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CERRADO MINEIRO
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Bet.o Horizonte
Junho de 2004

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S81.526.5
F745c
2004
-- - JNAS
L I Poder doCidadão
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CERRADO MINEIRO
DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Belo Horizonte
Junho de 2004

Ficha técnica

Editor responsável:
Rarniro Batista de Abreu
Diretor de Comunicação Iotitucronal

Coordenação:
Juscelino Luiz Ribeiro
Gerente-Geral de Projetos Institucionais

Produção gráfica:
Joana Nascimento
Gerente de Comunicação Visual

Edição:
Jurarri Garcia e Maria una Soares Souza

Consultoria temática:
Pedro Chaqa Locce

Revisão:
Ana Paula Barros e Larissa Freitas

Capa, projeto gráfico e editoração eletrônica:


Rodrigo Valente de Noronha

Fotos:
Evandro Rodney/IEF - páginas: 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14 (acima), 16,
17, 18, 20, 21, 22, 25, 26, 27, 29, 32, 34, 36, 37, 40
Humberto Guerra - Foto da capa e páginas: 14 (abaixo). 30, 31, 33, 38
Rodrigo Valente - Foto página 35

Publicação da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais


Rua Rodrigues Caldas, 30 - Santo Agostinho
CEP 30190-921 - Belo Horizonte - MG
Telefone: 3290-7000
MESA DA ASSEMBLÉIA
Deputado Mauri Torres
Presidente
Deputado Remoto Aloise
1°-Vice-Presidente
Deputado Adelmo Carneiro Leão
21-Vice-Presidente
Deputado DiLon Mero
31-Vice-Presidente
Deputado Antonio Andrade
11-Secretário
De putado Luiz Fernando Faria
2°-Secretário
Deputado George Hilton
30-Secretário

SECRETARIA
Jo,o Franco
Diretor-Geral
Eduardo Vieira Moreira
Secretário-Geral da Mesa

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Fôruni Técnico "Cerrado Mineiro: Desafios e


Perspectivas", 1., 2004, Belo Horizonte,
F745c Cerrado mineiro: desafios e perspectivas. - Belo
Horizonte : Assembléia Legislativa do Estado de Minas
Gerais, 2004.
44p.

1. Cerrado - Congresso - Minas Gerais.


2. Desenvolvimento sustentável - Cerrado - Minas
Gerais. 1. Título.

CDU: 581.526.5(815.1)
SUMÁRIO
Apresentação
Deputado Mauri Torres
Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais
página 5

Preservar para sobreviver


Deputado Mauri Torres
Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais
página 6

Desenvolvimento sustentável: um sonho possível.


Deputado Ricardo Duarte
Autor do requerimento que deu origem ao fórum
página 8

O desafio de transformar um patrimônio natural em riqueza


Derli Prudente Santana
Pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo
página 16

As vertentes social e econômica


Maria Luíza de Aguiar Marques
Diretora do Centro de Estudos Económicos e Sociais da Fundação João Pinheiro
página 24

O papel de Minas no desenvolvimento do cerrado


Alysson Paulinelli
Ex-Ministro de Estado da Agricultura
página 28

Por um programa racional de desenvolvimento


José do Carmo Neves
Assessor de Desenvolvimento Florestal do Instituto Estadual de Florestas
página 34

A importância do extrativismo e da agricultura familiar


Aparecido Alves de Souza
Diretor da Cooperativa Agroextrativista Grande Sertão
página 36

Documento final
Conservação, Potencialidades e Biodiversidade
Desenvolvimento e Sustentabilidade
Políticas para a Pesquisa no Cerrado
página 40

Moções
página 44

Carta dos povos do cerrado


página 44
CERRADO MINEIRO

APRESENTAÇÃO
Este documento contém as palestras apresentadas durante o
Fórum Técnico "Cerrado Mineiro: Desafios e Perspectivas", reali-
zado pela Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais nos
dias 14 e 15 de junho de 2004, e as propostas aprovadas pelos
participantes na sessão plenária final.
O fórum, coordenado pelo deputado Ricardo Duarte, teve o
objetivo de discutir a situação do cerrado mineiro, em virtude
das possibilidades de seu aproveitamento econômico e dos im-
pactos que vem sofrendo nas últimas décadas.
De uma exploração de cunho extrativista, associada à agricul-
tura familiar, passou-se, no cerrado mineiro, a uma exploração
altamente mecanizada, associada à agricultura de exportação e á
agroindústria. O novo modelo, se por um lado propiciou o de-
senvolvimento de várias atividades econômicas, por outro teve
efeitos negativos para parte significativa da população do cerra-
do, pela perda de espaços e de fontes tradicionais de sustento.
Resultou também em impactos desfavoráveis ao meio ambiente,
nos diversos aspectos ligados à biodiversidade.
Pretendeu-se, com o evento, ouvir entidades, especialistas e
autoridades ligadas ao assunto, buscando levantar subsídios para
o aprimoramento das ações legislativas e executivas voltadas para
o setor.
As exposições e debates do fórum, aliadas ao bom senso, indi-
cam que o caminho mais adequado para utilização das áreas de
cerrado deve ser o da sustenta bilidade, conceito que pressupõe
a conciliação das atividades econômicas com o equilíbrio do
meio ambiente e o interesse social.

Deputado Mauri Torres


Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais

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Deputado Mauri Torres
Presidente da Assembléia Legislativa de Minas Gerais*

Por tudo o que representa para a economia, para o


meio ambiente, para a cultura e as tradições do povo
mineiro, o cerrado é um dos maiores patrimônios natu-
rais do nosso Estado. Ele ocupa mais da metade do terri-
'ório de Minas Gerais, está presente em quase toda a ba-
cia do Rio São Francisco e boa parte das bacias do Rio
Paranaíbae do Rio Grande, espalhando-se principalmen-
e pelas regiões Norte, Centro, Sul e Triângulo. É o segun-
tJÊ do maior bioma do País, ocupando aproximadamente 25°I
do território nacional.
Pelas características de sua vegetação - composta de árvores baixas,
retorcidas, em geral de casca grossa, espaçadas, e por unia contínua
camada de gramineas -, o cerrado é também conhecido como a savana
brasileira. É o mundo dos buritis, das veredas e dos chapadões, que
inspiraram as grandes obras do escritor Guimarães Rosa.
Consideradas historicamente impróprias para as atividades
agropecuárias, essas áreas sempre tiveram aproveitamento voltado
para o extrativismo, como o do pequi e de outras frutas típicas,
constituindo-se em fonte diversificada para a culinária regional e
para a medicina fitoterápica.
CERRADO MINEIRO

A intensa exploração econômica desse biorna trouxe efeitos


colaterais indesejáveis, como a perda, para populações rurais, de
suas fontes tradicionais de sustento, centradas no extrativismo e na agricultura de subsistência,
e até mesmo de parte de sua identidade cultural.

A propósito dessa tradição, e a partir do desenvolvimento de


procurando valorizar a cultura das pesquisas e de tecnologias que
populações do cerrado, o Estado permitiram tornar suas terras
de Minas Gerais passou a contar, agricultáveis, como área de gran-
em 1992, por iniciativa da Assem- de potencial para outras ativida-
bléia Legislativa, com unia lei que des económicas.
torna o pequizeiro árvore de pre- O cerrado transformou-se na úl-
servação permanente, imune a cor- tinia fronteira agncola do Estado,
te, a não ser em situações especi- abrindo espaço para a expansão da
ais, envolvendo o interesse soci- agricultura (particularmente para a
al, mediante prévia autorização do produção de soja, milho, café e
Instituto Estadual de Florestas ou cana-de-açúcar), para a pecuária
de órgão municipal competente. leiteira, para a agroindústr-ia e para
Essa lei estabelece também que, a fabricação de carvão, demanda-
nas áreas de ocorrência do pequi- do pelas indústrias siderúrgicas.
zeiro, o reflorestamento homogéneo A intensa exploração económi-
com espécies exóticas somente po- ca desse bionia, contudo, trouxe
derá ser feito mediante critérios, de- efeitos colaterais indesejáveis,
finidos pelo JEF, que garantam o ple- como a perda, para populações
no desenvolvimento das árvores pro- rurais, de suas fontes tradicionais
dutivas. de sustento, centradas no
Outra lei, do ano de 2001, criou extrativismo e na agricultura de
o Programa Mineiro de Incentivo subsistência, e até mesmo de par-
ao Cultivo, à Extração, ao Consu- te de sua identidade cultural.
mo, à Comercialização e à Trans- Sua paisagem se transformou
formação do Pequi e Demais Fru- com a ocupação intensa pelo ho-
tos e Produtos Nativos do Cerrado mem, pela agricultura e pela pe-
(Prã-Pequi). Seu objetivo é inte- cuária voltadas para a exportação,
grar as populações que tradicio- entre outras atividades econômi-

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nalmente exploram esse bioma, cas. As áreas remanescentes do
numa perspectiva de sustenta- cerrado nativo representam hoje
hoje
hilidade ambiental. uni percentual minimo desse
Se. ate três ou quatro décadas ecossistema no Estado.
atrás, o cerrado mineiro estava pie- É grande também, entre os estu-
rramente associado ao extrati- %ffi diosos do cerrado, a preocupação
vismo, à cultura regional e à agri- com os impactos negativos que sua
cultura familiar, passou a ser visto, exploração, quando feita de maneira
1.
CERRADO MINEIRO

O cerrado é "o pai das águas". Se não cuidarmos dele agora, é


provável que dentro de pouco tempo ele deixará de cumprir essa
importante função ambiental. Se cuidarmos, essa função será preservada, tendo
em vista a pródiga capacidade de recuperação da natureza.

inadequada, tem trazido para o mero ambi- nuada, acompanhada de um processo de


ente. O primeiro desses impactos - inevitá monscientizaçao junto aos agentes econô-
vel quando se substitui um ecossistema na- nicos e ás comunidades, pois só um esfor-
tural por uma monocultura - é a perda da .0 conjunto é capaz de garantir a manu-
biodiversidade. O desequilíbrio ecológico tenção desse ecossistema.
provocado pelos grandes desmatamentos põe Durante o II Encontro dos Povos do
em risco centenas de espécies da flora e da Cerrado, realizado em Pirapora rio iní-
fauna. cio de junho, o depoimento de uma
Da mesma forma, o uso inadequado dos barranqueira ilustrou essa necessidade.
solos, os processos de mecanização e de Ela disse, com sua experiência e sim-
irrigação, o emprego de defensivos agrí- plicidade: "Se há 40 anos tivéssemos
colas, entre outros fatores, podem ter consciência do que era preciso fazer
como conseqüências o fenômeno das ero- Iara preservar o cerrado, o São Fran-
sões e, principalmente, a ameaça aos cur- isco e muitos outros rios não esta-
sos d'água, afetados pela contaminação am hoje morrendo."
química, pelo assoreamento e pela perda Ao iniciarmos este fórum técnico, cabe-
progressiva de seu volume. rios indagar: que tipo de desenvolvimento
Esse seria um prejuízo especialmente deve ser proposto para o cerrado mineiro,
preocupante, tendo em vista as importan- de forma a atender aos interesses e às cir-
tes bacias hidrográficas localizadas nas áreas cunstáncias em jogo?
do cerrado, a posição do Estado de Minas O bom senso indica que, nas propostas a
como berço de grande parte dos mananciais serem feitas sobre o tema, assim como nas
do País e a crescente demanda pela água políticas públicas a serem implementadas
no Brasil e em todo o mundo, o que tornou para o setor, deve prevalecer o conceito
esse recurso natural estratégico e cada ve: de sustenta bilidade, que pressupõe a con-
mais disputado no plano internacional. Jliação das atividades económicas com o
O professor Ivo das Chagas, de Pirapora. interesse social e a preservação do meio
especialista em cerrado, disse com muita a mbiente.
propriedade que o cerrado é "o pai das As informações e os esclarecimentos
águas". Se não cuidarmos dele agora, e aqui prestados, assim como as discus-
provável que dentro de pouco tempo ele sões a serem desenvolvidas nos grupos
deixe de cumprir essa importante função de trabalho deste evento, certamente nos
ambiental. Se cuidarmos, essa função ser: darão subsídios mais sólidos para ama-
preservada, tendo em vista a pródiga ca- durecermos nossas opiniões a respeito do
pacidade de recuperação da natureza. assunto.
Para que isso aconteça, é necessária uma *Pronunciamento lido pelo
ação governamental consistente e conti- Deputado Wanderley Ávila

