O xtão glorifica a Deus qdo adere, pela fé,
ao plano de salvação eleva uma vida condizente com essa fé. O homem glorifica a Deus pela fé,
comunhão de espírito com o Pensamento de Deus e pela caridade, que insere no seu coração o
próprio Amor de Deus. Assim, glorifica a Deus e realiza sua salvação; pois vivendo plenamente
a vida de filho, realiza sua salvação que é também a glória de Deus.
TEXTO
A bíblia pode ser descrita como coleção de escritos, reconhecidos como inspirados. Ela
recebe uma variação no seu nome: Escritura Sagrada, Livros Sagrados, Testamento. Ela é,
comumente, considerada como uma grande obra – obra de um único autor -, mas, do ponto de
Disciplina: Teologia Fundamental
43
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
vista humano, constitui uma biblioteca. Este livro é dividido em duas partes: Antigo e Novo
Testamento25; ambos testamentos falam das alianças que Deus estabeleceu com a humanidade.
Em meio a tantas infidelidades do povo escolhido e da permanente fidelidade de Deus, o Antigo
Testamento constitui uma preparação para o ato definitivo do amor de Deus para com a
humanidade.
A formação da bíblia
O Antigo Testamento foi formado a partir de um longo processo iniciado com Abraão
(séc. XIX a.C); as origens do A.T. remontam a ele. Mas foi Moisés (séc. XIII a.C) o líder
material e o legislador que iniciou o grande movimento religioso, o qual deu início a essa
grande obra literária.
O Pentateuco traz a marca de Moisés, mas a sua forma final só se deu no século VI a.C.
Os livros Proféticos tiveram o seu início no século VIII a.C. e a sua conclusão no século IV a.C.
O século VI constitui a fase áurea da literatura sapiencial, mas o seu início se reporta a Salomão
(séc. X a.C.). O livro da Sabedoria surgiu quando mal começava o século I da nossa era. Muito
da literatura do A.T. está baseado em tradições orais.
Como o Antigo Testamento, também o Novo relata a história de um povo; ele esboça a
vida dos primeiros cristãos: novo povo de Deus. Contrariamente ao Antigo, que precisou de
quase um milênio para ser composto, todo Novo Testamento foi escrito dentro de um só século
(o I). Vemos, desse modo, que ambas as Alianças são um resultado final de um coletivo esforço.
Os livros canônicos da bíblia foram escritos em três línguas: hebraico, aramaico e grego; sendo
que a maior parte do A.T. foi escrita em hebraico. Todo o Novo Testamento foi escrito em
grego. É bem verdade que não existe nenhum texto original dos escritos bíblicos, pois desde o
século III da era cristã tinham-se perdido. Isso se deu devido ao sensível material no qual foram
postos: papiro e pergaminho.
INSPIRAÇÃO
Existe uma definição precisa sobre esse tema: a inspiração bíblica é o resultado
mistérico da ação carismática de Deus nos hagiógrafos enquanto membros da comunidade
crente, seja judaica seja cristã; os quais, usando de todas as suas faculdades e talentos e agindo
Deus neles e por meio deles, põem por escrito tudo e só o que Deus quer em ordem à salvação
da humanidade “...
Assim, o Concílio Vaticano II afirma que: “As coisas divinamente reveladas, que se
encerram por escrito e se manifestam na Sagrada Escritura, foram consignadas sob inspiração
do Espírito Santo”27.
Não só nas manifestações do Magistério, mas também na mesma Sagrada Escritura nós
encontramos claramente uma consciência do fenômeno da inspiração; isto se dá em todas as
partes, desde o A.T. até o Novo. Jesus tem consciência de ser a plena revelação do Pai.
A Igreja, baseada na mesma revelação e querendo defender a sua integridade, depois uma
reflexão plurissecular, definiu como dogma o fenômeno da inspiração; essa definição foi
promulgada pelo Concílio Vaticano I na Constituição Dogmática Dei Filius.