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As veredas, imortalizadas como símbolo de Minas por Guimarães Rosa,


estão desaparecendo do grande sertão pela degradação dos cerrados,
pois, situadas em áreas de intensa monocultura,
estão sendo assoreadas e/ou contaminadas por venenos agrícolas.

ecossistema. Aliás, sempre nos preocupou muito o fato E necessário mencionar coni destaque o quanto a pro-
de termos pouco conhecimento científico sobre esse dução de carvão vegetal, especialmente em conseqüên-
bioma. cia do desenvolvimento da indústria siderúrgica, tem
Sabemos que a exploração inadequada dos recursos na- sido responsável pelo esgotamento da cobertura vegetal
turais é a causa principal da extinção de espécies nativas, original do cerrado. Parte do carvoejamerito é feito de
da perda da biodiversidade, que tem caracterizado a ocu- forma ilegal, com cortes de espécies nativas à revelia da
pação do cerrado desde os tempos do Brasil Colônia, O lei, aliando destruição ambiental com exploração, como
cerrado, que até os anos 70 era visto como área de redu- dos trabalhos escravo e infantil, além de outros males.
zido potencial agropecuario. hoje é responsável por 251'4, Por outro lado, a possibilidade de se fazer manejo flores-
da produção de cereais no Pais. Neste ano, os 9,6 milhões tal com vegetação nativa do cerrado não encontra boa
de toneladas de grãos em Minas constituem recorde his- acolhida entre os empresários do setor, que preferem optar
tórico que recolocam a agricultura mineira como um dos pelo eucalipto, especialmente devido ã sua rapidez de
suportes da nossa economia. Mas essa expansão da agri- crescimento, com prejuizo para a biodiversidade.
cultura intensiva, especialmente das diversas monoculturas Não podemos deixar de mencionar o impacto causado
- soja, cana e eucalipto -, provocou mudanças significa- pelo avanço da silvicultura, que, especialmente na re-
tivas no padrão de ocupação dos cerrados, reduzindo as gião do Norte de Minas, produziu alterações preocupantes
áreas de vegetação natural, com a conseqüente perda da no sistema hidrico regional, além de prejuízos á diversi-
biod i ve sidade. dade da fauna e da flora.

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CERDO MINEIRO
Outro aspecto que precisa ser considerado nesse pro-
cesso acelerado de destruição é o seu efeito sobre as
águas e mananciais. Além da contaminação por produ-
tos químicos, assoreamento de rios, desmatamento, des-
truição de nascentes e implantação desordenada de sis-
temas de irrigação, a construção de grandes complexos
hidrelétricos compromete e coloca em risco essa verda-
Cabe ao poder público,
deira caixa d'água do planeta. em todas as esferas de governo,
As veredas, imortalizadas como símbolo de Minas por inserir em suas políticas exigências
Guimarães Rosa, estão desaparecendo do grande sertão de controle ambiental,
pela degradação dos cerrados, pois, situadas em áreas
monitoramento,
de intensa monocultura, estão sendo assoreadas e/ou
contaminadas por venenos agrícolas. A destruição das pesquisa,
veredas ameaça a perenidade de muitos cursos de água
que têm ali suas nascentes e também a biodiversidade
criação e implantação
das regiões úmidas do cerrado. de unidades de conservação,
Precisamos ter em conta que um modelo de desenvol- além de rigorosa fiscalização,
vimento como o nosso - fundado na exploração ilimita-
visando coibir as variadas formas de
da dos recursos naturais, no desenvolvimento de uma
ciência sem consciência e na permanência de um eleva- crimes ambientais.
do contingente populacional vivendo abaixo da linha
de pobreza - compromete o futuro das novas gerações.
Cabe ao poder público, em todas as esferas de go-
verno, inserir em suas políticas exigências de contro-
le ambiental, monitoramento, pesquisa, criação e im-
plantação de unidades de conservação, além de rigo-
rosa fiscalização, visando coibir as variadas formas de
crimes ambientais.

É preciso também refletir sobre a necessidade de se aprovei-


tar de forma racional e equilibrada a nossa biodiversidade.
Estima-se que o Brasil possua cerca de 50 mil espécies vegetais
e milhares de espécies animais. Considerando o valor estraté-
yico dos recursos naturais e sua potencialidade econômica, o
interesse pelo controle e exploração da diversidade biológica
tem motivado debates calorosos em todo o mundo.
Sabemos que todos os dias saem do País plantas, ex-
tratos, animais, toxinas e microorganisnios para serem
estudados no exterior e que os resultados dessas pesqui-
sas e as patentes que delas se originam não retornam em
benefícios para o Brasil.
A utilização de plantas como fonte de medicamento,
por exemplo, demonstra como ainda estamos subutilizando
o imenso potencial da nossa biodiversidade. Estima-se
que muitos medicamentos disponíveis na terapêutica
t -Ç) CERRADO MINEIRO

Precisamos impedir a destruição


e, ao mesmo tempo, garantir empregabilidade e condições dignas
de vida para os povos do cerrado.
Dessa forma garantiremos a conservação do cerrado,
a sustentabitidade do seu desenvolvimento, o respeito ao homem e ao meio ambiente.
CERRADO MINEIRO

moderna tenham sido desenvolvidos a partir de fontes natu-


rais, especialmente as plantas.
Entre as maiores indústrias farmacêuticas do mundo, é cres-
cente o interesse por medicamentos derivados de fontes na-
turais.
Sabemos que só a ciência agrega valor à biodiversidade,
pois a exportação pura e simples de espécies animais ou
vegetais tem pouco valor para a indústria farmacêutica, ao
contrário do produto beneficiado por meios tecnológicos.
Por isso, embora o Brasil possua a maior biodiversidade do
planeta e detenha um dos principais mercados de medica-
mentos da mundo, sua população mais pobre ainda enfren-
ta o sério problema de acesso aos medicamentos.
A questão central em relação à biodiversidade do cerrado
refere-se também à capacidade de enfrentarmos o desafio
científico de transformar um patrimônio natural em rique-
zas, criando indústrias de base tecnológica e gerando em-
pregos qualificados, enquanto garantimos a permanência
dos pequenos agricultores na terra e reconhecemos o papel
fundamental da agricultura familiar na produção e na gera-
ção de renda para essas famílias.
É preciso aliar pesquisa com políticas públicas para garan-
tir a sustenta bi[idade das atividades econômicas no cerrado,
além de rigorosos instrumentos legais para impedir a ocor-
rência de mais crimes ambientais e devastação. Precisamos
impedir a destruição e, ao mesmo tempo, garantir
empregabilidade e condições dignas de vida para os povos
do cerrado. Dessa forma garantiremos a conservação do cer-
rado, a sustentabilidade do seu desenvolvimento, o respeito
ao homem e ao meio ambiente.
Acreditamos que isso é possível, e é esse o sonho que os
convidamos a sonhar juntos nestes dois dias e, principal-
mente, nos dias que se seguirão, tomando de empréstimo
uma pergunta feita por Guimarães Rosa, em "Grande Sertão:
Veredas", que cai muito bem nestes tempos em que pensa-
mos que somos fracos diante de mecanismos de poder ca-
pazes de tanta destruição e desesperança: "Tem horas que
penso que a gente carecia, de repente, de acordar de algu-
ma espécie de encanto. As pessoas, e as coisas, não são de
verdade E de que é que, amiúde, a gente adverte incertas
saudades? Será que, nós todos, as nossas almas já vende-
mos?"
Para encerrar, gostaríamos de dizer uma frase que vimos
escrita em um muro de uma cidade do interior: "Nem tudo
que é torto é errado. Vejam as pernas do Garrincha e as
árvores do cerrado".

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DerL.i Prudente Santana


Pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo

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DESÜ DE TRANSFORMAR
UM PATRIMONIO NATURAL

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/ .. O cerrado é o segundo biorna brasileiro, ocupando uma
extensão de 204 mil quilômetros quadrados, na opinião
de alguns, e 220 mil quilômetros quadrados, na opinião
de outros. Chamado pai das águas do Brasil, é funda-
mental sua importância para a hidrografia e para o Esta-
do de Minas Gerais, que tem grande parte de seu territó-
rio coberta por essa vegetação.
Mas o que é o cerrado? Esse nome é dado à vegetação
( típica do Brasil Central. Dá-se pouca ênfase à importân-
cia desse ecossistema p ara o crandes ciclos
, CERRADO MINEIRO
biogeoquimicos do planeta, enfati- a vegetação do cerrado. Outras áreas
zando-se mais a importância da Ama- incluídas na região são consideradas
zônia e da Mata Atiantica. pelos fitogeógrafos e pelos botânicos
O cerrado é uma savana mais ou
menos densa. É considerado como sis-
;-' como áreas de transição. Ao se compa-
rar, por exemplo, as regiões de Uberaba
tema savànico, com cobertura herbá- com as de Montes Claros ou Itania-
cea contínua e com uni dossel randiba, levando-se em conta os meses
descontínuo, pois existem andares de
diferentes estratos em termos da co- » de déficit hídrico, percebe-se que es-
tas últimas são mais secas.
bertura vegetal. Seus galhos são, ge- Para ilustrar a diferença entre o cer-
ralmente, retorcidos, e algumas espé- rado típico e a grande região do cerra-
cies apresentam a casca das árvores do, basta lembrar que cerca de 65% da
bastante coureácea. Dentro do que é área do Estado está ocupada pelo cer-
chamado de cerrado há uma gradação: rado, mas o que os Fitogeógrafos cha-
há o cerrado típico, o campo sujo, o mam de cerrado típico é apertas o equi-
campo limpo e o cerradão. Este seria valente a 186 mil quilômetros quadra-
quase unia transição de cerrado para dos, ou seja, 31% do Estado. Uma ca-
mata, com predomínio das espécies racterística típica dessas áreas é o pre-
arbóreas. O campo sujo viria em se- domínio de uma topografia de relevo
guida, e em último lugar o campo tini- plano ou suavemente ondulado, muito
po, coni predomínio das gramíneas. favorável à mecanização agrícola.
E comum, na área do cerrado, a pre- Os principais solos correlacionados ao
sença de veredas ou matas, que repre- cerrado e ao cerradão são os chamados
sentam alguma forma de compensação latossolos, que são profundos, bem dre-
ambiental. As veredas são a compen- nados e porosos, de baixa fertilidade
sação hídrica, e, se há melhor fertili- natural. Os argissolos são solos um pou-
dade do solo, podemos ter algumas co melhores em termos de fertilidade,
matas tia área. Se usado para designar mas ocorrem em menor expressão. Os
o bioma, o termo cerrado expressa a neossolos litóticos, ou seja, os
idéia do cerrado típico, do cerradão, litossolos, são solos rasos diretamen-
do campo sujo e do campo limpo. te relacionados ao campo' limpo e ao
Usado para designar a região ou do- campo cerrado. As características bá-
mínio do cerrado, refere-se a algo mais
amplo, mais abrangente.
/4 sicas da maioria dos solos do cerrado
são a baixa fertilidade natural e a grande
A terra-roxa do Triângulo Mineiro, t<idez de alumínio.
por exemplo, está incluída na região A legião possui uma estação seca bem
do cerrado, mas, na realidade, não tem dfinida, com déficit hídrico, que va-

A década de 70 marcou o início da revolução do cerrado.