CANONICIDADE
No caso dos cristãos a necessidade surgiu por conta da expansão contínua da igreja;
fazia-se necessária uma mesma regra de fé para todas as Igrejas; desse modo se manifestava a
sua universalidade. Um segundo motivo deveu-se ao fato de colocar um ponto final nos
heréticos que recorriam aos escritos apócrifos.
VERDADE BÍBLICA
a) Verdade bíblica (ou salvífica): é aquela verdade cujo objeto formal é o conhecimento
íntegro de tudo o que o homem precisa de saber para a vida e para a salvação, que nos
foi outorgado por Cristo;
b) Inerrância: é a qualidade da bíblia, pela qual a revelação de Deus nela contida está livre
de todo erro.Apesar de a inerrância ter sido afirmado desde as origens da tradição, tanto
judaica quanto cristã, durante todos séculos de nossa era houve resistências contra essa
verdade; de modo particular se destaca o século XVI, com a introdução do estudo
crítico e racionalista da Escritura, mas sobretudo os séculos XVII –XIX com o
desenvolvimento das ciências astronômicas28, palenteológicas29 e históricas30. Todo o
desenvolvimento científico foi causa de fortes tensões entre os homens da ciência, de
um lado, e os teólogos e magistério, do outro, chegando-se a pensar na impossibilidade
de conciliar razão fé.
Sua especificidade
Como sabemos, ao se tratar de verdade, podemos dizer que há uma diversidade32, mas
que, na diversidade, há um elemento comum33 a todos. Todavia, além disso, vale ressaltar que,
no caso da verdade bíblica, há o que chamamos de especificidade; Qual será? A verdade bíblica
é uma verdade lógica e ontologicamente especificada pelo seu objeto formal, ou seja, a
revelação de Deus para a salvação do homem. Ela se caracteriza por ser: de gênero semítico, de
caráter religioso, de caráter dialético, que se vai descobrindo pouco a pouco, seja em seu
progresso rumo à plenitude que é Cristo, seja em seu caráter sobrenatural que supera as
verdades meramente humanas.
INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA
Para uma interpretação coerente da bíblia são necessários critérios. O primeiro deles
consiste em ter presente a base da interpretação, ou seja, a noção básica de hermenêutica. Quais
são os aspectos considerados por ela? São: a) o texto literário; b) o receptor ou o homem
contemporâneo; c) o autor do texto; d) o tema e) e a linguagem.
28 O famoso caso Galileu; ele afirmava o movimento da terra sobre o sol; a mentalidade da época afirmava
diversamente.
29 O darwinismo – com a teoria da evolução das espécies - deu origem ao Poligenismo.
30 Progresso da arqueologia e da historiografia.
31 DV, 11.
32 Essa diversidade pode ser constatada a partir do objeto formal – que se caracteriza pelo princípio de
verificabilidade, o qual determina a verdade e falsidade da ciência – de cada uma das ciências.
33 É a adequação existente em cada ciência entre o entendimento humano e a realidade que a ciência estuda segundo o
seu objeto formal e segundo seus princípios e métodos característicos. O elemento comum da verdade de toda ciência
consiste em atuar segundo a natureza própria da mesma (verdade ontológica). .
Disciplina: Teologia Fundamental
46
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
contemporâneo, mediante o uso dos métodos científicos mais apropriados, com o fim de fazer o
texto vivo e atual para o homem”34.
Por que é necessária a interpretação bíblica? Os motivos são diversos: a- por causa da
natureza mesma do texto; ele continua a ser fonte de inspiração e de novidade para todos os
tempos; b- por causa da sua finalidade, pois ela é dirigida a todos os homens de todos os
tempos; c- por causa da dificuldade do texto em si mesmo, é um texto antigo que, à medida que
o tempo passa, se distancia sempre mais do presente, mas também porque nele está contida uma
série de passagens obscuras; d- porque sua interpretação é interminável, pois em cada época
surgem novas descobertas na filosofia, na exegese, na ciência e na técnica que contribuem para
a sua interpretação; e- sobretudo pelo fato da relação do homem com Deus, pois não é
indiferente ao homem conhecer Deus ou não, conhecê-Lo melhor ou não; assim está em jogo a
relação pessoal e comunitária do homem com Deus.
A hermenêutica bíblica tem uma história; ela atravessou milênios e séculos; suas fases
são: hermenêutica própria do A.T., do N.T., da época Patrística e Medieval, no qual se destaca
são Tomás, o período moderno, onde surgem teorias divergentes da interpretação tradicional:
influenciam o Renascimento humanista, a Reforma protestante, os novos movimentos
filosóficos: o iluminismo, positivismo e o romantismo. Esse encadeamento do período moderno
tem o seu ponto de partida no racionalismo cartesiano. Cada um desses períodos traz a sua
peculiaridade.
A hermenêutica católica entra num momento de decadência, mas ganha novo impulso
com a Providetissimus Deus (1893) até a Dei Verbum. Durante esse ínterim convém que
distingamos na história uma exegese católica e outra protestante.
34 GARCÍA, Antonio Izquierdo. La Palabra viva: introducción a la Sagrada Escritura. México: Nueva
Evangelización, 199. p.132.
35 Fundem-se aqui a intenção do autor humano e do autor divino.
36 Define-se como a conexão coerente da fé objetiva da Igreja, o nexo interno dos mistérios entre si.
Disciplina: Teologia Fundamental
47
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
“Como as expressões da Tradição são múltiplas e variadas, a ponto de, muitas vezes,
serem quase identificadas com a vida toda da Igreja, é necessário que se apontem alguns
critérios que sirvam para reconhecimento da Tradição; com eles se procura identificar o que é
próprio da Tradição apostólica e o que pertence à tradição eclesiástica.
1. Magistério: sua função já nos é conhecida: interpretar de tal modo a Palavra de Deus
que procura discernir o que o Espírito diz à Igreja hoje.
2. Antigüidade: este critério tem seu fundamento em Trento; considera como tradições
somente aquelas que chegaram até nós, indicando assim sua universalidade e
verificando sua continuidade ao longo da história. (...) Com ele se quer expressar que
uma tradição que provenha da época apostólica e que continue até os nossos dias
demonstra sua autenticidade e vitalidade para a vida de fé e serve como critério para
aquisição de novas tradições.
3. Sensus Fidei: o sentido de fé faz referência direta à comunhão da Igreja em todos os
seus membros e supõe a presença do Espírito Santo para que todos os fiéis reconheçam
a expressão clara da fé e tenham um sentido interior das realidades espirituais que
experimentam. Para discernir as tradições através do Sensus Fidei é necessário que se
examinem a fé e a prática da Igreja toda desde o Bispo até o último dos fiéis, levando-se
em conta, contudo, que o reconhecimento mesmo do sentido da fé supõe sempre uma
verificação através dos frutos visíveis do Espírito.
4. Fidelidade: continuidade e renovação: a transmissão fiel da verdade salvífica não
significa imobilismo; significa que deve está ligada às suas origens, mas ao mesmo
tempo aberta a novas mudanças que permitam tornar mais visível a realidade salvífica,
de modo a responder aos anelos e às aspirações do homem atual (Portanto: inovação
que mantenha a identidade essencial da Igreja).
5. A profissão de fé: entre os vários documentos do patrimônio eclesiástico, o ‘credo’ dos
apóstolos, o Niceno e outras profissões de fé serviram como instrumentos para verificar
as tradições herdadas. Neles se faz uma síntese maravilhosa do que ensina a Escritura e
do que pregou a Igreja, de modo a nos apresentar o núcleo básico com o qual se podem
confrontar as novas formulações e a pregação atual.
6. A Sagrada Escritura: ela é memória normativa da origem da fé; por conseguinte, toda
tradição na Igreja deve ser confrontada com ela como critério normativo e de existência
Disciplina: Teologia Fundamental
48
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
eclesial; ela é decisiva para a orientação da fé e da vida dos fiéis, tanto mais quanto é
formalmente Palavra de Deus.
7. Cristo ressuscitado: o critério fundamental – para o qual todos os demais se voltam – é
Cristo, Palavra última e definitiva de Deus aos homens”.