Havia uma dificuldade muito grande para se usar o solo do cerrado para a agricultura,
porque o conhecimento dos recursos naturais era muito limitado
e havia uma série de obstáculos.
.0
CERRADO MINEIRO

ria de quatro a sete meses. A temperatura é mais ou menos constante,


algo em torno de 22 graus. Nos meses chuvosos, ocorre o que chama-
mos de veranico, que é a interrupção desse período chuvoso, muito
prejudicial ao desenvolvimento das culturas.
A década de 70 marcou o início da revolução do cerrado. Havia uma
dificuldade muito grande de se usar o solo do cerrado para a agricultu-
ra, porque o conhecimento dos recursos naturais era muito limitado e
havia uma série de obstáculos, tais como: suprimento irregular de chu-
vas, baixa fertilidade dos solos, sistemas de produção ineficientes e
distância dos centros de consumo.
No entanto, havia uma grande extensão de terras aráveis e condi-
ções climáticas e topográficas apropriadas às principais culturas. Além
disso, em termos de estrutura física, também existiam solos adequados
à mecanização. Com a construção de Brasília, passou-se a ter uma
infra-estrutura básica, pois o eixo de desenvolvimento do País se des-
locou para essa região.
Uni aspecto importante a se considerar é a presença de calcário e
Cumpre destacar
fósforo na região. O grande desenvolvimento agrícola da área do cerra- algumas inovações
do foi resultado de uma combinação de políticas governamentais, as- tecnológicas
sisténcia técnica e uni grande investimento na área de pesquisa. O
importantes. A
Centro de Pesquisas do Cerrado, em Planaltina, foi criado dentro da
própria Embrapa e sistematizou todo o conhecimento adquirido até primeira delas foi a
então pelas universidades e instituições de pesquisa. O objetivo bási- construção da
co desse centro é resolver o problema da produção agrícola no cerrado. fertilidade do solo. O
A transformação de uma área praticamente ineficiente ou imprestável
em área própria para o uso agrícola tem sido considerada muito impor-
solo do cerrado é muito
tante no mundo atual, pois o Brasil conseguiu contrariar o processo pobre e deficiente em
normal, que é transformar terra boa em terra ruim. Nesse caso, uma magnésio, cálcio,
terra que não tinha utilidade para o uso agrícola foi transformada em fósforo e
área de grande aptidão para a agricultura.
Cumpre destacar algumas inovações tecnológicas importantes. A pri- micronutrientes.
meira delas foi a construção da fertilidade do solo. O solo do cerrado é
muito pobre e deficiente em magnésio, cálcio, fósforo e micronutrientes,
e foi preciso construir sua fertilidade.
Destaco o trabalho preponderante do setor de melhoramentos. A
plantação de soja é um exemplo muito importante. Cultivada apenas
nos Estados do Sul, em regiões de alta Latitude, devido à sensibilidade
ao fotoperiodismo, a soja foi desenvolvida para adaptar-se à região
dos trópicos, na parte central do nosso País. A tecnologia da fixação
biológica do nitrogénio foi muito importante, pois trouxe economia
para o Brasil e um grande bem para o meio ambiente, porque evita o
uso de adubos nitrogenados.
Destaco a plantação do milho para o solo ácido, desenvolvida na
Embrapa de Sete Lagoas. Trata-se de uma concepção diferente, que
busca o melhoramento de plantas para adaptá-las às condições de
estresse. Essa filosofia de trabalho é muito importante. Não podemos
c CERRADO MINEIRO

Se considerarmos a produção de grãos em Minas Gerais,


veremos que a participação do cerrado foi muito significativa.
A área do cerrado trouxe uma grande contribuição em termos de rendimento das culturas.
No período de 1975 a 2002, houve um aumento de 3,41%
na produção de grãos, e a área de cerrado foi
a grande responsável por esse crescimento em Minas.

negar o papel da braquiária, em termos de ocupação de ças entre os diversos cerrados: o Cerrado Oeste, o Cerra-
pastagens. do Norte, o Cerrado Central e o do Alto São Francisco.
A presença do café no cerrado era tida como impossí- Urna vez discutida a importância do cerrado e o aspecto
vel. Dizia-se que não seria possível cultivar o café em referente aos diferentes cerrados em Minas Gerais, chamo
solos com altitudes superiores a 600 metros, mas hoje a atenção para o que entendemos ser agricultura susten-
temos plantações em solos com altitude superior a mil tável. É um movimento que surgiu principalmente a partir
metros. No cenário internacional, o café plantado no da ECO 92, que engloba várias correntes de idéias. Apesar
cerrado é considerado o de melhor qualidade rio Pais. das divergências nos meios de concretizá-las, há uma gran-
Se considerarmos a produção de grãos em Minas Ge- de convergência nos meios para se alcançarem seus obje-
rais, veremos que a participação do cerrado foi muito tivos. Numa definição mais simples, a agricultura é consi-
significativa. A área do cerrado trouxe urna grande con- derada sustentável se simultaneamente satisfaz às neces-
tribuição em termos de rendimento das culturas. No pe- sidades do produtor e conserva os recursos naturais para
nodo de 1975 a 2002, houve uni aumento de 3,41% na a atual e as futuras gerações. Nesse contexto, o que pode-
produção de grãos, e a área de cerrado foi a grande res- ríamos considerar como grandes desafios para o desenvol-
ponsável por esse cresci- vimento sustentável ria área
mento em Minas.
Minas. de cerrado?
Observando-se o mapa "Os Uni deles seria o
Cerrados de Minas Gerais", desmatamento, que, embo-
feito pela Embrapa de Sete ra hoje aconteça em menor
Lagoas, com base em dados escala, ainda é considerado
econõmicos, percebe-se que um problema. Também são
a região é bastante hetero- problemas a mecanização in-
gênea: a caracterizaçao tensiva, com todas as ques-
ambiental é bem diferente, tões advindas da quebra de
os problemas são diferentes estrutura do solo; a faciti-
e as soluções deverão ser es- tação de erosão; a degrada-
pecificas. Essa observação é ção de pastagens; a
muito importante, pois não monocultura; o asso-
se pode falar em apenas um reamento de rios e reserva-
cerrado em Minas Gerais. Os tórios, decorrentes da in-
dados ressaltam as diferen- tensa mecanização e falta de

CERRADO MINEIRO

cuidados com o uso agrícola do solo; a poluição de ma- culturas. Esse sistema tem-se mostrado altamente eficien-
nanciais; o uso indiscriminado da água; o pouco cuida- te. Vem crescendo a adoção do plantio direto na região
do com as nascentes, campos de surgentes, veredas e do cerrado devido à sua grande eficiência no controle da
áreas de recarga, o que muito tem prejudicado o nosso erosão e à economia que representa para os agricultores.
potencial de água no Estado; e a agricultura familiar, Temos depoimentos, como o de um representante do
que não tem tido o desenvolvimento esperado, dada a Clube de Amigos da Terra de Rio Verde, em Goiás, em que
dificuldade de ser implantada numa área de solos pobres ele se mostra feliz por sua terra ter melhorado, estar pro-
e a de ser inserida no mercado. duzindo e, ao mesmo tempo, conservando o meio ambi-
Algumas iniciativas que têm ocorrido na área do cerra- ente. Os agricultores interessados em expandir o plantio
do merecem registro. Não existe sustentabilidade absolu- direto formam uma associação. Isso já acontece em Mi-
ta nem um pacote que garanta que a nossa área e o nosso nas e em várias regiões do Pais.
sistema de produção serão sustentados se adotarmos as Hoje pensa-se muito no aumento da agrodiversidade.
mesmas experiências aqui. Há alternativas que são utiliza- Os sistemas integrados - agricultura e pecuária - estão
das dependendo das circunstâncias ambientais e tendo grande repercussão. O Sistema Santa Fé foi desen-
socioeconômicas. Temos de selecionar a melhor alternati- volvido pela Embrapa Arroz e Feijão, em Goiânia, e con-
siste na consorciação de gramíneas de pastejo com cu[-

ír -;i •
va para cadd momento. Precisamos pensar qionalmente e

1
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agir localmerite. Isso veio da ECO 92. Minas Gerais já estáturas de milho e soja. Esse sistema tem sido muito efici-
ente na recuperação de pastagens e na produção de
atuando regionalmente no ánibito das bacias, fazendo o
grãos. É uma grande oportunidade, considerando a ex-
elo entre o local e o global. Um critério extremamente
tensa área de pastagens degradadas em Minas Gerais. É
importante na escolha do negócio é a capacidade de su-
porte ambiental da área que será utilizada. uma fronteira interna, na qual poderemos recuperar as
pastagens e produzir grãos.
Há um sistema de produção que tem sido uma grande

revolução no País e que chegou ao cerrado: o plantio Embora não sejam muito comuns, os sistemas
agroflorestais têm sido utilizados paulatinamente com
direto. Em Minas Gerais está indo muito rápido, mas deixa
sucesso em algumas regiões, com o aproveitamento de
muito a desejar. O plantio direto não usa arado nem gra-

de, é feito diretamente na palha, nos restos da cultura espécies nativas e exóticas. Essa iniciativa tem tido um
número cada vez maior de adeptos em Minas Gerais na
anterior. Deixa-se uma cobertura no solo, durante o ano

inteiro, tendo-se como pressuposto básico a rotação de área do cerrado.
C, CERRADO MINEIRO

Os dejetos de suínos também tem sido utilizados na


produção de grãos e pastagens. É a transformação de um
passivo ambiental em insumo, garantindo mais qualida-
de ambiental. A agricultura orgânica, que tem tido gran-
de demanda nos últimos anos, embora em pequenas áreas
e em nichos específicos, é uma alternativa bastante
entusiasmante no tocante à redução de uso de insumos.
O manejo integrado de pragas combina controle bioló-
gico, práticas mecânicas e culturas com princípios que
controlam insetos, pragas ou ervas daninhas.
O que temos tentado hoje é enfatizar que o agricultor
pode "produzir água". A agricultura é sempre apontada
como a grande culpada do problema da água, principal-
mente em áreas de cerrado. Acreditamos que a melhor
maneira de aumentar a água de nossos mananciais é o
enfoque hidroagrícola, em que o agricultor considere a
água como uni de seus produtos e dê tratamento ade-
quado ao solo, facilitando a infiltração. A agricultura é
o único segmento que consegue produzir água limpa. É
1
claro que o uso racional da água é de responsabilidade
de todos. A água não é usada só na irrigação, mas tam-
bém na cidade, na geração de energia, etc. Portanto,
todos têm de se envolver corri sua preservação.
A Embrapa Cerrados tem investido muito em novas al-
ternativas. Apesar de não vir tendo grande repercussão,
o investimento em pesquisas que propiciam maior proxi-
nridade com os produtores pode ser uma alternativa bem
interessante, principalmente para a agricultura familiar.
Devemos esquecer o desenvolvimento setorial e passar
a considerar o desenvolvimento territorial. O espaço ru-
ral é usado para ecoturismo, para a instalação de indús-
trias, para artesanato, etc. Atualmente, a visão do espa-
ço rural é multissetorial - daí a ênfase no desenvolvi-
mento territorial.
Aleni de ser gerente sob o aspecto economico, o pro-
dutor, atualmente, tem de ter uma visão do gerenciamento
ambiental, para que possa atender às futuras gerações.
Associamos a idéia a um banquinho de três pernas. Se
unia delas está mais curta, o banquinho não se sustenta-
ra. Lembramos que, para preservar a sustentabilidade do
cerrado, é necessário haver equilíbrio entre a preserva-
ção, o bem-estar e a renda.
Como nosso intuito é provocar, listei alguns pontos
interessantes para discussão. Poderíamos chamar esse
iteni de apoio ás iniciativas existentes: estimular, na maio-
ria dos municípios ou regiões, a criação dos Clubes Ami-
CERRADO MINEIRO