O conceito de Tradição é de suma importância na história das religiões; por isso o termo
pode receber uma definição genérica e outra particular. No sentido mais amplo, tradição
significa o dado recebido nos primeiros tempos e transmitido sem interrupção. No sentido mais
restrito, ou seja, no âmbito histórico-religioso judaico-cristão, Tradição está unida ao dado da
Revelação; sendo que, enquanto para o Antigo Testamento, o significado recai para a Lei
(Torá), no Novo Testamento o momento incisivo é o evento Cristo.
Cristo: evento que deveria ser transmitido às gerações futuras de um duplo modo: pela
pregação da palavra e pelos sinais salvíficos. A Tradição recebeu significado especial quando as
testemunhas oculares e auriculares começaram a desaparecer; mas não só isso, sobretudo
quando começaram a surgir as heresias: Cristo e sua mensagem estavam sendo transmitidos
com uma roupagem falsa, senão era-Lhe negado verdadeira importância. Nesta situação, a
Igreja teve que encontrar meios para continuar a transmissão intactamente da fé, recebida de
Cristo, testemunhada e garantida pelas testemunhas oculares e auriculares a fim de que Cristo e
sua identidade histórica não fossem extintas.
37 Magistério oficial da Igreja: é INFALÍVEL: não por própria força, mas em virtude do Espírito Santo e em
benefício da fé e da Igreja universal; é infalível no sentido de que a “Igreja do Novo Testamento, ao falar em virtude
de sua autoridade doutrinal obrigatória, não pode se enganar, graças à assistência do Espírito Santo”. Órgãos do
Magistério: Magistério Ordinário: é o caso normal da pregação docente da Igreja e se exterioriza através do ensino
próprio de cada um dos bispos. Magistério Extraordinário: constituído pelos concílios, sínodos e conferências
episcopais, os quais se reúnem em determinadas circunstâncias para se manifestar a propósito de questões doutrinais
ou de costumes. Dentro desse magistério extraordinário somente podem se manifestar de maneira infalível o concílio
ecumênico e o Papa quando fala “ex cathedra”. Sujeito da infalibilidade: de acordo com a doutrina do Vaticano II, o
verdadeiro lugar da infalibilidade é a Igreja toda como “sacramento universal de salvação”, e o fundamento disso é a
presença nela de Cristo e de seu Espírito. Daí a infalibilidade do sentido da fé, do qual participam todos os membros
da Igreja. Contudo, com referência ao Magistério explicitamente, na Igreja só existe um sujeito da infalibilidade: o
Colégio dos Bispos, tendo o Papa como cabeça. Esse sujeito de infalibilidade pode se manifesta de diversos modos:
no concílio, no Magistério ordinário universal e numa decisão “ex-cathedra” do Papa, que age como cabeça do corpo
episcopal. Magistério do Papa: quando o Pontífice Romano exerce seu poder como Cabeça do Colégio episcopal,
seus poderes não derivam desse Colégio, mas do próprio Cristo. Por força de seu ministério próprio a serviço de toda
a Igreja para a confirmação de seus irmãos na fé, compete a ele um Magistério peculiar. O Papa só é infalível quando
fala “ex cathedra”, ou seja, quando, para cumprir seu ofício de pastor e de doutor da Igreja, define com autoridade
apostólica que a Igreja universal deve aceitar uma doutrina pertencente à fé ou aos costumes. Para que ele fale desse
modo, é necessário que exercite seu pleno poder docente e anuncie com clareza que quer definir uma doutrina; que
queira impô-la como obrigação de fé a toda a Igreja; e que se refira à matéria de fé ou de costumes para a vida cristã.
Uma decisão tomada “ex cathedra” não necessita de ulterior aprovação da Igreja. Além desse caso limite máximo e,
portanto, excepcional e pouco freqüente, o Papa tem um magistério ordinário não infalível que se expressa através de
encíclicas, constituições e exortações apostólicas, motus próprios, e alocuções, que, em razão de sua autoridade
magisterial, pedem que o teólogo possa continuar suas investigações nas matérias assim tratadas pelo Pontífice
Romano. Em relação ao Magistério o fiel é convidado à aceitação de fé e ao obséquio religioso.
38 IITm 1, 13ss; 2, 2; 4, 1ss.
Disciplina: Teologia Fundamental
49
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
“No período da tradição, que vai ao final da ascensão de Cristo ao final do tempo
apostólico, isto é, até o nascimento da Escritura, dá-se uma interpretação progressiva do
mistério de Cristo, baseada na experiência histórica com Jesus de Nazaré, e na experiência
pascal das aparições do Senhor e da ação do Espírito Santo. Surge assim uma norma de fé,
precursora dos símbolos de fé, tendo seu lugar próprio (...) na liturgia eclesiástica. Esta norma
foi anterior à Escritura, mas nela desaguou. Conheçamo-la pela Escritura, da qual faz parte. Por
isso, a Escritura deve ser interpretada pela norma de fé recebida nela, porém já constituída
anteriormente”39.
A Escritura, pelo seu conteúdo duradouro, claro e pleno, contém dado objetivo para que
a mensagem salvífica seja transmitida até a irrupção do futuro absoluto. Mas não podemos
negar o fato de ter sido introduzido alguma deformação humana na transmissão do conteúdo
comunicado pelos apóstolos e seus discípulos. Por esse motivo é que se diz que dificilmente se
pode alcançar a forma pura do objeto transmitido oralmente; daí também mais um motivo pelo
qual só a Igreja ter a autoridade de interpretar e transmitir o conteúdo.
O CVII também considerou o problema, mas renunciou a essa teoria. Ele prefere
afirmar que o conteúdo transmitido pelos apóstolos encerra tudo o que é necessário saber para
que o povo de Deus viva santamente. Mas esta Tradição que procede dos apóstolos progride na
Igreja sob a assistência do Espírito Santo, enquanto progride no conhecimento das coisas e
palavras transmitidas.
Mas qual é a prova viva dessa tradição? O ensinamento dos Santos Padres, cujos
tesouros se comunicam à prática e à vida da Igreja que crê e reza. Assim percebemos a íntima
relação entre Escritura Sagrada e Sagrada Tradição; ambas surgem da mesma fonte, fundem-se
de certo modo e tendem a uma mesma finalidade; a Palavra de Deus, escrita sob a inspiração do
Espírito, foi confiada aos apóstolos; por eles, é transmitida integralmente aos seus sucessores,
para que estes a guardem fielmente, exponham-na e a difundam coma sua pregação; resultando
dessa atitude que a Igreja não tira as verdades reveladas apenas da Sagrada Escritura, mas
também da Tradição.
39 A fé da Igreja, p. 146.
40 A partir dos documentos de Trento.
41 Segunda esta, as verdades estabelecidas pela Igreja, que não estão fundadas na Escritura, podem ser demonstradas
Quais são os portadores da Tradição? O Concílio Vaticano II afirma ser todo o povo de
Deus, que tem um senso, um instinto de fé por meio do qual sabe julgar a conformidade e não
conformidade de uma proposição ou de um comportamento com o mistério de Cristo; é uma
espécie de sexto sentido. Contudo, a Igreja universal só pode atualizar a função de transmitir a
Tradição incorporando-a e subordinando-a ao Magistério eclesiástico.
O que significa a palavra “Dogma”? Os dogmas da Igreja contêm uma doutrina que não
é produto de simples descoberta da razão humana e, portanto, não são unicamente a expressão
42 “As definições de fé, ou fórmulas dogmáticas do Magistério da Igreja, pretenderam sempre a ajudar a compreensão
do dado revelado, determinando com autoridade o que o crente deve obrigatoriamente aceitar na fé. E quando a Igreja
faz novos enunciados tema intenção de confirmar ou esclarecer as verdades já contidas de algum modo na Sagrada
Escritura ou em expressões precedentes da Tradição, mas, ao mesmo tempo, costuma pensar em resolver certas
questões.
43 Anúncio do Senhor morto e ressuscitado.
Disciplina: Teologia Fundamental
51
Evangelizador: Luis Carlos Pereira
de determinada escola teológica. A doutrina exposta no dogma tem caráter divino, enquanto é a
expressão e explicação de um conteúdo da revelação, sob a luz e a guia do Espírito Santo.