gos da Terra (CATs), que se dedicam ao plantio direto; gar a produção do cerrado à proteção ambiental. Se con-
apoiar as cooperativas agroextrativistas para fortalecer seguirmos mostrar que a produção do cerrado é
principalmente a agricultura familiar; apoiar, com crédi- ambientalmente correta, teremos grande vantagem eco-
tos e incentivo fiscal, os municípios que já implantaram nômica no mercado externo. Vemos ainda como neces-
programas de preservação ambiental. sária a intensificação do uso agrícola sustentável em áreas
Entre os pontos de discussão, podemos enumerar os já em exploração.
seguintes: investimento em sistemas produtivos basea- Volto a destacar, no aspecto da integração entre agri-
dos na preservação e na valorização da biodiversidade; cultura e pecuária, a quantidade de pastagens em áreas
investimento no produtor rural, como guardião do de- de cerrado degradadas que temos no Estado. Um progra-
senvolvimento sustentável; valorização dos conhecimen- ma de crédito especial para desenvolver um sistema de
tos e dos recursos existentes na região; educação integração seria uma maneira muito adequada de au-
ambiental, enfatizando a região do cerrado; maior co- mentar a produção de grãos, carne, leite e fibras sem
nhecimento do ambiente e de suas restrições; estudo de derrubar uma árvore. Outro ponto seria um seguro agrí -
solo e das essências nativas e zoneamento climático para cola compatível com as condições de risco envolvidas
indicar a época de menor risco para se plantar; desen- nessa região.
volvimento de alternativas econômicas em espécies cul- Passando à questão do desenvolvimento territorial e
tiváveis adequadas às condições de estresse da região: não setorial, sugiro a criação de uma Agenda 21 para o
solos mais ácidos, solos mais pobres e clima mais árido; cerrado mineiro. A Agenda 21 é um documento elabo-
exploração dos recursos naturais existentes, especialmen- rado sob a coordenação do Ministério do Meio Ambi-
te das essências nativas. ente e contempla uma parte específica sobre agricultu-
As propostas mais urgentes em relação aos recursos ra sustentável, feita mediante ampla consulta a todos
hídricos são as seguintes: recuperação e proteção de os Estados. Poderíamos pinçar muitos pontos da agen-
nascentes, veredas e matas ciliares; manejo específico da nacional e complementar com especificidades do
para áreas de recarga, que reabastecem nossos lençóis e nosso cerrado.
que não têm sido devidamente contempladas; uso racio- Cumpre destacar os seguintes tópicos: programas de
nal dos recursos hídricos, contemplando seu aspecto de recuperação de pastagens degradadas, programas de re-
multiuso; estímulo ao sistema de produção que enfoca a cuperação e proteção de nascentes, veredas e matas
produção hídrica e agrícola. ciliares e programas regionais de desenvolvimento sus-
Todas as estratégias que mencionei e outras que pode- tentável. Essa idéia de desenvolvimento regional veio à
mos ainda selecionar em cada região deveriam ser baila porque chegou-se à conclusão de que é muito difí-
divulgadas para que tenham chance de ser adotadas por cil para o município sozinho trazer o desenvolvimento
maior número de pessoas. para si; ele tem de se agregar a regiões com afinidade
Outras propostas: promover o intercâmbio regional de geográfica, cultural e econômica. Uma linha especial de
produtores, para trocarem experiências de sucesso, e o apoio a esse trabalho, que contasse com a possibilidade
treinamento de mão-de-obra; implementar campanhas de de assessoria e consultoria, faria muito bem a toda a
divulgação e de conscientização, com o objetivo de li- região do cerrado.

Devemos esquecer o desenvolvimento setorial


e passar a considerar o desenvolvimento territorial.
O espaço rural é usado para ecoturismo, para a instalação de indústrias,
para artesanato, etc. Atualmente, a visão do espaço rural é mutissetorial
- daí a ênfase no desenvolvimento territorial.
ASVERTENTESSOCIALE ECONÔMICA
Maria Luíza de Aguiar Marques
Diretora do Centro de Estudos Econômicos e Sociais da Fundação João Pinheiro
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[te tetc, L1iteToItemente dos demais, focaliza as pessoas que vivem no cerrado mineho. Os dauos que neLe
aparecem são baseados no "Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil", trabalho da Fundação João Pinheiro, junto
com o Ipea e o Pnud, um ramo da ONU. Desenvolvemos esse trabalho há bastante tempo. Trata-se de um conjunto de
mais de 125 indicadores para todos os municípios brasileiros.
As questões serão tratadas por município, focalizando as condições sociais e econômicas da população que vive
na área. O foco principal serão as três dimensões da condição de vida das pessoas: a saúde - e aí enfocaremos a
expectativa de vida ao nascer -, a renda e o nível de educação. Essas dimensões formarão um índice, que será objeto
de nossas considerações antes de passarmos a cada uma das três em separado. Finalmente, será apresentado um
desafio para cada uma delas.
O atlas está disponibilizado na internet, e todos podem acessá-lo. É um conjunto de indicadores para todo o
Brasil. Veremos os dados sobre Minas Gerais e, depois, os dados específicos sobre o cerrado mineiro. Falarei separa-
damente sobre educação, longevidade e renda, três itens que compõem o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),
que varia de zero a um. Quando o IDH está abaixo de 0,5, o desenvolvimento humano é baixo; entre 0,5 e 0,79, é
médio; e de 0,8 a 1, é alto.
.Ç1 CERRADO MINEIRO

T Se observamos um mapa que mostra a situação do


: cerrado em 1991, encontramos grande diversidade
em te!mos de vegetação, de ocupação humana e de
condições de vida da população. Em 1991, o cerra-
i
do ainda não tinha municípios com alto desenvol-

è vimento humano, apenas com médio e baixo.


Em 2000, ocorre uma melhora muito grande. Au-
menta o numero de municípios com alto desenvol-
vimento humano. Assim como Minas Gerais é uni bom
retrato da diversidade do País, o cerrado também
^1
;1 apresenta grande variação de situações. É como se
fossemos da Polônia - 36 1 lugar na colocação mun-
dial do 10H - até Botsuana, que ocupa o126 0 lugar.
Se atentarmos para um gráfico que representa o
10H de todos os municípios, em 1991 e em 2000,
1 percebemos o desenvolvimento ocorrido no peno-
do. Comparando com a média no Estado, verifica-
nos que, em 1991, cerca de lS°/o dos municípios do
cerrado eram melhores do que a média de Minas; em
2000, o percentual de municípios acima da média
1. de Minas é muito maior. O desenvolvimento humano
dos municípios do cerrado, em geral, deu-se de for-
ma mais acelerada do que a média do Estado.
Na verdade, nenhum dos municípios apresenta o
iriesmo desenvolvimento alcançado por São Caeta-
no do Sul - cidade com o 10H mais alto do Pais. No
ntrno médio decrescimento apresentado entre 1991
2000 pelos municípios brasileiros, Indaiabira le-
varia 45 anos para chegai à situação de São Caeta-
rio do Sul, e Uberaba levaria dez anos para chegar à
niesrna situação.
Considerando a evolução de cada um dos índi-
ces, veremos que o comportamento é bastante di-
ferenciado. Comparando dados de 1991 e de 2000,
li verificamos que o desenvolvimento mais generali-
zado ocorreu na educação. A dimensão da educa-
A mortalidade infantil é um complemento ção leva em conta a taxa de analfabetismo e o acesso
da expectativa de vida ao nascer. a escola, e o que ocorreu nesse período foi a ampli-
A meta do milénio, estabelecida pela ONU, ação do acesso à escola, basicamente pela popula-
é que, em 2015, o Brasil ção adulta. O ensino fundamental foi o grande

tenha 17 mortes impulsor desse avanço, movido pelo Fundef.


No que se refere à expectativa de vida, a compa-
para cada mil crianças nascidas com vida.
ração entre os dados de 1991 e de 2000 mostra
Alguns dos municípios do cerrado
já atingiram essa meta,
que a situação está melhor também nesse aspecto.
A retida é que mostra um comportamento bastante
mas a grande maioria está longe de atingi-Ia. distinto: apesar da mudança razoável sinalizada pe-
CERRADO MINEIRO '--)

T Verifica-se que as gerações mais jovens têm mais faci-


lidade de acesso ao sistema educacional. Espero que isso
signifique potencial melhor para o futuro. Mas ainda te-
mos uma dívida muito grande para com a geração acima
»b 4'' •\ i
de 25 anos.
O segundo aspecto diz respeito ao acesso á escola. Con-
siderando o percentual de crianças entre 7 e 14 anos que
freqüentam a escola, concluímos que o acesso à escota está
quase universalizado. Mesmo o pior município tem quase
900/o das suas crianças nessa faixa etária na escola, enquan-
to os melhores municípios têm menos de S e/o fora da escola.
Poucos lugares estariam apresentando problemas nesse as-
pecto. Um problema é o atraso de crianças que deveriam
estar no ensino fundamental e continuam na pré-escota. Os
dados não são, porém, muito significativos.
Quando focalizamos a população de 15 a 17 anos, ve-
rificamos que a situação é pior. Há municípios com 45%
de seus adolescentes fora da escola; os que estão em
melhor situação têm de lS% a 20°I. Portanto, o acesso
dos adolescentes à escola não está tão universalizado
[os dados, ainda é muito baixo o desenvolvimento hu- quanto o das crianças de 7 a 14 anos. Também nessa
mano nesse aspecto. Somente São Gotardo apresenta, faixa etária se verifica o atraso escolar: os adolescentes
em termos de renda, um índice acima de 0,8. estão no ensino fundamental, e não no médio, onde de-
Numa comparação entre todos os municípios do cerra- veriam estar. Isso aponta para dois problemas, a serem
do, verificamos que a dimensão da educação foi a maior avaliados: primeiro, a ampliação do acesso dos adoles-
responsável pelo crescimento dos índices de IDH. O cer- centes à escola; segundo, a garantia de que, ao saírem
rado engloba 233 municípios. Em 50 deles, o crescimen- do fundamental, os adolescentes terão acesso ao ensino
to da dimensão da longevidade, na década de 90, foi médio.
maior do que o das outras duas dimensões. Em oito mu- Outro aspecto considerado no IDH é a esperança de
nicípios, a renda teve maior participação. No restante vida ao nascer. A mortalidade infantil é um complemento
dos municípios, a educação foi o fator mais importante da expectativa de vida ao nascer. A meta do milênio,
para o desenvolvimento humano. Em termos relativos, estabelecida pela ONU, é que, em 2015, o Brasil tenha 17
houve um crescimento bastante significativo na área, mortes para cada mil crianças nascidas com vida. Alguns
que pode ser considerado maior do que a média do Esta- dos municípios do cerrado já atingiram essa meta, mas a
do, mas permanecem muitos desafios. grande maioria está longe de atingi-ta.
Em educação, chamo a atenção para três aspectos. O Finalmente, se levamos em conta a dimensão da po-
primeiro refere-se à escolaridade da população. O 10H breza, verificamos que é enorme a disparidade de renda:
trata do analfabetismo. Existem dois tipos de analfabe- há rendas altas e rendas muito baixas. Na maioria dos
tismo: o funcional, em que o indivíduo possui apenas municípios, os lO a/o mais ricos da população possuem
quatro anos de estudo, e o fundamental, em que não 500/o da renda. Os 200/o mais ricos apropriam-se de 70%
possui o curso fundamental completo. Nesse caso, a si- da renda do município, e os 20°/ mais pobres, de menos
tuação seria muito pior. A parcela da população adulta de 2%. Se juntarmos renda baixa com alta desigualdade,
acima de 25 anos que não tem quatro anos de estudo é o resultado será pobreza. Dados de 2000 apontam altos
muito grande, em todos os municípios. A que não tem índices de pobreza na região: mais de 50% da população
oito anos de estudo é enorme, variando entre 30% e é considerada pobre, ou seja, possui uma renda per capita
90/o. A situação é muito ruim. abaixo de meio salário mínimo.