O dogma, como regra de fé, portanto, é tudo o que é verdade revelada por Deus e
definida como tal pelo Magistério. Ele comporta duas realidades fundamentais: o que se propõe
no dogma pertence de fato à revelação divina, pública e oficial tal qual nos é transmitida na
Escritura e na Tradição; a Igreja propõe explícita e definitivamente como pertencente à
Revelação.
Daí podemos concluir que a Igreja não pode inventar dogmas, o que faz é explicitar
verdades contidas na Revelação; ele está a serviço da verdade revelada.
Existe uma imutabilidade e evolução nos dogmas, ou seja, um desenvolvimento dogmático; este
consiste no processo pelo qual a verdade revelada passou da pregação dos Apóstolos ao
ensinamento atual da Igreja. Esta tem a missão de transmitir a verdade revelada, mas deve fazer
um esforço para um entendimento crescente e atual da mesma mensagem. Esse
desenvolvimento crescente se transforma em processo dogmático quando o melhor
entendimento conseguido é proclamado infalivelmente pelo Magistério da Igreja como verdade
contida no Depósito da revelação, ou seja, dogma. O desenvolvimento dogmático sempre se
realizou através da imutabilidade e evolução do dogma.
a) Imutabilidade das definições de fé: O valor absoluto e imutável do dogma tem sido
reiteradamente sustentado pelo Magistério contra todas as formas de “relativismo
dogmático”.
b) Evolução do dogma: os novos tempos exigem que os dogmas sejam explicados como
novos enunciados que esclareçam, completem e atualizem as definições anteriores; só
desse modo se podem evitar os erros futuros.
Diante do fenômeno da revelação o homem tem duas opções: aceitar ou recusar. O pólo
“aceitar” é o que interessa a nós. Responder positivamente à revelação e corresponder a ela é o
que chamamos de fé. Ela pode ser tanto “aceitação de certas verdades no sentido de declarações
conceituais, como confiança e obediência na aceitação da única ação salvífica de Deus em
Jesus”.
Na história, desde o Antigo Testamento até o Novo – neste se compreende também até
os nossos dias -, a fé recebeu diversas matizes. Não nos é possível elencar as características da
fé em toda a história e em cada um dos seus momentos, mas queremos indicar ao menos alguns
aspectos, pois eles são determinantes para a compreensão do tema:
Paulo diz que a fé inclui em si mesma uma nova auto-inteligência do homem; a fé, para
ele, é o conhecimento de Deus, da Verdade; é obedecer a Deus e aprender a salvação em Cristo
e granjear a esperança do futuro absoluto;
João: fé é ir a Jesus, é unidade de vida com Ele; é passar da morte para a vida, mas
também compreende uma dimensão escatológica, no sentido de esperança do futuro.
Escolástica: esforçou-se para uma análise psicológica da fé. Tomás define a fé como
“participação pela graça no conhecimento do próprio Deus”;
BIBLIOGRAFIA
BIBLIA DE JERUSALÉM
BIBLIA DO PEREGRINO
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. São Paulo: Loyola, 2000.
COLLANTES, Justo. Fé Católica: Documentos do Magistério da Igreja. Rio de Janeiro, RJ:
Lumen Christi; Anápolis, GO: Diocese de Anápolis, 2003.
COMPÊNDIO VATICANO II. Constituição Dogmática Lumem Gentium. São Paulo: Paulus,
2000.
CONCÍLIO VATICANO II, Constituição Dogmática Dei Verbum. São Paulo: Paulus, 2001.
DENZINGER, Heinrich. Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral. São
Paulo: Paulinas; Edições Loyola, 2007.
FISICHELLA, R. Dicionário de Teologia Fundamental. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 1094
GARCÍA, Antonio Izquierdo. La Palabra viva: introducción a la Sagrada Escritura. México:
Nueva Evangelización, 199. p.132.
LATOURELLE René. Teologia da revelação. São Paulo: edições Paulinas, 1973