(()
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L. A

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ALysson PauUneIt.i
Ex-Ministro de Estado da Agricultura

CERRADO MINEIRO

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437

Minas foi pioneira na dutivo e na sua própria renda foi observada. Essa mu-
conquista do cerrado. O dança foi fundamental. A agricultura brasileira, até a
governador Israel Pinhei- década de 60, tinha um conceito: o homem procurava a
es- terra fértil, desmatava-a e ali implantava seu sistema pro-
tadista, foi o primeiro ho- dutivo. Com poucas informações tecnológicas, buscava
tftL mem público a vislumbrar quase exclusivamente transferir pacotes tecnológicos de
a potencialidade do cer- uma agricultura temperada e milenar, que se desenvolveu
rado brasileiro. Se, em sua especialmente no Hemisfério Norte.
gestão como governador, Com as revoluções da década de 30, especialmente após
de 1967 a 1971, tivesse tido mais condições, ele teria a crise de 1929, países ricos e desenvolvidos passaram a
feito a grande e pioneira mudança. buscar o equilíbrio de suas ações e a investir maciça-
A chamada evolução do desenvolvimento do cerrado mente em ciência, tecnologia, infra-estrutura e organi-
brasileiro deve ser vista como um ato político de mu- zação social, especialmente no desenvolvimento das cha-
dança. Na realidade, unia incontestável mudança do ho- madas megaempresas multinacionais de comércio, O Bra-
mem no seu trabalho, na sua ação, no seu sistema pro- sil, país subdesenvolvido, sem conhecimento próprio de
Ç CERRADO MINEIRO '7

De acordo com o laureado pesquisador


e detentor do Prêmio Nobel da Paz
Dr. Norman Borlaug,
a segunda e grandiosa
revolução mundial
se processou no Brasil
na área dos cerrados.
O que se propõe discutir aqui
é o prosseguimento de uma revolução
benéfica ou a sua interrupção.

()IHhço( de trabalho, [o:alizade rluriid te,- etavaiii Limitad',. A epii populaçao brasilena cre
pical e subtropical, ora úmida, ora semi-árida, não tinha geometricamente.
capacidade competitiva. Portanto, a ação do homem era Foi então que ocorreu a chamada virada de 68, mo-
buscar as chamadas terras férteis, desmatá-las e utilizá- mento em que se acendia uma luz vermelha para os gran-
las o máximo possível, com o conhecimento transferido des líderes que, esquecidos dos relatórios de Maithus, já
da produção, que sempre entrava em declínio. empoeirados, angustiadamente procuravam indicações
Malthus não estava errado quando advertiu as grandes e soluções para o problema. Participei, em 1974, como
lideranças mundiais para o fato de que o mundo passaria chefe da delegação brasileira, da Primeira Conferência
por um período de carência alimentar. Em suas proje- Mundial do Alimento, em que 168 países foram discutir
ções, ele e seus seguidores mostravam que a curva abertamente as possibilidades do abastecimento e da
demográfica estava muito mais ascendente do que a ciii- produção de alimentos no mundo. Naquela altura, o Bra-
va da produção de alimentos. Em 1968, tendo coincidi- sil já tinha uma informação para levar à conferéncia, pelo
do a grande inclinação positiva da curva demográfica pioneirismo de Minas Gerais, pela ação coordenada de
com um desequilíbrio do clima no Hemisfério Norte, o seus órgãos institucionais: o BDMG: a Secretaria de Agri-
mundo deparou com o risco da fome mundial. Era a grande cultura, apoiada, naquela época, na Acar, hoje Emater; o
oportunidade para os países subdesenvolvidos. Se não Pipaemg, hoje Epamig: e a Embrapa.
tinham capacidade competitiva, por não deterem Diziam ao mundo que poderiam surgir mudanças. No-
tecnologia própria e, especialmente, por não possuirem vas áreas consideradas incultas, inférteis, poderiam ser
áreas férteis e ricas suficientes, tinham suas produções transformadas em novos mananciais. É verdade que essa
estagnadas. conferência pouco respondeu àquela comunicação. O
Havia necessidade de novos e arrojados projetos. O Brasil não tinha nenhuma importáncia relativamente ã
Brasil, um pais de dimensões continentais, já havia ocu- produção de alimentos; ao contrário, era clemandador.
pado, fora da Amazônia, praticamente todas as áreas de Não houve nenhuma resposta ás propostas que entusias-
grande fertilidade, suas várzeas, especialmente suas ter- ticamente levamos daqui: a criação de um banco inter-
ras-roxas, localizadas no Paraná, no Rio Grande do Sul, nacional para financiar a produção em países subdesen-
em Santa Catarina, em São Paulo e em pequena faixa de volvidos e o direito de saque para formação de estoques
Minas Gerais e de Goiás. Portanto, nossas perspectivas reguladores.
CERRADO MINEIRO

Nossa experiência em ocupações programadas,


como a criação das chamadas
áreas condominiais contínuas,
é um exemplo de que é
muito mais benéfica
a preservação do bioma,
o manejo racional dessas áreas,
do que a simples reserva de 20%,
muitas vezes impossível de ser fiscalizada.

- .

Nosso entusiasmo provavelmente foi recebido com Faço apenas um comparativo com tradicional agri-
muita apreensão e raiva por países como Estados Uni- cultura desenvolvida no mundo, a chamada agricultura
dos, Canadá e França, que não gostarani de abrir oportu- temperada, evolução de dois milênios, para colocar paí-
nidades às nações subdesenvolvidas. Apesar disso, as ses como grandes supridores e produtores de alimentos
mudanças indicadas naquela conferência foram realiza- no mundo. Aqui no Brasil houve uma verdadeira revolu-
das. O País estava organizado economicamente. Fez uma ção ao se criar uma nova agricultura, com novos
opção de investimentos com base nas experiências reali- parâmetros e novas responsabilidades em menos de 30
zadas com produtores em Minas Gerais. A Faemg foi uma anos.
parceira importante nessas mudanças. De acordo com o laureado pesquisador e detentor do
Os agricultores do Triângulo Mineiro que aceitaram o Prémio Nobel da Paz Dr. Norman Borlaug, hoje com 86
desafio inovador de realizar aquela profunda mudança, anos, a segunda e grandiosa revolução mundial se pro-
de não abandonar sua produção nas terras-roxas origi- cessou no Brasil na área dos cerrados. Em 1997, disse,
nárias do diabásio e do basalto, mudaram seus concei- enfaticamente, para 250 agrónomos em São Paulo que
tos e ocuparam uma terra pobre: o cerrado. Usaram as nem o governo nem o brasileiro tinham conhecimento
poucas informações de que dispunham, fazendo investi- disso. O que se propõe discutir aqui é o prosseguimento
mentos na correção, na fertilização e no manejo de nova de uma revolução benéfica ou a sua interrupção, o que,
agricultura tropical de uma região inóspita. a meu ver, seria um debate improdutivo.
Na verdade, aconteceu uma mudança política. Primei- Tranqüiliza-me a exposição do Dr. Derli Prudente quanto
ro, o governo se dispôs a acreditar na capacidade de ao que se deve considerar no cerrado. Ele representa uma
mudança desse homem. Fez a seleção com base em segu- instituição de pesquisa respeitada internacionalmente, que
ras informações vindas de Minas Gerais, do Projeto comandou a chamada revolução verde. Por meio dos tra-
Polocentro. À época, foram disponibilizados US$ 3 bi- balhos da Embrapa, de seus projetos e de suas ações, ava-
lhões, que nos possibilitaram, ainda na década de 70, lio permanentemente o que está acontecendo no País. É
ocupar cerca de 3,2 mil hectares de cerrado em sistemas necessário que a sociedade brasileira também tome co-
produtivos de grãos, de florestas e de pastagens, com o nhecimento disso. É preciso afastar os extremismos de
apoio das instituições de pesquisa, que inovaram com afirmações, muitas vezes sem fundamento, de que estamos
grande velocidade. acabando com o bioma do cerrado brasileiro.
CERRADO MINEIRO

• -«.:- •-- e agora o vê como busca de áreas viáveis e sua transfor-


mação. Esse é o conceito coni que deve ser encarado o
cerrado. Tenho certeza de que, dessa forma, iremos de-
parar com novas tecnologias já pesquisadas.
n
*j- Sou um entusiasta do plantio direto, de tecnologias
simples e inovadoras geradas pela Embrapa, como a
1 integração entre a lavoura e a pecuária, e tenho insisti-
do no aproveitamento das pastagens artificiais. Minas
Gerais, Estado pioneiro, deveria assumir a liderança les-
sa atividade. Segundo a Embrapa, há no País cerca de 50
milhões de hectares de pastagens artificiais, sendo que
8 milhões podem ser considerados razoáveis e bons, com
uma média de ocupação de 1,5 até dois animais por
hectare; 2 milhões de hectares estão sendo anualmente
transformados em áreas produtivas, e 40 milhões de hec-
tares, em áreas de pastagens degradadas.
Sou uni entusiasta da integração entre lavoura e pecu-
Na. drtL'ei da elaboraao
(Li ponta ária. Não estou falando de panacéia nem de riscos, mas
- que estabelecia regras para a ocupação dessas áreas. de fatos que estão acontecendo no Brasil. lima das áreas
Cabe á Assembléia, como fiscalizadora eficiente que tem mais difíceis de manejo, a chamada região do arenito
de ser, saber se estão sendo respeitados os 200/o de reser- caiuã, que fica no sul do Mato Grosso do Sul, em uma
vas na região onde rios encontramos para que esse bioma parte do Paraná e em pequena parte de São Paulo, só
seja preservado. Creio que é aumentada a responsabili- podia ser explorada em pecuária, assim mesmo com um
dade do poder público, da Assembléia e do Executivo, manejo limitado. Há quatro anos, cada hectare daquelas
em prover meios, especialmente das entidades terras valia não mais do que R$ 500 ou R$ 600. Com a
fiscalizadoras localizadas na Secretaria de Meio Ambien- implantação da tecnologia da integração da lavoura com
te, na Secretaria de Agricultura e em seus órgãos de ex- a pecuária, já estão tirando, por hectare, até 70 sacos
tensão, para que sejam guardadas as proporções exigidas de soja e 125 de milho, e, nos seis meses restantes do
em lei e para que essas áreas sejam mantidas intactas. período frio e não chuvoso, colocam de três a quatro
Nossa experiência em ocupações programadas, como a
criação das chamadas áreas condominiais continuas, é
um exemplo nítido de que são muito mais benéficos a Hoje o uso racional do cerrado
preservação do bioma e o manejo racional dessas áreas
para a preservação do bionia do que a simples reserva de
não lança mão do fogo.
Ao contrário, protege as áreas ambientais,
20%, muitas vezes irnpossrvel de ser fiscalizada. O cerra-
do bem manejado apresenta condições muito mais in- sabe preservar o solo.
tensas de vida de uni bioma renovado e de uma fertilida- Essa foi uma mudança fundamental
de não antes encontrada. O cerrado brasileiro sofreu de- de conceito do homem,
mais desde os primórdios, antes do descobrimento, quan- que antes via o processo produtivo
do os índios usavam o fogo como meio de controle das como busca de área fértil e
pastagens.
Hoje o uso racional do cerrado não lança mão do fogo.
uso de seus recursos naturais
e agora o vê como busca de áreas viáveis
Ao contrário, protege as áreas ambientais, sabe preser-
var o solo. Essa foi urna fundamental mudança de con- e sua transformação.
ceito do homem, que antes via o processo produtivo
como busca de área fértil e uso de seus recursos naturais
CERRADO MINEIRO ¶ T.
.,,

animais por hectare, extraindo dali de seis a oito arrobas tares de pastagens ao ano. Se o governo Lula tomar a
de carne, praticamente de graça. decisão agora, pode deixar em recuperação das pas-
25/o
Isso coloca o produtor brasileiro em indiscutível van- tagens degradadas do Brasil, aumentar a produção de
tagem sobre qualquer competidor, na área de soja, mi- grãos em 26 milhões de toneladas e colocar a produção
lho, algodão, feijão, outros grãos e leguminosas. Se to- brasileira em indiscutível capacidade de competição em
mássemos hoje uma decisão política, como foi possível preço e qualidade.
em 1974, seria ótimo. O governo brasileiro não dispõe Embora a mídia seja propensa a distorcer a realidade
facilmente de US$ 3 bilhões e não poderia ir às institui- da agricultura e do agricultor nacional, o cerrado brasi-
ções dominadas pelos Estados Unidos e pela Europa, leiro hoje é a mais competitiva, potente e sustentável
porque elas, apavoradas, iriam negar. Mas uma negocia- agricultura do mundo. Tinha razão o Dr. Norman Borlaug
ção séria com Japão, China e Coréia promoveria a venda quando, na exposição aos 200 agrônomos de São Paulo,
antecipada de USS 3 bilhões e seria um investimento dizia que até então tinha dor ria consciência porque,
nessa integração. mesmo que tenha sido realizada a primeira revolução ver-
Só que os dados são outros. Aqueles que nos ajudaram de, sabia que a agricultura no mundo era feita de forma
a montar o projeto Polocentro sabem que tivemos de distrófica, por uma ação do homem destruindo a nature-
fazer crédito de até 12 anos, e os dois primeiros anos za, exaurindo os recursos naturais que recebeu.
eram considerados de investimento. Então, seria grande Após conhecer o que se passa no Brasil, ele afirmou
sacrifício do governo transferir US$ 3 bilhões de longo que poderia morrer tranqüilo e usou uma expressão mui-
retorno. Na integração lavoura-pecuária, esse crédito é to conhecida em Minas Gerais: "Terra de fazer longe e
pouco mais que um custeio: 800/o retornam em seis meses transformá-la na mais produtiva e competitiva do mun-
e 20°/ são investimentos em máquinas e armazéns. do". Está em nossas mãos falar sobre a agricultura sus-
Isso pode ser feito sem nenhum susto por meio de um tentável e sua capacidade de manter o bioma intacto,
estudo de viabilidade econômica, com um retorno máxi- respeitando a lei. Na área onde é permitida a sua utiliza-
mo de quatro anos. Significa que, se na época gastamos ção, ela deve ser racional.
em média US$ 1.000 por hectare de cerrado, na Tenho certeza de que o São Francisco não irá morrer,
integração lavoura-pecuária gastei não mais que US$ 300 porque a agricultura sustentável fará aquilo que o nosso
por hectare para produzir uma média de milho superior à cerrado não fez, ou seja, transformar-se em um coletor
que sempre produzi. E hoje estou fazendo engorda de das águas das chuva. A Embrapa tem projetos de coleta
novilhos nas pastagens que restaram. de águas de chuva tão simples, baratos e corriqueiros
Alerto apenas para o fato de que esse é um custeio que transformarão a nossa angústia pelas mortes dos rios
que pode retornar ao caixa em seis meses, e o restante em recolocações de novas nascentes permanentes, redu-
em investimentos em máquinas e armazéns. Conclusão: ção de enchentes e manutenção de vazões mais apreciá-
US$ 3 bilhões dariam para recuperar 3 milhões de hec- veis nos períodos secos.

Sou um entusiasta do plantio direto, de tecnologias simples e inovadoras


geradas pela Embrapa, como a integração entre a lavoura e a pecuária,
e tenho insistido no aproveitamento das pastagens artificiais.
Minas Gerais, Estado pioneiro, deveria assumir a liderança nessa atividade.
Ç CERRADO MINEIRO

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Í9

DE DESENVOLVIMENTO
Meu enfoque serão as ações do
IEF, órgão responsável pela políti-
ca florestal em Minas, no cerrado
mineiro. Segundo as possibilidades
de recursos humanos, financeiros e
materiais, o JEF vem desenvolven-
do um trabalho extraordinário no
controle do desmatamento. dos in-

José do Carmo Neves cêndios florestais, nos programas de


floresta de produção e floresta de
Assessor de Desenvolvimento Florestal do proteção. Além de atuas como ór-
Instituto Estadual de Florestas gão fiscalizador, é dele também esse
papel importantíssimo de formação
de florestas de produção e de pro-
teção.

IM
CERRADO MINEIRO

ambiental do aproveitamento racio-


ial do cerrado. Outra, ainda, seria a
1.. laboração de uma legislação
mbiental que estabelecesse, com
apoio e estímulo, um programa de
O cerrado precisa
desenvolvimento sustentável do cer-
de um programa racional
rado. Deveria ser uma Legislação ob-
de desenvolvimento jetiva, clara e realista para o cerrado
sustentável, mineiro, abrangendo os aspectos
baseado nos geradores econômicos, sociais e ambientais.
de benefícios Finalmente, a educação ambiental.

econômicos, Nada disso acontecerá, dentro do


que o cerrado pode nos oferecer, se
ambientais e sociais. não realizarmos um trabalho básico
de educação ambiental, principal-
mente junto aos produtores rurais.
Abordaremos emprego, renda e
melhoria do meio ambiente.
No aspecto econômico estão a
Engana-se quem diz que o IEF só hídrica e a recuperação de área de- poupança dos produtores rurais, com
se preocupa com eucalipto. Temos gradadas. Também estamos trabalhan- suas atividades agrossilvopastoris, e
um programa executado em todo o do com esses projetos nas bacias do a valorização de suas propriedades.
Estado, o Programa Fazendeiro Flo- Rio das Velhas e do Rio Araçuai e, No ambiental, a proteção do solo, da
restal, que nasceu em Minas e hoje é esporadicamente, em propriedades água e das matas nativas. Segundo
modelo de reflorestamento para as rurais de modo geral. Em breve, da- pesquisas, um hectare de eucalipto
nações em desenvolvimento, aplica- remos início, por meio de um pro- no cerrado protege seis hectares de
do pela FAO. Nesse programa, traba- grama que abrange Minas e outros matas nativas. O aspecto social in-
lhamos com florestas com eucalipto dez Estados da Federação, ao Plano clui emprego, associativismo e fixa-
e com florestas nativas. A opção é de Ação Nacional de Combate à ção do homem no campo.
do produtor rural, e não do IEF. O Desertificação, em que o cerrado será Isso é o que pensamos e conhece-
eucalipto, por suas qualidades excep- uma das prioridades. mos sobre o cerrado. Apelo a esta Casa
cionais, é o preferido pelos produ- O cerrado precisa de um programa e às instituições governamentais e
tores rurais. racional de desenvolvimento susten- não-governamentais que proponham
Na floresta de proteção, trabalha- tável, baseado nos geradores de be- a valorização do cerrado, dando-lhe
mos com as matas ciliares, com as nefícios econômicos, ambientais e um programa claro, objetivo e rea-
florestas de recarga hídrica e na re- sociais. Há alguns aspectos que julgo lista, de acordo com sua vocação. É
cuperação de áreas degradadas. A prioritários. Um deles é implantar a um desafio. Mas é compatível com
base de todo o nosso trabalho é a atividade agrossilvo pasto ri 1 em uma os mineiros, detentores de conheci-
educação ambiental. Na Secretaria de agricultura tecnificada". Ao lado dis- mentos técnicos, além da capacida-
Meio Ambiente, no Igam, na Feam e so, é preciso desenvolver o programa de de adaptação e improvisação dos
no IEF, nossa ação primordial está de agricultura familiar. Não há neces- produtores rurais. Esse programa é
voltada para a educação ambiental. sidade de desmembrar essas duas ati- necessário porque estamos discutin-
Já estamos iniciando os trabalhos vidades, que podem ser muito bem im- do e ouvindo muitas heresias de ex-
no projeto de revitalização do Rio plantadas e sustentadas no cerrado. tremos, que apenas nos preocupam e
São Francisco, com a proteção de Outra prioridade seria a proteção desagradam. O cerrado é um bioma
matas ciliares, matas de recarga da biodiversidade. Esse é o aspecto que poderá enriquecer os mineiros.
CERRADO MINEIRO

A IMPORTÂNCIA DO EXTRATIVISMO
E DA AGRICULTURA FAMILIAR
:1.

\'. \

Minha exposiçao se relaciona aos moradores que so- segunda ocupaçao foi na década de 70, quando foam
breviveni na região dos Gerais, os chamados geraiseiros. desenvolvidas políticas para o cerrado. Ele foi olhado
O pequi é o símbolo da riqueza natural do cerrado. Ele é como um vazio econômico, como se ali não houvesse
reconhecido mundialmente como o rei da vitamina A. gente. Ali existe uma grande população de geraiseiros,
Quando falamos do cerrado, estamos falando de toda a com uma cultura muito rica de sobrevivência. Para pen-
riqueza natural que ali existe. São várias frutas e plantas sarmos no cerrado hoje, temos que pensar na população
medicinais bastante utilizadas pela população local. que Lã sobrevive, que tem de ser ouvida.
No que se refere à ocupação do cerrado, já passamos Hoje, pairam várias ameaças sobre o cerrado. Histori-
por três etapas. A primeira foi quando os portugueses camente, ele predomina em mais de 50 01 do território
chegaram ali e não consideraram o índio como gente. A mineiro. A partir da década de 7J, governos mineiros e
Ç CERDO MINEIRO

Aparecido Alves de Souza


Diretor da Cooperativa Agroextrativista Grande Sertão

brasileiros promoveram políticas de ocu- •qua. Cito também as grandes carvoeiras,


pação do cerrado por meio de diversos pro- r odutoras de carbono.
gramas, que já foram citados. Houve a ex- Hoje o cerrado está sendo ocupado pela
pansão de monoculturas de pastagens, cande fronteira agrícola. No Norte de Mi-
soja, café e eucalipto. E, como conseqüên- na', vemos o eucalipto. Em outras regiões,
cia disso, temos a biodiversidade ameaçada •'ios a expansão da soja nas áreas de
pela expansão do modelo monocultor, chapadas. Portanto, precisamos pensar em
agroexportador, e por todo o complexo uru novo modelo de utilização do cerrado.
associado a barramentos, hidrovias, pivõs A Cooperativa Grande Sertão trabalha com
centrais, etc. essas populações, principalmente as nati-
O cerrado é visto como mero suporte f vas, desenvolvendo agricultura associada ao
sico de sustentação do superávit comei etrativismo. No Norte de Minas, a experi-
cial. Há a apropriação do território di ia é de conservação do cerrado e de
chapadas pelas monoculturas, em detrime ação de renda, o que fortalece o
to das comunidades indígenas e do, ir O?XtttiV1fl1O. Historicamente, essas po-
quilombolas. Em conseqüência, no Norte lações trabalhavam a agricultura e, ao
de Minas, milhares de nascentes secaram. 1 ,mo tempo, a coleta de frutos.
Urna pesquisa mostrou que, de 1.200 rios (orno exemplo, cito o processamento do
e córregos, 680 já secaram. Houve o pjui. As populações locais sempre se en-
encurralamento de várias famílias das po- volveram nesse trabalho, reforçando sua
pulações tradicionais. Os agricultores fa- renda familiar. Há as unidades comunitá-
miliares não têm acesso às chapadas, onde rias de aproveitamento dos frutos nativos,
foram plantados eucaliptos, e encontram- nas quais eles são selecionados e prepara-
se encurralados nas grotas, com dificulda- dos para a comercialização. As pessoas os
de de acesso à água. Lavam, empacotam e extraem seu óleo. Atu-
Houve também o empobrecimento gene- almente a cooperativa trabalha com sete
ralizado dos municípios. O efeito das quei- unidades de beneficiamento de frutos.
madas é devastador. Sabemos que sempre No ano agrícola de 2003 e 2004, os agri-
houve queimadas no cerrado, mas hoje elas cultores, juntamente com a cooperativa,

1
causam mais problemas porque as chapadas extraíram cerca de 15 mil dúzias de pequis
estão cercadas, atingindo diretamente os e 5.200 litros de óleo. Para 2005, a proje-
animais. O desmatamento em prol do ção é aumentar a produção para 45 mil
eucalipto acabou com a riqueza natural, o dúzias e 8 mil litros de óleo de pequi.
que facilita as erosões. Ressalto a dificul- O trabalho que temos feito na região leva
dade das populações tradicionais no acesso em conta o aproveitamento de todas as fru-
CERRADO MINEIRO

tas nativas do cerrado, como o panã, o ma-


racujá-nativo, o coquinho-azedo e a pinha.
São várias frutas que precisam ser valoriza-
das. Associado a isso, desenvolvemos um
trabalho de conscientização para a preser-
vação e o uso dos recursos naturais.
Nosso trabalho é feito com 15 espécies
de frutas nativas e cultivadas, num total
de 60 toneladas de frutas processadas nas
safras de 2003 e 2004. Isso gerou unia
produção de 22 toneladas de polpa inte-
gral de frutas e o envolvimento de 253
famílias de agricultores. Urna vez colhidos,
os frutos são transportados para urna uni-
dade de beneficiamento, onde trabalha-
mos o seu aproveitamento, corri o
envolvimento das comunidades.
Na fábrica, as frutas são processadas em
uma despolpadeira, por meio de um proces-
so de envasamento, transformadas em polpa
e comercializadas por meio de uma marca
regional chamada Grande Sertão, criada pela
cooperativa. Estrategicamente. trabalhamos
em duas microrregiões no Norte de Minas: a
primeira é a região de Porteirinha, que en-
globa Cinco municípios; e a segunda, a de
Varzelándia. Esse trabalho envolve 14 muni-
cípios, empenhados no apoio a pequenas
unidades comunitárias.
Hoje existe uma fábrica que, além de pro-
duzir a polpa de fruta, também a transforma
em suco. Outra unidade está sendo instalada
nessa microrregião, dentro da discussão dos
territórios. No tocante ao território da Serra
Geral, os recursos serão investidos para a im-
plantação de urna unidade de beneficiarnento
de frutos, em prol do fortalecimento do
extrativismo no Norte de Minas.
Isso gera propostas de utilização e
reconversão de áreas em que o eucalipto
está acabando e o pequi e as outras frutas
estão se regenerando. As pesquisas apon-
tam que, para o hectare de cerrado em que
há bastante pequi, chegando, em média,
a 30 pés, há capacidade para se produzir
uma média de quatro a seis caixas por pé.
C
-7—------ CERRADO MINEIRO
Em um hectare, uma família pode produzir
100 caixas de pequi. Eni uma área de 15 hec-
tares, seriam 1.500 caixas. Considerando um
valor médio de R$ 3 por caixa, isso daria um
total de R$ 4.500. É possível associar a pro-
dução e o extrativismo no cerrado. Estamos
propondo a utilização das áreas em que o
cerrado está se regenerando, principalmente
as de eucalipto, no Norte de Minas.
Temos algumas propostas: apoiar as ex-
periências comunitárias de reapropriação de
territórios e o uso sustentável da biodiver-
sidade, o controle social e comunitário da
ocupação e do uso do território e a recon-
versão agroextrativista de terras devolutas,
principalmente onde o pequi e as outras
frutas estão se regenerando, mesmo dentro

O efeito das queimadas é de áreas plantadas com eucalipto.


Com respeito ao modelo sustentável de

devastador assentamentos rurais, é preciso associar a


questão dos assentamentos, principalmen-
Sabemos que sempre houve queimadas no cerrado,
mas hoje elas causam mais problemas, te dos que estão nas regiões de cerrado,
com o extrativismo e a biodiversidade lo-
porque as chapadas estão cercadas, cal e fortalecer experiências e ações pro-
atingindo diretamente os animais. dutivas que conciliem a articulação do sa-
ber local com o conhecimento tradicional.
O desmatamento em É preciso também associar o extrativismo
prol do eucalipto acabou com a riqueza natural. à diversidade vegetal do cerrado, aos fru-
tos, plantas medicinais, mel, óleos, arte-
sanato, etc, e à criação racional de bovi-
nos e/ou caprinos nas chapadas. É possí-
vel associar a criação de animais às pasta-
gens nativas, preservando também o cer-
rado. Quanto às veredas do cerrado, elas
estão em extinção. Estão comprometidas,
principalmente nas regiões em que se plan-
tou eucalipto nas chapadas.
A agricultura familiar tem de estar
contextualizada nas políticas para o cerra-
do. O Brasil pode chegar a ser o primeiro
país na produção de alimentos, mas tem uma
grande população passando fome, porque a
produção é voltada para a exportação. Hoje,
é a agricultura familiar que põe comida na
mesa do brasileiro e precisa ser contempla-
da nas políticas para o cerrado.
-• Ç CERRADO MINEIRO

DOCUMENTO FINAL
RI

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Propostas aprovadas na reunião plenaria final do Forurri e(Ia fiord nativas do cerrado, por reqiao. promovendo-
Técnico "Cerrado Mineiro: Desafios e Perspectivas", rea- se o repovoamento natural de áreas destruidas.
lizado nos dias 14 e 15 de junho de 2004. na Assembléia S. Estabelecimento de corredores ecológicos que pos-
Legislativa do Estado de Minas Gerais. sibilitem a interligação de áreas preservadas, utilizando
os cursos d'água e veredas, entre Outros elementos da
CONSERVAÇÃO, POTENCIALIDADES E paisagem da região, como canais de ligação de áreas
BIODIVERSIDADE remotas.
1. Manutenção e possi 'eL ampliação, até o limite Le- 6. Criação de mecanismos que identifiquem os mi-
gal, da vegetação de cerrado nas atuais áreas de reserva pactos da implementação de políticas de estimulo ã
legal do cerrado mineiro, reiterando-se a obrigatoriedade produção e produtividade, por categoria de produtor,
de recomposição da área de reserva, segundo a legisla- nas áreas remanescentes do cerrado mineiro.
ção vigente. 7. Criação de programas de pesquisa e desenvolvimen-
2. Criação de programas de conservação e preservação to e de utilização sustentável das áreas de reserva do
das áreas de reserva existentes no cerrado mineiro, de cerrado mineiro, visando ã comercialização de frutas e
modo a não permitir a ampliação da fronteira agrícola, produtos medicinais irr natura e industrializados, dentre
da mineração e das áreas urbanas e periurbanas sobre as outras formas, garantindo-se a qualidade ofertada.
áreas de reserva legal. S. Levantamento do custo-beneficio ambiental da in-
3. Utilização consciente da biodiversidade presente trodução de novas tecnologias para produção agrícola
no cerrado mineiro, levando-se em conta os limites im- nas áreas do cerrado.
postos pelo bioma. 9. Organização e disseminação dos conhecimentos e
4. Criação de mecanismos que permitam a conserva- tecnologias disponíveis e a serem gerados relativos a
ção, a preservação e a multiplicação de espécies da fauna conservação e preservação do cerrado mineiro.

L
CERRADO MINEIRO Ç
10. Adoção de programas de educação ambiental que 21. Promoção da Feira do Cerrado, para a divulgação
disseminem amplamente as práticas conservacionistas na das iniciativas, tecnologias e produtos do cerrado mi-
utilização dos ecossistemas do cerrado. neiro.
11. Estabelecimento de um programa de manutenção 22. Criação de Centros de Triagem de Animais Silves-
da agricultura familiar, de forma sustentável, no cerrado tres, de acordo com as regras da União Internacional
mineiro. para a Conservação da Natureza (IUCN), de âmbito muni-
12. Efetiva aplicação e fiscalização do cumprimento cipal, com apoio de órgãos governamentais, de pesquisa
das leis que regem o uso dos recursos naturais, renováveis e da área da saúde, localizados em municípios-pólo, para
ou não, com vistas a permitir seu uso sustentável. recebimento e reintrodução de animais oriundos de apre-
13. Criação de mecanismos que incentivem e subsi- ensões e/ou doações, proibindo-se a soltura aleatória
diem os produtores rurais que efetivamente preservam dos que forem apreendidos
suas unidades produtivas por meio de plantio direto, 23. Prioridade à criação de unidades de conservação
controle biológico de pragas, destinação adequada de de proteção integral, com tamanho compatível com as
embalagens de agrotóxicos, reabilitação de nascentes e necessidades das espécies que requerem grandes áreas, e
demais áreas de preservação permanente, com a utiliza- ampliação da rede dessas unidades.
ção de espécies nativas, entre outras ações. 24. Elaboração do Atlas da Biodiversidade do Cerrado
14. Geração e sistematização de conhecimentos sobre Mineiro, contendo o registro dos órgãos governamen-
as potencialidades da biodiversidade do cerrado minei- tais e não-governamentais que atuam no bioma.
ro e desenvolvimento de tecnologias regionalizadas para 25. Criação de uma Câmara Técnica de Vigilância Ambiental
sua aplicação, de forma sustentável. em Saúde, com enfoque epidemiológico, no âmbito da Agên-
15. Elaboração de um inventário de biodiversidade das cia de Desenvolvimento do Cerrado Mineiro.
áreas remanescentes do cerrado mineiro
16. Implementação dos compromissos contidos na
Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB - Rio-92), DESENVOLVIMENTO E SUSTENTA BI LIDADE
conforme estabelece o Decreto Federal n° 4.703, de 21 26. Encaminhamento à Secretaria de Educação de pro-
de maio de 2003, que confere ao Programa Nacional de posta de inclusão de matéria sobre o cerrado mineiro
Biodiversidade (Pronabio) a responsabilidade por sua nos currículos das escolas estaduais.
coordenação. 27. Implementação de um sistema de melhoria da infra-
17. Criação de um fundo de fomento à pesquisa, ao estrutura básica, nas pequenas cidades e comunidades
ensino e ao desenvolvimento sustentável do cerrado mi- rurais, contemplando:
neiro, a ser coordenado pela Agência de Desenvolvimen- a) estradas vicinais;
to do Cerrado Mineiro. b) reativação do Programa de Mobilização Comunitá-
18. Adoção da bacia hidrográfica como unidade de ria (Servas);
planejamento para programas de exploração do cerrado, c) retomada do programa de eletrificação, nos moldes
com a efetiva participação dos comitês de bacias do Lumiar;
hidrográficas da região. d) estabelecimento de linha de crédito para o abaste-
19. Estabelecimento de zoneamento ecológico/econô- cimento de água e para saneamento no meio rural;
mico no bioma cerrado, observando-se as áreas/ e) ampliação e melhoria dos meios de comunicação no
ecossistemas de expressiva potencialidade biológica, fí- meio rural;
sica, natural, cénica, as áreas/ecossistemas frágeis, as áreas f) linhas especiais de crédito para construção e melhoria
de recarga de aqüíferos, as unidades de conservação, en- de habitações rurais.
tre outras, tendo como referência o "Atlas da Biodiversidade 28. Alteração na legislação para reduzir a carga tributá-
de Minas Gerais", editado pela Fundação Biodiversitas. ria de produtos da cesta básica e de insumos destinados à
20. Criação de programa de acesso ao crédito coope- agricultura familiar, contemplando os seguintes itens:
rativo para iniciativas de manejo de culturas extrativistas a) criação de incentivos fiscais diferenciados para a
do cerrado. agricultura familiar e suas formas associativas;
Ç CERRADO MINEIRO
b) redução de tributos da cesta básica; 30. Promoção do associativismo e do cooperativismo
c) diminuição da carga de tributos sobre insumos agrí- como mecanismo para a conquista do desenvolvimento
colas que atendam à legislação federal sobre produtos sustentável, pelo estímulo ã organização e à participa-
orgánicos; ção da sociedade, buscando:
d) ampliação das linhas de crédito diferenciado para a a) fortalecimento da integração entre instituições
população de baixa renda, a exemplo do Banco do Povo, públicas e o setor privado;
das cooperativas de crédito solidário, dentre outras ini- b) apoio a essas ações por meio de políticas de incen-
ciativas; tivo, pela isenção do PIS/Cofins, ISS, crédito diferenci-
e) maior rigor no controle e fiscalização dos grupos ado, dentre outras;
oligopolizados produtores de insumos agrícolas, evitan- c) instituição de uma linha especial de crédito para
do-se a formação de cartéis; atendimento aos pequenos empreendedores, por meio
f) desburocratização do processo de regularização do microcrédito, de forma desburocratizada;
fundiária e de acesso á terra pelos agricultores familiares; d) promoção de ações que fortaleçam a formação do
g) redução das alíquotas de ICMS sobre energia elé- capital humano;
trica para os processos de exploração agrossilvipastoril; e) instituição de programas de capacitação e de ges-
h) criação de fundos para dar contrapartida a recursos tão social;
internacionais destinados à implementação de projetos f) estimulo à formação de gestores públicos;
de desenvolvimento sustentável; g) estímulo ao turismo, como fonte geradora de em-
i) criação de fundo de aval para atendimento aos agri- prego e renda, por meio da integração entre o governo e
cultores familiares. a iniciativa privada.
29. Criação de programa de recuperação e conserva- 31. Criação do Fundo Estadual do Meio Ambiente, com
ção de solos, mananciais e rodovias estaduais, munici- gestão paritária público-privada, objetivando o finan-
pais e vicinais, em parceria com o governo federal e a ciamento de pesquisas e projetos que visem ao desen-
iniciativa privada, bem como com os governos munici- volvimento sustentável.
pais, considerando: 32. Aprimoramento da Legislação ambiental e dos me-
a) abertura de linhas de financiamento para aquisição canismos de fiscalização, especialmente no que se refere
de máquinas e equipamentos para as prefeituras munici- à proteção permanente das veredas, covoais e várzeas
pais e associações microrregionais; dos chapadôes.
b) apoio a programas de recuperação e adequação 33. Incentivo a projetos de preservação do cerrado
ambiental de estradas vicinais, bacias de captação, cap- que se enquadrem nas proposições do Protocolo de Kyoto.
tação de águas pluviais, dentre outras iniciativas; 34. Regulamentação do Fundo de Recuperação, Prote-
c) isenção do IPI e do ICMS para aquisição de máqui- ção e Desenvolvimento Sustentável das Bacias
nas e rnontagern de patrulhas mecanizadas, com vistas Hidrográficas do Estado de Minas Gerais (Ftiidro), para a
ao atendimento dos objetivos expressos no caput; efetiva recuperação das bacias hidrográficas.
d) capacitação e treinamento de técnicos e operado- 35. Reconhecimento do licenciamento ambiental como
res de máquinas, com ênfase no manejo sustentável das instrumento efetivo de coristmucão do desenvolvimento
bacias hidrográficas; sustentável.
e) elaboração e implantação de um código de posturas 36. Criação de programa estadual de pesquisa e desen-
para construção, conservação e uso de solos, manan- volvimento da agricultura orgânica no cerrado mineiro.
ciais e estradas; 37. Criação de comissão de investigação dos efeitos
f) estudo de mecanismos de apoio à interligação dos dos impactos ambientais sobre a saúde das populações
transportes rodoviário e ferroviário; atingidas.
g) criação de programa de recuperação e ampliação do 38. Aplicação da legislação para garantir o retorno das
transporte ferroviário; terras devolutas cedidas às empresas reflorestadoras que,
h) criação de um programa de pesquisa sobre a im- por contrato, devem ser novamente incorporadas ao
plantação de hidrovias e seus impactos. patrimônio público no prazo legal, e destinação dessas
CERDO MINEIRO

terras a programas de reforma agrária, assentamentos pectivas", realizado, em novembro de 2001, pela Assem-
agroextrativistas e reservas extrativistas. bléia Legislativa do Estado de Minas Gerais.
39. Criação de linha de crédito específica para implan- 50. Recomposição imediata do quadro de pessoal das
tação e manutenção do sistema de plantio direto, con- instituições de ensino, pesquisa e desenvolvimento, por
dicionado à liberação de Licenciamento ambiental. meio de concurso público.
40. Elaboração e implementação de planos diretores 51. Capacitação e formação de recursos humanos nas
de irrigação no âmbito das bacias hidrográficas. instituições de ensino, pesquisa e desenvolvimento.
41. Revisão da Lei n° 14.309, de 2002, para evitar que 52. Diagnóstico e prospecção de demandas de pesqui-
as reservas legais sejam compensadas fora da mesma ba- sa para o cerrado.
cia hidrográfica. 53. Repasse suficiente de verba de custeio e investi-
42. Premiação do produtor rural que contribui para a mentos para as instituições de ensino, pesquisa, exten-
produção de águas, conforme proposto no Seminário são rural e desenvolvimento do Estado.
Legislativo "Águas de Minas". 54. Garantia, por parte do Estado, de uma política de
43. Estabelecimento de uma política de valorização e valorização, especialmente de melhoria imediata dos sa-
apoio às instituições públicas e não-governamentais que lários, dos profissionais que atuam em suas instituições
atuam na pesquisa da biodiversidade e intervêm nas ques- de ensino, pesquisa e desenvolvimento.
tões socioambientais que dizem respeito aos povos do 55. Integração efetiva e multidisciplinar dos órgãos
cerrado. governamentais e de pesquisa na vigilância, fiscalização
44. Instituição do Dia do Cerrado Mineiro. e investigação dos problemas ambientais do cerrado mi-
neiro.
56. Articulação entre agências federais de fomento à
POLÍTICAS PARA A PESQUISA NO CERRADO pesquisa (CNPq e fundos governamentais) e agências es-
45. Criação da Agência do Desenvolvimento do Cerra- taduais (FAP5) dos Estados que se localizam no bioma
do Mineiro, como organismo multiinstitucional, com as cerrado, para o lançamento simultâneo de editais indu-
seguintes atribuições: zidos para pesquisas de biodiversidade, educação
a) articulação entre os órgãos de pesquisa, extensão ambiental e desenvolvimento sustentável do cerrado bra-
rural, fomento e saúde e ONG5; sileiro.
b) acompanhamento e moriitoramento das ações 57. Criação de núcleos regionais de pesquisa, para aten-
propostas por este fórum, com vistas a sua imple- dimento às demandas vocacionadas, aproveitando-se a
me n ta çã o; estrutura de instituições já existentes.
c) organização das informações por meio de uma rede 58. Incentivo à criação de novas coleções científicas
virtual e de um banco de dados sobre o cerrado; - herbários, museus de zoologia e de história natural,
d) divulgação dos resultados das pesquisas. coleções científicas universitárias e dos institutos de
46. Delegação à Comissão de Representação, eleita na pesquisa -, bem como ampliação e manutenção das atu-
Plenária Final deste fórum, da função de implementar a ais, que abriguem espécimes científicos nativos do cer-
Agência de Desenvolvimento do Cerrado Mineiro e acom- rado mineiro.
panhar a efetivação das medidas propostas. 59. Titulação das terras dos remanescentes de quilombos
47. Garantia de efetiva e regular liberação dos recur- e regularização das terras das populações indígenas si-
sos constitucionalmente destinados à Fapemig, no valor tuadas na área do cerrado mineiro, e adoção de progra-
de, no mínimo, l a/o da receita orçamentária corrente or- mas voltados para o desenvolvimento etno-sustentável
dinária. dessas comunidades.
48. Estímulo à indução de editais nas agências de fo- 60. Discussão dos atuais critérios do regime de ou-
mento com temas específicos sobre o cerrado. torga, que limita a utilização das águas de Minas Ge-
49. Implementação das propostas aprovadas no Docu- rais pelos mineiros a valores em torno de lO'/o dos
mento Final do Fórum Técnico "Instituições de Pesquisa volumes produzidos, enquanto os 90% restantes saem
Científica e Tecnológica de Minas Gerais: Crises e Pers- do Estado.

43
CERRADO MINEIRO

MOÇÕES
Encaminhamento aos governos municipais, estaduais sua importante contribuição para o enraizamento da
e federal: educação ambiental no País.
1 - Apoio ao projeto "Vamos Cuidar do Brasil com as 2 - Apoio à Carta dos Povos do Cerrado, aprovada em
Escolas", do Ministério da Educação e do Desporto, por Pirapora (MG), em 5 de junho de 2004, conforme se segue:

CARTA DOS POVOS DO CERRADO

Reunidos na cidade de Pirapora, Norte de Minas Ge- capacidade para disponibilizar as experiências, saberes
rais, às margens do Rio São Francisco, nós, representan- e estratégias existentes ou em implementação nos domí-
tes de comunidades, organizações populares, universi- nios dos cerrados de Minas Gerais.
dades, percebemos ter idéias e princípios em comum. 9 - Criar urna rede de informações para divulgar, soci-
Queremos respeitar e conhecer todas as formas de vida. alizar e disponibilizar as experiências, as tecnologias, as
Cremos no cerrado como fonte da biodiversidade. No II marcas e os produtos produzidos pelas comunidades
Encontro Regional dos Povos do Cerrado, realizado eiii cerradeiras, desde que não agridam o ambiente em que
Pirapora nos dias 3, 4 e 5 de junho, discutiram-se e são desenvolvidos.
aprovaram-se, em plenária, as seguintes propostas: 10 - Agilizar os processos de legalização das terras
1 - Aplicar a Legislação para garantir o retorno das ocupadas por agricultores sem-terra no Alto Médio São
terras devolutas cedidas às empresas reflorestadoras que, Francisco, com ação mais efetiva do poder público para
por contrato, teriam de ser novamente incorporadas ao democratizar a posse da terra e as condições sociais de
patrimõnio público no prazo legal, para que sejam desti- produção.
nadas à reforma agrária. 11 - Definir e regulamentar os territórios das popula-
2 - Criar programa especial de proteção das veredas ções tradicionais dos cerrados, como os indígenas e os
dos cerrados de Minas Gerais, pela integração das insti- quilo ni bolas.
tuições oficiais e da sociedade civil organizada. 12 - Aplicar e cumprir a lei do Ministério Público que
3 - Isolar os núcleos de desertificação dos cerrados e exige a preservação de 20% das propriedades particula-
promover acompanhamento sistemático para avaliação res, bem como garanti-Ia em casos de venda ou partilha.
da regeneração natural. 13 - Assegurar recursos públicos, por meio de criação
4 - Identificar, mapear e analisar os maciços remanes- de fundo específico, para realização de encontros cien-
centes dos cerrados, para fins de preservação permanen- tíficos, tecnológicos e populares na região dos cerra-
te. dos, de modo a propiciar trocas entre os saberes popular
5 - Incentivar, corri base nas experiências dos e académico.
cerradeiros, a disseminação e a socialização das práticas 14 - Incentivar a produção familiar por meio de
de manejo junto aos usuários dos recursos naturais. tecnologias alternativas e compromissadas com a
6 - Resgatar o acervo cultural e tecnológico dos po- sustenta bi[idade socioeconómica e ambienta[.
vos do cerrado, bem como o cultivo de práticas popula- 15 - Garantir aos espaços urbano e rural equipamentos
res que possam viabilizar estratégias de geração de ren- sociais, de acesso a serviços elementares como educa-
da, visando à melhoria da qualidade de vida da popula- ção, saúde, segurança pública, saneamento básico, ener-
ção. gia elétrica, dentre outros, e assegurar que a gestão e a
7 - Estabelecer uma política concreta de conhecimen- decisão sobre o uso dos recursos sejam da competência
to, valorização e apoio às instituições públicas e não das respectivas comunidades.
governamentais que atuam na pesquisa e intervenção de 16 - Garantir a biodiversidade do bioma dos cerrados,
problemáticas socioambientais envolvendo os povos do por meio de iniciativas como a implantação de corredo-
cerrado. res ecológicos de proteção da fauna, da flora e das nas-
8 - Criar uma rede de divulgação e socialização, como centes.

ffil.
Esta publicação contém as palestras apresentadas
no Fórum Técnico "Cerrado Mineiro: Desafios e
Perspectivas", realizado pela Assembléia
Legislativa do Estado de Minas Gerais nos dias 14
e 15 de junho de 2004, e as propostas aprovadas
na sessão plenária final do evento. As informações,
discussões e opiniões expressas durante o fórum,
aqui resumidas, constituem valioso
o aperfeiçoamento das políticas púL
para as regiões mineiras do cerrad
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